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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA 1. ESTUDAR AS CAUSAS DE CEFALEIA, SEUS TIPOS, SUAS CARACTERÍSTICAS, SUAS FISIOPATOLOGIAS, MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS. A dor de cabeça dita cefaleia é aquela que pode acometer desde os olhos até o final da implantação dos cabelos. Se a dor acomete a região abaixo dos olhos é chamada de dor facial, se ela surge posteriormente, abaixo da implantação dos cabelos, passa a se chamar dor cervical. Podemos dividir as cefaleias em primárias e secundárias. As cefaleias primárias são aquelas em que a cefaleia constitui a própria doença (surge do nada, não tem uma doença desencadeadora) - como a enxaqueca, cefaleia tensional e cefaleia em salvas. Já as cefaleias secundárias geralmente se associam a lesão neurológica orgânica ou a distúrbios sistêmicos, havendo incontáveis causas como meningite, neoplasia cerebral, dengue. Nesses casos a cefaleia é apenas um dentre diversos sinais e sintomas. Geralmente, a cefaleia secundaria vem acompanhada de alguns sinais e sintomas aos quais devemos estar atentos, são os chamados SINAIS DE ALERTA (RED FLAGS). Eles são importantes, pois a presença destes vai indicar a realização de exames complementares para elucidação do diagnóstico. SINAIS DE ALARME Após os 50-55 anos, devemos considerar sempre a hipótese de arterite temporal ou lesão estrutural do SNC; O início súbito de cefaleia muito intensa remete à ruptura de aneurisma ou malformação arteriovenosa causando hemorragia subaracnoide ou AVE hemorrágico intraparenquimatoso; A cefaleia progressiva pode indicar hipertensão intracraniana de instalação insidiosa, decorrente principalmente de lesão estrutural com efeito de massa, como tumor ou abscesso; A cefaleia que piora significativamente com decúbito, tosse, espirro, esforços ou manobra de Valsalva pode se dever a hipertensão intracraniana (tais medidas aumentam a PIC, piorando a cefaleia); Em pacientes com neoplasia, a suspeita é de metástases para o SNC. Em pacientes com HIV, devemos sempre considerar a hipótese de neurotoxoplasmose, abscesso cerebral ou meningite; Em vítimas de queda ou TCE recente, a cefaleia pode indicar a instalação de um hematoma subdural ou epidural; A presença de vômitos precedendo a cefaleia (particularmente em jato), assim como a cefaleia que acorda o paciente à noite ou já está presente ao acordar pode significar hipertensão intracraniana; A cefaleia acompanhada por hipersensibilidade na região da artéria temporal pode significar arterite temporal Problema 02: Uma dor lancinante 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A solicitação rotineira de exames complementares como EEG, RX de crânio ou de seios da face ou ainda TC de crânio, apenas por queixa de cefaleia é DESNECESSÁRIA. Estes exames estariam indicados na busca de uma causa secundária de cefaleia, ou seja, caso o paciente apresente um dos sinais de alarme. CEFALEIAS PRIMÁRIAS ENXAQUECA OU MIGRÂNEA A enxaqueca é a segunda causa mais comum de cefaleia, acometendo cerca de 15% das mulheres e 8% dos homens num período de um ano. O paciente típico com enxaqueca é uma mulher, entre 30-50 anos, cujo quadro iniciou-se na infância ou adolescência, havendo um familiar próximo acometido em 60- 80% dos casos. A fisiopatologia não é bem explicada. Sabemos que o encéfalo do paciente com enxaqueca é hiperexcitável e fatores desencadeantes como mudanças climáticas, estresse, esforço físico, calor, odores, alimentos, jejum, bebidas alcoólicas, período pré-menstrual podem iniciar uma crise. A serotonina e a dopamina têm papel na fase de dor da crise de enxaqueca. O peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP) também parece estar relacionado à patogênese da enxaqueca. Existe um subtipo denominado “enxaqueca hemiplégica familiar” que parece estar ligado a mutações dos canais de cálcio e de sódio/potássio. QUADRO CLÍNICO A enxaqueca é caracterizada por 5 fases: 1. PRÓDROMO ou SINTOMAS PREMONITÓRIOS: em cerca de 60% das crises, pode surgir irritação, fadiga, dificuldade de concentração, sono agitado, avidez por doces e mal-estar, dentre outros, precedendo a dor em até dois dias; 2. AURA: em cerca de 20% das crises, temos a enxaqueca com aura, caracterizada pela presença de sinais e sintomas neurológicos focais, como escotomas cintilantes, escurecimento da visão, dormência ou parestesias (periorais, nas mãos ou nos pés), que podem surgir antes, durante (mais frequentemente) ou logo após a cefaleia. A aura pode acompanhar a cefaleia ou precedê-la em até uma hora. A enxaqueca sem aura é a mais frequente, correspondendo a 80% dos casos! É chamada, por muitos autores, de “enxaqueca comum”. A enxaqueca com aura, que corresponde a 20% dos casos, é também chamada de “enxaqueca clássica”. A aura mais comum é a visual. 3. DOR: a cefaleia é de forte intensidade, pulsátil ou latejante, geralmente unilateral e na região frontotemporal, mas às vezes é bilateral e assume outras localizações! A dor tem duração entre 4 e 72h e pode ser agravada pela atividade física ou mesmo pelo movimento da cabeça. Costuma melhorar quando o paciente permanece em repouso num ambiente silencioso e pouco iluminado. 4. SINTOMAS ASSOCIADOS: náusea, vômitos, fonofobia, fotofobia, osmofobia etc. O sintoma mais comum é a náusea (87% dos casos). 5. PÓSDROMO: é a fase da exaustão. Os pacientes podem ficar horas ou dias cansados e astênicos, precisando de um período de repouso para seu completo restabelecimento. Em crianças, as crises de enxaqueca são frequentemente associadas à dor abdominal e vômitos, podendo ainda haver febre. Além disso, a enxaqueca em crianças e adolescentes é mais frequentemente bilateral do que nos adultos. 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 FORMAS RARAS DE ENXAQUECA Quando a aura é acompanhada por hemiparesia/plegia de face e membros, estamos diante de um caso de enxaqueca hemiplégica. Quando presentes pelo menos dois sintomas dentre vertigem, zumbido, hipoacusia, diplopia, disartria, ataxia e redução do nível de consciência, temos um distúrbio funcional do tronco encefálico, caracterizando um episódio de enxaqueca com aura do tronco cerebral, OU enxaqueca basilar; DIAGNÓSTICO O diagnóstico da enxaqueca é essencialmente clínico; Existem critérios diagnósticos, na qual é caracterizando como enxaqueca quando: Ocorrência de pelo menos cinco episódios de cefaleia com duração de 4 a 72 horas e que apresentem as seguintes características: Cefaleia com pelo menos duas das seguintes características: unilateral, pulsátil, intensidade moderada a severa e piora com atividade física diária; Presença de náusea, vômitos, fotofobia ou fonofobia (importante para diferenciar da cefaleia tensional); História e exame físico não sugestivos de outras doenças orgânicas que possam causar cefaleia (em resumo, sem “sinais de alarme”) Embora teoricamente precisemos de 5 episódios para fechar o diagnóstico de enxaqueca, se a questão apresentar um quadro típico não temos dúvida de que se trata. No caso da enxaqueca com aura, são necessários apenas dois episódios para o diagnóstico! TRATAMENTO O primeiro passo é esclarecer o paciente a respeito do caráter benigno e geralmente transitório, porem incurável da enxaqueca. Felizmente existem algumas medidas não farmacológicas, que podem reduzir a frequência dos episódios de enxaqueca: dieta saudável e balanceada, exercício físico, padrão de sono regular, evitar álcool e cafeína em excesso e evitar estresse psicológico. Uma vez que evitar o estresse nem sempre é possível, medidas como meditação, ioga e até mesmo hipnose podem ser incentivadas. Ainda assim,a maioria dos pacientes precisava de um tratamento farmacológico, seja ele abortivo (durante as crises) ou profilático (para evitar novas crises). TRATAMENTO ABORTIVO (CRISE): TRIPTANOS (droga de escolha): São agonistas seletivos dos receptores serotonérgicos 5-HT1, levando à vasoconstrição preferencial dos vasos cerebrais e meníngeos. Uma vez que podem causar vasoespasmo em outras artérias, são contraindicados em pacientes com hipertensão arterial não controlada ou doença coronariana. Também devem ser evitados em gestantes, pelo risco de abortamento. Entre os efeitos adversos estão alterações sensoriais predominantes na cabeça e extremidades (dormência, formigamento, calor) e vertigem. Além disso, podem causar síndrome serotoninérgica quando associados a inibidores seletivos da receptação de serotonina; Os triptanos não servem para prevenir crises de enxaqueca – seu uso deve ser restrito ao período dos sintomas. O primeiro e ainda mais utilizado representante desta classe é o sumatriptano (Imigran®, Sumax®): podemos utilizá-lo, via oral, nas doses de 25, 50 ou 100 mg, ou ainda através de injeção subcutânea, 6 mg. Podemos ainda ter spray intranasal. A eficácia aumenta bastante com o início precoce da droga (paciente ainda com dor leve). Ele pode ser repetido dentro de 1-2h, respeitando as doses máximas de 200 mg/dia (VO) ou 12 mg/dia (via subcutânea). A associação com AINE de média/longa ação (ex.: naproxeno 500 mg VO) pode potencializar o efeito do triptano. DERIVADOS DE ERGOTAMINA São agonistas não seletivos da serotonina, atuando em todos os subtipos de receptores serotonérgicos. Esta foi a primeira classe de fármacos eficaz no tratamento das crises de enxaqueca. Seus representantes, a ergotamina e a di- hidroergotamina, são comercializados atualmente em comprimidos de 1 mg, em associações com cafeína e analgésicos (os 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 nomes comerciais mais comuns são Cefaliv® e Cefalium®). Também está disponível a ampola de di- hidroergotamina 1 mg para uso parenteral. Seus efeitos adversos, além daqueles descritos para os triptanos, incluem náusea, vômitos e isquemia de extremidades; OUTROS VASOCONSTRICTORES: Isomepteno (disponível em combinação com dipirona e cafeína – a popular Neosaldina®) um a dois comprimidos contendo 30 mg de isomepteno por vez (no máximo oito comprimidos/dia); ANALGÉSICOS COMUNS E AINES Drogas como paracetamol (500 mg a 1 g VO); dipirona (1 g VO ou IV diluída no soro glicosado 5%), diclofenaco (100 mg VO), naproxeno (500 a 825 mg VO), cetoprofeno (75 mg VO) e derivados dos salicilatos (AAS 1 g VO) também são úteis no tratamento abortivo das crises de enxaqueca. Uma associação com bons resultados é paracetamol, AAS e cafeína. OPIÓIDES Devem ser evitados sempre que possível, em especial a meperidina. Uma situação relativamente comum de uso do opioide na migrânea é na gestante com crise refratária a analgésicos comuns/AINE (lembre-se que essas pacientes não devem receber vasoconstritores). Neste caso, podemos usar a associação codeína 30 mg + paracetamol 500 mg, por exemplo (Tylex®). Nos pacientes com sintomas de pródromos e aura, devemos acrescentar um antiemético como a metoclopramida (10 mg VO – ou IV, no caso de vômitos). No caso de falha terapêutica aos esquemas anteriores, podemos usar um neuroléptico: clorpromazina (Amplictil®) 0,1 mg/kg IV em três minutos; Obs: Um artigo publicado pelo British Medical Journal relatou benefício do uso da dexametasona na prevenção de recorrência precoce das crises de enxaqueca. TRATAMENTO PROFILÁTICO: A principal indicação de tratamento preventivo para as crises de migrânea é a presença de três ou mais crises por mês. Outras indicações formais são a ausência de resposta à terapia abortiva das crises ou a presença de efeitos colaterais importantes às drogas usadas no tratamento abortivo. Uma vez obtida estabilização eficaz, o tratamento profilático é mantido durante 5-6 meses e então retirado gradualmente. BETABLOQUEADORES Permanecem como as drogas de primeira escolha na profilaxia da enxaqueca. O propranolol (80-320 mg/dia) e o atenolol (50-150 mg/dia) são os mais utilizados. ANTIDEPRESSIVOS: Amitriptilina (10-50 mg/dia); nortriptilina (25-75 mg/dia); venlafaxina (37,5-150 mg/dia). ANTICONVULSIVANTES: Valproato de sódio (800-1.200 mg/dia); topiramato (25-200 mg/dia). BLOQUEADORES DOS CANAIS DE CÁLCIO: Flunarizina (5 mg à noite); verapamil (80-480 mg/dia). Dentre as novidades para o tratamento profilático da enxaqueca, encontramos estimulação magnética transcraniana de pulso único (sTMS), estimulação elétrica transcutânea do nervo supraorbital e injeção de toxina botulínica na musculatura facial, esta última apenas para casos de enxaqueca crônica. CEFALEIA TENSIONAL Esta é a cefaleia primária mais frequente, com uma prevalência estimada entre 40-70% da população. O pico ocorre na quarta década de vida e há um discreto predomínio no sexo feminino. A fisiopatologia ainda é pouco compreendida, mas certamente atuam fatores centrais (encefálicos - semelhantes a enxaqueca) e fatores periféricos de contração exagerada e sustentada dos músculos do pescoço, couro cabeludo e até a face. Essa contração levaria a isquemia da fibra muscular e consequentemente dor. 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO Podemos observar dor de leve a moderada intensidade, de caráter opressivo, quase sempre bilateral. A duração da dor varia de 30min a 7 dias. Surge, principalmente, no final da tarde após um dia extenuante no trabalho. Ao contrário da enxaqueca, a dor não tem característica pulsátil e não costuma ser agravada por esforço físico ou impedir as atividades do paciente. Normalmente não há sintomas associados. Em alguns pacientes pode ser percebida, à palpação, hiperestesia e hipertonia da musculatura pericraniana. O diagnóstico é clínico, devendo ser realizados exames de imagem em caso de “sinais de alarme”. Para o diagnóstico segundo a Internacional Headache Society é necessário o preenchimento dos seguintes critérios: Duração de 30min a 7 dias; Pelo menos duas das características a seguir: ❯ Dor em pressão ou aperto (não pulsátil); ❯ Localização bilateral; ❯ Intensidade leve a moderada; ❯ Dor não é agravada por atividade física de rotina como caminhar ou subir escadas. Ausência de náusea e vômitos (na cefaleia tensional crônica pode haver vômitos e náusea leve); Apenas um dos sintomas a seguir pode estar presente (não é obrigatório): fotofobia ou fonofobia; Segundo a Classificação Internacional das Cefaleias, a cefaleia tensional pode ser dividida em três grupos de acordo com a frequência das crises: 1. Episódica pouco frequente ou infrequente (< 12 dias/ano); 2. Episódica frequente (12-180 dias/ano); 3. Crônica (> 180 dias/ano) – alguns autores classificam a cefaleia tensional como crônica quando ela ocorre durante mais de 15 dias em um mês; TRATAMENTO A maioria das pessoas com cefaleia tensional não procura o médico! A dor é leve e, apesar de atrapalhar, não impede as atividades habituais. O uso de analgésicos comuns, um banho quente e outras técnicas de relaxamento são medidas conhecidas e eficazes. O médico só é procurado quando a dor passa a ocorrer quase diariamente! ABORTIVO (CRISE): Deve ser realizado com analgésicos comuns ou Anti-Inflamatórios Não Esferoidais (AINE), via oral. Doses: paracetamol 650 a 1.000 mg com ou sem cafeína, dipirona 500-1.000 mg, diclofenaco potássico 50-100 mg, ibuprofeno 200-800 mg, dentre outros. PROFILÁTICO: Quando a frequência de episódios de cefaleia tensional é muito elevada (mais de 15 dias por mês), podemosclassifica-la como cefaleia tensional crônica. Para estes pacientes, devemos iniciar tratamento profilático com antidepressivos tricíclicos, como a amitriptilina. Deve-se iniciar uma dose baixa, que poderá ser aumentada gradualmente; Havendo melhora significativa (redução de mais de 80% na frequência das crises), a dose pode ser reduzida progressivamente. Dose: amitriptilina 10 a 50 mg/dia ao deitar. Os efeitos colaterais mais comuns dessas drogas são a sonolência, os efeitos anticolinérgicos (boca seca, vagina seca e constipação intestinal) e aumento do apetite para carboidratos (aumento de peso) CEFALEIA EM SALVAS Este grupo de cefaleias primárias se caracteriza por crises álgicas de curta duração, unilaterais e 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 muito intensas, frequentemente acompanhadas por sintomas autonômicos típicos; A cefaleia em salvas é incomum, com prevalência estimada em 0,1% da população. O paciente típico é um homem de meia-idade comumente etilista ou tabagista. A história familiar positiva é rara. O principal fator desencadeante da dor é a ingestão alcoólica, o que ocorre em até 70% dos indivíduos. Os episódios acontecem mais comumente à noite, acordando o paciente dentro das duas primeiras horas de sono. O termo “salvas” foi descrito em função da apresentação típica desta doença: diversas crises de curta duração quase diariamente, num intervalo de um a três meses, seguidas por um longo período assintomático. Também é chamada por alguns autores de cefaleia histamínica, cefaleia de Horton ou síndrome de Reader. A fisiopatologia desta cefaleia ainda é desconhecida, embora acredite-se que envolva a ativação de vias nociceptivas trigeminovasculares e a concomitantemente ativação autonômica craniana reflexa, responsável pelos sintomas e sinais associados a esta cefaleia. Alguns estudos com PET, sugerem que esta cefaleia se origine de distúrbios dos neurônios hipotalâmicos. QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO Os episódios de dor são quase sempre unilaterais localizados na região periorbitária, de grande intensidade (uma das dores mais fortes que se conhece), geralmente descritos como “facadas” e de curta duração (15-180min). Os episódios podem se repetir quase diariamente durante até dez semanas, geralmente no mesmo horário, sendo seguidos por um longo período assintomático (até um ano) e o posterior retorno das crises. Ou seja, é como se tivéssemos períodos de exacerbação e remissão! Durante a “exacerbação” da cefaleia em salvas ocorre uma crise por dia ou a cada dois dias, mas existem relatos de pacientes com até oito crises/dia! Cerca de 10-15% dos pacientes não apresentam os períodos de remissão, ou esses períodos duram menos de um mês (sendo chamada de cefaleia em salvas crônica). Durante a crise encontramos um paciente agitado, andando de um lado para o outro. Alguns pacientes chegam a bater a cabeça na parede e mesmo ameaçar o suicídio, devido à intensidade da dor! Existe uma clara associação das crises com um ou mais dos seguintes sintomas ou sinais (ipsilaterais à dor): Hiperemia conjuntival; Lacrimejamento; Congestão nasal; Sudorese facial; Miose, ptose e edema palpebral. Durante o primeiro episódio desta cefaleia, em virtude da forte dor, é importante a realização de ressonância magnética ou tomografia computadorizada e, caso este exame seja normal, punção lombar, para afastarmos outras hipóteses diagnósticas como hemorragia subaracnoide (5% dos casos têm TC normal) e infecção (meningite/encefalite). É especialmente importante o diagnóstico diferencial com tumores hipofisários, particularmente secretores de prolactina e GH. Aqui também temos critérios diagnósticos estabelecidos pela International Headache Society. Presença de pelo menos cinco crises; Dor severa ou muito severa, unilateral, orbitária, supraorbitária e/ou temporal, durando de 15 a 180 minutos, se não tratada; A cefaleia acompanha-se de, pelo menos, um dos seguintes aspectos: 7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 ❯ Presença de pelo menos um dos sinais a seguir, ipsilaterais à cefaleia: hiperemia conjuntival e/ou lacrimejo, congestão nasal ou rinorreia, edema palpebral ipsilateral, sudorose frontal e facial, rubor frontal e facial, miose e/ou ptose, sensação de ouvido cheio; ❯ Sensação de inquietude ou agitação. As crises têm uma frequência de uma a cada dois dias a oito por dia, durante o tempo em que a perturbação está ativa (lembrando que esta cefaleia é caracterizada por períodos de exacerbação e remissão); TRATAMENTO Na cefaleia em salvas recomenda-se, desde a primeira consulta, tanto a abordagem da crise quanto a terapia profilática. ABORTIVO (CRISE): Oxigênio a 100% (máscara), 10 a 12 L/min, durante 15 a 20 minutos, com o paciente sentado e inclinado para frente. Sumatriptano, 6 mg, subcutâneo, máximo de três injeções por dia (opções: sumatriptano ou zolmitriptano intranasais – as formulações orais não são eficazes). Estimulação vagal não invasiva (nVNS). Se refratária: tentar octreotide IV, ergotamina VO, lidocaína intranasal. PROFILÁTICO: Verapamil: 160-960 mg/dia, dividida em 2-3 doses (droga de escolha na maioria dos casos). Monitorar ECG. Valproato de sódio: 1-2 g/dia. Prednisona (iniciar 60-100 mg/dia durante pelo menos 5 dias, reduzindo a dose em 10 mg a cada dia) é uma opção interessante para crises de curta duração num intervalo inferior a dois meses. CEFALEIAS SECUNDÁRIAS As cefaleias secundárias se associam a doenças neurológicas ou sistêmicas, sendo a cefaleia nesses pacientes, geralmente apenas um dentre diversos sintomas e sinais. Embora seja um grupo bastante heterogêneo de doença, as causas da cefaleia secundária têm algo em comum, que é, quase sempre, a presença de pelo menos um dos sinais de alarme. 8 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 1. CEFALEIA DE HIPERTENSÃO CRANIANA: Costuma ser intensa, contínua, matinal e progressiva, associada a náuseas ou vômitos em jato. O exame físico mostra papiledema e/ou paralisia do VI par craniano, e/ou sinais neurológicos focais e/ou rigidez de nuca e alteração da consciência. Está indicada uma TC de crânio sem contraste. Se negativa, exame de liquor com medida de PIC e pesquisa de meningite. 2. HIPERTENSÃO INTRACRANIANA BENIGNA: É um diagnóstico de exclusão entre as causas de hipertensão intracraniana. Exames de imagem normais e liquor hipertenso (PIC>25). Mais comum em mulheres obesas. Exame físico: papiledema, paralisia do VI par craniano, ausência de sinais focais e de queda de consciência. Causas: idiopática, gestação, ACO, fenitoina, tetraciclina, sulfas. Tratamento: acetazolamida, punção lombar de alivio. 3. CEFALEIA DE ARTERITE TEMPORAL: É uma causa de cefaleia frontotemporal ou temporo-occipital uni ou bilateral em idosos (> 60 anos). É a vasculite sistêmica mais comum dos adultos. Relaciona-se a sintomas gerais: perda de peso, astenia e febre, além da síndrome de polimialgia reumática (dor e rigidez das cinturas escapular e pélvica) e a claudicação da mandíbula. Podem ser detectados nódulos palpáveis (e dolorosos) nas têmporas. O exame laboratorial pode mostrar anemia normo e VHS bastante elevado (> 55 ou mesmo 100 mm/h). Complicação temível: amaurose por vasculite da artéria oftálmica. Diagnóstico: biópsia da artéria temporal (arterite de células gigantes). Tratamento: prednisona em altas doses (80- 100 mg/dia). Resposta dramática ao corticoide é uma de suas principais características! 2. ENTENDER COMO É FEITO O MANEJO (TRATAMENTO FARMACOLÓGICO E NÃO FARMACOLÓGICO) DO PACIENTE COM CEFALEIA - POSOLOGIA, MECANISMO DE AÇÃO, EFEITOS ADVERSOS (DIPIRONA, METROCLOPRAMIDA, DIIDROERGOTAMINA,SUMATRIPTANO). DIPIRONA Mecanismo de ação: O mecanismo de ação da dipirona é via inibição da síntese de prostaglandina. A dipirona tem demonstrado inibir a ciclooxigenase, síntese do tromboxano, a agregação plaquetária induzida pelo ácido araquidônico e a síntese total de prostaglandina E1 e E2. Dose: 500-1000mg até 4x ao dia. Efeitos adversos de superdosagem: Após superdose aguda foram registradas reações como: náuseas, vômito, dor abdominal, deficiência da função renal/ insuficiência renal aguda (ex.: devido à nefrite intersticial) e, mais raramente, sintomas do sistema nervoso central (vertigem, sonolência, coma, convulsões) e queda da pressão sanguínea (algumas vezes progredindo para choque) bem como arritmias 9 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 cardíacas (taquicardia). Após a administração de doses muito elevadas, a excreção de um metabólito inofensivo (ácido rubazônico) pode provocar coloração avermelhada na urina. Efeitos colaterais: Síndrome de Kounis (aparecimento simultâneo de eventos coronarianos agudos e reações alérgicas ou anafilactoides); Reações anafiláticas; raramente exantema e, em casos isolados, síndrome de Stevens-Johnson (reação alérgica grave, envolvendo erupção cutânea na pele e mucosas) ou síndrome de Lyell ou Necrólise Epidérmica Tóxica (síndrome bolhosa rara e grave, caracterizada clinicamente por necrose em grandes áreas da epiderme); Anemia aplástica, agranulocitose e pancitopenia, incluindo casos fatais, leucopenia e trombocitopenia; Reações hipotensivas transitórias; Piora da função renal (oliguria, anuria, proteinúria e nefrite intersticial aguda); DIHIDROERGOTAMINA Mecanismo de ação: O mesilato de diidroergotamina é um bloqueador alfa- adrenérgico com um efeito estimulante direto sobre o músculo liso dos vasos sanguíneos periféricos cranianos e produz depressão dos centros vasomotores centrais. Este fármaco é também um antagonista parcial dos receptores da serotonina. Dose: Tomar 1 a 2 comprimidos ao primeiro sinal de enxaqueca; caso não haja melhora da sintomatologia, ingerir 1 comprimido a cada 30 minutos, até um máximo de 6 comprimidos ao dia. Efeitos adversos de superdosagem: Os sintomas da superdosagem aguda de ergotamina incluem cefaléia, vertigens, náuseas, vômitos, fenômenos alérgicos, ergotismo, choque, elevação súbita da pressão arterial. Raramente podem ocorrer insônia, nervosismo, náusea e diurese profusa. O tratamento da superdosagem consiste na remoção pela indução da emese, lavagem gástrica e tratamento sintomático. Pode ser indicado o uso de anticoagulantes e drogas vasodilatadoras Efeitos colaterais: Náuseas, vômitos, reações de hipersensibilidade, parestesia em pernas, dores musculares, entorpecimento e formigamento. SUMATRIPTANO Mecanismo de ação: São agonistas dos receptores da serotonina (5HT1B, 1D e, em menor escala, 5HT1F). Como eles são mais específicos que os ergotamínicos, evitam a vasoconstrição periférica mediada pelos receptores 5HT2A. Efeitos colaterais: Náuseas, vômitos e tontura; os triptanos, especialmente na formulação subcutânea, podem causar uma “sensação desagradável”: combinação de “aperto” na garganta, tórax e membros superiores, sensação de calor ou frio e parestesias nas extremidades; sonolência, cansaço, “dificuldade de raciocínio”, tontura, agitação, sonhos anormais, confusão mental e tremores METROCLOPRAMIDA Mecanismo de ação: Antagonista dopaminérgica de ação central - parecendo sensibilizar os tecidos para a atividade da acetilcolina. O efeito da metoclopramida na motilidade não é dependente da inervação vagal intacta, porém, pode ser abolido pelas drogas anticolinérgicas. A metoclopramida aumenta o tônus e amplitude das contrações gástricas (especialmente antral), relaxa o esfíncter pilórico, duodeno e jejuno, resultando no esvaziamento gástrico e no trânsito intestinal acelerados. Aumenta o tônus de repouso do esfíncter esofágico inferior. Dose: 1 comprimido, 3 vezes ao dia, via oral, 10 minutos antes das refeições. Efeitos adversos de superdosagem: Sintomas de superdose podem incluir reações extrapiramidais e sonolência, diminuição do nível de consciência, confusão e alucinações. Nesses casos deve-se proceder ao tratamento sintomático habitual, o tratamento para problemas extrapiramidais é somente sintomático (benzodiazepinas em crianças e/ou medicamentos anticolinérgicos e antiparkinsonianos em adultos). Os sintomas são autolimitantes e geralmente desaparecem em 24 horas. A diálise não parece ser método efetivo de remoção da metoclopramida em caso de superdose. Nos casos de metemoglobinemia, esta poderá ser revertida pela administração intravenosa de azul de metileno; Problemas endócrinos durante tratamento prolongado relacionados com hiperprolactinemia (amenorreia, galactorreia, ginecomastia); Diarreia; Hipotensão; Bradicardia 3. RELACIONAR OS FATORES PSICOSSOCIAIS QUE PODEM DESENCADEAR A CEFALEIA.
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