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Sobre Comportamento e Cognição (vol. 1) cap27

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Capítulo 27
O conceito de comportamento encoberto 
no Behaviorismo Radical de B. F. Skinner1
kmnhinuel Zii$ury Tourinho*
v y conceito de comportamento encoberto ó introduzido por Skinner, em sua 
discussão da privacidade, para dar conta de um conjunto de problemas tradicionalmente 
abordados pela psicologia a partir de referenciais mentalistas ou cognitivistas. Aí estão 
incluídos o pensar, o atentar, o ver, e outros tantos fenômenos admitidos como formas de 
ação do organismo, mas raramente interpretados com os conceitos de uma ciência do 
comportamento. Ao rejeitar a dicotomia físico-mental e o critério de verificação pública 
(Skinner, 1945), Skinner propõe-se a interpretar esses fenômenos enquanto 
comportamentos, com uma única especificidade: seu caráter privado ou encoberto. Dizer 
que aquelas ações do organismo podem ser interpretadas enquanto comportamentos 
implica afirmar que se trata de eventos (a) dotados de dimensões físicas e (b) funcionalmente 
relacionados a contingências de reforçamento presentes no ambiente (físico e social) com
1 Trabalho aprosontado no IV Encontro Drasiloiro do Psicoterapia o Medicina Cornportamontal, Campinas,
1995.
3 D opartam ento do Psico log ia Social e Escolar da U nivers idade Federal do Pará. Endereço para 
correspondência; Trav. Mauriti, 3275, ap 1501. Marco. 66.095-360, Bolóm, Pará.
Sobre comport.imento e coflniç.lo 2 Ó 7
o qual o organismo interage. Nesse sentido, o pensar é um fenômeno comportamental 
tanto quanto (e sujeito às mesmas leis que) o andar, por exemplo. Desse modo, não há 
necessidade, para Skinner, de uma definição especial para o conceito de comportamento 
encoberto, exceto que se trata de “comportamento executado em escala tão pequena que 
não ó visível aos outros”. (Skinner, 1974, p.27)
Apesar da aparente simplicidade da definição de comportamento encoberto, ela 
suscita um conjunto de questões que exigem esclarecimento. Procurarei, a seguir, abordar 
algumas destas questões, examinando como Skinner lida com elas.
a) A aquisição do comportamento encoberto.
Nas ocasiões em que Skinner trata da aquisição de repertórios encobertos, ele 
geralmente se refere a respostas adquiridas inicialmente de forma pública ou aberta, e que 
posteriormente retrocedem "ao nível do comportamento encoberto ou meramente incipiente" 
(1945, p.273). Um exemplo claro disso é o comportamento verbal encoberto, ao qual 
Skinner (1968) se refere afirmando que:
“Embora eventualmente uma criança fale para si mesma silenciosamente, nós 
a ensinamos a falar reforçando diferencialmente seu comportamento audível. Embora 
mais tarde ela leia livros e recite passagens para si mesma, nós a ensinamos na 
medida em que ela lê e recita em voz alta. O comportamento encoberto requer 
menos do ambiente atual e é fácil, rápido e secreto, mas até onde sabemos não há 
nenhum tipo de pensar que tenha que ser encoberto. ” (p. 125)
O pensar ó outro exemplo clássico de comportamento encoberto, mas ele não se 
confunde, para Skinner, com o comportamento verbal encoberto. O pensar, para Skinner, 
pode ser um conjunto de comportamentos preliminares (que podem ser públicos ou privados) 
emitidos em situações de resolução de problemas, nas quais não há possibilidade 
momentânea de emissão de uma resposta capaz de produzir o reforçamento. Tais respostas 
preliminares (ou precorrentes), quando funcionais, produzem mudanças (no ambiente ou 
no próprio indivíduo) que tornam possível a emissão da resposta solucionadora (que produz 
o reforçamento). Também o pensar é adquirido inicialmente de forma aberta. Por exemplo, 
quando aprendemos a ensaiar um movimento no jogo de damas, aprendemos a fazer isso 
de forma aberta e apenas sob outras contingências passamos a emitir a resposta de 
forma encoberta. Skinner, porém, não afasta a possibilidade de que uma estratégia de 
resolução de problema seja "aprendida em nível encoberto, com conseqüências privadas" 
(Skinner, 1974, p.112). Mas isso seria uma exceção e precisaria ser melhor explicada.
b) A manutenção de um comportamento ao nível encoberto.
' Quando uma resposta é aprendida de forma aberta, ela está sob o controle de 
conseqüências do ambiente do indivíduo. Quando ela passa ao nível encoberto, pode-se 
falar de duas possíveis fontes de controle. Primeiro, pode ser que a resposta fique sob 
controle de conseqüências privadas. É o que ocorre, por exemplo, no comportamento 
verbal encoberto. Sobre essa possibilidade, Skinner (1953/1965) diz o seguinte:
“O comportamento verbal... pode ocorrer ao nível encoberto porque ele não 
requer a presença de um ambiente físico particular para a sua execução. Além
268 Zafiury Touríufjo
disso, ele pode permanecer efetivo em nível encoberto porque o próprio falante é 
também um ouvinte e seu comportamento verbal pode ter conseqüências privadas.
A forma encoberta continua a ser reforçada, embora ela tenha sido reduzida om 
magnitude ao ponto em que nâo tem qualquer efeito apreciável no ambiente”, (p.264)
Na segunda alternativa, a resposta é parte de uma cadeia comportamental e fica 
sob controle das conseqüências ambientais que se seguem á segunda resposta, o chamado 
"comportamento consumatório”. Isso é o que ocorre com o pensar quando ele é um 
comportamento preliminar. Quanto a esta possibilidade, Skinner (1968) diz o seguinte:
"Uma voz que o comportamento precorrente opera principalmente para tornar o 
comportamento subseqüente mais efetivo, ele não precisa ter manifestações 
públicas. Qualquer comportamento pode retroceder ao nive! privado ou encoberto 
desde que as contingências de reforçamento sejam mantidas, e elas são assim 
mantidas quando o reforçamento é automático ou derivado da efetividade do 
comportamento aberto subseqüente. Como resultado, muito do comportamento 
precorrente envolvido no pensar não é óbvio", (p. 124)
Quer dizer, como um comportamento encoberto não afeta o ambiente físico e 
social com o qual o indivíduo está interagindo, ele não pode produzir mudanças reforçadoras 
nesse ambiente. Nesse caso, ou ele é reforçado por uma conseqüência igualmente interna, 
ou ele é reforçado por uma conseqüência que se segue a um outro comportamento quo é 
público e subseqüente ao comportamento encoberto.
c) Vantagens e desvantagens do comportamento encoberto.
Há circunstâncias em que o comportamento encoberto é claramente mais vantajoso 
para o indivíduo do que a forma aberta. Algumas vantagens citadas por Skinner (1974) são 
as seguintes: a )"... nós podemos agir sem nos comprometermos" (p.103), isto é, podemos 
emitir uma resposta sem sofrer possíveis conseqüências negativas que resultariam de 
sua emissão publica; e b) "nós podemos cancelar o comportamento e tentar novamente 
se as conseqüências privadas não forem reforçadoras" (p. 103), por exemplo, quando 
ensaiamos uma jogada num jogo de xadrez.
Há situações, porém, em que a forma encoberta de uma resposta é menos vantajosa 
do que a forma pública e, nesses casos, o comportamento tende a voltar ao nível aberto. 
Diz Skinner (1968) que "um pensador retorna ao nível aberto, por exemplo, quando a auto- 
estimulação encoberta é inadequada; ele pode começar um cálculo matemático 
privadamente, mas começar a falar alto ou escrever notas quando o trabalho se torna difícil 
ou surgem distrações", (p. 125)
Resumindo, o que define a forma aberta ou encoberta de certas respostas são as 
contingências em vigor, a possibilidade de produzir conseqüências reforçadoras em uma 
dada situação com a qual se está interagindo. Nenhuma resposta é sempre e 
necessariamente mais eficaz se emitida de forma aberta ou encoberta.
d) A descrição do comportamento encoberto.
A possibilidade de descrição do comportamento encoberto está intimamente 
relacionada com o aprendizado da descrição desse comportamento quando ele ocorre de 
forma aberta. No Behaviorismo Radical, o comportamento verbal ó visto comodeterminado
Sobre comport.imcnlo c roflniç.lo
por contingências sociais. A comunidade verbal, por seu turno, atua sempre com base em 
eventos públicos, que lhe estão acessíveis à observação direta. E apenas observando o 
comportamento cm sua forma aberta, então, que a comunidade pode ensinar o indivíduo a 
descrevê-lo. Para o próprio indivíduo, porém, a resposta pode ficar sob o controle, também, 
de uma estimulação encoberta que acompanha o comportamento. Sendo assim, numa 
ocasião futura, quando aquela estimulação ocorrer o indivíduo podo descrever a ocorrência 
do comportamento, mesmo que eía tenha acontecido de forma encoberta. Essa análise 
tem algumas complicações que não cabe discutir aqui, mas é importante ficar claro que a 
descrição só pode ser aprendida, a princípio, a partir de ocorrências abertas do 
comportamento.
e) A relação entre comportamento encoberto e comportamento aberto.
É um erro pensar que todo comportamento aberto é determinado por 
comportamentos ou estímulos encobertos. Por exemplo, ó um equívoco interpretar um 
comportamento público como determinado por um "pensamento", uma "decisão" ou uma 
"reflexão". O controle último de toda instância de comportamento humano está no ambiente 
físico e social, é possível que um comportamento encoberto anteceda temporalmento a 
ocorrência de um comportamento aberto, mas o último não é determinado pelo primeiro; 
ambos são função das contingências ambientais.
f) O ver como comportamento encoberto.
O comportamento de ver exige uma anáíise especial. Tanto quanto os outros 
comportamentos encobertos, ele é aprendido de forma aberta. Segundo Skinner (1968), 
"até onde sabemos, nada jamais é visto encobertamente que já não tenha sido visto 
abertamente, pelo menos de forma fragmentária. Portanto, o ver encoberto pode ser 
ensinado como ver aberto" (p. 127). O que torna o comportamento de ver um caso especial 
é que mesmo em sua forma aberta ele tem uma topografia que não pode ser especificada. 
Na verdade, ele é ensinado não com a comunidade observando diretamente o "ver”, mas 
com a comunidade inferindo sua ocorrência a partir da observação de outros comportamentos 
públicos que pressupõem a ocorrência do ver. Por exemplo, a comunidade ensina alguém 
a ver uma praia na medida em que solicita que o indivíduo descreva o lugar.
A análise do comportamento de ver é também fundamental para a crítica 
behaviorista à idéia de que nós armazenamos cópias mentais do mundo (cf. Skinner, 
1963). Uma cópia seria irrelevante para o comportamento privado porque o ver pode ocorrer 
na ausência da coisa vista. Uma vez que eu tenha aprendido a ver, por exemplo, uma 
praia, na presença da praia, eu posso vê*la na sua ausência, sem precisar, para isso, 
pressupor que eu guardei uma cópia mental da praia. Isso pode parecer improvável porque 
estamos acostumados com vários tipos de cópias de estímulos visuais, como fotografias, 
filmes, etc. Mas não é nada diferente de se dizer que se pode ouvir uma música na 
ausência dos estímulos auditivos que lhe são característicos, nem por isso dizemos que 
temos cópias mentais dos sons.
g) O caráter social do comportamento encoberto.
A ocorrência de uma resposta qualquer de forma aberta ou encoberta é função de 
contingências de reforçamento do ambiente com o qual interagimos, principalmente
2 7 0 I mm.muel Z.itfury lourmbo
do ambiente social. Não há, portanto, comportamento naturalmente encoberto; o que em 
uma cultura ocorre predominantemente sob a forma encoberta pode, em outro ambiente 
cultural, ocorrer predominantemente sob a forma pública ou aberta. Na cultura ocidental, 
por exemplo, a chamada leitura silenciosa, que corresponde ao comportamento verbal 
textual encoberto, só se tornou predominante a partir do final da Idade Média, com a 
separação ontro vida pública o vida privada (cf. Ariés, 1991). Antes disso, o comportamento 
verbal textual era predominantemente um comportamento público ou aberto.
Quando se fala do comportamento encoberto como função de contingências de 
reforçamento eminentemente sociais, ó importante entender que estamos falando da relação 
entre comportamento encoberto e práticas culturais. Nesse nível, náo estamos mais lidando 
com vantagens ou desvantagens do encoberto no nível pessoal ou individual, mas no nível 
da sobrevivência da própria cultura. Isto é, alguns repertórios comportamentais podem 
subsistir predominantemente a nível encoberto náo porque são mais funcionais enquanto 
tal para o próprio indivíduo, mas porque estão sob controle de contingências relacionadas 
à sobrevivência de uma cultura e das práticas que lhe são características. Neste caso, 
não apenas não podemos naturalizar o fenômeno do comportamento encoberto, como 
precisamos refletir sobre a própria cultura que o propicia e o modo de vida que esta cultura 
está produzindo ao estabelecer limites muito estritos para que grande parte do repertório 
comportamental humano possa ocorrer a nível aberto.
Bibliografia
ARIÉS, R (1991) Por uma História da Vida Privada. Em Ariés, P. e Chartier, R. História da 
Vida Privada - Volume 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1 “ reimpressão, p. 7-19
SKINNER, D. F. (1945) The operational analysis of psychological terms. Psychological 
Review, 52,270-277/291-294.
(1963) Dehaviorism atfifty. Science, 140, 951-958.
(1965) Science and Human Behavior. New York/London: Free Press/Collier 
MacMilIan. Publicado originalmente em 1953.
(1968) The Technology of Teaching. New York: Appleton-Century-Crofts.
(1974) About Behaviorism. New York: Alfred A. Knopf.
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