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Alice Bastos Urologia pediátrica Anamnese É de extrema importância buscar os sintomas abaixo: Dor: abdominal, genital, miccional (disúria) e testicular; Inapetência, astenia, ganho ponderal inadequado/perda de peso; Frequência miccional: polaciúria (≥ 8 vezes/dia) e diminuída (≤ 3 vezes/dia); Incontinência: perda involuntária de urina após controle miccional. Importante diferenciar se é contínua ou intermitente; Urgência: desejo súbito e de difícil contenção; Noctúria: desejo de despertar para urinar; Hesitância: não é esforço. Dificuldade em iniciar micção apesar do desejo miccional; Esforço miccional; Jato fraco; Disúria: inicial (uretra) ou terminal (bexiga); Manobras de retenção: manobras para retardar ou impedir a micção; → Cruzamento das pernas, apertar ou tracionar genitália, acocorar-se pressionando o períneo contra um dos calcanhares (reverência de Vincent); Sensação de esvaziamento incompleto; Gotejamento pós-miccional; Jato em spray ou duplo; Retenção urinária; Poliúria: volume urinário acima do esperado para a idade: 40 mL/kg ou 2,8 L em 24 horas. Além dos sintomas, durante a anamnese uropediátrica, é importante questionar sobre os antecedentes: história familiar, história gestacional, primeiros dias de vida, vacinação, cirurgias prévias, doenças associadas, ambiente familiar, alimentação. Exame físico Deve ser completo, com o intuito de afastar condições associadas/congênitas; É importante a participação dos pais/acompanhantes; Observar: perdas urinárias, comportamento, jato urinário; Palpação renal; Giordano é limitado; Bexiga pode ser palpável; → Evitar manobra de Credé; Avaliar testículos, epidídimos, prepúcio; É importante também avaliar durante a consulta o desenvolvimento puberal do paciente. Alice Bastos Diagnóstico por imagem A escolha do método diagnóstico depende de: → Indicação: história clínica, conhecimento de embriologia; → Disponibilidade: custo, acesso, necessidade de sedação; → Familiaridades: radiologistas com experiência; → Relação custo-benefício na exposição à radiação ionizante. Ultrassonografia Exame de imagem não invasivo; É o primeiro exame na suspeita de anormalidade do trato urinário (dilatações, massas renais, litíase, avaliação da bexiga); A criança deve estar hidratada e com a bexiga repleta, evitando jejum (pela desidratação e irritabilidade); A ecogenicidade do parênquima está elevada até os 6 meses; Sistema pielocalicinal e ureteres (avaliados com a criança hidratada): o diagnóstico de dilatação do sistema pielocalicinal é baseado na idade gestacional (pré-natal) e no diâmetro antero-posterior da pelve renal: → Normal: não há dilatação dos cálices, ureter não é visível e a bexiga é normal: • < 28 semanas: até 4 mm; • Após 28 semanas: até 7 mm; • No período pós-natal: até 10 mm; → Diâmetro AP maior do que 15 mm: anormal, maior chance de estar associada a uma patologia obstrutiva; Ureteres: dificilmente visualizados pelo exame ultrassonográfico; → Quando vistos, podem representar patologias refluxivas ou obstrutivas; Bexiga: espessura varia de 0,04 a 0,27; → Patologias que frequentemente cursam com espessamento: ITU, disfunções miccionais, patologias uretrais; → Conteúdo deve ser anecoico; → CCM: • RN: 30 mL; • Lactentes: 7x peso (kg); • 2 a 12 anos: 30 + (idade em anos x 30) em mL; → Resíduo: menor que 10% do volume inicial. Radiografia convencional Uso de radiação ionizante; Útil na detecção de cálculos radiopacos, anomalias da coluna vertebral, calcificações e síndromes. Uretrocistografia miccional (CUM) Método ouro para pesquisa de refluxo vesicureteral, tendo grande valor no estudo da bexiga e uretra; Alice Bastos Desvantagem: invasivo (ITU). Urografia excretora Pouco utilizada na atualidade, pois foi substituída pela TC/RM. Tomografia computadorizada Indicada em qualquer investigação que requeira boa definição volumétrica e multiplanar; Desvantagem: exposição a altas doses de radiação ionizante; Não é a primeira opção de exame de imagem em crianças, mas deve ser considerada em infecções urinárias complicadas, trauma e tumores; → Em caso de tumores, prefere-se a RM, se disponível. Ressonância magnética Pode ser utilizada para avaliar minuciosamente as anormalidades do trato urinário e renal que são difíceis de identificar ou caracterizar completamente com outras técnicas de imagem, além de fornecer informações anatômicas, vasculares e não utilizar radiação ionizante; Desvantagens: custo, disponibilidade e tempo de execução do exame. Cintilografia renal DTPA: → Primeira fase: 4 a 6 seg. – perfusão renal; → Segunda fase: 3 a 4 min. – função cortical; → Terceira fase: 3 a 5 min. – clareamento; → Fase dinâmica (acúmulo – concentração – eliminação): pode incluir uso de diurético para afastar obstrução; • Eliminação < 15 minutos: sem obstrução; • Eliminação entre 15 e 20 minutos: dúvida; • Eliminação > 20 minutos: consistente com uropatia obstrutiva. DMSA: imagens obtidas após 2 a 3 h da injeção endovenosa do radiotraçador. Principais patologias Enurese É a perda involuntária intermitente de urina durante o sono em crianças com 5 anos ou mais pelo menos 2 vezes por semana na ausência de alterações adquiridas ou congênitas de sistema nervoso central; Possui prevalência de: → 5 anos: 15%; → 7 anos: 10%; → 10 anos: 5%; → Adolescentes: 1%; Taxa de resolução espontânea de 15% ao ano; A severidade pode ser definida como: → Infrequente: 1 a 2 vezes por semana; → Moderadamente severa: 3 a 5 vezes por semana; → Severa: 6 a 7 vezes por semana; A etiologia é caracterizada por uma interação complexa entre fatores genéticos e ambientais: Alice Bastos → Interrupção constante do sono devido a via aérea obstruída levam a aumento do limiar de despertar e com a pressão intratorácica negativa causando aumento de peptídeo natriurético atrial; → Problemas psicológicos ou eventos podem precipitar ou exacerbar a enurese em crianças predispostas (abuso sexual, déficit de atenção e/ou hiperatividade, problemas familiares); → Em pacientes com enurese secundária: início de medicação anticonvulsiva, medicações como ácido valproico, inibidores seletivos da serotonina); → Constipação (compressão mecânica do reto sobre a bexiga); → Tempo de aleitamento materno exclusivo; Mecanismos: → Poliúria noturna: alteração do ritmo circadiano da vasopressina ou diurese de solutos (perda ocorre no primeiro terço da noite); → Redução da capacidade vesical e bexiga hiperativa (vários episódios a noite); → Falha do despertar (primeiro terço da noite); Diagnóstico: → História clínica: principal ferramenta diagnóstica, deve incluir dados sobre quando começaram os sintomas, qual a frequência que ocorre na semana e quantos episódios na mesma noite; • Importante coletar dados sobre os hábitos miccionais diurnos como urgência, incontinência, frequência miccional, manobras de contensão; → Exame físico: feito para afastar causa secundária e não monossintomática de enurese. Deve-se examinar área genital e retal para identificar malformações genitourinárias ou constipação; → Ultrassom: em casos de enurese monossintomática; → Diária miccional: único exame solicitado rotineiramente para a avaliação de crianças com enurese; • Feito por 2 ou 3 dias e conter informações sobre eventos relacionados a ingesta de líquidos (hora, volume, qual líquido) e sobre as micções (hora, volume, se houve urgência antes de urinar); → Diário de noites secas: durante um período de 14 noites, anotas todos os episódios de enurese que ocorreram, dando ideia da frequência que a enurese ocorreu; • Usado também para avaliação da evolução do tratamento; No manejo, podemos utilizar o alarme:sensor de umidade colocado nas roupas íntimas ou sob o lençol da criança; → Tem o objetivo da criança acordar no início do episódio de enurese, parar de urinar temporariamente, desligar o alarme, ir ao banheiro e terminar de urinar; → Usado por no mínimo 3 meses. Farmacoterapia: → Desmopressina: análogo sintético de hormônio antidiurético; • A taxa de recidiva é alta após a suspensão; • Administrada 1 hora antes de deitar; • Recomenda-se redução do consumo de líquidos após tomada de medicação para evitar o risco de intoxicação hídrica e hiponatremia, que é bastante raro; • Duração mínima de 3 meses e deve ser retirada gradualmente depois de obter melhora; → Imipramina: antidepressivo tricíclico, com efeito noradrenérgico (o mais importante), serotoninérgico e anticolinérgico; Alice Bastos → Anticolinérgicos: indicação limitada na enurese, podendo ser utilizados em crianças que apresentam quadro de hiperatividade vesical noturna e/ou enurese não- monossintomática; • Resultados ruins quando usado em monoterapia, podendo ser associado com desmopressina. Infecção do trato urinário Na infância, deve ser sempre considerada complicada e prontamente avaliada no sentido de identificar anomalias orgânicas e/ou funcionais do trato urinário; Acomete 2% dos meninos e meninas com menos de 2 anos; → Prevalência em meninas aumenta com a idade (8 a 11% até os 7 anos); Fatores de risco: sexo, idade, colonização vaginal e prepucial, fatores imunológicos intrínsecos, anomalias congênitas do trato urinário e refluxo vesicureteral; As bactérias que acometem o trato urinário na infância são as enterobactérias gram-negativas, e a mais comum é a E. coli (85% dos casos); Classificação: → Pode ser primeira infecção, infecção recidivante (mesma bactéria) ou reinfecção (nova bactéria); → Pode ser sintomática ou assintomática; Quadro clínico: → RNs: febre; → Lactentes até 2 anos: febre alta, não aceitação oral, irritabilidade, perda de peso, vômitos, toxemia, desidratação, diarreia ou constipação intestinal; → Crianças maiores: dor suprapúbica ou no flanco, disúria, perdas e/ou incontinência urinária, além de febre; → Adolescentes: disúria, doenças sexualmente transmissíveis podem estar associadas; O ideal seria diagnosticar precocemente a infecção, instituindo tratamento imediato (nas primeiras 24 a 48 horas) antes de ocorrer a lesão renal; O diagnóstico é feito por meio da urocultura; Os objetivos da investigação do trato urinário, após diagnóstico confirmado de ITU, são identificar anormalidades que possam predispor infecções subsequentes e recorrentes (obstrução/estase urinária, refluxo vesicureteral e litíase), buscar por complicações da própria infecção (cicatrizes renais), identificar e tratar crianças sob risco de complicações de longo prazo das cicatrizes renais (hipertensão e doença renal terminal); USG é o primeiro exame de imagem utilizado em ITU febril; Uretrocistografia miccional é o método de escolha na suspeita de refluxo vesicureteral e para avaliar a uretra: → < 6m e alterações no USG; → Cicatrizes renais ou ITU recorrente; → Imagem sugestiva de obstrução ou RVU de alto grau; → 2 episódios de ITU em crianças com menos de 2 anos; DMSA: avaliar cicatrizes renais. Pode ser feito no primeiro mês de vida e é recomendado para crianças menores de 3 anos com ITU atípica ou recorrente. Fimose É o estreitamento prepucial distal com ou sem aderências associadas, que dificulta ou impossibilita a exposição da glande; Alice Bastos Presente em 96% dos RNs (normal nessa fase); → Aos 3 anos: 10%; Tratamento: → Evitar exercícios ou descolamento forçado; → Corticosteróides tópicos; → Cirurgia nos seguintes casos: • Obstrução jato; • Malformações e ITU associadas; • Parafimose; • Higiene; • Infecções/inflamações recorrentes; • Desejo do paciente. Hérnia inguinal Presença de abaulamento na região inguinal e/ou escrotal (visualizado ou relatado pelos cuidadores); Pode piorar com esforço abdominal (ex.: choro) e melhorar com o repouso (ex.: dormir); O exame físico pode mostrar o sinal da luva de seda; O diagnóstico é feito por anamnese e exame físico, não sendo necessário exame de imagem (USG) de rotina; Na criança, quando diagnosticada hérnia inguinal, deve ser imediatamente encaminhada para o cirurgião ou urologista pediátrico; A presença de hérnia encarcerada ou estrangulada é uma urgência cirúrgica. Hidrocele Presença de abaulamento no escroto (visualizado ou relatado pelos pais); Hidroceles comunicantes: podem piorar com esforço abdominal (choro) e melhoras com repouso (dormir); Hidroceles não comunicantes: são comuns ao nascimento e não sofrem alteração do volume com esforço abdominal; O diagnóstico é feito por anamnese + exame físico, não sendo necessário exame de imagem; O tratamento é conservador até os 2 anos de idade, a não ser que a hérnia inguinal não possa ser excluída; Um cirurgião ou urologista pediátrico deve ser consultado para definir a melhor conduta e momento cirúrgico. Alice Bastos Criptoquirdia É a anomalia genitourinária mais comum em lactentes do sexo masculino; Definida como a não localização do testículo na bolsa testicular por não descida, não permanência ou inexistência; Sua fisiopatologia não é completamente esclarecida; O exame físico é o melhor método diagnóstico e os exames de imagem apresentam pouca utilidade; → TC e RM são métodos confiáveis na localização de testículos intra-abdominais; A época apropriada para o tratamento clínico é aos 6 meses de idade, pois a descida testicular espontânea raramente ocorre após esta idade; → Estimulação hormonal através da utilização da hCG ou do hormônio liberador da gonadotrofina (GnRH); Quando não houver resposta clínica, recorremos ao tratamento cirúrgico; → Deve ser feito antes dos 2 anos de idade. Varicocele É a dilatação das veias de drenagem dos testículos (veia espermática interna) e está associada a alterações de função testicular; Acomete 15 a 20% dos adolescentes; Raro observar em meninos com menos de nove anos de idade; 85 a 90% dos casos são unilaterais (esquerda), sendo extremamente rara a varicocele direita de forma isolada; A provável causa da varicocele é a estase e/ou refluxo de sangue para as veias gonadais transmitindo-se para os testículos; → As teorias mais aceitas são a incompetência ou ausência das válvulas da veia testicular e o diferencial de pressão durante a drenagem das veias gonadais para a cava e a veia renal; A maioria dos indivíduos não vai apresentar sintomas; → Alguns podem apresentar sensação de peso, dor intermitente, aumento do volume escrotal ou alteração da posição de um dos testículos O diagnóstico da varicocele na criança e no adolescente é eminentemente clínico, baseado no exame físico; Recomenda-se seguimento anual nos casos de varicocele com volume testicular normal; A decisão de tratar a criança ou adolescente com varicocele é controversa, e a maioria dos autores leva em consideração nesta decisão a presença de assimetria testicular; Tratar cirurgicamente todos os casos é inapropriado; O acompanhamento conjunto entre pediatra e urologista deve ser encorajado após o diagnóstico da varicocele.
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