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Psicólogo no psicodiagnóstico fenomenológico Referência: Reformulação do Papel do Psicólogo no Psicodiagnóstico Fenomenológico Existencial e sua Repercussão sobre os Pais. Uma das contribuições do psicodiagnóstico fenomenológico existencial está na reavaliação do papel desempenhado pelo cliente e pelo psicólogo, nesta situação em que o cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no trabalho de compreensão e eventual encaminhamento posterior. Observamos que os pais que comparecem para os atendimentos indicados a partir desta maneira de desenvolver o psicodiagnóstico (tradicional), quando comparecem, mostram pouca motivação para os mesmos. Quando questionados a respeito do atendimento anterior revelam desconhecimento do processo pelo qual passaram, limitando-se a repetir a queixa inicial, agora acrescida da indicação terapêutica. Todo ser humano está mergulhado no mundo que está sempre presente, embora muitas vezes passe despercebido. O sentido dos objetos está na relação que eles têm com uma totalidade estruturada de significados e de intenções inter relacionadas. Isso significa que, no nosso dia a dia, estamos com objetos de uso corrente, com nossa família, nosso filho, sem a todo momento nos perguntarmos a respeito de cada coisa. Entretanto, quando há uma ruptura, passamos a notar certos objetos. É nesse momento que podem ser problematizadas, questionadas, as relações dos pais e da criança consigo mesmos, com o mundo e com os outros. É nesse sentido que o psicodiagnóstico se propõe explicitar o sentido da experiência do cliente. Quando se trata do psicodiagnóstico infantil, o trabalho com os pais visa explorar o significado da queixa trazida, dos sintomas, a compreensão que eles têm de sua própria situação e de sua relação com o filho. São os pais que arcam com muitos dos custos do atendimento infantil: o tempo para levar e buscar a criança, o pagamento e os possíveis efeitos transformadores do atendimento infantil na dinâmica da família. Desta forma, sem informações, apoio e motivação para este atendimento, fica difícil esperar que os pais estejam dispostos a levá-lo adiante. Enquanto a necessidade de atendimento não tiver sentido para os pais, que limitam-se a seguir a indicação de outro profissional, fica mais difícil, senão impossível contar com sua colaboração ativa. Outro ponto é focalizar como os pais entendem o atendimento psicológico, suas expectativas em relação a ele. Estes esclarecimentos fazem com que entendam melhor por que sua própria participação no processo é importante e quais são os limites do trabalho, e também permite que decidam desde o início, se estão dispostos a compartilhar deste projeto. A primeira sessão com os pais geralmente se desenvolve a partir daquilo que eles trazem como sendo a pergunta, estendendo-se ao projeto estabelecido por eles em relação ao filho, aos focos de ansiedade e sentimentos mobilizados. Aceito as observações dos pais a respeito daquilo que eles veem, pensam e procuro ampliar seu campo de visão, contextualizando a queixa particular, inserindo-a num quadro mais amplo. Observo e assino aos pais aquilo que consigo apreender da relação deles com o filho e entre si. Esses assinalamentos não são considerados verdades, mas apenas possibilidades de compreensão que podem ser aceitas ou não por eles. A compreensão dos pais é valorizada, está no mesmo nível da do profissional. Trata-se de um trabalho em que a cooperação é um pré-requisito que deve ser assumido por ambas as partes. Na segunda ou terceira sessão, antes de conhecer a criança, utilizo-me de um roteiro de anamnese. Esse instrumento serve para que os pais se debrucem sobre sua experiência passada e presente com o filho, podendo esclarecer sentimentos e expectativas que atuam no relacionamento com a criança. Em geral, através de minhas intervenções procuro mover novas possibilidades existenciais na medida em que trabalho com o outro a transformação de sua projeto. O conhecimento que o cliente traz é valorizado, e é a partir dele que minhas falas terão ou não sentido. Para que seja eficiente, a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende, uma vez que, se estiver distante deste campo, ele poderá não ser compreendido ou recusado por ele. Antes de conhecer a criança, há mais um aspecto que é importante: é o que diz respeito às informações fornecidas à criança quanto ao trabalho que está sendo desenvolvido. Muitas vezes os pais não conseguem dizer ao filho por que estão consultando um psicólogo. Muitas vezes, a dificuldade dos pais de conversarem abertamente com o filho a respeito do trabalho com o psicólogo revela sua forma de relacionar-se com a criança e com o psicólogo, devendo ser explicitada. A partir do momento em que o psicólogo entra em contato com a criança, as sessões com ela e os pais são alternadas. Este procedimento tem por objetivo compartilhar com ela e com os pais as observações a respeito do filho. Na medida em que, para conhecer a criança, o psicólogo recorre a certos instrumentos é importante que cada instrumento seja discutido com os pais, e que se expliquem seus pressupostos teóricos e de que forma o psicólogo chegou às suas observações. É indispensável que se proceda desta forma para que os pais possam compreender melhor os referenciais do psicólogo e participar das decisões a respeito dos aspectos a investigar. A partir das conversas com os pais e do conhecimento da criança, ainda durante o psicodiagnóstico, o psicólogo pode sugerir alternativas de ação para os pais. Desta forma o psicodiagnóstico fenomenológico envolve um trabalho de redirecionamento dos pais a partir da compreensão da criança e da dinâmica familiar, com o objetivo de facilitar o relacionamento, propiciar novas formas de interação e abrir novas perspectivas experienciais. Também a partir da compreensão da dinâmica familiar, o psicólogo pode dar sugestões a respeito do que considera capaz de promover um desenvolvimento mais harmonioso. Aqui se apresenta um outro aspecto que diz respeito ao sigilo e ao respeito que o profissional deve ter em relação às partes envolvidas. Não se trata de contar a uns e aos outros o que os pais ou a criança fizeram ou disseram, mas de procurar descrever como compreendemos os comportamentos que nos aparecem. O psicólogo compartilha com os pais sua experiência com a criança a partir das situações propostas para favorecer a observação de como esta última se relaciona consigo mesma, com os outros e com o mundo. Muitas vezes, ainda durante o processo, os pais começam a experimentar novas formas de relacionamento com o filho. Esse tipo de mudanças podem servir de indicadores para a flexibilidade dos pais, a sua capacidade para prosseguir sozinhos ou a necessidade de encaminhamento psicoterápico uma vez encerrado o psicodiagnóstico. Concluídos os psicodiagnósticos, após um intervalo de seis meses a um ano, realizei sessões de follow up com os pais. Pude observar um fenômeno interessante: frequentemente, apesar de ter havido encaminhamento da criança para a psicoterapia com outro profissional, esta não havia sido feita. Os pais justificam sua decisão dizendo que o psicodiagnóstico havia sido suficiente para resolver o problema.
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