Buscar

Epilepsia: Conceitos, Fisiopatologia e Classificação

Prévia do material em texto

1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
epilepsia 
 
CONCEITOS 
Epilepsia é um termo genérico que se refere ao 
fenótipo de crises convulsivas recorrentes e 
espontâneas, isto é, não necessariamente 
provocada por um fator reversível e evitável. Por 
definição é preciso que tenha havido 2 ou mais 
crises convulsivas espontâneas (num intervalo 
>24h) para se estabelecer o diagnóstico de 
epilepsia; É UMA CRISE EPILÉPTICA DE REPETIÇÃO. 
Crise epiléptica: é uma alteração temporária e 
reversível do funcionamento do cérebro. Durante 
um curto período de tempo (segundos ou 
minutos), uma parte do cérebro manda 
descargas elétricas anormais e excessivas. 
Convulsão: é um termo usado para significar 
atividade motora substancial durante uma crise. 
Tal atividade pode ser tônica, clônica, mioclônica 
ou tônico-clônica. 
Estado do mal epiléptico: é definido como uma 
crise prolongada. Pode ser: 
 Status convulsivo: crises com mais de 30 
minutos de duração. Já é considerado caso 
apresente uma convulsão única com duração 
>5min. 
 Status não convulsivo: crises convulsivas 
sem recuperação da consciência entre elas. 
FISIOPATOLOGIA 
A doença se caracteriza por descargas elétricas 
neuronais excessivas. Se essa descarga estiver 
apenas em uma parte do cérebro, teremos as 
crises parciais ou focais. Se envolver os dois 
hemisférios, teremos as crises generalizadas. E se 
começar em uma parte do hemisfério e se 
propagar para os dois hemisférios, teremos as 
crises focais evoluindo para crises generalizadas. 
Essa descarga excessiva pode ocorrer por 
aumento da excitação neuronal (principal é o 
glutamato) ou por falta da inibição neuronal 
(principal inibidor é o ácido-gama-aminobutírico). 
Por resultar de um desequilíbrio ente excitação e 
inibição neuronal, diversos fatores que interferem 
nessas propriedades são capazes de induzir uma 
crise convulsiva. Assim, mesmo um cérebro 
absolutamente normal é susceptível desde que 
exposto a cirscutancias apropriadas. 
Por exemplo, certas drogas diminuem o limiar 
convulsivo, fazendo com que desencadeantes 
como estresse físico ou mental (incluindo privação 
de sono) consigam provocar uma crise tônico-
clônica generalizada num paciente sem história 
previa de epilepsia. 
ETIOLOGIA 
A idade é um fator endógeno relevante, haja vista 
que o limiar convulsivo varia em função do grau 
de maturidade do SNC. É por isso, que muitas 
crianças apresentam a chamada convulsão febril 
sem desenvolver posteriormente qualquer 
distúrbio neurológico. 
A história familiar de convulsão é outro fator de 
predisposição importante. 
Além disso, traumas cranianos tem chance de 
resultar em epilepsia subsequente. Acredita-se 
que redes neuronais previamente hígidas se 
tornem hiperexcitáveis após esse tipo de trauma, 
constituindo focos epilépticos permanentes. 
No caso das síndromes genéticas, os genes 
implicados geralmente codificam a síntese de 
receptores ou canais iônicos defeituosos que se 
localizam na membrana neuronal. 
 PERIODO NEONATAL: doenças congênitas, 
trauma, anóxia e desordens metabólicas. 
 CRIANÇAS DE 3 MESES A 5 ANOS: 
predominam as convulsões febris, mas 
também temos causas idiopáticas e 
infecções. 
 ENTRE 5 e 12 ANOS: a causa mais comum é 
a genética; 
 ADULTOS JOVENS: o TCE, a 
neurocisticercose, abuso de drogas ilícitas 
e a abstinência alcoólica compõe as 
principais etiologias. 
 IDOSOS: a causa mais comum é a doença 
cerebrovascular, além disso, temos os 
tumores cerebrais, TCE, hematoma 
subdural, infecção do SNC e doença 
degenerativa (Alzheimer). 
 
2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
 
EPILEPSIA PRIMÁRIA OU IDIOPÁTICA: Por mais que 
investigue esse paciente, não se encontra causa 
orgânica para sua epilepsia. Geralmente abem o 
quadro na infância e adolescência e tendem a 
desaparecer na idade adulta. 
EPILEPSIA SECUNDÁRIA OU SINTOMÁTICA: Para ser 
considerada como secundaria ou sintomática, o 
paciente tem que apresentar duas ou mais crises 
associadas a distúrbios metabólicos, eletrolíticos, 
intoxicação exógena, abstinência de álcool.. 
ATENÇÃO: Todo adulto que apresente uma crise 
epiléptica, não importa se focal ou generalizada, 
deve ter como hipótese diagnóstica a crise 
secundária, portanto, há necessidade de 
investigação etiológica de todos os casos. 
CLASSIFICAÇÃO 
As crises podem ser FOCAIS ou GENERALIZADAS. 
Além disso, as crises focais podem sofrer um 
processo de generalização secundária, isto é, 
iniciam em um foco restrito e depois ocorre 
disseminação para todo o cérebro. 
 
 CRISES FOCAIS 
A atividade epiléptica se restringe a determinada 
área do córtex cerebral. Quando há preservação 
plena da consciência a crise é denominada crise 
focal perceptiva. Porém, se a consciência for 
comprometida, a crise é considerada focal 
disperceptiva. 
Como a crise focal é restrita a um local do 
cérebro, os sintomas dependerão da área 
afetada. 
Crises frontais vão apresentar manifestações 
motoras, enquanto crises parietais apresentaram 
manifestações sensitivas, crise occipitais 
manifestações visuais, crises temporais alterações 
comportamentais. 
Crises convulsivas focais de caráter “não motor” 
(ex.: parestesias; alterações visuais, auditivas, 
psíquicas, autonômicas) são genericamente 
chamadas de auras. 
1. PERCEPTIVAS (SIMPLES) 
Sintomas de uma determinada área cerebral, mas 
sem alteração da consciência. Antigamente 
denominada "crise simples". 
 
3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
2. DISPERCEPTIVAS (COMPLEXAS) 
Normalmente surge no lobo frontal ou temporal. 
Caracterizada pela alteração da consciência 
(não responsividade), o que anteriormente 
denominava-se "crise complexa". Período pós-
ictal marcado por desorientação. 
 CRISE GENERALIZADA 
As crises generalizadas originam-se 
simultaneamente dos dois hemisférios cerebrais. 
Nesse tipo de crise, como o sistema reticular 
ativador ascendente é acometido, o paciente 
perderá a consciência. Ele pode perder a 
consciência por poucos segundos várias vezes ao 
dia (crise de ausência) ou até perder a 
consciência por minutos com movimentos (crise 
tônico-clônica generalizada). Normalmente, 
nessas crises há envolvimento muscular, seja com 
aumento da contração (tônica, clônica, 
mioclônica, espasmo) ou com diminuição da 
contração (crise atônica). 
1. CRISE TÔNICO CLÔNICA GENERALIZADA 
(GRANDE MAL) 
É o tipo mais comum de crise convulsiva induzida 
por fatores desencadeantes (ex: distúrbios 
metabólicos) e por esse motivo é a mais 
encontrada na pratica. 
Essas crises começam com uma fase tônica 
(contração simultânea dos músculos esqueléticos 
do corpo até a despolarização concomitante de 
todos os neurônios do córtex motor, nos dois 
hemisférios). Essa fase tem curta duração (10-20 
segundos). 
É seguida pela fase clônica (período de 
relaxamento muscular sobreposto à contração 
tônica de base, o que corresponde a ativação 
reflexa dos interneuronios inibitórios). 
Ocorre o grito epiléptico, os quatro membros são 
afetados e pode ocorrer sialorreia com liberação 
esfincteriana. Após a crise, o paciente entra no 
período pós-ictal, de aproximadamente 15-30min, 
apresentando letargia, confusão mental e 
sonolência 
A evolução da crise no EEG é a seguinte: na fase 
tônica surge um padrão generalizado de ondas 
rápidas de baixa voltagem, cuja amplitude 
aumenta progressivamente até se transformar em 
polipontas de alta voltagem. A fase clônica 
começa quando as polipontas de alta voltagem 
passam a ser periodicamente interrompidas por 
ondas lentas, criando um padrão “ponta-onda” 
cuja frequência vai diminuindo até predominar 
um traçado difusamente lentificado, que 
corresponde ao termino da fase ictal. A 
atividade elétrica volta ao normal na 
medida que o paciente recobra a 
consciência. 
2. CRISES DE AUSÊNCIA (PEQUENO 
MAL) 
É caracterizada por episódiossúbitos e breves 
(duração de segundos) de perda de consciência 
sem perda de tônus postural. A consciência 
retorna de maneira súbita, sem que haja 
manifestação pós-ictal. Muitas vezes nem o 
próprio paciente se dá conta de sua ocorrência, 
pois trata de verdadeiros lapsos no funcionamento 
normal do indivíduo, ocorrendo dezenas a 
centenas de vezes durante o dia. 
Apesar da perda de consciência ser a única 
manifestação da crise de ausência, não é raro a 
presença de automatismos sutis durante o evento 
(piscar os olhos, mastigar, clonus bilateral das 
mãos). 
Habitualmente se iniciam na infância (faixa etária 
entre 4-8 anos) e representam o principal tipo de 
crise em 15-20% das crianças epilépticas. 
No EEG, observa-se complexos “ponta-onda” de 3 
Hz bilaterais e simétricos (isto é, em todas as 
derivações ao mesmo tempo), sobrepostos a um 
traçado de base NORMAL; 
Esses complexos duram poucos segundos e 
podem ou não ser acompanhados de 
manifestações clínicas. A hiperventilação é um 
desencadeante previsível, e durante o EEG deve 
ser feita voluntariamente a fim de documentar um 
episódio. 
Nos quadros de pequeno mal isolado, o 
prognóstico é bom: a maioria dos pacientes 
melhora espontaneamente com o passar do 
tempo (raro após 20 anos de idade). Alguns 
pacientes, no entanto, desenvolvem outras 
formas de crise convulsiva, mantendo-se 
epilépticos pelo resto da vida. 
Muitos pais e professores não reconhecem as 
crises de ausência. O cenário clássico é levar a 
criança ao neurologista porque parece que a 
criança está sempre sonhando acordada ou tem 
um baixo desempenho escolar. 
 
4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
 
AUSÊNCIA ATÍPICA: Difere da ausência típica pelo 
fato de os lapsos de consciência serem mais 
duradouros e não apresentarem início e fim tão 
súbitos, isto é, a crise evolui de forma gradual. Em 
geral há sinais motores mais grosseiros durante o 
evento... No EEG, observa-se complexos “ponta-
onda” com frequência ≤ 2,5 Hz (atividade lenta), 
sobrepostos a um traçado de base ANORMAL. As 
crises de ausência atípica aparecem no contexto 
de alterações estruturais difusas do cérebro, sendo 
comum a existência de franco retardo mental. 
 
3. CRISES CLÔNICAS 
Presença de abalos musculares clônicos. 
4. CRISES TÔNICAS 
Aumento do tônus muscular. Duram de 10 a 20 
segundos. 
5. CRISES MIOCLÔNICAS 
Contrações musculares súbitas semelhantes a 
choques, com preservação da consciência. 
Frequentemente ocorrem após privação do sono, 
ao acordar ou ao início do sono. Acontece, por 
exemplo, quando sonhamos que estamos em 
queda livre e, de repente, acordamos. Diz-se que 
a mioclonia representa uma crise convulsiva 
quando sua ocorrência está sincronizada com 
surtos de atividade epileptiforme no EEG 
(complexos ponta-onda difusos). 
Em geral, as crises mioclônicas coexistem com 
outras formas de crise convulsiva em portadores 
de epilepsia, porém, é a forma predominante 
numa síndrome chamada epilepsia mioclônica 
juvenil 
6. CRISES ATÔNICAS 
Caracterizada por perda do tônus muscular (1-2 
segundos). Leva o indivíduo a quedas que 
realmente machucam e podem ser 
desencadeadas por sustos. 
O EEG revela um padrão difuso de complexos 
“ponta-onda” imediatamente seguidos por ondas 
lentas, que correspondem à perda do tônus 
muscular. 
7. ESPASMOS 
São contrações tônicas rápidas, de 1 a 15 
segundos. Normalmente ocorrendo várias vezes 
ao dia, com preferência ao acordar ou durante o 
sono. São semelhantes às crises tônicas. 
No EEG observa-se hipsarritmia, um padrão 
caracterizado por um traçado de base caótico, 
com ondas pontiagudas multifocais e irregulares. 
Os espasmos epilépticos recorrentes caracterizam 
a clássica síndrome de West (“espasmos infantis”), 
comuns em crianças muito pequenas decorrente 
da imaturidade do SNC. 
 
 CRISES FOCAIS QUE GENERALIZAM 
Aqui o paciente inicia com alguma manifestação 
focal (motora ou aura) que em seguida se 
transforma numa crise generalizada, 
habitualmente do tipo tônico-clônica. Na pratica 
é difícil caracterizar esta evolução, pois as 
manifestações focais iniciais podem ser sutis e de 
curta duração, passando despercebidas. Na 
dúvida, a videoeletroencefalografia contínua 
pode ser de grande auxílio. 
 
5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
CRISES EPILÉPTICAS 
São desordens com características clinicas, 
patológicas, radiológicas, eletroencefalográficas 
e genética peculiares, nas quais a epilepsia é uma 
manifestação preponderante. 
1. AUSÊNCIA INFANTIL OU PEQUENO MAL 
Idade: início entre 5 e 8 anos. 
Crise: perda total da consciência, com duração 
de 5 a 25 segundos, até 200 vezes ao dia. Pode ser 
acompanhada de componente motor (alteração 
do tônus, movimentos clônicos), autonômico 
(palidez, dilatação pupilar, taquicardia) e 
automatismos (continuar a fazer o que estava 
realizando, movimentos faciais). 
As crises podem ser desencadeadas por 
hiperventilação, estresse, hipoglicemia. Cerca de 
40% dos pacientes desenvolvem também crises 
tônico-clônicas generalizadas. 
Eletroencefalograma: complexos ponta-onda na 
frequência de 3 Hertz; 
2. EPILEPSIA FOCAL BENIGNA DA INFÂNCIA 
(ROLÂNDICA) 
Idade: 3 a 13 anos. 
Crise: focal perceptiva (motora ou sensitiva). 
Normalmente envolvendo língua, lábios, 
musculatura da faringe, bochechas. As crises 
geralmente são curtas (um a dois minutos). 
Quando noturna, é comum se tornar 
generalizada. 
Eletroencefalograma: complexos ponta-onda 
centrotemporais. 
3. EPILEPSIA MIOCLÔNICA JUVENIL 
(SÍNDORME DE JANZ) 
Idade: 13 a 20 anos. 
Crise: crises mioclônicas principalmente ao 
despertar e geralmente desencadeadas por 
privação do sono. Frequentemente os pacientes 
evoluem com crises tônico-clônicas após as 
mioclonias. Também pode haver crises de 
ausência. Em cerca de 1/3 dos casos há 
fotossensibilidade. 
Eletroencefalograma: complexos ponta-onda 
difusos (geralmente entre 3,5 e 4,5 ciclos por 
segundo). 
 
 
 
4. EPILEPSIA DO LOBO TEMPORAL MESIAL 
É a epilepsia focal mais comum no adulto (40% dos 
casos). A causa mais comum é a esclerose mesial 
temporal (esclerose hipocampal). 
Crise: caracteriza-se na maioria das vezes por 
crises focais disperceptivas recorrentes (olhar fixo, 
automatismos orais e manuais) de duração de um 
a dois minutos. 
Frequentemente são seguidas de crises tônico-
clônicas generalizadas. Alguns pacientes podem 
apresentar distúrbios da memória e pode haver 
história de crises febris na infância. 
Eletroencefalograma: atividade epileptiforme nas 
regiões temporais médio-basais. 
Obs.: a ressonância magnética de crânio é capaz 
de mostrar sinais indicativos de esclerose mesial 
temporal. 
Podem não responder aos anticonvulsivantes, mas 
a intervenção cirúrgica costuma ser uma boa 
opção. 
 
5. SÍNDROME DE WEST (ESPASMOS INFANTIS) 
Compreende a seguinte tríade: 
 Espasmos infantis; 
 Retardo do desenvolvimento 
neuropsicomotor; 
 EEG com padrão de hipsarritmia. 
Idade: inicia-se quase exclusivamente no primeiro 
ano. 
Crise: espasmos breves intermitentes da 
musculatura do pescoço, tronco e membros, 
 
6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
podendo levar a movimentos de extensão ou 
flexão. 
6. SÍNDROME DE LENNOX-GASTAUT 
Idade: início geralmente entre dois e dez anos. 
Crise: podem apresentar diversos tipos de crises 
(tônicas, atônicas, mioclônicas, tônico-clônicas, 
focais disperceptivas), associadas a retardo 
mental e distúrbio comportamental. 
Etiologia: pode ser devida à encefalopatia 
anóxica prévia, ou precedida pela síndrome de 
West, ou criptogênica. 
Eletroencefalograma: complexo de ponta-onda 
de frequência lenta (até 2,5 ciclos/segundo) e 
atividade de base caótica na vigília. 
Obs.: geralmente são refratárias ao tratamento 
antiepiléptico. Carbamazepina piora as crises; 
DIAGNÓSTICO 
A primeira pergunta a ser respondida é: foi oprimeiro episódio ou o paciente já era 
sabidamente epiléptico? 
 PRIMEIRO EPISÓDIO 
Neste caso, temos três prioridades: (1) fazer 
diagnóstico diferencial com outros eventos 
paroxísticos (foi convulsão mesmo?); (2) identificar 
fatores precipitantes; (3) decidir se é necessário 
lançar mão de profilaxia com drogas 
antiepilépticas. 
É preciso coletar uma anamnese minuciosa, não 
apenas com o paciente, mas também com 
eventuais testemunhas, questionando o que 
aconteceu antes, durante e depois do evento. 
Deve-se também questionar a presença de 
fatores precipitantes como crise febril na infância, 
epilepsia na família, história de traumas, AVC, 
neoplasia. Além de drogas, privação de sono e 
doenças sistêmicas. 
O exame físico precisa ser abrangente, em busca 
de sinais de doenças infecciosas, 
cardiovasculares e/ou insuficiências orgânicas 
(renal, hepática). Todos os pacientes devem ser 
submetidos a exame neurológico completo. 
Uma bateria de testes laboratoriais para rastreio 
de alterações homeostáticas sistêmicas sempre 
deve ser solicitada após um primeiro episódio de 
crise convulsiva. 
 
ELETROENCEFALOGRAMA (EEG); não é feito de 
rotina, mas torna-se obrigatório quando se 
suspeita de epilepsia, ou seja, quando o paciente 
tem 2 ou mais crises espontâneas. O objetivo é 
tentar caracterizar o padrão epiléptico, o que 
pode sugerir um diagnóstico especifico. No 
entanto, é importante lembrar que um EEG 
normal, mesmo durante o evento, não 
necessariamente afasta o diagnóstico de crise 
convulsiva. Assim como um indivíduo normal pode 
apresentar atividade epileptiforme no EEG. 
É importante perceber que crises generalizadas 
SEMPRE alteram o EEG convencional! 
Como as crises costumam ser infrequentes e 
imprevisíveis, pode-se lançar mão do EEG 
ambulatorial contínuo (≥ 24h), ou então internar o 
paciente num quarto especial onde é feita a 
videoeletroencefalografia contínua; 
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA: é o método de 
preferência após um episódio de crise convulsiva. 
TC DE CRÂNIO: por ser menos sensível, é reservada 
para casos em que se suspeita de uma condição 
urgente (tumor, infecção) e a RN não se encontra 
disponível. 
 PACIENTE SABIDAMENTE EPILÉPTICO 
Neste caso, temos duas prioridades: (1) identificar 
fatores precipitantes; (2) decidir se o tratamento 
atual está adequado. 
É importante salientar que quando existe um 
precipitante óbvio, como a má adesão ao 
tratamento anticonvulsivante (uma das principais 
causas de crise em indivíduos epilépticos), não se 
faz necessário a realização de exames 
complementares. 
 
 
 
 
7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL 
 SÍNCOPE X CRISE CONVULSIVA 
Síncope é a perda da consciência e do tônus 
postural devido a um estado de baixo fluxo 
sanguíneo cerebral. 
 
 CRISES PSICOGÊNICAS 
São eventos não convulsivos (EEG normal) em que 
o paciente tradicionalmente simula uma crise 
tônico-clônica generalizada. 
As crises psicogênicas se associam a distúrbios 
psiquiátricos, como o transtorno conversivo. 
Uma medida que pode ser útil é a dosagem de 
prolactina sérica nos primeiros 30 minutos do 
período pós-ictal. Em geral, as crises convulsivas 
verdadeiras aumentam a prolactina (> 2x o LSN), 
mas a pseudocrise não... 
TRATAMENTO CRÔNICO 
As drogas antiepilépticas (DAE) agem 
primariamente bloqueando o início ou a 
disseminação da hiperexcitação elétrica dos 
neurônios. 
Dentre os principais mecanismos de ação das 
DAE, podemos citar: 
1. Inibição de canais de Na+ (responsáveis 
pelo início do potencial de ação) de 
maneira “frequência-dependente”, como 
fenitoína, carbamazepina, topiramato e 
lamotrigina; 
2. Inibição de canais de Ca2+ voltagem-
sensíveis (responsáveis pela evolução do 
potencial de ação), como topiramato e 
lamotrigina; 
3. Abertura de canais de K+ (hiperpolarizam 
a célula e reduzem/dificultam a 
formação/transmissão dos potenciais de 
ação), como ezogabina; 
4. Bloqueio dos receptores de glutamato 
(excitatórios), como topiramato e 
lamotrigina; 
5. Aumento da atividade dos receptores do 
GABA (inibitórios), como 
benzodiazepínicos e barbitúricos; 
6. Aumento na síntese e oferta de GABA, 
como ácido valproico, gabapentina e 
tiagabina; 
7. Diminuição da transmissão sináptica, 
como levetiracetam. 
O objetivo é manter o paciente 100% livre das 
crises e sem efeitos colaterais. 
Sempre que possível deve-se tentar a 
MONOTERAPIA na menor dose possível. 
O tratamento deve começar quando o paciente 
apresentar crises idiopáticas ou quando houver 
uma causa que não possa ser prontamente 
corrigida. 
QUAL DROGA COMEÇAR? 
 Ausências » etossuximida ou valproato. 
 Ausências + tônico-clônica generalizada » 
valproato. 
 Tônico-clônica generalizada » 
carbamazepina, fenitoína, valproato, 
lamotrigina, topiramato. 
 Focal perceptiva ou disperceptiva » 
carbamazepina, fenitoína, valproato, 
lamotrigina, levetiracetam. 
 Focal evoluindo para tônico-clônica 
bilateral (incluindo epilepsia do lobo 
temporal) » carbamazepina, fenitoína, 
valproato. 
 Mioclônica » valproato, lamotrigina. 
 Espasmos infantis » ACTH ou vigabatrina. 
OBS: A LAMOTRIGINA é a droga de primeira 
escolha em TODOS os tipos de crise convulsiva. O 
ÁCIDO VALPROICO também, exceto nas crises 
focais. 
 
8 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
ATENÇÃO: carbamazepina, oxcarbazepina e 
fenitoína podem PIORAR crises de ausência, 
mioclônicas, tônicas e atônicas!!! 
Uma vez escolhida a droga, esta deve ter sua dose 
gradualmente aumentada até que o paciente 
fique livre de crises ou surjam efeitos colaterais 
(não existe uma regra rígida para titulação da 
dose, é “tentativa-erro” até achar uma dose 
adequada). 
Se mesmo com uma dose máxima tolerável as 
crises continuarem ocorrendo, deve-se ASSOCIAR 
uma segunda droga. Se as crises forem 
controladas, deve-se tentar desmamar a primeira 
droga; 
Deve-se estar atento às possíveis interações 
farmacológicas (ex.: redução dos níveis séricos de 
contraceptivos orais), efeitos teratogênicos e via 
de metabolização preferencial (renal ou 
hepática). 
É preciso salientar que TODAS as DAE podem 
causar paraefeitos similares de maneira dose 
dependente, como sedação, ataxia e diplopia. 
Algumas, em longo prazo, também podem induzir 
osteoporose (ex.: fenitoína). Logo, é preciso 
vigilância desses problemas... Hemograma, 
hepatograma e função renal são solicitados no 
início do tratamento, como parâmetros de base, 
devendo ser repetidos após alterações de dose. 
O nível sérico dos antiepilépticos não 
obrigatoriamente precisam ser medidos, mas 
podem ser uteis no início do tratamento para 
ajustar a dose ou para verificar a adesão ao 
tratamento. 
Cerca de 70% das crianças e 60% dos adultos que 
suprimem por completo a epilepsia com o uso de 
DAE conseguem interromper a medicação! Os 
principais preditores de sucesso para interrupção 
são: 
(1) Ausência de crises por 1-5 anos; 
(2) O paciente apresenta um único 
tipo de crise; 
(3) Exame neurológico normal, 
incluindo inteligência; 
(4) EEG normal. 
Na presença de todos esses critérios pode-se 
tentar “desmamar” gradualmente a DAE após um 
período de no mínimo dois anos de tratamento 
regular. A maioria das recidivas acontece nos 
primeiros três meses após a interrupção da DAE, e 
o paciente deve estar ciente deste fato. 
Nos casos de epilepsia refrataria, a conduta é 
associar uma segunda droga, em geral outro 
representante do grupo de primeira linha, porem 
de mecanismo de ação diferente. O risco de 
refratariedade é maior na presença de lesões 
estruturais do SNC e paciente que tem múltiplos 
tipos de crise. 
Algumas DAE interagem entre si, por exemplo: o 
ácido valproico diminui a metabolização da 
lamotrigina, aumentando os níveis séricos desta 
última 
TRATAMENTO CIRURGICO 
Cerca de 20% dos pacientes não respondem à 
combinaçãode duas ou mais DAE. Em muitos 
desses casos, a neurocirurgia pode permitir uma 
redução de doses ou mesmo a cura da epilepsia! 
O paciente que mais se beneficia da abordagem 
cirúrgica é aquele que possui um foco 
epileptogênico identificável e passível de 
ressecção, sendo o exemplo clássico a esclerose 
mesial do lobo temporal. 
Na epilepsia do lobo temporal, os procedimentos 
empregados são: a lobectomia temporal 
(ressecção da porção anteromedial do lobo 
temporal) ou a amigdaloipocampectomia 
(ressecção restrita do hipocampo e da amígdala 
cerebral). 
TRATAMENTO AGUDO 
A maioria das crises convulsivas ocorre fora do 
hospital e tem curta duração. Nestes casos, 
quando o paciente chega ao médico, a crise já 
cessou espontaneamente. 
Quando falamos de tratamento agudo de uma 
crise convulsiva, estamos nos referindo ao 
chamado status epiléptico, que é uma crise 
convulsiva contínua ou crises repetitivas sem 
recuperação da consciência entre os episódios. 
O estado do mal epiléptico é uma emergência 
medica, pois, a crise tônico-clõnica prolongada 
causa disfunção cardiorrespiratória, rabdomiólise 
e hipertermia, além de lesar diretamente os 
neurônios. A sua principal etiologia é a má adesão 
à terapia medicamentosa ou distúrbios 
metabólicos como hiponatremia, hipoglicemia. 
Antes de qualquer coisa, devemos excluir a 
possibilidade de causas potencialmente tratáveis 
gerando a convulsão, como hipoglicemia. Para 
isso, é recomendada a administração de glicose 
a 50% após tiamina IV (exceto em casos onde os 
níveis glicêmicos são conhecidos e estejam 
normais). 
 
9 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 
Em seguida, deve-se administrar lorazepam ou 
diazepam IV (no Brasil usamos o diazepam IV, pois 
não existe o lorazepam venoso). Para uso IM, a 
melhor droga é o midazolam. 
A partir daí, caso as convulsões persistam é 
necessário adicionar drogas. A primeira é a 
fenitoína. Outras opções são fosfenitoína, ácido 
valproico ou levetiracetam; 
O paciente refratário a duas classes de drogas é 
considerado portador de status refratário. O 
próximo passo é iniciar monitorização 
eletroencefalográfica contínua e anestesiar o 
paciente com midazolam, propofol,tiopental ou 
pentobarbital, procedendo à intubação 
orotraqueal.

Outros materiais

Materiais relacionados

Perguntas relacionadas

Perguntas Recentes