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Geovana Sanches, TXXIV MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS NO IDOSO INTRODUÇÃO O cuidado de idosos na prática clínica exige a habilidade de avaliar a interação das diversas patologias agudas e crônicas que acometem esse grupo populacional e que, muitas vezes, apresentam-se de modo atípico. O reconhecimento precoce desses quadros atípicos reflete em um melhor prognóstico, tendo em vista que adianta o diagnóstico e as intervenções necessárias. CONCEITOS Idosos No Brasil, consideram-se idosos os indivíduos com mais de 60 anos de idade. Idosos jovens • Entre 60 e 79 anos Muito idosos • Acima dos 80 anos • População que mais cresce no Brasil • Maior probabilidade de apresentar fragilidade, distúrbios cognitivos, múltiplas doenças crônicas e incapacidades Multimorbidade • > 2 doenças cônicas Doença índice • Condição principal em estudo Comorbidades • Uma ou mais doenças agudas ou crônicas que coexistem no momento do diagnóstico da doença índice SÍNDROME GERIÁTRICA O termo síndrome geriátrico é utilizado para definir as condições clínicas comuns entre pacientes idosos que não se enquadram em categorias distintas de doenças. Nas faixas etárias mais avançadas, elas geralmente são resultado de múltiplos processos patogênicos que interagem entre si (multimorbidade). Classificações • Delirium • Demência • Quedas • Fragilidade • Incontinência • Imobilidade • Úlceras por pressão • Iatrogenia APRESENTAÇÕES ATÍPICAS Os sinais e sintomas atípicos e/ou ausentes são sempre possíveis de ocorrer na prática clínica, principalmente quando o paciente apresenta multimorbidade, polifarmácia, incapacidade funcional, é frágil e está imunodeprimido. Por isso, é comum que isso ocorra com pacientes mais idosos, pois estes têm maiores probabilidades de apresentar essas características do que pacientes mais jovens. A multimorbidade é um fator contribuinte muito importante, pois uma doença pode mascarar, impedir, atenuar ou alterar as manifestações de outras. A apresentação atípica, embora composta de sinais e sintomas não clássicos de uma doença, traz pistas de uma ou mais enfermidades que podem estar envolvidas no processo. Fatores predisponentes • Idade avançada • Diminuição da reserva funcional dos órgãos e sistemas • Incapacidade de manter a homeostase • Percepções equivocadas sobre o envelhecimento o Muitas vezes os idosos e seus familiares atribuem um novo quadro clínico à velhice e deixam de reportá-los aos seus médicos • Multimorbidade • Incapacidade funcional • Deficiência cognitiva • Polifarmácia • Fragilidade Sinais de alerta • Mudanças cognitivas e delirium • Sensação de desconforto ou de que algo não está bem • Astenia • Anorexia • Quedas recorrentes • Perdas de capacidade funcional e em atividades de vida diária • Instalação de incontinência urinária • Taquipneia • Alterações de mais ou menos 2ºC da temperatura basal Geovana Sanches, TXXIV INFECÇÕES As doenças infecciosas são responsáveis por significativa parcela de morbidade e mortalidade em idosos. Atinge particularmente a população “muito idosa”, pois estes apresentam mais comumente resposta imune inata reduzida e sobreposição de doenças. Dentre os sinais e sintomas atípicos estão: (1) delirium ou estado confusional agudo; (2) astenia; (3) anorexia; (4) quedas; (5) alterações cognitivas; (6) taquipneia. Dentre eles, o delirium é um dos mais importantes sinais de alerta e de sintomatologia atípica desencadeada por infecções em idosos. Febre • Alteração da termorregulação corporal • Temperatura média basal e de febre se alteram progressivamente durante o envelhecer o Causas: sarcopenia, desnutrição, imobilidade, diabetes mellitus, doenças neurológicas, fármacos Regra de Roghmann • Decréscimo de 0,15ºC a cada década de vida na temperatura basal média • Septuagenários: temperatura basal média de 36ºC o 36,8º (20 anos de idade) - 0,75 (5 décadas x 0,15º) Critério de Yoshikawa e Norman • Febre: aumentos > 1,1ºC da temperatura basal em idosos • Caso a temperatura basal média do paciente seja 36ºC, valores > 37,1ºC já são definidos como estado febril Pneumonia • Sintoma mais comum: delirium • Dificilmente há febre e tosse o Termorregulação o Reflexo da tosse diminuído Infecções do SNC • Meningite • Rigidez de nuca prejudicada em idosos com alterações da coluna vertebral ou com Parkinson AIDS • Cogitar em quadros demenciais, confusionais ou com sinais localizatórios Doenças infectoparasitárias • Anemia, inapetência e emagrecimento o Solicitar exame de fezes parasitológico Tuberculose • Comum as formas extrapulmonares Tétano • Menor percentual de vacinação em idosos Hepatites virais • Sinais de colestase • Menor elevação de enzimas hepáticas DOENÇAS CARDIOVASCULARES As doenças cardiovasculares são muito prevalentes na população idosa, sejam elas sintomáticas ou não. O diagnóstico clínico das cardiopatias não segue o mesmo padrão de indivíduos jovens pois: (1) Mesmo com as alterações relacionadas ao envelhecimento, a maioria dos idosos mantém débito cardíaco adequado em condições basais de atividade física. Todavia, diante quadro de estresse, estão sujeitos a descompensações; (2) Há manifestações atípicas relacionadas com a sobreposição de outras doenças. Insuficiência cardíaca • Acomete ao menos 50% dos idosos com mais de 80 anos • Sintomas inespecíficos: confusão mental, depressão, fadiga, perda de peso, imobilidade • Importante avaliação ecocardiográfica Classificação • Insuficiência cardíaca sistólica o Mesmo padrão o Piora progressiva da sintomatologia diurna o Dispneia paroxística noturna • Insuficiência cardíaca diastólica o Mais comum nessa faixa etária o Propensa à instalação abrupta de sintomas Insuficiência coronariana • Idade à fator de risco independente para doença arterial coronariana o 60% das mortes súbitas atribuídas ao IAM ocorrem em indivíduos > 75 anos o Manifestações atípicas contribuem para a alta mortalidade Sintomas • Dispneia súbita ou piora da dispneia SEM dor torácica associada o Pode ser o primeiro sintoma o Redução da sensibilidade visceral Geovana Sanches, TXXIV o Aumento no limiar de dor • Outros o Confusão mental o Vertigem o Síncope o Epigastralgias Arritimias As deformidades torácicas próprias do envelhecer, como cifoses e escolioses, dificultam a ausculta cardíaca em muitos pacientes idosos. Assim, devemos ter especial atenção nesse grupo populacional. • Fibrilação atrial crônica o Presente em aproximadamente 5% dos idosos o Primeira manifestação pode ser ataques isquêmicos transitórios ou AVEs com elevado grau de mortbimortalidade o Ausência de sístole atrial à enchimento ventricular diastólico à precipita ou agrava quadros de IC diastólica • ICC secundária a taquiarritmias, em especial à fibrilação atrial o Suspeita em situações de declínio cognitivo recente ou perda da capacidade nas atividades de vida diária • Bradicardia o Sintomatologia vaga, com tonturas, síncopes e turvação da visão o Aferir o pulso arterial por ao menos 1 minuto o Na ausência de outras causas para os sintomas, realizar um Holter Hipertensão arterial • Sempre analisar possíveis associações medicamentosas ou doenças com potencial de interferir no valor médio da pressão arterial. • PA elevada na ausência de lesão em órgãos-alvo sugere pseudo-hipertensão em idosos o Importância da manobra de Osler § Artérias palpáveis mesmo em valores pressóricos maiores do que o estimado como sistólico • Paciente com PAS elevada e PAD baixa merece investigação para insuficiência aórtica, valvopatia de difícil ausculta pela característica do sopro e pelas alterações torácicas comuns no idoso Hipotensão • Sintomas o Tontura o Síncope o Quedas • Mensurar a pressão em ao menos 2 posições(deitado + sentado ou em pé) o Diferença de 20mmHg na PAS e/ou 10mmHg na PAD associado ao relato dos sintomas confirma hipotensão postural EMBOLISMO PULMONAR O embolismo pulmonar é uma das principais causas de morte não definidas clinicamente em idosos Sintomatologia • Dispneia, taquicardia e taquipneia • Ausência de dor torácica (ou menor intensidade) como manifestação primária • Síncopes, cianose, hipoxemia • Quedas, delirium, declínio cognitivo Fatores de risco Mais relatados em idosos • Obesidade o IMC > 27 kg/m2 • Imobilidade o Dois ou mais dias acamado nas 2 semanas que antecederam a avaliação • Neoplasias • Antecedentes de trombose venosa ou embolismo pulmonar Risco equivalente às demais faixas etárias • Pós-operatório o até 6 semanas • Insuficiência cardíaca • Doença pulmonar obstrutiva crônica • Traumas nos últimos 3 meses • Viagens prolongadas o > 6 horas em 1 semana Diagnóstico • Eletrocardiograma o S1Q3/S1Q3T3 encontrado em apenas 4,5 a 14% dos pacientes • Radiografia de tórax o Cardiomegalia, derrame pleural e atelectasias, embora não específicos, são observados em Geovana Sanches, TXXIV mais de 50% dos idosos com EP e complementam outros dados para o diagnóstico final • Gasometria arterial o Hipoxemia, hipocapnia e aumento de gradiente alvéolo-arterial de oxigênio é encontrado em 30 a 60% dos casos • Ecocardiograma o Revela anormalidade em câmaras direitas do coração em 50% dos casos • Dímero-D o Efetividade questionável o Douma: multiplica-se a idade do paciente por 10 para definir, em mg/L, o valor de corte do dímero-D para pacientes com mais de 50 anos • Angiotomografia pulmonar helicoidal o Exame de grande valia o Cuidado com a função renal ABDOME AGUDO A dor abdominal é uma das principais causas de procura aos serviços de emergência e acompanha um risco elevado, chegando a 10% de mortalidade. A imunossenescência reduz a capacidade de reação a infecções, assim como a perda progressiva da eficiência das barreiras naturais como pele e mucosas. Associa-se a esse quadro a diminuição da percepção dolorosa. Geralmente, o exame físico é pobre e os exames laboratoriais normais ou pouco alterados. Quadro clínico • Ausência de febre • Queixas generalizadas o Alterações da consciência e atenção o Confusão mental o Dor difusa o Dor torácica o Fadiga o Sensação de debilidade o Taquipneia o Taquicardia o Declínio funcional • Exame físico do abdome pode não apresentar dor e reação peritoneal o Flacidez abdominal, mesmo na presença de patologias Investigação Devem-se avaliar quatro grandes categorias: • Infecção • Obstrução mecânica o Intestino delgado: hérnias (aderências), neoplasias, cálculos biliares o Intestino grosso: neoplasias, divertículos, vólvulo • Doença vascular • Dor abdominal não específica Condições extra-abdominais também podem provocar dor abdominal. Todas elas têm prevalência aumentada com a idade, e quanto mais velho é o paciente, maior a chance de uma doença apresentar manifestações em outro sistema ou aparelho diferente do seu local de acometimento. Exames complementares • Exames laboratoriais sem grandes alterações • Raio-X de abdome o Presença de ar na cavidade abdominal e vísceras o Sinais de obstrução o Calcificações da Aorta o Presença de corpos estranhos • Ultrassonografia o Aneurisma de Aorta o Doença biliar o Doença pélvica • Angiografia abdominal o Exame invasivo e potencialmente nefrotóxico à cautela com pacientes idosos o Isquemia aguda mesentérica o Aneurisma de Aorta DIABETES MELLITUS O diabetes mellitus é uma doença de grande prevalência no idoso, sendo a apresentação vaga, atípica e silenciosa frequente. Diante da dificuldade no diagnóstico precoce, orienta-se a realização de glicemia de jejum para rastreio, pois com a detecção precoce é possível prevenir ou retardar as complicações tardias, evitar perdas funcionais e garantir a qualidade de vida ao idoso. Sinais e sintomas atípicos • Incontinência urinária ou ITU reincidente Geovana Sanches, TXXIV • Fadiga • Perda de peso • Tontura • Quedas • Declínio cognitivo • Depressão • Fraqueza muscular • Sintomas de neuropatia periférica • Alterações no nível de consciência o Cetoacidose o Quadro hiperosmolar o Alta mortalidade Associação com outras síndromes geriátricas • Incontinência • Instabilidade postural e quedas o Pode ser decorrente de neuropatias, vasculopatias e deficiências visuais • Demência e Delirium • Depressão • Imobilidade • Fragilidade • Polifarmácia com iatrogenia • Sarcopenia o Efeito da resistência insulínica TIREOIDOPATIAS Hipertireoidismo • Apatia • Fragilidade • Desânimo • Fadiga • Alterações de trânsito intestinal • Anorexia, perda de apetite • Fraqueza muscular proximal • Miopatia • Osteoporose e acropaquia tireóidea, edema e hipocratismo • Predomínio de queixas cardiovasculares o Insuficiência cardíaca, fibrilação atrial, angina de recente começo • Pode desencadear ou piorar quadros de IC, doença arterial coronariana e fibrilação atrial Hipotireoidismo Com o envelhecimento, pode ocorrer resistência relativa à ação do hormônio tireoidiano. Todavia, a apresentação mais comum do hipotireoidismo é subclínica. • Instalação insidiosa • Alteração de peso e ânimo • Disfunção cognitiva (confusão e agitação) • Alterações reumatológicas o Poliartralgia e poliartrite simétrica em joelhos, tornozelos, punhos, metacarpofalangeanas e interfalangeanas proximais o Dor nos tendões flexores da mão o Síndrome do túnel do carpo • Caibras • Anorexia • Por aumento do TSH o Pele seca, perda de memória, pensamento lentificado, fraqueza muscular, fadiga, caibra, intolerância ao frio, obstipação intestinal e alterações da voz HIPERPARATIREOIDISMO • Fadiga • Disfunção cognitiva • Instabilidade emocional • Anorexia • Constipação • Hipertensão NEOPLASIAS • Inapetência • Perda de peso não intencional e síndrome consumptiva • Fadiga e anemia • Depressão e disfunção cognitiva • Desnutrição e caquexia • Fragilidade • Quedas, declínio funcional e imobilidade • Alteração do trânsito intestinal e massas • Dor, artralgia e síndromes paraneoplásicas com neuropatias • Alterações endócrinas e hidroeletrolíticas • Metástases DELIRIUM O delirium (ou estado confusional agudo) é uma manifestação neuropsiquiátrica de doença orgânica, que acomete principalmente os pacientes idosos, especialmente se hospitalizados. Não apresenta uma etiologia específica e é caracterizada pela presença simultânea de perturbações da consciência, atenção, percepção, pensamento, memória, comportamento psicomotor, emoções e ritmo sono-vigília. A duração e a gravidade são variáveis. Geovana Sanches, TXXIV Essa síndrome geriátrica é muito importante não apenas pela frequência, mas também porque, muitas vezes, constitui a única ou a principal forma de apresentação de uma doença física potencialmente grave no idoso. Quadro clínico • Largo espectro de disfunção cerebral • Início agudo e curso flutuante • No idoso, pode ser insidioso, precedido de alguns dias por manifestações prodrômicas como diminuição da concentração, irritabilidade, insônia, pesadelos ou alucinações transitórias • Pensamento o Vago e fragmentado o Varia de lento a acelerado o Sem lógica e coerências nas formas graves • Memória o Comprometida o Associada ao prejuízo da atenção e nível de consciência • Sensopercepção o Ilusões e alucinações visuais o Transitório • Orientação o Comprometida na forma temporo- espacial • Linguagem o Disnomias o Disgrafias • Atenção o Dificuldade em manter-se atento • Estado de alerta o Reduzido o Aumentado • Comportamento psicomotor o Hiperativo o Hipoativo
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