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Rhyan Coelho Tutoria 04 – Mantendo o equilíbrio Objetivo 01 – Estudar a hipoglicemia (Causas, prevenção, tto [falar da DM1, incluindo esquemas], tto ambulatorial e hospitalar, cuidados com monitorização) ➔ Hipoglicemia em Diabéticos A hipoglicemia é a complicação mais frequente do tratamento do diabetes mellitus e pode ser fatal. Um risco aumentado em duas a três vezes para hipoglicemia grave ocorre em pacientes com DM1 ou DM2 submetidos a um controle glicêmico mais rígido. A hipoglicemia desencadeia vários mecanismos contrarreguladores, sendo os principais: (1) Supressão da secreção de insulina pelas células beta; (2) Estímulo da liberação de glucagon pelas células alfa, de epinefrina pela medula adrenal, bem como de cortisol pelo córtex adrenal e do hormônio de crescimento (GH) pela adeno-hipófise; (3) Liberação de norepinefrina pelos neurônios simpáticos pós-ganglionares e acetilcolina pelos neurônios pós- ganglionares simpáticos e parassimpáticos, além de outros neuropeptídios. A redução da secreção de insulina possibilita aumentar a produção hepática e renal de glicose, além de diminuir sua captação nos tecidos periféricos, especialmente os músculos esqueléticos. O glucagon tem papel fundamental nesse mecanismo, aumentando a glicogenólise hepática e favorecendo a gliconeogênese. A liberação de epinefrina resulta em maior produção hepática de glicose e diminuição da captação nos tecidos insulinossensíveis, além de ajudar na percepção dos sintomas hipoglicêmicos e contribuir para diminuição de secreção de insulina por mecanismo alfa-adrenérgico. Seu papel torna- se crítico quando a secreção de glucagon é insuficiente. Em DM tipo 1, evidentemente, não ocorre diminuição da secreção de insulina em resposta à hipoglicemia, uma vez que sua concentração circulante, causadora de hipoglicemia, depende da absorção da insulina administrada. Em contrapartida, eles tendem a desenvolver insuficiência autonômica, expressa precocemente pela perda da resposta esperada de aumento na secreção de glucagon na vigência de hipoglicemia. Após 5 anos de doença, a resposta de epinefrina, principal arma de defesa contra a hipoglicemia, mostra-se frequentemente atenuada, sendo seu limitar para sua liberação mais baixo do que em normais, especialmente após uma hipoglicemia prévia. Os mecanismos contrarreguladores em pessoas saudáveis são desencadeados de modo bastante reprodutível: (1) Glicemia (GL) < 85 mg/dL, redução da secreção de insulina; (2) GL < 70 mg/dL, aumento dos hormônios contrarreguladores; (3) GL < 55 mg/dL, aparecimento de sintomas; (4) GL < 3,5 mg/dL, disfunção cognitiva, convulsão e coma. A hipoglicemia costuma ser definida como qualquer valor de glicemia < 54 mg/dL. Entretanto, essa definição não é satisfatória, já que grande parte das hipoglicemias percebidas e tratadas no dia a dia não chegam a ser medidas ou registradas. Por essa razão, a ADA propôs classificar a hipoglicemia em: • Hiperglicemia grave: evento que requer assistência de outra pessoa para administração de carboidrato, glucagon ou glicose oral ou intravenosa. Implica neuroglicopenia suficiente para induzir Rhyan Coelho convulsão, alteração de comportamento ou coma. • Hipoglicemia sintomática documentada: evento com sintomas e glicemia < 70 mg/dL • Hipoglicemia assintomática (sem alarme): evento sem sintomas típicos de hipoglicemia, mas com glicemia < 70 mg/dL • Hipoglicemia sintomática provável: evento no qual os sintomas não são confirmados por medida de glicemia. Esses são eventos dificilmente quantificáveis em estudos clínicos • Hipoglicemia relativa: evento no qual o paciente diabético se apresenta com sintomas atribuídos à hipoglicemia, mas com glicemia medida > 70 mg/dL. Isso é observado quando o controle glicêmico é inadequado e ocorre uma queda acentuada e brusca da glicemia. Diversos fatores podem favorecer o aparecimento de hipoglicemia em diabéticos, mas, sem dúvida, o mais frequente é a omissão de refeições, seguida do uso de doses excessivas de insulina ou hipoglicemiantes orais e da ingestão alcoólica excessiva. Atividade física pode também favorecer o surgimento de hipoglicemias, sobretudo em pacientes tratados com insulina. Convém salientar, entretanto, que, muitas vezes, o fator causal da hipoglicemia pode não ser identificável. Diante do surgimento de hipoglicemias frequentes em um diabético tipo 1 que vinha apresentando um controle glicêmico satisfatório, deve-se investigar a possibilidade da coexistência de condições que impliquem menor necessidade diária de insulina, como, por exemplo, hipotireoidismo, doença de Addison, insuficiência renal ou síndrome de má absorção intestinal. No estudo The Diabetes Control and Complications Trial (DDCT), episódios hipoglicêmicos foram três vezes mais comuns em pacientes em insulinoterapia intensiva (três a quatro aplicações diárias) do que nos sob terapia convencional (uma a duas injeções/dia). Em pacientes tratados com insulina, hipoglicemias são frequentes durante a atividade física e podem ocorrer durante, logo após ou mesmo mais tardiamente (no período de 6 a 20 horas ou mesmo mais). Essas hipoglicemias podem ser assintomáticas e resultam de maior consumo de glicose muscular, maior absorção de insulina nos locais de aplicação, melhora da sensibilidade insulínica, bem como defeitos na contrarregulação. Hipoglicemias graves são mais frequentes em crianças diabéticas pequenas, em razão da dificuldade inerente à idade de identificar e combater a hipoglicemia precocemente. Além disso, muitas vezes elas recusam a alimentação, a despeito de já terem feito uso da dose habitual de insulina. Deve-se ter um cuidado especial com hipoglicemias em idosos diabéticos. A interação de muitas medicações, comumente usadas por idosos, associada algumas vezes à dificuldade de aceitação regular da dieta, pode predispor mais facilmente às hipoglicemias. Convém também salientar que diabéticos idosos podem ter sintomas atípicos de hipoglicemia ou ser menos sintomáticos do que os mais jovens. Assim, tem-se recomendado um controle glicêmico menos rígido nesses pacientes, nos quais valores de HbA1c < 8% ou mesmo < 8,5% podem ser uma meta aceitável. Essa conduta se aplica, sobretudo, aos pacientes com risco cardiovascular aumentado, nos quais as hipoglicemias podem ter um efeito mais deletério, àqueles com déficit cognitivo ou aos indivíduos submetidos à polifarmácia. Hipoglicemias graves podem favorecer a ocorrência de taquiarritmias e elevação da pressão arterial A utilização de análogos de insulina de ação lenta (Glargina, Detemir ou Degludeca) ou ultrarrápida (Lispro, Aspart e Glulisina) tem diminuído bastante o risco de hipoglicemias na prática clínica. Isso se deve ao fato de que eles se associam menos frequentemente à hipoglicemia do que as insulinas NPH ou Regular. Rhyan Coelho Os sinais e sintomas de hipoglicemia são inespecíficos; por isso, o diagnóstico deve, sempre que possível, ser confirmado por meio da glicemia capilar ou venosa. As manifestações da hipoglicemia podem ser divididas nas resultantes de neuroglicopenia, ou seja, insuficiente concentração de glicose para o funcionamento adequado do SNC, e as consequentes à estimulação do sistema nervoso autônomo • Sinais e sintomas neuroglicopênicos: São variáveis, exteriorizando-se, nos casos mais leves, por tonturas, cefaleia, parestesias, confusão mental e/ou distúrbios do comportamento. Nos casos mais graves, podem surgir convulsões, torpor e coma, o qual, raramente, pode ser fatal. Plena recuperação do SNC nem sempre ocorre se o tratamento for tardio. • Sinais e sintomas de hiperatividade autonômica: Podem ser adrenérgicos (taquicardia, palpitações, sudorese, tremores etc.) e parassimpáticos (náuseas, vômitos ou, mais comumente, sensação de fome). São os sintomas adrenérgicos quenormalmente alertam o paciente para a ocorrência de hipoglicemia. Com exceção da sudorese, a maioria dos sintomas simpáticos é mascarada pelos betabloqueadores, que, assim, devem ser usados com muita cautela em diabéticos tratados com insulina. Nem sempre o quadro autônomo precede os sintomas neuroglicopênicos • Complicações cardiovasculares: Hipoglicemias graves podem resultar em isquemia miocárdica recorrente e arritmias ventriculares. Além disso, a hipoglicemia inibe processos metabólicos miocárdicos e induz apoptose nos cardiomiócitos. Elevação da pressão arterial é uma complicação adicional da hipoglicemia • Hipoglicemia noturna: Hipoglicemia durante o sono é um dos principais temores dos pacientes submetidos à insulinoterapia. Ela pode ser assintomática ou se manifestar por pesadelos frequentes, sudorese noturna, cefaleia matinal ou, nos casos mais graves, coma. Hipoglicemia iatrogênica acontece com frequência durante o sono, especialmente quando a insulina de ação intermediária com pico é prescrita antes do jantar. As necessidades de insulina para manutenção de níveis glicêmicos normais são 20 a 30% mais baixas durante a madrugada, de modo que uma discreta hiperinsulinemia pode levar a uma hipoglicemia noturna grave em pacientes não bem controlados. • Efeito Somogyi: Hipoglicemia no meio da madrugada, seguida de hiperglicemia matinal de rebote (supostamente resultante da liberação dos hormônios contrarreguladores), caracteriza o chamado efeito Somogyi • Hiperglicemia sem sinais de alarme: A ocorrência de hipoglicemia sem sinais de alarme (hypoglycemic anawareness) foi descrita há mais de 50 anos em pacientes com DM1 e também em portadores de insulinoma. Esses pacientes toleram concentrações glicêmicas extremamente baixas sem apresentar os sintomas de alarme que tornam possível o reconhecimento do episódio hipoglicêmico. Esse fenômeno geralmente resulta de insuficiência autonômica, caracterizada por diminuição na resposta do sistema nervoso simpático e adrenomedular, o que ocasiona a redução dos sintomas neurogênicos que evidenciariam a neuroglicopenia. Pode acontecer em muitos pacientes tratados com insulina, sobretudo os diabéticos tipo 1. De fato, até 50% deles podem apresentar o problema, seja em função de uma deficiente liberação de hormônios contrarreguladores, seja por estarem submetidos a um controle muito rígido do diabetes. Atualmente, sabe-se que a hipoglicemia relacionada com a insuficiência autonômica (HAAF) não é necessariamente assintomática. De fato, há um amplo espectro de apresentação, desde a total ausência de alarme até a existência de sintomas discretos ou atípicos. Em uma forma mais perigosa, os pacientes desenvolvem neuroglicopenia grave sem nenhum sinal de alerta adrenérgico, fazendo com que fiquem sem condições de ingerir algum alimento ou pedir ajuda a terceiros, o que pode culminar em frequentes episódios de coma ou crises convulsivas. Acreditou-se que a HAAF fosse uma complicação permanente relacionada com a neuropatia autonômica. No entanto, está bem estabelecido que ela pode ser revertida se o paciente permanecer rigorosamente sem nenhum episódio de hipoglicemia por um período variável de algumas semanas a poucos meses. →Tratamento O melhor tratamento da hipoglicemia é sua prevenção. Os pacientes devem ser orientados a reconhecer os sinais hipoglicêmicos de alerta, assim como a evitar atitudes que possam predispor à hipoglicemia (omitir refeições, ingerir Rhyan Coelho bebidas alcoólicas em excesso, praticar exercícios em jejum etc.). Ademais, a insulina não deve ser aplicada em um local que será muito trabalhado durante a atividade física (p. ex., nas coxas, em um paciente que for correr ou pedalar), devido ao aumento da absorção da insulina a partir do tecido celular subcutâneo. Os diabéticos, sobretudo os em uso de insulina, devem carregar consigo algum tipo de identificação (p. ex., cartão ou bracelete), com nome, diagnóstico, medicação utilizada, telefone de contato, além do nome e telefone do médico. Isso poderá ser de muita utilidade, por exemplo, se o paciente apresentar uma hipoglicemia grave e for levado torporoso ou em coma a um serviço de emergência por pessoas que desconheçam o diagnóstico e/ou o tratamento a que ele está sendo submetido • Pacientes conscientes: Pacientes com sintomas de hipoglicemia e capazes de engolir devem ingerir comprimidos de glicose ou qualquer bebida ou comida contendo açúcar, exceto a frutose pura, que não atravessa a barreira hematencefálica. Se o paciente recusar o tratamento, em função de distúrbio de comportamento provocado pela hipoglicemia, deve ser medicado com glucagon (GlucaGen® HypoKit) IM ou SC. A dose recomendada é de 1 mg para adultos e 0,5 mg para crianças • Pacientes torporosos ou em estado de coma: Nessa situação, está contraindicada a administração de alimentos VO, devido ao risco de aspiração traqueobrônquica. O tratamento deve ser feito com 2 a 5 ampolas (20 a 50 mℓ) de glicose a 50%, rapidamente, IV. Se o paciente permanecer em coma, deve ser medicado com 200 mℓ de manitol a 20% IV. Em ambiente extra-hospitalar, um familiar ou amigo pode aplicar glucagon IM ou SC (1 mg para adultos e 0,5 mg para crianças), que, em geral, restaura a consciência ao paciente em 10 a 15 minutos. Esse procedimento é extremamente seguro, tendo como efeito colateral principal náuseas e, raramente, vômitos, que ocorrem 60 a 90 minutos após a injeção. Uma vez consciente, o paciente deverá ingerir um alimento que contenha açúcar. Se o glucagon não estiver disponível, pequenas quantidades de mel, xarope ou glicose em gel podem ser esfregadas na mucosa bucal do paciente. • Hipoglicemia assintomática: Pacientes com hipoglicemia assintomática por resposta autonômica defeituosa devem elevar os níveis de glicemia média a serem alcançados, reduzir a dose total diária de insulina, usar esquemas de múltiplas pequenas doses de insulina Regular (ou, de preferência, os análogos Aspart, Lispro ou Glulisina), aumentar o número de pequenos lanches durante o dia e incrementar a frequência de automonitoramento da glicemia. Esforços devem ser feitos para evitar hipoglicemias durante semanas ou meses, visando à reversão da adaptação do SNC. A troca das insulinas Regular e NPH pelos análogos de insulina de ação ultrarrápida (Aspart, Lispro ou Glulisina) e de ação lenta, respectivamente, é bastante útil visto que eles se acompanham de menor risco de hipoglicemia. O uso de determinados fármacos (p. ex., fluoxetina) pode favorecer o surgimento de hipoglicemias assintomáticas, devendo ser interrompido caso o problema ocorra. Pacientes com hipoglicemias assintomáticas, detectadas pela aferição de glicemias capilares entre as 2h e 3h da manhã, devem ser controlados com aumento da quantidade de alimentos ingeridos à hora de deitar e/ou com a redução da dose da insulina noturna • Hipoglicemia grave induzida por fármacos: Se o paciente apresentar hipoglicemia importante ou coma, devido ao uso de sulfonilureias de efeito hipoglicêmico prolongado (clorpropamida ou glibenclamida), ou altas doses de insulina de ação longa ou intermediária, deverá ser hospitalizado para tratamento com infusão contínua de glicose e cuidadoso monitoramento da glicemia. Em pacientes com insuficiência renal, a hipoglicemia pode ser prolongada, necessitando internação hospitalar, reidratação e uso de soluções glicosadas a 10% IV. • Hipoglicemia em pacientes em uso de acarbose: Nos pacientes em uso de acarbose isolada ou combinada a sulfonilureias ou insulina, as hipoglicemias devem ser tratadas com comprimidos de glicose ou glucagon IM, uma vez que acarbose retarda a absorção de carboidratos. O uso de alimentos contendo açúcar (sacarose) pode não ser útil, uma vez que a absorção intestinal de glicose a partir dos polissacarídeos, oligossacarídeos e dissacarídeos está prejudicada, em razãoda inibição competitiva da alfaglicosidase pela acarbose. Rhyan Coelho ➔ Hipoglicemia em pacientes não diabéticos Para que se estabeleça o diagnóstico de hipoglicemia, é necessária a presença da tríade de Whipple, que consiste em níveis glicêmicos baixos (< 45 mg/dℓ), associados a sintomas compatíveis com hipoglicemia e melhora desses sintomas após administração de glicose. Embora a hipoglicemia seja frequente em pessoas com DM, trata-se de evento clínico bastante incomum em pessoas que não tenham DM por causa da eficácia das defesas normais fisiológicas e comportamentais contra a queda das concentrações plasmáticas de glicose. Assim, na ausência de DM, recomenda-se uma investigação completa de hipoglicemia apenas para as pacientes nos quais a tríada de Whipple seja documentada. As concentrações séricas de glicose são controladas pela ação de hormônios hiper e hipoglicemiantes (insulina), cujas secreções devem ser controladas por uma sintonia muito fina, pois, visto que é importante fonte de energia, a glicose deve estar disponível para os tecidos em concentrações em quantidade adequada na corrente sanguínea. A insulina tem seu gene no braço curto do cromossomo 11, sendo produzida inicialmente como pré-proinsulina, que é então clivada em proinsulina e, posteriormente, em insulina (cadeias A e B) e peptídeo C, os quais são liberados na circulação em concentrações equivalentes. Cerca de 40 a 50 unidades de insulina são secretadas por dia. Nos estados de hipoglicemia, a liberação de proinsulina, insulina e peptídeo o C geralmente é suprimida para níveis mínimos. A insulina estimula a entrada e a utilização da glicose pelas células, e mantém em níveis adequados a glicemia no período pós-prandial A queda das concentrações da glicose plasmática causa uma sequência de respostas, com limiares glicêmicos definidos em indivíduos saudáveis. A primeira resposta é uma diminuição na secreção de insulina. Isso acontece quando os níveis de glicose plasmática declinam dentro da faixa fisiológica. Aumento da secreção de hormônios contrarreguladores da glicose (p. ex., glucagon e epinefrina) ocorre quando os níveis da glicemia diminuem e ficam logo abaixo da faixa fisiológica. Concentrações mais baixas de glicemia determinam uma resposta simpatoadrenal mais intensa (simpática neural e adrenomedular) e sintomas. O glucagon é o primeiro hormônio contrarregulador a responder à redução na glicemia e, na sua ausência, as catecolaminas são importantes. Tudo indica que o hormônio de crescimento (GH) e o cortisol sejam relevantes apenas após hipoglicemia prolongada (pelo menos 12 horas). Esses hormônios agem estimulando a formação de glicose (gliconeogênese) no fígado e a quebra do glicogênio (glicogenólise) hepático e muscular. Como forma de proteção fisiológica, o limiar glicêmico para o aparecimento de sintomatologia se encontra abaixo dos limiares que estimulam esses hormônios. A ocorrência de hipoglicemia indica que a taxa de efluxo de glicose da circulação excedeu a taxa do influxo glicêmico para a corrente sanguínea. Hipoglicemia pode resultar de uma saída excessiva de glicose da circulação (utilização excessiva, perdas externas), de um deficiente aporte de glicose (produção endógena deficiente, na ausência de liberação exógena de glicose), ou de ambos os mecanismos. Uma utilização aumentada da glicose é vista em condições como exercícios, gravidez e sepse. Perdas renais eventualmente ocorrem na presença de concentrações normais de glicose (p. ex., glicosúria renal e gravidez). Entretanto, devido à capacidade que o fígado (e rins) tem de aumentar várias vezes a produção de glicose, a hipoglicemia clínica raramente resulta apenas de um efluxo excessivo de glicose. Hipoglicemia pode ser causada por defeitos contrarregulatórios, enzimáticos ou de substratos. Defeitos contrarregulatórios incluem demasiada secreção de insulina ou deficiente secreção dos hormônios contrarreguladores. Defeitos enzimáticos na produção de glicose podem ser primários ou resultar de doença hepática. Defeitos de substrato originam-se da incapacidade de mobilizar ou utilizar substratos gliconeogênicos A classificação tradicional dos distúrbios hipoglicêmicos em pessoas não diabéticas, como hipoglicemias pós-absortivas (em jejum) ou pós- prandiais (reativas), é suplantada por uma categorização clínica: Rhyan Coelho (1) indivíduos doentes ou em uso de medicamentos; (2) indivíduos aparentemente saudáveis Neste último grupo, incluem-se, sobretudo, os pacientes com hiperinsulinismo endógeno (p. ex., insulinoma, nesidioblastose, hipoglicemia autoimune etc.). O primeiro grupo é representado principalmente por situações que cursam com hipoglicemia sem hiperinsulinismo associado, como doenças graves (p. ex., sepse), deficiências hormonais (sobretudo de GH e cortisol) e tumores de células não ilhotas. Diversos fármacos são responsáveis pelo surgimento de hipoglicemia, particularmente insulina, secretagogos de insulina e álcool. Todas as condições anteriormente citadas cursam, sobretudo, com hipoglicemia de jejum. Algumas delas, no entanto, manifestam-se exclusivamente (galactosemia, hipoglicemia pós-cirurgia de derivação gástrica etc.) ou quase exclusivamente (hipoglicemia pancreatógena não insulinoma) por hipoglicemia pós-prandial. A presença de sintomas pós-prandiais sem a tríade de Whipple, anteriormente chamada de “hipoglicemia reativa”, é hoje considerada uma alteração funcional em que os sintomas não ocorrem devido à hipoglicemia e para a qual um teste de tolerância oral à glicose não está indicado. A nesidioblastose caracteriza-se por hipertrofia das ilhotas, às vezes com hiperplasia, associada a núcleos de células beta aumentados e hipercromáticos. Clínica e laboratorialmente assemelha-se ao insulinoma. Em geral surge na infância, mas raramente é diagnosticada na idade adulta. Insulinomas são neoplasias raras, com incidência estimada em 1 caso/250 mil pessoas/ano, porém representam uma causa curável de hipoglicemia potencialmente fatal. Em cerca de 98% dos casos, o tumor situa-se no pâncreas. Insulinomas ectópicos foram encontrados em áreas de heterotopia pancreática, como a parede duodenal, a porta hepatis e as vizinhanças do pâncreas. Em geral, insulinomas têm ocorrência esporádica (90 a 95% dos casos), mas 4 a 6% são encontrados em pacientes com neoplasia endócrina múltipla (MEN) tipo 1 (MEN-1). A síndrome de hipoglicemia pancreatógena não insulinoma (NIPHS) é muito menos frequente do que os insulinomas. Essa síndrome é caracterizada por crises de neuroglicopenia devido à hipoglicemia hiperinsulinêmica endógena que muitas vezes (mas nem sempre) surge após uma refeição. Há predominância no sexo masculino. A anormalidade pancreática é o envolvimento difuso das ilhotas com nesidioblastose. A maioria dos adultos com deficiência dos hormônios contrarreguladores não desenvolve hipoglicemias. Entretanto, hipoglicemia de jejum pode eventualmente ser observada em pacientes Rhyan Coelho com doença de Addison, hipopituitarismo ou deficiência isolada de GH ou ACTH, inclusive como manifestação clínica inicial desses distúrbios hormonais. Geralmente a secreção deficiente de glucagon e epinefrina favorece o surgimento de hipoglicemias sem sinais de alerta em diabéticos com neuropatia autonômica. Os feocromocitomas (FEO) em geral se associam à hiperglicemia. Secreção de catecolaminas em excesso por tais tumores inibe a liberação de insulina pelo pâncreas devido ao estímulo dos receptores alfa-adrenérgicos. No entanto, o estímulo dos receptores beta-adrenérgicos resulta no aumento da liberação de insulina pelas ilhotas pancreáticas. O álcool não interfere na glicogenólise, mas inibe a glico-neogênese. Além disso, diminui a resposta do cortisol e do GH à hipoglicemia e retarda a resposta da epinefrina e do glucagon à hipoglicemia.O etanol pode também contribuir para a progressão da hipoglicemia em diabéticos em uso de fármacos hipoglicemiantes. Por fim, pode causar hipoglicemia de jejum em estados de depleção de glicogênio. Em geral, surge 6 a 36 horas após o consumo moderado a intenso de bebida alcoólica em um indivíduo que ingeriu pouca comida (ou seja, em um estado de depleção hepática de glicogênio). Hipoglicemia pode também ser uma manifestação tardia da cetoacidose alcoólica. A hipoglicemia pós-prandial (HPP) ocorre exclusivamente após as refeições, em geral no prazo de 4 horas após a ingestão do alimento. Qualquer distúrbio que cause hipoglicemia de jejum pode, também, cursar com sintomas pós- prandiais. Entretanto, algumas doenças ou condições se manifestam somente por HPP: (1) deficiências congênitas de enzimas do metabolismo dos carboidratos, como intolerância hereditária à frutose e galactosemia (2) Após cirurgias que favoreçam uma rápida passagem dos alimentos ingeridos para o intestino delgado, como gastrectomia, gastroenterostomia, piloroplastia, derivação gástrica etc. A hipoglicemia ocorre 1,5 a 3 horas após a refeição e precisa ser diferenciada da síndrome de dumping (plenitude abdominal, náuseas, fraqueza etc.), que surge mais precocemente (menos de 1 hora após a refeição). Em hemodiálises, a hipoglicemia parece resultar da difusão da glicose do plasma para os eritrócitos, provavelmente devido ao maior consumo de glicose por essas células, resultante de um metabolismo anaeróbico acelerado, induzido por mudanças no pH citoplasmático Os sintomas hipoglicêmicos variam de pessoa para pessoa, mas, em geral, são os mesmos em uma mesma pessoa em cada episódio hipoglicêmico. São categorizados como adrenérgicos (fome, sudorese, parestesias, palpitações, sudorese, ansiedade e tremor) e neuroglicopênicos (desorientação, distúrbios visuais, mudanças de comportamento, crises epilépticas, confusão, torpor e coma) Rhyan Coelho Os sintomas/sinais da hipoglicemia são inespecíficos, o que pode dificultar o diagnóstico. Assim, no diagnóstico diferencial, devem ser consideradas condições como ansiedade, estresse, histeria, depressão, epilepsia, angina do peito, narcolepsia e tumores cerebrais. Os sintomas hipoglicêmicos geralmente surgem quando a glicemia diminui para menos de 55 mg/dℓ (3,1 mmol/ℓ). Contudo, após um jejum prolongado, algumas crianças e mulheres podem se apresentar com glicemias < 55 mg/dℓ sem nenhuma sintomatologia. Além disso, valores falsamente baixos da glicemia (pseudo- hipoglicemia) ocorrem, sobretudo, em pacientes com leucocitose, eritrocitose ou trombocitose, em função da metabolização da glicose in vitro. Em geral, após uma noite de jejum, níveis de glicemia > 70 mg/dℓ (3,9 mmol/ℓ) são normais, aqueles entre 50 e 70 mg/dℓ (2,8 e 3,9 mmol/ℓ) são indicativos de hipoglicemia, ao passo que valores < 50 mg/dℓ são muito sugestivos. Entretanto, é mais confiável estabelecer a confirmação diagnóstica de hipoglicemia por intermédio da tríade de Whipple. Uma vez confirmada a hipoglicemia, deve-se partir para investigar sua etiologia, por meio da anamnese e avaliação laboratorial. No início, deve-se descartar o uso de fármacos potencialmente causadores de hipoglicemia. É preciso estar atento ao fato de que a hipoglicemia induzida por ingestão excessiva de álcool pode se manifestar tardiamente (até 36 horas após), quando a dosagem sanguínea de álcool poderá já estar normal. A possibilidade de hipoglicemia factícia deve ser considerada em todo paciente submetido à avaliação para um distúrbio hipoglicêmico, especialmente quando a hipoglicemia ocorre de maneira “caótica”, ou seja, sem nenhuma relação com o jejum ou as refeições. É importante lembrar que, nessa condição, o paciente poderá relatar dosagens anormais da glicemia, ou mesmo apresentar resultados fraudulentos de exames, como parte de um comportamento psicopata. A abordagem mais recomendada atualmente consiste na coleta de sangue no momento da crise, para que se possa confirmar o diagnóstico de hipoglicemia (pela dosagem da glicemia) e já seguir na investigação etiológica com mensuração simultânea de insulina, peptídeo C e, se possível, proinsulina e sulfonilureias. Desse modo, objetiva-se fazer o diagnóstico diferencial entre as principais causas de hipoglicemia. • Insulinoma As características laboratoriais dos insulinomas incluem níveis elevados de insulina, peptídeo C e proinsulina, associados à hipoglicemia. No entanto, elas nem sempre estão presentes. Como o valor absoluto de insulina não está elevado em todos os pacientes, um nível normal do hormônio não exclui a doença. Um valor de insulina em jejum > 24 μU/mℓ (geralmente, < 100) é encontrado em cerca de 50% dos pacientes com insulinoma. Contudo, em muitos pacientes, podem estar no limite superior da normalidade (ainda assim, inadequadamente altos devido à hipoglicemia). Após um jejum prolongado, na presença de glicemia < 55 mg/dℓ, níveis > 3 μU/mℓ de insulina são altamente sugestivos (sensibilidade de 93% e especificidade de 100%). Na experiência de outros autores, valores de insulina > 7 μU/mℓ, diante de glicemia < 40 mg/dℓ, são altamente indicativos de insulinoma. Níveis > 100 μU/mℓ são mais indicativos de hipoglicemia factícia por uso exógeno de insulina ou de hipoglicemia autoimune. Caso o paciente não apresente crises frequentes com sintomas espontâneos, deve ser submetido a um teste ambulatorial (jejum durante a noite, com coleta do sangue na manhã seguinte). Nessa situação, até 40% dos pacientes com insulinoma apresentarão hipoglicemia. Caso contrário, o paciente deve ser hospitalizado e submetido ao teste de jejum prolongado (TJP), com até 72 horas de duração, na tentativa de, uma vez induzida a hipoglicemia, coletar o sangue para as dosagens necessárias. Durante o teste de jejum prolongado, a presença de um insulinoma é altamente provável pela detecção de níveis inadequadamente elevados de insulina (≥ 3 μU/mℓ), peptídeo C (≥ 0,6 ng/mℓ) e proinsulina (≥ 5 pmol/ℓ), na presença de glicemia Rhyan Coelho < 55 mg/dℓ, em um paciente sulfonilureia- negativo e sem anticorpos anti-insulina. Do mesmo modo, níveis de betahidroxibutirato ≤ 2,7 mmol/ℓ e um aumento na glicemia de, pelo menos, 25 mg/dℓ após glucagon intravenoso indicam mediação da hipoglicemia pela insulina. Como um todo, esses critérios propiciam sensibilidade > 90% e especificidade > 70% para o diagnóstico de insulinoma. • Hipoglicemia factícia Quando induzida por sulfonilureias apresenta-se, a exemplo dos insulinomas, com níveis elevados de insulina e peptídeo C. Nesses casos, a dosagem de sulfonilureias é a única maneira de fazer o diagnóstico diferencial com o insulinoma. Em nosso meio, entretanto, a grande maioria dos laboratórios especializados somente faz a dosagem de sulfonilureias de primeira geração. As formulações de insulina atualmente disponíveis não contêm peptídeo C. Assim, nos casos decorrentes da autoaplicação de insulina, os níveis de peptídeo C encontram-se suprimidos (< 0,2 nmol/ℓ) e desproporcionalmente baixos em relação aos de insulina. Os valores de insulina costumam ser mais elevados do que os observados em pacientes com insulinomas. • Hipoglicemia sem hiperinsulinemia Nesta situação, é preciso pesquisar os raros tumores não pancreáticos, cujo diagnóstico não é difícil, uma vez que em geral são facilmente identificados pelos exames de imagem, por em geral serem volumosos. Laboratorialmente, caracterizam-se por níveis baixos de insulina e peptídeo C durante a hipoglicemia, enquanto os do “big IGF-2” (ou Pró- IGF-2) encontram-se elevados. As concentrações plasmáticas de IGF-2 livre (ou IGF-1 livre) estão elevadas, mas essas dosagens não estão facilmente disponíveis. ➔ Tratamento • Insulinoma A cirurgia é o tratamento escolhido para os insulinomas e possibilita cura de 77 a100% dos casos. Enucleação do tumor, quando exequível, é a técnica de escolha. Pancreatectomia mais extensa está indicada se houver múltiplos adenomas ou microadenomatose. A duodenopancreatectomia (cirurgia de Whipple) pode ser necessária para pacientes com tumores da cabeça do pâncreas. A farmacoterapia habitualmente é indicada para os pacientes que recusem a cirurgia ou apresentem contraindicação, ou, ainda, para aqueles que não respondem adequadamente à cirurgia (localização tumoral malsucedida ou presença de metástases). o Diazóxido. É considerado o medicamento de escolha, mas não é comercializado em nosso país. A dose inicial recomendada é de 300 a 400 mg/dia VO, em 2 a 3 tomadas, até um máximo de 1.200 mg/dia. Inibe a secreção de insulina (por estímulo dos receptores alfa-adrenérgicos na célula beta) e aumenta a glicogenólise. Os efeitos colaterais do fármaco (sobretudo intolerância gástrica, retenção hídrica, edema e hirsutismo) limitam seu uso prolongado o Hidroclorotiazida. Na dose de 12,5 a 25 mg/dia, pode ser adicionada ao diazóxido, com o qual tem sinergismo, por sua ação hiperglicemiante. Previne, também, a retenção hídrica induzida pelo diazóxido. o Antagonistas dos canais de cálcio. Existem alguns relatos de tratamento bem- sucedido com nifedipino, verapamil ou diltiazem o Análogos da somatostatina. Foram relatados casos de insulinomas não curados pela cirurgia ou insulinomas metastáticos que responderam de modo favorável ao uso de octreotida LAR (Sandostatin LAR®, 20 a 30 mg IM mensalmente). Tal resposta se deve ao fato de que até 70% dos insulinomas apresentam receptores somatostatínicos sst2 e sst5. o Outras condutas. A infusão contínua de glucagon ou glicose pode, também, ser útil. Para insulinomas malignos, a quimioterapia (estreptozocina ou dacarbazina) pode reduzir as dimensões tumorais, mas não há relatos de cura com esse tratamento. Rhyan Coelho Rhyan Coelho ➔ Tratamento Diabetes Mellitus tipo 1 Como o DM1 se caracteriza por produção insuficiente de insulina, o tratamento medicamentoso depende da reposição desse hormônio, utilizando-se de esquemas e preparações variados e estabelecendo-se “alvos glicêmicos” pré e pós-prandiais para serem alcançados. O estudo prospectivo Diabetes Control and Complications Trial (DCCT)1 demonstrou que o tratamento intensivo do DM1, com três ou mais doses diárias de insulina (de diferentes tipos de ação) ou com sistema de infusão contínua de insulina (SICI; bomba de insulina), é eficaz na redução das complicações crônicas advindas do mau controle. Diferentes esquemas terapêuticos podem ser utilizados no tratamento de indivíduos com DM1. Na prática, a reposição insulínica é feita com uma insulina basal (cuja função é evitar a lipólise e a liberação hepática de glicose no período interalimentar), uma insulina durante as refeições (bolus de refeição) e doses de insulina necessárias para corrigir hiperglicemias pré e pós-prandiais ou no período interalimentar (bolus de correção). A insulinoterapia em esquema intensivo (basal-bolus), seja com múltiplas aplicações de insulina ao dia, seja com SICI, constitui a terapêutica fundamental e deve ser aliada à terapia nutricional com contagem de carboidratos, automonitorização e prática regular e planejada de atividade física, a fim de complementar o tratamento, cujo objetivo principal é o bom controle metabólico, postergando-se complicações crônicas advindas de mau controle e evitando-se hipoglicemias, principalmente as mais graves, noturnas e despercebidas. O tratamento intensivo pode envolver a aplicação de múltiplas doses de insulina, com diferentes tipos de ação, por meio de seringa, caneta ou SICI. O tratamento com múltiplas doses de insulina tornou-se bastante prático após o surgimento das canetas (descartáveis ou permanentes), atualmente disponíveis em vários modelos, que permitem o uso de doses de 0,5 unidade de insulina e apresentam comprimentos diferentes de agulha (4, 5, 6, 8 e 12 mm). A dose diária total de insulina preconizada em pacientes com DM1, com diagnóstico recente ou logo após diagnóstico de cetoacidose diabética, varia de 0,5 a 1,0 U/kg/dia. No entanto, alguns casos requerem doses maiores de insulina para a recuperação do equilíbrio metabólico. A dose diária de insulina depende de idade, peso corporal, estadiamento puberal, duração e fase do diabetes, estado do local de aplicação da insulina (presença de lipodistrofias), ingestão de alimentos e sua distribuição, automonitoramento e HbA1c, rotina diária, prática e intensidade da atividade física, bem como intercorrências (infecções, dias de doença ou procedimentos cirúrgicos). Durante a fase de remissão parcial, a dose diária total de insulina administrada é < 0,5 U/kg/ dia (até < 0,3 U/kg/dia); posteriormente, com a evolução da doença e passada essa fase, a necessidade diária de insulina aumenta para 0,7 a 1 U/kg/dia em crianças pré-púberes, podendo alcançar 1 a 2 U/kg/dia durante a puberdade, ou, em situações de estresse (físico ou emocional), 1,5 U/kg/dia. Recomenda-se que a dose basal de insulina diária varie de 30 a 50% da dose total, a fim de tentar mimetizar a secreção endógena de insulina, e que o restante da dose diária seja em forma de bolus de correção (quantidade de insulina rápida ou análogo ultrarrápido para alcançar a glicemia na meta terapêutica desejada) e de refeição (quantidade de insulina necessária para metabolizar n gramas de carboidratos). Doses mais baixas de insulina basal (30%), sobretudo quando em associações à insulina regular, reduzem o risco de hipoglicemias e melhoram o controle metabólico. Em lactentes e crianças menores (< 6 anos), recomenda-se que as doses de insulina basal girem em torno de 30%; em crianças maiores, adolescentes e adultos jovens, em torno de 40%, podendo em alguns casos específicos utilizar no máximo 50% da dose. Rhyan Coelho O tratamento intensivo em esquema basal-bolus com múltiplas aplicações ao dia pode ser realizado por uma das seguintes opções: • Basal o Insulina protamina neutra Hagedorn (neutral protamine Hagedorn, NPH), duas a quatro vezes ao dia: (I) antes do desjejum e ao deitar-se, (II) antes do desjejum, no almoço e ao deitar-se ou (III) antes do desjejum, no almoço, no jantar e ao deitar-se ou o Análogo de insulina glargina, uma vez ao dia: (I) antes do desjejum, (II) no almoço, (III) no jantar ou (IV) ao deitar-se ou o Análogo de insulina glargina U300 (2019: > 18 anos): (I) antes do desjejum, (II) no almoço, (III) no jantar ou (IV) ao deitar-se ou o Análogo de insulina detemir, uma ou duas vezes ao dia: antes do desjejum e/ou no jantar e/ou ao deitar-se ou o Análogo de insulina degludeca: uma vez ao dia: (I) antes do desjejum, (II) no almoço, (III) no jantar ou (IV) ao deitar-se. • Bolus (correção e refeição): o Insulina de ação rápida (regular): antes (30 a 40 minutos) das principais refeições ou o Análogo de insulina de ação ultrarrápida (lispro, asparte ou glulisina): antes (15 minutos) das principais refeições ou logo ao término delas; o Análogo de insulina de ação mais ultrarrápida Fiasp: antes (2 minutos) das principais refeições ou até 20 minutos após o término delas A administração dos análogos de insulina ultrarrápida após a refeição é ao menos tão eficaz quanto a de insulina regular antes da refeição, podendo ser administrada dessa maneira em crianças menores, que, muitas vezes, não ingerem a quantidade total de carboidratos na refeição programada. A insulina regular, quando aplicada 5 minutos antes das refeições, é menos eficaz do que quando aplicada de 30 a 40 minutos antes, devido ao seu perfil de ação. →Análogos de Insulina Antes do advento dos análogos de insulina de ação ultrarrápida, as hipoglicemias ocorriam em maior número, o que certamente contribuiu para que houvesse certo receio dos pais, e até mesmo dos profissionais de saúde,na implementação do tratamento intensivo. Por meio de técnicas de DNA recombinante, obtiveram-se os análogos de insulina de ação ultrarrápida, com perfil mais fisiológico na melhora do controle glicêmico. Atualmente, estão comercialmente disponíveis três análogos de insulina de ação ultrarrápida: lispro, asparte e glulisina. Diversos estudos têm favorecido os análogos de insulina de ação ultrarrápida em relação à insulina regular. Um aspecto que deve ser considerado ao utilizar a insulina regular é a demora, em torno de 30 a 40 minutos, de seu início de ação, sendo necessário proceder à sua aplicação pelo menos 30 minutos antes das refeições. No entanto, alguns pacientes tendem a aplicá-la na hora da refeição, o que contribui para hiperglicemias pós-prandiais e hipoglicemias no período entre as refeições, pois a insulina regular atingirá seu pico no horário em que a alimentação já foi metabolizada. Os análogos de insulina de ação prolongada (glargina, glargina U300, detemir e degludeca) também foram obtidos por meio da técnica de DNA recombinante. Estudos têm demonstrado menor frequência de hipoglicemia com esses análogos em relação à insulina NPH, o que seria explicado pela ausência (ou diminuição) de pico desses análogos. O fabricante recomenda que a insulina glargina seja utilizada após os 2 anos de idade, em dose única (antes do café da manhã, antes do almoço, antes do jantar ou ao deitar-se), em casos de hipoglicemias frequentes, noturnas ou graves, variabilidade glicêmica extrema ou, ainda, escolha do paciente e/ ou da família. O horário de administração da insulina glargina não promove diferenças Rhyan Coelho clínicas significativas, podendo ser individualizado A ação do análogo de insulina detemir dura cerca de 20 a 24 horas, com declínio do efeito após 10 a 12 horas. Estudos demonstraram que a administração do análogo detemir, em duas doses ao dia, como parte de uma terapia basal-bolus, mantém o controle glicêmico na maioria dos adultos com DM1 O análogo de insulina degludeca, de ação prolongada, está disponível no mercado brasileiro para a prática clínica e, associado aos análogos de ação ultrarrápida, pode ser uma alternativa terapêutica no tratamento de indivíduos com diabetes. Esse análogo está aprovado para utilização em pacientes com mais de 1 ano de idade. Mais recentemente, foi lançado no mercado brasileiro o análogo de insulina basal glargina U300, ainda não aprovado para uso na faixa etária pediátrica. Estudos indicam, também, que esse análogo é uma nova alternativa para o tratamento desses indivíduos, demonstrando benefícios principalmente naqueles casos que exigem doses maiores de insulina basal, com resultados semelhantes de controle glicêmico e redução de hipoglicemias. Esses análogos têm perfil mais estável, menor variabilidade glicêmica e maior previsibilidade, além de não apresentarem picos de ação e não necessitarem de homogeneização, o que torna possível uma administração mais flexível.
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