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LEGISLAÇÃO CIVIL E PENAL E IMPLICAÇÕES FORENSES 2 Faculdade de Minas 2 SUMÁRIO 1 LEGISLAÇÃO CIVIL E PENAL E IMPLICAÇÕES FORENSES ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ..................................................................................................... 4 1.1 GENERALIDADES HISTÓRIA DO CONCEITO ..................................... 9 1.2 CLASSIFICAÇÃO ............................................................................... 13 2 ASPECTOS JURÍDICOS ELEMENTOS DO CRIME .................................. 19 2.1. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE PENAL ................................. 20 2.2. CONCEITO DE IMPUTABILIDADE PENAL ........................................ 21 2.3 ASPECTOS DA PSICOPATOLOGIA FORENSE CONDUTA CRIMINOSA DOS PSICOPATAS ......................................................................... 23 3. PERTUBAÇÃO DA SAÚDE MENTAL: CAPACIDADE DE IMPUTAÇÃO DO PSICOPATA ............................................................................................................. 26 3.1. PENA E MEDIDA DE SEGURANÇA PENA ........................................ 28 3.2 PRESSUPOSTOS PARA A APLICAÇÃO, IMPOSIÇÃO E ESPÉCIES DA MEDIDA DE SEGURANÇA. ................................................................................. 29 3.3 PSICOPATAS: QUAL A SANÇÃO IDEAL? .......................................... 30 4 CRIMINOSOS EM SÉRIE .......................................................................... 31 4.1 – DECISÕES JUDICIAIS VERSUS LAUDOS MÉDICOS .................... 32 REFERENCIas .............................................................................................. 34 3 Faculdade de Minas 3 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós- Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 4 Faculdade de Minas 4 1 LEGISLAÇÃO CIVIL E PENAL E IMPLICAÇÕES FORENSES ASPECTOS INTRODUTÓRIOS A ideia de que as pessoas que perdessem a razão deveriam ter um tratamento legal diferente das demais é bem antiga na história de humanidade. Antes dos gregos, há inúmeras referências às doenças mentais e aos enfermos da mente, mas tais fontes não se referem à sua responsabilidade penal ou à capacidade civil. O Código de Hamurabi e as Leis de Manu falam de doentes e de médicos, mas não versam sobre temas de psiquiatria forense. FONTE: Google imagens – acesso em 04/11/2020 De maneira geral, esse tipo de paciente não era visto como doente, mas como possuído por entidades malignas. Assim, não poderia ser objeto de cuidados legais. Os gregos – de Hipócrates em diante – dissertaram sobre doenças mentais, mas se omitiram em relação aos assuntos legais que pudessem vir a suscitar. Os fatos ocorreram de maneira diferente em Roma. Diferentemente dos gregos, os romanos 5 Faculdade de Minas 5 foram um povo legalista que deixou um monumento legal, o direito romano. Os doentes mentais, divididos em furiosos, alienados e mentecaptos, passaram a ter tratamento jurídico, tanto penal quanto civil. Os médicos romanos – como Celso, Areteu e Galeno, os quais deixaram obras que traduziam o pensamento científico da época – dissertaram sobre doenças mentais, mas não trataram dos aspectos jurídicos envolvidos no comportamento dos enfermos. Ainda que as leis de Justiniano tratassem desse tema no Corpus juris civilis, na Pandectas e nas Instituta, e que tenham sido elaboradas algumas normas legais (principalmente civis), a influência crescente do Cristianismo acabou eclipsando a ideia de que os que perderam a razão eram doentes. A demonologia cristã predominou, e os doentes mentais passaram a ser considerados energúmenos (endemoniados) e, por isso, sem qualquer direito ou reconhecimento legal. A história mostrou o que sucedeu a bruxas, feiticeiras e possuídas pelo demônio. Podemos considerar que houve um interregno, durante a Idade Média, nas ideias místicas que dominaram a medicina, sobretudo pela atividade de médicos árabes e judeus durante o domínio islâmico na Espanha, no norte da África e no Oriente Médio. Entretanto, Avicena, Averróis e Maimônides, apesar das excelentes descrições de doenças, não cuidaram dos aspectos jurídicos por elas suscitados.8 Assim, até o fim do século XVIII, não se pode falar em medicina forense e, muito menos, em psiquiatria forense. O advento do Iluminismo, tanto o francês quanto o alemão, do Racionalismo e dos ideais que foram consubstanciados na Revolução Francesa e na Revolução Industrial não poderia deixar de atingir a medicina e particularmente a psiquiatria. Ao longo do século XVIII se dá o reconhecimento de que os doentes mentais não eram endemoniados – as últimas feiticeiras foram queimadas em 1715 –, sem, contudo, passarem a ter o status de doentes, ainda que da razão. 6 Faculdade de Minas 6 Passaram a ser considerados marginais (à margem da sociedade), já que não produziam nem criavam riquezas. Eram assemelhados aos bandidos e às prostitutas. O máximo que por eles se fazia era recolhê-los em grandes instituições com os demais. As questões legais que suscitavam eram resolvidas pelos procuradores de justiça e pelos juízes, sem qualquer interferência médica. Quando foram libertados das prisões (na verdade, grandes casas de recolhimento dos marginais sociais) e enviados para hospitais, ainda não havia o reconhecimento de questões como capacidade civil e responsabilidade penal. A partir daí, aos poucos, foi se erguendo o edifício da psiquiatria forense, em particular na França e na Itália, mas também na Inglaterra e na Alemanha. Na atualidade, por meio do exame pericial psiquiátrico, a psiquiatria forense, a partir de psiquiatras forenses, é convocada a intervir em um sem-número de casos na interface entre psiquiatria e direito, desde temas penais (como responsabilidade penal, superveniência de doença mental e periculosidade), passando por questões cíveis (capacidade civil em geral e disputas em direito de família), chegando a discussões nos âmbitos administrativo, trabalhista e previdenciário, sempre que a saúde mental de uma das partes envolvidas for de interesse para a solução da causa. Alguns pressupostos básicos da psiquiatria forense Pelo menos três conceitos filosóficos e legais são indispensáveis para o exercício da psiquiatria forense: entendimento, determinação e discernimento. As capacidades de entendimento e de determinação decompõem-se em um número considerável de faculdades, tanto intelectivas quanto volitivas. Tais faculdades encontram-se de tal maneira entrelaçadas no espírito humano que seria bastante artificial apontar com rigidez quais são pertencentes à intelecção e quais são à conação. Assim, é preferível estudar de maneira exaustiva e abrangente um elenco 7 Faculdade de Minas 7 dessas faculdades, sem discriminar as pertencentes a uma ou a outradas categorias citadas. A posse, plena ou limitada, da capacidade de entendimento ou de determinação por parte de alguém só pode ser corretamente avaliada após detido exame de uma série de atributos cognitivos, volitivos e valorativos que, em seu conjunto, formam aquelas capacidades. Considerando-se a vastidão e a incomensurabilidade da mente humana, não é necessário que todas as qualificações sejam pesquisadas. A complexidade de uma ação cometida – seja uma infração penal, seja o exercício pessoal de atos da vida civil –, suas circunstâncias, seus antecedentes, seus concomitantes e consequentes é que ditarão o número razoável de faculdades a serem investigadas. Essa análise consistirá em determinar se cada uma dessas propriedades está indene (normal), prejudicada (diminuída ou reduzida) ou, até mesmo, suprimida. Percebe -se, assim, a existência de uma gradação, e a apreciação quantitativa só se torna possível diante de um caso particular. Portanto, entre outras, devem ser perquiridas noções de: bem ou interesse juridicamente tutelado; antijuridicidade, dano efetivo ou lesão a bem ou interesse juridicamente tutelado; dano potencial ou perigo de lesão a um bem ou interesse juridicamente tutelado; violação do dever jurídico; violação de norma jurídica; condições de superveniência de um efeito lesivo; tipicidade penal; culpabilidade; imputabilidade; responsabilidade; exigibilidade de conduta; natureza delituosa de uma ação; imoralidade da conduta; perturbação da vida social; ataque às condições fundamentais da vida social; nocividade da ação ou omissão; associabilidade; quais ações ou omissões produzem resultados; disciplina social; causalidade; ato voluntário como causa; relação; nexo causal entre conduta e evento; eficácia ou eficiência da ação. 8 Faculdade de Minas 8 Devem-se investigar também: capacidade de juízo valorativo em geral; capacidade de juízo valorativo de culpabilidade; consciência de ilicitude da conduta; consciência de proibição da conduta; consciência de ilegitimidade da ação; presença de sentimentos de piedade; presença de sentimentos de probidade; consciência do desvalor social da ação; presença de vivência de censura; presença de sentimento de rebeldia; capacidade de distinção entre utilidade e prejuízo; presença de escala de valores; percepção da influência dos valores na experiência pessoal; capacidade de incorporação e desfazimento de valores; presença de valores espirituais; presença de sentimentos de comunidade, cooperação e coexistência; presença de sentimentos de independência social; presença de sentimento de solidariedade; percepção de reprovação social; vivência de relação de causalidade entre ação ou omissão e resultado; capacidade de previsibilidade do resultado da ação; capacidade de avaliação do ato a ser praticado; nível de inteligência; previsão da consequência dos atos; percepção da correspondência entre previsão e resultado; percepção da coerência entre os elementos componentes do ato; concordância entre antecedentes e consequentes do ato; presença de proporcionalidade; estado da volição; presença de intenção e animus; presença de deliberação; disposição de praticar todos os elementos componentes do ato; capacidade, imediata ou remota, de evitação de dor, desgosto ou sofrimento; capacidade de adequação e conveniência na busca do prazer; presença de sentimentos de liberdade e de autonomia; capacidade de opção e escolha; capacidade de adaptação; capacidade de advertência e prevenção. A integridade, ou não, do momento intelectivo (entendimento) e do momento volitivo (determinação) de uma ação humana é o objetivo da maioria dos exames periciais psiquiátricos. O discernimento vem a ser a conjugação das duas faculdades para o exercício de ato específico. 9 Faculdade de Minas 9 1.1 GENERALIDADES HISTÓRIA DO CONCEITO A evolução dos conceitos sobre a personalidade psicopática transcorreu, durante mais de um século, oscilando entre a bipolaridade orgânicapsicológica, passando à transitar também sobre as tendências sociais e parece ter aportado finalmente, numa idéia bio-psico-social que, senão a mais verdadeira, ao menos a mais sensata. Conceituar a personalidade psicopática, ou tão somente psicopata, é algo que vem preocupando tanto a Psiquiatria como o Direito, evidentemente essa preocupação contínua e perene existe porque sempre houve personalidades anormais como parte da população geral. O que houve primeiro foi a definição para a relação entre o crime e o criminoso e aquelas pessoas que se entendiam pré dispostas para o crime, os delinqüentes. O estudo da evolução da Criminalidade realizado por Lombroso, permite fixar o fio condutor desta ciência e as suas diretrizes atuais, além de estabelecer as bases para novos progressos. Lombroso ao efetuar estudos sobre o homem delinqüente, estabeleceu um tipo particular de indivíduo, definido pelos seus caracteres físicos e psíquicos e pela prática no crime, denominado: “Criminoso Nato”. A obra de Lombroso foi continuada pela chamada “Escola de Antropologia Criminal de Roma”, a qual remodelou o conceito do “Criminoso Personalidade Psicopática definindo assim, a “Constituição Delinqüencial”, grupo biológico, com a característica fundamental da predisposição ao delito, essência esta, de uma personalidade, alcançando assim, o conceito comparável aos das personalidades psicopáticas. A “Escola de Graz” salienta a importância de dois fatores, determinantes da vida psíquica de cada indivíduo: o terreno (constituição biológica individual) e o ambiente. Admite uma tendência criminógena, transmissível por hereditariedade, com 10 Faculdade de Minas 10 disposições instintivas que levam determinado indivíduo, mais facilmente do que outros, a entrar em conflitos com as leis penais. A concepção do “Criminoso Nato” de Lombroso e da “Constituição Delinqüencial” da Escola de Antropologia Criminal de Roma refere-se a um tipo peculiar de indivíduos, com características próprias, predispostas especificamente para o crime. Entre essa peculiaridade de indivíduos criminosos está a personalidade psicopática. São “indivíduos fronteiriços” que se separam do grosso da população em termos de comportamento, conduta moral e ética. Girolano Cardamo, professor de Medicina da Universidade de Pavia, retratou uma das primeiras descrições registradas pela Medicina sobre algum comportamento que pudesse se identificar à idéia de personalidade psicopática. Neste relato, Cardamo falou em “Improbidade”, quadro que não alcançava a insanidade total, porque as pessoas que padeciam dessa “Improbidade” mantinham a aptidão para dirigir sua vontade. Pablo Zacchias, considerado por alguns como fundador da Psiquiatria Médico Legal, descreve, em Questões Médico Legais, as mais notáveis concepções, as quais logo resultariam significado às “Psicopatias” e aos “Transtornos de Personalidade”. Em 1801, Philippe Pinel publica seu Tratado Médico Filosófico sobre a Alienação Mental e descreve que os loucos em nenhum momento, sofrem de um prejuízo de seu entendimento, e que estavam sempre dominados por uma espécie de furor instintivo, como se o único dano fosse em suas faculdades instintivas. Prichard, em 1835, designou a expressão “Insanidade Moral”, para caracterizar a conduta anti- social e a falta do senso ético de certos criminosos e afirmava que existiam insanidades sem o comprometimento intelectual, mas possivelmente com prejuízo afetivo e volitivo (da vontade); esta denominação igualou-se ao atual conceito de psicopatia. 11 Faculdade de Minas 11 Em 1888, é definida pela primeira vez uma insanidade como inferioridade psicopática, mas foi em 1896 que surgiu o termo “Personalidade Psicopática”, esta designada por Kraepelin, o qual, trouxe átona o debate científico, relacionando assim, anomalias ou transtornos psíquicoscom o cometimento do crime. No ano de 1923, Kurt Schneider, em sua obra Personalidades Psicopáticas define:1 “Personalidades psicopáticas são as anormais, que sofrem por sua anormalidade ou fazem sofrer a sociedade”. 1 Kurt Schneider, Personalidades Psicopáticas, 1923 Frase esta criticada por José Alves Garcia, em sua obra Psicopatologia Forense, onde qualificou a definição de Kurt Schneider como irrelevante. Pode-se destacar nelas certas características e propriedades que as definem de maneira nada comparável aos sintomas de outras doenças. A concepção de Schneider traz um certo determinismo, porque define o psicopata, portador de uma personalidade estranha, separada de seu meio. A psicopatia, portanto não é exógena, sua essência é constitucional e inata. Schneider englobou no conceito de personalidade psicopática todos os desvios da normalidade, não suficientes para serem considerados doenças mentais francas, incluindo nesses tipos, também aquele que hoje se entende por sociopata (psicopatia). Muito mais tarde Mira y López conceitua a Personalidade psicopática: “Personalidade mal estruturada, predisposta à desarmonia intrapsíquica, que tem menos capacidade que a maioria dos membros de sua idade, sexo e cultura para adaptar-se às exigências da vida social”. Em 1941, Cleckley escreveu um livro chamado “A Máscara da Saúde”, o qual se referia a este tipo de criminosos. Em 1964 descreveu as características mais 12 Faculdade de Minas 12 freqüentes do que hoje é chamado de psicopata. Na década de 60, Karpmam afirmou:3 2 Mira y López 3 Karpmam, 1961 “Dentro dos psicopatas há dois grandes grupos; os depredadores e os parasitas”. Os depredadores são aqueles que tomam as coisas pela força e os parasitas tomam-nas através da astúcia . Outros autores, mais precisamente nas décadas de 60 e 70, foram também definindo os traços característicos da psicopatia com termos tais como; perturbações afetivas, perturbações do instinto, deficiência superegóica, tendência a viver somente o presente, baixa tolerância e frustrações. Alguns classificam esse transtorno como anomalias do caráter e da personalidade, ressaltando sempre a impulsividade e a propensão para condutas anti-sociais. Conceito atual As divergências, ainda hoje, existem, entre os que defendem a origem desses desvios em certa predisposição constitucional, os que sustentam encontrar a causa nas deficiências funcionais do cérebro e aqueles que admitem que os desvios se originam em possíveis rejeições sofridas pela criança nos primeiros anos de vida. A personalidade está sujeita, entretanto, a transtornos em seu desenvolvimento e em sua continuidade, quando se evidenciam as hipóteses dos seus desdobramentos , como na identidade; quando ocorrem transtornos da relação da pessoa com o mundo exterior; transtornos da percepção, como os estados depressivos e obsessivos, enfim uma infinidade existente de desvios de personalidade, com profundos reflexos em todo o comportamento do indivíduo e, evidentemente, com suas conseqüências na esfera do mundo jurídico. O renomado Nélson Hungria define os psicopatas como: “Portadores de psicopatias a escala de transição entre psiquismo normal e as psicoses funcionais. 13 Faculdade de Minas 13 Seus portadores são uma mistura de caracteres normais e caracteres patológicos. São os inferiorizados ou degenerados psíquicos. Não se trata propriamente de doentes, mas de indivíduos cuja constituição é “ab initio”, formada de modo diverso da que corresponde ao “homo medius”. No entanto, em meio a tantas definições, a discussão atualmente não reflete só a preocupação de conceituar, mas sim a tentativa de buscar correlação entre a criminalidade e esse tipo de transtorno de personalidade. 4 Nélson Hungria, Conferência realizada na Sociedade Brasileira de Criminologia, em 29/09/1942 (apud Heitor Piedade Júnior. A Psicopatologia pesquisa sobre as doenças mentais, sua etiologia e sua classificação. Segundo Gerardo Vasconcelos5 , as causas mais freqüentes dos distúrbios mentais são: doenças em geral, endo-intoxicações, exo-intoxicações, infecções, herança psíquica, crenças e superstições, causas psíquicas, causas mecânicas, disposições individuais e fisiológicas. Os psicopatas estariam dentro das causas psíquicas, que são traumas, principalmente de causas emotivas, que em determinado momento desencadeiam um quadro patológico grave; e também das disposições individuais, que é a constituição, temperamento e caráter do indivíduo. Ou seja, como já foi falado, os psicopatas teriam defeitos de base constitucional e que ao longo de sua vida, fatores, como a impotência sexual, potencializariam esses defeitos. Lembrando que são incapazes de aprender por qualquer experiência vivida. 1.2 CLASSIFICAÇÃO Adotaremos a classificação dada por Flamínio Favero que seguindo os dispositivos legais, classificou os distúrbios psíquicos em: psicoses, insuficiências mentais ou oligofrenias, personalidades psicopáticas e neuroses. 5 Ob. cit. 6 Apud Gerardo Vasconcelos, ob. cit. Personalidade Psicopática – implicações forenses e médico-legais. 14 Faculdade de Minas 14 As psicoses envolvem os distúrbios qualitativos, orgânicos (psicoses endógenas e exógenas) e alguns psíquicos (desenvolvimentos delirantes); enquanto as demais referem-se aos distúrbios quantitativos. Os distúrbios qualitativos caracterizam-se pela alteração da qualidade, com surgimento de “algo novo” na vida psíquica do paciente, como por exemplo, vozes, pensamentos delirantes, visões. Os distúrbios quantitativos caracterizam-se pelo aumento ou diminuição de coisas consideradas normais até então; o que muda é a quantidade, como por exemplo as reações de um psicopata de personalidade explosiva, que bate na mulher porque esta não colocou o lixo para fora (há uma extrema desproporcionalidade entre o estímulo e a reação), ou o oligofrênico que não consegue ler, por pouca inteligência. 2.1 OS PSICOPATAS: CARACTERÍSTICAS FONTE: Google imagens – acesso em 05/11/2020 A personalidade traduz-se, na visão psicopatológica, na somatória das tendências somatopsíquicas da constituição do indivíduo e do meio ambiente com o qual interage. Daí cada um ter uma personalidade diferente. Quanto às personalidades psicopáticas, estas são marcadas por desajustamento social, 15 Faculdade de Minas 15 tendências de reação às normas, sem acomodação ao grupo, dificuldades de adaptação ao meio e de relações com os demais. São, desta forma, parte integrante do indivíduo, precocemente reveladas, e constantes em toda a sua existência. Caracterizada por perturbações constitucionais, transtornos da afetividade, dos instintos, do temperamento e do caráter, vão se intensificando com o desenvolvimento do indivíduo, tornando-se cada vez mais marcadas. Revela-se, assim, num distúrbio da conduta. Mas para um melhor entendimento desses indivíduos estão elencados abaixo os traços e características mais significantes: Encanto Superficial e Manipulação: nem todos os psicopatas são encantadores, mas é expressivo o grupo deles que utilizam o encanto pessoal e, consequentemente capacidade de manipulação das pessoas, como meio de sobrevivência social. O encanto, a sedução e a manipulação são fenômenos que se sucedem no psicopata, partindo do princípio que somente será possível manipular alguém se esse alguém foi antes seduzido; Mentiras Sistemáticas e Comportamento Fantasioso: o psicopata utiliza a mentira como uma “ferramenta de trabalho”. O psicopata não mente circunstancialmente ou esporadicamente para conseguir safar-se de alguma situação. É comum que o psicopata priorize algumas fantasias sobre circunstâncias reais. Esse indivíduo pode converter-se no personagem que sua imaginação cria como adequada para atuar no meio com sucesso, propondo a todos a sensaçãode que estão, de fato, em frente a um personagem verdadeiro; Ausência de Sentimentos Afetuosos: o criminoso psicopático não manifesta nenhuma inclinação ou sensibilidade por laços sentimentais habituais entre familiares. Além disso, eles têm grande dificuldade para entender os sentimentos das outras pessoas. Na realidade são pessoas extremamente frias, do ponto de vista emocional; Amoralidade: os psicopatas são portadores de grande 16 Faculdade de Minas 16 insensibilidade moral, faltando-lhes totalmente juízo e consciência morais, bem como noção de Impulsividade: a ausência de sentimentos éticos e altruístas, unidos à falta de sentimentos morais, impulsiona o psicopata a cometer brutalidades, crueldades e crimes. Essa impulsividade reflete também um baixo limiar de tolerância às frustrações, refletindo-se na desproporção entre estímulos e as respostas, ou seja, respondendo de forma exagerada diante de estímulos mínimos e triviais, contudo, demonstra uma absoluta falta de reação frente a estímulos importantes; Incorregibilidade: dificilmente ou nunca aceita os benefícios da reeducação, da advertência e da correção; Falta de Adaptação Social: desde os primeiros contatos, como por exemplo, na escola, na família, no trabalho, é manifestada uma tendência egocêntrica, logo, essa tendência se torna responsável pelas dificuldades de sociabilidade; A média da população de psicopata é de 1 a 4% em maior ou menor escala. A maioria das pessoas com distúrbios da personalidade antisocial não é criminosa e é capaz de se controlar dentro dos limites da tolerabilidade social. Eles são considerados somente como "socialmente perniciosos", ou têm personalidade odiosas. Observação muito bem feita pelo neurologista Henrique Del Nero: “Sofrer desse distúrbio não significa necessariamente que a pessoa seja ou se torne assassino.” Dentre as várias classificações de psicopatias, a de Kurt Schneider inaugurou uma posição original, clássica e revolucionária na caracterização do problema, estas classificações serão apresentadas a seguir: 17 Faculdade de Minas 17 1. Psicopatas Hipertímicos: indivíduos alegres, loquazes, despreocupados, otimistas, superficiais em seu trabalho e inclinados a escândalos e às desavenças conjugais. Propensos a cometerem crimes como brigas, disputas, estelionatos, entre outros. Possuem sexualidade exaltada. 2. Psicopatas Depressivos: indivíduos tranqüilos, melancólicos, permanentemente deprimidos e eternamente descontentes e ressentidos, ligados a uma consideração pessimista da vida, iniciada, às vezes, na juventude. 3. Psicopatas Anancásticos: inseguros, com ideação especial dominada por uma ação coativa ou fóbica que surge de improviso por estímulos desencadeantes insignificantes, às vezes, acompanhada por manifestações subjetivas de exaltação, produtora de intenso sofrimento ao indivíduo, como por exemplo, a possibilidade de matar o próprio filho. Alguns são sensitivos ou escrupulosos morais. 4. Psicopatas Fanáticos: indivíduos dominados pelo elemento expansivo e criativo que se aproximam da personalidade do paranóico. Possuem um elevado sentimento de si mesmo, luta sempre por uma finalidade qualquer e suas idéias são sempre prevalecentes ou supervaloradas. Querem impor sua verdade ao mundo. Não procuram ajuda médica de forma alguma 5. Psicopatas Lábeis de Estado de ânimo: irritáveis com extrema facilidade, seu estado de ânimo sofre oscilações imotivadas e desproporcionais. São sempre impulsivos e cometem crimes tais como roubo e abandono de trabalho. 6. Psicopatas Necessitados de Valorização: personalidade em que a ideação se ressente da exaltação da fantasia que, junto com o relaxamento de crítica, conduz à pseudologia fanática. Cometem agressões e estelionatos. 18 Faculdade de Minas 18 7. Psicopatas Explosivos: irritáveis e coléricos, podem cometer homicídios e lesões corporais pelo menor estímulo externo. São acometidos por amnésia no momento da contenda. Cometem atos de violência e crimes passionais. 8. Psicopatas Abúlicos: caracterizam-se pelo enfraquecimento da volição, da vontade. Por não possuírem vontade própria, são facilmente influenciáveis, absorvendo os bons e os maus exemplos de seu meio. Normalmente, envolvem-se com o crime através de jogos, roubos. 9. Psicopatas Astênicos: sensitivos, assustadiços, dominados pelo sentimento de incapacidade e de inferioridade que, junto a qualquer deficiência orgânica são acometidos de difuso sentimento de estranheza comparável a alguns estados dissociativos. São os únicos que possuem aspectos físico-corporais. Procuram com freqüência, ajuda médica. São cometedores de suicídios reiteradamente. 10. Psicopatas Desalmados: sem sensibilidade ética, e em geral, com embotamento afetivo, sem compaixão ou culpa, defeituosos morais, inimigos da sociedade, com tendência à delinqüência. Segundo o jurista e criminólogo, Jason Albergaria, os psicopatas que interessam à Criminologia são os tipos fundamentais, como por exemplo, os Hipertímicos, que tendem à difamação, à indolência e à fraude; os Fanáticos praticam o delito político; os Explosivos, os delitos contra a pessoa e os Abúlicos cometem furtos, fraudes e apropriações indébitas. 19 Faculdade de Minas 19 2 ASPECTOS JURÍDICOS ELEMENTOS DO CRIME Para uma ação humana ser considerada criminosa precisa corresponder objetivamente à conduta descrita pela lei, contrariando a ordem jurídica e incorrendo seu autor no juízo de censura ou reprovação social. Nesse sentido que Noronha diz: “Considera-se delito como um ação típica, antijurídica e culpável.” Isto quer dizer que para a norma penal os elementos do crime são a Tipicidade, a Ilicitude e a Culpabilidade. Tipicidade – O tipo é a descrição abstrata da ação proibida ou da ação permitida. A ação, também chamada conduta, compreende o comportamento humano, que pode ser comissivo ou omissivo. Exprime elementos essenciais da ação descrita, como por exemplo, se a ação é dolosa ou culposa. Abrange a ação com seus elementos objetivos e subjetivos, o resultado e até o objeto, quando for o caso. Ilicitude – Para que haja crime, exige-se que o fato material causado seja lesivo de interesses protegidos. É protegido todo fato que a lei penal manda fazer ou deixar de fazer sob pena de uma sanção. Uma ação pode ser típica, mas não ser ilícita, logo, não é criminosa por falta de um de seus elementos. “A reprovação pela prática de um fato lesivo a um interesse penalmente tutelado, que o agente quis ou a que deu causa por negligência, imprudência ou imperícia...” Já para Fragoso culpabilidade consiste reprovabilidade da conduta ilícita (típica e antijurídica) de quem tem capacidade genérica de entender e querer (imputabilidade) e podia, nas circunstâncias em que o fato ocorre, conhecer a sua ilicitude, sendo-lhe exigível comportamento que se ajuste ao direito...” Ou seja, é o nexo subjetivo que liga o crime ao seu autor, revestindo, no Direito Penal, as formas de dolo e culpa. 20 Faculdade de Minas 20 Dentro da culpabilidade existem os seguintes elementos: Imputabilidade, Possibilidade de Consciência do Injusto e Exigibilidade de Conduta conforme o Direito. Para o estudo em questão merece especial atenção a Imputabilidade, estudada no item a seguir. A culpabilidade possui a finalidade de aferir a capacidade de delinqüir do agente, então se faz necessário o exame da intensidade do dolo e o grau de culpa. A razão pela qual a vontade se determina é um outro requisito importante para determinar a periculosidade individual. Lembrando que tudo isso deverá ser muito bem analisado no momento da aplicação da sanção. Responsabilidade e imputabilidade são dois termos que não se desagregam, e a proximidade de sentido é tamanha que pode ser observada até mesmo no Código Penal, nadenominação do seu Título III, da Parte Geral. O Código atual, após a reforma de 1984, trata da imputabilidade nos artigos 26 a 28, enquanto no Código anterior à reforma tratava da responsabilidade nos artigos 22 a 24. Nas opiniões de dois juristas conhecidos há divergências, para Magalhães Noronha, responsabilidade e a imputabilidade são sinônimos, no entanto para Damásio11 : “...imputabilidade e responsabilidade não se confundem...” Mas, como dito acima, esses dois termos caminham juntos, sendo a imputabilidade um pressuposto, e a responsabilidade uma conseqüência, enfim, podemos dizer que a imputabilidade é a capacidade de poder ser responsabilizado pelo ato. 2.1. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE PENAL A responsabilidade diz respeito à possibilidade jurídica, portanto será decretada ou não pela justiça e deverá ser analisada cada caso. Segundo Magalhães Noronha, em seu livro Direito Penal, parte geral, a responsabilidade seria um dever de prestar contas, responsabilidade penal é a obrigação que alguém tem de arcar com as conseqüências jurídicas do crime. É o dever que tem a pessoa de prestar 21 Faculdade de Minas 21 contas de seu ato. Ela depende da imputabilidade do indivíduo, pois não pode sofrer as conseqüências do fato criminoso (ser responsabilizado) senão o que tem a consciência de sua antijuridicidade e quer executá-lo... A responsabilidade penal implica, então em atribuir certo ato considerado como crime a um indivíduo, que somente sofrerá a punição adequada a sua ação se tiver capacidade ( condições psíquicas, intelectovolitivas) de entender o caráter ilícito do ato praticado. 2.2. CONCEITO DE IMPUTABILIDADE PENAL O termo imputar vem do latim “imputare”, que significa atribuir a alguém responsabilidade de algo. No Código Penal não há um definição do que é imputabilidade, mas, prevê no artigo 26 as condições em que são possíveis o seu reconhecimento. Para Magalhães Noronha a imputabilidade é como “...o conjunto de requisitos pessoais que conferem ao indivíduo capacidade, para que, juridicamente, lhe possa ser atribuído um fato delituoso...” Desta forma, a imputabilidade diz respeito à capacidade do indivíduo ter um juízo de reprovação em relação a conduta criminosa, que possa entender a ilicitude do ato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, em linhas gerais é a capacidade de ter consciência se seu ato foi bom ou mau. 22 Faculdade de Minas 22 Critérios de avaliação Existem três critérios de avaliação da capacidade penal do indivíduo, o método biológico, o método psicológico, e o método biopsicológico. O critério adotado pela Legislação Brasileira é o critério que une os dois primeiros: o biopsicológico. – Método biológico: sem levar em consideração investigações minuciosas, o agente que possui uma enfermidade mental ou desenvolvimento mental deficiente, e ainda, perturbação transitória da mente, ser sempre considerado inimputável. Método psicológico: neste leva-se em consideração apenas as condições psíquicas do agente no momento do fato, sem se preocupar com existência de doença mental ou qualquer distúrbio psíquico. Método biopsicológico: é a união dos métodos acima mencionados, primeiramente verifica-se se o agente é doente mental ou tem desenvolvimento mental incompleto ou retardado, e se no momento da ação era incapaz de entendimento ou autodeterminação, ou seja, é necessário uma relação de causa consequência. De qualquer forma, deve o agente ser submetido ao exame de sanidade mental. No que se refere aos portadores de personalidade psicopática, que são os fronteiriços. 23 Faculdade de Minas 23 2.3 ASPECTOS DA PSICOPATOLOGIA FORENSE CONDUTA CRIMINOSA DOS PSICOPATAS A psicopatia é reconhecida precocemente em um indivíduo: ela começa na infância ou adolescência e continua na vida adulta (o diagnóstico é possível em torno de 15 a 16 anos). Crianças psicopatas manifestam tendências e comportamentos que são altamente indicativos de seu distúrbio. Por exemplo, eles são aparentemente imunes a punição dos pais, e não são afetados pela dor. Nada funciona para alterar seu comportamento indesejável, e consequentemente os pais geralmente desistem, o que faz a situação piorar. Os mais violentos mostram uma história de torturar pequenos animais quando eles eram crianças e também vandalismo, mentiras sistemáticas, roubo, agressão aos colegas da escola e desafio à autoridade dos pais e professores. No entanto, como já foi dito anteriormente apenas uma pequena fração dos psicopatas se desenvolve em criminosos violentos, como estupradores e assassinos . Os criminosos psicopatas praticam crimes , via de regra, por impulsos irresistíveis. São comuns nesses indivíduos, os atos incendiários, a perversão sexual, a mitomania, o cinismo, o homicídio, etc. No momento da ação ele se encontra desprovido de emoção, e mesmo depois não sente culpa, não há angústia ou conflito interno. A história registra casos de psicopatas que se tornaram celebridades. Um psicopata clássico foi Donatien-Alphonse-François de Sade (1740-1814), um nobre francês cujas preferências sexuais perversas e novelas (tais como Justine) originaram o termo sadismo; outro foi o do pintor italiano Michelangelo Merisi, o Caravaggio (1571-1610). Ele morreu, aos 39 anos, após uma atribulada vida de desajustes e crimes – além, clara, de uma da Personalidade Psicopática – implicações forenses e 24 Faculdade de Minas 24 médico-legais – Sabrina Veríssimo Pinheiro Nunes _mais importantes obras legadas à história da arte. No livro Loucos Egrégios, o médico Juan Antonio Vallejo-Nágera apontou vários indícios de que a obra de Caravaggio teria sido influenciada por seu comportamento anti-social. Ele chamou a atenção para alguns detalhes macabros da obra de Caravaggio. No quadro O Sacrifício de Isaac, observa a expressão fria do ancião enquanto este se prepara para sacrificar o próprio filho. Na opinião do pesquisador canadense Robert Hare, os criminosos psicopatas:15 “...são predadores intra-espécie que usam charme, manipulação, intimidação e violência para controlar os outros e para satisfazer suas próprias necessidades. Em sua falta de consciência e de sentimento pelos outros, eles tomam friamente aquilo que querem, violando as normas sociais sem o menor senso de culpa ou arrependimento. Os crimes cometidos por criminosos psicopatas mais violentos apresentam, pelo menos: multiplicidade de golpes, ausência de motivos plausíveis, ferocidade na execução, ausência de premeditação, instantaneidade na ação, falta de remorso. Entretanto, já é consenso entre os autores que o psicopata pode entrar em estado de estreitamento de consciência e, nesse estado, praticar os mais cruéis delitos, cujos atos, às vezes bem ordenados, podem até ser premeditados, mas é uma premeditação mórbida, doentia. E esses casos acabam causando polêmicas jurídicas, mormente quando, em vez da explosão momentânea, há premeditação e, posteriormente ao crime, condutas dissimuladoras, com ocultação do cadáver e fuga do criminoso, o que muitas vezes confunde autoridades, podendo parecer uma pessoa mentalmente normal. Exemplo disso são os assassinos em série, que premeditam, matam e despistam as autoridades. Aliás, o exemplo citado cima, o assassino em série ou serial (Serial Killer) 25 Faculdade de Minas 25 é um tipo especial de portador de personalidade psicopática, de extrema periculosidade e incorrigível. Relação direito e psicopatologia Após falarmos sobre as duas áreas de conhecimento podemos agora traçar um paralelo entre ambas, considerando diferenças e semelhanças que apresentam ao tratarem do doente mental; sobre aquilo que a Psicopatologia entende por doente mental e como o Código Penal o utiliza. Os distúrbios psíquicos se dividem em orgânicos:- causa conhecida : psicoses exógenas ou sintomáticas, por exemplo, infecção que causa alteração cerebral, diabetes, medicamentos, etc. - causa desconhecida: psicoses endógenas (são geneticamente determinadas e não têm cura); por exemplo, esquizofrenia, PMD, psicose epiléptica, etc. b) psíquicos – para a Psicopatologia estes são distúrbios psíquicos e como tais necessitam de especial atenção e tratamento adequado, pois enquanto distúrbios traduzem-se em anormalidade. O Código Penal, por sua vez, embora se apoiando na Psicopatologia, adotou critérios rígidos na consideração dos distúrbios psíquicos para a aplicação da pena. Procurou dividi-los em 4 (quatro) aspectos distintos: “doença mental”, desenvolvimento mental incompleto”, “desenvolvimento mental retardado” e “perturbação da saúde mental”. 26 Faculdade de Minas 26 3. PERTUBAÇÃO DA SAÚDE MENTAL: CAPACIDADE DE IMPUTAÇÃO DO PSICOPATA Como já foi dito anteriormente, a lei reputa, para os efeitos da responsabilidade penal e da capacidade civil, que o indivíduo possua saúde mental e maturidade psíquica; isto para que tenha discernimento do certo e do errado no tocante de suas ações e omissões, que vem a ser imputabilidade. A norma que trata da imposição da imputabilidade se faz presente no artigo 26 da parte geral do Código Penal, o caput torna inimputáveis determinados casos patológicos e o parágrafo único traz outros casos que são semi-imputáveis. “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”. De suma importância é a análise do parágrafo único, pois contém uma causa especial de diminuição da pena, em face da diminuição da responsabilidade, embora persista a culpabilidade. Conforme o artigo terá reduzida a pena dos agentes que no momento da ação ou omissão não eram inteiramente capazes de entender a ilicitude do ato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, mas somente nos casos de desenvolvimento mental incompleto ou retardardo, e de perturbações da saúde mental. Desses somente nos interessa as perturbações da saúde mental, que é o termo jurídico que abriga os indivíduos que estão entre o campo da doença mental e da normalidade, os chamados fronteiriços ou border-line. São eles: a personalidade psicopática (objeto de estudo), o débil mental leve, o desenvolvimento simples e alguns casos o neurótico e o início e fim de psicoses (mais raro). 27 Faculdade de Minas 27 Assim, os portadores de personalidades psicopáticas são considerados semi- imputáveis, pois apesar de entenderem o caráter ilícito da ação, não são capazes de controlar seus atos. No entanto, não se pode esquecer que o julgamento dos termos da responsabilidade compete à ação do juiz, que tendo dúvidas quanto ao desenvolvimento mental do acusado deve nomear um perito (o delegado, o Ministério Público, os familiares ou representante do acusado também podem requerer a instauração do incidente de insanidade mental) que atestará de forma clara esse aspecto, pois a existência da incapacidade de imputação é uma circunstância preliminar e imprescindível para a melhor e mais correta interpretação causal dos fatos, e posteriormente na aplicação das penas. Como foi visto, verificou-se que os criminosos psicopatas estão dispostos no artigo 26, parágrafo único, do Código Penal, pois estão enquadrados no termo “Perturbação Mental”, isto é, possuem capacidade de entendimento em relação ao cometimento da ação criminosa, entretanto, têm uma perturbação de conduta que lhes tiram o controle, não ocorre a chamada, excludente de culpabilidade, todavia a responsabilidade é reconhecida de forma diminuída, no tocante à sua intensidade. Sendo assim, o juiz proferirá uma sentença condenatória, prevista nos termos do Artigo 387 do Código de Processo Penal. E terá a opção de aplicar 16 Artigo 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: I – mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código Penal, e cuja existência reconhecer; II – mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva ser levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 42 e 43 do Código Penal; Personalidade Psicopática. Pena reduzida de um a dois terços. Segundo o artigo a atenuação é facultativa, mas há decisões também no sentido de ser obrigatória, como para Paulo José da 28 Faculdade de Minas 28 Costa Júnior:17 “...preferimos, entretanto, sustentar que o poder, referido na norma, significa dever. A faculdade do magistrado está em dosara redução...” Ou necessitando o condenado de especial tratamento essa pena poderá ser substituída por internação ou tratamento ambulatorial, regra prevista no artigo 98 do Código Penal: “ Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º.” Essa alternativa imposta no artigo 98 demonstra a reforma penal de 1994, a qual trouxe a substituição da aplicação aos semi-imputáveis e imputáveis do “sistema vicariante” e não mais do duplo binário (pena + medida de segurança), em que se pode aplicar somente pena ou medida de segurança para os semi-imputáveis e unicamente a pena para os imputáveis. III – aplicará as penas, de acordo com essas conclusões, fixando a quantidade das principais e, se for o caso, a duração das acessórias; IV – declarará, se presente, a periculosidade real e imporá as medidas de segurança que no caso couberem; V – atenderá quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e medidas de segurança, ao disposto no Título XI deste Livro; VI – determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em resumo e designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, § 1º, do Código Penal). 3.1. PENA E MEDIDA DE SEGURANÇA PENA É a consequência jurídica decorrente de uma violação do tipo penal, considerada assim como sanção penal, e a medida de segurança? Segundo Damásio: “...enquanto a pena é retributiva-preventiva, tendendo a readaptar socialmente o delinqüente, a medida de segurança possui natureza essencialmente preventiva, visto que evita que um sujeito que praticou um crime e se 29 Faculdade de Minas 29 mostra perigoso venha cometer novas infrações penais.” Além disso, diz que as penas são proporcionais à gravidade da infração, enquanto a proporcionalidade das medidas de segurança é estabelecida de acordo com a periculosidade do sujeito e que a imposição das penas pressupõe prática de um crime, enquanto as medidas de segurança podem ser aplicadas aos autores de quase-crimes ( não é o entendimento que vigora em nossa legislação). Já para Noronha19 “...na pena prevalece o cunho repressivo, ao passo que na medida de segurança predomina o fim preventivo; porém, como já fez sentir, a prevenção também não é estranha à pena. ” Ao contrário do que leciona Damásio, para Noronha, Mirabete, entre outros ambas pressupõem a prática de ato ilícito e manifestam o “jus puniendi” colimando que o indivíduo que delinqüiu e se revelou perigoso não torne a delinqüir. Conforme Grispigni, tanto a medida de segurança quanto a pena são espécies de sanções penais que apresentam traços comuns : 20 “ambas importam diminuiçãode bens jurídicos; baseiam-se as duas na existência de um crime; servem para intimidação em massa como para readaptação do delinqüente e ambas são aplicadas jurisdicionalmente.” 3.2 PRESSUPOSTOS PARA A APLICAÇÃO, IMPOSIÇÃO E ESPÉCIES DA MEDIDA DE SEGURANÇA. Código Penal adota a medida de segurança pós delitual, ou seja é necessário que tenha havido um fato criminoso. Além disto, é também necessário que haja periculosidade do autor. Periculosidade é 21 : “...a potência, a capacidade, a aptidão ou a idoneidade que um homem tem para converter-se em causa de ações danosas.” O prazo para cumprimento da medida de segurança é indeterminado, enquanto a 30 Faculdade de Minas 30 perícia médica não constatar a cessação da periculosidade (§ 1º do artigo 97 do Código Penal). Para isso, necessário se faz a realização de um exame após o prazo mínimo de três anos (artigo 97, §§ 1º e 2º, CP). Para desinternarão a extinção da medida de segurança só ocorrerá, após um ano (prazo indicativo das condições para o livramento condicional; se não praticar fato indicativo de persistência de sua periculosidade (C.P., art. 97, § 3º). Se solto, a medida de segurança se extingue com a extinção da punibilidade. Quanto as espécies de medidas de segurança são a detentiva e a restritiva. A primeira consiste na internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, enquanto a segunda resulta de tratamento ambulatorial. 3.3 PSICOPATAS: QUAL A SANÇÃO IDEAL? O criminoso portador de personalidade psicopática, além do alto grau de periculosidade, é de difícil corrigibilidade, portanto o tratamento ambulatorial é praticamente nulo, primeiramente, porque não possui uma patologia e em segundo lugar, esses criminosos não possuem a mínima possibilidade de ressocialização. Sendo assim, é recomendável a análise profunda da personalidade do agente, por parte do perito, para no momento do julgamento o juiz aproveitá-la, pois a pena está totalmente descartada pelo seu caráter inadequado em relação à punição e prevenção desses criminosos. A prisão poderá resultar em um fato evasivo, e, posteriormente, eclodir em fugas lideradas pelo mesmo. No caso, do portador de personalidade psicopática o ideal é o cumprimento de medida de segurança, mesmo sendo, computada em um prazo de um a três anos, porque é difícil ou praticamente 31 Faculdade de Minas 31 impossível, a cessação de periculosidade ser extinta, ao ser realizada pelo perito. Personalidade Psicopática Nestes casos substituição da pena pela medida de segurança, esta será cumprida no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, como dispõe o artigo 99 da Lei 7210, de 11 de Julho de 1984: “O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos inimputáveis e semi-imputáveis referidos no art. 26 e seu parágrafo único do Código Penal. Personalidade Psicopática 4 CRIMINOSOS EM SÉRIE Os criminosos em série, também conhecidos por seu nome em inglês, serial killer´s, geralmente são psicopatas muito violentos, há casos também de doentes mentais, mas são raros. E como o próprio nome diz, são criminosos que matam em seqüência, quase sempre da mesma forma e que escolhem determinadas vítimas de acordo com sua fantasia. Algumas características são próprias dos criminosos em série, como o grande prazer de demonstrarem que possuem poder sobre os outros. Donos de um enorme sadismo, sentem prazer em assistir o sofrimento alheio, e não sentem remorso por isso. Grande parte deles não assume seus crimes, confessando, somente, através de pequenos deslizes movidos pela vontade de reviver o momento do crime, pois são muito dissimulados. Tendem a cometer crimes de natureza sexual. Há também uma curiosidade em relação a esses criminosos, existe uma incidência muito pequena de assassinas mulheres e negros, mas não existe explicações do porquê isto ocorre. São eles, os criminosos em série, que tem grande exposição na mídia e acabam ficando na história. 32 Faculdade de Minas 32 Aqui no Brasil tivemos, o caso do “Chico Picadinho”, do “Bandido da Luz Vermelha”, do “Maníaco do Parque”, entre outros. Estatísticas feitas por investigadores norte-americanos:22 82 % dos serial killer´s sofreram abusos na infância . 4.1 – DECISÕES JUDICIAIS VERSUS LAUDOS MÉDICOS Existe no Brasil um descaso dos juízes com relação aos laudos elaborados pelos médicos-peritos, no momento de sua decisão. Fala-se que os médicos resolvem as questões, os juízes decidem as soluções, entretanto, não é que temos visto, como por exemplo, no caso do “Chico Picadinho” e do Maníaco do Parque, em que os médicos deram o diagnóstico, mas a Justiça não o aceitou, em sua decisão. Vejamos por exemplo a opinião de Fragoso com relação a Psiquiatria23: “É um ramo da medicina muito subjetivo, onde tudo são hipóteses, conjecturas, inferências sem base na realidade, falsificações para o encalço de fantasias, deixando apenas de manifesto a persistente indemonstrabilidade das pretendidas causas genéticas do crime.” No entanto verificamos que a Psiquiatria possui critérios de avaliação que o juiz não levaria em conta no julgamento do criminoso, verificando a ocorrência de alterações de comportamento consideradas anormais, mas que para o juiz seriam normais. O que ocorre na realidade é que ao mesmo tempo em que a lei possibilita que a justiça chame um perito para elaborar um laudo sobre as funções psíquicas do acusado, com o fim específico de atribuir-lhe ou não capacidade de imputação acerca do crime praticado, a mesma lei também permite que o juiz decida a causa sem que esteja adstrito ao laudo apresentado pelo perito. 33 Faculdade de Minas 33 E esse juiz influenciado pela sociedade, que infelizmente é aguçada pelos meios de comunicação, não leva em conta o laudo médico e aplica a pena privativa de liberdade; principalmente nos casos de psicopatas violentos, que tem uma grande exposição na mídia. Dificilmente a sociedade aceitaria a decisão de um juiz que absolveu um psicopata que estuprou e matou brutalmente suas vítimas, pois como sabemos, para a aplicação da Medida de Segurança é necessário primeiro a absolvição perante o Tribunal do Júri. Para a sociedade o psicopata estaria ficando impune. Em suma, é evidente que o juiz não deverá sempre aceitar o laudos apresentados pelos peritos, tendo em vista que a prática também tem nos mostrado a existência de médicos que atestam uma disfunção psíquica que não existe para que o criminoso seja considerado inimputável ou semi-imputável pelo Poder Judiciário. Todavia, deve existir um meio termo na conduta do juiz que infelizmente, nos dias atuais, tem se mostrado bastante radical ao desconsiderar laudos bem elaborados e adstritos a ética profissional. 34 Faculdade de Minas 34 REFERENCIAS Ackerknecht EH. A short history of medicine. Baltimore: Johns Hopkins University; 1982. Bonnet EFP. Psicopatologia y psiquiatria forense. Buenos Aires: Lopez Libreros; 1983. Branquinho J, Murcho D, Gomes NG, editores. Enciclopédia de termos lógico- filosóficos. São Paulo: Martins Fontes; 2006. Chalub M. Introdução à psicopatologia forense. Rio de Janeiro: Forense; 1981. 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