Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Direito da Integração - Prof. Umberto Celli; Monitora: Carolina 22.2 - 01.03 - Material disponível no Stoa.usp.br Integração é um fenômeno multifacetado, que não possui um único conceito. Envolve aproximação comercial, econômica, política, cultural, jurídica e até religiosa entre os Estados. Nos textos do curso podem ser verificadas várias concepções de integração. A opção do professor é estudar predominantemente a integração comercial e econômica. É evidente que existem outros motivos que levam os Estados a se aproximarem que não apenas razões econômicas. Ex.: Mercosul: possui razões comerciais e econômicas, mas o Brasil também se esforça em manter forte o Mercosul por conta de uma razão política. Economicamente, Paraguai e Uruguai não têm a mesma relevância de outros países, mas a negociação de acordos enquanto bloco é melhor. Além disso, o Brasil fortalece a sua posição de liderança política na América do Sul. No entanto, a liderança não é algo que se conquista a partir do discurso. Ela é conquistada por atos e está ligada à legitimidade. Se o Brasil busca aprofundar as relações internas do Mercosul, isso significa que há uma estratégia política apoiada por ações, como investimentos em infra- estrutura nos países vizinhos. A integração, então, tem um componente político muito forte. Isso fica mais claro quando examinamos, por exemplo, a Unasul (União das Nações Sulamericanas). Tem- se até uma ideia até maior de integração comercial e econômica, passando por unificação de infra- estrutura e até da política de defesa. Partindo-se do pressuposto de que se tem um fenômeno ou um processo multifacetado, procura-se entender quais as razões que levam os Estados a iniciarem um processo de aproximação ou integração1. Por que existe a aproximação? Primeiro, imagina-se que quando os Estados celebram um acordo para facilitar a circulação de bens e mercadorias entre eles, remover barreiras tarifárias, isso pode aumentar o comércio no espaço e, consequentemente, a geração de riquezas. Abre-se a possibilidade de aumento de importações e exportações entre os diferentes países daquele espaço. Há também a ideia de que os Estados são heterogêneos. Há discrepâncias enormes, por exemplo, entre Alemanha e Grécia. Evidentemente, não há uma homogeneidade, mas ela é buscada. Hoje, a diferença entre Grécia e Alemanha é menor do que antes. Essa primeira tentativa de integração regional também parte do pressuposto de que, gerando maior riqueza e aumentando a importação e a exportação, haverá maior concorrência entre as empresas, beneficiando o consumidor. Outra razão é a tentativa de complementação das economias, a partir de parceiros especializados em determinadas áreas. Assim, a maior eficiência de um país pode gerar mudanças estruturais em outro, e vice-versa. No Mercosul, por exemplo, a maior eficiência da indústria de 1 Por enquanto, integração é pensada nas razões que levam os Estados a se aproximarem, principalmente quanto ao aspecto comercial e econômico. laticínios na Argentina exige uma maior eficiência na indústria brasileira. Se a indústria interna não se torna efetiva, o país se limita a importar do parceiro. Até o passado recente a integração era regional, e mesmo hoje ela é predominantemente regional. Tem-se, por exemplo, o Mercosul (integração subregional), a UNASUL (regional), a União Europeia, a Comunidade Andina das Nações, e outros grupos na Ásia e na África. A proximidade geográfica, porém, deixa de ser cada vez mais uma das razões para a integração. O próprio termo regional tem nuances. A OMC continua tratando esses acordos de Regional Trade Agreements (“Acordos de Integração Regional”), mesmo que eles não sejam propriamente regionais. É o caso do acordo entre Mercosul e Israel. A ideia da proximidade geográfica ainda tem seu fundamento, principalmente se o pensamento se volta para a estratégia geopolítica do país. Porém, esses acordos regionais convivem com outros acordos que não são mais regionais, embora ainda sejam tratados assim pela OMC. É uma fase de transição que ainda exige uma sistematização. Os fundamentos e as motivações para a ocorrência da integração regional sempre foram verificados na história. É o caso da Zollverein alemã, a primeira união aduaneira. É um objetivo que persiste desde o séc. XIX. É a necessidade de unir esforços para superar problemas estruturais nos países e fortalecer a economia dos diferentes países. Apenas os Estados que se aproximam e participam desse processo de “integração” se beneficiam. Durante o séc. XX consolida-se a ideia de que os países próximos entre si continuassem a se integrar, mas também surge a ideia de que para o mundo seria muito melhor que houvesse uma aproximação maior entre um grande número de Estados, com a mesma concepção de que todos os Estados seriam beneficiados por isso. Essas idéias encontraram um contraponto: o amadurecimento da ideia de que seria mais viável e mais plausível a obtenção de um maior crescimento econômico entre os Estados se essa aproximação não se desse apenas no plano regional, mas sim no plano multilateral. Nesse processo, o ano de 1947 é um marco. Era necessário reconstruir a ordem política e jurídica internacional no pós-guerra (ONU), bem como a ordem econômica internacional, especialmente diante da derrocada da economia européia. Seriam necessárias políticas monetárias para que não houvesse uma desvalorização irreversível e dramática de moedas, bem como controle da inflação. Por mais que isso significasse a intervenção em assuntos internos dos Estados, era necessária alguma estrutura que impedisse essas crises internacionais. Surge, assim, o Fundo Monetário Internacional (FMI). Evidentemente que ao se falar nessa reconstrução política e jurídica, também se fala na reconstrução econômica e financeira. Financiamentos para infra-estrutura e recuperação da economia eram necessários. Daí o surgimento do Banco Mundial, com objetivo imediato de financiamento dessa reconstrução econômica. Além da ONU, do FMI e do BM, faltava uma organização que editasse as regras para o comércio internacional. Não faltaram esforços para que se pudesse criar uma organização internacional do comércio, mas não foi possível concretizar esse tratado. Razões políticas, como a resistência do Congresso norte-americano à grande abrangência do tratado, impediram a criação dessa organização. O que se originou foi diferente: retirou-se um capítulo do tratado, sobre comércio e remoção de barreiras tarifárias, e com ele deu-se origem a um acordo chamado GATT (“Acordo Geral de Tarifas e Comércio”). O GATT seria um acordo provisório, porque o objetivo último era a criação de uma organização tal como o FMI, o BM ou a ONU. Mesmo com essa provisoriedade, o acordo durou 47 anos. Durante todo esse tempo, o tripé de sustentação da economia internacional não contou com essa organização internacional2. O acordo visava a remoção de barreiras tarifárias entre as partes contratantes. Por força desse objetivo, houve a necessidade de certo grau de institucionalização ao longo do tempo, como, por exemplo, a formação de um próprio “sistema de solução de controvérsias”. O GATT criou feições de uma organização, mas nunca chegou a sê-la. O GATT tinha objetivo de liberalizar o comércio internacional, ou seja, remover barreiras comerciais, tarifárias, jurídicas, etc. Com todas as deficiências, isso significou um contraponto às idéias de integração do séc. XIX. Era uma ideia de liberalização mais ampla, que envolvia um conjunto maior de países e não apenas um bloco regional de países. Aparecia com maior vigor o multilateralismo como um contraponto ao regionalismo. O multilateralismo tinha que encontrar um ponto de sustentação, um princípio de direito que poderia sustentar a liberalização. Trata-se do “princípio da não-discriminação”. Um Estado-parte (não Estado-membro!) do GATT, aofazer uma concessão a outro, não deveria discriminar os outros. A multilateralização do comércio envolve a não discriminação e, portanto, exige a extensão para todas as partes de benefícios concedidos a uma delas, não importando o fato de que as concessões eram restritas a apenas duas delas. É preciso positivar o princípio, transformando-o numa norma, numa cláusula. No GATT, o Artigo I dispõe justamente sobre o princípio da “não-discriminação” e o princípio da reciprocidade. É a cláusula Most Favoured Nation (“cláusula de nação mais favorecida”). Segundo o dispositivo, quaisquer concessões trocadas entre as partes do GATT serão automática e incondicionalmente estendidas às demais partes contratantes. Evitam-se favorecimentos, discriminações, especialmente aquelas praticadas normalmente em acordos regionais. Por isso, o acordo favorecia o multilateralismo. 15.3 - Pontos 1.3, 1.4, 1.5 e 1.6 do programa Como acordo multilateral, o GATT também passou a regular os fenômenos regionais. Como principal fundamento jurídico, encontramos o art. 1º, conhecido como cláusula de nação mais favorecida, que nada mais é do que a consubstanciação do princípio da não-discriminação. É um princípio de matriz neo-liberal. A regra é a não-discriminação, que permite um processo gradual de liberalização comercial, ou seja, a remoção de barreiras comerciais, sobretudo de impostos de importação. Já em 1947, é importante ressaltar que o GATT é realizado. Trata-se de um acordo, não um tratado, cujos avanços foram incorporados ao tratado de criação da OMC. Os avanços obtidos na liberalização comercial, ao longo desses 47 anos, foi incorporado. Os artigos do GATT, inclusive o art. 1º, continuam integralmente em vigor, sendo parte do arcabouço normativo da OMC. Trata-se do fundamento jurídico do comércio internacional. Atualmente, as concessões conferidas a um membro são automaticamente estendidas aos demais. Os art. XXIV do GATT-47 e do GATT-94 são praticamente iguais.3 Também se pensou, em 1947, que sendo um acordo multilateral, o artigo seria concebido como uma exceção ao princípio da não-discriminação e a cláusula da nação mais favorecida. Os Estados signatários do GATT já eram 2 Organização internacional é algo institucionalmente mais complexo. Ela se diferencia justamente por ter uma capacidade de assumir direitos e obrigações para si, diferente da capacidade dos Estados. Os Estados delegam competência para a entidade, que passa a ter poderes e uma estrutura institucional distintos dos poderes e da estrutura dos Estados. 3 Alguns artigos do GATT sofreram ligeiras alterações por interpretação durante a Rodada Uruguai, última rodada de negociações do GATT. heterogêneos desde o início, mesmo sendo numericamente poucos. A aproximação foi lenta e gradual, o que resultou em rodadas longas e reiteradas. Por serem heterogêneas, as partes tinham receio de abrirem, de maneira excessiva, as suas economias. Assim, essa flexibilização e essa exceção permitida ao art. 1º e à cláusula de nação mais favorecida poderia fomentar a aproximação entre Estados com maior afinidade econômica, comercial, política e jurídica. Mais importante, poderiam ter menos desníveis e menos assimetrias. Com mais afinidades econômicas, há maior possibilidade de crescimento econômico (maior exportação e maior importação, sem prejuízos). Estabeleceu-se a possibilidade de que a aproximação ocorresse de forma mais rápida, na medida que os Estados-parte poderiam avançar nas negociações numa velocidade mais rápida a partir da “integração”. Significa dizer que há uma redução das alíquotas de importação mais rapidamente para os parceiros, que possuem economias complementares. Aplica-se, dentro desses esquemas de cooperação, os princípios do GATT, mas é uma exceção permitida dentro do GATT. Os acordos regionais, então, são filhotes do sistema multilateral. A mãe é o GATT; os filhotes são os acordos regionais. Eles só são possíveis se autorizados pela mãe. Ou seja, em termos jurídicos, os acordos regionais devem ser compatíveis com as regras e os princípios do GATT (hoje, do arcabouço da OMC). Um desses é o próprio princípio da não-discriminação: dentro desses esquemas regionais, não pode haver discriminação (cláusula da nação mais favorecida). Ex.: acordo regional envolvendo 4 países: se a concessão é feita para um, deve ser estendida para os outros dois. Isso é muito importante e deve ser desde logo assimilado. É fundamental que se saiba que os acordos regionais são filhotes do sistema multilateral, e um dos fundamentos jurídicos é o art. XXIV. Como isso funciona? Enquanto, no sistema multilateral, o objetivo é uma redução gradual das barreiras tarifárias, mas com maiores dificuldades por conta das profundas diferenças de interesses (ex. Rodada de Doha), no sistema regional, por conta da maior homogeneidade, o objetivo é a eliminação das barreiras tarifárias, dentre outras. Como elas seriam eliminadas? Em primeiro lugar, o art. XXIV dispõe, mais ou menos, que em conseqüência do presente acordo, as disposições do presente acordo (cláusula de nação mais favorecida) não se oporão à formação de uma união aduaneira entre as Partes-contratantes ou ao estabelecimento de livre troca. É possível a aplicação do art. XXIV para se criar, seja uma zona de livre-comércio, seja uma união aduaneira. No caso de uma zona de livre troca ou de livre-comércio, os direitos aduaneiros de cada território. Enquanto no GATT e na OMC fala-se em liberalização do comércio, o art. XXIV fala em livre comércio. O que isso significa? Significa “sem barreiras”. No GATT, as barreiras são gradualmente reduzidas, mas não eliminadas. A forma mais usual de acordo regional é a zona de livre-comércio: os Estados que fazem parte do acordo ou do tratado internacional devem, num determinado prazo, eliminar as barreiras de determinados produtos dentro do território regional. É um processo de integração que objetiva a eliminação de barreiras tarifárias, num primeiro momento, e de barreiras não-tarifárias, num segundo momento. No art. 8º, há a definição clássica do que seja zona de livre comércio: é a livre circulação de mercadorias, com eliminação de todas as barreiras de comércio (tarifárias e não-tarifárias) e aumento do comércio intra-zona (e não apenas um desvio de comércio). Mas se não há mais impostos de importação, outras barreiras poderão surgir. Assim, por exemplo, é possível que a ANVISA estabeleça uma norma que determine que certos produtos agrícolas, para serem comercializados no Brasil, devem ter uma dada forma de manejo e tratamento, sem agrotóxicos. Não há imposto de importação, mas os produtos não são importados por barreiras não-tarifárias (no caso, barreiras técnicas). Assim, a livre circulação envolve não apenas a inexistência de barreiras tarifárias como de barreiras não-tarifárias. As partes que compõem essa zona de liberalização também devem coordenar a eliminação de barreiras técnicas. É um grande trabalho de normatização e de cooperação entre os órgãos técnicos dos diversos países do bloco, em busca de uniformização ou harmonização. Para o produtor brasileiro, a proibição de uso de agrotóxicos, por exemplo, aumenta os custos da produção. Por isso, há uma desvantagem comparativa caso os produtores argentinos, que deveriam ser parceiros, produzam com agrotóxicos. O cuidado que se deve ter é com barreiras que parecem trazer benefícios para o consumidor, mas que, na verdade, buscam apenas estabelecer barreiras alfandegárias camufladas. É o caso, por exemplo, de barreiras ambientais (ex. pesca predatória do Atum no México e proibição de importação pelos EUA; caso do licor de cassis de Dijón). Adequar-se aos fatores de produção implicaria na assunção de custos pelos produtores mexicanos. Existe um órgão, na OMC, chamado Comitê de Normas Técnicas. Ele analisa se as barreiras técnicas são justificáveis, são imprescindíveise implicam num verdadeiro benefício para o consumidor, ou se elas são apenas barreiras camufladas. Em âmbito regional, a mesma discussão ocorre. É necessário evitar a concorrência desleal e predatória que possa destruir o produtor nacional. Por outro lado, há a necessidade de se criarem regras para que a produção seja feita com base no low carbon (tecnologias menos poluentes). Os países devem apoiar os produtores locais para fazerem essa transição. As regras, porém, não podem ser implementadas de uma só vez. A zona de livre-comércio não pode implicar apenas em um desvio de comércio, i. e., na criação de espaços como barreiras a produtos de países que não são membros, mas produzem em condições mais competitivas. A ideia é sempre de aumento da concorrência, de incremento de comércio internamente à zona. A outra possibilidade prevista no art. XXIV, de exceção à cláusula de nação mais favorecida (criação de espaço regional com benefícios específicos para seus integrantes), é uma União Aduaneira. Quando temos uma zona de livre-comércio, em tese, temos uma livre-circulação de mercadorias. Isso pode, porém, não ser suficiente. Além desse passo, pode ser necessário estabelecer alíquotas de importação comuns aos países membros do bloco. Ex.: Argentina importa computadores e maquinário com 0% de alíquota, industrializa seus produtos e vende os produtos ao Brasil a preços muito mais competitivos. Isso justifica a criação de uma união aduaneira. O objetivo é que todos e quaisquer produtos importados de fora da zona terão o mesmo imposto de importação. É a Tarifa Exterior Comum (TEC). Ex.: MERCOSUL a partir do Protocolo de Ouro Preto. Quaisquer produtos importados por Paraguai, Uruguai, Brasil ou Argentina, de fora da MERCOSUL, terão o mesmo imposto de importação. É um estágio de integração mais complexo do que uma zona de livre comércio, pois pressupõe um volume de negociações muito maior do que o necessário para a construção de uma zona de livre comércio. Pressupõe a coordenação de políticas comerciais, sendo um passo muito mais audacioso. 22.3 - Categorias de integração (dr. Carolina) Uma obra de referência no tema é de Bela Balassa. O autor trata da integração econômica a partir de categorias. O prof. Celli critica a excessiva teorização e também o problema da gradação de movimentos de integração. Há exemplos contrários, como o NAFTA. Não há a intenção de chegar a um Mercado Comum, com uma Tarifa Externa Comum para os países. Por outro lado, há regras muito claras sobre proteção trabalhista, meio-ambiente, etc. Para a obra de Bela Balassa, isso não seria possível sem passar por outros modelos. A Comunidade Andina de Nações, por outro lado, teria pulado o primeiro modelo de Acordo ou Área de Livre Comércio, tornando-se, desde logo, Mercado Comum. Pelos modelos de Bela Balassa: 1) acordos de livre-comércio (art. 24): eliminação de barreiras alfandegárias entre os países, com manutenção das barreiras para os outros países do mundo. Ex.: Nafta: entre México, Canadá e EUA há uma classificação tarifária, ou seja, uma troca de listas, com todos os produtos, segundo categorias e suas respectivas tarifas (Nomenclatura Comum do MERCOSUL - MCM). A partir dessas listas, reduzem-se as tarifas. A intenção do acordo de livre-comércio busca a redução das tarifas para todos os envolvidos no acordo. Substancialmente, há diversos problemas levados ao órgão de solução de controvérsias. Para alguns, há maior eliminação de tarifas, enquanto para outros, menos. O que há é a determinação de que as listas tratem substancialmente de 80% do comércio. 2) união aduaneira: adoção de uma Tarifa Externa Alfandegária Comum para os países membros. Um exemplo é a Tarifa Externa comum do Mercosul. Os países resolveram não apenas tirar as barreiras entre eles, mas também harmonizar a política comercial com terceiros países. Assim, se a União Europeia resolver exportar para Brasil, Argentina, Paraguai ou Uruguai um bem qualquer, esse bem terá a mesma tarifa em qualquer um dos países. Por que a união aduaneira exige um esforço maior dos países? Notamos uma proliferação de acordos regionais, mas quase sempre como acordo de livre-comércio. Como união aduaneira, apenas União Europeia, o MERCOSUL, a Comunidade Andina das Nações, a SACU (entre países do Sul da África). É difícil porque a concordância sobre todas as tarifas exige um comprometimento muito grande dos países e uma secretaria que controle a tarifa. Exigem-se coisas práticas, como o certificado de origem. Todo o produto, para entrar e circular no Mercosul, deve ter certificado emitido por autoridade para comprovar que foi produzido num dado país. 3) mercado comum: seria um terceiro momento no processo de integração. Exige não apenas todos os passos anteriores (liberalização comercial entre os países e tarifa externa comum perante terceiros) como a liberdade de movimento de bens, serviços e fatores produtivos (capital e trabalho). Permite-se que o capital circule livremente, de tal sorte que o trabalhador de um país possa trabalhar com as mesmas liberdades em outro membro do bloco. Ex.: Comunidade Econômica Europeia, desde 1993 (Tratado de Maastricht, de 1992). O Mercado Comum, além das características comuns, deveria ter um direito da concorrência. Normalmente não existe um direito da concorrência, mas a chamada “defesa comercial”. O instrumento existente para proteger o país contra outros países é a imposição de salvaguardas (medidas anti-dumping), com a restrição do comércio internamente. No Mercado Comum, isso não seria possível, porque entre os países deve haver a mesma liberdade de circulação de bens e serviços. As salvaguardas não seriam úteis nesse cenário, havendo a necessidade de um direito de concorrência. O MERCOSUL, na sua ambição de se tornar um Mercado Comum, previu um direito de concorrência no Protocolo de Olivos, mas isso nunca foi implementado, pois os países não estariam preparados para enfrentar essa livre concorrência. Por isso, a Argentina pode utilizar salvaguardas contra os produtos brasileiros. 4) união econômica: é a harmonização do conjunto de política econômica e monetária. Ex.: União Europeia, desde 1999, com a criação do Euro. Alguns países não acolheram o Euro, porque a União Europeia possui um mecanismo de cooperação reforçada - ou seja, nem todos os países precisam aceitar a integração proposta. 5) união política: construção de uma única unidade territorial político-econômica. O professor Celli entende que ainda não chegamos a uma unidade política em nenhum lugar do mundo. A monitora dele entende que, com o advento do Tratado de Lisboa, há elementos que trariam uma unidade política (ministro, possibilidade de que vários países requeiram que o Parlamento Europeu faça uma lei, etc.). São elementos que estariam na Constituição, mas foram feitos por meio do novo Tratado. Conceitos de integração Sobre os conceitos de integração, há uma visão liberal e uma visão estruturalista. A primeira pensa numa integração puramente econômica, ou seja, uma liberalização gradual, com diminuição gradual das barreiras comerciais (tarifárias e técnicas), até a eliminação dos entraves. Para a visão estruturalista, essa integração deve estar atrelada a critérios de desenvolvimento. Caso contrário, os benefícios econômicos não seriam alcançados. Isso porque, quando temos integração econômica, há sempre países mais ricos e mais pobres. Como resultado, haveria um desvio de comércio natural: se o Brasil, por exemplo, é mais rico e produz produtos mais competitivos do que o Paraguai, a indústria incipiente paraguaia seria sufocada na origem, e apenas o Brasil produziria. Não haveria um auxílio econômico ao Paraguai. Para evitar esse tipo de situação, há fundos para ajudar os países mais pobres dentro dos processos de integração. Isso foi muito utilizado no âmbito da União Europeia, principalmente Portugal, Espanha e Grécia, que receberammontantes de dinheiro elevados para elevar a estrutura do país a fim de chegarem próximos de França, Reino Unido e Alemanha. Há a adoção, por exemplo, de políticas de integração energética, políticas sociais, educacionais, etc. Isso foi muito discutido no MERCOSUL. Em 2007, foi criado o FOCEN, um Fundo de Apoio que Brasil e Argentina dariam para Uruguai e Paraguai. Cláusula Habilitante Numa visão de integração como desenvolvimento, verificamos uma flexibilização ao art. 24. O art. 1º (cláusula da nação mais favorecida) tem como exceção o art. 24 (permite que não tenha uma liberalização igual para todos os países). Como exceção ao art. 244, existe a cláusula habilitante. Historicamente, o GATT começou em 1947, e o processo de liberalização se deu a partir de rodadas de comércio. Durante as primeiras rodadas, houve liberalização de tarifas. Porém, os países em desenvolvimento perceberam um grande desvio de comércio - apenas quem se beneficiava com o sistema do GATT eram os países desenvolvidos. Eles passaram a ver o sistema GATT como uma forma de privilegiar o livre acesso dos bens dos países desenvolvidos Criou-se a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento). Foi uma forma de os países em desenvolvimento se unirem contra esse desequilíbrio no comércio internacional. Na Rodada Tóquio de 1979, os países em desenvolvimento conseguiram aprovar a 4 Em sendo uma exceção da exceção, o prof. Celli prefere a nomenclatura “flexibilização” do art. 24. É uma exceção ao art. 1º. cláusula habilitante, que dispõe: “Não obstante as disposições do art. 1º do Acordo Geral, as partes contratantes poderão conceder um tratamento diferenciado e mais favorável aos países em desenvolvimento, sem conceder esse tratamento às outras partes contratantes”. Os países são divididos em desenvolvidos e em desenvolvimento. As disposições se aplicam aos acordos gerais e regionais entre as partes contratantes. Há duas flexibilizações ao art. 1º e ao art. 24. Na primeira, permite-se a criação dos sistemas gerais de preferência (SGPs). Os países desenvolvidos (EUA, UE, Austrália e Nova Zelândia aplicam) possuem uma lista de classificações tarifárias, pelas quais os produtos dos países em desenvolvimento podem entrar com uma tarifa menor em seu mercado. Embora não haja um acordo de livre-comércio, a lista de produtos que é escolhida fornece um benefício para os países. Sobre o sistema geral de preferências, há problemas. Os países desenvolvidos escolhem os produtos e critérios dos benefícios. Pode-se ter uma questão política grave. Inclusive, o SGP da União Europeia já foi questionado no órgão de solução de controvérsias da OMC. No sistema europeu, havia uma classificação dos próprios países em desenvolvimento. Países que não produzissem armas teriam benefícios maiores. Assim, estimulam-se os países em desenvolvimento a terem políticas que os países desenvolvidos acreditam ser mais adequadas. O mesmo vale para o SGP americano e os direitos de propriedade intelectual. Há propostas de modificação desse sistema. Ele é importante para beneficiar os países em desenvolvimento, mas não pode ser apenas mais uma forma de esses países imporem essas políticas aos países em desenvolvimento. Não há uma via de mão-dupla (os países em desenvolvimento não precisam dar nenhuma contrapartida), mas há um instrumento de controle. A UNCTAD criou uma lista de 50 países com menor desenvolvimento relativo (duty free, quota free). Entendeu-se que há uma liberalização completa para esses países. Foram convidados países desenvolvidos e em desenvolvimento para assinarem essa lista. A cláusula habilitante também permite acordos de livre-comércio entre países em desenvolvimento que não precisam chegar a um critério substancial de todo o comércio entre os países. Em outras palavras, o MERCOSUL pode fazer um acordo com o México que não abranja 80% dos produtos. Pode ser apenas para o setor automobilístico. O problema é que os países em desenvolvimento poderiam fazer acordos, entre si, com poucas listas tarifadas. Mesmo assim, os países em desenvolvimento ainda defendem essa cláusula, porque não podem concorrer à altura dos desenvolvidos. Isso gera uma polêmica com os países emergentes (Brasil, Índia, China e Rússia). Eles já possuiriam condições de entrar de igual para igual nos mercados dos países desenvolvidos, de tal sorte que eles se beneficiariam ainda mais das regras, prejudicando a essência do sistema multilateral de comércio da cláusula da nação mais favorecida. A rodada Doha é a atual rodada de negociação na OMC. Tem um aspecto desenvolvimentista, porque esses países ainda entendem que não há auxílio à promoção de desenvolvimento. Os acordos regionais de comércio deveriam levar em consideração os aspectos desenvolvimentistas e os acordos regionais (mandado negociador da Rodada Doha, parágrafo 29). Os acordos regionais voltam a ser negociados na rodada Doha porque, não só houve a proliferação de acordos regionais, como cada um tem regras próprias. Os países devem conhecer os outros acordos regionais (transparência), de forma a evitar barreiras. Assim, deveria haver a notificação dos acordos, deveria haver relatórios subseqüentes, com suporte técnico para os países em desenvolvimento e submissão das informações pelas partes do Acordo Regional de Comércio. Evita-se o problema do desconhecimento dos acordos. No começo da OMC, entendeu-se que a exceção ao art. 24 permitiria aos países se unirem num processo de homogeneização. Porém, não se previu a proliferação de acordos regionais. Hoje em dia, quase 50% do comércio entre países decorre dessa exceção à cláusula da nação mais favorecida. Há muitas críticas a esse processo. Embora a finalidade seja nobre, há um emaranhado de acordos que dificultam a compreensão do comércio internacional. Houve o maior número de entraves e barreiras técnicas. É o chamado fenômeno do “Spaghetti Bowl”. Existem muitos acordos. Alguns criam acordos entre eles mesmos - em outras palavras, a União Europeia faz um Acordo com o MERCOSUL. Isso é complicado porque cada acordo tem suas regras de origem próprias. Essas regras de origem próprias determinam quanto do produto deve ser produzido no país que faz parte do acordo. Cada acordo estabelece que produto pode entrar com degravação tarifária em seu âmbito. Torna-se difícil saber as regras para exportar a um país, tendo em vista acordos com outros países. Esse emaranhado de acordos também contribui para que se saltem as barreiras. Assim, o Brasil exporta o etanol para os países do Caribe, que possuem um acordo com os EUA. Os países do Caribe acrescentam água e exportam para os EUA sem tarifa. Ao contrário, a relação Brasil-EUA possui tarifas mais altas. A situação se torna mais problemática se, por exemplo, verificarmos a relação entre Ásia e América. A tendência, com acordos em negociação, é do aumento desse emaranhado de acordos. Esse seria o futuro. O que acontece atualmente é uma busca desenfreada por acordos regionais. A monitora não é contra acordos regionais per si. Seriam importantes para aprofundar regras que não são instituídas no âmbito da OMC. É uma espécie de “laboratório” para verificar se as regras dão certo e podem ser levadas ao sistema multilateral. Porém, em excesso, podem minar as preferências acordadas no sistema multilateral de comércio. Por isso, há um interesse grande em fechar a rodada Doha de negociações. A partir do momento em que for fechada, a própria rodada já fará previsão da liberalização entre os países. A comparação entre o número de acordos em 2006 e em 2011 demonstra a diferença. Países que participavam de 5 acordos passam a participar de 25, 30 acordos. Prática do Comércio Exterior Qual a relevância prática dessa discussão? Há uma importância, nem que seja para entender os processos de integração e a tomada de decisão nos blocos.Também há importância para o advogado de uma empresa. Há a necessidade de se conhecer regras de comércio exterior para se trabalhar. Se um produto brasileiro será exportado para os EUA, é necessário conhecer a tarifa que os americanos impõem ao produto brasileiro. Também é importante saber se há um SGP para o Brasil. Neste momento, o Brasil saiu do SGP americano, pois os EUA entendem que nosso país já está num grau superior de desenvolvimento. Há um grande problema nas regras de origem. Cada acordo regional possui uma regra de origem própria, podendo ser considerado um verdadeiro entrave no âmbito da OMC (bibliografia: Vera Torsten). Outra preocupação diz respeito à Tarifa Externa Comum. Em teoria, ela não poderia ter exceções, pois é acordado que há uma tarifa comum perante terceiros. As exceções, porém, existem. No âmbito do Mercosul, já representam 32% do comércio da região. No âmbito do Mercosul existe também a concessão de Ex-Tarifário. É a possibilidade de importação de produtos de outros países em desrespeito à Tarifa Externa Comum (com alíquota zero). Bastaria uma requisição ao Ministério de Desenvolvimento e Comércio do Brasil, requisitando a importação de uma máquina com tarifa zero, em detrimento de uma tarifa externa comum, por conta da importância e da especificidade do produto. Um problema de participar do acordo de livre-comércio, então, é a necessidade de negociação no âmbito do acordo para a celebração de outros acordos. O Chile, por outro lado, pode fazer acordos livremente. Há também a complexa questão da adesão de novos membros a um Acordo Regional. Um exemplo é a União Europeia. Sem os países do leste, havia uma harmonia muito boa. No entanto, entre 2004 e 2005 houve uma grande expansão. Normalmente, os países entram com uma flexibilidade até alcançarem o mesmo patamar. Há um viés político muito grande. Um exemplo é a entrada da Venezuela no Mercosul. O país possui posições conflitantes com outros países. O que isso poderia acarretar para os países do Mercosul? Poderia diminuir ainda mais a possibilidade de os países do Mercosul fazerem acordos com outros países. Um exemplo é a UE, que não faria acordo com o Mercosul por conta disso. Além disso, há uma discussão sobre os deveres desses países que ingressam no bloco, que seriam mais flexíveis do que os deveres dos membros. Políticas de imigração também podem ser problemáticas. 29.03 - Fundamentos legais dos acordos regionais Economistas criaram uma gradação: Zona de livre comércio, União Aduaneira, Mercado Comum (livre circulação de mercadorias, serviços, capital e trabalho). Funcionavam bem na década de 50, mas verificamos que, na prática, os processos de integração não tinham necessariamente o objetivo de fazer essa transição. Ainda há muito esse tipo de visão. O professor menciona Editorial do Estadão sobre os 20 anos de MERCOSUL: Passados 20 anos desde a assinatura do tratado assunção, que criou o MERCOSUL, ele é uma arremedo do que poderia ter sido o do que se esperava que fosse. Na forma, alcançou a forma de União Aduaneira, uma etapa do Mercado Comum, de livre circulação de pessoas, serviços e bens. Em primeiro lugar, não é correto falar que se trata de etapa. Em segundo lugar, coloca o Mercosul como já tendo implementado a livre circulação de mercadorias e serviços. Isso não é verdade. Há exceções ainda sujeitas a impostos de importação (exceções à própria zona de livre comércio). A livre circulação de serviços é algo que está muito longe de poder ser alcançada. A livre circulação não é apenas a exclusão de barreiras tarifárias e não-tarifárias, mas a eliminação de barreiras normativas também, com legislações comuns que permitam a pessoas de outros países prestarem serviços livremente nos parceiros. Portanto, há confusão quanto às etapas - se se passa de uma União Aduaneira para um Mercado Comum, a Zona de Livre Comércio deveria estar completa, e não está - e uma confusão quanto à definição. Percebe-se que o conceito de Zona de Livre Comércio se alterou. É o exemplo do NAFTA, com liberação do comércio de bens e uma restrita liberação da circulação de serviços. Mesmo a União Europeia, que se diz ter atingido o grau de mercado comum, não ocorre a livre circulação de serviços. Se um francês quiser ir para a Itália, ficar algum tempo lá, prestando serviços jurídicos, de arquitetura, ele encontrará uma enormidade de barreiras normativas (ex. exigência de um treinamento específico). Por isso, o professor não fala em etapas, mas em categorias. A categoria “zona de livre comércio” significa um espaço em que circulariam livremente mercadorias industrializadas, semi- industrializadas, agrícolas e serviços. O NAFTA seria uma zona de livre comércio ampliada, por tratar também de propriedade intelectual, concorrência, investimentos, etc. Eram temas que não eram imaginados nas décadas de 50 e 60. Com o aumento da complexidade de temas a serem regulamentados dentro desses espaços, sejam eles zonas de livre comércio, uniões aduaneiras ou mercados comuns, fica patente a utilização do conceito de categorias. Há uma mudança de paradigma: não há uma formalização, pois no art. XXIV deveríamos ter apenas zona de livre comércio (num conceito tradicional e ultrapassado) e união aduaneira. Em face do aumento de temas (serviços, investimentos, concorrências, propriedade intelectual), há a necessidade de se buscar um fundamento que não esteja no art. XXIV. São Free Trade Areas, acordos bilaterais que se formam para que seja constituída uma zona de livre comércio que teriam como fundamento legal o art. XXIV do GATT/OMC. Esses acordos possuem muito mais do que prevê a definição de zona de livre comércio do art. XXIV do GATT. Assim, a releitura do art. XXIV não foi completa, na Rodada Uruguai. Essas Free Trade Areas têm temas como propriedade intelectual, investimentos, relação entre comércio e meio ambiente, etc. Como resultado, não se pode afirmar com certeza que uma união aduaneira seja mais abrangente que uma zona de livre comércio. É o caso do Mercosul, que não tem regras de concorrência, propriedade intelectual, etc., mas pretende ser uma união aduaneira, em relação ao NAFTA, que é área de livre comércio, mas envolve mais temas. O GATT tratou exclusivamente do comércio de bens. Os acordos (sobre o comércio de serviços e sobre propriedade intelectual) que foram assinados na Rodada Uruguai, em complemento ao GATT, ampliaram a complexidade dessa integração. Se tínhamos que dar o fundamento legal para a assinatura de tratados cujo objetivo era estabelecer uma zona de livre comércio ou uma união aduaneira sobre comércio de bens, a partir do momento em que os itens são ampliados, devemos prever também a possibilidade de que dentro desses acordos se estabeleçam mecanismos para o comércio de serviços, em exceção à cláusula da nação mais favorecida. Portanto, há a necessidade de um novo fundamento legal para essa exceção. É o art. 5º do GATS, que se torna uma exceção para os serviços. O processo de remoção de barreiras legislativas, normativas, que é o que constitui a liberalização do comércio de serviços, pode ocorrer dentro dessas free trade areas, sem que essa liberalização se estenda a outros países que não componham esse acordo. É semelhante ao art. XXIV do GATT/OMC, que estabelece a possibilidade de acordos regionais para a liberalização de comércio de bens. Assim, há a possibilidade de acordos regionais sobre comércios de serviços para a liberalização desse setor. Por não serem materiais, há uma necessidade de regras diferentes para regular esse comércio (ex. dinheiro é pago por meio de remessa e o serviço pode ser feito sem sair de casa). A lógica, então, não é de imposto de importação, mas de barreiras legais para a prestação dos serviços. O acordo de comércio e serviços foi incorporado à OMC, mas não era imaginado ao tempo do GATT-47. Claramente os acordos para Zona de Livre Comércio e União Aduaneira não tinham um fundamentolegal para desenvolver em seu bojo um processo de liberação de serviços. O fundamento legal, portanto, é o art. 5º do GATS (acordo sobre serviços no âmbito da OMC). Outro fundamento diz respeito ao princípio da não-discriminação, do qual esse artigo é exceção. Por fim, também existe a cláusula habilitante. Os países podem fazer acordos discriminatórios, mas submetidos a certos padrões (envolver todos os produtos que dizem respeito àquele acordo). Devem ser respeitados os fundamentos legais para tanto. Os países em desenvolvimento não se sentiam confortáveis com essas restrições, principalmente quando eram feitos com países mais desenvolvidos. Assim, desejavam fazer uma liberalização restrita, que não dissesse respeito a todos os bens, por exemplo. Desejavam a flexibilização do art. XXIV e a possibilidade de celebrar acordos com países em desenvolvimento ou, se fossem países desenvolvidos, acordos restritos. O GATT não era o modelo que os interessava. Houve discussões no âmbito da UNCTAD, o que gerou o sistema geral de preferências (SGP). O país desenvolvido poderia outorgar preferências (eliminação do imposto de importação, por exemplo) sem qualquer contrapartida. Há uma clara discriminação entre os países em desenvolvimento. A segunda brecha, que também é decorrente das discussões da CEPAL e da UNCTAD, dizia respeito à cláusula de habilitação: integração entre os países em desenvolvimento sem a adoção das regras rígidas do art. XXIV. A ALALC e a ALADI, por exemplo, possuem níveis de desenvolvimento dentro dos próprios acordos, e os países são tratados diferentemente dentro do próprio âmbito regional. Não há necessidade de abertura de todos os produtos, respeitando-se o grau de desenvolvimento dos países. Assim, são fundamentos legais para os acordos regionais: art. XXIV do GATT, cláusula de habilitação e art. 5º do GATS. Devemos saber claramente que, por conta, não só da existência de dois fundamentos legais que foram acrescidos ao art. XXIV, mas da complexidade de temas, tivemos uma alteração no que se chamava de etapas de integração, chegando ao que o professor chama de “categorias de integração”, que são muito diferentes das categorias do passado. O fundamental é estabelecer a relação entre o regional e o multilateral.5 Como os acordos regionais são filhotes, como eles se constituem como tal? Há os fundamentos legais da matriz, e a matriz deve ser notificada da constituição de um acordo. Esse acordo é discriminatório em relação à matriz (concessões de bens e serviços apenas para quem integra os acordos). Todo e qualquer acordo regional deve ser notificado, em função desse vínculo formal. Hoje temos: - Free Trade Agreement: é a maioria, as zonas de livre comércio - Customs Union: são as uniões aduaneiras - Economic Integration Agreement: título do art. 5º do GATS - Preferencial Trade Agreement: A notificação deve conter as partes do acordo, o objeto do acordo (bens ou serviços), o fundamento legal no sistema GATT/OMC e o tipo de integração. Ex.: Acordo entre Egito e Turquia, em março de 2007, sob a forma de Free Trade Area, entre dois países em desenvolvimento (autodenominados assim), criou uma zona de livre comércio para liberalizar o comércio de bens. O fundamento foi a cláusula de habilitação, ou seja, dentro dessa zona de livre comércio, não há o comprometimento sobre a liberalização de todo o comércio. Ex2.: Mercosur: no início, foi notificado como liberalização do comércio de bens, como União Aduaneira (Custom Union) e sob o fundamento da cláusula de habilitação.6 Em 2005, entrou em vigor o protocolo de serviços do Mercosur. Como resultado, notificou-se a OMC uma segunda vez (2006), afirmando que se estava criando um acordo regional de serviços. Uma vez notificado, deve haver a aprovação da OMC. O GATT nunca teve um Comitê de Acordos Regionais para analisar os acordos, mas a OMC criou. Por pressões políticos, nunca funcionou. O enfoque atual se alterou: busca-se a transparência. A OMC investiga se não há discriminação excessiva. Contudo, há muitos acordos discriminatórios. Há várias razões pelas quais a OMC não consegue cumprir com êxito sua tarefa, principalmente, as pressões políticas. Essas notificações são numerosas e, principalmente nos últimos 10, 15 anos, ocorrem de maneira desenfreada. Em 1947, a ideia era permitir a formação de acordos de forma bastante restritiva (zona de livre comércio e união aduaneira). Imaginava-se que seria muito difícil mesmo a formação de uma zona de livre comércio. Jade Baguat (???), um economista liberal, afirma que esses 5 Pergunta de prova. 6 Não se sabe até hoje se poderia haver a notificação como “cláusula de habilitação”, ou se deveria a citação como art. XXIV do GATT. acordos são “cupins” no sistema multilateral. Criaram-se tantas regras que a essência do sistema multilateral (conhecimento de regras aplicáveis a todos) ficou comprometida. O conceito de regional foi alterado, passando a abranger regiões do mundo diferentes. Não houve chance de se alterar a nomenclatura. Para Baguat, essa situação de Spaghetti Bowl não deixa de macular o sistema multilateral. Há uma fragmentação normativa muito grande do direito internacional. Indaga-se: e se os “cupins” tiverem êxito? E se eles minarem o sistema multilateral em suas bases? Outro grande problema é que eles agregam e acrescentam normas. São as OMC+ (WTO plus) normas de serviços e propriedade intelectual. São plus porque reproduzem os TRIPs, mas vão além e acrescentam outros itens que não estão regrados na OMC. São OMC extra (WTO extra). Para Baguat, é impossível impedir a celebração desses acordos regionais sem comprometer as bases do sistema multilateral. A reflexão é a seguinte: o que fazer agora? E qual é o papel do Brasil? Como fica o Mercosul, que proíbe a assinatura desses acordos separadamente? Para o professor, é necessário “apostar as fichas” no sistema multilateral. 5.4 - Aladi e Mercosul Devemos conhecer, antes de tudo, os antecedentes do Mercosul. É importante fazer a relação entre os fenômenos, sabendo localizar as origens, as razões políticas e econômicas que fundamentalmente dão as razões jurídicas. Tivemos, nas décadas de 50 e 60, o surgimento de algumas idéias sobre integração, como a tentativa de sistematização das “etapas de integração” (zona de livre comércio, união aduaneira, mercado comum, integração monetária, etc.). Vimos também que houve alguns contrapontos aos dispositivos do GATT, ou pelo menos a maneira pela qual as negociações vinham sendo realizadas. São contrapontos provenientes, sobretudo, da América Latina (CEPAL). Diversos estudos foram feitos, encontrando respaldo na conferência das nações unidas para comércio e desenvolvimento (UNCTAD), o que levou à modificação do GATT e a introdução do capítulo IV, sobre comércio e desenvolvimento. Depois disso, tivemos na Rodada Uruguai, a criação da cláusula de habilitação. Essa cláusula permite que países em desenvolvimento adotem, em seus esquemas regionais e subregionais de integração, algumas flexibilidades. Ela foi adotada apenas em 1979. O cenário das origens do Mercosul é posterior à criação das Comunidades Europeias, mas anterior a 1979. Por força de algumas discussões ocorridas no âmbito da CEPAL, discutiu-se a necessidade da criação de um processo de integração na América do Sul. Assim como havia sido criada a Comunidade Econômica Europeia, 1957, pensou-se a necessidade de que, principalmente os países da América do Sul, criassem um processo de integração. A ideia de se criar um espaço de integração que envolvesse os 10 países da América do Sul, mais o México, surge nesse momento. Em 1960, foi assinado o Tratado de Montevidéu, que criou a Associação Latino-americana para uma área de livre-comércio (ALALC). O que temos na ALALC? Em primeiro lugar, o nome é revelador do seu objetivo: a criação de uma zona de livre-comércio. Issoreproduz o pensamento de Bela Balassa, que já tinha uma definição sobre o que era uma zona de livre-comércio (mecanismos de progressiva liberalização do comércio de bens). Em 10 anos, estabeleceu-se um prazo para a criação da zona de livre-comércio. Tudo o que era mais retórico em termos de objetivos estava nos consideranda desse tratado de 1960. Quais os mecanismos para se atingir essa área de livre-comércio em 10 anos? A ALALC foi uma exceção permitida ao GATT. A data era 1960 e tínhamos apenas um fundamento legal para a constituição desses acordos regionais, em exceção ao art. 1º. O tratado da ALALC, então, foi constituído como exceção à cláusula de nação mais favorecida, a partir do art. XXIV. Em se baseando no art. XXIV, a ALALC possui os mecanismos permitidos por ele (formação de zona de livre-comércio ou união aduaneira). O que se almeja na constituição de uma zona de livre-comércio é a remoção de todas as barreiras tarifárias sobre todos os produtos que transitam numa determinada região. A ALALC teve que reproduzir as regras do art. XXIV do GATT. Não havia clareza de que os acordos regionais deveriam ser notificados ao sistema multilateral, mas é evidente que o Tratado de Montevidéu foi notificado ao GATT. Os mecanismos previstos no art. XXIV são: - progressiva liberalização - prazo de 10 anos para a eliminação total das barreiras tarifárias Se observarmos os mecanismos do tratado, verificamos uma contradição. De um lado, há um prazo para que, em 10 anos, se crie uma zona de livre-comércio. De outro, há mecanismos de desgravação tarifária. Quando comparamos esses mecanismos com aqueles próprios do sistema GATT (corte linear das tarifas a partir de todo o universo de produtos existentes), verificamos que há uma dificuldade em se fazer negociações produto por produto. Não havia violação às regras do GATT, porque havia a proposta de remoção das barreiras tarifárias em 10 anos. O processo, porém, não seria feito a partir de um corte linear das tarifas. A negociação seria feita produto por produto. Ex.: Brasil e Argentina: resolvem reduzir tarifas na área de equipamentos. Dentre os bens de capital, negocia-se a alíquota de importação dos tratores. Chega-se a um acordo. Como dentro da zona de livre-comércio, é preciso estender essa vantagem aos outros países (cláusula de nação mais favorecida). É complicado alcançar algum acordo. Como era a primeira experiência na região, havia um objetivo de liberalização do comércio, mas o mecanismo de desgravação era muito conservador. Em segundo lugar, havia um fundado receio de que, já naquela época, as economias mais fortes (Argentina, México e Brasil) fossem as mais beneficiadas por essa conformação. Eram os países mais industrializados e detinham setores industrializados ou semi-industrializados com maior expressão. Já havia a percepção de certas assimetrias entre os países. Passamos de um discurso da ALALC e da ALADI para chegarmos à ação, no Mercosul. Há toda uma retórica de integração e livre-comércio na ALALC, mas o mecanismo já revela uma posição conservadora e receosa dos Estados. Quando vemos que eles desejavam atingir esse ponto em 10 anos, com aquele mecanismo, percebemos que é força de retórica, que seria impossível alcançar tal objetivo com um mecanismo tão conservador. O próprio desenrolar das negociações demonstrou que elas avançavam muito lentamente. Outra questão de suma importância: de um lado, os estudos da CEPAL exigiam a integração dos países latino-americanos (ALALC, p. ex.); de outro lado, uma das principais contribuições da CEPAL para as economias dos países latino-americanos foi a separação entre países de economia central e países de economia periférica, sustentando que os países da periferia suprem os países centralizados com matéria-prima e insumos. Os produtos industrializados contêm maior valor agregado. Essa relação de centro-periferia (dependência) tende a se agravar. O que seria preciso para mudar a condição de centro e periferia? Como eliminar a dependência? Para se aproximarem dos países centrais, os países periféricos teriam que mudar as relações de troca (insumos básicos por produtos com valor agregado). Isso seria feito por meio da substituição de importações. Cada um dos países deveria criar mecanismos de desenvolvimento e investimento, de forma a ele próprio criar indústrias estratégicas. Cada país, no lugar de continuar importando, deveria produzir, criar suas próprias indústrias. Nesse contexto, temos a celebração do Tratado de Montevidéu (1960). A contradição latente entre a criação de uma zona de livre-comércio e uma política de substituição de importados, que era latente, fica clara. A zona de livre-comércio pressupõe a eliminação de barreiras; de outro, a política de substituição de importados impõe a criação de barreiras. Não foram todos os países que conseguiram efetivar uma política de substituição de importações. Brasil, Argentina e México foram bem sucedidos nesse processo. Em 1960, por exemplo, instala-se o parque industrial automobilístico no Brasil. Percebe-se uma grande contradição entre uma ALALC que lutava pela liberalização das importações e países que viviam um momento contrário de diminuição das importações e de produção local, no sentido de diminuir a dependência. As desconfianças que existiam aos três grandes países da América-latina, um mecanismo de desgravação tarifária bastante conservador e a ideia de substituição de importações, tudo isso serviu para minar a força da ALALC. Mesmo com todas essas limitações, a ALALC conseguiu aumentar o comércio dentro da região. Depois, porém, entrou num período de total estagnação. Verificou-se que, mesmo nesse período em que houve um aumento de comércio intrarregional, os grandes beneficiados foram justamente Brasil, Argentina e México. Não havia vontade política em se avançar para um prazo retoricamente estabelecido de criação de uma zona de livre-comércio. Não havia mecanismos de tratamento especial e diferenciado para países de menor desenvolvimento, por exemplo. Percebeu-se essa estagnação. Por outro lado, a integração econômica européia avançava com grandes dificuldades. Outros acordos regionais também tinham sido assinados. Persistia a ideia de integração regional, mas percebeu-se que os avanços nesse processo passariam necessariamente pelo reconhecimento das diferenças entre os países (Brasil, Argentina e México X Paraguai e Bolívia, p. ex.). Devemos reconhecer que esses países todos, de maneira mais ou menos bem sucedida, estão implantando políticas de substituição de importações. Evidentemente, os Estados investiam em determinados setores da economia para que se desenvolvessem. Não podemos pensar, como se fez na ALALC, numa desgravação de produto por produto. Porém, devemos respeitar a necessidade de proteção dos setores frágeis. O pensamento deve ser mais flexível. Eram as idéias que estavam sendo discutidas no final da década de 70. Seria necessária a existência de mecanismos mais flexíveis, com um processo de integração que liberasse o comércio em conciliação com a substituição de importações. Seria necessário reconhecer que não seria possível um tratamento igual a todos. Eram idéias discutidas não só no âmbito da ALALC, como também na CEPAL, com ressonância na UNCTAD e, finalmente, incorporação pelo GATT. Em 1979, temos a adoção de uma resolução pelo GATT que vem de encontro a isso (cláusula de habilitação: reconhecimento de que existem assimetrias). Os países menos desenvolvidos deveriam ser tratados diferentemente (special and different treatment). Nesse cenário, e com esses elementos, com o amadurecimento da ideia de mudança do processo subregional na América do Sul, a ALALC, que tinha fundamento legal no art. XXIV do GATT, dava lugar para outra forma de integração. O Tratado de Montevidéu de 1960 foi revogado, assinando-se um novo Tratado de Montevidéu (1980) criando a ALADI (Associação Latino-americana de integração). Logono nome já há uma alteração: o objetivo da ALADI é criar um espaço de integração, de forma livre em relação às amarras do art. XXIV do GATT. Não há a necessidade de se criar uma zona de livre-comércio em um determinado prazo. Não estabeleceram metas que sabiam que não seriam cumpridas. Isso não seria necessário. Seria uma integração do possível, e o que não fosse possível não envolveria problemas: a complexidade, em relação ao arranjo institucional, envolvia inclusive os mecanismos de liberalização. Essa flexibilidade que permeia o tratado da ALADI tem como fundamento jurídico a cláusula de habilitação. Não era exigência a criação de uma zona de livre-comércio, sendo mais importante a liberdade para a integração. Era uma integração entre países em desenvolvimento, e cláusula de habilitação permitia a formação de acordos desses países entre si, sem a necessidade de abertura das fronteiras para todos os produtos. Dentro do próprio acordo, não seria necessária a aplicação automática da cláusula de nação mais favorecida. Não há o objetivo declarado da zona de livre- comércio. De um lado, seria possível que, num processo de negociação para abertura de fronteiras entre países menores, que as concessões trocadas entre eles não fossem estendidas aos maiores, porque seriam países de menor desenvolvimento econômico relativo. Deveria haver uma coordenação melhor entre os países, aliada a uma atenção especial a esses países. Haveria uma integração mais afinada com o grau de desenvolvimento intrínseco e as políticas de desenvolvimento interno de cada um, encontrando respaldo na cláusula de habilitação. É importante fazer essa associação da ALADI com o contexto da cláusula de habilitação e com o contexto da América Latina. Ela reproduz a palavra que sintetiza a cláusula de habilitação: “flexibilidade”. Ela prevê um tratamento especial e diferenciado aos países com menor desenvolvimento econômico relativo (Bolívia, Paraguai, Equador). O Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, faz remissão ao preâmbulo do Tratado de Montevidéu que criou a ALADI. Fala-se do desenvolvimento progressivo com vistas à integração. O que melhor caracteriza a flexibilização da ALADI é o seu art. 7º. Os acordos de alcance parcial envolvem apenas alguns países membros, não abrangendo a todos. Cria-se um processo de integração regional através da progressiva multilateralização. Os acordos de alcance parcial, no âmbito da ALADI, representam uma exceção à cláusula de nação mais favorecida dentro da própria ALADI. Diferencia-se, portanto, da ALALC. Os países membros da ALADI podem realizar acordos com um ou dois, e essas trocas específicas para alguns setores envolvem um desenvolvimento em comum aos países, não apenas a redução de impostos de importação (acordos de complementação econômica). Esses acordos têm alcance parcial, ou seja, as condições só valem para aqueles que assinaram os acordos. A ALADI, que continua em vigor, tem, como seu maior repertório, vários acordos de complementação econômica (Brasil e México, Uruguai e Chile, etc.). Percebeu-se que seria mais interessante fazer acordos com abrangência regional. Há o princípio da convergência, que determina que, posteriormente, tais acordos serão estendidos para os outros membros (convergência dos acordos). Nesse âmbito, com fundamento legal no art. 7º do Tratado de Montevidéu, Uruguai, Argentina, Brasil e Paraguai comunicaram à ALADI a elaboração do Acordo Parcial nº 18, determinando a criação de um mercado comum que seria denominado MERCOSUL. Os quatro países, com base na ALADI, subscreveram um acordo de complementação econômica de alcance parcial. Surge o fundamento legal para a criação do MERCOSUL. O MERCOSUL notifica a ALADI sobre esse Acordo Parcial, que nada mais é do que o Tratado de Assunção. 26.4 - Mercosul A ALADI já continha elementos de flexibilização em relação aos mecanismos do GATT, enquadrando-se na cláusula de habilitação. Os mecanismos da ALADI foram possíveis porque ela é de 1980, um ano após a entrada em vigor da cláusula de habilitação. Essa flexibilização envolve, como um dos mecanismos mais emblemáticos, os acordos de alcance parcial, que podem ser celebrados apenas entre alguns países, não entre todos. É flexibilização da cláusula de nação mais favorecida. A partir desses acordos de alcance parcial, chega-se aos acordos de complementação econômica, que possuem objetivos que vão além de um simples processo de liberalização comercial. Juntos, os dois instrumentos (acordo de complementação econômica e acordo de alcance parcial) valem apenas para quem fez o acordo. Há, assim, o surgimento do Mercosul, como já exposto em aula anterior. A questão não resolvida é se o Mercosul também teria como fundamento o art. XXIV do GATT, pois, ao se enquadrar como uma união aduaneira, ela recairia nesse artigo. Três casos do órgão de solução de controvérsias da OMC tangenciaram o assunto. O Mercosul, então, é uma exceção à própria ALADI. Algumas regras não se aplicarão às partes contratantes do GATT. O Mercosul surgiu como exceção à ALADI. Sua criação, pelo Tratado de Assunção, foi notificada à ALADI, que notificou o GATT. Essa relação é fundamental e deve ser bem compreendida: o Mercosul decorre de um mecanismo da ALADI. A composição inicial do Mercosul foi feita por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Hoje, como membros associados, podendo participar das negociações do Mercosul, mas sem direito a voto, temos a Venezuela7, Bolívia, Chile, Peru, Equador e Colômbia. Chile e Peru, por exemplo, possuem uma série de acordos bilaterais; Equador faz parte da ALBA. O problema é verificar que também há uma formação de um cipoal legislativo complicado na própria América do Sul. Em 1992, há a notificação da ALADI ao sistema GATT. Hoje, há um outro fundamento legal para o Mercosul - art. 5º do GATS. Em 2005, foi assinado o Protocolo de Buenos Aires, sobre liberalização de serviços dentro do Mercosul. Assim, como fundamentos legais, esquematicamente, temos: - Cláusula habilitante: por conta da flexibilização no sistema ALADI - Art. 5º do GATS: por conta do protocolo de serviços que procura liberalizar o comércio de serviços - duvidosamente, o art. XXIV do GATT: por ser uma união aduaneira, mesmo que incompleta O Mercosul chegou a ser analisado pelo Comitê de Comércio e Desenvolvimento da OMC, para verificar se ele se enquadrava na cláusula de habilitação. Sua análise não foi definitiva. O Comitê de Acordos Regionais está fazendo uma análise, ainda não finalizada. Assim, não há nada que comprometa os fundamentos legais acima mencionados. Em 1991, o Consenso de Washington havia acabado de ser assinado. Era um momento liberalizante e privatizante. Predominava a ideia da liberalização como um fim a ser alcançado e, portanto, não poderia ser diferente com o Mercosul. É a primeira fase do Mercosul, bem mais liberalizante. O bloco, porém, também inseria a questão do desenvolvimento, com a diminuição das assimetrias entre os próprios membros do bloco, principalmente em relação a Uruguai e Paraguai. Houve a criação posterior de alguns fundos (FOCEN), destinados a investimentos realizados nesses países. É uma segunda fase, ainda em curso, de enfoque no desenvolvimento. Há a questão da gradualidade (Bela Balassa) também no Mercosul. O Tratado de Assunção é claro em afirmar que, no prazo de 3 anos, os países consolidariam uma Zona de Livre Comércio para posteriormente formar uma União Aduaneira e depois um Mercado Comum. A Comunidade Europeia fornecia um contexto inspirador para o bloco. Pelo art. 1º, os Estados-partes estariam comprometidos a construir um Mercado Comum, reproduzindo os erros históricos de pensar que em tão pouco tempo seria possível construir um mercado comum. A União Europeia demorou mais de 30 anos para chegar a esse ponto (1957 - 7 O país está numa situação indefinida, porque optou ingressarcomo membro efetivo do Mercosul. Isso resultou num protocolo para alterar o Tratado de Assunção, que já foi ratificado por Brasil, Argentina e Uruguai, mas ainda pendente no Paraguai. 1992, com o Tratado de Maastricht). Hoje, temos uma união aduaneira imperfeita que está muito longe de chegar a esse ponto. Não há sinais que indiquem uma vontade política em chegar-se a essa etapa de livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos. O art. 1º indica, além da intenção de se fazer uma zona de livre comércio, serviços e fatores produtivos, a ideia de uma tarifa exterior comum e a coordenação de políticas macroeconômicas. Não há uma precisão de como isso será atingido, o que é esmiuçado pelos artigos seguintes, embora isso seja feito de forma mais retórica do que prática. O art. 5º dispõe que durante o período de transição para constituição do Mercado Comum, os principais instrumentos são: a) um Programa de Liberação (liberalização) Comercial, com reduções tarifárias progressivas, lineares e automáticas (zona de livre comércio), para chegar a 31 de dezembro de 1994 com tarifa zero, sem barreiras tarifárias e não tarifárias para toda a universalidade dos produtos; - contraponto: ainda hoje existem Listas de Exceções para a Zona de Livre Comércio, com produtos que não possuem alíquota zero (produtos sensíveis). É uma primeira constatação de que nem a Zona de Livre Comércio do Mercosul foi consolidada. Isso só ocorrerá quando os produtos e serviços estiverem livres de impostos de importação. Pelo menos 25% dos produtos, segundo o professor, não estariam livres de impostos. É o essencial do que os países produzem, sendo o volume mais efetivo do comércio. b) a Coordenação de Políticas Macroeconômicas c) uma Tarifa Externa Comum Em 1994, tínhamos um incremento extraordinário do comércio intrarregional, com redução das barreiras tarifárias e não-tarifárias. Não se chegou, porém, a uma Zona de Livre Comércio totalmente feita. Mesmo assim, havia a programação de uma reforma do Mercosul, concretizada pela assinatura do Protocolo de Ouro Preto. Muito embora não tenhamos consolidado a zona de livre comércio, avançamos. Como previsto no art. 5º, o Mercosul passou para uma segunda etapa, de união aduaneira. Isso exigiria um esforço muito maior de coordenação de política comercial. Seria necessária uma tarifa de imposto de importação única para todos os produtos de outros países. Isso é mais difícil. Exemplificativamente, o Brasil tem um setor de bens de capital forte, enquanto a Argentina precisa importar bens de capital para a sua indústria. De um lado, o Brasil não quer reduzir suas alíquotas de importação (respeitados os limites máximos da OMC); de outro, a Argentina deseja uma alíquota aplicada de zero ou próxima a zero, a fim de renovar seu parque industrial. Surgem listas de exceções à união aduaneira. Para se atingir essa coordenação, torna-se necessária uma institucionalização do bloco. O Protocolo de Ouro Preto foi importante por trazer mecanismos de cooperação e por, juridicamente, atribuir ao Mercosul a personalidade jurídica de Direito Internacional. Significa que pode praticar todos os atos necessários à realização de seus objetivos, ou seja, pode contrair direitos e obrigações. Assim, o Mercosul pode ser caracterizado como uma Organização Internacional. Qual a importância dessa caracterização? Para se avançar em matéria de política comercial, que exige uma política comercial comum, é necessário um avanço institucional. Modifica-se o tratado de assunção para que se reflita essa nova etapa. Passa-se para uma união aduaneira, que é uma etapa mais sofisticada de atuação e exige um arcabouço institucional mais sofisticado. A decisão por uma organização internacional tem as suas repercussões - p. ex. o Mercosul representa os Estados-membros, embora, na prática, isso não ocorra. O que decorre do fato de o Mercosul ter ganhado personalidade jurídica? A rigor, os tratados poderiam ser assinados apenas por um representante do Mercosul, embora, na prática, os Estados-membros assinem também. Em tese, isso conferiria autorização e legitimidade para que o Mercosul atuasse em nome de todos os países, mas ainda há necessidade de ratificação interna. O Mercosul pode negociar acordos comerciais em nome dos quatro, mas eles terão que assinar. Mesmo a negociação não é feita pelo Mercosul enquanto bloco. Normalmente, há uma composição de interesses, mas esse desprendimento fica claro em casos como a rodada Doha. É diferente do que ocorre, por exemplo, com a União Europeia, que negocia efetivamente em bloco. Em 2000, foi editada uma Decisão (32/2000) que, decorrendo do fato de o Mercosul ser uma organização internacional e uma união aduaneira, vedava aos entes do Mercosul a possibilidade de celebrar acordos isoladamente. O Mercosul é o responsável por impedir, por exemplo, que o Brasil celebre muitos acordos bilaterais. Segundo o professor, deveria haver, dentro do Mercosul, mecanismos de efetiva redistribuição de renda, de apoio a Uruguai e Paraguai, que ficam imobilizados por não poderem fazer acordos bilaterais. Por isso, criou-se o FOCEN, como um fundo financiador de projetos de desenvolvimento dos países menores. É uma concessão política para amenizar a insatisfação dos menores. A conseqüência da institucionalização e dessa decisão é a vedação a esses acordos comerciais separados, com exceção dos Acordos de Complementação Econômica (ACE) no âmbito da própria ALADI. Dentro da ALADI, os países podem, isoladamente, celebrar acordos comerciais, mas não no Mercosul, com outros países de fora do bloco. Juridicamente, então, cada um deles pode celebrar acordos dentro da ALADI (com países da ALADI), mas não fora, não com países de fora (EUA, p. ex.). A grande discussão no momento é o acordo econômico entre o Mercosul e a União Europeia. São negociações que começaram em 2004, foram interrompidas, e agora devem voltar com mais intensidade. Órgãos do Mercosul Os principais órgãos são o Conselho e o Grupo de Trabalho do Mercosul. No início, havia apenas uma Comissão Parlamentar Conjunta (embrião do atual Parlamento) e a Secretaria. O Protocolo de Olivos criou o Tribunal Permanente de Revisão e o Tribunal Administrativo Trabalhista. O Mercosul teve uma clara influência da Comunidade Europeia, mas, desde o início, verificamos essas influências nos objetivos. Existem muito mais diferenças do que semelhanças. Uma delas é que a opção européia foi atribuir aos órgãos institucionais um caráter supranacional. O que isso significa? O Mercosul é uma organização internacional de caráter intergovernamental, enquanto a União Europeia é uma organização internacional de caráter supranacional. É uma questão de intensidade de delegação de soberania. No caso da União Europeia, a delegação de soberania para a organização e para seus órgãos é muito mais intensa. Eles receberam uma parcela maior de soberania, sendo supranacionais porque os órgãos não representam os interesses dos Estados, mas os interesses da organização, com decisões vinculantes para os próprios Estados. A Comissão da União Europeia são funcionários da própria organização, que trabalham para ela e representam os interesses dessa organização. As decisões são tomadas tendo em vista os interesses da organização internacional. Eles não são representantes dos Estados-membros, mas representantes da organização. Assim, por exemplo, a competência do Tribunal de Justiça da União Europeia se sobrepõe à competência do Poder Judiciário de cada um dos Estados-membros em matéria comunitária. Competência intergovernamental, por sua vez, significou e significa uma menor intensidade de delegação de soberania. Por isso, o Mercosul, embora em tese represente os Estados, não assina os acordos por conta própria. A intensidade de soberania atribuída é menor, e os Estados-membros continuam defendendo seus interesses. A lógica jurídica não se confirma na prática,pois mesmo tendo sido criada a personalidade jurídica, os seus órgãos institucionais são intergovernamentais, pois os representantes são os de cada um dos Estados-membros. Não são interesses que se sobrepõem aos interesses dos Estados-membros. 03.05 - Mercosul e sua estrutura institucional Errata: a ALADI é uma organização internacional Os órgãos institucionais do Mercosul, responsáveis pelo funcionamento da organização, possuem características intergovernamentais. Os órgãos intergovernamentais têm como representantes os representantes de cada um dos Estados-membros do Mercosul, não representando os interesses da organização, mas aqueles de seus governos. Isso marca a diferença em relação à União Europeia, que tem órgãos supranacionais. O Mercosul é formado pelos seguintes órgãos: Conselho do Mercado Comum, Grupo do Mercosul, Comissão do Comércio, Comissão parlamentar e Parlamento, Secretaria, Tribunal Permanente de Revisão e Tribunal Administrativo Trabalhista. Conselho do Mercado Comum É o principal órgão, responsável pela condução política do processo de integração e pela tomada de decisões fundamentais para os compromissos assumidos no Tratado de Assunção. É composto pelos ministros exteriores e de economia de todos os países. Tem a função de exercer a titularidade da personalidade jurídica do Mercosul, podendo delegá-los para o órgão executivo da organização. Como se trata de um órgão político, seus atos normativos são chamados de “decisões”, atos que constituem o nível normativo mais elevado do Mercosul. Assim como as “resoluções”, possuem caráter vinculativo. Ex.: Decisão 32/00: é uma das mais importantes, tomada num momento em que se tentou uma renovação do Mercosul após a crise financeira do Brasil (1999) e da Argentina (2000-2001). Tentou- se demonstrar a coesão política do Mercosul, sustentando-se que a política econômica tendia cada vez mais à coesão. Pelo fato de ser uma organização internacional, dotada de personalidade jurídica, a decisão afirmou a necessidade de uma política externa comum (união aduaneira) e, no art. 1º, reafirmou o compromisso dos Estados-Partes8 em negociar, em conjunto, acordos regionais com outros países. No art. 2º, determina que, a partir de 2001, os Estados não poderiam celebrar novos acordos preferenciais isoladamente, mas sim enquanto Mercosul. É uma decisão política muito discutida hoje em dia, face à realidade do spaghetti bowl e do grande número de acordos bilaterais no cenário mundial. Na prática, existem muito mais divergências do que convergências. Uma das decorrências da crise financeira é a busca por acesso aos mercados. Na União Europeia, durante muito tempo o Conselho de Ministros, como órgão político, exerceu uma importante função. Hoje, divide sua atuação com o Parlamento. 8 Segundo o professor, em 2000 já eram Estados-membros. Grupo Mercado Comum É o órgão executivo, composto por 4 membros titulares e 4 membros alternos, de cada país, designados pelos respectivos governos, dentre os quais devem constar os representantes dos ministérios exteriores, ministérios da economia (ou equivalentes) e membros dos bancos centrais. Uma vez que eles são designados pelos governos, eles defendem os interesses de seus governos. Não são funcionários da organização em si. Ele pode implementar as decisões do Conselho por meio de “resoluções”, que também são vinculantes. Também é possível que, por delegação expressa do Conselho, o Grupo seja o responsável por negociar e assinar acordos em nome do Mercosul. Há uma discussão grande por conta do número reduzido de “resoluções” incorporadas aos ordenamentos jurídicos dos países-membros. Ao contrário da União Europeia, na qual há exigência de vinculação às normas comunitárias, no Mercosul as resoluções são tomadas por um órgão que reúne representantes dos próprios governos. Pela lógica, uma vez aceitas e determinadas por representantes dos próprios governos, tanto as decisões como as resoluções deveriam ser automaticamente incorporadas aos Estados (exceto algumas, que trazem políticas muito importantes e devem passar pelos Parlamentos). Foram os próprios países que decidiram, por meio de seus representantes, a partir de consenso (decisões unânimes). Porém, o que verificamos é um grande déficit de incorporação de resoluções e decisões ao ordenamento jurídico. Comissão Também é um órgão técnico, voltado a editar “diretrizes” sobre a administração da tarifa externa comum. Discutem-se os avanços e os retrocessos na Tarifa Externa Comum. Ex.: Brasil tem uma exceção à Tarifa Externa Comum para vinhos de sobremesa, aplicando uma alíquota máxima de 20%. Parlamento Foi criado em 2005, tendo como incumbência representar os povos do Mercosul. No ano de 2010, foi adotada uma decisão pelo Conselho (n. 28/10) propondo a regulamentação de eleições que estabeleçam o sufrágio universal para o Mercosul. Estabelece uma proporção na representatividade, de tal sorte que o Brasil indicaria por volta de 37 parlamentares e Argentina (26), Paraguai (18) e Uruguai (18) indicariam um número proporcional de representantes. A ideia é que, em 2014, além de votar para os cargos majoritários e do congresso, os brasileiros possam votar para escolher seus representantes no Parlamento do Mercosul. Na União Europeia, o Parlamento só adquiriu importância com o passar do tempo, havendo maior destaque para o Conselho de Ministros. Secretaria Representa os setores econômicos e se situa em Montevidéu. Tribunal Permanente de Revisão Objetivos do Mercosul O Mercosul tem como objetivos a liberalização comercial, com a queda das barreiras alfandegárias e não-alfandegárias. As exportações dos países da região e o comércio intrarregional cresceram expressivamente nos últimos anos. Associados com o comércio de bens existem dois outros importantes assuntos. O primeiro diz respeito ao tratamento dos investimentos estrangeiros. Recentemente, uma empresa chinesa se comprometeu a fazer um investimento de 12 bilhões de dólares para montar IPads, no Brasil. Em contrapartida, a empresa chinesa gostaria de diversas concessões, tributárias e não-tributárias. Muitas peças deverão ser importadas, mas o Brasil estabeleceu a necessidade de transferência de tecnologia e utilização de maior parte de componentes brasileiros. O Protocolo de Colônia (1994) dispõe sobre o tratamento dos investimentos no Mercosul, enquanto o Protocolo de Buenos Aires (1994) dispõe sobre o tratamento dos investimentos em relação a terceiros países. O Brasil foi o último a ratificar o Protocolo de Buenos Aires, que entrou em vigor na semana passada. O objetivo do Protocolo de Colônia é a harmonização das regras entre os países, enquanto o de Buenos Aires procura proteger investimentos de países não-membros do Mercosul. Há uma situação estranha, porque Paraguai e Uruguai possuem acordos bilaterais (não comerciais) sobre investimentos com vários países. O Brasil tem 15 BITs (Bilateral Investments Agreements), mas nenhum deles foi ratificado. Seria favorável para o Mercosul que as políticas fossem coesas nesse sentido. Dentro do próprio Mercosul, há também o Protocolo de Montevidéu sobre o comércio de serviços (1997, vigente desde 2005). Busca proporcionar a abertura do comércio de serviços. É uma lógica completamente diferente, sem a discussão sobre barreiras tarifárias ou não tarifárias. Não se trata da imposição de imposto de importação sobre serviços. É preciso que a legislação de um país permita que um profissional de outro país preste seus serviços. É a eliminação de barreiras normativas, que deveriam ocorrer com muito mais rapidez no âmbito do Mercosul. Estágio atual do Mercosul É uma “união aduaneira” incompleta, com várias exceções. No ano de 2010, o Conselho de Ministros apresentou e aprovou o Código Aduaneiro do Mercosul. Tem uma importância
Compartilhar