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CAROLINA ELMAUER BORGES MEDICINA MAUÁ décimo semestre, internato, 2022. Doenças Perinatais e da Prematuridade Hipoglicemia Neonatal Durante a vida intrauterina, o feto depende do aporte de glicose da mãe. Há passagem de glicose transplacentária, com difusão facilitada. Já a insulina é o principal hormônio de crescimento do feto, mas não ultrapassa a barreira placentária, já que é produzida pelo próprio feto. TRANSIÇÃO FETAL�NEONATAL ❖ Após o nascimento, o RN entra em estado de relativo jejum pós-natal, tendo mecanismos para controle da glicemia (reservas e mobilização da gordura marrom). ❖ Os RNs tem maior massa cerebral em relação ao tamanho corporal, tendo elevada taxa de utilização de glicose (e maior risco de hipoglicemia). ❖ As reservas de glicogênio mantém a glicemia por, em média, 4h, tendo assim a importância da amamentação frequente. ❖ Clampeamento do cordão umbilical: Suprimento de glicose cessa de maneira abrupta, e, dessa forma, os níveis glicêmicos caem rapidamente: ➢ Até cerca de 30mg/dL durante as primeiras 2-3 horas. ➢ 40-45 mg/dL nas primeiras 4-6 horas de vida; ➢ Manutenção nas primeiras 12 horas de vida; DEFINIÇÃO Não existe consenso na literatura. Maioria dos autores: ❖ Glicemia <45 md/dL = nível de investigação e intervenção; ❖ Outros serviços: glicemia <40 mg/dL; ❖ UPTODATE: <47 md/dL; FISIOPATOLOGIA ❖ Aumento do consumo de glicose. ❖ Pouca produção (baixa reserva de “estoque”). ❖ Causas mistas RASTREIO DA HIPOGLICEMIA Avaliação da glicemia capilar: Dextro ou HGT: ❖ Avaliação da glicemia por tira reagente de papel. ❖ Limitações: ➢ Subestima valores de glicemia de 10-15% ➢ Baixa sensibilidade para valores <40 mg/dL ❖ Hipoglicemia identificada pelo dextro= confirmação com dosagem plasmática. Triar sempre que RNs sintomáticos e com risco de hiperinsulinismo (mãe com DG) e baixa reserva de glicogênio e causas mistas. RNs Sintomáticos: DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL ❖ Distúrbios metabólicos (hipocalcemia e hipomagnesemia), tendo como fatores de risco semelhantes aos da hipoglicemia: ➢ Diabetes materno (gestacional ou prévio). ➢ Prematuridade. ➢ RCIU. ➢ Asfixia perinatal. MANE�O DA HIPOGLICEMIA RN PIG ou Pré-Termo: Devem ser alimentados a cada 2-3 horas e realizar dextro pré-mamada nas primeiras 24 horas. ❖ >24 horas: Dextro apenas se mantiverem glicemia inferior a 50mg/dL. RN com Risco de Hiperinsulinismo: Amamentação na 1 hora de vida e dextro após mamada (glicose de no mínimo 45). Gel de Dextrose Bucal a 40% - Realizado em paciente assintomático: É uma terapia eficaz e segura, quando em conjunto com a dieta enteral. Preferível à fórmula -> Estímulo à amamentação. Paciente Sintomático - Cérebro sofrendo com a hipoglicemia: ❖ Push de glicose endovenoso - SG 10%, 2mL/kg em bolus. ❖ Soro de Manutenção com infusão contínua de glicose (VIG) a 8mg/kg/min. ❖ Controle do dextro de 30-60 min. Hipoglicemia Refratária: ❖ Corticoide - antagonista de insulina. ❖ Glucagon - contrarregulador insulínico. ❖ Diazóxido - utilizada em hipoglicemia hiperinsulinêmica. ❖ Octreotide - inibe a secreção de insulina. Investigação da Hiperglicemia Refratária: ❖ Coleta de exames durante a crise hipoglicêmica - glicemia plasmática, cortisol, insulina, etc. ❖ Teste com glucagon - Hipoglicemia hiperinsulinêmica. Doença Hemorrágica do RN Causada pela deficiência transitória dos fatores de coagulação dependentes da vitamina K. ❖ Níveis reduzidos de vitamina K proveniente da passagem transplacentária. ❖ Ingesta oral inadequada - leite materno com baixa disponibilidade de vitamina K. ❖ Ausência de flora bacteriana intestinal que sintetiza a vitamina K2. Fatores de risco para doença hemorrágica do RN: ❖ Uso materno de anticonvulsivantes durante a gestação. ❖ Não aplicação da vitamina K no RN. ❖ Uso de antibiótico de amplo espectro pelo RN. ❖ Presença de doenças disabsortivas como fibrose cística. �UADRO CLÍNICO Varia de acordo com o momento do aparecimento da clínica. ❖ Precoce (Primeiras 24h de vida): Interferência no metabolismo da vitamina K. ❖ Clássica (Do 2º ao 7º dia de vida): Baixa ingesta, pouca produção e ausência de profilaxia. ❖ Tardia (De 8 dias de vida ao 6º mês de vida - pico com 3-8 semanas): Condições que reduzem absorção. ❖ Clínica: Sangramento gastrointestinal. DIAGNÓSTICO A ausência de vitamina K causa deficiência dos fatores II, VII, IX e X, com plaquetas e fibrinogênio normais. Diferenciar o sangramento materno do que sangramento do RN. ❖ Teste de APT (NaOH 1%): Sangue do RN com predomínio de Hb fetal. ➢ Coloração rósea: Teste positivo. ❖ Sangue materno deglutido contém Hb adulta: ➢ Coloração marrom-amarelada: Teste negativo. TRATAMENTO E PROFILAXIA Administração da vitamina K. ❖ Ministério da Saúde: Vitamina K1 IM: TODOS os RN < 48 horas. Dose: 1mg IM DOSE ÚNICA. Profilaxia de doença hemorrágica clássica. ❖ Academia Americana de Pediatria: Vitamina K1 ORAL: RN termo, saudáveis, AME. Dose: 2mg VO na primeira mamada. Repetir: com 1, 4 e 8 semanas de vida. Displasia de Desenvolvimento do Quadril Trata-se do espectro de anormalidades que envolvem o quadril, com relação anormal entre a cabeça do fêmur e a cavidade acetabular. O acetábulo com cavidade defeituosa (rasa/mais aberta) + frouxidão capsular, com a cabeça do fêmur parcialmente desencaixado do acetábulo. Tem etiologia multifatorial. Fatores de risco: Sexo feminino, apresentação pélvica, oligodrâmnio, RN grande para IG (GIG) e história familiar positiva. *O quadril esquerdo é o mais acometido. �UADRO CLÍNICO Assintomáticos ao nascimento, portanto, realizamos manobras semiológicas, como manobra de Barlow e Ortolani. Paciente não diagnosticado no período neonatal: ❖ 2-3º mês de vida: ➢ Sinal de Hart - limitação na abdução do quadril. ➢ Sinal de Peter-Bade - assimetria das pregas glúteas e das coxas. ➢ Sinal de Galeazzi - assimetria dos membros. DIAGNÓSTICO USG de quadril: Caracteriza o grau de displasia pela avaliação da morfologia do acetábulo (método de Graf). Indicações de USG de quadril: ❖ Ortolani positivo. ❖ Ocorrência familiar de DDQ ou RN de apresentação pélvica, com pé calcâneo valgo, torcicolo congênito ou geno recurvado. ❖ Casos examinados tardiamente, porém com suspeita clínica prévia. EVOLUÇÃO ❖ Regressão espontânea (casos leves). ❖ Subluxação femoral: Sintomas no adulto jovem, limitação de movimento. ❖ Desencaixe total da cabeça do fêmur: Luxação congênita do quadril. TRATAMENTO ❖ Objetivo: Manter a cabeça do fêmur dentro do acetábulo. ❖ Diagnóstico e tratamento precoces: Em fases onde o remodelamento ainda é possível. ❖ Como: Órtoses - quadril em posição de abdução, rotação externa e flexão. Suspensório de Pavlik - uso de 2 a 3 meses. Em caso de diagnóstico tardio, ou seja, após 3-6 meses de vida, realizar redução fechada + imobilização do quadril com aparelho gessado pelvipodálico. Asfixia Perinatal ❖ Anóxia: Consequências da falta completa de oxigênio (podendo ocorrer por diferentes causas). ❖ Hipóxia: Concentração arterial de O2 menor que a normal. ❖ Isquemia: Fluxo sanguíneo insuficiente para manter a função normal dos órgãos. ❖ Asfixia Perinatal: Agressão causada por hipóxia e/ou isquemia -> comprometimento do fluxo sanguíneo placentário antes ou durante o parto. FISIOPATOLOGIA Queda da oferta de O2 aos tecidos por comprometimento do fluxo sanguíneo placentário durante o parto. Fases: ❖ Inicial: Interrupção do fluxo sanguíneo -> redistribuição (SNC, coronária e adrenais). ❖ Persistência do Processo Hipóxico-Isquêmico: Comprometimento da função miocárdica (queda do débito cardíaco) e posterior queda do fluxo sanguíneo. ❖ Consequências: Disfunção de múltiplos órgãos e sistemas. CAUSAS Diferentes condições maternas e gestacionais: ❖ Oxigenação inadequada do sangue materno - hipoventilação por anestesia geral. ❖ Hipotensão arterial materna (perda sanguínea). ❖ Ausência de relaxamento uterino (enchimento placentário). ❖ Descolamento prematuro de placenta. ❖ Obstrução da circulação sanguínea(compressão ou nó verdadeiro de cordão). ❖ Insuficiência placentária (DHEG, pós-maturidade). �UADRO CLÍNICO ❖ Intraútero: RCIU. ❖ Durante o parto: Alterações na frequência cardíaca e variabilidade. ❖ Ao nascimento: Depressão perinatal, ausência de respiração espontânea - REANIMAÇÃO NEONATAL. DEFINIÇÃO CLÍNICO�LABORATORIAL Aspectos clínico-laboratoriais da Asfixia Perinatal: ❖ APGAR < 3 NO 5º minuto de vida. ❖ Gasometria de cordão: pH <7,0 ou BE < 15 mmol/L. ❖ Alteração neurológica no período neonatal imediato. ❖ Disfunção orgânica no período neonatal imediato. LESÃO CEREBRAL HIPÓXICO�IS�UÊMICA É a manifestação clínica mais descrita da asfixia perinatal e tem a patogênese da lesão neuronal. ❖ Inativação reversível das sinapses (resposta adaptativa). ❖ Se não conseguir readaptar essa inativação, ocorre uma falta de energia persistente, causando falha de bombas que dependem de ATP e, consequentemente, liberando glutamato (aminoácido citotóxico para as células neuronais), causando lesão irreversível. Fases da Lesão: ❖ Aguda: Necrose neuronal por privação de O2. ❖ Período de latência. ❖ Tardia: Apoptose neuronal (intensidade variável). *Classificação em estágios de gravidade: Sarnat & Sarnat. TRATAMENTO Hipotermia terapêutica. ❖ RN maior ou igual a 35 semanas e encefalopatia hipóxico-isquêmica. ❖ Início nas primeiras 6 horas de vida: Impede a progressão da fase tardia. ❖ Indicações: Evidência de asfixia perinatal e de encefalopatia hipóxico-isquêmica moderada ou grave já nas primeiras 6 horas de vida. ❖ Reduz a taxa de apoptose e produção de mediadores neurotóxicos (glutamato, radicais livres, óxido nítrico) e reduz morbimortalidade. A hipotermia terapêutica é realizada de duas formas: ❖ Sistêmica (corpo todo): ➢ Temperatura corporal central (termômetro retal/esofágico) entre 33-34ºC. ➢ Monitorização constante de temperatura, sinais vitais, diurese e exames laboratoriais. ❖ Seletiva (craniana): ➢ Temperatura corporal central (termômetro retal/esofágico) entre 33-34ºC. ➢ Monitorização constante de temperatura, sinais vitais, diurese e exames laboratoriais. *Duração: 72 horas, a partir do momento em que se chega na temperatura alvo. *Reaquecimento lento (0,5ºC por hora, até 36,5ºC). Enterocolite Necrosante Principal emergência do TGI no período neonatal. É caracterizada por diferentes graus de necrose da mucosa/parede, podendo levar a um quadro de perfuração intestinal. Fatores de Risco Relacionados ao RN: ❖ Prematuridade. ❖ Muito baixo peso. ❖ RCIU. ❖ Asfixia perinatal. ❖ Uso de fórmulas. Fatores de Risco Relacionados à Mãe: ❖ Uso de cocaína/medicações que mantém o canal arterial (roubo de fluxo). PATOGÊNESE Perda da integridade da mucosa + Resposta do hospedeiro = Necrose. Regiões mais comumente envolvidas: Íleo distal e cólon proximal. Fatores associados à patogênese da enterocolite necrosante: ❖ Predisposição genética. ❖ Imaturidade intestinal. ❖ Desregulação do tônus vascular mesentérico. ❖ Supercrescimento bacteriano. ❖ Hiper-reatividade da mucosa intestinal. ❖ Nutrição enteral agressiva. �UADRO CLÍNICO ❖ Primeiras 2 semanas de vida: ➢ Primeiros sinais da doença são inespecíficos: Letargia, instabilidade térmica (sinais de sepse). ➢ Específicos do TGI: Distensão abdominal, resíduo gástrico, eritema de parede abdominal. ➢ Progressão: Peritonite, sepse, óbito. DIAGNÓSTICO ❖ Confirmação do diagnóstico: Radiografia de abdome. Pneumatose intestinal (ar em volta da mucosa do intestino), aerobilia (ar dentro das vias biliares) e pneumoperitônio. TRATAMENTO ❖ Suporte para prevenir novas lesões: ➢ Jejum + Sonda Aberta (7-10 dias). ➢ Fluidoterapia/Nutrição parenteral; ➢ Antibioticoterapia: Gram positivos, gram negativos e anaeróbios. ❖ Suporte hemodinâmico (se necessário). ❖ Tratamento cirúrgico: ➢ Perfuração intestinal (pneumoperitônio). ➢ Paracentese abdominal positiva (fezes na cavidade ou bacterioscopia/cultura positiva). ➢ Ausência de melhora com o tratamento clínico. Hemorragia Intracraniana Resultado de trauma, asfixia, alterações hematológicas, etc. A hemorragia intraventricular é a forma mais comum de hemorragia intracraniana, sendo mais comum em RNPT pela fragilidade vascular. MATRIZ GERMINATIVA SUBEPENDIMÁRIA ❖ Localização periventricular. ❖ Região de origem de neurônios ependimários e células gliais. ❖ Altamente vascularizada: Vasos IMATUROS (tecido de sustentação frouxo). ❖ Involui com o amadurecimento - tecido de sustentação se torna mais forte - Incomum em RN a termo. FISIOPATOLOGIA ❖ Maior fragilidade vascular do RNPT. ❖ Fatores hemodinâmicos intrínsecos: alteração da autorregulação da pressão cerebral. ❖ Fatores extrínsecos: Redução do fluxo (asfixia perinatal) ou aumento do fluxo (drogas vasoativas, fluídos). *Redução na incidência: Uso mais frequente de corticoide materno, melhora na assistência neonatal. *A hemorragia intracraniana tem início já no primeiro dia de vida, com evolução progressiva assintomática. DIAGNÓSTICO ❖ Como é frequentemente assintomática: Triagem com USG transfontanela. ❖ Todos os prematuros com IG < 34 semanas. TRATAMENTO E PROGNÓSTICO ❖ Tratamento: Manejo das complicações (convulsões, anemia, etc). ❖ Prevenção: Corticoide materno antenatal, entre 24-34 semanas, manipulação mínima. ❖ Prognóstico: ➢ Graus I e II: Maioria com desenvolvimento neurológico normal. ➢ Graus III e IV: Pior prognóstico - ECNE (Encefalite crônica não-evolutiva)/Paralisia Cerebral. ➢ A hemorragia intracraniana evolui para leucomalácia periventricular - formação de cistos, com perda de parênquima, onde ocorreu a hemorragia. Retinopatia da Prematuridade Trata-se de uma doença vasoproliferativa secundária à vascularização inadequada da retina imatura dos RNs prematuros (entre 31-36 semanas). É caracterizada inicialmente pela parada na vascularização normal que ativa mecanismos compensatórios que culminam com uma neovascularização anormal da retina. Está diretamente ligada ao uso exagerado de O2 em prematuros, tendo sua incidência aumentada atualmente pelo aumento da sobrevida de RNs de muito baixo peso, que apresentam maior risco de ROP. É uma das principais causas de cegueira e baixa visão infantil no mundo. Fatores de risco: ❖ Prematuridade. ❖ Baixo peso ao nascer. ❖ Flutuação do nível de O2 nas primeiras semanas de vida. ❖ RN pequeno para a IG. ❖ Hemorragia intraventricular. ❖ Hiperglicemia. ❖ Sepse neonatal tardia. ❖ Transfusões sanguíneas neonatais. DIAGNÓSTICO A triagem oftalmológica é realizada com exames de fundo de olho. É feita em: ❖ Todos os prematuros com peso de nascimento <1500g e/ou ❖ Prematuros com IG < ou = 32 semanas. ❖ RN com IG maior, porém com hemorragia intraventricular ou sepse ou síndrome do desconforto respiratório. O exame deve ser realizado com dilatação das pupilas entre 4-6 semanas de vida. O fundo de olho permite classificar a ROP de acordo com a localização, extensão e gravidade. ❖ Estágios 1-3: Regressão espontânea, sem efeitos residuais na visão. ❖ Estágios 4-5: Geralmente evoluem para a cegueira. TRATAMENTO ❖ Crioterapia ❖ Fotocoagulação a laser - maior índice de regressão da doença, menos complicações e sequelas a longo prazo. Indicada já nos estágios iniciais da doença. ❖ Cirurgia Vitreorretiniana: Indicada para o estágio 5 e tem resultado funcional e anatômico insatisfatório em geral, mesmo realizado no estágio 4. As crianças submetidas ao tratamento da ROP apresentam maior risco de erros refracionais e alterações da motilidade extrínseca ocular, devendo ser acompanhadas de perto nos primeiros 5 anos de vida.
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