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Intervenção do Estado na Propriedade Privada 1. Limitações Administrativas As limitações administrativas podem ser conceituadas como determinações de caráter geral, unilaterais e gratuitas. Por meio delas, o Estado impõe a adoção de um determinado comportamento (que pode ser o de fazer ou de deixar de fazer), com a finalidade de assegurar que a propriedade atenda sua função social e que a coletividade seja beneficiada. Exemplo: a obrigação que as propriedades possuem de observar alguns metros de distância de recuo (destinado às calçadas públicas) quando da realização da construção, ou então a proibição de que os edifícios sejam construídos acima de determinado número de andares. Ao contrário do que ocorre com a servidão administrativa, as limitações possuem o caráter da generalidade, incidindo sobre todas as propriedades. Se tomarmos como base o exemplo anteriormente apresentado, veremos que todas as construções devem observar o limite máximo de andares definido pelo Poder Público, bem como que todas as propriedades devem manter o recuo destinado às calçadas. Nas limitações administrativas, estamos diante de uma restrição particular em prol de todo o interesse coletivo, conceito que nos remete a outro importante ponto do Direito Administrativo: o poder de polícia. Assim, podemos afirmar que as limitações administrativas são manifestações diretas do poder de polícia. Como as limitações administrativas são decorrentes do poder de polícia, e considerando que tal poder é inerente à atividade da administração pública, não há que se falar em indenização ao particular, uma vez que o que ocorre em tal instituto é uma restrição de um direito individual em prol do bem-estar da população. Em situações excepcionais, quando a limitação resultar no dano ao particular, deve o Poder Público proceder à devida indenização, oportunidade em que os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade devem ser levados em conta. Exemplo: caso a administração determine que as construções de prédios particulares não poderão exceder ao número de quinze andares, estaremos diante de uma limitação administrativa negativa (não fazer) que não gera direito à indenização. Caso, no entanto, o Poder Público determine a demolição de uma propriedade construída anteriormente à edição da norma que determinou o limite de andares (limitação positiva, de fazer), e considerando que com a demolição o particular sofreu prejuízos, deverá este ser indenizado dos prejuízos causados. Da mesma forma, as limitações administrativas podem recair sobre bens móveis, imóveis ou até mesmo sobre a prestação de um serviço, consistindo em uma obrigação positiva (fazer algo) ou negativa (deixar de fazer algo). Diferentemente do que acontece com as servidões administrativas, as limitações podem ser constituídas por lei ou por meio de atos administrativos, uma vez que são manifestações do poder de polícia da administração pública. 2. Servidão Administrativa A Servidão Administrativa pode ser conceituada como um ônus real incidente sobre um bem particular com a finalidade de permitir que tal propriedade possua utilização pública. Por estarmos diante de um ônus real (e não pessoal), não teremos a extinção da intervenção com o falecimento do proprietário ou com a alienação do bem objeto da restrição, situações que ocorreriam caso a servidão fosse um ônus de caráter pessoal. Exemplo: uma situação clássica de servidão administrativa ocorre quando uma casa, estrategicamente localizada na esquina entre duas importantes avenidas de uma cidade, é utilizada pelo Poder Público para a fixação de uma placa, em sua parte externa, com o nome das duas avenidas. Em tal situação, toda a coletividade foi beneficiada (uma vez que passou a dispor de uma melhor forma de localização), ao passo que a propriedade não deixou de pertencer ao particular, que apenas teve que suportar a fixação das placas. 3. Requisição Administrativa A requisição administrativa é forma de intervenção na propriedade prevista no artigo 5º, XXV, da Constituição Federal, sendo utilizada nas situações de iminente perigo público: No caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano. De acordo com a doutrina, dois são os tipos de requisições administrativas: A requisição militar, que possui o objetivo de resguardar a segurança interna em situações de guerra ou de perturbação da ordem, e a requisição civil, que deve ser utilizada nas situações em que o Poder Público deseje evitar a propagação de algum tipo de dano à coletividade (como nos casos de epidemia, desastres naturais e incêndios). 4. Ocupação Temporária A ocupação temporária consiste na forma de intervenção por meio do qual o estado utiliza, em caráter temporário, a propriedade privada com a finalidade de auxiliar na execução de uma obra ou de um serviço público. Exemplo: pensemos em uma construção efetuada pelo Poder Público em uma localidade distante do local onde a administração guarda seus equipamentos. Dessa forma, não seria nada viável a administração retornar, ao final de cada dia, com a finalidade de guardar equipamentos e máquinas, não é mesmo? Assim, ela utiliza uma propriedade particular que esteja localizada em um local próximo ao que a obra está sendo construída, em plena consonância com os princípios da economicidade e da eficiência. Esta é a hipóteses de Ocupação Temporária prevista no Decreto 3.365, que, em seu artigo 36, assim estabelece: É permitida a ocupação temporária, que será indenizada, afinal, por ação própria, de terrenos não edificados, vizinhos às obras e necessários à sua realização. Tal hipótese de ocupação gera o direito ao recebimento de indenização pelo particular, uma vez que quem está sendo beneficiada é a administração pública como um todo. Além dessa, deve-se ressaltar a hipótese de ocupação temporária decorrente da necessidade de escavações e pesquisas arqueológicas ou da utilização da propriedade particular para a realização de um múnus público essencial à manutenção do bem-estar coletivo, tal como ocorre, por exemplo, com a locação de uma escola para a realização de eleições ou com a realização de campanhas de vacinação em uma propriedade particular estrategicamente localizada. Nestas hipóteses, o particular, em regra, não fará jus à indenização do Poder Público. No entanto, caso haja danos comprovados como resultado da utilização da propriedade pelo Poder Público (ou até mesmo pelos particulares, quando do exercício de algum encargo público), deve haver a correspondente indenização. Exemplo: pode ser visualizado na locação de uma propriedade particular com a finalidade de realizar campanha de vacinação. Em regra, não haverá indenização ao particular, uma vez que a restrição de seu direito de propriedade está fundamentada no interesse de toda a coletividade (que sofreria caso houvesse uma epidemia). No entanto, caso haja uma discussão entre dois ou mais moradores e, como consequência, a dilapidação do imóvel (quebra de vidros), deverá o particular ser indenizado de todos os prejuízos comprovadamente causados. 5. Tombamento O tombamento pode ser conceituado como a forma de intervenção por meio da qual o poder público objetiva garantir a preservação do patrimônio histórico e cultural nacional. Ainda que parte da doutrina afirme o contrário, o entendimento que deve ser levado para as provas de concurso é o de que o tombamento configura uma hipótese autônoma de intervenção estatal na propriedade particular. O fundamento, em todas as situações de tombamento, é a preservação dos bens (conceito utilizado em sentido amplo) que possuam valor artístico, histórico, arqueológicoou cultural. A previsão para a utilização do tombamento está prevista na Constituição Federal (artigo 216, § 1º): O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. As diversas disposições acerca do tombamento estão previstas no Decreto-lei 25, de 1937. Para garantir a preservação de tais bens, o tombamento poderá recair em bens móveis e imóveis e até mesmo em bairros ou cidades. Da mesma forma, poderão ser tombados os bens materiais e imateriais, públicos ou privados. Importante esclarecer que o patrimônio cultural brasileiro pode ser entendido como o conjunto de bens (independentemente de serem materiais ou imateriais) que sejam portadores de referência aos diversos grupos formadores da sociedade, conforme expressão do artigo 216 da Constituição Federal: Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. Tal como ocorre com os bens móveis e imóveis nacionais, as obras de origem estrangeira podem ser objeto de tombamento, desde que atendam a característica da relevância para a preservação do patrimônio público nacional. Como exceção, temos alguns tipos de bens estrangeiros que são insuscetíveis de tombamento, conforme previsão do artigo 3º do Decreto-lei 25: Art. 3º Excluem-se do patrimônio histórico e artístico nacional as obras de origem estrangeira: 1) que pertençam às representações diplomáticas ou consulares acreditadas no país; 2) que adornem quaisquer veículos pertencentes a empresas estrangeiras, que façam carreira no país; 3) que se incluam entre os bens referidos no art. 10 da Introdução do Código Civil, e que continuam sujeitas à lei pessoal do proprietário; 4) que pertençam a casas de comércio de objetos históricos ou artísticos; 5) que sejam trazidas para exposições comemorativas, educativas ou comerciais: 6) que sejam importadas por empresas estrangeiras expressamente para adorno dos respectivos estabelecimentos. A possibilidade de tombamento pode recair, ainda, sobre bairros ou cidades declarados históricos e necessários à preservação do patrimônio público. Tais situações ocorrem, normalmente, quando os bairros ou cidades foram relevantes nos processos de transformação do país, objetivando a preservação de expressões próprias de cada período histórico. Exemplo: caso o Poder Público entenda que uma propriedade particular foi importante para o processo de emancipação municipal, poderá realizar o tombamento do imóvel. Da mesma forma, caso julgue que uma cidade brasileira merece ser preservada, uma vez que foi vital para a realização de algum movimento social, poderá realizar o tombamento.
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