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DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DA FFLCH/USP HISTÓRIA DA ÁFRICA (FFLCH 0649) Profa. Leila Maria Gonçalves Leite Hernandez PRIMEIRO TEXTO “Durante muito tempo, os historiadores do período colonial interessaram-se principalmente pelo sistema administrativo, econômico e social criado pelos europeus e, eventualmente, pelas suas consequências sobre os africanos. Mas, quanto ao essencial, foi preciso que surgisse a obra de especialistas de outras ciências sociais (etnólogos, antropólogos, polítólogos, economistas e sociólogos, todos eles investigadores de campo, atentos à “África atual” e preocupados com as incertezas do “tempo presente” ) para chamar a atenção para a necessidade de tomar em conta, como fato maior desse período, não apenas a reação dos africanos em face desse sistema ou as transformações verificadas nas sociedades africanas, mas também a sua aptidão a constituir-se ou a reconstituir-se como plenos sujeitos históricos. Tornou-se assim possível pôr também em evidência a sua capacidade para inventarem os meios mais adequados para salvaguardar o controle do seu destino, meios esses que podiam dizer respeito quer aos sistemas de interpretação do mundo, quer às estratégias de escape (de utilização ou de captação) de novas relações de dominação ou das filosofias em que os europeus pretendiam assentar a sua legitimidade. Vista deste ângulo, a história da África colonial é, antes de mais, a da notável continuidade de uma tradição: a da resistência dos povos às usurpações e às lógicas estatais de invasão, de dominação e de exploração que se repetiam desde há séculos, mas que a colonização multiplicou numa escala sem precedentes, e que prosseguiram após as independências. Contudo, na medida em que, para obterem as melhores condições de negociação com o colonizador, ou, ao contrário, para o combaterem, numerosos africanos fizeram seus e adaptaram à sua condição particular os princípios filosóficos e ideológicos característicos das sociedades europeias, assim como as suas formas de mobilização e de ação, essa história é também de uma “ocidentalização” e de uma “aculturação” seculares, de que, no fim de contas, a colonização não foi mais do que uma fase. Por último, e talvez, sobretudo, como a ocupação da quase totalidade do continente africano por estrangeiros foi um desafio que punha em causa a própria essência e o devir da africanidade, essa história foi a de uma invenção de linguagens, de solidariedades, de culturas e de práticas que levaram a África às independências e que, continuando a atuar nas sociedades de hoje, constituem o fator determinante e o motor essencial das evoluções do continente negro”. (LE CALLENNEC, Sophie. Os caminhos da emancipação. In M’BOKOLO, Elikia. África Negra. História e Civilizações. Tomo II- Do século XIX aos nossos dias. Lisboa: Edições Colibri, 2007, p.455).
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