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PRINCÍPIOS DE CLIMATOLOGIA HIDROLOGIA Vanessa de Souza Machado Introdução à hidrologia Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identi� car a importância da água e seus distintos usos. Relacionar os conceitos básicos de hidrologia. Caracterizar os estudos hidrológicos. Introdução A água é um dos recursos mais preciosos do mundo. Sem ela, não haveria vida na Terra. Sendo assim, você precisa entender alguns importantes conceitos associados a esse tema, sendo eles a caracterização, a ocorrência, a distribuição e a movimentação da água no planeta em que vivemos. Neste texto, você vai estudar esses conceitos e a importância do co- nhecimento diante da ocorrência de água em determinados locais, sua circulação, leis e fenômenos que ocorrem entre a água e o meio ambiente. A água e seus usos Como você viu na introdução deste texto, a água é um dos recursos mais pre- ciosos do mundo e, sem ela, não haveria vida na Terra. Embora a quantidade total de água na Terra seja fi xa e não possa ser aumentada, podemos dizer que não corremos risco de fi car sem ela, mas é preciso fi car atentos, pois há escassez em alguns lugares do mundo, em função das diversas potencialidades de uso. Essa escassez ocorre por motivos de quantidade e de qualidade. As demandas de uso da água para as mais diversas finalidades, a partir do século XX, passaram a ter um aumento significativo em relação a sua disponibilidade. Foi reconhecido, também nesse período, o fato lamentável de que 47% da área do globo é composta por bacias hidrográficas compartilhadas U N I D A D E 1 por mais de um país. Essa constatação justifica vários conflitos internacionais, que têm como tema principal a água. A luta pela posse de territórios com nascentes de grandes rios e cursos d’água é um dos temores do século XXI, por ser o motivo de estar provocando algumas guerras, como no Oriente Médio, por exemplo. A água é um mineral presente em toda a natureza nos estados sólido, líquido e gasoso. Além de ser essencial para a sobrevivência de homens e animais, a água pode exercer a função de diluir, receber e transportar efluentes. A abundância desse recurso pode ser notada pelo fato de a água cobrir cerca de três quartos da superfície do planeta. Embora, a quantidade total de água na Terra seja enorme, boa parte dela não está prontamente disponível para o uso humano, pois apenas uma pequena porcentagem é de água doce. Tipos de uso da água Agora que você já leu sobre a importância da água, vamos apresentar os tipos de uso desse recurso, que são classifi cados em dois grandes grupos: Usos consuntivos: aqueles usos em que há perda entre o que é retirado do corpo hídrico e o que retorna a ele, como o caso dos abastecimentos doméstico e industrial, a limpeza pública e a irrigação. Usos não consuntivos: aqueles em que não há necessidade da retirada de água de seu local de origem, por exemplo, para geração de energia, transporte e navegação, lazer e piscicultura. É importante ressaltar que a produção agrícola é responsável pelo uso de 69% da água doce disponível mundialmente para abastecimento. O setor industrial, em segundo lugar, é responsável pelo uso de 21% dela, e o uso doméstico fica por último, com 10%. Dos 2,5% de água doce do planeta, cerca de 15% estão no Brasil. A Or- ganização das Nações Unidas (ONU) classifica a disponibilidade hídrica, como (SABESP, [2017b]): Abundante: disponibilidade hídrica de mais de 20.000 metros cúbicos (m³) por habitante por ano. Correta: disponibilidade hídrica entre 2.500 m³ e 20.000 m³ por ha- bitante por ano. Pobre: disponibilidade hídrica entre 1.500 m³ e 2.500 m³ por habitante por ano. Princípios de climatologia e hidrologia14 Crítica: disponibilidade hídrica menor que 1.500 m³ por habitante por ano. A disponibilidade, assim como a distribuição hídricas pelo planeta são influenciadas fortemente pelo clima, sendo assim, elas podem flutuar entre as estações e entre os anos seguidos. 20% da população mundial habita regiões semiáridas. 44% da precipitação são acessíveis por reservatórios e barragens. A precipitação média anual do planeta é de 900 mm, sendo que 1 mm de chuva equivale a 1 litro de precipitação que se acumula em 1 m2. 1/3 da precipitação mundial se encontra na América do Sul e no Caribe. Países do norte da África apresentam 100 mm anuais de precipitação, apresentando a maior taxa de evaporação e a menor de precipitação registrada. Água virtual, segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP, [2017a]), é a quantidade de água gasta para produzir um bem, produto ou serviço. Ela está embutida no produto, não apenas nos sentidos visível e físico, mas também no sentido “virtual”, por isso o nome. Considerando a água necessária aos processos produtivos, ela é, portanto, uma medida indireta dos recursos hídricos consumidos por um bem. Hidrologia A hidrologia é o estudo científi co das águas: seus processos, interações com o ambiente, transporte e ciclo. A hidrologia examina as propriedades da água, sua ocorrência, distribuição e movimento no planeta. 15Introdução à hidrologia A hidrologia é uma ciência interdisciplinar que tem tido evolução signifi- cativa em razão dos problemas crescentes, resultados da ocupação das bacias, do incremento significativo da utilização de água e do impacto resultante sobre o meio ambiente. Os profissionais de diversas áreas, como engenheiros, agrônomos, geólogos, matemáticos, estatísticos, geógrafos, biólogos, gestores ambientais, entre outros atuam nas diferentes subáreas dessa ciência. Como é uma disciplina que abrange uma grande parte do conhecimento humano, a hidrologia foi subdividida em algumas subáreas: Hidrometeorologia: a parte da ciência que trata da água na atmosfera. Limnologia: refere-se ao estudo dos lagos e reservatórios. Potamologia: trata do estudo dos arroios e rios. Glaciologia: a área da ciência relacionada à neve e ao gelo na natureza. Hidrogeologia: o campo científico que trata das águas subterrâneas. A hidrologia evoluiu de uma ciência preponderantemente descritiva e qualitativa, para uma área do conhecimento em que os métodos quantitati- vos têm sido explorados, aprimorando os resultados e explorando melhor as informações existentes. No âmbito da utilização da hidrologia em recursos hídricos, ela é entendida como a área que estuda o comportamento físico da ocorrência e o aproveita- mento da água na bacia hidrográfica, quantificando os recursos hídricos no tempo e no espaço, além de avaliar o impacto da modificação da bacia hidro- gráfica sobre o comportamento dos processos hidrológicos. A quantificação da disponibilidade hídrica serve de base para o planejamento e o projeto dos recursos hídricos. Alguns exemplos são: abastecimento de água, navegação, produção de energia hidrelétrica, controle de enchentes e impacto ambiental. A hidrologia é uma ciência de extrema importância para o entendimento da formação de rios, lagos e oceanos existentes na superfície terrestre. Os profissionais de hidrologia atuam também na prospecção de poços de água e aquíferos. Em um tempo em que os recursos hídricos, principalmente de água doce, estão ficando cada vez mais raros, a hidrologia torna-se uma ciência de grande importância para o ser humano. Princípios de climatologia e hidrologia16 Estudos hidrológicos A hidrologia científi ca pertence ao contexto do desenvolvimento clássico do conhecimento científi co, já a hidrologia aplicada estuda os diferentes fatores relevantes ao provimento de água para a saúde e para a produção de comida no mundo. Hidrologia científica A hidrologia científi ca se consolidou apenas na segunda parte do século XX, por meio do desenvolvimento de programas de observação e quantifi cação sistemática dos diferentes processos que ocorrem no ciclo hidrológico. A sub- divisão, já apresentada, foi expandida,surgindo subáreas mais especializadas, como resultado da necessidade crescente da utilização e da preservação da bacia hidrográfi ca. Algumas das subáreas que tratam da análise dos proces- sos físicos que ocorrem na bacia são: hidrometeorologia, geomorfologia, escoamento superfi cial, interceptação vegetal, infi ltração, qualidade da água e meio ambiente. A hidrologia como ciência está voltada para a representação dos processos físicos que ocorrem na bacia hidrográfica. Em diferentes partes do mundo, foram equipadas bacias representativas e experimentais, que permitem ob- servar em detalhes o comportamento dos diferentes processos. Com base no registro das variáveis hidrológicas envolvidas, é possível entender melhor os fenômenos e procurar representa-los matematicamente. A caracterização dos processos hidrológicos tem sido desenvolvida para a microescala (10-8 a 10-2m), ao passo que para a mesoescala (102 a 104m) e macroescala (105 a 107m) existem muitas dificuldades, principalmente na transferência da teoria usada de uma escala para outra. As prioridades científicas em hidrologia, sem ordem hierárquica, são: Componentes químicos e biológicos do ciclo hidrológico: envolvem o melhor conhecimento dos processos geoquímicos; Escala dos processos dinâmicos: a dificuldade de transferência entre processos que ocorrem em diferentes escalas; Interação entre superfície e atmosfera: interação entre as variáveis climáticas e as superfícies; Conhecimento ao nível global do armazenamento e fluxos de água e energia; Efeitos hidrológicos devido às atividades humanas. 17Introdução à hidrologia Hidrologia aplicada A hidrologia aplicada está direcionada aos diferentes problemas que en- volvem a utilização dos recursos hídricos, preservação do meio ambiente e ocupação da bacia. A utilização dos recursos hídricos envolvem os aspectos de disponibilidade hídrica, regularização de vazão, planejamento, operação e gerenciamento dos recursos hídricos. Quanto a preservação do meio ambiente, modificações do uso do solo, regularização para controle de qualidade da água, impacto das obras hidráulicas sobre o meio ambiente aquático e terrestre, são exemplos de problemas que envolvem aspectos multidisciplinares dentro da hidrologia. A ocupação da bacia pela população gera duas preocupações distintas. A primeira refere-se ao impacto do meio sobre a população por meio das enchentes; e a segunda, ao impacto do homem sobre a bacia, mencionado na preservação do meio ambiente. No Brasil, algumas das principais áreas do desenvolvimento da hidrologia aplicada encontram-se nos seguintes aspectos: Planejamento e gerenciamento da bacia hidrográfica: o desenvolvi- mento das principais bacias quanto ao planejamento e controle do uso dos recursos naturais requer uma ação pública e privada coordenada. Drenagem urbana: atualmente 75% da população do Brasil ocupa o espaço urbano. Enchentes, produção de sedimentos e qualidade da água são problemas sérios encontrados em grande parte das cidades brasileiras. Energia: a produção de energia hidrelétrica representa 92% de toda a energia produzida no país. O potencial hidrelétrico ainda existente é significativo, mas essa energia depende da disponibilidade de água, da sua regularização por obras hidráulicas e seu impacto sobre o meio ambiente. Uso do solo rural: a expansão das fronteiras agrícolas e o intenso uso agrícola têm gerado impactos significativos na produção de sedimentos e nutrientes nas bacias rurais, resultando em perda de solo fértil e assoreamento dos rios. Qualidade da água: o meio ambiente aquático (oceanos, rios, lagos, reservatórios e aquíferos) sofre com a falta de tratamento dos despejos domésticos e industriais e de cargas de pesticidas de uso agrícola. Abastecimento de água: a disponibilidade de água, que apesar de farta em grande parte do país, apresenta limitações nas regiões áridas e Princípios de climatologia e hidrologia18 semiáridas do nordeste brasileiro. A redução da qualidade da água dos rios e as grandes concentrações urbanas têm apresentado limitações quanto à disponibilidade de água para o abastecimento. Irrigação: a produção agrícola nas regiões áridas e semiáridas depende essencialmente da disponibilidade de água. No Sul, culturas como o arroz utilizam quantidades significativas de água. O aumento da pro- dutividade passa pelo aumento da irrigação em grande parte do país. Navegação: a navegação interior é ainda pequena, mas com grande potencial de transporte. Ela pode ter um peso significativo no desenvolvi- mento nacional. Os principais aspectos hidrológicos são: disponibilidade hídrica para calado, previsão de níveis e planejamento e operação de obras hidráulicas para navegação. A Lei nº 9.433 de 8 de janeiro de 1997 (BRASIL, 1997), instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e também criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Em seu art. 1º são apresentados os fundamentos dessa política: a água é um bem de domínio público; a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. A Lei nº 9.984 de 17 de julho de 2000 (BRASIL, 2000), dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas (ANA), entidade federal de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e de coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Nessa lei, no art. 4º, a atuação da ANA obedecerá aos fundamentos, objetivos, diretrizes e instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos e será desenvolvida em articulação com órgãos e entidades públicas e privadas integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. A hidrologia é uma ciência que se baseia na observação dos processos envolvidos no meio físico natural. Para analisar a sazonalidade da ocorrência de precipitações, em um determinado local, utilizam-se observações realizadas no passado, uma vez que os fenômenos provocados pelos processos hidrológi- cos na bacia hidrográfica são os eventos meteorológicos, cuja previsão é em 19Introdução à hidrologia médio e longo prazos, o conhecimento atual ainda não dispõe de explicações suficientes. O ser humano, desde sua origem, convive com as condições naturais do planeta, tanto em seu uso como na sua sobrevivência. Mesmo não conhecendo a origem da água e o funcionamento dos fenômenos naturais, as civilizações antigas exploraram os recursos hídricos por meio de projetos de irrigação, como os do Egito e Mesopotâmia, aquedutos para abastecimento de água romanos e irrigação e controle de inundação pelos chineses. O desenvolvimento na hidrologia moderna está ligado ao uso da água, ao seu controle de ação sobre a população e ao impacto sobre a bacia e o globo terrestre. Nos links a seguir (ABREU; CUNHA, 2016; BENINI; MENDIONDO, 2015), você encontrará artigos sobre o tema. Qualidade da água e índice trófico em rio de ecossistema tropical sob impacto ambiental. Disponível em: <https://goo.gl/6dHs3E> Urbanização e Impactos no ciclo hidrológico na bacia do Mineirinho. Disponível em: <https://goo.gl/VQ49Mf> Princípios de climatologia e hidrologia20 ABREU, C. H. M.; CUNHA, A. C. Qualidade da água e índice trófico em rio de ecossistema tropical sob impacto ambiental. Revista de Engenharia Sanitária Ambiental, Rio de Janeiro, out. 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/esa/2016nahead/1809-4457- esa- -S1413_41522016144803.pdf>. Acesso em: 24 dez.2016. BENINI, R. M.; MENDIONDO, E. M. Urbanização e impactos no ciclo hidrológico na bacia do Mineirinho. Floresta e Ambiente, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 211-222, 2015. Dis- ponível em: <http://www.scielo.br/pdf/floram/v22n2/2179-8087- floram-22-2-211. pdf>. Acesso em: 24 dez. 2016. BRASIL. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Brasília, DF, 1997. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9433.htm>. Acesso em: 24 dez. 2016. BRASIL. Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000. Dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas – ANA. Brasília, DF, 2000. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/ L9984.htm#art30>. Acesso em: 24 dez. 2016. SABESP. Água virtual. São Paulo, [2017a]. Disponível em: <http://site.sabesp.com.br/ site/interna/ Default.aspx?secaoId=105>. Acesso em: 01 fev. 2017. SABESP. Uso racional da água. São Paulo, [2017b]. Disponível em: <http://site.sabesp. com.br/site/interna/ Default.aspx?secaoId=137>. Acesso em: 01 fev. 2017. Leituras recomendadas BRASIL. Princípios de hidrologia ambiental: curso de aperfeiçoamento em gestão de recursos hídricos. Brasília, DF: Ministério da Ciência e Tecnologia, [2003]. Disponí- vel em: <http://capacitacao.ana.gov.br/Lists/Editais_Anexos/ Attachments/23/03. PHidrologiaAmb-GRH-220909.pdf>. Acesso em: 24 dez. 2016. PAZ, A. R. da. Hidrologia aplicada. Caxias do Sul: Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, 2004. Disponível em: <http://www.ct.ufpb.br/~adrianorpaz/artigos/ apos- tila_HIDROLOGIA_APLICADA_UERGS.pdf>. Acesso em: 24 dez. 2016. ROSA, A. H.; FRACETO, L. F.; MOSCHINI-CARLOS, V. (Org.). Meio ambiente e sustentabi- lidade. Porto Alegre: Bookman, 2012. 23Introdução à hidrologia
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