levou. Saímos para caminhar e andamos até as bolhas sangrarem, até sentir que as montanhas estão acabando com a gente. Patrick encosta em uma planta venenosa. Imogen é picada por uma vespa. Minhas queimaduras de sol ardem embaixo das roupas, e acabo jurando para quem quiser ouvir que nunca mais vou me envolver em atividades ao ar livre. – É sério – repito para Imogen, descendo a encosta da montanha e sentindo o cabelo escapar do coque. – Assim que chegar em casa, vou me enfiar em uma bolha hermeticamente fechada e nunca mais saio de lá. – Ótimo plano – Julia anuncia animada atrás de nós. Imogen e eu trocamos um olhar surpreso antes de explodirmos em um ataque de riso. – Essa Julia – digo ofegante, praticamente caindo de tanto rir. Fazia muito tempo que Imogen e eu não tínhamos um ataque como esse, desde antes de eu ter ido embora, com certeza. Não sei se estamos apenas exaustas, se é outra coisa, mas as queimaduras quase valem a pena por isso. – A gente sempre pode contar com ela. Tess está bem melhor quando voltamos, e até ajuda Patrick a preparar os hambúrgueres e as salsichas na fogueira do acampamento, arrumando os pães sobre a mesa em fileiras organizadas e simétricas. – Melhorou? – pergunto quando me aproximo para pegar dois pães para mim e Gabe, e também um pedaço do brownie maravilhoso que Imogen fez. Tess assente rapidamente, inclinando a cabeça para aceitar um beijo que Patrick dá em seu rosto. Não sei se é uma exibição para mim, ou não. – Que bom – completo com um tom radiante, segurando um prato de papel em cada mão, sentindo meu rosto fazer um movimento estranho, que tento evitar. Não tem de quê, penso rancorosa. – Fico feliz. Digo a mim mesma que não tenho motivo para me sentir estranha de repente, que estou irritada e incomodada por causa da queimadura de sol e de três noites seguidas dormindo no chão. Mais tarde, porém, quando estou voltando do banheiro do acampamento com a escova de dentes em uma das mãos e massageando o braço com a outra, porque faz frio aqui nas montanhas e estou arrepiada, vejo Patrick segurando a aba da abertura da barraca para Tess entrar antes dele. Não consigo ouvir o que ele diz, mas ouço a gargalhada dela, mesmo abafada, quando Patrick fecha o zíper da porta. É a mesma barraca que Chuck montava para nós atrás da casa da fazenda no verão quando éramos crianças. Sei que o interior tem cheiro de naftalina e poeira. Respiro fundo, atingida de repente por um estranho e forte instinto de gritar para, como se visse alguém entrar na frente de um carro ou aproximar a mão de uma chama acesa. Como se tentasse impedir algo terrível e desastroso, mas sou eu quem vai se machucar. Meu Deus. Balanço a cabeça quando viro, determinada a voltar à barraca que divido com Gabe. Não sei como me livrar desse sentimento. É claro que eu sabia que os dois estavam juntos na barraca, é claro que pensei nas várias implicações desse arranjo e no fato de todas essas implicações serem irrelevantes enquanto Tess vomitava até virar do avesso. Gabe me toca assim que entro, segurando minha mão e me puxando para os sacos de dormir macios, onde tira minha prática camiseta regata. – Você se queimou de verdade, Molly Barlow – murmura ele, olhando para mim à luz da lua que entra na barraca pelo teto. Depois, encosta a boca em uma área vermelha no meu ombro e em outra perto do quadril, onde a camiseta levantou enquanto eu dormia. – Dói? Tess é mais magra que eu, penso com inveja. Deve ser mais bonita que eu quando tira a roupa, e provavelmente... Para com isso. – Não dói – respondo, fechando os olhos e me entregando ao momento, sentindo as mãos e a boca de Gabe e a vibração agora familiar que ele desperta em meu corpo. Patrick e eu éramos crianças quando começamos a namorar, tão novos que nem tínhamos pressa para fazer nada, mais tímidos que admitíamos um para o outro, provavelmente. Mas agora somos mais velhos, estamos naquela idade em que não é inconcebível que ele e Tess tenham seguido em frente mais depressa, não é improvável que ele agora esteja tirando a camiseta dela, puxando o elástico da calcinha e... – Não posso – falo de repente, sentando com tanta força que empurro Gabe de cima de mim, levantando bruscamente no saco de dormir meio fechado com o rosto suado e vermelho. Não sei o que fazer, não sei como explicar a ele que Patrick e Tess estão na tenda vizinha e nós dois estamos aqui, e que tudo parece estar conectado, muito próximo, terrível, e que nesse segundo tudo o que eu quero é que ninguém nunca mais toque em mim. Já fizemos isso antes, não? Não devia ser tão importante, mas é, e eu não... – Desculpa – tento –, eu só... – Ei, calma. – Gabe também se senta e afasta o cabelo do rosto. – Tudo bem. A gente não precisa fazer nada. Fica calma. – Ele segura minha mão e a acaricia. – Quer andar um pouco? Sorrio, constrangida e agradecida, pegando a camiseta e brincando com a barra por um instante. – Você é, tipo, perfeito, ou qualquer coisa assim? – pergunto, e balanço a cabeça antes de vestir a blusa. – Esse é seu superpoder? – Não – Gabe responde sério. – Meu superpoder é visão de raios X. Dou risada. – Ai, caramba, retiro o que disse. Gabe sorri. – Vem – diz, levantando e me ajudando a ficar em pé. – Vamos ver as estrelas. Pego um lanche e alguns equipamentos e atravessamos o camping passando por grupos que ainda conversam em volta de fogueiras. Sinto um arrepio quando o ar frio da noite toca minha pele queimada de sol. A mão de Gabe é morna na minha, porém, e quando chegamos à clareira onde aconteceu o show na noite passada, já tirei Patrick, Tess e o que eles podem estar fazendo da cabeça. Isto é o que está acontecendo: Gabe, eu e as estrelas sobre nós. É aqui que eu tenho que estar. Encontramos um trecho de grama livre de lixo e estendemos o cobertor no chão úmido, depois deitamos para olhar para o céu. Estamos longe o bastante da civilização para a lua parecer um holofote. Vejo Orion, a Ursa Maior, Cassiopeia em sua cadeira de cabeça para baixo. – Essa é a hora em que a gente fala sobre como somos pontinhos minúsculos comparados ao universo – digo para Gabe com tom irônico, mas a verdade é que estou muito, muito feliz por termos saído da barraca para olhar o céu. – Pega – ofereço, tirando duas cervejas da mochila. – Um brinde a sermos pontinhos. Gabe sorri, surpreso. – Olha só para você, escoteira – diz, tirando as tampinhas das duas garrafas e me devolvendo uma delas. – Te amo, sabia? Você é especial. Olho para ele por um momento. Gabe olha para mim. Depois, nós dois começamos a rir. – Você entendeu – ele diz, e eu entendo, acho. E o beijo para provar que é verdade. Volto para casa e encontro outro e-mail da reitoria na minha caixa de entrada: Caro ingressante, por favor, pelo amor de tudo que é sagrado, decida sua vida rápido. Ou alguma coisa com esse sentido. Faço um lanche com maçã e manteiga de amendoim e mando uma mensagem para Gabe dizendo que me diverti muito. Você também é bem legal, para um pontinho, ele responde, e eu rio. Com Gabe, nunca me sinto uma decepção falante e ambulante. Com Gabe, só me sinto eu mesma. Então, por que não consigo parar de pensar no irmão dele? Termino de comer a maçã e levo Oscar para o quintal, tentando tirar da cabeça a imagem de Patrick e Tess desaparecendo no interior da barraca, dizendo a mim mesma que estou sendo melancólica e burra. Faço uma lista de projetos a desenvolver no dia seguinte, quando voltar ao trabalho. Finalmente, pego o celular no bolso. E a coceira?, escrevo para Patrick em tom de brincadeira. Ele não responde. Na manhã seguinte, porém, recebo a resposta: coçando. Só uma palavra, sem pontuação. Dois minutos depois: e a queimadura? Sorrio olhando para o celular, me sentindo boba e contente. Queimando, respondo. Minha mãe tem babosa, ele escreve quando estou emitindo notas no escritório de Penn. Pode vir buscar um pouco, se ainda estiver parecendo uma lagosta. Não estou, na verdade. A queimadura já clareou e está começando a descascar, como se eu me transformasse em alguma