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1 Ginecologia e Obstetrícia (8º semestre) O termo diabetes mellitus descreve um grupo de doenças em que se observa metabolismo anormal de carboidratos, caracterizado por hiperglicemia. A gestação é caracterizada por acréscimo na resistência periférica à insulina (pela secreção placentária de hormônios diabetogênicos – hormônio do crescimento, cortisol e hormônio lactogênico placentário) e por incremento na produção de insulina pelas células-beta do pâncreas. Na gestação, o metabolismo energético pode ser dividido em duas fases distintas: • 1ª – fase anabólica: a glicemia tende a diminuir, em especial quando ocorre jejum prolongado • 2ª – fase catabólica: crescente consumo de nutrientes maternos pelo feto, aumentando também a resistência periférica à insulina. Quando as modificações pancreáticas não são suficientes para vencer a resistência à insulina, ocorre a diabetes mellitus gestacional (DMG). Mesmo nas gestantes com diabetes mellitus pré-gestacional, o conhecimento do metabolismo dos carboidratos na gestação é importante para facilitar o ajuste das doses de insulina durante o pré-natal, considerando que, no segundo e no terceiro trimestres, há aumento da necessidade de insulina e, no puerpério, há uma diminuição considerável. É utilizada a classificação etiológica, que remete ao reconhecimento da fisiopatologia da doença e faz com que a abordagem terapêutica seja direcionada e forneça melhores resultados. Reconhecer o momento de manifestação do diabetes (prévio à gestação ou durante a gestação) é importante, pois o mau controle da doença na fase periconcepcional aumenta o risco de malformações fetais. Além disso, quanto mais longe da gestação ocorrer o surgimento do diabetes, maiores as chances de que, no momento da gravidez, já estejam presentes complicações de longo prazo da doença. Também há a classificação de Priscilla White, que avalia o tempo da doença e a presença de complicações vasculares. 2 Em 2010 a International Association of Diabetes and Pregnancy Study Groups propôs que o diabetes diagnosticado durante a gravidez fosse classificado de duas formas: diabetes pregresso desconhecido (overt diabetes -> a glicemia em jejum chega a ser maior que 126 no primeiro exame) e diabetes mellitus gestacional. Seriam, portanto, consideradas portadoras de diabetes pregresso e desconhecido as pacientes que apresentassem, na primeira consulta de pré- natal, um dos seguintes critérios, utilizados para diagnóstico de diabetes fora da gravidez: • Glicemia em jejum ≥ 126 mg/dL • Hemoglobina glicada ≥ 6,5% • Glicemia ocasional ≥ 200mg/dL Já o diabetes mellitus gestacional seria diagnosticado quando se observassem valores de glicemia de jejum na primeira consulta entre 92-125 mg/dL (o normal para gestante seria abaixo de 92) ou por meio do teste de tolerância à glicose oral (TTGO) de 75g de dextrosol. Prevalência de diabetes mellitus gestacional É influenciada pela distribuição étnica e racial das populações e pelo método escolhido para rastreamento e diagnóstico desta intercorrência obstétrica. Nos últimos anos, tem sido observado aumento gradativo da prevalência da doença, o que é relacionado ao aumento da média de idade e da frequência de obesidade nas gestantes. Fatores de risco para DMG Cerca de 90% de todas as gestantes apresentam pelo menos um dos fatores de risco, o que deixa claro que a utilização deles para o rastreamento é insuficiente, visto que não permitem seleção adequada de pacientes para o teste diagnóstico. Este fato é uma das justificativas para a realização do teste diagnóstico de forma universal, por meio de TTGO de 75g entre 24 e 28 semanas de IG. Os fatores de risco passaram a ser utilizados como ferramentas para identificar casos que teriam maior risco de desenvolver resultados adversos maternos e fetais durante o acompanhamento pré-natal. Investigação do diabetes na gravidez Glicemia em jejum na primeira consulta de pré-natal Preconiza-se que, nessa consulta de pré-natal, seja solicitada uma glicemia de jejum. A verificação de glicemia em jejum com valores ≥ 126 mg/dL permite o diagnóstico de diabetes mellitus pré- gestacional, provavelmente do tipo 2. A 3 paciente que apresentar esse diagnóstico deverá ser acompanhada durante o pré-natal da mesma forma que aquelas que já eram sabidamente diabéticas. Teste de tolerância à glicose oral de 75g O TTGO compreende a ingestão de 75g de glicose anidra diluídos em 100 a 200mL de água e medidas de glicemia em jejum, após 1 hora e após 2 horas da ingestão da glicose. Deve ser realizado entre 24-28 semanas (ou seja, na segunda rotina de pré- natal) para as pacientes que ainda não tiveram o diagnóstico de diabetes mellitus (gestacional ou não) confirmado. Pacientes com fator de risco para o diabetes (obesas/sobrepeso) ou com antecedentes de resistência insulina, com antecedentes familiares de diabetes ou que tiveram um óbito fetal sem causa aparente, antecedentes de macrossomia ou polidrâmnio em gestação anterior, devem fazer o TTGO com 24 semanas (no máximo 26 semanas). Já as pacientes que não tiverem fatores de risco para a diabetes, fazem o TTGO com 28 semanas. Considerando-se ainda que os valores de glicemia em jejum, da primeira e da segunda horas foram considerados preditores independentes dos resultados neonatais adversos, pode-se afirmar que um ou mais valores maiores ou iguais aos valores de referência permitem definir o diagnóstico de diabetes mellitus gestacional. Avaliação pré-concepcional O objetivo primordial dessa consulta é avaliar e informar a mulher sobre os riscos relacionados à evolução do diabetes e dos possíveis efeitos de sua doença na gestação e vice-versa. Além disso, nesse momento, devem-se instituir medidas que possam melhorar o prognóstico materno e fetal. Apesar de serem conhecidos os benefícios da avaliação preconcepcional, estima-se que apenas um terço das gestações de pacientes portadoras de diabetes seja programado. Complicações clínicas maternas Hipertensão arterial: a HAS é uma complicação frequente em pacientes diabéticas, tendo sua prevalência relacionada ao tipo de diabetes, à obesidade, à idade e à etnia. Em pacientes com diabetes tipo 1, a hipertensão é usualmente manifestação de doença renal preexistente e, em diabéticos do tipo 2, pode ser considerada parte da síndrome metabólica. A HAS se associa com o maior risco de doença cardiovascular, retinopatia e nefropatia. Retinopatia diabética: é a complicação vascular mais específica do diabetes mellitus, 4 sendo sua prevalência fortemente relacionada à duração da doença. O controle glicêmico é a principal forma de prevenir ou ainda retardar o aparecimento da retinopatia diabética. Geralmente não há progressão da retinopatia durante a gestação, mas se houver, a laserterapia não é contraindicada. Nefropatia diabética: acomete 20-40% do total de pacientes com diabetes, sendo uma das principais causas de insuficiência renal crônica. A microalbuminúria associa-se a maior risco de desenvolvimento de pré-eclâmpsia, devendo ser avaliada em gestantes com diabetes pré-gestacional. A microalbuminúria é definida como a perda de 30 a 299mg de albumina em urina coletada durante 24 horas e é considerada um estágio precoce da nefropatia diabética. A presença deste distúrbio se associa a maior risco de doenças cardiovasculares. A progressão para macroalbuminúria, valores de 300mg ou mais em uma urina de 24 horas, associa-se ao desenvolvimento de insuficiência renal crônica, sendo variável o intervalo de tempo para que a doença se instale. O controle glicêmico e pressórico tem sido sugerido como a principal forma de interferir na evolução da nefropatia tanto em D1 e D2. A progressão da doença inclui a diminuiçãodo clearence de creatinina e da taxa de filtração glomerular (deverão ser sempre avaliados quanto tiver macroalbuminúria). A presença de valores de creatinina acima de 1,5 mg/dL, proteinúria maiores ou iguais a 3g/24h e hipertensão de difícil controle são associadas a maior risco de progressão da doença materna e à perda de função renal Cetoacidose diabética materna Risco de malformações fetais: estudos observacionais apontam que a hiperglicemia nas primeiras 6 a 8 semanas de gestação aumenta o risco de malformações fetais. São mais comumente afetados o aparelho cardiovascular, o sistema genitourinário e o aparelho musculoesquelético. Das malformações cardíacas, as do septo interventricular são as mais frequentes, porem também podemos ter comunicações interatriais, hipertrofia do septo, transposição dos grandes vasos. Também podem ocorrer malformações neurológicas, síndrome da cauda equina, o que causa incontinência urinária) e a síndrome do intestino curto. Complicações na gestação: abortamentos, óbito fetal de causa desconhecida, além macrossomia, polidrâmnio, prematuridade (pois são fetos grandes, que parecem ter mais IG do que eles têm na realidade e também porque o diabetes atrasa a maturidade pulmonar -> fazem desconforto respiratório e membrana hialina no berçário). Na hora do parto podem ter distocia de ombro (podendo luxar o ombro), além de desproporção céfalo-pélvica. Quando nascem podem ter distúrbio metabólico, fazendo hipoglicemia, Policitemia e podem ir a óbito. Podem se tornar crianças obesas, adolescentes obesos e adultos obesos ou com sobrepeso, desenvolvendo também intolerância ou diabetes, também podem ter síndrome metabólica. Assistência pré-natal Pacote de exames para o diabetes (mãe) 1. Hemograma completo 5 2. Hemoglobina glicada 3. Sódio e potássio 4. Ureia e creatinina 5. TGO e TGP 6. Urina 1 e urocultura 7. Microalbuminúria 8. Cetonúria 9. Controle de dextro 10. Gasometria arterial nas pacientes com cetoacidose 11. Raio X de tórax (para diabéticas tipo 1 e 2) 12. Eletrocardiograma (para diabéticas tipo 1 e 2) 13. Ecocardiograma (para diabéticas tipo 1 e 2) 14. Fundoscopia (indicado principalemente para o diabetes tipo 1, 2 e overt diabetes) Pacote de exames para o diabetes (feto) 1. Ultrassom morfológico entre 11 e 13 semanas (para ver transluscência nucal e osso nasal, e se está tudo bem com esse feto) 2. Ultrassom morfológico entre 20 e 24 semanas (para ver se não há alguma malformação) 3. Ultrassom obstétrico para avaliar crescimento fetal entre 30-32 semanas (ver se não há macrossomia) 4. Ultrassom após 34 semanas (para analisar o peso fetal) 5. Mobilograma a partir de 28 semanas (exame muito importante no diabetes) -> porque os movimentos fetais são importantes para mostrar o estado glicêmico do feto indiretamente. Já a cardiotocografia mostra só os batimentos cardíacos fetais, além de durar apenas 20 minutos OBS: macrossomia = pesar 4 quilos ou mais Esses primeiros 2 ultrassons são pedidos para todas as gestantes Se a paciente for diabético tipo 1, 2 ou over diabetes -> precisa de um ultrassom com doppler (a partir de 30 semanas e até 32) e; além de um exame para avaliar a vitalidade fetal (perfil biofísico simplificado – cardiotocgrafia + ILA). em todas as diabéticas. -> o ILA é feito obrigatoriamente uma vez por semana a partir de 28 semanas, até as 34 semanas; duas vezes por semana, a partir de 34 semanas, até nascer -> em todas as diabéticas. Como fazer o controle de dextro? Nós pedimos na receita e a paciente consegue pegar no posto de saúde um glicosímetro e as fitas, ela mesma faz esse controle. O controle é feito em jejum (assim quando acorda), 1 hora após o café da manhã, 30 minutos antes do almoço, 1 hora após o almoço, 30 minutos antes do jantar, 1 hora após o jantar e às 3h30 da madrugada. Quais são os valores normais? No jejum -> 95mg/dL 1 hora após as refeições -> 140 mg/dL Meia hora antes das refeições -> 100mg/dL 3h30 da madrugada -> entre 95-100mg/dL O controle de dextro é o melhor teste para avaliar a vitalidade fetal, e deve ser feito até o término da gestação. Se o controle está bom, o feto também está bem. Dextro simplificado (pode ser feito apenas no ambulatório) Avaliação da vitalidade fetal (escala de importância): 1. Dextro 2. Mobilograma 3. Cardiotocografia 6 Pode ser controlado com alimentação ou com antiglicemiantes (metformina, glifage) Dieta e Exercício físico Primeiramente, a dieta é obrigatória de 1800 calorias (já vem impressa, e está disponível no ambulatório e na enfermaria para entregar para as pacientes). É uma dieta qualitativa e quantitativa. Refeições (café da manhã, às 10h da manhã come uma fruta, 12h/13h almoço, 15/16h lanche, 19/20h janta, às 22h ceia) A ceia geralmente é um copo de leite, uma vitamina, chá com bolacha, iogurte com granola. Atividade física -> andar todo dia por meia hora (esse tempo pode ser direto ou fracionado no dia) A paciente irá retornar no pré-natal depois de 15 dias da consulta com as orientações de dieta, exercício físico e o controle de dextro. Precisamos avaliar o controle para analisar se estão dentro dos valores. Se ela retornar com 30% ou mais dos controles alterados, isso não é bom, nesse caso, damos mais uma chance para a paciente seguir as orientações de dieta e de exercício físico, e pede para ela retornar novamente em 15 dias. Se quando ela voltar o controle de dextro continuar igual (alterado 30% ou mais) e ela estiver no começo da gravidez (até 22-24 semanas) podemos dar outra chance (a última), se a gravidez estiver avançada, devemos entrar com insulina. Se a glicemia estiver muito alterada, entramos com insulina depois da primeira chance com a dieta e exercício físico. Insulinoterapia A que mais é utilizada é a NPH (insulina de ação intermediária), a paciente consegue pegar no posto Quando a paciente é do tipo 1 ou 2 e em alguns casos de overt diabetes, a NPH não da conta sozinha, nesses casos temos que acrescentar a insulina regular (de ação rápida). Além disso, a gestante tem horários para injetar a insulina: • A NPH é administrada metade da dose do dia no jejum, ¼ da dose antes do almoço, ¼ da dose às 22h o Horários devemos acrescentar a regular caso seja necessário: 1/3 no jejum, 1/3 antes do almoço, 1/3 antes do jantar. Fórmula da insulina (vale tanto para a NPH ou para regular) • Diabetes gestacional e overt diabetes -> a dose é 0,5/0,6 de UI de insulina por quilo de peso (durante toda a gestação – não tem dose limite) • Diabetes tipo 1 ou 2 o 1º trimestre da gestação -> 0,5/0,6 UI por quilo de peso o 2º trimestre -> 0,7/0,8 UI por quilo de peso o 3º trimestre -> 0,9/1 UI por quilo de peso • Nas diabéticas tipo 1, 2 e algumas com pacientes overt diabetes, devemos usar as duas insulinas (NPH + regular), pois somente a NPH (que é a prioritária para gestantes) não vai dar conta. Quando temos que usar as duas, colocamos 2/3 da dose total por dia de NPH e 1/3 da dose total por dia de insulina regular. OBS: não podemos usar número ímpar, pois a seringa de insulina aumenta de 2 em 2 (então devemos diminuir 1 número ou aumentar, de acordo com o controle de dextro para decidirmos isso) A insulinoterapia é feita até o término da gestação 7 No dia do parto, a dose da insulina vai ser a metade da dose que ela costumava tomar na gestação. Exemplos Paciente com 100kg e diabetes gestacional Insulina NPH -> total = 50/60UI (vamos usar o 60 para calcular). A paciente injeta 30 em jejum, 14/16 antes do almoço e 14/16 às 22h. Paciente com 90kg e diabetes tipo 1 no 2º trimestre de gestação Insulina NHP e regular -> total =63/72UI (vamos usar o 72 para calcular). Em jejum injeta 24 de NPH e 8 de regular, noalmoço 12 de NPH e 8 de regular, 8 de regular na janta e 12 de NPH às 22h.
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