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Gestão em Segurança Pública e Privada Psicologia Social e Organizacional 1 CURSO DE GESTÃO EM SEGURANÇA PÚBLICA E PRIVADA PSICOLOGIA SOCIAL E ORGANIZACIONAL 2 Sumário 1. Introdução Conceito de Psicologia Social .............................................................. 3 1.1. Influências Sociais Moldam Nosso Comportamento ....................................... 8 1.2. Atitudes e Disposições Pessoais Também Moldam Nosso Comportamento ... 9 1.3. Princípios da Psicologia Social São Aplicáveis à Vida Cotidiana .................. 11 1.4. Valores Sociais ............................................................................................. 14 2. Determinantes da Representação Social ............................................................. 19 2.1. Representação Social E Ideologia ................................................................ 22 3. A Psicologia e o Comportamento Social .............................................................. 24 3.1. Concepções de Humanismo e as Contingências Sociais.............................. 27 3.2. As Contribuições da Psicologia Social Para Uma Concepção de Humanismo ........................................................................................................................29 3.3. Implicações Para uma Ciência Histórica do Comportamento Social ............. 31 3.4. Desenvolvendo Indicadores de Disposições Psicossociais ........................... 33 4. Psicologia Social: Educação, Trabalho ................................................................ 36 4.1. Psicologia Social, do Trabalho e Organizacional .......................................... 39 4.2. Possibilidades de atuação da Psicologia Social do Trabalho ........................ 43 4.3. O que pode fazer a Psicologia Social do Trabalho em empresas? ............... 44 4.4. Psicologia Social: Motivação Humana Produtividade e Realização .............. 47 4.5. Motivação pessoal (interna) x Motivação externa ......................................... 49 4.6. A ciência por trás da motivação pessoal ....................................................... 53 4.7. Definição de metas como fator motivacional ................................................. 53 4.8. Por que é tão importante manter a motivação pessoal? ............................... 54 4.9. Psicologia Organizacional ............................................................................. 57 5. Referências ......................................................................................................... 64 3 1. Introdução Conceito de Psicologia Social O que é psicologia social? Psicologia social é uma ciência que estuda as influências de nossas situações, com especial atenção a como vemos e afetamos uns aos outros. Mais precisamente, ela é o estudo científico de como as pessoas pensam, influenciam e se relacionam umas com as outras. A psicologia social se situa na fronteira da psicologia com a sociologia. Comparada com a sociologia (o estudo das pessoas em grupos e sociedades), a psicologia social focaliza mais nos indivíduos e usa mais experimentação. Comparada à psicologia da personalidade, a psicologia social focaliza menos nas diferenças dos indivíduos e mais em como eles, em geral, veem e influenciam uns aos outros. A psicologia social ainda é uma ciência jovem. Os primeiros experimentos nessa área foram relatados há pouco mais de um século (1898), e os primeiros textos de psicologia social surgiram em torno de 1900 (Smith, 2005). Somente a partir da década de 1930 ela assumiu sua forma atual, e apenas a partir da Segunda Guerra Mundial começou a emergir como o campo de vulto que é hoje. ______________________ http://www.diariors.com.br/site/colunistas/consuelo-pasqualotto/8426-luz-da-psicologia-social-por- consuelo-pasqualotto-poloni.html 4 A psicologia social estuda nosso pensamento, nossa influência e nossos relacionamentos fazendo perguntas que intrigam a todos. Eis alguns exemplos: Quanto de nosso mundo social está somente em nossas cabeças? Como veremos em capítulos posteriores, nosso comportamento social varia não apenas conforme a situação objetiva, mas também conforme nosso modo de interpretá-la. Crenças sociais podem ser autorrealizáveis. Por exemplo, pessoas felizes no casamento atribuem um comentário azedo do cônjuge “Por que você nunca põe as coisas no seu devido lugar?” a algo externo: “Ele deve ter tido um dia frustrante”. Pessoas infelizes no casamento atribuirão o mesmo comentário a uma disposição mesquinha: “Quanta hostilidade!”, e podem responder com um contra-ataque. Além disso, esperando hostilidade de seu cônjuge, elas podem se comportar com ressentimento, provocando justamente a hostilidade que esperam. As pessoas seriam cruéis se assim ordenássemos? Como os alemães nazistas puderam conceber e executar o massacre de seis milhões de judeus? Em parte, aqueles atos maléficos ocorreram porque milhares de pessoas cumpriram ordens. Elas colocaram os prisioneiros em trens, arrebanháramo- nos até “chuveiros” lotados e os envenenaram com gás. Como puderam praticar atos tão horrendos? Aquelas pessoas eram seres humanos normais? Stanley Milgram (1974) queria saber. Assim, ele montou uma situação na qual se pediu às pessoas que aplicassem choques cada vez mais fortes a alguém que estivesse tendo dificuldades para aprender uma sequência de palavras, quase dois terços dos participantes obedeceram à risca. Ajudar? Ou se servir? Quando sacolas com cédulas de dinheiro caíram de um caminhão blindado em um dia de outono, dois milhões de dólares se espalharam em uma rua de Columbus, Ohio. Alguns motoristas pararam para ajudar, devolvendo cem mil dólares. Julgando-se pelo um milhão e novecentos mil que desapareceram, um número muito maior parou para se servir. O que você teria feito? Quando acidentes semelhantes aconteceram alguns meses depois em São Francisco e Toronto, os resultados foram os mesmos: os transeuntes pegaram a maior parte do dinheiro (Bowen, 1988). 5 Que situações fazem as pessoas serem prestativas ou gananciosas? Alguns contextos culturais talvez vilarejos e cidades pequenas gerem maior prestatividade? Essas perguntas têm um aspecto em comum: tratam de como as pessoas veem e afetam umas às outras. E é disso que trata a psicologia social. Os psicólogos sociais estudam atitudes e crenças, conformidade e independência, amor e ódio. Grandes ideias da psicologia social Quais são as grandes lições da psicologia social, seus temas dominantes? Em muitas áreas acadêmicas, os resultados de dezenas de milhares de estudos, as conclusões de milhares de investigadores e os insights de centenas de teóricos podem ser reduzidos a algumas ideias centrais. A biologia nos oferece princípios como a seleção natural e a adaptação. A sociologia se baseia em conceitos como estrutura e organização social. A música aproveita nossas ideias de ritmo, melodia e harmonia. Construímos nossa realidade social Nós humanos temos um irresistível desejo de explicar o comportamento, atribuí-lo a alguma causa e, assim, fazê- lo parecer organizado, previsível e controlável. Podemos reagir de maneira diferente a situações semelhantes porque pensamos de maneira diferente. Nosso modo de reagir ao insulto de um amigo depende de se o atribuirmos à hostilidade ou a um mau dia. Uma partida dos times de futebol americano das universidades Princeton e Dartmouth, em 1951, ofereceu uma demonstração clássica de como interpretamos a realidade (Hastorf Cantril, 1954; ver também Loy Andrews, 1981). A partida correspondeu ao que foi anunciado como um confronto rancoroso; revelou-se uma das mais duras e sujas na história das duas universidades. Um dos melhores atletas de Princeton foi derrubado e agredido em bando, sendo,por fim, obrigado a sair do jogo com o nariz quebrado. Surgiram brigas de socos, gerando mais feridos de ambos os lados. Não muito tempo depois, dois psicólogos, um de cada universidade, exibiram filmagens da partida aos alunos nos dois campi. Os estudantes desempenharam o papel de cientista-observador, apontando todas as infrações enquanto assistiam e indicando quem era responsável por elas. Mas eles não conseguiram deixar de lado suas lealdades. Por exemplo, os alunos de Princeton viram duas vezes mais violações de Dartmouth do que viram os próprios alunos de Dartmouth. Conclusão: 6 Existe uma realidade objetiva lá fora, mas sempre a enxergamos pelas lentes de nossas crenças e nossos valores. Todos somos cientistas intuitivos. Explicamos o comportamento das pessoas, geralmente com rapidez e precisão suficientes para atender nossas necessidades diárias. Quando o comportamento de alguém é coerente e distintivo, atribuímos aquele comportamento a sua personalidade. Por exemplo, se você observa que alguém costuma fazer comentários depreciativos, você pode inferir que esse indivíduo tem uma inclinação sórdida, e então você pode evitá-lo. Nossas crenças a nosso próprio respeito também importam. Temos uma perspectiva otimista? Vemo-nos como no controle das coisas? Vemo-nos como relativamente superiores ou inferiores? Nossas respostas influenciam nossas emoções e ações. Nosso modo de interpretar o mundo, e a nós mesmos, importa. Nossas Intuições Sociais Com Frequência São Poderosas, Mas às Vezes Perigosas Nossas intuições instantâneas moldam nossos medos (Viajar de avião é perigoso?), impressões (Posso confiar nele?) e relacionamentos (Ela gosta de mim?). Intuições influenciam presidentes em épocas de crise, apostadores à mesa de apostas, jurados que avaliam culpa e gerentes de pessoal selecionando candidatos. Essas intuições são corriqueiras. Sem dúvida, a ciência psicológica revela uma mente inconsciente fascinante uma mente intuitiva nos bastidores sobre a qual Freud nunca nos falou. ______________________ http://blogdapsicologia.com.br/unimar/2017/08/convite-grupo-de-estudo-em-psicologia-social-unimar/ 7 Mais do que os psicólogos compreendiam até pouco tempo atrás, o pensamento ocorre fora do palco, longe dos olhos. Nossas capacidades intuitivas são reveladas por estudos sobre o que os capítulos posteriores explicarão: processamento automático, memória implícita, heurísticas, inferência espontânea de traços, emoções instantâneas e comunicação não verbal. Pensamento, memória e atitudes operam em dois níveis um consciente e deliberado, o outro inconsciente e automático, ou seja, o processamento dual como o chama os pesquisadores da atualidade. Sabemos mais do que sabemos que sabemos. A intuição é imensa, mas também perigosa. Um exemplo: enquanto atravessamos a vida, em geral no piloto automático, intuitivamente julgamos a probabilidade das coisas pela facilidade com que vários exemplos nos vêm à cabeça. Sobretudo desde 11 de setembro de 2001, nós facilmente produzimos imagens mentais de quedas de aviões. Assim, a maioria das pessoas tem mais medo de voar do que de dirigir, e muitas dirigem grandes distâncias para evitar o risco dos céus. Atualmente, estamos muito mais seguros (por milhas de viagem) em um voo comercial do que em um veículo motor (nos Estados Unidos, viajar de avião foi 230 vezes mais seguro entre 2002 e 2005, conforme relato do Conselho Nacional de Segurança [2008]). Mesmo nossas intuições sobre nós mesmos com frequência são falhas. Intuitivamente confiamos em nossas memórias mais do que deveríamos. Interpretamos erroneamente nossas próprias mentes; em experimentos, negamos a influência de coisas que de fato nos influenciam. Prevemos erroneamente nossos próprios sentimentos os quantos nos sentirão mal daqui a um ano se perdermos nosso emprego ou se nosso romance terminar, e o quanto nos sentirão bem daqui a um ano, ou mesmo daqui a uma semana, se ganharmos na loteria. E muitas vezes erramos na previsão de nosso próprio futuro. Por exemplo, ao escolher roupas, pessoas perto da meia-idade comprarão peças justas (“Prevejo que perderei uns quilos”); raramente alguém diz, mais realista, “É melhor eu comprar uma peça relativamente folgada; na minha idade, as pessoas tendem a ganhar peso”. 8 Nossas intuições sociais, então, são dignas de nota tanto por seus poderes como por seus perigos. Lembrando-nos das dádivas de nossa intuição e alertando-nos para suas armadilhas, os psicólogos sociais procuram fortalecer nosso pensamento. Na maioria das situações, juízos fáceis, “rápidos e simples” são suficientes. Mas em outras, quando a precisão importa como quando é necessário temer as coisas certas e despender nossos recursos de acordo, é melhor restringirmos nossas intuições impulsivas com pensamento crítico. Nossas intuições e processamento inconsciente de informações são rotineiramente poderosos e, às vezes, perigosos. 1.1. Influências Sociais Moldam Nosso Comportamento Somos como Aristóteles observou há muito tempo, animais sociais. Falamos e pensamos com palavras que aprendemos com os outros. Ansiamos nos conectar, pertencer e ser estimados. Matthias Mehl e James Pennebaker (2003) quantificaram o comportamento social de seus alunos no Texas University convidando-os para levarem consigo minigravadores e microfones. Uma vez a cada 12 minutos durante suas horas acordados, o gravador operado por computador gravaria imperceptivelmente por 30 segundos. Embora o período de observação cobrisse apenas os dias da semana (inclusive as horas de aula), quase 30% do tempo dos alunos era passado em conversação. Os relacionamentos representam uma parte considerável do ser humano. Como seres sociais, respondemos a nossos contextos imediatos. Às vezes, a força de uma situação social nos leva a agir de modo contrário a nossas posições expressas em palavras. Sem dúvida, situações poderosamente maléficas às vezes sobrepujam as boas intenções, induzindo as pessoas a concordar com falsidades ou consentir na crueldade. Sob a influência nazista, muitas pessoas a princípio decentes se tornaram instrumentos do Holocausto. Outras situações podem provocar grande generosidade e compaixão. Depois da tragédia de 11 de setembro, a cidade de Nova York recebeu uma imensa quantidade de doações de alimentos, roupas e ajuda de ávidos voluntários. 9 O poder da situação também foi claramente evidenciado pela variação nas atitudes com relação à invasão do Iraque, em 2003. Pesquisas de opinião revelaram que a maioria dos estadunidenses e israelenses era a favor da guerra. Seus primos distantes em outras partes do mundo majoritariamente opunham-se a ela. Diga-me onde você vive e darei um palpite razoável sobre suas opiniões quando a guerra começou. Diga-me qual é seu nível de instrução e o que você lê e assiste, e eu darei um palpite ainda mais confiante. Nossas situações importam. Nossas culturas ajudam a definir nossas situações. Por exemplo, nossos padrões sobre prontidão, franqueza e vestuário variam conforme nossa cultura Preferir um corpo esbelto ou voluptuoso depende de quando e onde você vive no mundo. Definir justiça social como igualdade (todos recebem o mesmo) ou como equidade (os que merecem mais recebem mais) depende de sua ideologia ter sido mais moldada pelo socialismo ou pelo capitalismo. Tender a ser expressivo ou reservado, causal ou formal, depende em parte de sua cultura e de sua etnia. Focar principalmente em si mesmo em suas necessidades pessoais, desejos e moralidade ou na família, no clã e em grupos comunitários depende do quanto você é um produto do individualismo ocidental moderno. 1.2. Atitudes e Disposições Pessoais Também Moldam Nosso Comportamento Forças internas também importam. Não somos folhassoltas, simplesmente levadas por este ou aquele caminho pelos ventos sociais. Nossas atitudes internas afetam nosso comportamento. Nossas opiniões políticas influenciam nosso comportamento nas urnas. Nossas opiniões sobre o tabagismo influenciam nossa suscetibilidade às pressões sociais para fumar. Nossas posturas com relação aos pobres influenciam nossa disposição em ajudá-los. Como veremos nossas atitudes também decorrem de nosso comportamento, o que nos leva a acreditar fortemente nas coisas com as quais 10 nos comprometemos ou pelas quais sofremos. Disposições da personalidade também afetam o comportamento. Diante da mesma situação, pessoas diferentes podem reagir de uma maneira diferente. Depois de anos de encarceramento político, uma pessoa transpira amargura e busca vingança. Outra, como o sul-africano Nelson Mandela, busca reconciliação e integração com seus inimigos anteriores. Atitudes e personalidade influenciam o comportamento. A psicologia social do século XXI está nos trazendo um entendimento cada vez maior das bases biológicas de nosso comportamento. Muitos de nossos comportamentos sociais refletem uma sabedoria biológica profunda. Quem já fez estudos iniciais de psicologia aprendeu que a natureza (inata) e a experiência (adquirida) formam, juntas, quem somos. Assim como a área de um retângulo é determinada tanto por seu comprimento quanto por sua largura, também a biologia e a experiência, juntas, nos criam. Como nos lembram dos psicólogos evolucionistas (ver Capítulo 5), nossa natureza humana nos predispõe a nos comportarmos de modos que ajudaram nossos ancestrais a sobreviverem e a se reproduzirem. Levamos os genes daqueles cujos traços permitiram que eles e seus filhos sobrevivessem e se reproduzissem. Assim, os psicólogos evolucionistas indagam como a seleção natural poderia predispor nossas ações e reações ao namorar e acasalar, odiar e machucar, cuidar e compartilhar. A natureza também nos dota de uma enorme capacidade de aprender e se adaptar a ambientes variados. Somos sensíveis e responsivos a nosso contexto social. Se todo evento psicológico (todo pensamento, toda emoção, todo comportamento) é simultaneamente um evento biológico, então podemos examinar a neurobiologia subjacente ao comportamento social. Que áreas cerebrais permitem nossas experiências de amor e desprezo ajuda e agressão, percepção e crença? Como o cérebro, a mente e o comportamento funcionam juntos como um sistema coordenado? O que os tempos de ocorrência de eventos cerebrais revelam sobre nosso modo de processar informações? Perguntas desse tipo são feitas por aqueles que se dedicam à neurociência social (Cacioppo et al., 2007). Os neurocientistas sociais não reduzem comportamentos sociais complexos, tais como ajudar e 11 ferir, a mecanismos neurais ou moleculares simples. Seu ponto é este: para compreender o comportamento social, devemos considerar tanto as influências sob a pele (biológicas) como aquelas entre as peles (sociais). A mente e o corpo são um grande sistema. Os hormônios do estresse afetam como nos sentimos e agimos. O ostracismo social eleva a pressão arterial. O apoio social fortalece o sistema imune, que combate doenças. Somos organismos biopsicossociais. Refletimos a interação de nossas influências biológicas, psicológicas e sociais, e é por isso que os psicólogos da atualidade estudam o comportamento a partir desses diferentes níveis de análise. 1.3. Princípios da Psicologia Social São Aplicáveis à Vida Cotidiana A psicologia social tem o potencial de iluminar sua vida, tornar visíveis as influências sutis que guiam seu pensamento e suas ações. Além disso, como veremos, ela oferece muitas ideias sobre como nos conhecer melhor, como ganhar amigos e influenciar as pessoas, como transformar punhos cerrados em braços abertos. Outros pesquisadores também estão aplicando ideias da psicologia social. _________________ http://psicoativo.com/categoria/abordagens/psicologia-social 12 Os princípios do pensamento social, da influência social e das relações sociais têm implicações para a saúde e o bem-estar humanos, para procedimentos judiciais e decisões de jurados em salas de audiência e para influenciar comportamentos que permitirão um futuro ambientalmente sustentável. Sendo apenas uma perspectiva sobre a existência humana, a ciência psicológica não pretende tratar das questões fundamentais da vida: qual é o significado da vida humana? Qual deveria ser nosso propósito? Qual é nosso derradeiro destino? Entretanto, a psicologia social nos oferece um método para formular e responder algumas questões muito interessantes e importantes. A psicologia social trata da vida a sua vida: suas crenças, suas atitudes, seus relacionamentos. Resumindo... A psicologia social é o estudo científico de como as pessoas pensam se influenciam e se relacionam. Seus temas centrais incluem: Como interpretamos nossos mundos sociais; Como nossas intuições sociais nos guiam e, às vezes, nos enganam; Como nosso comportamento social é moldado por outras pessoas e por nossas atitudes, personalidade e biologia; Psicologia Social e Valores Sociais Os valores dos psicólogos sociais permeiam seu trabalho de maneiras tanto óbvias como sutis. Que maneiras são essas? A psicologia social é menos uma coleção de descobertas do que um conjunto de estratégias para responder perguntas. Na ciência, como nos tribunais de justiça, opiniões pessoais são inadmissíveis. Quando as ideias são colocadas em julgamento, as evidências determinam o veredito. Mas, os psicólogos sociais são realmente objetivos assim? Por serem seres humanos, será que seus valores suas convicções pessoais sobre o que é desejável e como as pessoas deveriam se comportar não se infiltram em seu trabalho? Neste caso, a psicologia social pode realmente ser científica? Quando os valores influenciam a psicologia Os valores ganham importância quando os psicólogos selecionam temas para pesquisa. Não foi por acaso que o estudo do preconceito floresceu durante a década de 1940, quando o fascismo dominava a Europa; que na década de 13 1950, época de modas de uniformidade na aparência e de intolerância por opiniões diferentes, nos deu estudos da conformidade; que os anos de 1960 viram aumentar o interesse pela agressão com tumultos e crescentes índices de criminalidade; que o movimento feminista dos anos de 1970 ajudou a estimular uma onda de pesquisa sobre gênero e sexismo; que os anos de 1980 ofereceram um ressurgimento da atenção aos aspectos da corrida armamentista; e que os anos de 1990 e início do século XXI foram marcados pelo aumento do interesse em como as pessoas respondem à diversidade na cultura, na etnia e na orientação sexual. A psicologia social reflete a história social (Kagan, 2009). Os valores diferem não apenas ao longo do tempo, mas também entre as culturas. Na Europa, as pessoas sentem orgulho de suas nacionalidades. Os escoceses são mais autoconscientes de sua distinção dos ingleses, e os austríacos dos alemães, do que o são os residentes de Michigan em relação aos residentes de Ohio, semelhantemente adjacentes. Consequentemente, a Europa nos deu uma teoria importante da “identidade social”, ao passo que os psicólogos sociais norte-americanos focaram mais nos indivíduos como uma pessoa pensa sobre as outras, é influenciada por elas e se relaciona com elas (Fiske, 2004; Tajfel, 1981; Turner, 1984). Os psicólogos sociais australianos extraíram teorias e métodos tanto da Europa quanto da América do Norte (Feather, 2005). Os valores também influenciam os tipos de pessoas que são atraídas às diversas disciplinas (Campbell, 1975a; Moynihan, 1979). Em sua universidade, os alunos que se especializam em humanidades, artes, ciências naturais e ciências sociais diferemperceptivelmente entre si? A psicologia social e a sociologia atraem pessoas que são, por exemplo, relativamente ávidas por questionar a tradição, pessoas mais inclinadas a moldar o futuro do que preservar o passado? Finalmente, os valores obviamente têm importância como o objeto da análise sociopsicológica. Os psicólogos sociais investigam como se formam os valores, por que eles mudam e como eles influenciam atitudes e ações. Contudo, nada disso nos diz quais valores são “certos”. Quando os valores influenciam a psicologia sem que percebamos Com menos frequência, reconhecemos as maneiras mais sutis em que comprometimentos com valores 14 se disfarçam de verdade objetiva. Consideremos três maneiras menos óbvias em que valores influenciam a psicologia. 1.4. Valores Sociais A literatura sobre sistemas de valores revela a existência de diferentes abordagens teóricas e metodológicas que têm contribuído para uma melhor e maior compreensão dos valores humanos e da sua importância na vida das pessoas. Allport, Vernon e Lindzey (1951, citados por Gregory, 2004) foram os primeiros a dar aos valores um sentido mais concreto, associando-os a actividades do dia-a-dia e descrevendo-o como preferências estáveis de comportamentos. A partir da classificação apresentada por Eduard Spranger no seu livro Types of Men de 1928, em que o autor apresenta seis valores principais que as pessoas possuem e que definem a sua personalidade, Allport, Vernon e Lindzey criaram um instrumento que procurava medir a força relativa destes valores, a Escala do Estudo dos Valores (Gregory, 2004). Esta escala continha 30 questões que colocavam um valor oposto a outro, e 15 questões em que se tinha de hierarquizar os valores apresentados. Os resultados obtidos seriam os scores dos valores propostos: teórico (T), económico (E), estético (A), social (S), político (P) e religioso (R). As críticas apresentadas a este instrumento prendiam-se essencialmente com o facto de os valores serem demasiado vagos e gerais (Gregory, 2004). Com base neste trabalho, Milton Rokeach (1973) procurou perceber a forma como as pessoas organizam o seu sistema de valores, partindo de cinco pressupostos. Primeiro, considera que o número total de valores que uma pessoa tem é relativamente pequeno; segundo, todas as pessoas têm os mesmos valores, mas em graus diferentes; terceiro, os valores podem ser organizados num sistema; quarto, os valores humanos podem ser atribuídos à cultura, sociedade e instituições, bem com a personalidade; quinto, a forma como os valores se manifestam trata-se de um fenómeno que importa analisar (Rokeach, 1973). 15 Assim, um valor é uma crença duradoura relativamente a uma forma de conduta ou estado final desejado que é preferível pessoal e/ou socialmente a outra forma de conduta ou estado final. Rokeach (1973) propõe dois tipos de valores: instrumentais e terminais. Os primeiros dizem respeito à forma como as pessoas actuam para conseguir alcançar um fim desejado, e estão relacionados com aspectos morais e de competências como, por exemplo, a honestidade e a responsabilidade; os segundos representam as necessidades da natureza humana e estão associados a questões sociais e pessoais, como ter uma vida confortável (Rokeach, 1973). Os valores instrumentais foram definidos com base na condensação de traços de personalidade; já os valores terminais foram criados a partir de abordagens impressionistas (Gregory, 2004). No seu sistema de valores, Rokeach (1973) sugere 36 valores, 18 em cada dimensão. Para aceder a estes valores o autor construiu o Questionário de Valores, em que é pedido às pessoas para ordenarem estes valores apresentados de acordo “com a sua importância, enquanto princípios que guiam a sua vida”. Os resultados representam a hierarquia de valores de cada pessoa, em que scores mais baixos indicam menos importância do valor. Os valores deixam assim de ser consideradas tipologias estáveis e fixas e passam a ter uma maior flexibilidade na medida em que cada pessoa cria a sua hierarquia de valores. Inglehart (1997) propõe uma associação entre as necessidades básicas e o sistema de valores, utilizando para isso a pirâmide de necessidades de Maslow (1970). Distingue valores materialistas e valores pós-materialistas, partindo da ideia de que os valores surgem das mudanças ocorridas na história das sociedades. Desta forma, sugere que na base dos valores da sociedade estão as questões materialistas associadas à necessidade de estabilidade económica e à coesão social, sendo que no topo estão os valores pós-materialistas que, à semelhança da pirâmide de Maslow (1970), só surgem quando os anteriores atingiram certo nível de satisfação (Inglehart, 1997). Os valores pós- materialistas dizem respeito à qualidade de vida, participação na tomada de decisão e realização profissional. As teorias de valores parecem revelar algum consenso ao contextualizarem os valores enquanto orientações ou motivos que guiam, 16 explicam e justificam atitudes, normas, opiniões, bem como a ação humana (Ramos, 2006). Tendo por base o questionário e teoria de Rockeah (1973), Schwartz (1992) propõe um modelo de valores inovador. À semelhança de outros autores, Schwartz e Bilsky (1994) definiram valores como conceitos ou crenças que dizem respeito a estados desejáveis ou comportamentos que transcendem situações específicas, e que nos guiam na seleção ou avaliação de comportamentos e acontecimentos, sendo que podem ser ordenados segundo a sua importância. Os valores representam, de acordo com os autores, um conjunto de motivações que são universais e que as pessoas, independentemente do seu contexto cultural, partilham três necessidades básicas: necessidades inerentes a cada organismo, os motivos sociais relacionados com a interação social, a sobrevivência e bem-estar dos grupos. Estes pressupostos conduziram à identificação de 10 valores motivacionais: universalismo, benevolência, segurança, tradição, conformismo, poder, realização, estimulação, hedonismo e autodetecção. O universalismo diz respeito à compreensão, reconhecimento, tolerância e proteção do bem-estar dos outros e da natureza; A benevolência está relacionada com a preservação e valorização do bem-estar dos outros; A segurança com a harmonia e estabilidade na sociedade, das relações e da pessoa consigo própria; Tradição, isto é, respeito, envolvimento e aceitação dos costumes e ideias religião e cultura; Conformismo, ou seja, restrições de ideias e impulsos que possam violar as normas e expectativas sociais; O poder relaciona-se com o estatuto e prestígio social, bem como controlo e domínio sobre os outros e os recursos; A realização descreve a procura pelo sucesso pessoal através da demonstração de competência valorizada nos padrões sociais; A estimulação refere-se ao desejo pela excitação e novidade, bem como pelo desafio; 17 A autodetecção, caracterizada pela liberdade, criatividade, independência, curiosidade, escolha dos seus objetivos e auto respeito; por fim, O hedonismo representa o prazer e a gratificação sensorial para cada pessoa (Ramos, 2006). O que permite distinguir um valor de outro são as motivações presentes em cada um, sendo que os valores são representações cognitivas da importância dos objetivos e das motivações pessoais (Bilsky & Schwartz, 1994). A procura por um tipo de valores tem consequências psicológicas, práticas e sociais que podem, por vezes, entrar em conflito e/ou conduzirem à procura de outro tipo de valores (Schwartz & Sagi, 2000). Estes 10 valores podem ser organizados segundo o grau de compatibilidade ou incompatibilidade existente entre si, dando origem a quatro valores de ordem superior que, por sua vez, são agrupados em duas dimensões que seopõem. _________________ http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-37722007000100008 18 A primeira diz respeito à autotranscedência versus autodesenvolvimento que reflete a oposição existente entre a preocupação com o bem-estar dos outros e o querer aceitá-los como iguais (autotranscedência), bem como a necessidade de alcançarmos os nossos objetivos e dominar os outros (autodesenvolvimento). A segunda dimensão corresponde à oposição entre a abertura à mudança e a conservação que reflete os conflitos entre a autonomia, a liberdade de ação e orientação e a obediência, preservação e necessidade de proteção e estabilidade (Schwartz, 1992). Os valores enquanto objetivos, quando alcançados, servem interesses pessoais e coletivos, sendo que os primeiros se opõem aos segundos (Schwartz, 1992). Este modelo tem sido amplamente testado, sendo aplicado através do European Social Survey (ESS) a amostras representativas de 19 países europeus. Para isso foi criado o Questionário de Valores Sociais que procura medir os valores de cada pessoa através da sua identificação com a descrição que é feita de uma pessoa com determinadas características. Os resultados do estudo do ESS revelam que os valores propostos são equivalentes nos diferentes países, apresentando bons valores de consistência interna e que os 10 valores se distribuem como esperado pelas dimensões e valores de ordem superior. A autotranscedência está negativamente relacionada com o autodesenvolvimento, assim como a conservação face à abertura à mudança (Ramos, 2006). Assim, e uma vez que os valores são equivalentes entre países, é possível analisar diferenças entre os mesmos no que diz respeito à importância dada a cada um. Pode concluir-se, assim, que os valores representam motivações que guiam, explicam e justificam a ação humana, e que podem ser hierarquizados segundo o seu grau de importância na vida. A ideia de que as pessoas possuem um sistema de valores fixo com elementos estáveis e separados dá lugar à noção de que as pessoas criam os seus próprios sistemas de valores. Esta mudança ocorre principalmente como o trabalho de Rockeah (1973), seguido por Schwartz (1992) que adiciona o facto de existirem valores universais que permitem a comparação da forma como diferentes pessoas, em diferentes lugares, hierarquizam os seus valores. 19 O modelo de 10 valores universais de Schwartz (1992) tem sido amplamente estudado, contribuindo para a investigação dos aspectos específicos de cada cultura, para questões relacionadas com o comportamento e as atitudes das pessoas. 2. Determinantes da Representação Social A representação social é uma modalidade de conhecimento e uma interpretação do real, determinada pela estrutura da sociedade onde ela se desenvolve. No entanto, essa influência não é linear, isto é, não se pode compreender a representação social como sendo resultado único de processos socioeconômicos. Se, por um lado, as normas e valores sociais são fundamentais na gênese dos sistemas de orientação do sujeito, por outro lado eles se combinam com as atitudes e motivações construídas ao longo das experiências pessoais através de uma história. Essa combinação implica um duplo movimento de objetivação e subjetivação do objeto. Três processos intervêm nessa relação realidade social-representação social-atividade do sujeito: a) A Pressão à Inferência - Considerando que o sujeito busca constantemente o consenso com o seu grupo e que a ação o obriga a estimar, comunicar e responder às exigências da situação a cada momento, essas múltiplas pressões tendem a influenciar a natureza dos julgamentos, preparando respostas pré-fabricadas e forçando um consenso de opinião para garantir a comunicação e assegurar a validade da representação. b) A Focalização - "Refere-se à densidade de interesses dos sujeitos em relação ao objeto" (Silva, 1978, p. 27). O sujeito tende a dar uma atenção variável aos aspectos do ambiente social. A intensidade de suas atitudes e o modo pelo qual ele relaciona os dados da realidade depende de seus hábitos lógicos e linguísticos, de tradições históricas e da estratificação de valores. c) Defasagem e Dispersão de Informação - "esse fator refere-se às condições de acesso e exposição às informações sobre o objeto (inclusive do próprio objeto)" (Silva, 1978, p. 27). Essa diversidade de 20 informação refere-se não só às informações disponíveis, mas também às condições objetivas de acesso a elas como, por exemplo, obstáculos de transmissão, falta de tempo, barreiras educativas e até mesmo os efeitos de especialização. Além disso, para se constituir como organização cognitiva a representação social se apoia em dois princípios: 1. Analogia - é um princípio de mediação entre dois ou mais universos tornados permeáveis por uma transferência, ou generalização de uma resposta ou de um conceito já conhecido para uma resposta ou conceito novo. 2. A analogia permite a construção do objeto representado a partir de uma informação sumária sobre o objeto, relacionando seus atributos com atributos semelhantes pertencentes a outros objetos significativos. A analogia permite uma economia de informação justificada pelas exigências da comunicação. 3. Compensação - é um princípio que regula a frequência de raciocínio, sua coerência interna. São, segundo Moscovici (1976), operações que fazemos maximizando as semelhanças ou diferenças a fim de introduzir o objeto em uma classe. É uma tendência à estabilidade, à coerência, à não-contradição das proposições destinadas a exprimir o conteúdo das representações. Silva (1978) destaca que, a partir das características descritas, a representação social seria: a) Uma recriação do objeto determinada simultaneamente pela estrutura psicológica e pela estrutura social b) Um processo de mediação entre o conceito e o objeto, em que o processo individual e as características do objeto se relacionam e se engendram mutuamente c) Um princípio de ordenamento dos objetos em um sistema coerente, o que lhe confere uma significação individual e social. Jodelet propõe a seguinte definição da representação social: O conceito de representação social designa uma forma de conhecimento específico, o saber do senso comum, cujos conteúdos 21 manifestam a operação de processos generativos e funcionais socialmente marcados. Mais abrangentemente, ela designa uma forma de pensamento social. As representações sociais são modalidades de pensamento prético orientado para a comunicação, a compreensão e o domínio do ambiente social, material e ideal. Enquanto tal, elas apresentam características específicas no plano da organização dos conteúdos, das operações mentais e da lógica. A marca social dos conteúdos ou dos processos da representação remete às condições e ao contexto das quais emergem as representações, às comunicações pelas quais elas circulam, às funções que elas têm na interação com o mundo e com os outros (Jodelet, 1984, pp. 361-362). Esta definição possui, no entanto, uma tal abrangência que dificulta a operacionalização do conceito nos trabalhos de pesquisa. O próprio Moscovici (1976) reconhece que o conceito não é facilmente apreendido embora o "seja a realidade das representações sociais". A sua situação de conceito carrefour faz com que ela designe um grande número de fenômenos e processos, como o salientam Doise e Palmonari (1986). E, continuam os autores, "a pluralidade de abordagens e de significações que ela veicula fazem dela um instrumento de trabalho difícil de manipular" (Doise e Palmonari, 1986, p. 83). Paradoxalmente, é nisso que consiste a sua riqueza. Ela busca articular diferentes sistemas explicativos, referindo-se aos processos individuais, inter-individuais, intergrupais e ideológicos. Qualseria, pois, a diferença entre representação social e ideologia? 22 2.1. Representação Social E Ideologia A representação social é, segundo Jodelet (1991, p. 15) "uma forma de conhecimento que embora distinta do saber sapiente ou sério' (Foucault, 1969), deve ser estudada como tal em seus estudos e processos (Jodelet, 1988) e enquanto um saber prático do senso comum, socialmente compartilhado e tido por evidência consensual no quotidiano (Berger e Luckmann, 1966)". Ainda segundo a autora, dessa definição decorre que o estudo da representação social deve levar em conta: - “o sujeito do conhecimento - indivíduo ou grupo - e sua experiência”. - “as condições sócias de sua produção e de sua circulação em referência a uma prática já que este conhecimento se oferece como versão do mundo que gere a vida cotidiana material, social etc”. (Jodelet, 1991, p. 15) Jodelet (1991) afirma que na medida em que o conceito de ideologia não conseguiu explicar o papel do conceituai nas relações sociais e nas relações de poder, a noção de representação social constitui um novo olhar sobre o social e o pensamento, tendo como perspectiva a questão da mudança. Na medida em que fatos sociais é objeto do conhecimento, as representações são a parte conceituai do real. Paradoxalmente, as representações são constitutivas do social na medida em que os sujeitos só se situam com relação aos outros no momento em que os fatos sociais são apropriados pela consciência, isto é, representados pelos sujeitos. Lipiansky (1991), no entanto, ao discutir as diferenças entre os conceitos de representação social e ideologia salienta a dificuldade de precisar esses limites, uma vez que, quanto à sua utilização, eles aparecem de forma desigual em Psicologia Social. Além disso, há desigualdade da elaboração dessas noções nos trabalhos de pesquisa na área de Psicologia Social. Enquanto a representação social vem se constituindo como um conceito fértil e articulado em Psicologia Social, o conceito de ideologia é utilizado raramente, de forma limitada e imprecisa. Vale salientar que a articulação entre os dois conceitos é, segundo 23 Lipiansky (1991), insuficiente, pois raramente os pesquisadores fazem uma confrontação explícita e/ou uma articulação entre eles. Para este autor, é necessário fazer algumas distinções entre representação social e ideologia, partindo do pressuposto de que eles não são sinônimos. A primeira distinção proposta por Lipiansky (1991) é uma distinção de nível. Ele ressalta que o conceito de ideologia aparece nas pesquisas como um sistema de representações. Nesse sentido, ela seria o contexto no qual se inscreveriam as representações isoladas. Tudo se passa como se a ideologia fosse de um nível que englobaria as representações. A segunda distinção proposta diz respeito à extensão e domínio dos dois conceitos. "O termo ideologia refere-se geralmente a sistemas de representações compartilhadas por todo um grupo social, tendo um caráter dominante sobre o campo das representações desse grupo" (Lipiansky, 1991, p.50). A terceira distinção remete às funções específicas da ideologia. Esta aparece nas pesquisas em Psicologia Social com as funções de racionalização das condutas, função de defesa, função de articulação do individual e do grupai, do psicológico e do social. Para Lipiansky (1991) é necessário confrontar os dois conceitos para que se possam construir as articulações e suas possíveis operacionalizações no campo da Psicologia Social. Partindo da definição de ideologia como um sistema de representações, pode-se apenas deduzir que a ideologia seria o fio de articulação das diferentes representações. Isso nos daria a ideia da estrutura da ideologia, mas não de sua função e processo. No que se refere à função da ideologia, o pensamento marxista remete às relações de classe. "Ela traduz as posições e interesses de um grupo particular, naturalizando essas posições e interesse, apresentando-os como universais e comuns no conjunto da humanidade e tendendo a legitimar a ordem estabelecida" (Lipiansky, 1991, p. 56). Aqui, ideologia aparece como a expressão do pensamento de um grupo sem que haja reciprocidade. "A representação das relações deste grupo às suas práticas e relações sociais, torna-se, para ele, a descrição e explicação da realidade" (Lipiansky, 1991, p. 57). 24 3. A Psicologia e o Comportamento Social A Psicologia Social tem como foco o estudo do comportamento do indivíduo em sociedade. Segundo Lane (1995) o ambiente social incide no comportamento do indivíduo antes do seu nascimento, pois o contexto familiar e as condições em que a gestação acontece determinam a forma como este momento será significado e vivenciado. A psicologia estuda o convívio social, como ele se processa, quais as leis que regem e quais as consequências do processo de interação social. O objeto principal da psicologia social é o indivíduo em sociedade, pois não vivermos isolados, mas estamos em constante interação com outras pessoas. As principais teorias da Psicologia Social são as que se debruçam sobre a aprendizagem social, com base no behaviorismo, na perspectiva cognitivista, na perspectiva sociocultural e na perspectiva evolutiva baseada na influência biopsicossocial. As principais áreas da psicologia social são a percepção no que se refere à compreensão do outro, as atitudes na tomada de decisão em relação às mudanças das mesmas, agressão e conflito como fenômenos sociais na interação com o outro e as dinâmicas de grupos que visam compreender e conhecer a própria identidade. Segundo pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Psicologia em 1988, publicada no livro Quem é o psicólogo brasileiro, os motivos apontados quando da escolha da profissão podem ser de três ordens: Dos motivos voltados para si emerge a busca de mudanças; daqueles motivos voltados para o outro se evidencia a orientação de ajuda e, finalmente, dos motivos voltados para a profissão fica patente a atração e fascínio que o psíquico exerce sobre as pessoas (Carvalho et al., 1988, p.56). Isso significa que boa parte dos estudantes e profissionais da psicologia no Brasil tem a sua atuação voltada para a chamada psicologia tradicional na área clínica, que tem, historicamente, caráter privativo e individualizado. A psicologia social se diferencia em muitos aspectos da proposta de consultório 25 focando no indivíduo que está inserido na sociedade, que faz parte de um grupo social. Segundo Lane (2006), nosso modo de agir é determinado pelo grupo social ao qual pertencemos. Como, nesta convivência, definimos nossa identidade. A Psicologia Social estuda o comportamento dos indivíduos enquanto seres influenciados, por intermédio da linguagem e dos valores que assimilamos. Tratando do desenvolvimento da consciência social, na escola e no trabalho, a autora nos faz compreender a transformação do indivíduo em agente da história de sua sociedade. Estudando o processo de interação entre as pessoas, a psicologia social permite que se tenha uma melhor compreensão do comportamento social. Segundo Neves (2013), está concepção de ser humano recoloca a relação indivíduo e sociedade, rompendo com a perspectiva dualista e dicotômica, na qual indivíduo e contexto social influenciando-se mutuamente. Propõem em seu lugar a construção de um espaço de intersecção com novos temas, entre os quais, as representações sociais são os exemplos mais representativos. Nestes temas está incluído o estudo das causas e efeitos do comportamento individual e da interação dos mesmos com o grupo ou sociedade. Além disto, uma compreensão dos pensamentos, atitudes e comportamentos individuais que repercutem no campo social e no campo individual. Isso significa que boa parte dos estudantes e profissionais da psicologiano Brasil tem a sua atuação voltada para a chamada psicologia tradicional na área clínica, que tem, historicamente, caráter privativo e individualizado. A psicologia social se diferencia em muitos aspectos da proposta de consultório focando no indivíduo que está inserido na sociedade, que faz parte de um grupo social. Segundo Lane (2006), nosso modo de agir é determinado pelo grupo social ao qual pertencemos. Como, nesta convivência, definimos nossa identidade. A Psicologia Social estuda o comportamento dos indivíduos enquanto seres influenciados, por intermédio da linguagem e dos valores que assimilamos. Tratando do desenvolvimento da consciência social, na escola e no trabalho, a autora nos faz compreender a transformação do indivíduo em agente da história de sua sociedade. Estudando o processo de interação entre 26 as pessoas, a psicologia social permite que se tenha uma melhor compreensão do comportamento social. Segundo Neves (2013), está concepção de ser humano recoloca a relação indivíduo e sociedade, rompendo com a perspectiva dualista e dicotômica, na qual indivíduo e contexto social influenciando-se mutuamente. Propõem em seu lugar a construção de um espaço de intersecção com novos temas, entre os quais, as representações sociais são os exemplos mais representativos. Nestes temas está incluído o estudo das causas e efeitos do comportamento individual e da interação dos mesmos com o grupo ou sociedade. Além disto, uma compreensão dos pensamentos, atitudes e comportamentos individuais que repercutem no campo social e no campo individual. Segundo Farr (1994), existem duas formas diferentes de psicologia social: formas psicológicas e formas sociológicas. As formas psicológicas de psicologia social reduzem as explicações do coletivo e do social a partir de leis individuais. O indivíduo é entendido como uma entidade liberal, autônoma, independente das relações com o contexto social que o cerca e consciente de si. Segundo Figueiredo (1991), a história da psicologia emerge quando reconhece a instância individual do homem na sociedade e que, por motivos sociais, políticos e econômicos, necessita ser normatizada e padronizada. Desta forma, a psicologia só ganha espaço quando se tem o reconhecimento da experiência privatizada, bem como o reconhecimento da experiência da crise desta subjetividade. Ainda, é quando a doutrina liberal afirma a individualidade, liberdade e igualdade dos homens que se dá o reconhecimento daquela subjetividade. Entretanto, o próprio indivíduo percebe que estes princípios são mera ilusão, ocasionando assim a crise da subjetividade, que requer solução. Temos afirmado que esse é um bom motivo para estudar a história da psicologia (Cambava, Silva & Ferreira, 1997). Estudar a história da psicologia é apreendê-la na sua totalidade enquanto criação humana, isto é, compreender como, por que e quando foi criada. Isso pode significar a compreensão do predomínio de linhas teóricas, a eleição dominante de uma determinada área de atuação, o aparecimento de novas áreas de atuação. Mas estudar a história da psicologia vai, além disso, e inclui o homem como produtor de 27 conhecimento. De dessa forma, o situa frente ao mundo em que vive e no qual atua. A forma de compreender a psicologia tem a pretensão de estudar a sociedade, no entanto não pode ignorar a existência de fatores psicológicos ou individuais que influem no comportamento social. Neste caso o estudo da mente humana e da sua interação na sociedade ou de grupos específicos dentro da mesma, se apresenta como um misto de Psicologia e de Sociologia. Em outras palavras o estudo da psicologia na forma sociológica, se apresenta em três vertentes, que inclui conhecer o outro, as influências recíprocas entre ambos e as interações sociais. A Psicologia Social passa a estudar comportamento social, apoiando-se na compreensão das interações sociais, processo cognitivo, variáveis ambientais, contexto cultural e fatores biológicos dos indivíduos. Desta forma estamos considerando que o homem produz sua história e compreender como desenvolve ideias na sua relação com o mundo. 3.1. Concepções de Humanismo e as Contingências Sociais Segundo pensamento de Marx (1984), o primeiro pressuposto de toda história humana é a existência de indivíduos humanos vivos, que se distinguem dos animais, não pelo fato de pensar, mas de produzir seus meios de vida. A organização corporal destes indivíduos e sua relação com a natureza constituem a história da humanidade. Esta relação implica em transformação dos homens e da natureza, registrando pensamentos, que apoiam o conhecimento do mundo. ____________________ http://institutomentefit.org/2017/11/01/esquemas-mentais/ 28 Dessa maneira, o conhecimento humano se apresenta de diferentes formas: como conhecimento histórico, filosófico, teológico, senso comum, científico e tantos outros. Para Chauí (2002), dadas características que trazem a humanidade ao homem, como a liberdade, racionalidade, comunicabilidade e possibilidade de interação com a natureza e o tempo, a sociedade e a cultura definem o homem como sujeito do conhecimento e da ação, não podendo a violência reduzi-lo a coisa ou objeto. No entanto, tal cultura e sociedade, ao delinearem o que têm por crime, vício e o mal em geral, acabam por circunscrever aquilo que entendem por violência contra o próximo e, assim, erguer os valores positivos do bem e da virtude, como barreiras éticas contra a violência. Mais uma vez, sem que se perceba, os homens são educados e cultivados por criação histórico-cultural na busca da sociedade por uma manutenção de seus padrões morais que, com o tempo e as gerações, são naturalizados. As ideias psicológicas acerca de processos individuais e subjetivos se converterem em ciência requerem um pensar sobre a história da humanidade, sobre o desenvolvimento do seu pensamento enquanto manifestação da sua condição de vida material. Assim, apesar do fundo comum que possa haver entre sociedades com relação a certos valores éticos, é ainda primordial que seja respeitado aquilo que pode ser considerado como atitude ética pelas mais variadas culturas, ainda que tais valores agridam o que se tem por valor ético em sua própria sociedade, como, por exemplo, a manutenção da condição humana de sujeito sem que este se transforme em coisa a ser manipulada por outros. O humanismo é uma postura de vida democrática e ética que afirma que os seres humanos têm o direito e a responsabilidade de dar sentido e forma às suas próprias vidas. Defender a construção de uma sociedade mais humana através de uma ética baseada em valores humanos e outros valores naturais, dentro do espírito da razão e do livre-pensamento, com base nas capacidades humanas Desta forma, o humanismo constitui uma postura de vida que entra na esfera da compreensão do Outro. A psicologia humanista é uma reação ao determinismo nas práticas psicoterapêuticas, compreendendo o homem como autor de sua própria história e mesmo tempo preso a ela. 29 Até o problema mais simples deve ser objeto de investigação psicológica para entender o indivíduo como ser humano, incluído em um mundo social constituído por ações e interações, subordinadas a usos, costumes e regras e dizem respeito a meios, fins e resultados. Resumidamente humanismo, nesta forma de compreensão, significa, entre outras coisas, reconhecer que estamos em relação uns com os outros, que precisamos exercitar a compreensão para atingir o mundo do vivido do outro, aceitando sua racionalidade e intencionalidade. 3.2. As Contribuições da Psicologia Social Para Uma Concepção de Humanismo Passamos a tratar das relações que podem ser estabelecidas entre a psicologia social, ideologia e humanismo. A psicologia social deve estudar as formas de alteridadepensando nos modos pelos quais se estabelecem as trocas entre os seres humanos. Ao fazer estudo identifica a construção da subjetividade de um sujeito, constituída na relação com o outro. Implica, também, pensar na diferença, para aceitação mútua, o reconhecimento da singularidade e da identidade. Para que as ideias psicológicas acerca de processos individuais e subjetivos se converterem em ciência se fazem necessário pensar sobre a história da humanidade, sobre o desenvolvimento do seu pensamento, enquanto manifestação da sua condição de vida material. Faz-se necessário perguntar sobre as relações que podem ser estabelecidas entre a psicologia social, o entendimento da história e a ideologia que fundamenta as concepções de ser humano. Na discussão sobre o homem como objeto da ciência se inclui a interdisciplinaridade entre as subdivisões para investigar as condições que possibilitam a consolidação do olhar da Psicologia. As condições econômicas e sociais advindas do modelo político- econômico vigente da globalização da economia promovem o aumento da recessão, dos privilégios e do desemprego, degradando as relações humanas. A competição pelas ofertas cada vez menores de emprego e a consequente ameaça de perda daquilo que garante as condições básicas para a sobrevivência, o apelo ao consumo que não pode ser concretizado e, o pior, 30 os contingentes de excluídos e o decorrente aumento da violência e do ódio social, tornam a convivência entre as pessoas cada vez mais problemática. Neste contexto, falar em alteridade, construção da subjetividade, identidade psíquica e identidade cultural é um exercício árduo. Entretanto, quando constatamos o aumento ininterrupto de pessoas que o sistema excluiu e transformou em moradores de rua, sem teto, sem privacidade, sem sequer um espaço que separe o público do privado, totalmente expostos e invadidos pelos olhares curiosos ou indiferentes dos passantes, fica difícil pensar em preservação da identidade e na sobrevivência do sujeito. O que temos, então, são trocas marcadas pela rejeição, pelo ódio, pela indiferença. Os investimentos afetivos são, em grande parte, da mesma ordem, ou seja, falta amor, fundamento para a bondade e o caráter. As pessoas são coisificadas e as coisas personalizadas. Tratar do comportamento social como uma questão psicológica isolada é facilmente questionável, pois, sem situar a análise em um campo social, que leva em consideração uma gama muito maior de fatores interdependentes, interagindo entre si, inviabiliza uma completa análise sócia histórica. (Crespo & Freire, 2014). Atualmente se instalou uma nova forma de individualismo como uma radical mudança de contrato social, o que produziu uma troca ideológica neoliberal e que põe em questão o modelo antes vigente de repartimento de riquezas e a legitimidade desse repartimento. As responsabilidades da atual constituição da sociedade e do sujeito se constroem mutuamente num processo social, histórico, político e ético. Portanto segundo Guareci (2012), a psicologia social faz a junção entre o ser humano sua consciência e a realidade exterior: sua consciência é resultante das respostas que conseguimos dar às perguntas: Por que sou o que sou? Por que o mundo que me rodeia é assim? A verdadeira consciência, isto é, o fundamental e profundo e insubstituível, o essencial do ser humano, é o que ele consegue construir a partir de seu entorno existencial e do que fizeram dele, ou seja, o ser humano começa a se subjetivar, a construir a ter consciência no momento em que descobre respostas às perguntas. É neste sentido que precisamos ter como ponto de partida o entendimento das interações tais como elas se apresentam neste dado momento histórico, como as personalidades se expressam historicamente 31 através da vida institucional e social mais ampla que norteiam tais relações. Esta é uma das tarefas da psicologia social que bem desempenhada, pode nos oferecer elementos necessários para a transformação da realidade. 3.3. Implicações Para uma Ciência Histórica do Comportamento Social Sob a luz dos presentes argumentos, a tentativa contínua de construir leis gerais do comportamento social parece mal direcionada, e a crença associada a ela de que o conhecimento da interação social pode ser acumulado como nas ciências naturais revela-se injustificada. Em essência, o estudo em psicologia social é fundamentalmente um empreendimento histórico. Estamos essencialmente engajados em incontáveis questões contemporâneas. Utilizamos metodologia científica, porém os resultados não são princípios científicos no sentido tradicional. No futuro, historiadores poderão voltar-se para tais relatos do passado a fim de alcançar uma melhor compreensão acerca da vida nos dias atuais. Entretanto, é provável que os psicólogos do futuro encontrem pouco valor no conhecimento contemporâneo. Esses argumentos não são puramente acadêmicos e não se limitam a uma simples redefinição de ciência. Aqui estão implicadas significantes alterações na atividade de campo. Cinco dessas alterações merecem atenção. Rumo à Integração do Puro e do Aplicado Entre psicólogos acadêmicos encontra-se difundido um preconceito contra a pesquisa aplicada, um preconceito que é evidenciado pelo enfoque dado à pesquisa pura pelos periódicos de prestígio e pela dependência de promoção e manutenção de contribuições à pesquisa pura em oposição à pesquisa aplicada. Esse preconceito baseia-se, em parte, na suposição de que a pesquisa aplicada é de valor transitório. Enquanto esta se limitaria a resolver problemas imediatos, a pesquisa pura contribuiria para um conhecimento básico e duradouro. Do ponto de vista atual, o solo no qual se assentam tais preconceitos não é merecedor de respeito. O conhecimento que a pesquisa pura se dedica em estabelecer é 32 também transitório; generalizações nessa área de pesquisa geralmente não perduram. A tal ponto que, quando generalizações da pesquisa pura têm grande validade transitória, podem estar refletindo processos de interesse periférico ou importantes para o funcionamento da sociedade. Psicólogos sociais são treinados para usar ferramentas de análise conceitual e metodologia científica a fim de explicar a interação humana. No entanto, dada a esterilidade em aperfeiçoar os princípios gerais ao longo do tempo, essas ferramentas mostram-se mais produtivas quando usadas na resolução de problemas de importância imediata para a sociedade. Isso não implica que tais pesquisas devam ser de alcance restrito. Um defeito fundamental de grande parte das pesquisas aplicadas é que os termos usados para descrever e explicar são relativamente concretos e específicos para o caso em mãos. Enquanto os comportamentos concretos estudados pelos psicólogos acadêmicos são frequentemente mais triviais, a linguagem explicativa é altamente geral, e assim mais amplamente heurística. É assim que os argumentos presentes sugerem uma intensa focalização em assuntos sociais contemporâneos, baseados na aplicação de métodos científicos e ferramentas conceituais largamente generalizadas. Da Predição à Sensibilização O objetivo central da psicologia é tradicionalmente encarado como a predição e o controle do comportamento. Do nosso ponto de vista, esse objetivo é despropositado e oferece pouca justificativa para a pesquisa. Princípios do comportamento humano podem ter valor preditivo temporalmente limitado, e seu alto conhecimento pode torná-los impotentes como ferramentas de controle social. Todavia, previsão e controle não precisam servir de pedras angulares do campo. A teoria psicológica pode desempenhar um papel excessivamente importante enquanto dispositivo de sensibilização. Pode esclarecer-nos acerca da gama de fatores que potencialmente influenciam o comportamento sob váriascondições. A pesquisa pode também oferecer algumas estimativas da importância desses valores num determinado momento. Seja no caso do domínio da política pública ou dos relacionamentos pessoais, a psicologia 33 social pode aguçar a sensibilidade de um indivíduo para influências sutis e apontar suposições sobre o comportamento que não se mostraram úteis no passado. Quando se pede um conselho ao psicólogo social sobre um provável comportamento em uma situação concreta, a reação consiste em desculpar-se. É necessário explicar que o campo ainda não se encontra suficientemente desenvolvido a ponto de que predições confiáveis possam ser feitas. Do nosso ponto de vista, tais desculpas são inapropriadas. O campo pode raramente fornecer princípios para que predições confiáveis possam ser feitas. Padrões de comportamento estão sob constante mudança. Contudo, o que o campo pode e deve oferecer são pesquisas informando o inquiridor do número de possíveis ocorrências, ampliando assim sua sensibilidade e preparando-o para uma acomodação mais rápida à modificação ambiental. Pode prover ferramentas conceituais e metodológicas com as quais um número maior de juízos de discernimento pode ser efetuado. 3.4. Desenvolvendo Indicadores de Disposições Psicossociais Psicólogos sociais evidenciam uma contínua preocupação com processos psicológicos básicos, ou seja, processos que influenciam um vasto e variado conjunto de comportamentos sociais. Simulando a preocupação de psicólogos experimentais com processos básicos, como visão em cores, aquisição da linguagem, memória e assim por diante, psicólogos sociais detiveram-se em alguns processos, tais como dissonância cognitiva, nível de aspiração e atribuição causal. Entretanto, há uma profunda diferença entre os processos estudados nos domínios da psicologia geral experimental e no domínio da psicologia social. No primeiro caso, os processos estão frequentemente guardados biologicamente no organismo, não estão sujeitos a efeitos de esclarecimento e não dependem de circunstâncias culturais. Ao contrário, a maioria dos processos de domínio social é dependente de disposições sujeitas a modificação ao longo do tempo. Assim sendo, é um erro considerar os processos em psicologia social como básicos no sentido das ciências naturais. Antes, podem ser largamente 34 considerados a contrapartida psicológica de normas culturais. Da mesma maneira que um sociólogo preocupa-se em medir preferências parciais ou padrões de mobilidade no decurso do tempo, o psicólogo social poderia atentar para os padrões de mudança das disposições psicológicas e a sua relação com o comportamento social. Se a redução de dissonância é um processo importante, então deveríamos estar aptos a medir a prevalência e a força de tal disposição no seio da sociedade ao longo de tempo e os modos de redução de dissonância prediletos num dado momento. Se a elevação da estima parece influenciar a interação social, os amplos estudos culturais deveriam revelar a extensão dessa disposição, sua força em várias subculturas, e a forma do comportamento social com a qual se encontra mais associada a um dado momento. Embora experimentos em laboratório sejam adequados ao isolamento de disposições particulares, são pobres indicadores da série e da significância dos processos da vida social contemporânea. São extremamente necessárias metodologias que estabeleçam contato com a prevalência, força e forma das disposições sociais no tempo. Com efeito, uma tecnologia dos indicadores sociais psicologicamente sensíveis (Bauer, 1969) é desejada. Pesquisa em Estabilidade Comportamental O fenômeno social pode variar consideravelmente na medida em que se submete à mudança histórica. Certos fenômenos podem ser mais estreitamente vinculados a dados fisiológicos. A pesquisa de Schachter (1970) sobre estados emocionais parece ter uma forte base fisiológica, assim como o trabalho de Hess (1965) sobre afeto e constrição pupilar. Embora disposições adquiridas possam vir a superar algumas tendências fisiológicas, tais tendências deveriam se reafirmar gradualmente. Outras propensões fisiológicas, ainda, podem ser irreversíveis. Pode haver também disposições que são suficientemente poderosas para que nem o esclarecimento e nem mesmo as mudanças históricas venham a causar-lhe algum impacto. Algumas pessoas geralmente evitarão estímulos físicos dolorosos, apesar de suas sofisticações ou das normas correntes. Devemos pensar, então, em termos de um contínuo de durabilidade histórica, com 35 fenômenos altamente suscetíveis à influência histórica num extremo e processos mais estáveis no outro. Assim, métodos de pesquisa habilitando-nos a discernir a durabilidade relativa do fenômeno social são bastante necessários. Métodos interculturais poderiam ser empregados para esse fim. Embora a replicação intercultural seja repleta de dificuldades, similaridade numa dada função entre culturas amplamente divergentes atestaria fortemente sua durabilidade no tempo. Técnicas de análise de conteúdo poderiam também ser empregadas no exame de períodos históricos recentes. Até agora, tais empreendimentos têm fornecido pouco além de citações indicando que algum grande pensador pressentiu uma hipótese familiar. Temos ainda que travar contato com a vasta quantidade de informações referentes aos padrões de interação nos últimos períodos. Embora a progressiva sofisticação dos padrões de comportamento ao longo do espaço e do tempo fornecesse valiosas compreensões referentes à durabilidade, alguns difíceis problemas apresentar-se-iam. Alguns padrões de comportamento podem permanecer estáveis até uma observação minuciosa. Outros podem simplesmente tornar-se disfuncionais com o passar do tempo. A confiança do homem num conceito de deidade tem uma longa história e é encontrada em numerosas culturas. Entretanto, muitos são céticos sobre o futuro desta crença. Taxas de durabilidade teriam assim que contribuir para a estabilidade potencial tanto quanto atual do fenômeno. Ainda que a pesquisa por disposições culturais mais duráveis seja extremamente valiosa, não deveríamos daí concluir que seja mais útil ou desejável que estudar os padrões passados de comportamento. Grande parte da variabilidade do comportamento social deve-se indubitavelmente a disposições historicamente dependentes, e o desafio de capturar tais processos "em luta" e durante períodos preciosos da história é imenso. Rumo a uma História Social Integrada Sustentou-se que a pesquisa em psicologia social é fundamentalmente o estudo sistemático da história contemporânea. Assim sendo, parece miopia manter a separação disciplinar (a) do estudo tradicional de história e (b) de outras ciências historicamente fronteiriças (incluindo sociologia, ciência política 36 e economia). As particulares estratégias de pesquisa e a sensibilidade do historiador poderiam elevar a compreensão da psicologia social, passada e presente. Particularmente útil seria a sensibilidade do historiador às sequências causais no curso do tempo. Muitas pesquisas em psicologia social centram-se em segmentos momentâneos de processos em andamento. Temos nos concentrado muito pouco na função desses segmentos dentro de seu contexto histórico. Temos pouca teoria lidando com a inter-relação entre eventos dentro de longos períodos de tempo. Da mesma feita, historiadores poderiam beneficiar-se das mais rigorosas metodologias empregadas pelos psicólogos sociais tanto quanto de sua sensibilidade a variáveis psicológicas. Contudo, o estudo da história, passada e presente, deveria ser empreendido da maneira mais ampla possível. 4. Psicologia Social: Educação, Trabalho Quando a Psicologia se constituiu como disciplina científica, seu alcance ficou inicialmente limitado à análise damente e de seus mecanismos, antes de expandir-se e incluir o estudo do comportamento. Durante a maior parte da primeira metade dos séculos XX, a ênfase da disciplina ficou, portanto, no estudo da mente e do comportamento individual e suas respostas ao ambiente. Não obstante, ficou cada vez mais claro para alguns psicólogos que o “ambiente” incluía outras pessoas, configurando um ambiente socioeconômico e político através de relações interpessoais. A Psicologia Social surgiu na década de 1930, quando os psicólogos começaram a investigar as interações de indivíduos dentro de grupos e da sociedade como um todo. Eles examinaram o efeito das organizações sociais sobre o indivíduo e de que maneira as estruturas sociais são influenciadas pela psicologia dos indivíduos. Os psicólogos sociais, como eram chamados, estudaram também as relações entre indivíduos dentro de um mesmo grupo e de grupos diferentes. Surgiram desses estudos novos temas de interesse para a Psicologia, tais 37 como: dinâmica, atitudes e preconceitos de grupo, conflito, conformidade, obediência e transformação social. Um dos primeiros a conduzir um estudo sistemático da Psicologia de Grupos Sociais foi o germano-americano Kurt Lewin, considerado “o pai da Psicologia Social”. Lewin adotou uma nova perspectiva sobre a abordagem behaviorista dominante e propôs-se a investigar como o comportamento resulta da interação do indivíduo com o ambiente, bem como com a natureza desse ambiente. Seus estudos de pequenos grupos abriram caminho para análises subsequentes sobre as dinâmicas de grupos e como os grupos e seus membros conseguem implementar mudanças. O behaviorismo havia caído em ostracismo após a Segunda Guerra Mundial, e as ideias de Lewin sobre os efeitos do meio social ofereciam um caminho alternativo que foi muito bem recebido pela geração seguinte. O conceito de “atribuição” – o modo como enxergamos e interpretamos o comportamento alheio tornou-se uma área de pesquisa independente e originou as teorias de conformidade e de obediência a normas culturais. A teoria que desempenhamos certos comportamentos para nos adequarmos à impressão que queremos passar aos outros também foi resultado desse novo enfoque, destacando a importância da interação social. Quando pesquisas, realizadas na década de 1960, desvendaram aspectos mais obscuros do comportamento, percebeu-se que, às vezes, as vítimas são culpadas pelo ocorrido com elas. Comportamentos aparentemente anormais poderiam resultar de circunstâncias, e não de insanidade. Pesquisou-se também até que ponto a necessidade de obedecer e se conformar afeta o nosso comportamento. O advento da Psicologia Cognitiva propiciou novos ares à Psicologia Social. Os efeitos dos processos cognitivos, como memória e emoções, passaram a ter um impacto cada vez maior sobre as estruturas sociais, motivando as Teorias de Construtivismo Social. Construtivismo social é uma área do interesse de historiadores, filósofos, e sociólogos da ciência. Ela é a extensão na qual teorias científicas são moldadas por seus contextos políticos e sociais. O construtivismo social é em um sentido uma extensão do instrumentalismo que incorpora os aspectos sociais da ciência. Em sua forma mais forte, vê a ciência como um mero 38 discurso entre cientistas, com o fato objetivo desempenhando pouco papel, se de fato desempenhar algum. Uma forma mais fraca da posição construtivista pode defender que fatores sociais desempenham um grande papel na aceitação de novas teorias científicas. Pode ser mais bem explicado como uma teoria sociológica que aplica o construcionismo filosófico ao cenário social, onde os grupos de pessoas colaboram com a sabedoria um dos outros, criando uma pequena cultura onde significada e sabedorias são abertamente compartilhados. Quando alguém está imerso em alguma cultura deste tipo, está inevitavelmente aprendendo o tempo todo com a experiência e ideias dos outros participantes. O aumento de discussões em sala de aula está de acordo com as Teorias de Construtivismo Social. Afinal de contas, muitas são as vantagens que resultam da implementação desse método didático para as pessoas envolvidas. A participação ativa em debates permite aos estudantes generalizar e transferir conhecimentos de uns aos outros e os permite trabalhar a forma de expressar suas ideias oralmente. É uma oportunidade para que os estudantes expressem e testem suas ideias, simplifiquem as ideias dos outros, e aprendam mais profundamente o assunto abordado antes de expressá-los. Adicionalmente, a discussão aumenta a motivação dos estudantes e a habilidade de resolver problemas. Grupos grandes ou pequenos são beneficiados pelo aprendizado de autorregularão, autodeterminação e de desejo de perseverar com os objetivos construídos pelo debate. Criar a oportunidade dos estudantes de conversarem e argumentarem uns com os outros e discutir suas ideias aumenta a habilidade de racionalizar o que estão pensando, desenvolver um sentido de autocrítica, e argumentar suas opiniões uns com os outros. Além disto, o sentimento de participação e colaboração aumenta, já que os estudantes passam a discutir em seus círculos, e como consequência disto, até mesmo sua confiança tende a aumentar. Dadas às vantagens que resultam da discussão, é uma surpresa que tais discussões não fazem parte de uma maior parte das atividades de aprendizado. Estudos e evidências empíricas comprovam que estudantes não são acostumados, de uma forma geral, a participar em discussões acadêmicas. Os professores raramente elegem discussões em classe como forma de ensino. Em geral, os professores dedicam menos de 5% do seu tempo à 39 discussão em classe. Mesmo dentro destes 5%, as discussões não são nada produtivas, já que os alunos estão pouco acostumados a falar e acabam não se expressando de maneira eficaz, ficando nas mãos do professor a responsabilidade de conduzir perguntas, normalmente com respostas pré- estabelecidas, para que boas ideias sejam geradas. Professores que valorizam as ideias de seus alunos criam pessoas que aprendem e se desenvolvem. A discussão através de grupos discussão estimula as ideias de cada pessoa, não somente por elas estarem expondo o que pensam, mas também por serem obrigadas a filtrar, se autocriticar e se comunicar de maneira eficaz com os outros. Este tipo de aprendizado “promove a retenção e o aprendizado pleno, que está associado à manipulação cognitiva das informações”. 4.1. Psicologia Social, do Trabalho e Organizacional A relação da Psicologia com o trabalho no contexto atual Devemos esclarecer que os modelos de organização do trabalho predominantes na atualidade são, na verdade, um “aperfeiçoamento” do taylorismo-fordismo. Segundo Antunes (1999), o capitalismo sofreu profundas mudanças em decorrência de uma grave crise enfrentada a parir da década de 1970. A essa crise se somam a expansão da globalização da economia de cunho neoliberal e a introdução de novas tecnologias nos processos produtivos, especialmente aquelas relacionadas à microeletrônica, que caracterizam as últimas décadas. Na maior parte dos ramos produtivos, há pouco espaço para a produção em massa de produtos padronizados, o que caracteriza o período em que o modelo taylorista-fordista teve seu auge. Desse modo, as empresas passaram a buscar maior “flexibilidade”, para atender a uma demanda mais diversificada em menores quantidades. E, para conseguir isso, foi necessário adaptar as formas de gestão do trabalho, tornando-as, também, mais flexíveis (Bernardo, 2009). Entre os vários modelos que surgiram, um se destaca pela influência que teve em todos os meios de 40 trabalho. Trata-se do chamado modelo japonês de produção, também conhecido como toyoismo. Uma das características mais marcantes que diferencia o toyoismo
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