Buscar

TCC - Matheus Cavalheiro Ferreira

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 59 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 59 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 59 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

17
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF
FACULDADE DE DIREITO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
MATHEUS CAVALHEIRO FERREIRA
A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DE ALTO VALOR
NITERÓI
2018
MATHEUS CAVALHEIRO FERREIRA
A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DE ALTO VALOR
	
	Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Marcelo Pereira de Almeida
NITERÓI
2018
Ficha catalográfica automática - SDC/BFD
F383i	Ferreira , Matheus Cavalheiro
A (im)penhorabilidade do bem de família imóvel de alto valor
· Matheus Cavalheiro Ferreira ; Prof. Dr. Marcelo Pereira De Almeida, orientador. Niterói, 2018.
58 f.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito)-Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Direito, Niterói, 2018.
1. Direito à moradia. 2. Patrimônio mínimo. 3. Bem de família de alto valor. 4. Impenhorabilidade . 5. Produção intelectual. I. Título II. De Almeida,Prof. Dr. Marcelo Pereira, orientador. III. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito.
CDD -
		 Bibliotecária responsável: Elazimar Menezes - CRB7/3912
	MATHEUS CAVALHEIRO FERREIRA
A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DE ALTO VALOR
	
	Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Aprovada em dezembro de 2018.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Marcelo Pereira de Almeida – Orientador
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Prof. Carlos Eduardo Dutra Curado
Prof. Ricardo Proença Pinto
Dedico este trabalho à memória do meu querido padrinho Clézio, que muito me ensinou, me ajudou e moldou meu caráter ao longo de 17 inesquecíveis anos ao meu lado. Onde quer que você esteja, esta conquista também é sua.
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, Madalena, mulher guerreira, pelo apoio incondicional ao longo de toda minha vida e por ter me ensinado valores que carregarei para sempre;
Ao meu pai, Lenildo, por toda ajuda ao longo da minha trajetória; 
À minha madrinha, Maria Eni, que mesmo sem obrigação, sempre esteve presente, sendo minha maior incentivadora;
À Marianna, que mesmo com altos e baixos, esteve comigo durante quase toda graduação, sendo meu ponto de equilíbrio; 
Aos meus bons amigos, os próximos e os distantes, fundamentais no dia a dia; 
Aos meus colegas de turma pela convivência fraterna e ajuda mútua;
Ao meu orientador, Marcelo, pela condução deste trabalho. 
	
“Enquanto eles não se conscientizarem, não serão rebeldes autênticos e, enquanto não se rebelarem, não tem como se conscientizar.”
1984. George Orwell
RESUMO
O direito à moradia é consagrado como um direito social, presente no artigo 6º da Constituição Federal. Ele recebe especial proteção no ordenamento jurídico brasileiro, sendo a figura do bem de família o principal meio de proteção da moradia familiar. O bem de família tem como tem como princípio basilar a proteção do imóvel residencial, por meio da garantia de impenhorabilidade nos processos de execução, sendo a Lei 8.009/90 resultado dessa proteção. Com isso, visa-se garantir a dignidade do devedor, que não deve, no processo de execução, ser privado de um patrimônio mínimo necessário à sua sobrevivência. Nesse sentido, surgem questionamentos sobre o bem de família imóvel de alto valor, pois a sua intangibilidade, em determinados casos concretos, pode representar afronta aos princípios da razoabilidade e do acesso à justiça. Isso se justifica pois o bem de família representa proteção ao mínimo necessário para uma vida digna, e imóveis luxuosos exacerbam este caráter. Além disso, caso a penhora seja permitida, seria garantido ao devedor um montante do valor, a fim de que ele possa adquirir novo imóvel, provavelmente menos luxuoso, garantindo-se o direito fundamental à moradia. Isso representa que o credor deve receber o mesmo tratamento do devedor nos processos de execução, porque o credor também é sujeito de direitos e frustrar a satisfação do crédito que ele tem a receber, permitindo uma vida luxuosa ao devedor, pode representar a perda do direito ao patrimônio mínimo do credor. 
Palavras-chave: Moradia. Dignidade Humana. Patrimônio mínimo. Bem de família. Alto valor. 
ABSTRACT 
The right to housing is enshrined as a social right, present in Article 6 of the Federal Constitution. It receives special protection in the Brazilian legal system, and the homestead is the main means of protecting family housing. The homestead has as its basic principle the protection of the residential property, through the guarantee of no attachment in the execution processes, being Law 8.009/90 being the result of this protection. This is to ensure the dignity of the debtor, who must not be deprived of the minimum assets necessary for his or her survival in the execution process. In this sense, questions arise about the property of a high-value immovable family, since its intangibility, in certain concrete cases, may represent an affront to the principles of reasonableness and access to justice. This is justified because the homestead represents protection to the minimum necessary for a dignified life, and luxurious real estate exacerbate this character. In addition, if the attachment is allowed, the debtor would be guaranteed an amount of the value, so that he can acquire new property, probably less luxurious, guaranteeing the fundamental right to housing. This means that the creditor must receive the same treatment as the debtor in the enforcement proceedings, because the creditor is also subject to rights and frustrate the satisfaction of the credit he has to receive, allowing a luxurious life to the debtor, can represent the loss of the right to the creditor's minimum equity.
Keywords: Housing. Human dignity. Minimum equity. Homestead. High value. Reasonability. 
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO	11
1. DO DIREITO FUNDAMENTAL À MORADIA	13
1.1. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA	15
1.2. DO MÍNIMO EXISTENCIAL	16
1.3. TEORIA DO ESTATUTO JURÍDICO DO PATRIMÔNIO MÍNIMO	17
2. DO BEM DE FAMÍLIA NO DIREITO BRASILEIRO	21
2.1. O CONCEITO DE FAMÍLIA E SUA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL	22
2.2. A ORIGEM DO BEM DE FAMÍLIA E O INSTITUTO DO HOMESTEAD	24
2.3. BEM DE FAMÍLIA VOLUNTÁRIO OU CONVENCIONAL (CC/02)	27
2.4. BEM DE FAMÍLIA LEGAL (RESIDÊNCIA FAMILIAR): ASPECTOS GERAIS	31
2.5. A LEI 8.009/90: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS	33
2.5.1. As exceções à impenhorabilidade na Lei 8.009/90	37
2.5.2. Do adquirente insolvente de má fé de imóvel mais valioso	39
3. A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DE ALTO VALOR	42
3.1. ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL 1351571/SP	44
3.2. O PATRIMÔNIO MÍNIMO E OS BENS LUXUOSOS	48
3.3. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS FRENTE À IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DE ALTO VALOR	49
CONCLUSÃO	55
REFERÊNCIAS	57
INTRODUÇÃO
O presente trabalho objetiva retratar a relação entre a impenhorabilidade do bem de família, tutelado no Código Civil de 2002 entre os artigos 1.711 e 1.722 e, principalmente, na Lei 8.009/90, e a satisfação do crédito quando o devedor possuir um único imóvel residencial de alto valor e não sendo possível a penhora de outros bens. Será feito um paralelo entre as garantias fundamentais do devedor à moradia digna e ao mínimo existencial, baseado na teoria do patrimônio mínimo e as garantias fundamentais do credor ao acesso à justiça e também ao mínimo existencial, uma vez que o crédito a ser recebido, como em boa parte das dívidas trabalhistas, pode possuir natureza alimentar e de sustento da família. 
Tal análise da possibilidade de penhora do bem de família imóvel de alto valor é relevante e necessária, uma vez que atutela a estes bens pela Lei 8.009/90 encontra algumas resistências doutrinárias e jurisprudenciais, gerando decisões alternadas em diferentes processos, apesar dos tribunais superiores estarem se alinhando à continuidade da impenhorabilidade total dos bens de família, ressalvadas as exceções já previstas na referida lei. 
Além disso, há embate constitucional entre os direitos fundamentais do credor e do devedor, pois, apesar deste possuir o direito à moradia, o crédito devido àquele pode constituir relevante importância para sua subsistência digna, não podendo o devedor esquivar-se de sua responsabilidade para com o credor e, neste caso, há uma corrente que defende que o imóvel de alto valor do devedor deva ser passível de penhora para satisfação do crédito e, após isso, com o montante restante, o devedor adquira um imóvel mais simples, não afetando, portanto, seu direito à moradia.
Concomitante às divergências anteriormente citadas, será defendido que se admita, por parte da jurisprudência, a possibilidade de penhora do bem de família imóvel de alto valor. A hipótese apresentada é de que não haja uma irresponsável aceitação da penhora de todo e qualquer imóvel de alto valor que constitua bem de família, mas sim uma minuciosa análise de cada caso concreto para, a partir disso, julgar-se pela penhora ou não. É o que ensina Freddie Didier (2017, p. 843) ao afirmar que “nada impede que o órgão julgador determine a penhora de uma mansão milionária, que serve de sede familiar, reconhecendo a inconstitucionalidade da restrição no caso concreto”. Portanto, o principal objetivo do trabalho é afastar a absoluta impenhorabilidade do bem de família imóvel de alto valor.
Serão analisados dispositivos constitucionais que garantem o direito à moradia, bem como o mínimo existencial. Entretanto, essa análise será estendida também ao credor, pois, normalmente, este goza de menos proteções constitucionais, o que muitas vezes frustra o direito ao crédito. A partir da análise constitucional, esmiuçar-se-ão os dispositivos que garantem a impenhorabilidade do bem de família, com destaque à lei 8.009/90. Por fim, será proposto o afastamento da absoluta impenhorabilidade do bem de família imóvel de alto valor, levando-se em conta posições doutrinárias de autores renomados, como Freddie Didier, Sérgio Cruz Arenhart e Nelson Rosenvald, além do excelente voto do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão, no Recurso Especial 1351571/SP que, apesar de ter sido vencido, trouxe boa discussão à Corte.
1. DO DIREITO FUNDAMENTAL À MORADIA
O direito à moradia é uma necessidade básica do homem, constituindo-se requisito imprescindível para uma vida plena. Como bem disserta Nolasco (2008, p. 87) “[...] a casa é o asilo inviolável do cidadão, a base de sua indivisibilidade, é, acima de tudo, como apregoou Edward Coke, no século XVI: ‘a casa de um homem é o seu castelo’.”
Sérgio Iglesias Nunes de Souza assim define a moradia:	
	
	A moradia consiste em bem irrenunciável da pessoa natural, indissociável de sua vontade e indisponível, que permite a fixação em lugar determinado, não só físico, como também a fixação dos seus interesses naturais da vida cotidiana, exercendo-se de forma definitiva pelo individuo, e, secundariamente, recai o seu exercício em qualquer pouso ou local, mas sendo objeto de direito e protegido juridicamente. O bem da “moradia’’ é inerente á pessoa e independente de objeto físico para a sua existência e proteção jurídica. Para nós, “moradia’’ é elemento essencial do ser humano e um bem extrapatrimonial. “Residência’’ é o simples local onde se encontraria o individuo. E a habitação é o exercício efetivo da “moradia’’ sobre determinado bem imóvel. Assim, a “moradia’’ é uma situação de direito reconhecida pelo ordenamento jurídico [...]. (SOUZA, 2004, p.45)
O direito fundamental à moradia somente foi expressamente especificado na Constituição da República Federativa do Brasil no ano de 2000, através da Emenda Constitucional nº 26, que modificou a redação do art. 6º da Carta Magna, passando este a vigorar do seguinte modo: “Art. 6º: são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.[footnoteRef:1] [1: A Emenda Constitucional nº 90, de 2015, alterou o art. 6º da Constituição, que passa a vigorar com a seguinte redação: São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. ] 
Anteriormente, o direito social à moradia era extraído da redação do art. 7º da Constituição Federal, qual seja:
Art. 7º: são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
[...] 
IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.
Além dos já citados artigos, também é possível exprimir do art. 4º, inciso II da Constituição Federal o direito à moradia, uma vez que, segundo o referido artigo, o Brasil é regido pelos direitos humanos em suas relações internacionais, sendo certo que o direito à moradia encontra respaldo em tratados e convenções internacionais, como bem diz Sérgio Iglesias Nunes de Souza (2004, p; 131):
	Entretanto, o direito à moradia não era só previsto neste citado dispositivo constitucional. O inciso II do artigo quarto, da vigente constituição determina que a República Federativa do Brasil reja-se, nas suas relações internacionais, pelo principio da prevalência dos direitos humanos. Dessa forma, perante os organismos internacionais, o Estado é obrigado a atender e dar proteção ao direito a moradia, sob pena de não só descumprir o seu papel junto a sociedade brasileira, mas também junto aos órgãos internacionais. Em verdade, o assunto referente ao direito à moradia não só interessa a determinado Estado, mas a toda humanidade, já que tal assunto é de interesse legitimo internacional, reconhecimento tido nos tratados aos quais o Brasil pertence.
Como exemplo, pode-se citar a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Esta foi adotada e promulgada pela Resolução 271 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, no dia 10 de dezembro de 1948, sendo confirmada pelo Brasil no mesmo momento. E muito embora se utilizasse ainda a “habitação” para expressar esse direito, já se estabelecia a moradia como requisito para se desfrutar de uma vida completa, conforme retrata o art. 25, item I, da dita Declaração:
	Todo o homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda de meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM, 1948).
O direito à moradia encontra resguardo, também, no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, o qual foi admitido pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992, cujo artigo 11 dispõe que “Os Estados signatários do presente pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si e para sua família, inclusive alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como uma melhoria contínua de suas condições de vida.” O ordenamento jurídico brasileiro é regido também por outros dois[footnoteRef:2] documentos como a Declaração de Vancouver sobre assentamentos humanos – HABITAT I (1976), que reconheceu o direito à moradia adequada como umdireito básico da pessoa humana; e a designada Agenda HABITAT II (1996), decorrente de uma Conferência da ONU, a qual é um dos documentos mais importantes a tratar do tema. Esse documento determina em seu artigo 13: [2: Em 2016 foi realizado, no Equador, o Habitatt III. Entre as principais disposições do documento, está a igualdade de oportunidades para todos; o fim da discriminação; a importância das cidades mais limpas; a redução das emissões de carbono; o respeito pleno aos direitos dos refugiados e migrantes; a implementação de melhores iniciativas verdes e de conectividade, entre outras.] 
Reafirmamos somos guiados pelos objetivos e princípios da Carta das Nações Unidas e reafirmamos nosso compromisso em assegurar a plena implementação dos Direitos Humanos estabelecidos em instrumentos internacionais, incluindo o Direito à Moradia como está na Declaração Universal de Direitos Humanos, na Convenção Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, na Convenção Internacional pela Eliminação de Todos as Formas de Discriminação Contra a Mulher e na Convenção dos Direitos da Criança, levando em conta que o Direito à moradia adequada, na forma como está incluído nos instrumentos internacionais mencionados acima, deve ser implementado progressivamente. Reafirmamos que todos os Direitos Humanos – civis, culturais, econômicos, políticos e sociais – são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados.
Apesar de não ter dado origem a qualquer tratado internacional, esta Agenda é considerada um marco histórico em relação ao direito à moradia, pois suas conclusões podem ser utilizadas como diretrizes para elaboração de políticas relacionadas aos assentamentos humanos.
1.1. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
A efetivação do direito à moradia demanda uma intervenção na ordem econômica e social pelo Estado, ou seja, políticas públicas, além das já existentes, devem ser criadas para melhor organizar o uso e o desenvolvimento da área urbana. Legalmente, é possível afirmar que os pactos e as convenções assinadas pelo Brasil possuem força de Lei, sendo assim, somadas às previsões constitucionais, reforçam uma obrigação por parte do Estado de efetivar e proteger o direito à moradia de forma ampla a todos os cidadãos. 
É bom lembrar, em virtude das obrigações assumidas perante a comunidade internacional o Brasil incluiu, no texto do art. 6º da Carta Magna de 1988, mediante a Emenda Constitucional nº 26/2000, o direito à moradia como um direito fundamental, além dos direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados. 	A moradia, apesar de ter sido incluída no rol dos direitos fundamentais sociais, não se encontra assegurada de maneira efetiva e concreta a todos os brasileiros, sendo certo que a previsão Constitucional implica obrigação para o Estado no sentido de implementar políticas públicas socialmente ativas para tornar concreto este direito.
1.2. DO MÍNIMO EXISTENCIAL
O mínimo existencial assenta-se na tese de que toda pessoa deve ter acesso a condições mínimas para uma vida digna. Ele consiste em um direito fundamental que encontra suporte no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 
Não há previsão expressa na Constituição Federal sobre o mínimo existencial, entretanto, este pode ser extraído de alguns dispositivos da Carta Magna. Primeiramente, o art. 3º elenca objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, com destaque para a redução das desigualdades sociais e regionais e a erradicação da pobreza e da marginalização. Mais adiante, podemos extrair do art. 6º da Constituição Federal que a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição são direitos sociais das pessoas. Há ainda o art. 7º, inciso IV, da referida Constituição Federal, o qual estabelece que o salário mínimo deverá ser capaz de atender às necessidades básicas do indivíduo e de sua família, aqui destacando que a moradia está inclusa no rol de direitos aos quais o salário mínimo deve ser suficiente.
O mínimo existencial é direcionado, principalmente, ao Estado, para que este possa desenvolver mecanismos que garantam que os mais abastados também tenham acesso a condições mínimas de vida, como o direito à moradia. Daniel Sarmento (2008) aduz que dentre os fundamentos que justificam a obrigação do Estado perante o mínimo existencial, há dois fundamentos instrumentais e um fundamento não instrumental. Os instrumentais tratam de uma exigência necessária para a garantia da liberdade real ou para a proteção dos pressupostos da democracia. Já o argumento não instrumental traz que o atendimento das necessidades humanas mais básicas é uma exigência autônoma da justiça, que se impõe independentemente das suas consequências para a promoção de outros objetivos.
Daniel Sarmento (2008) complementa:	
	Noutro giro, o mínimo existencial desempenha um papel importante como critério para adjudicação judicial de direitos sociais. Como antes ressaltado, numa ordem jurídica centrada na dignidade da pessoa humana não se pode conceber a realização de despesa pelo Estado como um campo livre para as decisões do legislador orçamentário e do administrador. Pelo contrário, há prioridades que a eles se impõem por força de princípios constitucionais revestidos de elevado teor moral, dentre as quais sobressai a de realizar os gastos necessários para o atendimento das necessidades materiais mais básicas dos necessitados. Assim, me parece que o Poder Judiciário está plenamente legitimado para fiscalizar o cumprimento destas prioridades pelos demais poderes estatais.
É possível extrair do trecho em questão que os direitos sociais que contornam o mínimo existencial possuem fundamental prioridade no âmbito das políticas públicas. Ou seja, antes de qualquer coisa, o poder legislativo e o poder executivo devem observar as garantias fundamentais mínimas para uma vida digna para a população. Do mesmo modo, o poder judiciário deve, além de fiscalizar o cumprimento dessas prioridades por parte dos outros poderes, atuar também na judicialização de determinadas demandas que visem garantir os direitos sociais básicos para uma vida digna. Utilizando-se deste raciocínio e como será visto mais a frente, o direito à moradia encontra respaldo nos bens de família, estes sendo impenhoráveis. Entretanto, será notado que há um conflito entre princípios constitucionais no que tange ao processo de execução e à impenhorabilidade do bem de família imóvel e é importante ressaltar que os dois princípios fazem parte do chamado mínimo existencial. De um lado o direito à moradia, sendo o imóvel bem de família; do outro o direito à alimentação, uma vez que as verbas devidas pelo devedor podem significar os alimentos do credor, o que ocorre, principalmente, em processos trabalhistas. 
1.3. TEORIA DO ESTATUTO JURÍDICO DO PATRIMÔNIO MÍNIMO
A partir da crescente perspectiva de garantias constitucionais ao mínimo existencial às pessoas, construiu-se a o estatuto do patrimônio mínimo, fruto da tese apresentada pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal e Professor Luiz Edson Fachin. A teoria do estatuto jurídico do patrimônio mínimo defende que a toda pessoa deve ser garantido um mínimo existencial a ser assegurado por um patrimônio mínimo, mensurado consoantes parâmetros elementares de uma vida digna e do qual não pode ser expropriada ou desapossada. Fachin sustenta existir uma imunidade juridicamente inata ao ser humano, superior ao interesse dos credores. Como bem diz Flávio Tartuce (2017, p. 197) “a pessoa passa a ser o centro do Direito Privado, em detrimento do patrimônio (despatrimonialização do Direito Civil).” Flávio Tartuce (2017, p. 197), sobre a obra de Edson Fachin, ainda complementa:
	Sobre o tema, ensina o Ministro Fachin que “a ‘repersonalização’do Direito Civil recolhe, com destaque, a partir do texto constitucional, o princípio da dignidade da pessoa humana. Para bem entender os limites propostos à execução à luz do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, têm sentido verificações preliminares. A dignidade da pessoa é princípio fundamental da República Federativa do Brasil. É o que chama de princípio estruturante, constitutivo e indicativo das ideias diretivas básicas de toda a ordem constitucional. Tal princípio ganha concretização por meio de outros princípios e regras constitucionais formando um sistema interno harmônico, e afasta, de pronto, a ideia de predomínio do individualismo atomista no Direito. Aplica-se como leme a todo o ordenamento jurídico nacional compondo-lhe o sentido e fulminando de inconstitucionalidade todo preceito que com ele conflitar. É de um princípio emancipatório que se trata”. 
Nota-se o tratamento destacável que o Ministro Edson Fachin dá à dignidade da pessoa humana, deixando claro que este é o princípio norteador da Constituição Federal e da República Federativa do Brasil. Ou seja, todo preceito que conflitar com o princípio da dignidade humana é dotado de inconstitucionalidade. Flávio Tartuce (2017, p. 197) conclui: “Em síntese, a tese pode ser resumida pelo seguinte enunciado: deve-se assegurar à pessoa um mínimo de direitos patrimoniais, para que viva com dignidade”.
Como exemplo da aplicação do patrimônio mínimo no Direito Civil, pode-se citar o art. 548 do Código Civil, que elucida ser nula a doação de todos os bens, sem a reserva do mínimo para a sobrevivência do doador (a chamada nulidade da doação universal). Outro exemplo é o art. 928, § único, do Código Civil, que ao tratar da indenização contra o incapaz, enuncia que o valor indenizatório deve ser fixado pelo juiz com equidade, para não privar o incapaz e os seus dependentes do mínimo para que vivam com dignidade. 
Entretanto, como bem diz Flávio Tartuce (2017, p. 198):
	[...] as principais aplicações da teoria do patrimônio mínimo se referem à do bem de família, especificamente pelas interpretações que se faz da Lei 8.009/1990. Conclui-se que a proteção do bem de família nada mais é que a proteção do direito à moradia (art. 6.º da CF/1988) e da dignidade da pessoa humana, seguindo a tendência de valorização da pessoa, bem como a solidariedade estampada no art. 3.º, I, da CF/1988. Em suma, falar em dignidade humana nas relações privadas significa discutir o direito à moradia, ou, muito mais do que isso, o direito à casa própria. 
Portanto, a teoria do patrimônio mínimo, como já citado anteriormente, possui como ponto central a tentativa de, através dos direitos sociais e do princípio da dignidade da pessoa humana, garantir a subsistência digna dos indivíduos, fazendo-se valer de proteções constitucionais que norteiam todo ordenamento jurídico subsequente. Aqui está um ponto chave de discussão: a teoria do patrimônio mínimo, somada aos preceitos constitucionais sobre o tema, afirma que a pessoa necessita de um patrimônio mínimo para viver com dignidade, e sobre isso recai a impenhorabilidade do bem de família, qual seja o único imóvel residencial disponível para que o devedor e sua família morem. Entretanto, alguns autores levantaram a tese da penhora do bem de família ser possível quando o único imóvel residencial for de alto valor, pois a alienação deste bem não acarretaria na perda do mínimo para uma vida digna. Acerca do tema, Sérgio Cruz Arenhart (2006, p. 3) traz:
Tais previsões respondiam às críticas frequentes da doutrina, que acentuava a excessiva proteção dada aos bens de família e às verbas alimentares. De fato, se esses bens merecem proteção especial, é certo também que o interesse do credor – que, por vezes, também está respaldado em valor de relevância - exige adequada proteção. Ademais, a proteção de verbas de caráter alimentar ou do imóvel que serve de residência da família não pode servir como escudo para a desmesurada preservação de bens e direitos de forma manifestamente abusiva. Não há dúvida de que deve haver diferença no tratamento da casa usada pela família para sua residência e da mansão, de vários metros quadrados, que também se destina a tal fim, embora exceda a dimensão necessária para o exercício do estrito direito de habitação. É inquestionável que a perda da residência familiar gera elevado risco de que a família fique desalojada, o mesmo não se podendo dizer da arrecadação do imóvel suntuoso, que pode bem ser substituído por outro, de menores proporções.
Portanto, além de um possível conflito entre direitos sociais, quais sejam o direito à moradia e o direito à alimentação (quando o valor devido representar a subsistência do credor, como normalmente é nos casos de verbas de origem trabalhista), Sérgio Arenhart levanta a hipótese de que a penhora do único imóvel de alto valor do devedor não traria prejuízo ao seu patrimônio mínimo, ou seja, o devedor conseguiria manter um padrão de vida digno em imóvel menos luxuoso que o penhorado. Mais adiante o tema será tratado com mais riqueza de detalhes. 
2. DO BEM DE FAMÍLIA NO DIREITO BRASILEIRO
O bem de família goza de proteção contra a execução, ou seja, é impenhorável. Entretanto, Freddie Didier (2017, p. 812) afirma que “o bem imóvel que serve de moradia da família é relativamente impenhorável”, ou seja, quando há a possibilidade do bem ser penhorado na execução de certos créditos. Um exemplo de impenhorabilidade absoluta, quando o bem não pode ser penhorado em nenhuma hipótese, é o seguro de vida, artigo 833, VI, CPC. 
No Código de Processo Civil, a impenhorabilidade do bem de família possui respaldo no artigo 832, segundo o qual “não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis”, vide artigos 1711 e 1715 do Código Civil (bem de família voluntário) e vide Lei 8.009/90 (bem de família legal), que serão tratadas mais adiante. 
Como citado inúmeras vezes no trabalho, as regras pertinentes à impenhorabilidade devem ser aplicadas respeitando determinadas metodologias com fulcro em direitos fundamentais, como, por exemplo, o direito fundamental à moradia, presente no artigo 6º da Constituição Federal e o instituto do patrimônio mínimo, tese do Ministro Edson Fachin. Em consonância com o artigo 832 do CPC, há o artigo 833, também do CPC, o qual elenca o rol dos bens impenhoráveis. Isso significa que o legislador já se preocupou em fazer um prévio juízo de ponderação entre os interesses envolvidos em uma execução, ficando claro o direcionamento em favor da proteção do executado face o direito do exequente. Freddie Didier (2017, p. 812) complementa:
Não obstante isso, as hipóteses de impenhorabilidade podem não incidir em determinados casos concretos, em que se evidencie a desproporção/desnecessidade/inadequação entre a restrição a um direito fundamental e a proteção do outro. Ou seja: é preciso deixar claro que o órgão jurisdicional deve fazer o controle de constitucionalidade in concreto da aplicação das regras de impenhorabilidade, e, se a sua aplicação se revelar inconstitucional, porque não razoável ou desproporcional, deve afastá-la, construindo a solução devida para o caso concreto. Nesse momento, é imprescindível rememorar que o órgão jurisdicional deve observar as normas garantidoras de direitos fundamentais (dimensão objetiva dos direitos fundamentais) e proceder ao controle de constitucionalidade das leis, que podem ser constitucionais em tese, mas, in concreto, revelar-se inconstitucionais.
O trecho anterior do curso é de fundamental importância para o próximo capítulo do presente trabalho, uma vez que Didier defende uma maior relativização da impenhorabilidade frente ao caso concreto, utilizando, principalmente, o princípio da razoabilidade. 
2.1. O CONCEITO DE FAMÍLIA E SUA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL
Inicialmente, antes de se adentrar no mérito do bem de família, é necessário traçar um paralelo entre o conceito de família e a flexibilização frente às suas necessidades sociais.A Constituição Federal de 1988 possui um capítulo exclusivo parar tratar da família, da criança, do adolescente e do idoso, qual seja o “Capítulo VII, do Título VIII - Da Ordem Social”. O art. 226 da Carta Magna traz em seu texto: 
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. 
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. 
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Extrai-se do referido artigo, ao analisar-se a literalidade do exposto, uma visão ainda engessada do conceito de família e de como esta se origina. É que, a despeito do texto constitucional, a doutrina e a jurisprudência têm ampliado esse conceito, através da chamada mutação constitucional, da qual mesmo sem alteração no corpo do texto, traz modificação ou ampliação do significado constante na lei. Acerca de uma nova definição conceitual da família, Maria Berenice Dias (2015, p. 133) traz:
É necessário ter uma visão pluralista da família, que abrigue os mais diversos arranjos familiares, devendo-se buscar o elemento que permite enlaçar no conceito de entidade familiar todos os relacionamentos que têm origem em u m elo de afetividade, independentemente de sua conformação. Esse referencial só pode ser identificado no vínculo que une seus integrantes. [...]
O novo modelo da família funda-se sobre os pilares da repersonalização, da afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, impingindo nova roupagem axiológica ao direito das famílias. Agora, a tônica reside no indivíduo, e não mais nos bens ou coisas que guarnecem a relação familiar. A família-instituição foi substituída pela família-instrumento, ou seja, ela existe e contribui tanto para o desenvolvimento da personalidade de seus integrantes como para o crescimento e formação da própria sociedade, justificando, com isso, a sua proteção pelo Estado. 
Em sua referida obra, Maria Berenice Dias elenca as seguintes formas de entidades familiares, que serão apenas citadas, pois não norteiam o objetivo principal do presente trabalho: 
a) Matrimonial;
b) Informal;
c) Homoafetiva;
d) Paralelas ou simultâneas;
e) Poliafetiva;
f) Monoparental;
g) Parental ou anaparental;
h) Composta, pluriparental ou mosaico;
i) Natural, extensa ou ampliada;
j) Substituta;
k) Eudemonista.
Entretanto, cabe destacar a entidade familiar homoafetiva, pois esta desponta como a principal ampliação do conceito familiar e exemplifica o tocante dos direitos humanos na questão. Acerca deste tema há o Informativo nº 625[footnoteRef:3] do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar. Além disso, é interessante observar o elucidativo voto do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luís Felipe Salomão, em Recurso Especial de 2011: [3: Trecho do informativo: A norma constante do art. 1.723 do Código Civil — CC (“É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”) não obsta que a união de pessoas do mesmo sexo possa ser reconhecida como entidade familiar apta a merecer proteção estatal. Essa a conclusão do Plenário ao julgar procedente pedido formulado em duas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, respectivamente, pelo Procurador-Geral da República e pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro. Preliminarmente, conheceu-se de arguição de preceito fundamental — ADPF, proposta pelo segundo requerente, como ação direta, tendo em vista a convergência de objetos entre ambas as ações, de forma que as postulações deduzidas naquela estariam inseridas nesta, a qual possui regime jurídico mais amplo. Ademais, na ADPF existiria pleito subsidiário nesse sentido. Em seguida, declarou-se o prejuízo de pretensão originariamente formulada na ADPF consistente no uso da técnica da interpretação conforme a Constituição relativamente aos artigos 19, II e V, e 33 do Estatuto dos Servidores Públicos Civis da aludida unidade federativa (Decreto-lei 220/75). Consignou-se que, desde 2007, a legislação fluminense (Lei 5.034/2007, art. 1º) conferira aos companheiros homoafetivos o reconhecimento jurídico de sua união. Rejeitaram-se, ainda, as preliminares suscitadas.
STF: ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)] 
"Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988 uma nova fase do direito de família e, consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado ‘família’, recebendo todos eles a 'especial proteção do Estado: Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento - diferentemente do que ocorria com os diplomas superados - deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade". (STJ, REsp 1.183.378/RS, 4.a Turma, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, j. 25.10.2011, Dfe 01.02.2012).
Nota-se que a proteção familiar torna-se um caminho para a proteção da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido de ampliação de entidades familiares, fica claro, também, que a proteção aos bens de família se estende aos novos conceitos de família. Um exemplo disso é o reconhecimento, por parte do STJ, de que o imóvel em que residem duas irmãs é bem de família, pois elas se enquadram em uma entidade familiar: "Execução. Bem de família. Ao imóvel que serve de morada as embargantes, irmãs e solteiras, estende-se a impenhorabilidade de que trata a Lei 8.009/1990" (STJ, REsp 57.606/MG, 4.a Turma, Rel. Min. Fontes de Alencar, j. 11.04.1995, D/ 15.05.1995, p. 13.410).
Portanto, fica evidente a flexibilização do art. 226 da Constituição Federal, pois as entidades familiares mencionadas anteriormente não fazem parte do rol taxativo do referido dispositivo. E, por consequência disso, a proteção ao bem de família estende-se a essas e outras entidades familiares.
2.2. A ORIGEM DO BEM DE FAMÍLIA E O INSTITUTO DO HOMESTEAD	
De acordo com Álvaro Villaça Azevedo (1974, p. 19), conforme citado por Tartuce (2017, p. 213), originariamente e na perspectiva histórica “pode-se dizer, seguramente, que o bem de família nasceu com tratamento jurídico específico, na República do Texas, sendo certo que, no Direito Americano, desponta ele como uma pequena propriedade agrícola, residencial, da família, consagrada à proteção desta”.
Ainda na perspectiva histórica do direito norte-americano, Araken de Assis (2016, p. 202) completa:
Lei do Texas, de 26.01.1839, autorizou a separar do domínio público a área de 50 acres, ou terreno na cidade, de valor limitado,e a mobília, utensílios, ferramentas e equipamentos, conforme o caso. O objetivo da lei era acolher numerosos colonos que, massivamente, passavam a ocupar o território, dobrando a população num reduzido espaço de tempo. O instituto incorporou-se à legislação da União por Lei de 20.05.1862.
Também neste caso se visou à colonização de terras inóspitas, à fixação dos imigrantes nas vastas áreas inexploradas ao Oeste, beneficiando razoavelmente os veteranos de guerra. O ponto comum desses diplomas era a imunização (provisória e limitada no tempo, no caso federal), ou exemption, do homestead contra execuções.
Nota-se que o instituto do homestead pode ser compreendido como um incentivo dado pelo governo norte-americano aos colonos, para que estes fixassem moradia e começassem a produzir. Este incentivo consistia na proteção da propriedade, principalmente no tocante à imunização contra execuções durante determinado período. 
Acerca das primeiras leis que visavam à proteção do bem de família no direito brasileiro, destaca-se o Código Civil de 1916. O Capítulo V da Lei 3.071 (CC/1916) assim dispõe: 
Art. 70. É permitido aos chefes de família destinar um prédio para domicílio desta, com a cláusula de ficar isento de execução por dívidas, salvo as que provierem de impostos relativos ao mesmo prédio. 
Parágrafo único. Essa isenção durará enquanto viverem os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade. 
Art. 71. Para o exercício desse direito é necessário que os instituidores no ato da instituição não tenham dívidas, cujo pagamento possa por ele ser prejudicado. 
Parágrafo único. A isenção se refere a dívidas posteriores ao ato, e não às anteriores, se se verificar que a solução destas se tornou inexeqüível em virtude do ato da instituição. 
Art. 72. O prédio, nas condições acima ditas, não poderá ter outro destino, ou ser alienado, sem o consentimento dos interessados e dos seus representantes legais. 
Art. 73. A instituição deverá constar de instrumento público inscrito no registro de imóveis e publicado na imprensa local e, na falta desta, na da Capital do Estado.
O referido Capítulo do Código Civil de 1916, anteriormente citado, foi o precursor do bem de família convencional, presente no Código Civil de 2002, entre os artigos 1.711 e 1.722.
Entre o Código Civil de 1916 e o Código Civil de 2002, sobreveio a Lei 8.009, de 1990, que torna impenhorável o bem de família imóvel, qual seja a residência familiar. Sobre o assunto, Araken de Assis (2016, p. 205) procura esclarecer que, apesar de determinadas diferenças, a Lei 8.009/90 e o bem de família presente no Código Civil de 2002, coexistem: 
A disciplina dessa lei extravagante não contraria à do bem de família, objeto de ressalva explícita no art. 1.711, caput, do CC ("...mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial"). Aqui interessa, fundamentalmente, essa última disciplina, porque subsiste a rejeição ao instituto do homestead tal como configurado na lei civil.
A compatibilidade da Lei 8.009/1990 com a instituição do bem de família, a teor do art. 1.711, caput, do CC, suscita o problema terminológico. A toda evidência, o instituto do homestead desfruta de duas disciplinas paralelas. Para mais de um autor, o paralelismo implica duas espécies de bem de família: (a) convencional; (b) legal. Por sua vez, em estudo precursor acerca do tema, distinguia-se entre o bem de família "legal" - "sendo a residência efetiva no imóvel sua única e suficiente manifestação visível" - e o "formal" - "além da residência, exige a declaração, avaliação e registro do imóvel". 
 	
Araken de Asiss (2016, p. 205) ainda defende o emprego de expressões diversas para os dois regimes de homestead presentes no direito brasileiro. Para ele, o bem de família oriundo da Lei 8.009/90 deveria adotar a expressão “residência familiar”, ficando a expressão “bem de família” apenas para o instituto presente no Código Civil de 2002, entre os artigos 1.711 e 1.722. A justificativa, para o autor, consiste nas diferenças entre os institutos, principalmente porque “o bem de família mostra-se indisponível para o instituidor, porque inalienável, e, além disso, tem valor limitado; ao invés, a residência familiar (Lei.8009/90) é disponível, porque tão só impenhorável para os credores”. 
Sobre as diferenças citadas, Marcelo Abelha (2015, p. 129) também dispõe:
	É que o imóvel tutelado no art. 1.711 do CC é inalienável, e, por isso mesmo, impenhorável por razão lógica. Outrossim, o bem de família previsto no dispositivo do CC recebe esse regime jurídico por ato de terceiro ou dos cônjuges que assim o registram no cartório de registro imobiliário, atendidas as formalidades descritas no referido artigo do Código. Já o bem de residência instituído pela Lei 8.009/1990 é impenhorável por força da referida lei e independente de qualquer outro ato legal para que adquira tal condição, mas a dita impenhorabilidade sofre inúmeras restrições (admite a penhora) em diversas hipóteses previstas na própria Lei 8.009/1990.
Dito isto, faz-se necessário traçar, minuciosamente, as diferenças entre o bem de família presente no Código Civil, entre os artigos. 1.711 e 1.722, denominado bem de família voluntário ou convencional e o bem de família previsto na Lei 8.009/90, também chamado de residência familiar, denominado bem de família legal, conforme a doutrina. Estes temas serão retratados nos itens 3.3 e 3.4, respectivamente, com maior destaque para a Lei 8.009/90. 
2.3. BEM DE FAMÍLIA VOLUNTÁRIO OU CONVENCIONAL (CC/02)
Inicialmente, é necessário advertir sobre a pouca aplicabilidade prática do bem de família convencional. Isso decorre dos processos burocráticos necessários à obtenção da proteção dos bens, sendo que, em contrapartida, a proteção auferida ao bem de família (residência familiar), presente na Lei 8.009/90, ocorre de forma automática. Flávio Tartuce (2016, p. 614) assim salienta:
Em verdade, a modalidade em estudo é de pouca relevância prática, até porque a Lei 8.009/1990 consagra a impenhorabilidade automática do imóvel destinado para residência da família ou da pessoa. Assim sendo, desnecessária se torna a instituição por escritura pública ou testamento, o que gera gastos, inclusive de registro do bem de família. Ademais, como se verá, o bem de família voluntário tem o inconveniente de ser inalienável, além de ser impenhorável. Diante de sua pouca relevância, o Projeto de Lei conhecido como Estatuto das Famílias[footnoteRef:4] do IBDFAM pretende suprimir a categoria e o duplo tratamento, o que conta com o apoio deste autor. [4: Projeto de Lei (PLS 470/2013) que institui o Estatuto das Famílias. Constam do projeto não apenas as regras de direito material, mas também processual, para proporcionar às famílias brasileiras maior agilidade nas demandas jurídicas, indispensável quando se trata de direitos relacionados tão diretamente à vida das pessoas. O projeto contempla a proteção de todas as estruturas familiares presentes na sociedade moderna. A proteção legal conferida ao bem de família pela Lei nº 8.009/1990, assegurando a impenhorabilidade do imóvel residencial, contempla o direito de moradia, que é constitucionalmente assegurado. Deste modo, incorpora-se seu texto ao Estatuto das Famílias, assegurando proteção às variadas formas de família e trazendo as especificidades que vêm sendo definidas pela jurisprudência. O Projeto ainda continua em tramitação no Senado Federal. ] 
 
A respeito da pouca aplicabilidade prática, Maria Berenice Dias (2015, p. 365) complementa:
O bem de família pode ser instituído por meio de escritura pública ou testamento. Mas há limites: o valor do bem não pode ultrapassar um terço do patrimônio líquido do instituidor, existente ao tempo da instituição. Dita limitação acaba permitindo que somente famílias abastadas possam adotá-lo, pois o acervo patrimonial elo instituidor eleve ser ele significativa expressão, de modo que uma terça parte seja liberada para tornar-se impenhorável. Daí o pouco uso elo instituto.O artigo 1.711 do Código Civil dispõe que o bem de família convencional ou voluntário pode ser instituído pelos cônjuges, pela entidade familiar ou por terceiro, mediante escritura pública ou testamento, não podendo ultrapassar essa reserva um terço do patrimônio líquido das pessoas que fazem a instituição. 
Para gozar da proteção prevista em lei, conforme artigo 1.712 do Código Civil, é necessário que o bem seja imóvel residencial, rural ou urbano, ainda incluindo a proteção a todos os bens acessórios que o compõem, podendo abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.
Seguindo adiante, tem-se o artigo 1.713 do Código Civil, pelo qual os valores mobiliários, desde que destinados aos fins previstos no artigo anterior, não poderão exceder o valor do prédio instituído em bem de família, à época de sua instituição, pois estes valores imobiliários possuem natureza acessória.
Já o artigo 1.714 do Código Civil dispõe que a instituição do bem de família convencional deve ser efetuada por escrito e registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Este registo deve ser feito no mesmo local em que está situado o imóvel. 
O artigo 1.715 possui alguns aspectos interessantes e necessita de uma análise mais profunda. A redação traz do artigo:
Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio.
Parágrafo único. No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz.
Nota-se que, no corpo da lei, as exceções à isenção de execução correspondem a dívidas anteriores à sua instituição, dívidas relativas ao prédio posteriores à sua instituição, como o IPTU e despesas do condomínio, também posteriores à sua instituição. Sobre o referido artigo, Flávio Tartuce (2016, p. 615) elucida:
Como se percebe, são apenas três as exceções à impenhorabilidade do bem de família convencional. Essas previsões não se confundem com as sete exceções previstas para a impenhorabilidade do bem de família legal, o que merece a devida atenção pelo intérprete.
Talvez no tratamento das exceções estivesse a única vantagem de constituição do bem de família em apreço. De toda sorte, a referida instituição teria o intuito de fraudar o sistema jurídico, estando carregado de ilicitude, por lesão à boa-fé e aos bons costumes (art. 187 do CC).
Também pode ser arguida eventual ilicitude por fraude à lei imperativa (art. 166, inc. VI, do CC), o que depende da análise do caso concreto. Cite-se, a título de exemplo, o devedor de alimentos que constitui bem de família voluntário, antes do inadimplemento da dívida, visando de forma premeditada à proteção de imóvel determinado, o que não pode prevalecer. Como se nota, a previsão da exceção dos alimentos consta apenas da Lei 8.009/1990, e não do Código Civil de 2002, o que abre margem para manobras jurídicas indesejadas. A penhora deve ser admitida, pois a proteção teve como objetivo fraudar a norma de ordem pública que consagra o dever alimentar, no caso o art. 1.694 do CC.
Fica evidente a separação entre as exceções à impenhorabilidade do bem de família convencional e do bem de família legal (residência familiar), presentes na Lei 8.009/90. Mais evidente ainda, o engessamento às possíveis fraudes que a constituição do bem de família convencional poderia causar em situações específicas, como no caso do devedor de alimentos. 
Avançando nos principais tópicos do bem de família convencional, presente no Código Civil de 2002, tem-se o artigo 1.117. O texto do referido artigo assim expõe:
Art. 1.717. O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem da família, não podem ter destino diverso do previsto no art. 1.712 ou serem alienados sem o consentimento dos interessados e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público.
Este é, talvez, o artigo que mais contribui para a pouca aplicabilidade do bem de família convencional no plano prático, ao lado dos trâmites burocráticos. Como fica claro pelo dispositivo, a possibilidade de alienação depende de autorização judicial, sendo relevantes os motivos para tanto. A alienação do bem de família voluntário ou convencional, não havendo preenchimento dos requisitos legais, é nula, por fraude à lei imperativa (art. 166, inc. VI, do CC).
Eventualmente, comprovada a impossibilidade de manutenção do bem de família convencional, poderá o juiz, a requerimento dos interessados, extingui-lo ou autorizar a sub-rogação real de bens que o constituam em outros, ouvido o instituidor e o Ministério Público. Trata-se de uma hipótese de dissolução judicial do bem protegido, conforme art. 1.719 do Código Civil. 
Sobre a administração do bem de família, matéria tratada no artigo 1.720 do Código Civil, é muito interessante a colocação do autor Flávio Tartuce (2016, p. 616):
No que concerne à sua administração, salvo previsão em contrário, cabe a ambos os cônjuges, sendo possível a intervenção judicial, em caso de divergência (art. 1.720 do CC). Esse comando legal, que constitui novidade, está em total sintonia com a igualdade consagrada no art. 226 da CF/1988 e no art. 1.511[footnoteRef:5] do CC. Traz também uma tendência de judicialização dos conflitos conjugais, pois o juiz irá decidir sobre a questão que interessa aos membros da entidade familiar. É importante a constatação de que essa tendência não é a atual, de fuga do Judiciário, o que pode ser captado pela leitura do Novo Código de Processo Civil, pela valorização da desjudicialização em vários de seus comandos. [5: Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.] 
É interessante notar algo no tocante à extinção do bem de família convencional. Para tanto, é necessária a transcrição de alguns artigos do Código Civil de 2002 para melhor elucidação:
Art. 1.716. A isenção de que trata o artigo antecedente durará enquanto viver um dos cônjuges, ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade.
[...]
Art. 1.720. Salvo disposição em contrário do ato de instituição, a administração do bem de família compete a ambos os cônjuges, resolvendo o juiz em caso de divergência.
Parágrafo único. Com o falecimento de ambos os cônjuges, a administração passará ao filho mais velho, se for maior, e, do contrário, a seu tutor.
Art. 1.721. A dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de família.
Parágrafo único. Dissolvida a sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges, o sobrevivente poderá pedir a extinção do bem de família, se for o único bem do casal.
Art. 1.722. Extingue-se, igualmente, o bem de família com a morte de ambos os cônjuges e a maioridade dos filhos, desde que não sujeitos a curatela.
É notória a intenção do legislador em proteger o bem de família, pois, em todos os casos, se os administradores originários não puderem mais administrar o bem de família, este deverá ser administrado por sucessores. A extinção não se daria de forma automática, sendo necessários alguns procedimentos para que ela possa ocorrer. Entretanto, é extremamente importante salientar que a extinção do bem de família convencional não afasta a impenhorabilidade ao bem de família legal (residência familiar), prevista na Lei 8.009/90. É o que afirma Flávio Tartuce (2016, p. 617):
A instituição dura até que ambos os cônjuges faleçam, sendo que, se restarem filhos menores de 18 anos, mesmo falecendo os pais, a instituição perdura até que todos os filhos atinjam a maioridade (art. 1.716 do CC). Mais uma vez se percebe a intenção do legislador de proteger a célula familiar. Todavia, a extinção do bem de família convencional não afasta a impenhorabilidade prevista na Lei 8.009/1990.
Por todo o exposto, analisando-se os artigos que guarnecem o bem de família convencional, ficaevidente que este instituto não é vantajoso para a entidade familiar, pois, além de necessitar de variados processos burocráticos e onerosos, ainda acarreta um determinado engessamento do imóvel residencial e dos valores mobiliários tidos como bem de família, como, por exemplo, as dificuldades impostas para alienação de tais bens. 
2.4. BEM DE FAMÍLIA LEGAL (RESIDÊNCIA FAMILIAR): ASPECTOS GERAIS
O bem de família legal (residência familiar) pode ser conceituado como o imóvel utilizado como residência da entidade familiar, decorrente de casamento, união estável, entidade monoparental ou entidade de outra origem, protegido por previsão legal específica. Há ainda a incidência da Súmula 364[footnoteRef:6] do STJ, que traz que o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas. Sobre a incidência da Súmula 364 do STJ, é necessário fazer algumas ponderações jurisprudenciais e doutrinárias. Cita-se como exemplo o seguinte julgado do Tribunal da Cidadania: [6: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. STJ - Súmula 364. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 31 out. 2008. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=237.21501&seo=1>. Acesso em: 01 nov. 2018.] 
Processual. Execução. Impenhorabilidade. Imóvel. Residência. Devedor solteiro e solitário - Lei 8.009/1990. A interpretação teleológica do art. 1º, da Lei 8.009/1990, revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana: o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos: a solidão. É impenhorável, por efeito do preceito contido no art. 1º da Lei 8.009/1990, o imóvel em que reside, sozinho, o devedor celibatário' (STJ, EREsp 182.223/SP, j. 06.02.2002, Corte Especial, Rei. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Rel. acórdão Min. Humberto Gomes de Barros. DJ 07.04.2003, p. 209, REV/UR, vol. 306, p. 83; Veja: STJ, REsp 276.004/SP (RSTJ 153/273, JBCC 191/215), REsp 57.606/MG (RSTJ 81/306), REsp 159.851/SP - LEXJTACSP 174/615 -, REsp 218.377/ES - LEXSTJ 136/111, RDR 18/355, RSTJ 143/385).
Extrai-se deste julgado, um dos tantos pacificados que originaram a edição da Súmula 364, que a real intenção da Lei 8.009/90 é, por assim dizer, a proteção também da pessoa e não somente da família, que seria um grupo específico de pessoas. Este entendimento vai de encontro à proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/1988) e ao direito constitucional à moradia, direito social e fundamental (art. 6º da CF/1988). 
Ainda sobre este tema, Flávio Tartuce (2016, p. 8) complementa:
Por certo é que, pelo que consta no art. 226 da CF/1988, uma pessoa solteira não constituiria uma família, nos exatos termos do sentido legal. Um solteiro, como se sabe, não constitui uma entidade familiar decorrente de casamento, união estável ou família monoparental. Estaria, então, o julgador alterando o conceito de bem de família? A resposta parece ser positiva, estando ampliado o seu conceito para bem de residência da pessoa natural ou bem do patrimônio mínimo, utilizando-se a construção do Ministro Luiz Edson Fachin. Reside, nesse ponto, forte tendência de personalização do Direito Privado (FACHIN, Luiz Edson. Estatuto..., 2001). 
Como já exposto no segundo capítulo do presente trabalho e novamente exposto neste tópico, a teoria do patrimônio mínimo, do Ministro Luiz Edson Fachin é, provavelmente, o instituto mais importante no que diz respeito à impenhorabilidade do bem de família, sendo, inclusive, citado em decisões de tribunais superiores. Neste sentido, reforçando a brilhante tese apresentada pelo Ministro, será transcrita ementa do STJ em que sua obra é expressamente citada para justificar a extensão da proteção da Lei 8.009/90 a imóveis de propriedade de pessoas jurídicas: 
"Processual civil. Embargos de terceiro. Execução fiscal movida em face de bem servil à residência da família. Pretensão da entidade familiar de exclusão do bem da execução fiscal. Possibilidade jurídica e legitimidade para o oferecimento de embargos de terceiro. É bem de família o imóvel pertencente à sociedade, dês que o único servil à residência da mesma. Ratio essendi da Lei 8.009/90. 1. A Lei deve ser aplicada tendo em vista os fins sociais a que ela se destina. Sob esse enfoque a impenhorabilidade do bem de família visa a preservar o devedor do constrangimento do despejo que o relegue ao desabrigo. 2. Empresas que revelam diminutos empreendimentos familiares, onde seus integrantes são os próprios partícipes da atividade negociai, mitigam o princípio societas distat singulis, peculiaridade a ser aferida cum granu salis pelas instâncias locais. 3. Aferida à saciedade que a família reside no imóvel sede de pequena empresa familiar, impõe-se exegese humanizada, à luz do fundamento da república voltado à proteção da dignidade da pessoa humana, por ~sso que, expropriar em execução por quantia certa esse imóvel, significa o mesmo que alienar bem de família, posto que, muitas vezes, lex dixit minus quam voluit. 4. In casu, a família foi residir no único imóvel pertencente à família e à empresa, a qual, aliás, com a mesma se confunde, quer pela sua estrutura quer pela conotação familiar que assumem determinadas pessoas jurídicas com patrimônio mínimo. 5. É assente em vertical sede doutrinária que 'A impenhorabilidade da Lei nº 8.009/90, ainda que tenha como destinatários as pessoas físicas, merece ser aplicada a certas pessoas jurídicas, às firmas individuais, às pequenas empresas com conotação familiar, por exemplo, por haver identidade de patrimônios' (FACHIN, Luiz Edson. 'Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo: Rio de Janeiro, Renovar, 2001, p. 154). 6. Em consequência '(...) Pequenos empreendimentos nitidamente familiares, onde os sócios são integrantes da família e, muitas vezes, o local de funcionamento confunde-se com a própria moradia, devem beneficiar-se da impenhorabilidade legal: [grifo nosso] 7. Aplicação principiológica do direito infraconstitucional à luz dos valores eleitos como superiores pela Constituição Federal que autoriza excluir da execução da sociedade bem a ela pertencente, mas que é servil à residência como único da família, sendo a empresa multifamiliar. 8. Nessas hipóteses, pela causa petendi eleita, os familiares são terceiros aptos a manusear os embargos de terceiro pelo título que pretendem desvincular, o bem da execução movida pela pessoa jurídica. 9. Recurso Especial provido' (STJ, REsp 621399/RS, 1ª Turma, Rei. Min. Luiz Fux, j. 19.04.2005, DJU 20.02.2006, p. 207).
Por fim, cabe mencionar a ótima colocação de Maria Berenice Dias (2015, p. 368), a qual cita Álvaro Villaça Azevedo (2010, p. 167): 
O Estado chama para si o dever de proteção que antes era deixado ao arbítrio do chefe de família, a quem incumbia à constituição voluntária do bem de família. Conforme lembra Álvaro Villaça Azevedo, não fica a família à mercê de proteção por seus integrantes, mas é defendida pelo próprio Estado. Em face da referência à entidade familiar, é necessário estender o instituto a todas as estruturas familiares. Não há como enfocar o instituto somente como proteção a este ou aquele modelo de entidade familiar, nem mesmo como proteção à família do devedor, por não ter sido ela quem diretamente contraiu a dívida.
Portanto, fica evidente a preocupação da jurisprudência e da doutrina em estender o número de pessoas beneficiadas pela proteção dada ao imóvel residencial. Entretanto, e como será visto no próximo capítulo, a despeito do aumento do número de pessoas que se valem dessa proteção, há correntes na doutrina e na jurisprudência que defendem reinterpretações acerca de quais imóveis residenciais disporiam de proteção integral ou não. Mais especificamente, estas correntes defendem análises sobre o único imóvel residencial de alto valor.
2.5. A LEI 8.009/90: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
A Lei 8.009/90 representa significativoavanço no que tange à proteção da residência familiar. Ela consagra dispositivos constitucionais que visam garantir o mínimo existencial necessário para uma vida digna. Maria Berenice Dias (2015, p. 367) muito bem aduz: 
O Código Civil prevê somente o bem de família instituído voluntariamente, remetendo à lei especial a impenhorabilidade elo imóvel residencial (CC 1.711). É a Lei 8.009/90 que cumpre esta função: dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Trata-se de lei cogente e de ordem pública, de nítido caráter protecionista e publicista. Garante o mínimo necessário à sobrevivência da família, à luz do direito fundamental à moradia, amplamente prestigiado e consagrado pelo texto constitucional (CF 6º, 7º, IV e 23, IX). No entanto, se o devedor oferece à penhora o bem que reside, depois não pode buscar o reconhecimento de se tratar bem ele família. Configura-se afronta à boa fé objetiva. 
O art. 1º da Lei 8.009/90 assim dispõe:
Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
Essa é a norma precursora do entendimento da Lei 8.009/90, pois trata, de forma clara, que o imóvel residencial próprio da entidade familiar (e suas variantes, como já anteriormente visto) é impenhorável, ressalvadas as hipóteses previstas na referida lei e que serão discutidas mais adiante. 
A Súmula 205 do STJ possui relevante importância, pois afirma que a Lei 8.009/90 aplica-se à penhora realizada antes de sua vigência, ou seja, tem eficácia retroativa. Flávio Tartuce (2016, p. 617) complementa afirmando que a Súmula 205 representa o que “denominamos retroatividade motivada ou justificada, em prol das normas de ordem pública, justificadas na justiça social e na dignidade humana. Sendo norma de ordem pública, cabe o reconhecimento de ofício dessa impossibilidade de penhora.”
Nesse sentido, a impenhorabilidade pode ser alegada a qualquer tempo ou grau de jurisdição, através de petição simples, não havendo preclusão processual. Flávio Tartuce (2016, p. 618) complementa:
Como se percebe, a jurisprudência nacional vem entendendo que o bem de família legal acaba por quebrar alguns paradigmas processuais, premissa que deve ser mantida com a emergência do Novo CPC, especialmente pela regra contida no seu art. 8º[footnoteRef:7], que determina ao julgador levar em conta a dignidade da pessoa humana ao aplicar o ordenamento jurídico. Ora, reafirme-se que uma das aplicações desse princípio constitucional nas relações privadas diz respeito à proteção do bem de família. [7: Art. 8º. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. (CPC/2015). ] 
O artigo 5º, caput, da Lei 8.009 traz que para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Aqui cabe lembrar o já exposto anteriormente sobre as novas configurações de entidade familiar, inclusive pessoas solteiras. Essa é a regra geral, entretanto, a jurisprudência entende que no caso de locação do bem, devendo, obrigatoriamente, a renda auferida ser utilizada para manter outro imóvel para a entidade familiar, a proteção de que trata a Lei 8.009/90 é mantida. Para melhor esclarecer o tema, transcreve-se jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"Processual civil. Execução. Penhora de imóvel. Bem de família. Locação a terceiros. Renda que serve a aluguel de outro imóvel que serve de residência ao núcleo familiar. Constrição. Impossibilidade. Lei 8.009/1990, art. 1º. Exegese. Súmula 7-STJ. I. A orientação predominante no STJ é no sentido de que a impenhorabilidade prevista na Lei 8.009/1990 se estende ao único imóvel do devedor, ainda que este se ache locado a terceiros, por gerar frutos que possibilitam à família constituir moradia em outro bem alugado. Il. Caso, ademais, em que as demais considerações sobre a situação fática do imóvel encontram obstáculo ao seu reexame na Súmula 7 do STJ. 111. Agravo improvido" (STJ, AGA 385692/RS, 4. • Turma, Rei. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 09.04.2002, D/ 19.08.2002, p. 177. Veja: STJ, REsp 114.119/RS, 302.781/SP, 159.213/ES (RDR 15/385) e 183.042/AL).
Flávio Tartuce (2016, p. 619) complementa sobre o tema:
Filia-se plenamente ao julgado transcrito, pois, na verdade, ele nada mais faz do que proteger a moradia de forma indireta, conforme ordena o art. 6º da CF/1988. A situação pode ser denominada como do bem de família indireto. A questão consolidou-se de tal forma que, em 2012, foi editada a Súmula 486 do STJ, in verbis: "É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família'. Ato contínuo, entendeu-se, ainda, que a premissa igualmente vale para o caso de único imóvel do devedor que esteja em usufruto, para destino de moradia de sua mãe, pessoa idosa (STJ, REsp 950.663/SC, 4ª Turma, Rei. Min. Luis Felipe Salomão, j. 10.04.2012). Na última decisum, além da proteção da moradia, julgou-se corretamente com base no sistema de tutela constante do Estatuto do Idoso.
Nota-se a atuação do judiciário a fim de resguardar, o máximo possível, o estatuto do patrimônio mínimo, uma vez que a Súmula 486 do STJ traz que o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros é impenhorável, desde que a renda obtida com a locação seja revertida não só para o aluguel da moradia da sua família, como também para a subsistência da mesma. Ou seja, com essa súmula visa-se garantir o mínimo existencial para uma vida digna em termos monetários também. 
Ainda no tocante à ampliação da tutela de moradia, a jurisprudência considera que o único imóvel residencial do devedor em que resida seu familiar, também constitui bem de família, portanto impenhorável, mesmo que o proprietário nele não resida. Essa é uma premissa que pode ser extraída da proteção constitucional da família, presente no artigo 226, caput, da Constituição Federal. É o exposto em excelente julgado do STJ, presente no informativo nº 543, de 2014: 
DIREITO CIVIL. CARACTERIZAÇÃO COMO BEM DE FAMÍLIA DO ÚNICO IMÓVEL RESIDENCIAL DO DEVEDOR CEDIDO A FAMILIARES. Constitui bem de família, insuscetível de penhora, o único imóvel residencial do devedor em que resida seu familiar, ainda que o proprietário nele não habite. De fato, deve ser dada a maior amplitude possível à proteção consignada na lei que dispõe sobre o bem de família (Lei 8.009/1990), que decorre do direito constitucional à moradia estabelecido no caput do art. 6º da CF, para concluir que a ocupação do imóvel por qualquer integrante da entidade familiar não descaracteriza a natureza jurídica do bem de família. Antes, porém, isso reafirma esta condição. Impõe-se lembrar, a propósito, o preceito contido no art. 226, caput, da CF – segundo o qual a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado –, de modo a indicar que aos dispositivos infraconstitucionais pertinentes se confira interpretação que se harmonize com o comando constitucional, a fim de assegurar efetividade à proteção a todas as entidades familiares em igualdade de condições. Dessa forma, tem-se que a Lei 8.009/1990 protege, em verdade, o único imóvel residencial de penhora. Se esse imóvel encontra-se cedido a familiares, filhos, enteados ou netos, que nele residem, aindacontinua sendo bem de família. A circunstância de o devedor não residir no imóvel não constitui óbice ao reconhecimento do favor legal. Observe que o art. 5º da Lei 8.009/1990 considera não só a utilização pelo casal, geralmente proprietário do imóvel residencial, mas pela entidade familiar. Basta uma pessoa da família do devedor residir para obstar a constrição judicial. Ressalte-se que o STJ reconhece como impenhorável o imóvel residencial cuja propriedade seja de pessoas sozinhas, nos termos da Súmula 364, que dispõe: "O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas". Além do mais, é oportuno registrar que essa orientação coaduna-se com a adotada pela Segunda Seção do STJ há longa data, que reconhece como bem de família, inclusive, o único imóvel residencial do devedor oferecido à locação, de modo a garantir a subsistência da entidade familiar. (REsp 1.216.187-SC, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 14/5/2014.) 
O artigo 2º, caput, da Lei 8.009/90 possui texto elucidando que os veículos de transporte, as obras de arte e os adornos suntuosos estão excluídos da impenhorabilidade. Já o parágrafo único do referido artigo traz que no caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo. Portanto, cabe ao caso concreto e à jurisprudência determinar o que é bem suntuoso e se estes são passíveis de penhora ou não. 
Por fim, o STJ ainda editou a Súmula 449, de 2010, que possui a seguinte redação: “A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora”. Flávio Tartuce (2016, p. 620) critica a referida súmula:
A ementa merece críticas, pois, diante do princípio da gravitação jurídica (o acessório segue o principal), se a impenhorabilidade atinge o imóvel, do mesmo modo deve atingir a vaga de garagem. Em reforço, lembre-se que a falta de vaga de garagem pode tirar a funcionalidade do imóvel, caso de um apartamento localizado em uma grande cidade.
Os artigos 3º e 4º da Lei 8.009/90 serão tratados em tópicos separados a seguir, pois representam maior importância prática para as exceções à impenhorabilidade. 
2.5.1. As exceções à impenhorabilidade na Lei 8.009/90
O artigo 3º da Lei 8.009/90, de redação “a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido”, trata das exceções à impenhorabilidade do bem de família legal, ou, como prefere Araken de Assis, da residência familiar. Tratemos, separadamente, os incisos deste artigo:
a) O inciso I foi revogado pelo artigo 46 da Lei Complementar nº 150, de 2015. Ele trazia que a impenhorabilidade do bem de família não era oponível se o processo de execução fosse movido “em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias”. Aqui, deveriam ser incluídos os empregados domésticos e empregados da construção civil, no caso de aumento da área construída do imóvel, desde que houvesse vínculo de emprego. A Lei Complementar nº 150, de 2015, regulamentou os direitos trabalhistas dos trabalhadores domésticos. Na opinião de Flávio Tartuce (2016, p. 621), “a inovação veio em bora hora, pois a tutela da moradia deve, de fato, prevalecer sobre os créditos trabalhistas de qualquer natureza.”
b) De acordo com o artigo II, a impenhorabilidade do bem de família não é oponível se o processo de execução for movido pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato. Nesse sentido, tem-se, também, a redação do § 1º do artigo 833 do Código de Processo Civil, que traz que “a impenhorabilidade não oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contrariada para sua aquisição”. A exceção de justificaria pelo fato de a dívida ter origem na própria existência da coisa. 
c) O inciso III teve redação alterada pela Lei nº 13.144, de 2015. De acordo com a nova redação, a impenhorabilidade do bem de família não é oponível se o processo de execução for movido “pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida”. É importante mencionar que a pensão alimentícia pode ser decorrente de alimentos convencionais, legais (Direito de Família) ou indenizatórios (nos termos do artigo 948, II, do Código Civil).
d) O inciso IV trata que a impenhorabilidade do bem de família não é oponível se o processo de execução for movido “para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar.” Neste caso, segundo a jurisprudência, nas contribuições relativas ao imóvel estão incluídas as dívidas decorrentes do condomínio. Segue jurisprudência do Superior Tribunal Federal:
"Bem de Família: Despesas Condominiais e Penhorabilidade. A Turma negou provimento a recurso extraordinário em que se sustentava ofensa aos artigos 5º, XXVI, e 6º, ambos da CF, sob a alegação de que a penhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, IV, da Lei 8.009/1990 não compreenderia as despesas condominiais (Art. 3º: “A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: ... IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar”. Entendeu-se que, no caso, não haveria que se falar em impenhorabilidade do imóvel, uma vez que o pagamento de contribuição condominial (obrigação propter rem) é essencial à conservação da propriedade, isto é, à garantia da subsistência individual e familiar - dignidade da pessoa humana. Asseverou-se que a relação condominial tem natureza tipicamente de uma relação de comunhão de escopo, na qual os interesses dos contratantes são paralelos e existe identidade de objetivos, em contraposição à de intercâmbio, em que cada parte tem por fim seus próprios interesses, caracterizando-se pelo vínculo sinalagmático” (STF, RE 439.003/SP, Rei. Eros Grau, j. 06.02.2007, Informativo n. 455, 14 de fevereiro de 2007). 
e) O inciso V traz que a impenhorabilidade do bem de família não é oponível se o processo de execução for movido para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar. O presente inciso é alvo de diversas discussões jurisprudenciais e doutrinárias. Como este não é o tema central do presente trabalho, transcreve-se apenas uma jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, pois esta possui bastante importância constitucional: a Corte Superior, dando interpretação restritiva à exceção, concluiu que a norma não alcança os casos em que a pequena propriedade rural é dada como garantia de dívida. Sustentou-se que tal propriedade encontra proteção contra a penhora no art. 5º, inc. XXVI, da CF/1988, dispositivo que deve prevalecer na espécie, não sendo o caso de incidir a norma excepcional ora em estudo (STJ, REsp 1.115.265/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 24.04.2012, Informativo n. 496).
f) O inciso VI traz que a impenhorabilidade do bem de família não é oponível nos casos em que o imóvel foi adquirido como produto de crime ou para a execução de sentença penal condenatória de ressarcimento, indenização (inclusive por ato ilícito ou abuso de direito) ou perdimento de bens. 
g) O inciso VI diz que a impenhorabilidade do bem de família não é oponível de movido por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, exceção que foi introduzida pelo artigo 82 da Lei 8.245/1991. Esse inciso é alvo de diversas críticas por parte da doutrina e da jurisprudência. Por conta disso, o STJ editou, em 2015, a Súmula nº 549, a qual salienta

Outros materiais