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André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 1 APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS 1. APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS: Toda norma constitucional tem imperatividade e aplicabilidade. As normas constitucionais são cogentes (obrigatórias) e de ordem pública (como regra são inafastáveis pela disposição das partes). 1.1. EFICÁCIA VERSUS APLICABILIDADE IMEDIATA A eficácia das normas diz respeito ao seu poder de produzir efeitos. A eficácia poderá ser jurídica ou social. Diz-se eficácia social quando a norma possui aplicabilidade imediata, ou seja, quando a norma produz seus efeitos imediatamente. Quando uma norma regula casos concretos ou pelo menos possui meios judiciais de consegui-lo, como é o caso dos direitos e garantias fundamentais, art. 5o §1o. Ressaltando que o remédio do Mandado de Injunção no Art. 5o LXXI visa evitar que norma de direito fundamental tenha que aguardar a edição de lei posterior para ganhar eficácia. Diz-se eficácia jurídica quando a norma produz efeitos no ordenamento jurídico, ou seja, possui efeitos jurídicos típicos das normas em geral. Os efeitos jurídicos são tipicamente negativos, posto que: A. Revoga as leis incompatíveis; B. Proíbe o legislador de fazer leis que sejam incompatíveis; C. Serve de parâmetro para efeito de controle de constitucionalidade quanto ao ordenamento infraconstitucional, ou seja, pode ser usada para declarar inconstitucional uma norma inferior; Mas, a eficácia jurídica também pode conceder efeitos positivos, como: D. Servir como parâmetro de interpretação do texto constitucional, obrigando o juiz a decidir conforme o disposto na norma; E. Traduz-se em um dever de implementação pelo Estado quando assim exigir a Constituição sob pena de inconstitucionalidade por omissão ou mesmo responsabilização dos governantes; André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 2 1.2. CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS EM NORMAS AUTO- APLICÁVEIS E NÃO-AUTO-APLICÁVEIS A doutrina tem mencionado que as normas constitucionais, conforme sua aplicabilidade, podem ser classificadas em normas constitucionais auto- aplicáveis e normas constitucionais não-auto-aplicáveis. Seriam do segundo grupo aquelas normas que dependem de regulamentação ou de posterior efetivação por parte do Estado. No entanto, a classificação mais utilizada em concurso tem sido a do Professor José Afonso da Silva (Aplicabilidade das normas constitucionais). Também faremos menção à classificação de Maria Helena Diniz. 1.3. CLASSIFICAÇÃO DE MARIA HELENA DINIZ Maria Helena Diniz escreveu a obra ―A Norma Constitucional e Seus Efeitos‖ e, como novidade, trouxe mais um critério de classificação das normas constitucionais. O novo critério, segundo Maria Helena Diniz é a classificação em normas do tipo supereficazes. 1.3.1. Eficácia Absoluta ou supereficazes Segundo Maria Helena Diniz, são aquelas normas constitucionais que possuem aplicabilidade imediata direta e integral, ou seja, podem ser aplicadas sem intermediação estatal e não dependem de lei posterior (até aqui são idênticas às normas de eficácia plena), porém, como novidade ela mencionam que são supereficazes aquelas normas que não podem ser abolidas por meio de emenda Constitucional (normas protegidas por cláusula pétrea), segundo ela os art. 60§4o, art. 2º e art. 34, VII ―a‖ e ―b‖ são normas que não podem ser abolidas nem mesmo por emenda e por isso teriam eficácia absoluta, irrestringível e por isso supereficazes. 1.4. CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA A classificação de José Afonso da Silva é usada em parte por Maria Helena Diniz (que inova apenas no ponto acima), portanto, no que se assemelham será listado abaixo, outros autores mencionados também utilizam a classificação de José Afonso, porém, citam outras nomenclaturas que a título de precaução serão citadas. 1.4.1. Eficácia plena Segundo o autor já mencionado, seriam de eficácia plena as normas que possuem aplicabilidade imediata, direta e integral, também não dependem de lei posterior. Vejam que elas não proíbem, por completo, a edição legislativa André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 3 que venha complementar ou especificar, porém, não admitem a restrição por parte do legislador. Estas normas deverão permanecer com sua eficácia total desde o momento da edição da constituição e até que outra norma constitucional venha a retirar-lhes o efeito. Resumidamente, podemos dizer que estas normas produzem efeitos desde a entrada em vigor da Constituição, não necessitam de regulamentação e não podem ser contidas pelo legislador ordinário. Exemplos: Art. 1o e 1o Parágrafo único, 5º IX, XX, 14 §2o,15, 17 §4o, 19 a 22, 24 a 28 caput, 29, 30, 37 III, 44 e 44 Parágrafo único, 45 caput, 46 §1o, 48, 49, 51, 52, 60 §3o, 69, 70, 71, 76, 84, 101, 102, 103, 104,105, 145, 153, 155, 156 226§1o. Apesar de serem muitos exemplos, é aconselhável que o concursando repasse este exemplos, ainda que aos poucos, já que, normalmente, são os exemplos cobrados em concursos. 1.4.2. Eficácia contida (ou redutível, prospectiva ou ainda plena restringível) As normas de eficácia contida possuem aplicabilidade imediata, direta e restringível – não dependem de lei posterior como as de eficácia plena, mas podem fazer menção à lei posterior dando ao legislador a possibilidade de manipulação por lei de seus efeitos. Neste caso o legislador constituinte regulou e deu aplicabilidade à norma, ou seja, é possível exercer o direito, porém, este direito pode ser restringido (contido), pela discricionariedade do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados (conceitos do tipo: ordem pública, segurança nacional, necessidade pública). Exemplos: Art. 5o VIII (a contenção pode vir por lei ou pelo Art. 15, IV), XII, XIII, XXII (contida pelos incisos XXIV e XXV do mesmo artigo), LVIII, LX, LXI (parte final), 14 §1o a §3o (são contidas pelos §4o a 7o do mesmo Art. 14). Novamente alerta-se para a necessidade de seguir à leitura de alguns dos exemplos, posto que são muito cobrados em concursos públicos. 1.4.3. Eficácia limitada (ou mediata, reduzida, mínima diferida ou ainda relativa complementável): São as normas constitucionais que dependem de atuação posterior do poder público para regular o direito previsto de forma mediata, diferida, ainda limitada. Cabendo lembrar que possuem eficácia jurídica e estabelecem uma necessidade de atuação positiva do Poder Público. Dividem-se em: A. Princípios institutivos ou organizativos: Contém esquemas gerais em que o legislador constituinte originário cria estruturas de instituições, André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 4 órgãos, ou entidades e permite que o legislador ordinário os estruture em definitivo, mediante lei. Impositivas: Geram uma obrigação de fazer. Exemplos: 20§2o, 32 §4o, 33, 88, 90 §2o, 91§2o, 107 parágrafo único, 109 VI, 113, 121, 128 §5o, 146, 165 §9o, 163. Facultativas ou permissivas: Permitem que se faça, não obrigam a complementação. Exemplos: Art. 22 parágrafo único, 25 §3o, 125 §3o, 154 I, 195 §4o, B. Princípios programáticos: As normas constitucionais programáticas não produzem seus plenos efeitos com a entrada em vigor da CF (são normas de eficácia limitada). Possuem, além da eficácia jurídica (revogação de leis anteriores contrárias, parâmetro para inconstitucionalidade de leis posteriores contrárias eutilização como norma de interpretação para resolução de casos levados à apreciação judicial) também geram a previsão de atuação posterior (concretização de seus plenos efeitos pelo poder público). As normas programáticas têm por objeto a disciplina dos interesses econômicos-sociais (realização da justiça social, existência digna, valorização do trabalho, desenvolvimento econômico, repressão ao abuso do poder econômico, assistência social, intervenção do Estado na ordem econômica, amparo à família, combate à ignorância, estímulo à cultura, à ciência e à tecnologia). Em certa medida vinculam os Poderes públicos porque o Legislador, no mínimo, não pode fazer leis contrárias, o Judiciário não pode negar- lhes vigência ou julgar contra elas e o Executivo não pode produzir políticas públicas em sentido oposto. Tais normas são protegidas por Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão, conforme o art. 103 §2o quando exigem a atuação positiva do Legislador ou de órgãos públicos e também podem ser protegidas por Mandado de Injunção, conforme o artigo 5o LXXI quando sejam essenciais ao exercício de direitos constitucionais. Admite-se ainda, quando for o caso, a proteção por Iniciativa Popular, conforme o art. 14 III c/c (combinado com) o artigo 61 §2º. As normas programática se concentram, via de regra nos Títulos VII e VIII da Constituição. São subtipos: Normas programáticas vinculadas ao princípio da legalidade: Dependem da edição de lei para que venham produzir seus efeitos. Exemplos: Artigo 7oXI (já há lei posterior, então, pode-se dizer que deixou de ser programática, concretizando-se), artigo 7o XX (a André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 5 proteção ao mercado de trabalho da mulher, dada a discricionariedade do legislador ordinário é norma de difícil proteção via Mandado de Injunção), artigo 7o XXVII, artigo 173 §4o (a lei já existe e há o Conselho Administrativo de Defesa Econômica para tratar do assunto), artigo 216§3o e, por último o artigo 218§4o. Normas programáticas referidas aos Poderes Públicos: São normas que exigem adoção de políticas públicas, de incentivos para que sejam satisfeitas. Exemplos: Arts. 21 IX, 184, 211 §1o, 215, 215 §1o, 216 §1o, 217, 218, 218 §3o, 226, 226 §8o e 227 §1o. Normas programática dirigidas à ordem econômica e social: Procuram dar um norte à ordem econômica e social. Exemplos: Arts. 170, 193. 1.5. CLASSIFICAÇÃO DE MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO Segundo Manoel Gonçalves as normas podem ser normas auto- executáveis ou não-auto-executáveis, em verdade as primeiras se dividem em plena ou contida e as segundas em limitadas, conforme a classificação exposta acima de José Afonso da Silva. 1.6. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES 1.6.1. Normas de aplicação Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto indicam como normas de aplicação as normas auto-aplicáveis. 1.6.2. Normas de integração Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto indicam que as normas constitucionais podem ser completáveis (equivale à limitada) ou restringíveis (equivale à contida). 1.6.3. Normas de eficácia exaurida: Uadi Lâmego Bulos informa que são normas exauridas as do ADCT que não produzirão mais efeitos, ou seja, que já transitaram. 2. A QUESTÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL E APLICAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 6 A reserva do possível é um instituto muito utilizado no Direito Administrativo. É um princípio sustentado pela administração pública desde que a noção da ―separação dos poderes‖ começou a ser aplicada. Seria uma espécie de contrapeso para que o Poder Executivo não seja obrigado a obedecer a ordens ―impossíveis‖ do judiciário se protegendo e fazendo, portanto, o que ―for possível‖. Não há dúvida de que a administração pública detém discricionariedade ao efetivar interesses públicos criados por lei, ou seja, a administração escolhe onde fazer, quando fazer e o que fazer – aí esta a reserva do possível. Por isso, não cabe ao judiciário determinar o que fazer, como fazer e quando fazer. Acontece que a administração pública estava se omitindo excessivamente na concretização das normas constitucionais e utilizando como argumento a reserva do possível. Esta omissão desarrazoada impede a concretização de normas constitucionais e faz com que tal conduta seja considerada abusiva e inconstitucional. O Ministério Público Federal, utilizando da ADPF (argüição por descumprimento de preceito fundamental – ADPF nº 45) levou ao STF uma discussão em que pedia à Suprema Corte a limitação desta área da ―reserva do possível‖. O STF limitou a reserva do possível, fixando que: Se o direito está respaldado na lei, então não é um mero interesse público. É um direito subjetivo público e pode ser exigido judicialmente sem que o poder público possa afirmar ser discricionário para a execução. Se além do interesse, a própria sociedade demandar pela efetivação, então a administração pública deverá mitigar a oportunidade e a conveniência para atingir a demanda social – lembrando que a finalidade do Estado é atingir o bem público, o interesse social. A conduta que não atende ao interesse comum não tem legitimidade social. O interesse é social e pertence à sociedade – a administração age para efetivar estes interesses. Quando a administração dispuser de recursos para implementar o interesse, deverá fazê-lo de imediato. Se não houver possibilidade imediata de o administrador efetivar o direito, então, haverá a fixação de um plano ou um programa de efetivação. O planejamento deverá ser concreto e possível. O que não pode é não fazer nada. O Ministério Público tem utilizado da Ação Civil Pública para efetivar direitos, ou seja, exigir judicialmente a concretização das normas constitucionais que demandam integração por parte dos poderes públicos. ADPF 45 (STF): Não obstante a formulação e a execução de políticas públicas dependam de opções políticas a cargo daqueles que, por delegação popular, André Alencar – Direito Constitucional Aplicabilidade das normas constitucionais Página 7 receberam investidura em mandato eletivo, cumpre reconhecer que não se revela absoluta, nesse domínio, a liberdade de conformação do legislador, nem a de atuação do Poder Executivo. É que, se tais Poderes do Estado agirem de modo não-razoável ou procederem com a clara intenção de neutralizar, comprometendo-a, a eficácia dos direitos sociais, econômicos e culturais, afetando, como decorrência causal de uma injustificável inércia estatal ou de um abusivo comportamento governamental, aquele núcleo intangível consubstanciador de um conjunto irredutível de condições mínimas necessárias a uma existência digna e essenciais à própria sobrevivência do indivíduo, aí, então, justificar-se-á, como precedentemente já enfatizado — e até mesmo por razões fundadas em um imperativo ético-jurídico —, a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, em ordem a viabilizar, a todos, o acesso aos bens cuja fruição lhes haja sido injustamente recusada pelo Estado.
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