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Apostila - Interpretação e produção de textos

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APOSTILA IPT 
 
Os textos a seguir serão trabalhados em sala de aula, alguns na íntegra, outros parcialmente. Os conteúdos contemplam o 
plano de ensino da Disciplina IPT programa 2012. 
 
Texto 1: Ler é construir sentidos 
A leitura é uma atividade de construção de sentidos baseada em conhecimentos que temos sobre a língua, as 
coisas do mundo, as situações de comunicação e os textos (sua organização e função). 
Ler é construir sentidos, o que significa uma atitude ativa do leitor diante do texto. 
Não se trata, portanto, apenas de “captar” a intenção do autor, nem tampouco de o leitor construir quaisquer 
sentidos para o texto, mas, sim, de levar em conta que todo texto é “incompleto” e essa “incompletude” é uma 
indicação de que a leitura pressupõe a interação autor-texto-leitor. 
Lemos de muitas formas, através de diversos meios e finalidades diferentes. Lemos sinais de aviso, de entoações 
e de silêncio, lemos notações e indicadores de projetos e de trajetos, lemos a nossa própria escrita e o que os 
outros escreveram. 
Para alguns autores, ler é saber decifrar, ou seja, ser capaz de pronunciar de forma precisa as palavras impressas 
ainda que não compreenda o sentido do texto. 
Para outros ler é compreender o sentido do texto. 
Outros ainda afirmam que "ler" é raciocinar. 
A leitura é o processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de compreensão e interpretação do texto, a 
partir de seus objetivos, de seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a 
linguagem etc. 
Não se trata de extrair informação, decodificando letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade 
que implica estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível 
proficiência. É o uso desses procedimentos que possibilita controlar o que vai sendo lido, permitindo tomar 
decisões diante de dificuldades de compreensão, avançar na busca de esclarecimentos, validar no texto 
suposições feitas. 
Os autores Heinemann e Viehweger (1991) concebem o texto como um processo definido por quatro grandes 
sistemas de conhecimento responsáveis pelo processamento textual: 
Conhecimento lingüístico: corresponde ao conhecimento do léxico e da gramática, responsável pela escolha dos 
termos e a organização do material lingüístico na superfície textual, inclusive dos elementos coesivos. 
Conhecimento enciclopédico ou de mundo: compreende as informações armazenadas na memória de cada 
indivíduo. O conhecimento do mundo compreende o conhecimento declarativo, manifestado por enunciações 
acerca dos fatos do mundo ("O Paraná divide-se em trezentos e noventa e nove municípios"; "Santos é o maior 
porto da América Latina") e o conhecimento episódico e intuitivo, adquirido através da experiência ("Não dá 
para encostar o dedo no ferro em brasa."). 
Ambas as formas de conhecimento são estruturadas em modelos cognitivos. Isso significa que os conceitos são 
organizados em blocos e formam uma rede de relações, de modo que um dado conceito sempre evoca uma 
série de entidades. É o caso de futebol, ao qual se associam: clubes, jogadores, uniforme, chuteira, bola, apito, 
arbitro... Aliás, graças a essa estruturação, o conhecimento enciclopédico transforma-se em conhecimento 
procedimental, que fornece instruções para agir em situações particulares e agir em situações específicas. 
Conhecimento interacional: relaciona-se com a dimensão interpessoal da linguagem, ou seja, com a realização 
de certas ações por meio da linguagem. Divide-se em: 
Conhecimento ilocucional: referentes aos meios diretos e indiretos utilizados para atingir um dado objetivo; 
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Conhecimento comunicacional: ligado ao anterior, relaciona-se com os meios adequados para atingir os 
objetivos desejados; 
Conhecimento metacomunicativo: refere-se aos meios empregados para prevenir e evitar distúrbios na 
comunicação (procedimentos de atenuação, paráfrases, parênteses de esclarecimento, entre outros). 
Conhecimento acerca de superestruturas ou modelos textuais globais: permite aos usuários reconhecer um 
texto como pertencente a determinado gênero ou tipo. 
 
Texto 2: CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOÇÃO DE TEXTO 
In Lições de texto: leitura e redação. J. L. Fiorin e F. P. Savioli 
 
Leia o texto abaixo, uma tira de As cobras, de Luís Fernando Veríssimo: 
 
 
 
 
 
 
 
A leitura do primeiro quadrinho, isolado do segundo, deixaria o presidente Fernando Henrique Cardoso e sua 
equipe muito gratificados, já que sua administração recebe nota máxima (dez) na avaliação de um dos 
interlocutores do diálogo aí transcrito. 
Confrontado com o segundo, no entanto, o significado do quadrinho um se altera consideravelmente e provoca 
decepção. Dez passa a ser lido como um indicador de velocidade e não como a nota máxima de uma escala 
convencional. Com a quebra de expectativa criada pelo quadrinho um, produz-se um efeito de humor, e o texto, 
no seu todo, passa a ser uma sátira à lentidão com que se tomam as decisões do governo.Essa tirinha é 
exemplar para demonstrar dois dados importantíssimos na leitura de um texto: 
a) num texto, o significado de uma parte não é autônomo, mas depende das outras com que se relaciona. Tanto 
é verdade que, no caso da tirinha acima, fomos obrigados a reinterpretar o sentido do quadrinho um, quando 
confrontamos com o dois. 
b) o significado global de um texto não é o resultado de mera soma de suas partes, mas de uma certa 
combinação geradora de sentidos. Não fosse esse dado, o pequeno texto humorístico admitiria a seguinte 
leitura: que o governo de FHC merece nota dez e que anda a dez quilômetros por hora. Qualquer leitor, 
mediano, de texto diria que interpretá-lo dessa forma significa não tê-lo entendido. 
Em síntese, num texto o sentido de cada parte é definido pela relação que mantém com as demais constituintes 
do todo; o sentido do todo não é a mera soma das partes, mas é dado pelas múltiplas relações que se 
estabelecem entre elas. 
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Ao explicar o sentido da tira aqui reproduzida, usamos diversas vezes a palavra TEXTO. Mas o que é um texto? 
Essa palavra é bastante usada na escola e mesmo fora dela. É muito freqüente ouvirmos frases como seu texto 
ficou muito bom; o texto sobre o qual versaram as questões da prova de Português era muito longo e complexo; 
os atores de novela devem decorar textos enormes todos os dias; o texto constitucional desceu a detalhes que 
deveriam estar em leis ordinárias. 
Apesar do uso corrente da palavra, o conceito de texto não é tão simples: mesmo para aquelas pessoas 
habituadas a empregar esse termo com freqüência. Comecemos por definir quais são as propriedades de um 
texto. 
1. A primeira propriedade de um texto é que ele tem (ou deve ter) coerência de sentido. Isso quer dizer que ele 
não é um amontoado de frases, ou seja, nele, as frases não estão pura e simplesmente dispostas umas após as 
outras, mas estão relacionadas entre si. É por isso que, nele, o sentido de uma frase depende do sentido das 
demais com que se relaciona. O exemplo do texto com que iniciamos esta lição mostra de maneira simples e 
clara que o sentido de qualquer passagem de um texto é dado pelo todo. Se não levarmos em conta as relações 
de uma frase com as outras que compõem o texto, corremos o risco de atribuir a ela um sentido oposto àquele 
que ela efetivamente tem. 
Uma mesma frase pode ter sentidos distintos dependendo do contexto dentro do qual está inserida. Precisemos 
um pouco melhor o conceito de contexto. Contexto é a unidade maior em que uma unidade menor está 
inserida. Assim, o texto (unidade maior) serve de contexto para a frase (unidade menor); a frase (unidade maior) 
serve de contexto para a palavra (unidade menor); etc. O contexto pode ser explícito, quando é expresso por 
palavras, ou implícitos, quandoestá embutido na situação em que o texto é produzido. 
Um texto é, então, um todo organizado de sentido. Dizer que ele é um todo organizado de sentido implica 
afirmar que o texto é um conjunto formado por partes solidárias, ou seja, que o sentido de uma depende das 
outras. 
O que é que faz que um conjunto de frases forme um texto e não um amontoado desorganizado? São vários os 
fatores. Citemos por enquanto dois. O primeiro é a coerência, istoé, a harmonia de sentido, de modo que não 
haja nada ilógico, nada contraditório, nada desconexo, que nenhuma parte não se solidarize com as demais. A 
base da coerência é a continuidade de sentido, ou seja, a ausência de discrepâncias. Em princípio, seria 
incoerente um texto que dissesse “Pedro está muito doente. O quadrado da hipotenusa é igual à soma do 
quadrado dos catetos”. Essa incoerência seria dada pelo fato de que não se percebe a relação de sentido entre 
as duas frases que compõem o texto. Um outro fator é a ligação das frases por certos elementos que recuperam 
passagens já ditas ou garantem a concatenação entre as partes. Assim, em “Não chove há vários meses. Os 
pastos não poderiam, portanto, estar verde”, o termo portanto estabelece uma relação de decorrência lógica 
entre uma e outra frase. Esse segundo fator é menos importante que o primeiro, pois, mesmo sem esses 
elementos de conexão, um conjunto de frases pode ser coerente e, por conseguinte, um todo organizado de 
sentido. Observe o texto de Carlos Drummond de Andrade: 
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O QUE SE DIZ 
Que frio! Que vento! Que calor! Que caro! Que absurdo! Que bacana! Que tristeza! Que tarde! Que 
amor! Que besteira! Que esperança! Que modos! Que noite! Que graça! Que horror! Que doçura! Que 
novidade! Que susto! Que pão! Que vexame! Que mentira! Que confusão! Que vida! Que talento! Que alívio! 
Que nada... 
Faltam elementos de ligação entre as partes no primeiro parágrafo, mas a última frase, Assim, em plena floresta 
de exclamações, vai-se tocando pra frente, produz a unidade de sentido. O texto deixa de ser um amontoado 
aleatório de exclamações, adquirindo coerência e, dessa forma, mostrando o caráter estereotipado de nossa 
linguagem cotidiana. 
 
2. O texto é produzido por um sujeito num dado tempo e num determinado espaço. Esse sujeito, por pertencer 
a um grupo social num tempo e num espaço, expõe em seus textos as idéias, os anseios, os temores, as 
expectativas de seu tempo e de seu grupo social. Todo texto tem um caráter histórico, não no sentido de que 
narra fatos históricos, mas no de que revela os ideais e as concepções de um grupo social numa determinada 
época. Cada período histórico coloca para os homens certos problemas e os textos pronunciam-se sobre eles. 
Por exemplo, em nossa época, em que os recursos naturais do planeta correm risco de esgotar-se, aparece o 
discurso ecologista que mostra a necessidade de preservar a natureza com vistas à manutenção da espécie 
humana. 
 Não há texto que não mostre o seu tempo. Cabe lembrar, no entanto, que uma sociedade não produz uma 
única forma de ver a realidade, um único modo de analisar os problemas colocados num dado momento. Como 
ela é dividida em grupos sociais, que têm interesses muitas vezes antagônicos, produz idéias divergentes entre 
si. A mesma sociedade que gera a idéia de que é preciso por abaixo a floresta amazônica para explorar suas 
riquezas, produz a idéia de que preservar a floresta é mais rentável. Cabe lembrar, no entanto, que algumas 
idéias, em certas épocas, exercem domínio sobre as outras, ganhando o estatuto de concepção quase geral da 
sociedade. 
 É necessário entender as concepções existentes na época e na sociedade em que o texto foi produzido para não 
correr o risco de compreendê-lo de maneira distorcida. Como as idéias só podem ser expressas por meio de 
textos, analisar a relação do texto com sua época é estudar as relações de um texto com outros. Poderíamos 
dizer que um texto é, pois, um todo organizado de sentido, produzido por um sujeito num dado espaço e num 
dado tempo. Duas conclusões poderemos tirar dessa noção: 
a) uma leitura não pode basear-se em fragmentos isolados do texto, já que o significado das partes é 
determinado pelo todo em que estão encaixadas; 
b) uma leitura, de um lado, não pode levar em conta o que não está no interior do texto e, de outro, 
deve levar em consideração a relação, assinalada por marcas textuais, que um texto estabelece com outros (sua 
intertextualidade). 
 
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COMO LER TEXTOS 
 Como você lê? De maneira mecânica, passiva ou de maneira ativa, reflexiva e crítica? Você acumula apenas 
os dados e as informações ou você integra o lido ao vivido? Há pessoas que lêem muito, pilhas de livros são 
devoradas, como se isso fosse uma saída a qualquer problema psicológico, mas sua vida nada muda. Elas lêem 
como o raio laser lê o disco, mecanicamente. Quando muito, elas são verdadeiras enciclopédias ambulantes. 
Outras pessoas lêem de forma reflexiva, fazem a leitura como se estivessem comendo alguma coisa. Mascam, 
ruminam, não gostam, devolvem, brigam com o texto. Elas possuem uma postura crítica diante do que lêem. 
Depois do texto lido e digerido, ele passa a fazer parte da vida das delas. Para ler é necessário ir e voltar, do 
texto a nós mesmos, até interiorizá-lo, até que ele, finalmente, faça parte de nós. 
Os japoneses, por exemplo, que possuem uma língua escrita ideográfica, bem mais difícil do que a nossa, lêem 
sempre para não esquecer a escrita que aprenderam. Com a mesma população que tem o Brasil, o Japão edita 
70 milhões de exemplares de jornais escritos, enquanto o Brasil não chega a 5 milhões. Como disse uma 
trabalhadora dos canaviais pernambucanos: “Quem não sabe ler, tem medo das novidades”. Ler é um processo, 
cuja condição primordial. é a própria prática da leitura. 
Erros clássicos de entendimento de texto 
Após a leitura do texto, leia as perguntas propostas. Você perceberá que algumas questões incidem sobre o 
conjunto do texto: estas podem ser respondidas diretamente. Mas há outras questões que incidem sobre 
trechos, sobre passagens específicas do texto: estas, para serem respondidas, exigem uma volta ao texto. 
Quando a prova é de questões discursivas, expositivas, temos mais liberdade para encaminhar nossas repostas. 
Nesse caso, é preciso muita atenção quanto ao enunciado, para que você responda realmente o que está sendo 
pedido e não incorra nos erros clássicos de entendimento de texto, que são basicamente três: extrapolação, 
redução e contradição. Reconhecer estes erros, conhecer o processo lógico que ocorre em cada um deles, é de 
importância vital. 
Extrapolação 
O erro de extrapolação, como o próprio nome indica, acontece quando saímos do contexto, quando 
acrescentamos idéias que não estão presentes no texto. Ao extrapolar, vamos além dos limites do texto, 
viajamos além de suas margens, fazemos outras associações, evocamos outros elementos, criamos a partir do 
que foi lido, deflagramos nossa imaginação e nossa memória, abandonando o texto que era o nosso objeto de 
interpretação. 
A extrapolação é muitas vezes um exercício de criatividade inadequada - porque nos leva a perder o contexto 
que está em questão. Geralmente, o processo de extrapolação se realiza por associações evocativas, por 
relações analógicas: uma idéia lembra outra semelhante e viajamos para fora do texto. Outras vezes, a 
extrapolação acontece pela preocupação de se descobrir pressupostos das idéias do texto, pontos de partida 
bem anteriores ao pensamento expresso, ou, ainda, pela preocupação de se tirar conclusões decorrentes das 
idéias do texto, mas já pertencentes a outros contextos, a outros campos de discussão. Reconhecer os 
momentos de extrapolação - sejam analógicos ou lógicos - significa conquistar maior lucidez,maior capacidade 
de compreensão objetiva dos textos, do contexto que está em questão. Essa clareza é necessária e é criadora: 
significa, inclusive, uma liberdade maior de imaginação e de raciocínio, porque os vôos para fora dos textos 
tornam-se conscientes, por opção, serão realizados por um projeto intencional, e não mais por incapacidade de 
reconhecer os limites de um texto colocado em questão, nem por incapacidade de distinguir as próprias idéias 
das idéias apresentadas por um texto lido. 
Redução 
Outro erro clássico em exercícios de entendimento de texto, erro oposto à extrapolação, é o que chamamos de 
redução ou particularização indevida. Neste caso, ao invés de sairmos do contexto, ao invés de acrescentarmos 
outros elementos, fazemos o inverso: abordamos apenas uma parte, um detalhe, um aspecto do texto, 
dissociando-o do contexto. A redução consiste em privilegiarmos um elemento (ou uma relação) que é 
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verdadeira, mas não é suficiente diante do conjunto, ou então que se torna falso porque passa ser 
descontextualizado. Prendemo-nos assim, a um aspecto menos relevante do conjunto, perdendo de vista os 
elementos e as relações principais, ou antes, quebramos este conjunto, fracionando inadvertidamente esse 
aspecto, isolando-o do contexto. Reconhecer os processos de redução representa também um salto de 
qualidade em nossa capacidade de ler e entender textos, assim como em nossa capacidade de perceber e 
compreender conjuntos de qualquer tipo, reconhecendo seus elementos e suas relações. 
Contradição 
O último erro clássico nas interpretações de texto, o mais grave de todos, é o da contradição. Por algum motivo 
- uma leitura desatenta, a não percepção de algumas relações, a incompreensão de um raciocínio, o 
esquecimento de uma idéia, a perda de uma passagem no desenvolvimento do texto - chegamos a uma 
conclusão contrária ao texto. Como esse erro tende a ser mais facilmente reconhecido - por apresentar idéias 
opostas às idéias expressas pelos textos - os testes de interpretação muitas vezes são organizados com uma 
espécie de armadilha: uma alternativa apresenta muitas palavras do texto, apresenta até expressões inteiras do 
texto, mas com um sentido contrário. Um leitor desatento ou/e ansioso provavelmente escolherá essa 
alternativa, por ser a mais “parecida” com o texto. Por ser a que apresenta mais literalmente, mas “ao pé da 
letra”, elementos presentes no texto... 
 A tradição é importante. É democrática quando desempenha a sua função natural de prover a nova geração 
com conhecimentos das boas e más experiências do passado, isto é, a sua função de capacitá-la a aprender às 
custas dos erros passados a fim de os não repetir. A tradição torna-se a ruína da democracia quando nega à 
geração mais nova a possibilidade de escolha; quando tenta ditar o que deve ser encarado como “bom” e como 
“mau” sob novas condições de vida. Os tradicionalistas fácil e prontamente se esquecem de que perderam a 
capacidade de decidir o que não é tradição. Por exemplo, o aperfeiçoamento do microscópio não foi conseguido 
pela destruição do primeiro modelo: o aperfeiçoamento foi realizado com a preservação e o desenvolvimento 
do modelo primitivo a par com um estágio mais avançado do conhecimento humano. Um microscópio do tempo 
de Pasteur não capacita o pesquisador moderno a estudar uma virose. Suponha agora que o microscópio de 
Pasteur tivesse o poder e o descaramento de vetar o microscópio eletrônico. Os jovens não sentiriam nenhuma 
hostilidade para com a tradição, não teriam na verdade senão respeito por ela se, sem se arriscar, pudessem 
dizer: Isto nós o tomaremos de vocês porque é convincente, é justo, diz respeito também à nossa época e 
passível de desenvolvimento. Aquilo, entretanto, não podemos aceitar. Era útil e verdadeiro para o seu tempo - 
seria inútil para nós. E esses jovens deveriam preparar-se para ouvir dos seus filhos as mesmas palavras. 
(Wilhelm Reich - A revolução sexual) 
Observe alguns exemplos de extrapolação, redução e contradição, muito freqüente na interpretação de 
textos: 
Extrapolação: O texto fala sobre o papel dos cientistas na sociedade e sobre a importância da ciência para a 
democracia, que é o melhor sistema de governo. 
Redução: O texto fala sobre a importância do microscópio, importante instrumento de investigação científica. 
Contradição: O texto afirma que a tradição sempre é um empecilho para o desenvolvimento do conhecimento 
humano. 
A compreensão correta do texto apresentaria os seguintes elementos e relações: 
· a importância da tradição; 
· A tradição, quando é democrática fornece elementos sobre as experiências do passado; 
· A tradição, quando é antidemocrática e tenta ditar o que é bom ou mau, em diferentes condições de vida; 
· O exemplo do microscópio, nos dois casos. 
 
Coesão E Coerência 
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A coesão é a ligação entre os elementos de um texto , que ocorre no interior das frases, entre as 
próprias frases e entre os vários parágrafos. Pode-se dizer que um texto é coeso quando os conectivos 
são empregados corretamente. 
Já a coerência diz respeito à ordenação de idéias, dos argumentos. A coerência depende obviamente 
da coesão. um texto com problemas de coesão terá , com certeza , problemas de coerência. Veja 
alguns casos :- 
1)- Uso inadequado do conectivo :- preposição , conjunção e pronome relativo 
2)- Falta de sequência lógica 
3)- Redundância : é a repetição desnecessária de palavras, expressões ou idéias. Geralmente os textos 
redundantes são confusos e mais extensos do que o necessário. 
4)- Ambiguidade : é uma falha na estrutura frasal, que terá que ser desfeita, caso ocorra, na produção 
de um texto. 
Veja estas duas frases , retiradas de um vestibular da Fuvest - SP , em que o aluno era solicitado a 
desfazer a ambigüidade: 
“Ele me trata como irmão”. 
Essa frase pode ser compreendida de duas maneiras: 
a)- Ele me trata como se eu fosse irmão dele. 
b)- Ele me trata como um irmão me trataria. 
Outro caso : “O menino viu o incêndio do prédio”. 
Pode-se inferir daí que o menino viu um prédio que se incendiava ou o menino estava num prédio 
quando o incêndio que acontecia em outro local. 
 
2 AS DIFERENTES LINGUAGENS 
“A linguagem é o instrumento com que o homem pensa e sente, forma estados de alma, aspirações, volições e 
ações, o instrumento com que influencia e é influenciado, o fundamento último e mais profundo da sociedade 
humana.” 
L. Hjelmslev 
 
A linguagem nasce da necessidade humana de comunicação. Nela e com ela, o homem interage com o mundo. 
Para tratarmos das diferentes linguagens de que dispomos, sejam elas verbais ou não, precisamos, inicialmente, 
pensar que elas existem para que possamos estabelecer comunicação, para que possamos interagir. Mas, o que 
é, em si, comunicar? 
Se desdobrarmos a palavra comunicação, teremos: 
Comunicação: “comum” + “ação”, ou melhor, “ação em comum”. 
De modo geral, todos os significados encontrados para a palavra comunicação revelam a ideia de se estabelecer 
relação com alguém, de haver transferência de informação. Observe: 
I 
A palavra comunicação deriva do latim communicare, cujo significado é “tornar comum”, “partilhar”, “repartir”, 
“trocar opiniões”, “estar em relação com”. Assim, podemos afirmar que, historicamente, comunicação implica 
participação, interação entre dois ou mais elementos, um emitindo informações, outro recebendo e reagindo. 
Para que a comunicação exista, então, é preciso que haja mais de um polo: sem o “outro”, não há partilha de 
sentimentos e ideias ou de comandos e respostas. 
Para que a comunicação seja eficiente, é necessário que haja um código comum aos interlocutores. Tomemos, 
agora, o conceito apresentado por Bechara (1999, p. 28) para fundamentar o conceito de linguagem: 
Entende-se por linguagem qualquer sistema de signos simbólicos empregadosna intercomunicação social para 
expressar e comunicar ideias e sentimentos, isto é, conteúdos da consciência. A linguagem é vista, então, como 
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um espaço em que tanto o sujeito quanto o outro, que com ele interage, são inteiramente ativos. Por meio dela, 
o homem pode trocar informações, ideias, compartilhar conhecimentos, expressar intenções, opiniões e 
emoções. Desse modo, reconhecemos a linguagem como um instrumento múltiplo e dinâmico, isso porque, 
considerados os sentidos que devem ser expressos e as condições de que dispomos em dada situação, valemo-
nos de códigos diferentes, criados a partir de elementos como som, imagem, cor, forma, movimento e tantos 
outros. 
Vale salientar a ideia de que o processo de significação só acontece verdadeiramente quando, ao nos 
apropriarmos de um código, nos fazemos entender por meio dele. 
 
A linguagem humana caracteriza-se pela extrema diversidade e pela complexidade de suas formas de 
organização e de suas formas de atividade. E é ela que confere às organizações e atividades humanas uma 
dimensão social. 
A linguagem humana se apresenta, inicialmente, como uma produção interativa associada às atividades sociais, 
sendo ela o instrumento pelo qual os interactantes, intencionalmente, emitem pretensões à validade relativas 
às propriedades do meio em que essa atividade se desenvolve. Com efeito, na medida em que os signos 
cristalizam as pretensões à validade designativa, se estão disponíveis para cada um dos indivíduos, eles também 
têm, necessariamente, uma dimensão transindividual, veiculando representações coletivas do meio, que se 
estruturam em configurações de conhecimentos que podem ser chamadas de mundos representados. 
Conforme Bronckart (1999), três tipos de mundo podem ser distinguidos: 
1. Linguagem representa o mundo objetivo (físico). 
2. Linguagem representa o mundo social (coletivo, de conversação etc.). 
3. Linguagem representa o mundo subjetivo (experiência individual). 
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A linguagem introduz uma distância nas relações que os organismos humanos mantêm com o meio e, por 
conseguinte, provoca a autonomia das próprias produções. A linguagem organiza-se, então, em discursos, em 
textos, que se diversificam em gêneros. É por meio dos textos que os mundos representados são construídos. 
Cada língua realiza o processo representativo geral da linguagem humana, mas ela o faz de acordo com suas 
modalidades próprias, isto é, cada língua tem sua semântica própria, que, por sua vez, dá origem às variadas 
culturas. 
De modo geral, a linguagem tem um caráter histórico. Os mundos representados já foram ditos bem antes de 
nós, e os textos e signos que os constituíram continuam trazendo os traços dessa construção histórica 
permanente. 
Nessa abordagem, a língua é fato social, produto de ações de seres humanos organizados em comunidades. A 
linguagem é, em outras palavras, uma prática social, e como tal exige do usuário da língua um olhar a partir de 
algum lugar sócio-historicamente marcado e atravessado por conotações ideológicas. 
A linguagem implica, além da consciência e responsabilidade de seus usuários, a interação entre eles. Para que 
duas ou mais pessoas possam compreender-se mutuamente, é preciso que seus contextos sociocognitivos 
sejam, pelo menos, parcialmente semelhantes. Em outras palavras, seus conhecimentos devem ser 
compartilhados, uma vez que é impossível duas pessoas partilharem exatamente dos mesmos conhecimentos. 
Ao entrar em uma interação, cada um dos parceiros já traz consigo sua bagagem cognitiva, ou seja, já é, por si 
mesmo, um contexto. A cada momento da interação, esse contexto é alterado, ampliado, e os 
parceiros se veem obrigados a se ajustar aos novos contextos que se vão originando sucessivamente. 
 
LINGUAGEM VERBAL E LINGUAGEM NÃO VERBAL 
Chamamos de linguagem a todo sistema de sinais convencionais que nos permite realizar atos de comunicação. 
Certamente você já observou que o ser humano utiliza as mais diferentes linguagens: a da música, a da dança, a 
da pintura, a dos surdos-mudos, a dos sinais de trânsito, a da língua que se fala, entre outras. Como vemos, a 
linguagem é produto de práticas sociais de uma determinada cultura que a representa e a modifica, numa 
atividade social. 
Considerando o sistema de sinais utilizados na comunicação humana, costumamos dividir a linguagem em verbal 
e não verbal. Assim, temos: 
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a. Linguagem verbal: aquela que utiliza as palavras para estabelecer comunicação. A língua que você utiliza, por 
exemplo, é linguagem verbal. 
b. Linguagem não verbal: aquela que utiliza outros sinais que não as palavras para estabelecer comunicação. Os 
sinais utilizados pelos surdos-mudos, por exemplo, constituem um tipo de linguagem não verbal. 
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LINGUAGEM FORMAL E INFORMAL 
Nossa língua apresenta uma imensa possibilidade de variantes linguísticas, tanto na linguagem formal (padrão) 
quanto na linguagem informal (coloquial). Elas não são, assim, homogêneas. Especialmente no que se refere ao 
coloquial, as variações não se esgotam. Alguns fatores determinam essa variedade. São eles: 
• diferenças regionais: há características fonéticas próprias de cada região, um sotaque próprio que dá traços 
distintivos ao falante nativo. Por exemplo, a fala espontânea de um caipira difere da fala de um gaúcho em 
pronúncia e vocabulário. 
• nível social do falante e sua relação com a escrita: um operário, de modo geral, não fala da mesma maneira 
que um médico, por exemplo. 
• diferenças individuais. 
É importante salientar que cada variedade tem seu conjunto de situações específicas para seu uso, e, de modo 
geral, não pode ser substituída por outra sem provocar, ao menos, estranheza durante a comunicação. 
 
LINGUAGEM COLOQUIAL: É utilizada pelas pessoas que fazem uso de um nível menos formal, mais cotidiano, mais 
espontâneo, usando criatividade e intimidade. Apresenta mais liberdade de expressão. É a comunicação de massa 
em geral. Muitas vezes foge às regras gramaticais. 
• Me diga a verdade. 
•Senta aí, tá! 
•Cuidado pra não falar besteira. 
•Me faça um favor. 
 
LINGUAGEM POPULAR: é utilizada pelas pessoas de baixa escolaridade. De menor cultura.Não há preocupação 
com as regras gramaticais. Apresenta vícios de linguagem (ERROS): 
• Mãi, não vou aumuçá em casa, pruque meu amigo mi convidô prá aumuçá com ele. 
• Hoje eu vou sai ca minha namorada. 
• Eu vi ela. 
• Olha eu aqui. 
 
CULTA: Eu estou preocupada 
COLOQUIAL: Tô preocupada 
POPULAR: Tô grilada 
GÍRIA: linguagem informal. É colorida - usada mais pelos adolescentes. Forma exagerada da linguagem familiar. 
 
Novos hippies: tô sussu=estou tranqüilo / viajar=soltar a imaginação / ler um texto= fumar maconha 
Lutadores: cheio de marra=metido / casca grossa=lutador muito bom / tomar toco= levar ofora. 
Patricinhas: pular o muro=beijar o garoto em uma festa / labiuda=menina que tira nota alta. 
Metaleiros: breja=cerveja / pão molhado= polícia / trincar a vela= ficar bêbado. 
 
VULGAR: 
incultos - sem cultura - 
Quero casa. Nóis vai. Eu vou i. Ocê tá bom. Aí né. Daí. Então. Percebe.Sabe. 
Vamu pára com isso. Nóis fumo 
Tauba, estauta, pobrema, estrupo, menas, amontar, esmagrecer, meia nervosa 
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REGIONAL: 
falar nordestino, gaúcho, carioca, caipira 
O sinhô, voismecê 
Quar quê 
Pra mode 
Deveras importante 
Bestaiado 
Oh! chente bichinho, ocê não sabe isso. 
Ele buliu ca moça 
 
 
Texto 3 - Comunicação (Luís Fernando Veríssimo. Para gostar de ler. v.7. São Paulo, Ática, 1982.) 
É importante saber o nome das coisas. Ou, pelo menos, saber comunicar o que você quer. Imagine-se entrando 
numa loja para comprar um... um... como é mesmo o seu nome? 
“Posso ajudá-lo, cavalheiro?” 
“Pode. Eu quero um daqueles, daqueles...” 
“Um... como é mesmo o nome?” 
“Sim?” 
“Pomba! Um... um... Que cabeça a minha. A palavra me escapou por completo. É uma coisa simples,conhecidíssima.” 
“Sim senhor.” 
“O senhor vai dar risada quando souber.” 
“Sim senhor.” 
“Olha, é pontuda, certo?” 
“O quê, cavalheiro?” 
“Isso que eu quero. Tem uma ponta assim, entende? Depois vem assim, assim, faz uma volta, aí vem reto de novo, 
e na outra ponta tem uma espécie de encaixe, entende? Na ponta tem outra volta, só que esta é mais fechada. E 
tem um, um... Uma espécie de, como é que se diz? De sulco. Um sulco onde encaixa a outra ponta, a pontuda, de 
sorte que o, a, o negócio, entende, fica fechado. É isso. Uma coisa pontuda que fecha. Entende?” 
“Infelizmente, cavalheiro...” 
“Ora, você sabe do que estou falando.” 
“Estou me esforçando, mas...” 
“Escuta. Acho que não podia ser mais claro. Pontudo numa ponta, certo?” 
“Se o senhor diz, cavalheiro...” 
“Como, se eu digo? Isso já é má vontade. Eu sei que é pontudo numa ponta. Posso não saber o nome da coisa, isso 
é um detalhe. Mas sei exatamente o que eu quero.” 
“Sim senhor. Pontudo numa ponta.” 
“Isso. Eu sabia que você compreenderia. Tem?” 
“bom, eu preciso saber mais sobre o, a, essa coisa. Tente descrevê-la outra vez. Quem sabe o senhor desenha para 
nós?” 
“Não. Eu não sei desenhar nem casinha com fumaça saindo da chaminé. Sou uma negação em desenho.” 
“Sinto muito.” 
“Não precisa sentir. Sou técnico em contabilidade, estou muito bem de vida. Não sou um débil mental. Não sei 
desenhar, só isso. E hoje, por acaso, me esqueci do nome desse raio. Mas fora isso, tudo bem. O desenho não me 
faz falta. Lido com números. Tenho algum problema com os números mais complicados, claro. O oito, por exemplo. 
Tenho que fazer um rascunho antes. Mas não sou um débil mental, como você está pensando.” 
“Eu não estou pensando nada, cavalheiro.” 
“Chame o gerente.” 
“Não será preciso, cavalheiro. Tenho certeza de que chegaremos a um acordo. Essa coisa que o senhor quer, é feito 
do quê?” 
“É de, sei lá. De metal.” 
“Muito bem. De metal. Ela se move?” 
APOSTILA IPT 
“Bem... É mais ou menos assim. Presta atenção nas minhas mãos. É assim, assim, dobra aqui e encaixa na ponta, 
assim.” 
“Tem mais de uma peça? Já vem montado?” 
“É inteiriço. Tenho quase certeza de que é inteiriço.” 
“Francamente.” 
“Mas é simples! Uma coisa simples. Olha: assim, assim, uma volta aqui, vem vindo, vem vindo, outra volta e clique, 
encaixa.” 
“Ah, tem clique. É elétrico.” 
“Não! Clique, que eu digo, é o barulho de encaixar.” 
“Já sei!” 
“Ótimo!” “O senhor quer uma antena externa de televisão.” 
“Não! Escuta aqui. Vamos tentar de novo...” 
“Tentemos por outro lado. Para o que serve?” 
“Serve assim para prender. Entende? Uma coisa pontuda que prende. Você enfia a ponta pontuda por aqui, 
encaixa a ponta no sulco e prende as duas partes de uma coisa..” 
“Certo. Esse instrumento que o senhor procura funciona mais ou menos como um gigantesco alfinete de segurança 
e...” 
“Mas é isso! É isso! Um alfinete de segurança!” 
“Mas do jeito que o senhor descrevia parecia uma coisa enorme, cavalheiro!” 
“É que eu sou meio expansivo. Me vê aí um... um... Como é mesmo o nome?” 
 
 
 
NÍVEIS DE LINGUAGEM 
LÍNGUA - É uniforme e visa padronizar a linguagem. 
LINGUAGEM - é individual flexível / varia de acordo com idade, sexo, cultura, posição social. 
LÍNGUA - ESCRITA - não reproduz na íntegra o timbre de voz, expressões e gestos = segue normas 
LÍNGUA - FALADA - é descontraída, espontânea, por isso foge às regras. 
LINGUAGEM CULTA/PADRÃO: é utilizada pelas classes intelectuais da sociedade, ensinada nas escolas e usada 
para transmitir informações filosóficas e científicas.Reflete - prestígio social e cultural. 
LINGUAGEM COLOQUIAL: É utilizada pelas pessoas que fazem uso de um nível menos formal, mais cotidiano, mais 
espontâneo, usando criatividade e intimidade. Apresenta mais liberdade de expressão. É a comunicação de massa 
em geral. Muitas vezes foge às regras gramaticais. 
LINGUAGEM POPULAR: é utilizada pelas pessoas de baixa escolaridade. De menor cultura. Não há 
preocupação com as regras gramaticais. Apresenta vícios de linguagem CULTA: Eu estou preocupada 
GÍRIA: linguagem informal. É mais usada pelos adolescentes. Forma exagerada da linguagem familiar. 
 
TEXTOS ORAIS E TEXTOS ESCRITOS 
A interação pela linguagem materializa-se por meio de textos, sejam eles orais ou escritos. É relevante, no 
entanto, reconhecer que fala e escrita são duas modalidades de uso da língua que, embora se utilizem do mesmo 
sistema lingüístico, possuem características próprias. As duas não têm as mesmas formas, a mesma gramática, 
nem os mesmos recursos expressivos. Para a compreensão dos problemas da expressão e da comunicação 
verbais, é necessário evidenciar essa distinção. 
Em nossa sociedade, fundamentalmente oral, convivemos muito mais com textos orais do que com textos 
escritos. Todos ospovos1, indistintamente, têm ou tiveram uma tradição oral e relativamente poucos tiveram ou 
têm uma tradição escrita. No entanto, isso não torna a oralidade mais importante que a escrita. Mesmo que a 
APOSTILA IPT 
oralidade tenha uma primazia cronológica sobre a escrita, esta, por sua vez, adquire um valor social superior à 
oralidade. 
A escrita não pode ser tida como representação da fala. Em parte, porque a escrita não consegue reproduzir 
muitos dos fenômenos da oralidade, tais como a prosódia, a gestualidade, os movimentos do corpo e dos olhos, 
entre outros. Ela apresenta, ainda, elementos significativos próprios, ausentes na fala, tais como o tamanho e o 
tipo de letras, cores e formatos, sinais de pontuação e elementos pictóricos, que operam como gestos, mímica e 
prosódia graficamente representados. 
Observe a transcrição de um texto falado, retirado de uma aula de História Contemporânea, ministrada no Rio de 
Janeiro, no final de década de 70. Procure ler o texto como se você estivesse “ouvindo” a aula. 
É possível notar que o texto é bastante entrecortado e repetitivo, apresenta expressivas marcas de oralidade e 
progride apoiando-se em questões lançadas aos interlocutores, no caso, aos alunos. Isso não significa que o texto 
falado é, por sua natureza, absolutamente caótico e desestruturado. Ao contrário, ele tem uma estruturação que 
lhe é própria, ditada pelas circunstâncias sociocognitivas de sua produção. No entanto, tais características, 
próprias do texto oral, são consideradas inapropriadas para o texto escrito. E por quê? 
 
Para entender essa questão, inicialmente, faz-se necessário observar a distinção entre essas duas modalidades de 
uso da língua, proposta por Marcuschi (2001:25): 
  A fala seria uma forma de produção textual-discursiva para fins comunicativos na modalidade oral. Caracteriza-
se pelo uso da língua na sua forma de sons sistematicamente articulados e significativos, bem como os 
aspectos prosódicos e recursos expressivos como a gestualidade, os movimentos do corpo e a mímica. 
  A escrita, por sua vez, seria um modo de produção textual-discursiva para fins comunicativos com certas 
especificidades materiais e se caracterizaria por sua constituição gráfica, embora envolva também recursos de 
ordem pictórica e outros. Pode manifestar-se, do ponto de vista de sua tecnologia, por unidades alfabéticas 
(escrita alfabética), ideogramas (escrita ideográfica) ou unidades iconográficas. Trata-se de uma modalidade de 
uso da língua complementar à fala. 
 
De modo geral, discute-se que ambas apresentam distinções porque diferem nos seus modos de aquisição, nas 
suas condições de produção, na transmissão e recepção, nos meios através dos quais os elementos de estrutura 
são organizados. 
Para Koch (1992), dentre as características distintivas mais freqüentemente apontadas entre as modalidades 
falada e escrita estão as seguintes: 
 
 
Fala 
1. Contextualizada. 
2. Não-planejada. 
3. Redundante. 
4. Fragmentada.5. Incompleta. 
6. Pouco elaborada. 
7. Predominância de frases curtas, simples 
ou coordenadas. 
8. Pouco uso de passivas. 
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9. Pouca densidade informacional. 
10. Menor densidade lexical. 
 
Escrita 
1. Descontextualizada. 
2. Planejada. 
3. Condensada. 
4. Não-fragmentada. 
5. Completa. 
6. Elaborada. 
7. Predominância de frases complexas, 
com subordinação abundante. 
8. Emprego freqüente de passivas. 
9. Densidade informacional. 
10. Maior densidade lexical. 
 
Ocorre, porém, que essas diferenças nem sempre distinguem as duas modalidades. Isso porque se verifica, por 
exemplo, que há textos escritos muito próximos ao da fala conversacional (bilhetes, recados, cartas familiares, por 
exemplo), e textos falados que mais se aproximam da escrita formal (conferências, entrevistas profissionais, entre 
outros). Além disso, atualmente, pode-se conceber o texto oral e o escrito como atividades interativas e 
complementares no contexto das práticas culturais e sociais. 
Oralidade e escrita, assim, são práticas e usos da língua com características próprias, mas não suficientemente 
opostas para caracterizar dois sistemas lingüísticos distintos. Ambas permitem a construção de textos coesos e 
coerentes, ambas permitem a elaboração de raciocínios abstratos e exposições formais e informais, variações 
estilísticas, sociais e dialetais. 
Cabe lembrar, finalmente, que em situações de interação face a face, o locutor que detém a palavra não é o único 
responsável pelo seu discurso. Trata-se, como bem mostra Marcuschi (1986), de uma atividade de co-produção 
discursiva, visto que os interlocutores estão juntamente empenhados na produção do texto. 
 
Como produzir um texto escrito a partir do texto falado: 
1ª operação: eliminação de marcas estritamente interacionais e a inclusão da pontuação; 
2ª operação: apagamento de repetições, redundâncias e autocorreções e a introdução de substituições; 
3ª operação: substituição do turno por parágrafos; 
4ª operação: diferenciação do encadeamento sintático dos tópicos; 
5ª operação: tratamento estilístico com seleção do léxico e da estrutura sintática, num percurso do menos para o 
mais formal. 
 
Texto Falado 
L1: - vou levar o meu cachorro pra um dia de SPA naquela pet shop um dia! 
L2: - onde? 
L1: - lá naquela pet shop nova perto da sua casa! Eles fazem propaganda na rádio! 
L2: - nossa, você está podendo hein! Eu não tenho dinheiro para ir na manicure e seu cachorro vai pro Spa! 
L1: - Ah, eu estou zoando...claro que um banho e tosa de vez em quando precisa ser profissional... 
L2: - Hum! Pensei que era sério...já ia pedir para ser seu pet! (risos) 
L1: - Mas, falando sério, você conhece aquela pet shop? Será que é boa? 
L2 : - Não conheço! Não tenho bicho, como iria conhecer! 
 
APOSTILA IPT 
Texto Escrito 
Comentei com uma amiga que gostaria de um dia levar meu cachorro para um dia de tratamento estético em uma 
loja especializada em animais de estimação, a loja era nova e vinha fazendo anúncios sobre seus serviços 
diferenciados em uma emissora de rádio. Minha amiga, que parecia não estar de bom humor naquele dia, me fez 
uma crítica, em tom de reclamação ela disse que não tinha dinheiro para pagar a manicure e que eu deveria estar 
em boa situação financeira para custear tal tratamento especial a um animal de estimação. Tentando amenizar o 
clima, logo avisei que era brincadeira, apesar de que eu acho que o tratamento mínimo, composto por banho e 
tosa, feito por profissionais, às vezes é necessário. Minha amiga, já recuperando o bom humor, até brincou 
dizendo que gostaria de ser meu cachorro. Foi então que eu pedi referências sobre a tal pet shop, que ficava perto 
de sua casa, foi o suficiente para ela voltar a se mostrar irritada, respondendo rispidamente que não conhecia, 
pois não tinha animal em casa!

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