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1111 Artigo publicado na Isto É Negócios, em 1.4.2009. A aposta esperta da Mercedes A estratégia da montadora para lançar o charmoso Smart no Brasil e apagar de vez a sombra deixada pelo fracasso com o Classe A. Por Joaquim Castanheira e Cláudio Gatti "Você sempre está bem-vestido com o Smart. Com ele, pode ir ao McDonald's ou ao Fasano", Philipp Schiemer, vice-presidente da Mercedes. O executivo Philipp Schiemer, vice-presidente de vendas da subsidiária brasileira da Mercedes-Benz, gosta de citar um dado para impressionar seus interlocutores. Se metade da frota da cidade de São Paulo fosse composta por Smart, o minúsculo veículo produzido pela montadora, os congestionamentos da metrópole desapareceriam. Schiemer tem desfilado esses argumentos não por diletantismo, e sim por motivos essencialmente comerciais. A partir do dia 1º de abril (que não se perca pela data), o Smart começará a ser comercializado no Brasil, importado da única fábrica do veículo no mundo, localizada em Hambach, na França. Trata-se da chegada por aqui de um produto que, em dez anos de existência, já atingiu o status de um ícone do design industrial e da inovação. Com apenas 2,69 metros de comprimento (um metro a menos do que o menor carro do mercado brasileiro), o Smart possui só dois lugares - um para o motorista, outro para o passageiro. Não há banco traseiro e tampouco algo que possa ser chamado de porta-malas. O automóvel nem sequer tem estepe - se o pneu furar, um spray evita que ele esvazie. Para alguns, isso significa limitações ao uso do veículo em algumas situações, como viagens mais longas. Para Schiemer, trata-se das características típicas da categoria em que se encaixa o Smart: um veículo essencialmente urbano, ideal para uso em cidades com graves gargalos no trânsito e dificuldades de estacionamento. "Em São Paulo, a média de ocupação é de apenas 1,2 pessoa por carro. O Smart é ideal para essa situação", afirma Schiemer, um alemão que, apesar de seu 1,90 metro, entra com facilidade no automóvel. 2222 Com essa argumentação, Schiemer espera convencer os motoristas a desembolsarem algo entre R$ 57,9 mil e R$ 64,9 mil para comprar uma das duas versões do Smart: cupê e conversível. Espera também apagar a impressão deixada pelo tropeço com o Classe A, a primeira tentativa da empresa em trabalhar com carros pequenos no Brasil - experiência que durou menos de sete anos e deixou milhões de reais de prejuízo. Ao contrário do que fez com o Classe A, a Mercedes adotou uma estratégia cautelosa para o Smart. Nos cálculos da empresa, há algo entre 20 mil e 25 mil compradores potenciais desse modelo no Brasil, metade deles em São Paulo. São consumidores que já possuem dois ou mais carros, sendo um deles com valor superior a R$ 100 mil. O Smart, na visão de Schiemer, não competirá, portanto, com outros veículos, mas com alternativas de consumo voltadas para a satisfação pessoal, como viagens internacionais de alto nível, uma moto Harley Davidson ou uma joia para a mulher. A Mercedes pretende fisgar esse consumidor com outros argumentos, além do apelo "urbano". Ela destacará, por exemplo, o perfil ecológico do produto. Segundo a empresa, o Smart libera 116 gramas de CO2 por quilômetro rodado, enquanto a média no Brasil encontra-se em 400 gramas. Além disso, 100% do material utilizado em sua fabricação é reciclável. A questão é a seguinte: isso vende carro? O consultor André Beer trabalhou 50 anos na GM e conhece profundamente o comportamento do consumidor de automóveis no Brasil. Para ele, o impacto do discurso ecológico na decisão de compra é reduzido. "Todo mundo está preocupado com o meio ambiente", diz ele. "Mas o brasileiro ainda não tira um tostão a mais do bolso por um produto mais amigável com a natureza. A não ser que o discurso venha acompanhado de algum benefício financeiro para ele." É o caso do Smart. O consumo, de acordo com a Mercedes-Benz, atinge cerca de 15 quilômetros por litro de gasolina na cidade. Na estrada, esse número sobe para quase 25 quilômetros. Para Schiemer, o apelo emocional é fundamental na decisão de compra de um Smart. "As pesquisas na Europa mostram que o automóvel atrai pelo visual totalmente diferenciado", afirma ele. A silhueta em forma de cunha, a pintura bicolor e o desenho arrojado de faróis e acessórios lhe dão um aspecto esportivo, sem agressividade, "próximo do estilo 3333 clássico", nas palavras de Schiemer. "Você sempre está bem vestido com o Smart", afirma ele, usando uma linguagem tipicamente publicitária. "Com ele, pode ir ao McDonald's ou ao Fasano", diz, em referência ao badalado hotel-butique de São Paulo. Esse estilo remete a um "público de hábitos irreverentes", de acordo com os estudos da Mercedes. O marketing do veículo seguirá o mesmo conceito. Não haverá campanhas de massa. Canais de comunicação como o YouTube serão largamente utilizados. Ações de marketing de guerrilha, como a exposição do veículo em eventos voltados para o público jovem, também estão em pauta. A Mercedes estuda ainda o patrocínio de times de rúgbi. Rúgbi? Sim, rúgbi. "Há times desse esporte em várias cidades brasileiras. Seus jogadores são universitários, frequentam academias e locais da moda", diz Schiemer. "São os lugares onde queremos estar presentes." Fabricado em Hambach, França, o veículo vende 130 mil unidades por ano em várias partes do mundo. Nos EUA foram comercializados 25 mil carros. A previsão inicial era de 10 mil. É fácil perceber que os planos para o lançamento do Smart têm um forte tempero de cautela. A empresa prevê comercializar 500 unidades no primeiro ano. Antes de 2010, o veículo não será oferecido em outras cidades além de São Paulo. As metas de expansão geográfica e de vendas serão definidas apenas depois dos resultados dos primeiros meses. "Vamos testar o mercado", afirma Schiemer. "A decisão de vender o Smart no Brasil está tomada e é definitiva. Mas a velocidade com que faremos isso dependerá do desempenho inicial." Tanto cuidado tem origem naquele que foi o mais ambicioso projeto da Mercedes-Benz no mercado brasileiro de automóveis de passeio: o Classe A. Em 1998, a empresa inaugurou uma fábrica na cidade mineira de Juiz de Fora. Com capacidade para até 40 mil unidades em um turno, suas linhas de montagem colocariam no mercado o Classe A, o carro compacto da marca. O modelo, porém, não emplacou. "Houve um erro 4444 grave de gestão de marca", afirma o especialista José Roberto Martins, da Global Brands. "O Classe A se desvinculou da grife Mercedes. Ninguém compra um Mercedes motivado por economia." A capacidade ociosa nunca ficou abaixo dos 50% até que o modelo foi retirado do mercado e a fábrica abandonada. Com o Smart, a vinculação com a Mercedes será mínima. As vendas do simpático carrinho serão feitas em concessionárias exclusivas da marca. Num primeiro momento, a empresa abrirá apenas duas lojas, ambas em São Paulo - uma nos Jardins, bairro nobre da capital paulista, e outra na avenida Europa, tradicional corredor de revendas de automóveis de luxo. São espaços coerentes com o público a ser atingido. O consultor Beer, porém, deixa uma pergunta no ar. "E se o carro enguiça no Rio de Janeiro ou em Pernambuco?", questiona. "Quem vai consertá- lo?" A Mercedes afirma que haverá um serviço de atendimento 24 horas, batizado de SmartMove, e, com isso, pretende dar conta do recado. Disponível em: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/579_A+APOSTA+ESPERTA+DA+MERCEDES
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