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Constitucionalizacao do Direito Eleitoral

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DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 21
CAPÍTULO 1
A CONSTITUCIONALIZAÇÃO
DO DIREITO ELEITORAL
Sumário: 1. Introdução; 2. A constitucionalização do Direito; 3. A cons-
titucionalização do Direito Eleitoral; 3.1. A regulação constitucional dos di-
reitos políticos; 3.2. A filtragem constitucional do ordenamento jurídico-
eleitoral; 3.2.1. Breves anotações sobre o Direito Eleitoral infraconstitu-
cional; 3.2.2. Vetores interpretativos da legislação eleitoral; 3.3. Exemplos
da constitucionalização do Direito Eleitoral; 4. Considerações finais; Re-
ferências.
1. INTRODUÇÃO
A locução “constitucionalização do Direito” é daquelas de
cunho polissêmico, podendo ser usada para: a) caracterizar qual-
quer ordenamento jurídico no qual vigore uma Constituição
dotada de supremacia; e para b) distinguir o fato de uma Cons-
tituição formal incorporar inúmeros temas afetos aos diversos
ramos infraconstitucionais do Direito1 .
Na terceira variante, que é a de que trataremos aqui, a
expressão serve para identificar um “efeito expansivo das normas
constitucionais, cujo conteúdo material e axiológico se irradia,
com força normativa, por todo o sistema jurídico”2 , ou ainda, a
“irradiação dos efeitos das normas (ou valores) constitucionais
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1 Cf. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do
Direito (O triunfo tardio do Direito Constitucional do Brasil) in SOUZA NETO,
Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). A Constitucionalização do Di-
reito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2007, p. 217.
2 Idem, ibidem.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA22
aos outros ramos do direito”3 , condicionando, além da validade,
o sentido do Direito infraconstitucional.
Nessa acepção, temos o que se costuma denominar de fil-
tragem constitucional, decorrência da supremacia, norma-
tividade e centralidade da Constituição, determinando que todo
o ordenamento jurídico infraconstitucional seja lido e apreendido
sob a lente da Lei Maior, buscando realizar os valores nela
consagrados4 .
Os estudos realizados pela doutrina nacional acerca da
constitucionalização do Direito – ainda que não especificamente
sobre a vertente da filtragem –, avançam no sentido de identificar
seus reflexos nos mais diversos ramos da produção normativa.
Assim, já foram examinadas, dentre outras, aplicações espe-
cíficas no campo dos Direitos Civil, Penal, Administrativo, Pro-
cessual Civil, Ambiental, Internacional, Financeiro, do Trabalho
e das Obrigações. 5
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3 SILVA, Virgílio Afonso da. A Constitucionalização do Direito: Os direitos funda-
mentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2008, p.18.
4 Cf. SCHIER, Paulo Ricardo. Filtragem Constitucional: construindo uma nova
dogmática jurídica. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1999, p. 25: “[...] o fenômeno toma-
do como objeto de estudo refere-se a que, diante da força normativa da Constituição, todo
o ordenamento jurídico estatal deve ser lido sob a ótica da axiologia, materialidade e
juridicidade constitucional” ; para o autor, a leitura do ordenamento
infraconstitucional através do filtro da Constituição é uma das características da
preeminência normativa da Lei Maior (Canotilho/Vital Moreira), que, todavia, não
se confunde com a “filtragem constitucional”; esta é a projeção da preeminência
normativa num sistema aberto de regras e princípios: “Dessa idéia de preeminência
normativa da Constituição, em um segundo momento projetada para o Direito Constitu-
cional enquanto realidade sistemática, pode-se pensar a categoria da Filtragem Constitu-
cional”.
5 Cf. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). Op. cit.
SAMPAIO, José Adércio Leite (Coord.). Constituição e crise política. Belo Hori-
zonte: Del Rey, 2006.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 23
Buscaremos, no presente ensaio, analisar a constituciona-
lização do Direito Eleitoral, especialmente sob a perspectiva da
filtragem constitucional, cujos efeitos podem ser identificados
de forma clara em recentes pronunciamentos dos que são incum-
bidos de interpretar a legislação eleitoral no Brasil, especialmente
o Tribunal Superior Eleitoral.
2. A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
A constitucionalização do Direito decorre do reconhe-
cimento da supremacia da Constituição e de sua força nor-
mativa6 , importando tenha sido conduzida ao centro do sistema
jurídico7 , condicionando a interpretação de todo o ordenamento
infraconstitucional, de modo que “nenhuma norma do direito
ordinário é ‘livre da Constituição’, antes é informada mate-
rialmente por ela”8 .
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6 Cf. HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição (Die normative Kraft der
Verfassung). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991.
7 Embora as premissas sejam aqui alinhadas para fundamentar o fenômeno da
constitucionalização do Direito, também são identificadas como elementos
metodológico-formais do chamado neoconstitucionalismo. Cf. BARCELLOS, Ana
Paula de. Neoconstitucionalismo, direitos fundamentais e controle das políticas
públicas. in SARMENTO, Daniel; GALDINO, Flavio (Org.). Direitos Fundamentais:
Estudos em homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar,
2006, p. 32-33: “Do ponto de vista metodológico-formal, o constitucionalismo atual opera
sobre três premissas fundamentais, das quais depende em boa parte a compreensão dos siste-
mas jurídicos ocidentais contemporâneos. São elas: (i) a normatividade da Constituição, isto
é, o reconhecimento de que as disposições constitucionais são normas jurídicas dotadas,
como as demais, de imperatividade; (ii) a superioridade da Constituição sobre o restante da
ordem jurídica (cuida-se aqui de Constituições rígidas, portanto); e (iii) a centralidade da
Carta nos sistemas jurídicos, por força do fato de que os demais ramos do Direito devem ser
compreendidos e interpretados a partir do que dispõe a Constituição. Essas três característi-
cas são herdeiras do processo histórico que levou a Constituição de documento essencial-
mente político, e dotado de baixíssima imperatividade, à norma jurídica suprema, com todos
os corolários técnicos que essa expressão carrega”.
8 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. 5.ed. Coimbra: Almedina, 1991,
p. 143.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA24
Superando o paradigma de Constituição como documento
essencialmente político, passa ela a ser reconhecida, especialmente
na segunda metade do século XX9 , como documento cujos precei-
tos são dotados de força normativa: “uma força própria, motivadora
e ordenadora da vida do Estado” segundo Hesse, importando que
não configure apenas uma expressão da realidade, mas, ao con-
trário, ordene e conforme a realidade política e social10 .
Como conseqüência, a Constituição deixa de gozar apenas
de supremacia formal e passa a ser reconhecida por sua supre-
macia material, axiológica, a reclamar que todo o ordenamento
infraconstitucional, mais do que nela encontre seu fundamento
de validade, se destine a assegurar a máxima efetividade dos
valores nela consagrados.
Nessa perspectiva, segundo Canotilho, o Direito ordinário
é convertido em Direito constitucional concretizado. As normas
constitucionais passam a atuar em duas frentes: como determi-
nantes negativas, impondo limites às normas hierarquicamente
inferiores; e como determinantes positivas, para regular par-
cialmente o próprio conteúdo das normas inferiores, “de forma
a obter-se não apenas uma compatibilidade formal entre o direito
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9 O marco apontado para oreconhecimento da normatividade da Constituição é con-
testado por DIMOULIS, Dimitri. Uma visão crítica do neoconstitucionalismo. in LEI-
TE, George Salomão; LEITE, Glauco Salomão (Coord.). Constituição e efetividade cons-
titucional. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 50: “[...] se a reivindicação-afirmação da força
normativa suprema da Constituição está presente nos discursos constitucionais e na prática
institucional desde o início do constitucionalismo no século XVII, não é possível denominar
essa tendência de ‘neoconstitucionalismo’, pois não se verifica nenhuma inovação”.
10 A asserção busca claramente contrapor-se à idéia de Ferdinand Lassalle sobre ser a
constituição escrita um mero pedaço de papel. Para Lassalle a Constituição real seria
aquela que tem raízes nos fatores do poder: “Onde a constituição escrita não corresponder
à real, irrompe invariavelmente um conflito que é impossível evitar e no qual, mais dia menos
dia, a constituição escrita, a folha de papel, sucumbirá necessariamente, perante a constituição
real, a das verdadeiras forças vitais do país.” (LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Cons-
tituição, 6.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p.33).
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 25
supra-ordenado (normas constitucionais) e infra-ordenado (nor-
mas ordinárias, legais, regulamentares, etc.), mas também uma
verdadeira conformidade material”11 .
Tem-se, com efeito, aquilo que Louis Favoreu (La constitutionnalisation
Du Droit) denominou de impregnação dos diferentes ramos do
Direito pelos valores constitucionais, transformando o conteúdo
do Direito infraconstitucional12 .
No Brasil, por motivos óbvios, o fenômeno da constitucio-
nalização do Direito é observado desde a promulgação da Carta
de 88 (social, dirigente e compromissária, voltada para o resgate
das promessas da modernidade13), mantendo-se em clara
expansão. Daí a lembrança de Clèmerson Clève de que emergiu
no Brasil, após a promulgação da Constituição de 1988, uma
doutrina identificada como dogmática constitucional da efetividade,
cujo compromisso primeiro não era de ordem teórica, mas
preponderantemente de cunho político:
Tratava-se de apostar nas virtualidades dirigentes do novo texto
e de irrigar a ordem jurídica com os valores plasmados no
documento constitucional. Para isso, importava reler todo o
direito à luz da principiologia da Constituição, através do pro-
cesso reconhecido como filtragem constitucional. Tratava-se,
portanto, de uma doutrina amiga da Constituição, enfim, de
uma doutrina constitucional amorosa, vinculada até a medula
à idéia de normatividade integral da lei fundamental14 .
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11 Idem, ibidem.
12 Apud SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit. p. 48.
13 STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica. 2.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2004, p.15. Embora identificando a mudança de paradigma com a edição da
Constituição de 88, afirma o autor que: “[...] não houve ainda, no plano hermenêutico, a
devida filtragem – em face da emergência de um novo modelo de Direito representado pelo
Estado Democrático de Direito – desse (velho/defasado) Direito, produto de um modelo liberal-
individualista-normativista de Direito”(p. 16-17).
14 CLÈVE, Clèmerson Merlin. Direito Constitucional, novos paradigmas, consti-
tuição global e processos de integração. Revista Trimestral de Direito Público. v.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA26
O reconhecimento da força normativa da Constituição e
de sua centralidade no sistema jurídico – a superar o postulado
de que está no vértice da pirâmide (Kelsen), mas antes é um
“centro exercente de atração de ordem gravitacional sobre o
vasto universo normativo contaminado pela fragmentação” 15,
de modo que, no campo jurídico, tudo haverá de orbitar em torno
dela – importa que seus efeitos irradiem para os mais variados
campos da atuação humana, tanto que se cogita atualmente na
“ubiqüidade constitucional”, considerando-se que “os mais
relevantes conflitos políticos e sociais estão sendo equacionados
a partir da Constituição – do impeachment de um Presidente da
República até reformas da Previdência Social; do aborto de feto
anencéfalo até o controle de atos de CPI’s”16 .
Podemos acentuar, com efeito, a exemplo de Clève, que o
Direito Constitucional (centro, fundamento e filtro) agora é
outro:
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39. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 24. Cf. também BARROSO, Luís Roberto. Da
falta de efetividade à judicialização excessiva: direito à saúde, fornecimento gra-
tuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. in LEITE, George
Salomão; LEITE, Glauco Salomão (Coord.). Op. cit. p. 223: “Tal movimento [dou-
trina brasileira da efetividade] procurou não apenas elaborar as categorias dogmáticas
da normatividade constitucional, como também superar algumas crônicas disfunções da
formação nacional, que se materializavam na insinceridade normativa, no uso da Cons-
tituição como uma manifestação ideológica e na falta de determinação política em dar-
lhe cumprimento. A essência da doutrina da efetividade é de tornar as normas constitu-
cionais aplicáveis direta e imediatamente, na extensão máxima de sua densidade
normativa”.
15 CLÈVE, Clèmerson Merlin. Ibidem.
16 SARMENTO, Daniel. Ubiqüidade Constitucional: Os Dois Lados da Moeda. in
SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). A Consti-
tucionalização do Direito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 114. Acrescenta o autor que: “[...] hoje, além das gran-
des questões, a Constituição influencia também a resolução dos pequenos conflitos. Ela é
invocada não só nas causas mais graúdas ou polêmicas, como também em modestas ações de
cobrança, em singelas reclamações trabalhistas, em pequenas demandas nos juizados especi-
ais. A Constituição, enfim, está presente de várias maneiras no dia-a-dia das pessoas, como
nunca antes esteve no Brasil”.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 27
Não é mais um discurso de especialistas, uma linguagem apenas
para os iniciados. Ao contrário, é agora língua comum, idioma
compartilhado por todos os juristas (para não falar dos cidadãos),
uma espécie de língua franca na medida em que não há possi-
bilidade de aplicar o direito (qualquer ramo do direito) sem, ao
mesmo tempo, transitar pelo direito constitucional. Mas é língua
franca também para o sítio exterior ao exercício profissional do
direito. Eis a razão pela qual a Constituição que incide tem seu
sentido construído e reconstruído num processo democrático
permanente de disputabilidade intersubjetiva levado a efeito pela
sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, para fazer uso
da eloqüente expressão sugerida por Häberle.17
A irradiação das normas e valores constitucionais sobre o
ordenamento infraconstitucional alcança também o Direito
Eleitoral, em cujo âmbito podem ser facilmente percebidos os
efeitos da constitucionalização do Direito, como veremos a
seguir.
3. A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO ELEI-
TORAL
Antes de tecer considerações sobre a filtragem cons-
titucional do Direito Eleitoral ordinário, objeto central do
presente trabalho, devemos alinhar breves impressões sobre a
normatização dos direitos políticos na Constituição.
3.1. A regulação constitucional dos direitos políticos
O Direito Eleitoral pode ser conceituado como o conjunto
de regras e princípios que regulam o exercício dos direitos
políticos. Trata-se da identificação do objeto em sua essência,
mercê da ampla abrangência da expressão direitos políticos,
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17 Op. cit. p. 25.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA28
entendidos, segundo José Afonso da Silva, como adisciplina dos
meios necessários ao exercício da soberania popular18 .
O conceito formulado aproxima-se daquele alinhado pela
clássica lição de Fávila Ribeiro, para quem o Direito Eleitoral é o
conjunto de “normas e procedimentos que organizam e disci-
plinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo
a que se estabeleça a precisa equação entre a vontade do povo e
a atividade governamental”19 .
Entendido o Direito Eleitoral como o conjunto de normas
que disciplinam o exercício dos direitos políticos, ou, como
lembra Clève, regulam o método ou procedimento democrático
de legitimação do poder político20 , não se identifica qualquer
inovação em assistirmos às suas normas contempladas no Texto
Constitucional, uma vez que tal decorre da própria razão da
existência de uma Constituição, que, dispondo sobre a titu-
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18 SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros,
2000, p. 347.
19 RIBEIRO, Fávila. Direito Eleitoral. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p.4. A for-
mulação supera com vantagens os conceitos excessivamente analíticos encontrados
atualmente na doutrina nacional, dentre os quais os apresentados por PINTO, Djalma.
Direito Eleitoral, Improbidade Administrativa, Responsabilidade Fiscal – Noções
Gerais. São Paulo: Atlas, 2003, p.30; e RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. Rio de
Janeiro: Impetus, 2006, p. 24, para quem o “Direito Eleitoral é um conjunto de normas
jurídicas que regulam o processo de alistamento, filiação partidária, convenções partidárias,
registro de candidaturas, propaganda política eleitoral, votação, apuração, proclamação dos
eleitos, prestação de contas de campanhas eleitorais e diplomação, bem como as formas de
acesso aos mandatos eletivos através dos sistemas eleitorais. Na verdade, o Direito Eleitoral
tem por função regulamentar a distribuição do eleitorado, o sistema eleitoral, a forma de vota-
ção, a apuração, a diplomação e garantir a soberania popular através do voto eletrônico ou do
depósito da cédula na urna eleitoral”.
20 CLÈVE, Clémerson Merlin. Temas de Direito Constitucional (E de Teoria do Direi-
to). São Paulo: Acadêmica, 1993, p. 86. E acrescenta o autor: “Falhando o direito eleitoral,
falha o procedimento legitimador, esmorecem os canais de comunicação entre a ação do Estado
e a vontade popular, aparecem as “crises políticas”. Bem elaborado o direito eleitoral e suas
instituições, serão mais estreitas as distâncias que separam o poder da massa de cidadãos”.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 29
laridade do poder soberano, haveria de impor disciplina aos
meios para o seu exercício.
Sendo da própria essência da Constituição a organização
do poder político21 , não se constata qualquer surpresa em encon-
trar as normas eleitorais – seja quanto ao exercício da capaci-
dade eleitoral ativa, seja quanto à capacidade eleitoral passiva –
dispostas na Lei Maior22 .
Lembra-nos Jorge Miranda que o constitucionalismo
triunfante a partir do final do século XVIII, de origem anglo-saxônica
e francesa, propõe-se simultaneamente a garantir direitos
individuais e a transferir o poder do monarca para a coletividade
(ou para quem estiver em condições de falar em nome dela),
surgindo, assim, o governo representativo, que “oferece a par-
ticularidade, em contraste com a vida política antecedente, de elevar
a eleição a instrumento periódico de legitimação dos governantes”23 .
Assim, é a Constituição o locus próprio onde estão dis-
ciplinadas as condições de alistabilidade, elegibilidade, inelegi-
_____________________________________________________________________________________________
21 Cf. BARROSO, Luís Roberto. A doutrina brasileira da efetividade. in BONAVIDES,
Paulo; LIMA, Francisco Gerson Marques de; BEDÊ, Fayga Silveira (Org.). Constitui-
ção e Democracia: Estudos em homenagem ao Professor J.J. Gomes Canotilho. São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 443: “A Constituição é o primeiro documento na vida jurídica do
Estado, assim do ponto de vista cronológico como hierárquico. Dotada de supremacia, suas
normas devem ter aplicação preferencial, condicionando, ademais, a validade e o sentido de
todos os atos normativos infraconstitucionais. Uma Constituição, ao instituir o Estado, (a)
organiza o exercício do poder político, (b) define os direitos fundamentais do povo e (c) estabe-
lece determinados princípios e traça fins públicos a serem alcançados. Por via de conseqüência,
as normas materialmente constitucionais podem ser agrupadas nas seguintes categorias: a)
normas constitucionais de organização; b) normas constitucionais definidoras de direitos; c)
normas constitucionais programáticas”.
22 Nosso constitucionalismo revela que, mesmo nas cartas outorgadas, como as de
1824 e 1937, os direitos políticos sempre estiveram tratados nas respectivas cartas.
23 MIRANDA, Jorge. Direito Constitucional III: Direito Eleitoral; Direito Parlamentar.
Lisboa: Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2003, p. 11.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA30
bilidades, perda e suspensão de direitos políticos etc., formando
o que se denomina de Direito Constitucional Eleitoral. Tais
normas constituem inegavelmente fontes do Direito Eleitoral,
repercutindo sobre a atuação do legislador ordinário e da própria
interpretação a ser realizada pelo Poder Judiciário24 .
Sob essa perspectiva, ou seja, de regulação constitucional
da matéria eleitoral, não se pode cogitar em qualquer inovação,
daí não pretendermos distinguir tal fenômeno como constitu-
cionalização do Direito Eleitoral, uma vez que, para os fins a
que nos propomos, tal expressão serve para distinguir o que se
denomina de filtragem constitucional do Direito Eleitoral ordi-
nário.
3.2. A filtragem constitucional do ordenamento jurí-
dico-eleitoral
Neste ponto, é possível identificar uma mudança signi-
ficativa na interpretação do ordenamento jurídico-eleitoral no
período pós-Constituição de 1988, especialmente no sentido de
que as normas infraconstitucionais, por atuação determinante
da Justiça Eleitoral, passam a ser lidas e apreendidas à luz da
Lei Maior25 . É nesse sentido que podemos falar de constituciona-
_____________________________________________________________________________________________
24 Lembra BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização
do Direito (O triunfo tardio do Direito Constitucional do Brasil) in SOUZA NETO,
Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). A Constitucionalização do Di-
reito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2007, p. 226: “[...] na medida em que princípios e regras específicos de uma disciplina
ascendem à Constituição, sua interação com as demais normas daquele subsistema muda
de qualidade e passa a ter um caráter subordinante. Trata-se da constitucionalização das
fontes do direito naquela matéria. Tal circunstância, nem sempre desejável, interfere com
os limites de atuação do legislador ordinário e com a leitura constitucional a ser empreen-
dida pelo Judiciário em relação ao tema que foi constitucionalizado”.
25 Cf. CLÈVE, Clèmerson Mérlin. Direito Constitucional, novos paradigmas,
constituição global e processos de integração. Revista Trimestral de Direito Pú-
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 31
lização do Direito Eleitoral como fenômeno relativamente novo
no Brasil.
Importa inicialmente que façamos breve análise do Direito
Eleitoral infraconstitucional.
3.2.1. Breves anotações sobre o Direito Eleitoral infracons-
titucional
Em princípio, é de se observar que, ao contrário do governo
democrático – que, instalado no País há quase duas décadas, não
cuidou de editar uma nova codificação eleitoral –, os militares
que ascenderam ao poder no Brasil em 1964 logo cuidaram de
instituir um novo CódigoEleitoral (Lei 4.737, de 15 de julho de
1965), que recebeu marcante influência dos ideais então acolhidos
pelo regime autoritário26 .
A edição de um novo Código Eleitoral, mesmo num período
de exceção, se justificava em vista de uma peculiaridade do regi-
_____________________________________________________________________________________________
blico. v. 39. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 25: “A Constituição é fundamento, mas é
também centro, estrela-mãe a atrair para sua órbita os fragmentos que compõem o univer-
so normativo contraditório da sociedade complexa. É igualmente filtro que retém e repele
o que não pode integrar a ordem jurídica recomposta. Qualquer estudo jurídico, portanto,
sendo indiferente o ramo do saber, haverá de começar levando em conta a Constituição do
ponto de vista formal e material, especialmente para cotejar a disposição que reclama apli-
cação com o Texto Constitucional e daí retirar a demonstração de sua legitimidade. Mas o
trabalho final do operador jurídico, consistente na solução deste ou daquele caso, não se
completa, não se perfaz, se também não for testado mais uma vez à luz da Constituição.
A Constituição tem lugar no começo e no fim do trabalho hermenêutico”.
26 A asserção pode ser facilmente comprovada através de um rápido exame, por
exemplo, do art. 243, do Código Eleitoral, que ao estabelecer as vedações quanto à
propaganda eleitoral, proíbe as manifestações: “I – de guerra, de processos violentos
para subverter o regime, a ordem política e social, ou de preconceitos de raça ou de classes;
II – que provoque animosidade entre as Forças Armadas ou contra elas, ou delas contra as
classes e as instituições civis; III – de incitamento de atentado contra pessoa ou bens;
IV – de instigação à desobediência coletiva ao cumprimento de lei de ordem pública”.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA32
me militar brasileiro, que mantivera as eleições diretas para
alguns cargos27 .
Não obstante o processo de redemocratização e a realização
de eleições diretas em todos os níveis, não se cuidou, até hoje,
da criação de um novo Código Eleitoral. Ainda assim, é possível
identificar significativas alterações da legislação eleitoral,
mediante a edição de leis ordinárias (um bom exemplo são as
chamadas “leis do ano”28 ), ou até mesmo por intermédio de
resoluções do Tribunal Superior Eleitoral29 , sem que se procure
atualizar o Código Eleitoral, cujo texto, a essa altura, registra
inúmeras disposições revogadas tacitamente.
Quem se inicia no estudo das normas eleitorais será, por
certo, tomado de espanto ao perceber, por exemplo, que o Código
Eleitoral não disciplina o sistema informatizado de votação e
apuração. Muito embora o uso da urna eletrônica em todo o
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27 Conforme anota NICOLAU, Jairo. História do voto no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2002, p. 55: “Uma das singularidades do regime militar instaurado em 1964
no Brasil foi a manutenção de eleições diretas para alguns cargos. Em meio a toda sorte de
casuísmos legislativos, durante 13 anos (1966 -79) os dois únicos partidos que conseguiram se
organizar (ARENA e MDB) disputaram as preferências do eleitorado. Ainda que dezenas de
parlamentares tenham sido cassados e o Congresso tenha sido fechado em duas ocasiões, as
eleições proporcionais não foram suspensas e os eleitores escolheram deputados federais, depu-
tados estaduais (1966, 1970, 1974 e 1978) e vereadores (1972 e 1976)”.
28 As “leis do ano” ficaram assim conhecidas em vista da aplicação do princípio da
anualidade da lei eleitoral, previsto no art. 16, da CF/88: “A lei que alterar o processo
eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que
ocorra até um ano da data de sua vigência”; a observância do princípio determinou,
durante alguns anos, que se editasse uma nova lei para cada eleição que se avizinha-
va; desde 1997, com edição da Lei 9.504, se busca uma legislação com maior pereni-
dade, o que se tem logrado, não obstante algumas mudanças pontuais e outras mais
significativas, como as determinadas pela edição da Lei 11.300/06, intitulada de
“minirreforma eleitoral”.
29 Ainda que as resoluções não assumam o condão de revogar disposições do Código
Eleitoral, não são raros os episódios em que o Tribunal Superior Eleitoral edita nor-
mas que contrariam a lei, exorbitando de seu poder regulamentar. Sobre o tema, re-
metemos o leitor ao Capítulo 9.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 33
Território Nacional tenha sido efetivado desde as eleições
municipais de 2000, não é no Código Eleitoral onde se encontrará
a disciplina do sistema, pois a vetusta codificação ainda continua
a tratar exclusivamente a votação por cédulas, cogitando em ins-
trumentos absolutamente ultrapassados como “folha individual
de votação”, “mapas parciais de apuração”, “voto em separado”,
para dizer o menos.
As atualizações da legislação eleitoral, com efeito, são
realizadas por intermédio de leis esparsas e da edição de
resoluções por parte do TSE. Estas, aliás, se deveriam cingir a
“garantir a fiel execução da lei”, todavia desbordam de tal limite
para contemplar entendimentos que chegam em algumas
ocasiões a contrariar frontalmente o Código Eleitoral30 .
Certamente, os ares democráticos respirados no pós-88
justificam uma nova codificação. As vicissitudes do processo
eleitoral, que demandam rapidez na regulação de situações
surgidas em meio à disputa (e que não poderiam aguardar o
processo legislativo ordinário), parecem não justificar a ausência
de um novo Código, ainda que mais enxuto, regulando o es-
sencial do exercício dos direitos políticos. A tentativa de
estabelecer-se legislação perene, que garanta o mínimo de segu-
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30 Exemplo claro desse confronto pode ser encontrado na permissão por parte do TSE
da realização de carreatas, caminhadas e passeatas até a véspera do dia da eleição,
quando, a teor do art. 240, P. Único, do Código Eleitoral, nenhuma manifestação de
propaganda através de reunião pública é admitida nas 48 horas anteriores ao pleito.
O dispositivo, que integrou as normas para eleições de 2004 e 2006 e que fora supri-
mido para as eleições de 2008, findou reeditado, através da Resolução 22.829, que
incluiu o artigo 69-A na Resolução 22.718/08, que regula a propaganda eleitoral para
as eleições municipais de 2008. Merece referência, ainda, a recentíssima Resolução
22.874 (01.07.08), que permite que pré-candidatos e candidatos participem de entre-
vistas realizadas antes de 6 de julho do ano da eleição com a exposição de platafor-
mas e projetos políticos, contrariando frontalmente o art. 36, da Lei 9.504/97, que
fixa o marco inicial para a propaganda eleitoral.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA34
rança aos envolvidos no processo eleitoral, como se busca fazer
com a Lei 9.504/97, recomenda a tentativa, ainda que não se possa
esperar um diploma que esgote a gama de situações pendentes
da disciplina.
Mesmo os que não identificam mora legislativa ante a
ausência de um novo Código, não a deixam de reconhecer
quando presente a referência do art. 121 da Carta de 88, que
reservou à lei complementar dispor sobre a organização e compe-
tência dos órgãos da Justiça Eleitoral. Passados quase 20 anos
desde a promulgação da Grande Carta, tal lei ainda não foi edi-
tada, importando se tenha reconhecido que o Código Eleitoral,
no tocante a tais matérias, fora recepcionado pela ordem consti-
tucional instalada em 1988 com o status de lei complementar31 ,
estando até hoje a disciplinar a competência da Justiça Eleitoral,
ainda que o faça com inegável deficit32 .
Diversos dispositivos do Código acerca da competência
da Justiça Eleitoral sequer foram recepcionados pela nova
ordem constitucional, todavia ali continuama figurar,
confundindo os que se postam a manusear a legislação eleitoral.
Exemplo claro é a previsão do art. 22, I, “d”, que estabelece
competir ao TSE processar e julgar originariamente “os crimes
eleitorais e os comuns que lhes forem conexos cometidos pelos
seus próprios Juízes e pelos Juízes dos Tribunais Regionais”. É
sabido que, de acordo com o disposto na Carta de 88, eventuais
_____________________________________________________________________________________________
31 A recepção parcial do Código Eleitoral como lei complementar restou reforçada
pela edição da Lei Complementar N º 86, de 14 de maio de 1996, que criou a ação
rescisória eleitoral no âmbito da competência do TSE. Cf. Capítulo 6 (nota 4).
32 Exemplo claro dessa tibieza do Código Eleitoral pode ser identificado quando se
examina a competência da Justiça Eleitoral para dirimir questões posteriores à
diplomação, ou ainda questões internas dos partidos políticos. A ausência de
regramento específico tem criado inegáveis confusões e impropriedades quanto à de-
finição das atribuições dos órgãos do Judiciário Eleitoral. Cf. Capítulo 10 (infra).
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 35
crimes cometidos por ministros de tribunais superiores devem
ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal, enquanto as
infrações penais praticadas por membro de Tribunal Regional
Eleitoral estão afetas à competência do Superior Tribunal de
Justiça33 .
Já no que tange à disciplina das inelegibilidades, temos a
Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, nascida por
decorrência da norma do art. 14, § 9º, da Constituição Federal.
Não obstante editada sob a égide da Carta de 88, e por imposição
dela, tem-se que o diploma carece de pronta atualização, pois o
dispositivo constitucional que fundamenta a criação de inelegi-
bilidades foi alterado pela Emenda Constitucional de Revisão
nº 04, de 07 de junho de 1994, passando a contemplar valores
outros que não os consagrados na redação original.34
Recordamos, ainda, o fato de que no plano infraconstitucio-
nal, é possível encontrar a Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/
95). Ainda que alguns hoje cogitem na existência do Direito Parti-
_____________________________________________________________________________________________
33 Poderíamos citar outro exemplo, como a competência do TSE para processar e jul-
gar mandados de segurança, em matéria eleitoral, impetrados contra ato do Presi-
dente da República (Art. 22, inciso I, alínea “e” ); a incompatibilidade do dispositivo
com a Constituição fora declarada ainda na vigência da ordem constitucional decaí-
da, após o julgamento do MS 20.409/DF (31.08.83), por parte do Supremo Tribunal
Federal.
34 Para um exame mais aprofundado do tema, conferir o que escrevemos no Capítulo 2.
Os valores incluídos foram a probidade administrativa e a moralidade para o exercí-
cio do mandato, considerada a vida pregressa do candidato. Ainda que a Lei Comple-
mentar 64 já criasse impedimentos com base em tais valores (mesmo antes de que
constassem expressamente da Constituição), há clara necessidade de atualização da
Lei das Inelegibilidades, especialmente para o fim de delimitar quais situações po-
dem ser consideradas para fins de definição da vida pregressa desabonadora. Na
ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) nº 144, ajuizada pela
AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) em 26 de junho de 2008, argüi-se que
alguns dispositivos da Lei das Inelegibilidades seriam incompatíveis com a redação
do art. 14, § 9º, da CF, com a redação dada pela Emenda de Revisão, pois impedem a
apreciação da vida pregressa dos candidatos.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA36
dário, como figura autônoma do Direito Eleitoral, não nos parece
deva ser assim encarado, de modo que é possível incluir o refe-
rido diploma dentre os que formam o Direito Eleitoral infracons-
titucional35 .
Mencionado diploma teve diversas normas declaradas
inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (ADIn’s 1.351
e 1354 – julg. 07.12.06), relacionadas à chamada cláusula de bar-
reira, além de não disciplinar a contento instrumentos como a
fidelidade partidária.
3.2.2.Vetores interpretativos da legislação eleitoral
Feitas essas breves considerações, observamos que, quando
se cogita na filtragem constitucional do Direito Eleitoral, tem-se
em mente a leitura, sob a lente da Constituição, de todas as nor-
mas a que antes nos reportamos. A tarefa do intérprete é, por-
tanto, mais do que examinar a compatibilidade de tais regras
com a Lei Maior, determinar-lhes o sentido de acordo com a
realização dos valores consagrados na Constituição, ou seja, “ga-
_____________________________________________________________________________________________
35 Não obstante os notáveis avanços no sentido de que o Direito Eleitoral tenha reco-
nhecida sua autonomia científica, vê-se que, ainda hoje, a disciplina sequer é conside-
rada obrigatória em alguns currículos de cursos de graduação. Apartar as normas
sobre os partidos políticos do Direito Eleitoral, além de impróprio, porque direta-
mente relacionadas ao exercício dos direitos políticos, enfraqueceria a busca pela eman-
cipação do Direito Eleitoral, que, orientado por princípios próprios, regulado em di-
plomas legais específicos e disciplinando matéria peculiar, deve ter reconhecida sua
autonomia, embora tal não represente, especialmente para os fins a que nos propo-
mos, seu desapego ao Direito Constitucional, o que seria mesmo impossível. A con-
clusão diversa chegou MIRANDA, Jorge. Op. cit., p. 17, ao sustentar que o Direito
Eleitoral não goza de autonomia, integrando o Direito Constitucional: “Se a eleição
política é uma instituição básica do Estado constitucional representativo moderno, tudo quan-
to lhe respeita tem ser considerado elemento participante do Direito constitucional. As opções
subjacentes a essas normas – sufrágio restrito ou sufrágio universal, voto obrigatório ou não,
sujeitos de processos eleitorais, sistemas eleitorais traduzem outras tantas grandes opções cons-
titucionais”.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 37
rantir a efetiva realização dos valores estabelecidos no pacto fun-
dador diante do direito infraconstitucional”36 .
Daí assinalarem Canotilho e Vital Moreira que
A principal manifestação da preeminência normativa da
Constituição consiste em que toda a ordem jurídica deve ser
lida à luz dela e passada pelo seu crivo, de modo a eliminar as
normas que se não conformem com ela. São três as compo-
nentes principais desta preeminência normativa da Consti-
tuição: (a) todas as normas infraconstitucionais devem ser
interpretadas no sentido mais concordante com a Constitui-
ção (princípio da interpretação conforme à Constituição); (b)
as normas de direito ordinário desconformes com a Consti-
tuição são inválidas, não podendo ser aplicadas pelo Tribu-
nal Constitucional; (c) salvo quando não exequíveis por si
mesmas, as normas constitucionais aplicam-se directamente,
mesmo sem lei intermediária, ou contra ela e no lugar dela
(cfr. art. 18-1, quanto às normas respeitantes aos direitos, li-
berdades e garantias).37
Nessa perspectiva, importa observar que, especificamente
no campo dos direitos políticos, é possível identificar valores
consagrados pela Constituição Federal e que devem nortear a
atividade do intérprete quando diante da tarefa de definir a
extensão das normas infraconstitucionais, dando a elas o sentido
que mais se aproxime da máxima efetividade dos valores con-
templados na Lei Maior.
Observa-se, desde logo, que os princípios fundamentais (de-
mocrático, republicano, separação de poderes, federativo) in-
fluenciam diretamente a interpretação do Direito Eleitoral
ordinário, pois, representando as principais decisões políticas
_____________________________________________________________________________________________
36 SCHIER, PauloRicardo. Op. cit. p. 25.
37 CANOTILHO, J.J. Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra:
1991, p.45-46.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA38
do Estado, aquelas que determinam sua estrutura essencial, irra-
diam seus efeitos sobre todo o ordenamento jurídico.
Já os princípios gerais, embora não integrando o núcleo
das decisões políticas que conformam o Estado, representam
desdobramentos dos princípios fundamentais, expandindo-se,
de igual modo, sobre toda a ordem jurídica38 , alcançando, com
efeito, as normas do Direito Eleitoral infraconstitucional. Me-
recem referência, dentre outros, os princípios da legalidade, li-
berdade, igualdade e devido processo legal.
Além disso, o próprio reconhecimento dos direitos polí-
ticos como direitos fundamentais39 já assegura que a inter-
pretação das normas que os contemplam busque resguardar ao
máximo o seu exercício. Daí afirmar Luís Roberto Barroso que,
no campo da interpretação dos direitos políticos, dada a
incidência dos princípios constitucionais da igualdade e da
democracia, três subprincípios deverão orientar o intérprete: a)
na medida do possível, deve haver coincidência entre o conjunto
dos eleitores e dos elegíveis; b) embora admitidas, inclusive por
força de normas constitucionais, as exigências para o exercício
de direitos políticos deverão ser razoáveis e guardar relação
lógica e proporcional com os fins que pretendem proteger ou
promover; e c) qualquer restrição a direitos políticos, especifi-
camente no que diz respeito à elegibilidade, deverá sempre ser
interpretada de forma estrita40 .
_____________________________________________________________________________________________
38 Cf. BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história.
A nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no Direito brasi-
leiro. in BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional:
ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Reno-
var, 2006, p. 365.
39 Para um exame mais aprofundado sobre o tema, remetemos o leitor ao Capítulo 2.
40 BARROSO, Luís Roberto. Direitos políticos, inelegibilidades e parentesco. Inte-
ligência do art. 14, § 7º, da Constituição. in Revista Brasileira de Direito Eleitoral.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 39
De inegável relevo é também reconhecer que as normas do
Direito Eleitoral ordinário devem observar os princípios espe-
cíficos (setoriais) que orientam a disciplina dos direitos políticos,
que podem ser divididos, segundo Jorge Miranda, em dois gru-
pos: princípios constitucionais de Direito Eleitoral subjetivo
(ou princípios relativos aos eleitores); e princípios cons-
titucionais de Direito Eleitoral objetivo (ou princípios relati-
vos à inserção na organização do poder político e aos procedi-
mentos).
No primeiro grupo, podem ser incluídos princípios dire-
tamente relacionados ao exercício do voto: a) universalidade
(sufrágio universal); b) igualdade (sufrágio igual; voto com valor
igual para todos); c) individualidade (ausência de voto múltiplo,
familiar ou plural); d) pessoalidade (impossibilidade de voto
por meio de mandatário ou representante); e) liberdade (voto
livre e secreto); e f) imediatidade (voto direto).
Já no segundo grupo, estão os princípios da: a) periodici-
dade (corolário do princípio republicano: temporariedade dos
mandatos eletivos); b) liberdade (aqui entendida, de acordo com
a CRP, como liberdade de propaganda nas campanhas eleitorais);
c) igualdade (de oportunidades e de tratamento das diversas
candidaturas); d) imparcialidade de entidades públicas (perante
as candidaturas); e) participação na administração eleitoral
(dever de todo cidadão de colaborar com a administração do
_____________________________________________________________________________________________
v. 17. ABC: Fortaleza, 2005, p. 60. Para o autor, seriam os princípios da igualdade e
da democracia que orientariam a disciplina dos direitos políticos: “[...] se todos são
iguais, o fundamento de legitimidade do poder, institucionalizado em um governo, é o con-
sentimento da maioria dos governados. Participar livremente da formação dessa vontade e,
igualmente, dispor da possibilidade de ser escolhido pela maioria para fazer parte do governo
são corolários do respeito à igualdade de todos e, igualmente, da concepção de que o poder
político deve ter origem no povo”.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA40
processo eleitoral)41 ; f) relevância específica dos partidos polí-
ticos; g)proporcionalidade (abrangendo, além do sistema de
representação proporcional, a proporcionalidade entre o número
de eleitores e a respectiva representação); h) estabilidade da lei
eleitoral; i) jurisdicionalidade (o contencioso eleitoral cabe aos
tribunais).
Ainda que a classificação considere a ordem constitucional
portuguesa, não é difícil identificar princípios semelhantes na
Constituição de 1988. Quanto aos elencados no primeiro grupo,
vê-se que decorrem expressamente dos direitos fundamentais à
liberdade, à igualdade, e, mais especialmente, ao sufrágio
universal, exercido, dentre outras formas, por meio de voto direto,
secreto, periódico e com valor igual para todos (art. 14), elevado
à categoria de cláusula pétrea (art. 60, § 4º, II).
Já quanto aos dispostos no segundo grupo, é perfei-
tamente possível identificá-los em nossa ordem constitucional,
como decorrência de princípios como o da igualdade e da lega-
lidade.
_____________________________________________________________________________________________
41 A classificação de Jorge Miranda considera o disposto no art. 113, nº 3 a 7, da
Constituição da República Portuguesa, que tem a seguinte redação:
“3. As campanhas eleitorais regem-se pelos seguintes princípios:
a) Liberdade de propaganda;
b) Igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas;
c) Imparcialidade das entidades públicas perante as candidaturas;
d) Transparência e fiscalização das contas eleitorais.
4. Os cidadãos têm o dever de colaborar com a administração eleitoral, nas formas previstas
na lei.
5. A conversão dos votos em mandatos far-se-á de harmonia com o princípio da representa-
ção proporcional.
6. No acto de dissolução de órgãos colegiais baseados no sufrágio directo tem de ser marcada
a data das novas eleições, que se realizarão nos sessenta dias seguintes e pela lei eleitoral
vigente ao tempo da dissolução, sob pena de inexistência jurídica daquele acto.
7. O julgamento da regularidade e da validade dos actos de processo eleitoral compete aos
tribunais.”.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 41
Alguns, aliás, a exemplo da CRP, foram expressamente con-
templados pela Constituição Federal de 88: a estabilidade da
lei eleitoral (identificada entre nós como princípio da anualidade
da lei eleitoral, art. 16); relevância específica dos partidos
políticos (art. 17); jurisdicionalidade (arts. 118 e seguintes, que
cuidam da composição e competência da Justiça Eleitoral); e pro-
porcionalidade (art. 45).
Há outros princípios da Constituição Federal que orientam
a interpretação do Direito Eleitoral ordinário a merecerem refe-
rência: a vedação ao terceiro mandato consecutivo na chefia do
Poder Executivo (art. 14, § 5º); e a impossibilidade de cassação
de direitos políticos (art. 15).
Vê-se, portanto, que tais princípios constitucionais irradiam
efeitos para determinar o sentido da legislação infraconstitu-
cional. Desse modo, a interpretação do Direito Eleitoral ordinário
será tão mais legítima quanto mais se aproxime da efetiva
aplicação dos valores por eles consagrados.
Outro vetor interpretativo do Direito Eleitoral infraconstitu-
cional é facilmente encontrado no art. 14, § 9º, da CF, no qual
estão consagrados os valores que devem nortear a criação de
novas hipóteses de inelegibilidades (encargo cometido ao legis-
lador complementar),tais como: a probidade administrativa, a
moralidade para o exercício do mandato, além de balizarem,
desde logo, a interpretação do ordenamento infraconstitucional.
3.3. Exemplos da constitucionalização do Direito Eleitoral
Ao apreciar o Recurso Ordinário 912/RO (Rel. Min. Cesar
Rocha, julg. 24.08.06), o Tribunal Superior Eleitoral operou
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA42
radical mudança na orientação jurisprudencial acerca da inter-
pretação da ressalva prevista na alínea “g”, do artigo 1º, inciso I,
da Lei Complementar 64/9042 .
Segundo o entendimento então dominante, a mera pro-
positura de uma ação judicial para desconstituir a decisão de
rejeição das contas dos gestores públicos seria suficiente para
afastar o impedimento previsto na alínea “g”. Depois de vários
anos de aplicação quase irrestrita de tal entendimento, o TSE reexa-
minou a questão à luz da Constituição Federal, entendendo que
A análise da idoneidade da ação anulatória é complementar e
integrativa à aplicação da ressalva contida no Enunciado nº 1
da Súmula do TSE, pois a Justiça Eleitoral tem o poder-dever
de velar pela aplicação dos preceitos constitucionais de proteção
à probidade administrativa e à moralidade para o exercício do
mandato (art. 14, § 9º, CF/88).
O julgamento demonstra claramente que dispositivo infra-
constitucional foi reexaminado à luz de valores consagrados na
Constituição, especialmente aqueles contemplados no art. 14, § 9º.
Outro exemplo que merece referência diz respeito à inter-
pretação do art. 47, § 2º, da Lei 9.504/97, que prevê a divisão do
horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão para todos os
partidos e coligações que “tenham candidato e representação na
Câmara dos Deputados”, em relação aos quais devem ser observados
os seguintes critérios da divisão: um terço, igualitariamente; e dois
terços, proporcionalmente ao número de deputados federais.
A interpretação literal do dispositivo conduziria a que
somente tivessem oportunidade de lançar mão da propaganda
_____________________________________________________________________________________________
42 Para um exame aprofundado do tema, conferir o Capítulo 3.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 43
no rádio e na TV os partidos e coligações que reunissem ambos
os requisitos: candidatos disputando o pleito e bancada na Câ-
mara dos Deputados, o que criaria verdadeiro obstáculo para
partidos novos ou pequenos, que não contassem com repre-
sentação parlamentar.
Buscando exegese mais consentânea com o princípio
democrático, o TSE tem determinado em suas resoluções acerca
da propaganda eleitoral que todos os partidos e coligações, ainda
que não tenham representação na Câmara dos Deputados,
tenham acesso ao horário eleitoral gratuito, participando do
rateio de um terço do tempo, que é dividido igualmente entre as
agremiações que disputam o pleito43 .
_____________________________________________________________________________________________
43 Assim dispõe o art. 28, da Resolução 22.718/08:
“Art. 28. Os juízes eleitorais distribuirão os horários reservados à propaganda de cada
eleição entre os partidos políticos e as coligações que tenham candidato, observados os
seguintes critérios (Lei nº 9.504/97, art. 47, § 2º, I e II):
I – um terço, igualitariamente;
II – dois terços, proporcionalmente ao número de representantes na Câmara dos Deputa-
dos, considerado, no caso de coligação, o resultado da soma do número de representantes
de todos os partidos políticos que a integrarem”. Sobre o tema, afirma CASTRO, Edson
de Resende. Teoria e Prática do Direito Eleitoral. 4. ed. Belo Horizonte: Manda-
mentos, 2008, p. 289-90: “Segundo o art. 47, § 2º, da LE, a distribuição dos horários será
feita entre os Partidos que tenham candidato e representação na Câmara Federal, de forma
igualitária quanto a 1/3 do tempo, e, proporcionalmente ao número de representantes na-
quela Casa, quanto aos restantes 2/3 do tempo. Por esse texto, nota-se que os Partidos que
apresentam candidatos, mas que não tenham representação na Câmara Federal, ficam sem
acesso à propaganda no rádio e na TV, pois que até mesmo o 1/3 é previsto para distribui-
ção igualitária entre os Partidos com representação. É evidente a inconstitucionalidade do
dispositivo, pois não respeita o princípio constitucional da isonomia de oportunidades no
processo eleitoral, uma vez que fecha as portas do rádio e da televisão aos Partidos que não
tenham representação na Câmara Federal. O princípio da isonomia autoriza tratamento
desigual aos desiguais, mas não admite a exclusão de oportunidades. Essa incons-
titucionalidade vem sendo corrigida pelas resoluções do TSE que disciplinam ano a ano a
propaganda eleitoral, determinando a distribuição de 1/3 do tempo entre todos os Parti-
dos/Coligações com candidatos (independentemente de ter representação na Câmara), re-
servando os outros 2/3 para distribuição proporcional entre aqueles Partidos/Coligações
que tenham a tal representação.
MARCELO ROSENO DE OLIVEIRA44
Nas eleições de 2006, o TSE entendera, na mesma linha,
por abrandar os requisitos para a participação de candidatos nos
debates, ao interpretar a regra do art. 46, da Lei das Eleições,
assegurando a participação de candidatos filiados a partidos com
representação na Câmara dos Deputados, considerada esta por
ocasião da data da convenção (e não do início da legislatura,
como determinava o art. 18, § 4º, da Res. 22. 261/06, poste-
riormente revogado)44 .
A interpretação do dispositivo parece atender claramente à
necessidade de leitura do ordenamento eleitoral infraconstitucional
à luz da Constituição, conforme temos aventado ao longo do
presente ensaio. Para as eleições de 2008, o TSE disciplinou o tema
de forma diversa, determinando que a representação a ser obser-
vada para fins de assegurar a participação nos debates é aquela
que decorrer da eleição (art. 23, § 3º, da Res. 22.718/08).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os exemplos que alinhamos demonstram que, nos últimos
anos, se há verificado no Brasil o despertar para a necessidade
de interpretação das normas eleitorais sob a lente da Constitui-
ção, especialmente em julgamentos do Tribunal Superior Elei-
toral. Algumas decisões são exemplos claros da filtragem consti-
tucional. Citamos apenas alguns, sem qualquer pretensão de
esgotar-lhes o rol.
_____________________________________________________________________________________________
44 A revogação do dispositivo beneficiou o PSOL (Partido Socialismo e Liberdade),
criado em meio à legislatura 2003-2006, e que, a prevalecer a regra editada pelo
TSE, não teria assegurada a participação nos debates eleitorais das disputas de 2006,
o que provocara, inclusive, a impetração do MS 3460/DF, junto ao TSE, por parte da
Sen. Heloísa Helena, então candidata à Presidência da República, o qual findou
extinto, sem apreciação de mérito, em virtude da modificação levada a efeito pela
Corte.
DIREITO ELEITORAL – REFLEXÕES SOBRE TEMAS CONTEMPORÂNEOS 45
O fundamental é demonstrar que tal comportamento há
de ser incentivado, alcançando todos quantos operam com o Di-
reito Eleitoral. Se os efeitos da constitucionalização do Direito
são objeto de constante preocupação dos juristas em outros ramos
da Ciência Jurídica, tem-se que ainda reclamam atenção maior dos
eleitoralistas, ainda muito presos à interpretação da legislação
sob um enfoque meramente legal.
A atividade legiferante do TSE concorre diretamente para
tal comportamento. Muitos dos que militam na Justiça Eleitoral
se acostumaram a acatar as resoluções da Corte Superior como
que a dispensar0qualquer cotejamento com o texto da Consti-
tuição, se não para lhes determinar a validade, mas sim e princi-
palmente para estabelecer o sentido que se apresente mais
consentâneo com os valores consagrados na Lei Maior.
Os tempos são outros. Temos outro Direito Constitucional
e outro DireitoEleitoral. Em tempos de ubiqüidade constitu-
cional, de incentivo à dogmática constitucional da efetividade,
temos um Direito Eleitoral impregnado pelo Direito Cons-
titucional. Não há dúvida de que o Direito Eleitoral se consti-
tucionalizou!
Tal constatação está a exigir dos que militam na e perante a
Justiça Eleitoral uma nova atitude, quando se trata da interpre-
tação do Direito Eleitoral ordinário.
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