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OS ÓRGÃOS DA FALÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS Anna Christina Gonçalves De Poli Mestranda da PUC Paraná, advogada e professora universitária. 1. INTRODUÇÃO; 2 ÓRGÃOS DA FALÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS; 2.1 BREVE HISTÓRICO; 2.2 O JUIZ; 2.3 O MINISTÉRIO PÚBLICO; 2.3.1 O Ministério Público na Falência; 2.3.2 O Ministério Público na Recuperação Judicial; 2.3.3 O Ministério Público na Recuperação Extrajudicial; 2.4 O GESTOR JUDICIAL; 3 ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO DA INSOLVÊNCIA; 3.1 ADMINISTRADOR JUDICIAL; 3.1.1 Requisitos e Impedimentos; 3.1.2 Atribuições; 3.1.2.1 Na falência e recuperação judicial; 3.1.2.2 Na recuperação judicial; 3.1.2.3 Na falência; 3.1.3 Remuneração do Administrador Judicial; 3.1.4 Remuneração dos Auxiliares do Administrador Judicial; 3.1.5 Substituição e Destituição; 3.2 COMITÊ DE CREDORES; 3.2.1 Estrutura, Atribuições e Funcionamento; 3.2.3 Remuneração e Responsabilidade dos Membros do Comitê; 3.2.4 Impedimentos, Substituição e Destituição; 3.3 ASSEMBLÉIA GERAL DE CREDORES; 3.3.1 Competências; 3.3.1.1 Na recuperação judicial; 3.3.1.2 Na falência; 3.3.2 Estrutura e Representação; 3.3.3 Convocação e Deliberação; 3.3.4 Instalação; 4. CONCLUSÃO; 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 1 INTRODUÇÃO A atual Lei de Falências e Recuperação de Empresas, neste texto tratada simplesmente por LFRE, implantou organismos novos na administração da empresa insolvente1. Trouxe ainda figuras inovadoras, porém não auto- 1 O termo “empresa insolvente” será utilizado neste texto para designar aquele empresário cuja atividade encontra-se em qualquer tipo de crise, seja ela financeira, econômica ou patrimonial. 1 explicativas que terão de ser construídas pela doutrina e pelo estudo comparado de legislações alienígenas. A atuação dos órgãos deixa lacunas que precisam ser sanadas para melhor aplicação efetiva da lei. A remuneração do administrador judicial, dos membros do Comitê de Credores e do Gestor Judicial e a própria criação de alguns destes órgãos são facultativos dando margem a um excesso de poder de mando dos credores no processo de insolvência. Neste panorama, a Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, abre espaço para os credores participarem nas decisões de fundo, onde normalmente o prejuízo é sofrido pelo credor. O órgão da falência tido como supremo, o Juiz, é aquele que se encarregará de fiscalizar a atuação dos demais órgãos. Resta saber se tal órgão máximo está preparado para fiscalizar a aplicação da lei novel. Importa ressaltar que as conseqüências da aplicação das inovações trazidas pela lei são ainda desconhecidas. Se por um lado temos uma menor atuação do Ministério Público, de outro temos um livre agir do Juiz. A exemplificar: o juiz poderá escolher o administrador judicial e destituí-lo de ofício sem consulta prévia aos órgãos consultivos. Isso não dará margem às fraudes tão comuns hoje no processo de insolvência? Outra polêmica envolve questão cultural: os credores nacionais saberão como conduzir o processo de insolvência para o fim de restabelecer o devedor ou será apenas mais uma forma de obtenção de vantagens. Ainda se faz necessário ater-se a questões como: o fato da lei em seu artigo 65 tratar de um Gestor Judicial, este possui funções diferentes daquelas 2 atribuídas ao administrador do devedor? A lei sequer trata adequadamente do Gestor Judicial. No presente trabalho houve a intenção de sistematizar o que já foi dito pela doutrina sobre os órgãos da falência e recuperação de empresas, fazendo- se uma breve comparação com legislações estrangeiras. O texto está divido em dois capítulos: o primeiro capítulo trata dos órgãos da falência e recuperação de empresas. Trata portanto do Juiz e do Ministério Público, trazendo anotações sobre o gestor judicial; o segundo capítulo destina-se a tratar dos órgãos administrativos da falência e da recuperação de empresas. Optou-se pela divisão do texto na forma em que se apresenta por razões de ordem prática. A atual lei não traz um capítulo dedicado aos órgãos da falência e recuperação de empresas, deixando espalhado pelo texto da norma vários órgãos que interagem entre si, porém sem uma classificação. 2 ÓRGÃOS DA FALÊNCIA 2.1 Breve Histórico No Decreto-Lei 7661/1945, eram considerados órgãos da falência o Juiz, o Síndico e o Ministério Público2. Isso em razão dessas figuras terem participação na administração da falência naquela lei anterior. 2 Neste sentido Almeida, Amador Paes de. Curso de Falência e Concordata. 19ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p.229-250. 3 Alguns autores como Paulo Roberto Colombo Arnoldi e Amaury Campinho, classificavam os órgãos da falência de forma muito mais abrangente. Segundo ARNOLDI3 eram órgãos da administração da falência: a) o síndico; o liquidatário; c) o curador. Além daqueles que funcionam nos processos de falência por já fazerem parte na organização judiciária como: a) o juiz; b) o representante do Ministério Público; c) o escrivão; d)os peritos; e) os contadores; f) os avaliadores; g) os depositários; h) os advogados. Neste mesmo sentido abrangente, CAMPINHO4, afirmava serem órgãos da administração da falência: ... Todas as pessoas que atuam direta ou indiretamente no processo falimentar, como o Juiz, o representante do Ministério Público, o síndico, os serventuários da Justiça, os contadores, os avaliadores, os peritos, os depositários, o leiloeiro etc. Ao Juiz de Direito cabia as funções jurisdicionais (em geral de natureza cível e comercial, também podendo atuar na esfera criminal) e administrativas (supervisionava a atuação do síndico e também era responsável por medidas acautelatórias, tais como a venda antecipada de bens, a continuação do negócio etc). Ao Síndico cabia a função de administrar e representar os interesses da massa falida. Possuía um elenco de deveres que vinha descrito nos artigos 60 a 69 da Lei Falimentar e várias outras atribuições e obrigações espalhadas no texto legal, a exemplo do artigo 209, que tratava da forma de arrecadação dos bens do falido. O exercício da atividade de síndico gerava responsabilidade se mal conduzida e tais responsabilidades eram apuradas tanto na esfera cível como criminal, podendo, ainda, culminar com a pena de prisão. 3 ARNOLDI, Paulo Roberto Colombo. Falências e Concordatas. 2ª ed., ver., atual. e ampl. São Paulo: Editora de Direito, 1999. p. 216-217. 4 CAMPINHO, A Maury. Manual de Falência e Concordata. 8ª ed., rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 47. 4 A função atribuída pelo Decreto-Lei 7661/1945 ao Ministério Público, era a de “curador das massas”, o que de certa forma era errôneo tendo em vista que os bens do falido não eram administrados ou guardados pelo representante do Ministério Público. A Lei de Falências e Concordatas, além daquelas atribuições já expressamente escritas, ainda ampliava a atuação do Ministério Público em seu artigo 2105 sem critério algum, o que restou comprovado ser causa da demora no andamento dos processos falimentares. O número excessivo de intervenções do Ministério Público causou, ao longo do tempo, a insatisfação da classe, que ficou demonstrada na Carta de Ipojuca6 em seu item 4, inciso X. Algumas leis falimentares trazem um título dedicadoa identificar os órgãos do concurso mercantil. A lei mexicana indica no Título Segundo quais são estes órgãos7: o visitador (que é aquele responsável pela visita de verificação 5 Dec.-Lei 7661/1945. “Art. 210 - O representante do Ministério Público, além das atribuições expressas na presente lei, será ouvido em toda ação proposta pela massa ou contra esta. Caber-lhe-á o dever, em qualquer fase do processo, de requerer o que for necessário aos interesses da justiça, tendo o direito, em qualquer tempo, de examinar todos os livros, papéis e atos relativos à falência ou à concordata”. 6 Ministério Público. Carta de Ipojuca. Conselho Nacional dos Corregedores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União. 34º Encontro. Ipojuca-PE, 12 e 13 de maio de 2003. “4) Perfeitamente identificado o objeto da causa e respeitado o princípio da independência funcional, é desnecessária a intervenção ministerial nas seguintes demandas e hipóteses: ...omissis... X – Requerimento de falência, na fase pré-falimentar; ...” (grifos nossos) 7 Ley de Concursos Mercantiles y de Reforma al Artículo 88 de la Ley Orgánica del Poder Judicial de la Federación (México). TÍTULO SEGUNDO - De los órganos del concurso mercantil - Capítulo I - Del visitador, del conciliador y del síndico Artículo 54.- El visitador, el conciliador y el síndico tendrán las obligaciones y facultades que expresamente les confiere esta Ley. Artículo 55.- Los visitadores, conciliadores y síndicos podrán contratar, con autorización del juez, a los auxiliares que consideren necesarios para el ejercicio de sus funciones lo que no implicará, en ningún caso, la delegación de sus respectivas responsabilidades. Artículo 56.- El nombramiento del visitador, conciliador o síndico podrá ser impugnado ante el juez por el Comerciante, y por cualquiera de los acreedores dentro de los tres días siguientes a la fecha en que la designación se les hubiere hecho de su conocimiento conforme a lo establecido en los artículos 31, 149 o 172. La impugnación sólo se admitirá cuando se verifique alguno de los supuestos a que se refiere el artículo 328 de esta Ley. La impugnación se ventilará en la vía incidental. El juez podrá rechazar la designación que haga el Instituto cuando se dé alguno de los supuestos del artículo 328 de esta Ley, debiendo notificarlo al Instituto para que realice una nueva designación. Artículo 57.- La impugnación del nombramiento del visitador, conciliador o síndico no impedirá su entrada en funciones, ni suspenderá la continuación de la visita, la conciliación o la quiebra. Artículo 58.- Cuando la presente Ley no determine un plazo para el cumplimiento de las obligaciones del visitador, del conciliador o del síndico, se entenderá que deberán llevarlas a cabo en un plazo de treinta días naturales salvo que, a petición del visitador, 5 tão logo haja seja a demanda de concurso mercantil admitida), o conciliador (indicado na sentença de declaração de concurso mercantil), o síndico (responsável pela condução da quebra) e os chamados interventores (que representam os interesses dos credores e fiscalizam a atuação do visitador, do síndico e do comerciante na administração de seus negócios). Não inclui entre eles órgãos como o juiz (que é considerado o regente do concurso mercantil8) e o Ministério Público, que será, como na lei brasileira, o fiscal da lei, intimado a participar em alguns momentos do concurso mercantil já estabelecido. 2.2 O Juiz conciliador o síndico, el juez autorice un plazo mayor, el cual no podrá exceder de treinta días naturales más. Artículo 59.- El síndico y, en su caso, el conciliador, deberán rendir bimestralmente ante el juez un informe de las labores que realicen en la empresa del Comerciante y deberán presentar un informe final sobre su gestión. Todos los informes serán puestos a la vista del Comerciante, de los acreedores y de los interventores por conducto del juez. Artículo 60.- El Comerciante, los interventores y los propios acreedores, de manera individual, podrán denunciar ante el juez los actos u omisiones del visitador, del conciliador y del síndico que no se apeguen a lo dispuesto por esta Ley. El juez dictará las medidas de apremio que estime convenientes y, en su caso, podrá solicitar al Instituto la sustitución del visitador, conciliador o síndico a fin de evitar daños a la Masa. Cuando por sentencia firme se condene a algún visitador, conciliador o síndico al pago de daños y perjuicios, el juez deberá enviar copia de la misma al Instituto para efectos de lo previsto en la fracción VI del artículo 337 de este ordenamiento. Artículo 61.- El visitador, el conciliador y el síndico serán responsables ante el Comerciante y ante los acreedores, por los actos propios y de sus auxiliares, respecto de los daños y perjuicios que causen en el desempeño de sus funciones, por incumplimiento de sus obligaciones y por la revelación de los datos confidenciales que conozcan en virtud del desempeño de su cargo. Capítulo II - De los interventores - Artículo 62.- Los interventores representarán los intereses de los acreedores y tendrán a su cargo la vigilancia de la actuación del conciliador y del síndico así como de los actos realizados por el Comerciante en la administración de su empresa. Artículo 63.- Cualquier acreedor o grupo de acreedores que representen por lo menos el diez por ciento del monto de los créditos a cargo del Comerciante, de conformidad con la lista provisional de créditos, tendrán derecho a solicitar al juez el nombramiento de un interventor, cuyos honorarios serán a costa de quien o quienes lo soliciten. Para ser interventor no se requiere ser acreedor. El acreedor o grupo de acreedores deberán dirigir sus solicitudes al juez a efecto de que éste haga el nombramiento correspondiente. Los interventores podrán ser sustituidos o removidos por quienes los hayan designado, cumpliendo con lo dispuesto en este párrafo. Artículo 64.- Los interventores tendrán las facultades siguientes: I. Gestionar la notificación y publicación de la sentencia de concurso mercantil; II. Solicitar al conciliador o al síndico el examen de algún libro, o documento, así como cualquier otro medio de almacenamiento de datos del Comerciante sujeto a concurso mercantil, respecto de las cuestiones que a su juicio puedan afectar los intereses de los acreedores; III. Solicitar al conciliador o al síndico información por escrito sobre las cuestiones relativas a la administración de la Masa, que a su juicio puedan afectar los intereses de los acreedores, así como los informes que se mencionan en el artículo 59 de esta Ley, y IV. Las demás que se establecen en esta Ley. 8 Ley de Concursos Mercantiles y de Reforma al Artículo 88 de la Ley Orgánica del Poder Judicial de la Federación (México). Art. 7º. El juez es el rector del procedimiento de concurso mercantil y tendrá las facultades necesarias para dar cumplimiento a lo que esta ley establece. … 6 O juiz é o órgão obrigatório da falência e recuperação de empresas, por ser indispensável na condução do processo do devedor em crise. Segundo classificação apresentada por Waldo Fazzio Júnior9, são órgãos obrigatórios da falência: o juiz, o administrador judicial e o representante do Ministério Público; e, órgãos facultativos Comitê de Credores e Assembléia Geral de Credores. Observando a classificação do autor, e levando em consideração queo administrador judicial não é órgão da recuperação extrajudicial, temos como órgãos obrigatórios da falência e da recuperação de empresas, o juiz e o representante do Ministério Público10. Sendo órgãos não obrigatórios o administrador judicial, o Comitê de Credores e a Assembléia Geral de Credores. Sobre a figura do gestor judicial, ver item 2.4 abaixo. Sebastião José Roque11 ao tratar da figura do juiz na LFRE afirma que “o juiz é órgão máximo da recuperação judicial, da recuperação extrajudicial e da falência, tanto que todos os demais órgãos giram em torno dele. Uma sentença sua dá início aos procedimentos concursais; outra dá fim a ele”. Entretanto, não se pode deixar de observar que na recuperação extrajudicial, existe a possibilidade do devedor optar pela homologação ou não do plano de recuperação extrajudicial, existindo, ainda, a possibilidade de realização de acordo, privado, entre devedor e credores (art. 167, LFRE). ROQUE12 na defesa de sua afirmação escreve que 9 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p.767. 10 O representante do Ministério Público, foi colocado nesta classificação em razão de ser o fiscal da lei, vez que não atuará na recuperação extrajudicial, salvo no caso de ocorrência de crimes tipificados pela LFRE. Assim sua participação efetiva no processo não é obrigatória, mas enquanto órgão fiscalizador da lei, sim. 11 ROQUE, Sebastião José. Direito de Recuperação de Empresas. São Paulo: Ícone, 2005. p. 362. 12 ROQUE, Sebastião José. Direito... p. 362. 7 É dupla a função do juiz. Em primeiro lugar, ele é diretor direto dos procedimentos concursais; toma iniciativa, intimando pessoas várias a tomar medidas e pronunciar-se. Como superintendente, ele supervisiona o trabalho do administrador judicial e de outros órgãos dos procedimentos concursais. Embora a lei diz que ele exerça a “fiscalização”, na verdade ele exerce a “supervisão”. É ele quem nomeia o administrador judicial e o fará na própria sentença declaratória de abertura do procedimento concursal ou então determinará a constituição do Comitê de Recuperação. Na sentença, além da nomeação, o juiz determinará uma série de providencias, na qual se incluirão: a abertura de prazo para que os credores se manifestem, a fixação do termo legal, a suspensão das ações ou execuções contra a empresa em estado de crise econômico-financeira, a apresentação do laudo econômico-financeiro, a expedição de editais. O juiz possui função de regente13 do procedimento concursal, podendo assim tomar todas as medidas necessárias para o bom andamento do processo. Tanto assim o é, que a lei lhe permite agir de ofício, como a exemplo do artigo 31, artigo 82, §2º, artigo 129, parágrafo único da LFRE. Claro está no item IV da exposição de motivos da “Ley Concursal” da Espanha a importância do juiz como reitor do procedimento concursal: La ley simplifica la estructura orgánica del concurso. Sólo el juez y la administración concursal constituyen órganos necesarios en el procedimiento. La junta de acreedores únicamente habrá de constituirse en la fase de convenio cuando no se haya aprobado por el sistema de adhesiones escritas una propuesta anticipada. La intervención como parte del Ministerio Fiscal se limita a la sección sexta, de calificación del concurso, cuando proceda su apertura, sin perjuicio de la actuación que e establece en esta ley cuando intervenga en delitos contra el patrimonio o el orden socioeconómico. La reducción de los órganos concursales tiene como lógica consecuencia la atribución a éstos de amplias e importantes competencias. La ley configura al juez como órgano rector del procedimiento, al que dota de facultades que aumentan el ámbito de las que le correspondían en el derecho anterior y la discrecionalidad con que puede ejercitarlas, siempre motivando las resoluciones. (grifos nossos) A lei portuguesa por sua vez traz uma inovação, que no Brasil foi sentida com a vigência da LFRE: a atuação mínima necessária do Juiz, não 13 Ver nota 8. 8 ocasionando com isso, a diminuição da importância desta figura (juiz) no processo concursal. A afirmação da supremacia dos credores no processo de insolvência é acompanhada da intensificação da desjudicialização do processo. Por toda a parte se reconhece a indispensabilidade da intervenção do juiz no processo concursal, tendo fracassado os intentos de o desjudicializar por completo. Tal indispensabilidade é compatível, todavia, com a redução da intervenção do Juiz ao que estritamente releva do exercício da função jurisdicional, permitindo a atribuição da competência para tudo o que com ela não colida aos demais sujeitos processuais.14 Observando-se a exposição de motivos da lei espanhola e a citada lei portuguesa vê-se que o Juiz é órgão obrigatório e indispensável no processo concursal, mesmo minimizando sua atuação. No Brasil o juiz é figura obrigatória e indispensável, entretanto na recuperação extrajudicial seu papel se torna reduzido em favor da celeridade. Pois, poderá o credor na recuperação extrajudicial prescindir da homologação judicial observado o disposto nos artigos 162 e 163, da LFRE15. 2.3 O Ministério Público na Lei 11.101/2005 Com a nova lei (Lei nº 11.101/2005) o Ministério Público deixou de ser considerado o curador de massas e passou a ser considerado como fiscal da lei, função primeira da instituição. Houve assim uma conformação das funções do Ministério Público ditadas pela lei falimentar com as funções próprias da 14 Portugal. Decreto-Lei 54/2004 de 18 de março. Item 10. 15 LFRE, Art. 162. O devedor poderá requerer a homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial, juntando sua justificativa e o documento que contenha seus termos e condições, com as assinaturas dos credores que a ele aderiram. Art. 163. O devedor poderá, também, requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga a todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos. ...omissis... 9 instituição, passando a ter atuação mínima16, o que possibilitou uma atuação mais eficiente do Ministério Público pela redução do volume de processos em trâmite pela instituição. Isso graças ao veto ao artigo quarto17 que para José Marcelo Martins Proença18, foi a atitude mais acertada, em razão, inclusive, da regra do artigo 12719 da Constituição Federal, que dita as ocasiões em que o Ministério Público deve atuar. Importa frisar, entretanto, que de acordo com o artigo 82, inciso III20 e artigo 499, § 2º21 do Código de Processo Civil a ação do Ministério Público está garantida quando este atua como fiscal da lei, independentemente de previsão legal específica. Restou claro que o legislador incluiu na nova lei apenas os momentos em que a participação do Ministério Público é imprescindível e obrigatória, deixando outras oportunidades de intervenção a critério da instituição. 2.3.1 O Ministério Público na Falência 16 Sobre a intervenção mínima do Ministério Público: Musumecci Filho e Piacitelli, observam que “o legislador acabou com a odiosa figura do inquérito judicial, afastando todas as discussões sobre a nulidade desses procedimentos que não se atinham ao princípio constitucionaldo contraditório”. Musumecci Filho, Leonardo e Piacitelli, Marcelo. Comentários aos Artigos 179 ao 188. In: DE LUCCA, Newton e SIMÃO FILHO, Adalberto (coord). Comentários à Nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p.638. 17 LFRE, Art. 4º. O representante do Ministério Público, intervirá nos processos de recuperação judicial ou de falência. Parágrafo Único. Além das disposições previstas nesta lei, o representante do Ministério Público intervirá em toda ação proposta pela massa falida ou contra esta. (VETADO). 18 PROENÇA, José Marcelo Martins. In: MACHADO, Rubens Approbato. Comentários à Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p.68-72. 19 Constituição Federal. Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. § 1º - São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. ...omissis... 20 Código de Processo Civil. Art. 82. Compete ao Ministério Público intervir: I - nas causas em que há interesses de incapazes; II - ...omissis...; III - nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte. (grifos nossos). 21 Código de Processo Civil. Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público.§ 1o ...omissis...§ 2o O Ministério Público tem legitimidade para recorrer assim no processo em que é parte, como naqueles em que oficiou como fiscal da lei. (grifos nossos). 10 O Ministério Público, em virtude do artigo 99, XIII22 da Lei de Falência e Recuperação de Empresas (LFRE), passou a atuar no processo falimentar somente após a sentença declaratória de quebra. Fábio Ulhoa Coelho23 ao analisar o dispositivo supra citado, explica que: A lei não prevê a obrigatória intervenção do Ministério Público nos pedidos de falência, quaisquer que sejam as circunstâncias. E, de fato, não há justificativas para a participação obrigatória do promotor de justiça nessa ação, em que a lide versa exclusivamente sobre interesses patrimoniais e disponíveis. Em última análise, mesmo quando fundado o pedido na prática de ato de falência, o direito do requerente e a obrigação do requerido dizem respeito ao pagamento de uma dívida. A participação do Ministério Público, como fiscal da lei e titular da ação penal, é compreensível somente após a instauração do concurso de credores, quando podem entrar em conflito, de um lado, os interesses dos trabalhadores, do Fisco e de sujeitos de direito vulneráveis e, de outro, os dos credores cíveis, normalmente empresários e bancos. Mesmo assim, quando não houver as hipóteses descritas na lei, não há razões para envolver o promotor de justiça na demanda. Analisando a participação do Ministério Público no processo falimentar e fazendo um paralelo entre a doutrina brasileira e a norte-americana, Alberto Camiña Moreira afirma, corroborando a idéia de COELHO, que “o interesse público é que justifica a atuação do Ministério Público nas lides concursais”24. Resta clara a idéia de interesse público para a atuação do Ministério Público. A atuação mínima do órgão fiscalizador da lei, acelera o processo falimentar e evita pareceres inócuos e irrelevantes. 22 LFRE, Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações: ...omissis... XIII – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência. (...). 23 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas: (lei nº11.101/2005). 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 98-99. 24 MOREIRA, Alberto Camiña. Poderes da Assembléia de Credores, do Juiz e Atividade do Ministério Público. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente (coord). Direito Falimentar e a Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p.268. 11 As intervenções do Ministério Público, na falência, ditadas pela nova lei são as seguintes: a) Impugnar a relação de credores25; b) Propor ação de rescisão de crédito26; c) Quando intimado do relatório do administrador judicial que apontar responsabilidade penal dos envolvidos 27; d) Pedir a substituição do administrador ou membro do comitê28; e) Quando intimado da sentença que declarar a falência29; f) Pedir explicações ao falido30; g) Propor ação revocatória31; 25 LFRE, Art. 8º. No prazo de 10 (dez) dias, contado da publicação da relação referida no art. 7o , § 2o , desta Lei, o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público podem apresentar ao juiz impugnação contra a relação de credores, apontando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade, importância ou classificação de crédito relacionado. 26 LFRE, Art. 19. O administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público poderá, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores. ...omissis... 27 LFRE, Art. 22. Ao administrador judicial compete, sob a fiscalização do juiz e do Comitê, além de outros deveres que esta Lei lhe impõe: ...omissis... III – na falência: ...omissis... e) apresentar, no prazo de 40 (quarenta) dias, contado da assinatura do termo de compromisso, prorrogável por igual período, relatório sobre as causas e circunstâncias que conduziram à situação de falência, no qual apontará a responsabilidade civil e penal dos envolvidos, observado o disposto no art. 186 desta Lei; ...omissis... § 4o Se o relatório de que trata a alínea e do inciso III do caput deste artigo apontar responsabilidade penal de qualquer dos envolvidos, o Ministério Público será intimado para tomar conhecimento de seu teor. 28 LFRE, Art. 30. ...omissis... § 2o O devedor, qualquer credor ou o Ministério Público poderá requerer ao juiz a substituição do administrador judicial ou dos membros do Comitê nomeados em desobediência aos preceitos desta Lei. § 3o O juiz decidirá, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sobre o requerimento do § 2o deste artigo. 29 LFRE, Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações: ...omissis... XIII – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência. Parágrafo único. O juiz ordenará a publicação de edital contendo a íntegra da decisão que decreta a falência e a relação de credores. 30 LFRE, Art. 104. A decretação da falência impõe ao falido os seguintes deveres:...omissis... VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessemà falência 31 LFRE, Art. 132. A ação revocatória, de que trata o art. 130 desta Lei, deverá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor ou pelo Ministério Público no prazo de 3 (três) anos 12 h) Quando intimado pessoalmente sobre a alienação do ativo32; i) Impugnar a venda dos bens do falido33; j) Manifestar-se na prestação de contas do administrador judicial34; k) Propor ação penal35; 2.3.2 O Ministério Público na Recuperação Judicial Na recuperação Judicial a atuação do Ministério Público é ainda mais diminuta, tendo em vista que a recuperação trata de direitos de ordem privada. Tal atuação deverá ocorrer nos casos expressamente previstos em lei, salvo, como já dito, nos casos de interesse público. Ao Ministério Público, na Recuperação Judicial, coube intervir nas seguintes Hipóteses: a) Impugnar relação de credores36; contado da decretação da falência. 32 LFRE, Art. 142. O juiz, ouvido o administrador judicial e atendendo à orientação do Comitê, se houver, ordenará que se proceda à alienação do ativo em uma das seguintes modalidades: I – leilão, por lances orais; II – propostas fechadas; III – pregão. ...omissis... § 7o Em qualquer modalidade de alienação, o Ministério Público será intimado pessoalmente, sob pena de nulidade. 33 LFRE, Art. 143. Em qualquer das modalidades de alienação referidas no art. 142 desta Lei, poderão ser apresentadas impugnações por quaisquer credores, pelo devedor ou pelo Ministério Público, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas da arrematação, hipótese em que os autos serão conclusos ao juiz, que, no prazo de 5 (cinco) dias, decidirá sobre as impugnações e, julgando-as improcedentes, ordenará a entrega dos bens ao arrematante, respeitadas as condições estabelecidas no edital. 34 LFRE, Art. 154. Concluída a realização de todo o ativo, e distribuído o produto entre os credores, o administrador judicial apresentará suas contas ao juiz no prazo de 30 (trinta) dias. ...omissis... § 3o Decorrido o prazo do aviso e realizadas as diligências necessárias à apuração dos fatos, o juiz intimará o Ministério Público para manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias, findo o qual o administrador judicial será ouvido se houver impugnação ou parecer contrário do Ministério Público. ...omissis... 35 LFRE, Art. 187. Intimado da sentença que decreta a falência ou concede a recuperação judicial, o Ministério Público, verificando a ocorrência de qualquer crime previsto nesta Lei, promoverá imediatamente a competente ação penal ou, se entender necessário, requisitará a abertura de inquérito policial. ...omissis... § 2ºEm qualquer fase processual, surgindo indícios da prática dos crimes previstos nesta Lei, o juiz da falência ou da recuperação judicial ou da recuperação extrajudicial cientificará o Ministério Público. 36 vide nota 25. 13 b) Propor ação de rescisão de crédito37; c) Quando intimado do relatório do Administrador que aponta responsabilidade penal de qualquer dos envolvidos38; d) Pedir substituição do Administrador Judicial ou membro do Comitê de Credores39; e) Quando intimado do despacho de processamento da Recuperação Judicial40; f) Recorrer quando da concessão da Recuperação judicial41; g) Manifestar-se na prestação de contas do Administrador Judicial42; h) Propor ação penal no caso de incidência de qualquer dos crimes da LFRE43; 2.3.3 O Ministério Público na Recuperação Extrajudicial Luiz Antônio Soares Hentz44 afirma que “não há oportunidade para manifestação do Ministério Público no processo de homologação do plano de recuperação extrajudicial, em qualquer das suas modalidades”. 37 Vide nota 26. 38 Vide nota 27. 39 Vide nota 28. 40 LFRE, Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato: ...omissis... V – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento. 41 LFRE, Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1o do art. 50 desta Lei. ...omissis... § 2o Contra a decisão que conceder a recuperação judicial caberá agravo, que poderá ser interposto por qualquer credor e pelo Ministério Público. 42 Vide nota 34. 43 Vide nota 35. 44 HENTZ, Luiz Antônio Soares. Manual de Falências e Recuperação de Empresas: Lei nº 11.101, de 9.2.2005. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2005. p. 135. 14 Explica o autor citado que: O veto ao art. 4º da LFRE tem esse sentido, ao pretender dar celeridade a procedimentos de interesse puramente patrimonial, plenamente defensáveis pelos próprios credores e pelo devedor (que não perde a administração da empresa na recuperação judicial e extrajudicial). Com o veto, desapareceu a intervenção obrigatória do representante do Ministério Público nos processos de recuperação judicial e de falência, que assim, deve manifestar-se nas hipóteses precisas em que a lei ordena sua intimação45. Assim a intervenção do Ministério Público na Recuperação Extrajudicial ocorrerá no caso exclusivo do art. 187, § 2º da LFRE46, ou seja, a intervenção se dará quando da ocorrência de crime tipificado pela LFRE. 2.4 O Gestor Judicial Têm-se, no artigo 64 da LFRE, que o devedor ou qualquer dos administradores serão afastados da condução da atividade empresarial se praticarem quaisquer dos atos descritos nos seus parágrafos e alíneas. Para assumir as funções do devedor ou administrador afastado será nomeado um gestor. A figura do gestor judicial foi introduzida no direito brasileiro através do artigo 65 da LFRE47. A denominação dada pela LFRE é falha e induz o interprete a erro, vez que o gestor apontado no referido artigo não é judicial, não é órgão da falência ou da Recuperação de Empresas, ele simplesmente substituirá o devedor no exercício de suas atividades na empresa, em face de algum impedimento que venha a obstar o exercício da empresa pelo próprio falido. 45 HENTZ, Luiz Antônio Soares. Manual... p. 135. 46 Vide nota 34. 47 LFRE, Art. 65. Quando do afastamento do devedor, nas hipóteses previstas no art. 64 desta Lei, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial. ...omissis... 15 MOREIRA48 contestando a denominação “gestor judicial” defende que: Embora haja efetiva gestão da empresa, ela não é gestão judicial; até porque o nome do gestor é de indicação da assembléia e não do juiz. Assim como o administrador judicial não é administrador, o gestor judicial, judicial não é. A lei não é feliz em várias das suas designações. Silvânio Covas49 apresentando a nova figura inserida pela LFRE, advoga que: A figura do gestor judicial é inovadora, no ordenamento jurídico brasileiro, eis que não constava da lei anterior. A sua escolha deve recair na pessoa de especialistas em administração de empresas, pois suas funções exigem competências específicas e necessárias à boa gestão. O afastamento do empresário da direção da empresa émedida excepcional, passível de questionamento no campo da responsabilidade civil. Por esse motivo, deve revestir-se de garantias suficientes para não impor à empresa prejuízos decorrentes da má administração. Diversamente, o administrador judicial assume papel semelhante ao do Comissário (v. artigo 169 do Decreto-lei nº 7661/45). O Gestor Judicial será nomeado pela Assembléia Geral de Credores, que se submeterá, quando couber, às mesmas regras aplicadas ao administrador quanto aos impedimentos, deveres e remuneração50. Em caso de recusa ou impedimento, nova Assembléia Geral será convocada pelo juiz para a escolha de um novo gestor. O administrador judicial exercerá as funções do gestor judicial, enquanto este não for escolhido pela Assembléia Geral. 48 MOREIRA, Alberto Camiña. Poderes... In: PAIVA, Luiz Fernando Valente (coord). Direito Falimentar... 2005. p.264. 49 COVAS, Silvânio. Comentários aos Artigos 55 ao 69. In DE LUCCA, Newton e SIMÃO FILHO, Adalberto (coord). Comentários à Nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p.318. 50 LFRE, Art. 65. Quando do afastamento do devedor, nas hipóteses previstas no art. 64 desta Lei, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial. § 1o O administrador judicial exercerá as funções de gestor enquanto a assembléia-geral não deliberar sobre a escolha deste. § 2 o Na hipótese de o gestor indicado pela assembléia-geral de credores recusar ou estar impedido de aceitar o encargo para gerir os negócios do devedor, o juiz convocará, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, contado da recusa ou da declaração do impedimento nos autos, nova assembléia-geral, aplicado o disposto no § 1o deste artigo. 16 ROQUE51 interpreta a lei de maneira diferenciada, fundindo a figura do gestor judicial com a figura do administrador judicial. Alega ele que: Entre os meios de realização dos procedimentos falimentares figura o de se afastar da direção da empresa em recuperação os dirigentes que a levaram ao estado de crise econômico-financeira ou possam dificultar sua recuperação. Se eles forem afastados, é preciso que alguém assuma suas funções, ou seja, gerir as atividades empresariais. É o gestor judicial. É o próprio administrador judicial que assumirá essas funções e os demais membros do comitê fiscalizarão seus atos. Na hipótese do administrador judicial recusar ou estar impedido de aceitar o cargo para gerir os negócios da empresa em recuperação, o juiz o destituirá e nomeará, no prazo de três dias, contados da recusa ou da declaração do impedimento nos autos, o gestor judicial para assumir suas funções nos termos da Lei de Recuperação de Empresas. Deve-se ter, em razão da confusão causada pelo legislador em nomear figuras importantes como o gestor judicial, cautela na análise desta nova figura. O Gestor judicial foi criação do legislador que ao nominá-lo não se preocupou com o nexo que deve haver entre o nome e a função nominada. O gestor judicial não é órgão da falência e recuperação de empresas, uma vez que participa simplesmente como um substituto do administrador do falido em suas atividades empresariais, quando este é retirado da condução do seu negócio. Jorge Lobo52 tratando dos impedimentos para desempenho da função de gestor judicial, afirma: Não podem assumir o cargo de gestor judicial pessoas impedidas por lei especial ou condenadas por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato, contra a economia popular, a fé pública ou a propriedade, ou a pena criminal que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos (LSA, art. 147, §1º, e CC, art. 1.011, §1º), bem côo as que, nos últimos cinco anos, no exercício do cargo de administrador judicial ou de membro do comitê de credores foram destituídas nos autos da falência ou recuperação judicial anterior, deixaram de prestar contas dentro dos prazos legais ou tiveram a prestação de contas desaprovada ou tiverem relação de parentesco ou afinidade até o terceiro grau com o devedor, seus administradores, 51 ROQUE, Sebastião. Direito de... p.150. 52 LOBO, Jorge. In: TOLEDO, Paulo F. C. Salles e ABRÃO, Carlos Henrique (coord.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 169. 17 controladores ou representantes legais, ou deles forem amigos, inimigos ou dependentes (art. 30, caput e § 1º). A lei tratou de estabelecer os impedimentos legais ao exercício da função do gestor judicial. Mas estes impedimentos são aqueles legalmente estabelecidos para o administrador judicial, pois na condução do negócio do falido deverá estar pessoa que tenha aptidão e competência para soerguer a empresa em crise, afinal o intuito da atual lei é a recuperação da empresa, sendo sua liquidação a alternativa. A lei portuguesa (Dec-Lei 200/2004), ao contrário da brasileira, trata logo de estabelecer as definições utilizadas pela lei. Diz a lei em seu artigo 6º53: “1. Para efeitos deste Código, são considerados como administradores: a) não sendo o devedor pessoa singular, aqueles a quem incumba a administração ou liquidação da entidade ou patrimônio em causa, designadamente os titulares do órgão social que para o efeito for competente; b) Sendo o devedor uma pessoa singular, os seus representantes legais e mandatários com poderes gerais de administração. 2. Para efeitos deste Código, são considerados responsáveis legais as pessoas que nos termos da lei, respondam pessoal e ilimitadamente pela generalidade das dívidas do insolvente, ainda que a título subsidiário.” Existe ainda no Código de Insolvência português, a figura do administrador judicial provisório que é aquele que poderá administrar ou acompanhar a administração dos negócios em casos de má-gestão54. Estabelece, ainda, dois tipos de administrador judicial provisório: i) aquele que de fato 53 LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes. Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Anotado. 2ª edição. Coimbra: Almedina, 2005. p. 49. 54 LEITÃO, L. M. T. de M. Código ... p. 65. Artigo 31º 1 - Havendo justificado receio da prática de actos de má gestão, o juiz, oficiosamente ou a pedido do requerente, ordena as medidas cautelares que se mostrem necessárias ou convenientes para impedir o agravamento da situação patrimonial do devedor, até que seja proferida sentença. 2 - As medidas cautelares podem designadamente consistir na nomeação de um administrador judicial provisório com poderes exclusivos para a administração do património do devedor, ou para assistir o devedor nessa administração. ...omissis... 18 administrará os bens do devedor; e, ii) aquele que se encarregará de assistir a administração do devedor. A figura do gestor judicial na lei portuguesa foi eliminada pelo Decreto-Lei 54/2004, quando criou a figura do administrador da insolvência55. Quando traçado um paralelo entre a lei portuguesa e a brasileira, verifica-se que a figura do gestor judicial é um corpo estranho na lei brasileira. Resta óbvio que o administrador judicial nada mais é que um fiscalizador, ele não gere. Assim o gestor judicial aparece para suprir uma deficiência deixada pela lei.Se o administrador judicial não administra de fato, fez-se necessária a criação da figura do gestor judicial para gerir. Entretanto como já dito anteriormente o gestor não é judicial. 3 DOS ÓRGÃOS DE ADMINISTRAÇÃO DA FALENCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS 3.1 Administrador Judicial Inovação trazida pela LFRE, o administrador judicial substitui o Síndico na falência e o Comissário na Concordata. Entretanto com funções diferentes daqueles os quais substitui. O administrador judicial não é administrador, em verdade ele é apenas um fiscalizador do falido e somente atuará efetivamente como administrador no espaço de tempo em que o administrador do 55 Portugal. Decreto-Lei 54/2004. “O novo Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa eliminou a distinção existente entre gestor judicial e liquidatário judicial mediante a criação da nova figura do administrador da insolvência.” 19 falido for afastado da condução de seus negócios, até que seja indicado pela Assembléia Geral de Credores um gestor judicial. Novamente aqui, percebe-se a infelicidade dos legisladores em nominar tal função. O legislador não se preocupou em ser coerente, atribuindo a uma função nome diverso daquele que espelha as atividades que de fato desenvolverá. “O administrador judicial da falência é um auxiliar qualificado do juízo. Inserto no elenco dos particulares colaboradores da justiça, não representa os credores nem substitui o devedor falido”56. Paulo F. C. Salles de Toledo57, observa que “em vez do síndico e do comissário, a LRE prevê, para atuação tanto na falência quanto na recuperação judicial, o administrador judicial”. Observa ainda que as diferenças entre síndico, comissário e administrador judicial “não são apenas de rótulo, mas principalmente de funções”. COELHO58 acrescenta que modificações importantes foram introduzidas pela LFRE quanto à função agora assumida pelo administrador judicial: Além do nome do titular da função (“administrador judicial” e não mais “síndico”), duas alterações importantes se verificam no cotejo dessas disposições: a redução da autonomia do administrador judicial, em relação à atribuída pela lei ao síndico; b) simplificação e racionalização do procedimento de escolha. COELHO59 ainda traça um perfil mínimo necessário para o administrador judicial. Diz ele: 56 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas. São Paulo: Atlas, 2005. p. 327. 57 TOLEDO, Paulo F. C. Salles e ABRÃO, Carlos Henrique (coord.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 47. 58 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários... p. 22. 59 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários... p. 22. 20 O administrador judicial (que pode ser pessoa física ou jurídica) é o agente auxiliar do juiz que, em nome próprio (portanto, com responsabilidade), deve cumprir com as funções cometidas pela lei. Além de auxiliar do juiz na administração da falência, o administrador judicial é também o representante da comunhão de interesses dos credores (massa falida subjetiva), na falência. Exclusivamente para fins penais, o administrador judicial é considerado funcionário público. Para os demais efeitos, no plano dos direitos civil e administrativo, ele é agente externo colaborador da justiça, da pessoal e direta confiança do juiz que o investiu na função. Ele deve ser profissional com condições técnicas e experiência para bem desempenhar as atribuições cometidas por lei. Note-se que o advogado não é necessariamente o profissional mais indicado para a função, visto que muitas das atribuições do administrador judicial dependem, para seu bom desempenho, mais de conhecimentos de administração de empresas do que jurídicos. O ideal é a escolha recair sobre pessoa com conhecimentos ou experiência na administração de empresas do porte da devedora e, quando necessário, autorizar a contratação de advogado para assisti-lo ou à massa. Entretanto, o administrador terá apenas uma chance de administrar de fato a empresa, que é no interregno entre o afastamento do devedor e a indicação de um gestor judicial pela Assembléia Geral de Credores. 3.1.1 Requisitos e Impedimentos A LFRE não especifica claramente quais são os requisitos necessários para a investidura na função de administrador judicial, limitando-se a exigir para o caso de pessoa física que este seja profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresas ou contador e no caso de pessoa jurídica, que esta indique o responsável pela condução do processo60. 60 LFRE, Art. 21. O administrador judicial será profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada. Parágrafo único. Se o administrador judicial nomeado for pessoa jurídica, declarar-se-á, no termo de que trata o art. 33 desta Lei, o nome de profissional responsável pela condução do processo de falência ou de recuperação judicial, que não poderá ser substituído sem autorização do juiz. 21 Luiz Tzirulnik61 entende que “os únicos requisitos expressamente legais para ser administrador judicial são a idoneidade e a habilitação profissional”. Acrescenta ainda o autor que com relação às “profissões citadas no artigo 21 (...), elas não constituem requisito obrigatório, mas preferencial”. TOLEDO62 adita o acima exposto, observando que: Essa idoneidade, ainda que a norma não o diga expressamente, deve ser moral e financeira. Trata-se de função de confiança, em que se administram valores e bens muitas vezes de grande vulto, e são múltiplos os interesses envolvidos. O respeito à ética é, pois, fundamental. (...) O administrador deve ser escolhido dentre profissionais de áreas afins da recuperação judicial ou falência. Manoel Justino Bezerra Filho63 conclui que: O processo de recuperação e de falência é bastante complexo, por envolver inúmeras questões que só o técnico, com conhecimento especializado da matéria, poderá resolver a contento, prestando real auxílio ao bom andamento do feito. Mesmo tratando-se de advogados, economistas, administradores, contadores e outros profissionais especializados, não serão necessariamente capacitados para o pleno exercício deste trabalho, que sempre será mais bem resolvido por aqueles que se especializarem em Direito Comercial e, particularmente, em Direito Falimentar. Portanto, deve o juiz do feito tomar cuidado especial no momento em que nomear o administrador, atendo a todos estes aspectos. Diversas leis estrangeiras, entre elas a mexicana, a chilena e a portuguesa nos mostram uma responsabilidade e comprometimento do Estado para com o processo de insolvência. A lei mexicana cria em seu artigo 311 o “Instituto Federal de Especialistas de Concursos Mercantiles”64 como órgão auxiliar do Conselho de 61 TZIRULNIK, Luiz. Direito Falimentar. 7ª ed. Ver., ampl. E atual. De acordo com a lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p.77. 62 TOLEDO, Paulo F. C. Salles e ABRÃO, Carlos Henrique (coord.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 47. 63 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falências comentada. Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, comentário artigopor artigo. 3ª ed., 2.tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p.84-85. 64 Ley de Concursos Mercantiles (México). Artículo 311.- Se crea el Instituto Federal de Especialistas de Concursos Mercantiles, como órgano auxiliar del Consejo de la Judicatura Federal, con autonomía técnica y operativa, con las atribuciones siguientes: …omissis… 22 Magistratura Federal. Tal instituto é responsável pela inscrição e registro de pessoas que possuam as qualificações necessárias para atuar perante o processo de insolvência como síndico, visitador ou conciliador. Tal instituto também atua fora do processo judicial, pois está aberto ao comerciante em crise para indicar-lhe um conciliador que atuará, como conciliador amigável entre ele e seus credores65. No Chile a lei prevê uma lista nacional de síndicos66 que serão ali inseridos através de decreto do Ministério da Justiça67, após comprovarem, através de exame, serem aptos para a função. Serão também fiscalizados pela “Superintendencia de quiebras” que é órgão vinculado ao Ministério da Justiça daquele país. Os síndicos que integram a relação da Superintendência de quebras, devem renovar seus exames de proficiência a cada três anos, sob pena de serem excluídos da lista de aptos ao exercício da função. Em Portugal há a Lei nº 32/2004 que estabelece o estatuto do administrador da insolvência, contando com 30 artigos diz sobre a nomeação, exercício e suspensão de funções do administrador da insolvência. A lei expõe sobre as listas oficiais de administradores da insolvência (na razão de uma para cada distrito judicial), sobre o modo de inscrição dos candidatos na lista, sobre o exame de admissão, remuneração, nomeação etc. 65 Ley de Concursos Mercantiles (México). Artículo 312.- El Comerciante que enfrente problemas económicos o financieros, podrá acudir ante el Instituto a efecto de elegir a un conciliador, de entre aquellos que estén inscritos en el registro del Instituto, para que funja como amigable componedor entre él y sus acreedores. Todo acreedor que tenga a su favor un crédito vencido y no pagado también podrá acudir ante el Instituto para hacer de su conocimiento tal situación y solicitarle la lista de conciliadores. 66 Chile. Código de Comercio. Artículo 14° Existirá una nómina nacional de síndicos integrada por aquellas personas legalmente investidas como tales por la autoridad competente. 67 Chile. Código de Comercio. Artículo 15° El nombramiento de los síndicos que conformarán la nómina se hará por decreto expedido a través del Ministerio de Justicia. 23 Nota-se na lei portuguesa um cuidado especial na escolha do administrador da insolvência para que este possa ter condições de reerguer a empresa e torná-la novamente uma unidade econômica produtiva. No Brasil a lei é omissa quando trata dos requisitos do administrador judicial. Assim uma breve análise comparativa mostra que perante outras leis falimentares, a brasileira é a mais descuidada quando se trata daquele que tem por função fiscalizar, dar suporte ao soerguimento da empresa. O legislador repetiu os impedimentos legais da antiga lei68, acrescentando apenas o lapso temporal de cinco anos para aqueles que foram destituídos do cargo de administrador judicial ou de membro do Comitê em falência69. 3.1.2 Atribuições legais 3.1.2.1 Na Falência e Recuperação Judicial O artigo 22, inc. I, lista as atribuições do administrador judicial, comuns à falência e à recuperação judicial. São elas: i) Enviar correspondência aos credores comunicando a data do pedido de recuperação judicial ou da decretação da falência, a natureza, o valor e a classificação dos seus créditos; 68 Ver nota 63. 69 LFRE, Art. 30. Não poderá integrar o Comitê ou exercer as funções de administrador judicial quem, nos últimos 5 (cinco) anos, no exercício do cargo de administrador judicial ou de membro do Comitê em falência ou recuperação judicial anterior, foi destituído, deixou de prestar contas dentro dos prazos legais ou teve a prestação de contas desaprovada. § 1o Ficará também impedido de integrar o Comitê ou exercer a função de administrador judicial quem tiver relação de parentesco ou afinidade até o 3o (terceiro) grau com o devedor, seus administradores, controladores ou representantes legais ou deles for amigo, inimigo ou dependente. § 2o O devedor, qualquer credor ou o Ministério Público poderá requerer ao juiz a substituição do administrador judicial ou dos membros do Comitê nomeados em desobediência aos preceitos desta Lei. § 3o O juiz decidirá, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sobre o requerimento do § 2o deste artigo. 24 ii) Estar ciente de todos os acontecimentos ocorridos no processo para poder fornecer aos credores interessados as informações solicitadas, com rapidez e eficiência; iii) Dar extratos dos livros do devedor, que merecerão fé de ofício. Tais extratos servirão, também, para fundamentar habilitações de crédito ou impugnações; iv) Exigir dos credores informações que se façam necessárias ao desenrolar do processo, definindo os créditos que farão parte da relação de credores e, posteriormente consolidar o quadro geral de credores; v) Requerer a convocação da Assembléia Geral de Credores para deliberar sobre assuntos em que a lei assim o exija, ou aqueles que entenda necessária a participação da AGC; vi) Contratar profissionais especializados, após autorização judicial, para auxiliá-lo no exercício de suas funções; vii) Manifestar-se quando exigido pela lei. 3.1.2.2 Na Recuperação Judicial Já na recuperação judicial as atribuições do administrador são, principalmente, de natureza fiscalizatória. São elas: i) Acompanhar a atividade desenvolvida pelo devedor, fiscalizando seus atos para que se cumpra com regularidade o plano de recuperação apresentado em juízo. Requerendo, se for o caso, a falência do devedor por descumprimento do plano de recuperação. 25 ii) Apresentar, ao Juiz, relatório mensal das atividades do devedor e relatório sobre a execução do plano de recuperação. 3.1.2.3 Na Falência Na falência a clareza de atos e informações é uma exigência dos credores, assim as atribuições do administrador judicial são ainda maiores: i) Tornar público aos credores, através da imprensa oficial, o local e hora em que os documentos do falido estarão à disposição dos credores diariamente; ii) Analisar dos documentos do falido e apresentar em 40 dias da assinatura do termo de compromisso, relatório apontando responsabilidade civil e penal do devedor; iii) Colacionar os processos da massa e representá-la judicialmente; iv) Abrir as correspondências do devedor entregando a ele aquilo que não for de interesse da massa; v) Arrecadar os bens, avaliá-los (podendo contratar avaliadores se não possuir condições de avaliar tais bens) e elaborar auto de arrecadação; vi) Atuar na realização do ativo e pagamento do passivo; vii) Requerer a venda antecipada de bens perecíveis ou de fácil deterioração; viii) Atuar na defesa dos interesses da massa, cobrando dívidas, dando quitações; ix) Remir bens apenhados, penhorados ou legalmente retidos; 26 x) Representar a massa falida em juízo, podendo contratar advogado se necessário, mediante autorização judicial; xi) Apresentar mensalmente conta demonstrativa da administração; xii) Quando substituído,entregar todos os documentos e bens da massa que estiverem em seu poder; xiii) Prestar contas quando tenha fim o processo, quando destituído, substituído ou quando renunciar ao cargo. 3.1.3 Remuneração do Administrador Judicial A remuneração do administrador judicial é fixada pelo Juiz da causa. Não poderá exceder, entretanto, o correspondente a 5% (cinco por cento) do montante a ser pago aos credores na Recuperação Judicial ou do valor de venda dos bens na falência70. Para a fixação da remuneração do administrador judicial o juiz deverá sopesar a complexidade da tarefa a ser realizada, a capacidade do devedor e os valores praticados no mercado.71 Para COELHO72 “a remuneração na falência deve refletir, na falência, a ponderação de quatro fatores”. Descreve o autor: O primeiro é pertinente à diligencia demonstrada pelo administrador judicial e pela qualidade do trabalho devotado ao processo (o mais diligente e competente merece proporcionalmente mais). O segundo atenta à importância da massa, isto é, o valor do passivo envolvido, 70 LFRE, Art. 24. O juiz fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial, observados a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes. § 1o Em qualquer hipótese, o total pago ao administrador judicial não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência. ...omissis... 71 TZIRULNIK, Luiz. Direito Falimentar. p.87. 72 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários... p. 69. 27 inclusive quantidade de credores (o administrador judicial de uma falência com passivo elevado, distribuído entre poucos credores, merece proporcionalmente menos que o de uma outra com passivo mais baixo, com muitos credores). O terceiro diz respeito aos valores praticados no mercado de trabalho equivalente. O derradeiro fator ponderável pelo juiz é o limite máximo da lei, fixado em percentual de 5% sobre o valor de venda dos bens. Há na LFRE previsão de reserva de 40% do montante devido ao administrador judicial, no caso da falência especificamente. Valor esse que será pago após a apresentação e julgamento da contas do administrador.73 Discute-se, em razão de tal dispositivo, se na recuperação judicial a reserva do montante seria cabível. TOLEDO74, ao observar a lacuna deixada pela lei afirma: A norma refere-se expressamente a dois artigos relativos ao processo de falência. Daí se pode depreender que a LRE não adotou a reserva para os casos de recuperação judicial. Talvez tenha entendido que, aí, o próprio devedor poderia defender seus interesses, sem necessidade de proteção legal diferenciada. Melhor contudo, a solução prevista no art. 71, § 1º, da redação final do Projeto de Lei da Câmara. Previa-se, então, que o devedor faria, com os pagamentos aos credores, também a remuneração devida ao administrador judicial, reservando-se 20% para serem pagos somente após o oferecimento de prestação de contas e apresentação do relatório sobre a execução do plano. A questão levantada por TOLEDO acima, merece ser ouvida, afinal tal questão incide diretamente sobre a remuneração do administrador judicial substituído ou destituído. Quando substituído o administrador judicial será remunerado na proporção do trabalho por ele realizado. Entretanto não será remunerado se injustificadamente renunciar ou, for destituído por desídia, culpa, dolo ou 73 LFRE, Art. 24. ...omissis... § 2o Será reservado 40% (quarenta por cento) do montante devido ao administrador judicial para pagamento após atendimento do previsto nos arts. 154 e 155 desta Lei. ...omissis... 74 TOLEDO, Paulo F. C. Salles e ABRÃO, Carlos Henrique (coord.). Comentários... p. 65. 28 descumprimento das obrigações fixadas na LFRE, ou ainda, suas contas não forem aprovadas.75 3.1.4 Remuneração dos Auxiliares do Administrador Judicial Os auxiliares contratados pelo administrador com autorização judicial, serão remunerados segundo o valor fixado pelo juiz. Os termos para a fixação da remuneração dos auxiliares serão: a complexidade do trabalho a ser desenvolvido e, os valores praticados no mercado.76 3.1.5 Substituição e Destituição FAZZIO JUNIOR, exemplifica as ocasiões em que “o juiz poderá designar substituto para o administrador judicial”: quando o administrador judicial “não assinar o termo de nomeação; não aceitar o cargo; renunciar; falecer; ou for interditado”77. Cabe à Assembléia Geral de Credores deliberar sobre a substituição do administrador judicial. Entretanto cabe ao juiz de ofício ou a requerimento do Ministério Público ou de qualquer credor, ou ainda do próprio devedor destituir o administrador judicial. 75 LFRE. Art. 24 ...omissis... §3º O administrador judicial substituído será remunerado proporcionalmente ao trabalho realizado, salvo se renunciar sem relevante razão ou for destituído de suas funções por desídia, culpa, dolo ou descumprimento das obrigações fixadas nesta Lei, hipóteses em que não terá direito à remuneração. § 4o Também não terá direito a remuneração o administrador que tiver suas contas desaprovadas 76 LFRE. Art. 22 ...omissis...§ 1o As remunerações dos auxiliares do administrador judicial serão fixadas pelo juiz, que considerará a complexidade dos trabalhos a serem executados e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes. ...oimissis... 77 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual... p.771. 29 Interessante salientar que o juiz destituirá o administrador judicial ouvindo-o ou não, acerca do fundamento de sua destituição. 3.2 Comitê de Credores O Comitê de credores é órgão tido como inovador na LFRE, entretanto sua existência já havia sido delineada na antiga lei. O Decreto-Lei 7661/45 havia facultado a criação do Comitê de Credores e da Assembléia Geral78. Tal dispositivo foi quase nunca utilizado, assim não há como prever por exemplo se o instituto tal como prevista pela nova lei irá efetivamente funcionar, sendo prático e eficiente, como observa Ecio Perin Júnior79: 78 Decreto-lei 7661/1945. Art. 122. Credores que representem mais de um quarto do passivo habilitado, podem requerer ao juiz a convocação de assembléia que delibere em termos precisos sobre o modo de realização do ativo, desde que não contrários ao disposto na presente lei, e sem prejuízo dos atos já praticados pelo síndico na forma dos artigos anteriores, sustando-se o prosseguimento da liquidação ou o decurso de prazos até a deliberação final. 1º A convocação dos credores será feita por edital, mandado publicar pelo síndico, com a antecedência de oito dias, e do qual constarão lugar, dia e hora designados. 2º Na assembléia, a que deve estar presente o síndico, o juiz presidirá os trabalhos, cabendo-lhe vetar as deliberações dos credores contrários às disposições desta lei. 3º As deliberações serão tomadas por maioria calculada sobre a importância dos créditos dos credores presentes. No caso de empate, prevalecerá a decisão do grupo que reunir maior número de credores. 4º Nas deliberações relativas ao patrimônio social, somente tomarão parte os credores sociais; nas que se relacionarem com o patrimônio individual de cada sócio, concorrerão os respectivos credores particulares e os credores sociais. 5º Do ocorrido na assembléia, oescrivão lavrará ata que conterá o nome dos presentes e será assinada pelo juiz. Os credores assinarão lista de presença que, com a ata, será junta aos autos da falência. Art. 123. Qualquer outra forma de liquidação do ativo pode ser autorizada por credores que representem dois terços dos créditos. 1º Podem ditos credores organizar sociedade para continuação do negócio do falido, ou autorizar o síndico a ceder o ativo a terceiro. 2º O ativo somente pode ser alienado, seja qual for a forma de liquidação aceita, por preços nunca inferiores aos da avaliação, feita nos termos do parágrafo 2º do artigo 70. 3º A deliberação dos credores pode ser tomada em assembléia, que se realizará com observância das disposições do artigo anterior, exceto a do parágrafo 3º; pode ainda ser reduzida a instrumento, público ou particular, caso em que será publicado aviso para ciência dos credores que não assinaram o instrumento, os quais, no prazo de cinco dias, podem impugnar a deliberação da maioria. 4º A deliberação dos credores dependem de homologação do juiz e da decisão cabe agravo de instrumento, aplicando-se ao caso o disposto no parágrafo único do artigo 17. 5º Se a forma de liquidação adotada for de sociedade organizada pelos credores, os dissidentes serão pagos, pela maioria, em dinheiro, na base do preço da avaliação dos bens, deduzidas as importâncias correspondentes aos encargos e dívidas da massa. 79 PERIN JÚNIOR, Ecio. O Administrador Judicial e o Comitê de Credores no Novo Direito Concursal Brasileiro. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de. (coord.). Direito falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 186-187. 30 A iniciativa da criação do Comitê de Credores (artigos 26 a 34, da LRE) e da Assembléia Geral de Credores (artigos 35 a 46, da LRE), tem como embrião, mecanismos existentes no Dec-Lei 7661/45 que, de fato, foram pouco utilizados. Importante será destacar quais foram as razões do insucesso dos dispositivos existentes na legislação anterior, para que se possa evitar futuros problemas. Muito embora a novel legislação trate do tema com maior grau de complexidade. (...)São essas algumas da razões que explicam em parte o fracasso do modelo vigente na legislação anterior: o processo falimentar era extremamente moroso e oneroso. Os credores deixavam, na maioria das vezes de se interessar pela recuperação do capital investido e com isso permitiam a livre atividade de atores não credores (síndico, Ministério Público, etc) que decidiam, muitas vezes, com base em agendas diferentes e incompatíveis com a recuperação da empresa ou do crédito. Corroborando a idéia acima, BEZERRA FILHO80 afirma que: O Comitê de Credores não é figura nova em nosso diploma falimentar, pois existe na lei anterior, desde 1945, como se pode ver dos arts. 122 e 123 daquele diploma, que previam exatamente a formação do comitê de credores para liquidar ou administrar a massa falida, da forma que viessem a propor ao juiz. No entanto – e a observação é valida também para a presente lei –, não houve interesse em usar tal prerrogativa legal, porque a recuperação da empresa por meio de comitês é um fenômeno de natureza econômica e não jurídica. Ou seja, embora já houvesse a previsão legal, não houve interesse econômico e, por isso mesmo, o sistema de comitês não funcionou na legislação anterior. Entretanto é indiscutível sua importância em processos de insolvência onde haja envolvimento de grandes quantias, sejam elas no passivo ou no ativo. Ezio Carlos S. Baptista81, expõe a importância do Comitê de Credores: O comitê de credores tem escopo de despertar nos credores da massa falida um maior interesse pela condução do processo de recuperação ou de falência, uma vez que possui direito de fiscalização sobre os atos desenvolvidos pelos administradores judiciais, bem como o direito de requerer ao magistrado a convocação de assembléia de credores nas vezes em que se depararem com atos de interesse da comunidade de credores. Funciona o comitê como um grande interlocutor permanente entre os anseios dos credores e o desenvolvimento do processo, já que as assembléias de credores são convocadas para deliberarem sobre pontos específicos e possuem caráter eventual. 80 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei ... p.100. 81 Ezio Carlos S. Baptista. Comentários aos Artigos 21 ao 34. In: DE LUCCA, Newton e SIMÃO FILHO, Adalberto (coord). Comentários ... p.166. 31 O Comitê de Credores na LFRE é órgão facultativo tanto na falência quanto na recuperação judicial82. Será constituído por deliberação de qualquer das classes de credores na Assembléia Geral, conforme a necessidade e complexidade do processo de insolvência instaurado. Poderá ser criado pelo juiz, de ofício, ou a pedido de qualquer das classes de credores da Assembléia Geral. ...o Comitê de Credores é órgão de criação facultativa e que, certamente, apenas será criado – se o for – em recuperações e falências de grande espectro, pois as formalidades que cercam tanto a convocação da assembléia-geral quanto o funcionamento do Comitê mostram que a Lei não pretendeu destiná-lo para feitos de pequena expressão econômica. Inexistente o Comitê, todas as suas atribuições serão exercidas pelo administrador judicial e na administração da massa falida, e também eventualmente, pelo próprio juiz.83 Assim, é indiscutível a importância de tal órgão na administração da falência e da recuperação judicial desde que sua criação seja justificada pelo fator econômico. A criação do Comitê de Credores em falências ou recuperações judiciais inexpressivas pode acarretar um ônus impossível de ser suportado pela massa insolvente. 3.2.1 Estrutura, Atribuições e Funcionamento O comitê de credores é composto por três membros sendo um representante de cada uma das três classes de credores84 com dois suplentes cada. 82 Neste sentido. Fabio Ulhoa Coelho: “É facultativa a instalação do Comitê. Ele não existe e não deve existir em toda e qualquer falência ou recuperação judicial. Deve, ao contrário, ser instaurado pelos credores apenas quando a complexidade e o volume da massa falida ou da empresa em crise o recomendar. Não sendo empresa de vulto (seja pelo indicador da dimensão do ativo, seja pelo do passivo) e não havendo nenhuma especificidade que jusitifque a formação da instancia de consulta, o Comitê representará apenas burocracia e perda de tempo, sem proveito algum para o processo falimentar ou de recuperação”. COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários... p. 72. 83 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei ... p.104-105. 84 São três as classes previstas pela LFRE em seu artigo 41: i) créditos trabalhistas e de acidentes do trabalho; ii) créditos com garantia real; iii) créditos quirografários, com privilégio especial e geral e créditos subordinados. 32 Poderá o Comitê funcionar normalmente com a representação de até duas classes de credores. Posteriormente se houver o interesse da classe faltante, esta poderá requerer diretamente ao juiz, independentemente de realização da Assembléia Geral, a nomeação de seu representante e suplentes, conforme disposto no artigo 26 da LFRE85. Entre os três membros do Comitê será escolhido um representante. Havendo empate na votação a solução será dada pelo administrador e havendo incompatibilidade deste, pelo juiz, em atenção ao artigo 27,
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