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Sistema de Suspensão e Direção Luiz Carlos Gertz Índice 1. Suspensão ............................................................................................................................. 1 2.1 O Início ............................................................................................................................ 2 2.2 Definição.......................................................................................................................... 4 2.3 Elemento flexível da suspensão .................................................................................. 5 1.3.1 Molas em forma de lâmina .................................................................................... 5 1.3.2 Molas helicoidais .................................................................................................... 6 1.3.3 Mola do tipo Barra de Torção ............................................................................... 7 1.3.4 Barra Estabilizadora ............................................................................................... 8 2.4 Amortecedores ............................................................................................................. 10 2.5 Suspensão com eixo rígido ........................................................................................ 13 2.6 Suspensão De Dion ..................................................................................................... 14 2.7 A Geometria da Suspensão ....................................................................................... 14 1.7.1 Restrição de movimento que a suspensão deve oferecer ............................. 14 1.7.2 Centro Instantâneo de Giro ................................................................................. 16 1.7.3 Eixo Instantâneo de Giro ..................................................................................... 16 2.8 Suspensão independente ........................................................................................... 17 1.8.1 Vista Frontal da Suspensão do Tipo Braço em Balanço (Swing Arm) ........ 17 1.8.2 Variação de Ângulo de Camber ......................................................................... 18 1.8.3 Distância do Centro de Rolagem ao Solo ........................................................ 20 1.8.4 Desvio ..................................................................................................................... 20 2.9 Tipos de Suspensão Independente .......................................................................... 21 1.9.1 Braço em Balanço Positivo ................................................................................. 21 1.9.2 Braço em Balanço Negativo ............................................................................... 22 1.9.3 Braços Paralelos Horizontais.............................................................................. 22 1.9.4 Braços Paralelos Inclinados................................................................................ 23 1.9.5 McPherson ............................................................................................................. 23 1.9.6 Semieixo Oscilante ............................................................................................... 24 1.9.7 Vista Lateral da Suspensão do Tipo Braço em Balanço ................................ 25 2. Sistema de Direção ............................................................................................................ 28 2.1 Introdução ..................................................................................................................... 28 2.2 Definição........................................................................................................................ 29 2.3 Geometria de Ackermann ........................................................................................... 31 2.4 Geometria do pino mestre do sistema de direção .................................................. 32 2.5 Ângulo de inclinação do pino mestre ........................................................................ 33 2.6 Ângulo de camber ........................................................................................................ 34 2.7 Ângulo de caster .......................................................................................................... 35 2.8 Divergência e Convergência ...................................................................................... 36 2.9 O sistema de direção e a suspensão ....................................................................... 36 3. Considerações Finais ........................................................................................................ 39 4. Índice de nomes.................................................................................................................. 39 1 Sistema de Suspensão e Direção Luiz Carlos Gertz Universidade Luterana do Brasil Introdução Este texto foi desenvolvido com o objetivo de apresentar teoria básica sobre sistemas de direção e suspensão de veículos de forma que permita a compreensão de seu funcionamento. Um grande esforço foi realizado para que todas as definições fossem colocadas de forma simples e clara, dentro de uma ordem que tornasse o texto compreensível. Infelizmente, algumas vezes, isto não foi possível, principalmente pela dificuldade de traduzir alguns termos. A nomenclatura utilizada para definir peças, efeitos, ou características que não possuem uma expressão popularmente conhecida em nossa língua foi traduzida literalmente para o português. Alguns termos de tradução duvidosa foram conservados na língua inglesa com o objetivo de não criar expressões que se tornem comum ao pequeno grupo de usuários deste material. Os sistemas de suspensão e direção veículo são sistemas complexos compostos por barras, articulações e elementos elásticos. A teoria apresentada neste material tem como foco principal a análise da geometria da suspensão e a forma como se relaciona com o comportamento dinâmico do veículo. Assim, serão analisados modelos simplificados e não serão considerados aspectos relacionados ao dimensionamento de molas, amortecedores, ou partes estruturais. 1. Suspensão Um automóvel é uma máquina formada por vários sistemas mecânicos. Entre estes existem alguns que atuam diretamente sobre as rodas, tais como sistema de transmissão, sistema de direção e sistema de freios. A suspensão do eixo direcional possui partes do sistema de direção como barras e articulações. O sistema de freios utiliza mangueiras, pinças, discos ou tambores e sapatas que aumentam a massa das partes não suspensas, que tem influência direta na eficiência do funcionamento da suspensão. Assim como a transmissão que possui rolamentos, eixos, juntas deslizantes, juntas homocinéticas, ou cruzetas, que são responsáveis por transmitir a energia mecânica do motor para o solo. Para que o movimento seja transmitido da massa suspensa para a não suspensa é necessário a introdução de um elemento no sistema de suspensão. Como a suspensão é a parte que faz a conexão entre as rodas e o corpo do veículo é difícil determinação os limites físicos de cada um destes sistemas. Para o estudo da teoria elementar sobre o sistema de suspensão e direção será tratado apenas 2 os aspectos geométricos. Os demais sistemas se seus efeitos sobre o funcionamento da suspensão não serão considerados. 2.1 O Início O comerciante chamado Nikolaus August Otto, de origem austríaca e naturalizado francês, construiu uma máquina com a finalidade de dar autonomia as carroças. Sua intenção era a de oferecer uma opção mais prática que o sistema de propulsão da época, o cavalo. Assim, em 1862, foi construído o primeiro motor de combustão interna (Hunninghaus, 1963). Foi um trabalho árduo que durou muitos anos e vários problemas foram enfrentados.Otto chegou a ser proibido de trabalhar pela polícia e tinha que fazê- lo nas madrugadas, escondido, pois os vizinhos acreditavam que ele era um feiticeiro. As ferramentas disponíveis eram primitivas, os processos de transformação do aço eram rudimentares o que impossibilitava a construção de um sistema complexo de transmissão que permitisse que e o motor tracionasse uma carroça, o que fez com que os primeiros motores de combustão interna fossem testados em lanchas, devido a simplicidade do sistema de transmissão. Depois que os motores se mostraram confiáveis e, principalmente, utilizáveis, ficou claro que tentar adaptá-los em carroças não era tarefa fácil, e assim estes foram criados novos veículos para receber os motores, sistema de transmissão e direção, os automóveis. A tecnologia utilizada na construção de bicicletas no final do século XIX, além do glamour relacionado ao uso destas novas máquinas, foram cruciais para o desenvolvimento do automóvel. Inicialmente a bicicleta era uma travessa de madeira acolchoada, com duas rodas onde o condutor impulsionava-se com grandes passadas. Depois surgiu o sistema de transmissão onde o pedal acoplado no eixo dianteiro tracionava uma grande roda. Quando, finalmente, surgiu a bicicleta que conhecemos atualmente com tração na roda traseira iniciou-se uma nova era para a mecânica ligeira. O processo de construção de eixos e mancais evolui e vieram as rodas de borracha, depois os pneumáticos, as rodas dentadas, as correntes e, por fim, as esferas e os rolamentos pequenos e leves. Os adeptos do ciclismo aumentaram rapidamente e a indústria de construção de bicicletas cresceu de forma espantosa. Uma nova escola foi criada, um ideal. O clima de entusiasmo associado ao ciclismo fez com que, quase que simultaneamente, surgissem a motocicleta, o triciclo a motor e o automóvel leve. Era a aplicação do motor ao ciclismo. Os primeiros construtores de automóveis preferiam o triciclo por ser a melhor base para o veículo leve, já que possuía pouca massa e era robusto, prestando-se muito bem para receber um motor, desde que ele também fosse leve e rápido. Os primeiros triciclos motorizados fizeram um grande sucesso que perdurou por mais de vinte anos. O ilustre brasileiro Alberto Santos Dumont, que criou o primeiro dirigível ao colocar um pequeno motor num balão esférico, e primeiro homem a voar com um veículo mais pesado que o ar, também foi um importante personagem da história do automóvel. Segundo o livro “Meus Balões” escrito por Dumont, ele também foi o primeiro a organizar uma corrida de triciclos em circuito fechado, na França, em 1901, no velódromo Parc des Princes, bancando os custos do aluguel do velódromo e dos prêmios. O evento foi um sucesso muito maior que o esperado, e um marco na história. Em 1891 traz para o Brasil um Peugeot equipado com motor Daimler a gasolina, dois cilindros em V, com 3,5 hp. 3 No final do século XIX existia uma grande disputa entre os veículos acionado por vapor, gasolina e elétricos. Os movidos a vapor demoravam muito para começar a funcionar e tinha um sério inconveniente com as caldeiras que estouravam devido a falha de material e a junção que era feira com rebites. Os motores a gasolina eram acionados através de manivelas, que necessitam de força, e não raramente geravam lesões de braços e ombros. O futuro parecia ser dos carros acionados por energia elétrica. Mas tinham problemas de autonomia, postos de recarrega para baterias e eram pesados. Os esforços de engenharia permitiram que os motores evoluíssem e foi possível construir motores leves e potentes. Tão leves e potentes que puderam ser utilizados para acionar os motores a gasolina. Assim, a criação do motor de arranque resolveu um dos maiores inconvenientes dos motores a gasolina, e estes foram preferidos na época. Os primeiros motores de combustão interna utilizavam gás combustível, eram pesados e pouco potentes. Motores com 600 kg geravam aproximadamente 3 hp. Os motores ficaram leves o que permitiu que fossem instalados em automóveis. Mas, um dos avanços mais importantes foi feito por Gottlieb Daimler (1834-1900), que utilizou combustível liquido para alimentar os motores através de um carburador. Isto viabilizou o transporte do combustível e o próprio automóvel. Em 1886 Karl Benz constrói seu triciclo a gasolina, considerado o primeiro automóvel útil (Figura 1). Benz desenvolveu vários sistemas e o bom rendimento de seu veículo se deve, principalmente, ao refinamento do uso do sistema de arrefecimento e da carburação. Ele é considerado o iniciador da técnica automotiva por ter aprimorado a unidade do motor com o chassis. (Pietisch, 1962). Figura 1 – Triciclo Benz, 1888. Além da bicicleta, a carroça (Figura 2), e a locomotiva também foram fonte de inspiração para o desenvolvimento do automóvel. Na Figura 3 pode ser vista a suspensão de molas planas de um Chase, 1908, pertencente ao extinto Museu da Tecnologia da ULBRA, que é praticamente o mesmo utilizado nas carruagens para transporte de pessoas, onde o nível de conforto já era razoável. 4 Figura 2 - Carroça Funerária de 1873. Museu da Tecnologia da ULBRA Figura 3 - Chase 1908. Museu da Tecnologia da ULBRA. A suspensão do automóvel demorou algumas décadas para ser aprimorada. Em 1901 August Horch, que daria origem a Audi, constrói um veículo com cofre para o motor montado na dianteira, caixa de câmbio na parte posterior do motor, carburador, eixo cardan e diferencial. Nesta época surge a suspensão com molas planas, feixes de molas fixados em eixos rígidos, tal como conhecemos hoje. Porém, somente trinta anos depois, em 1933, a GM utiliza amortecedores telescópicos e a Mercedes utiliza suspensão independente. Em 1955 a Citroën lança a primeira suspensão hidropneumática. 2.2 Definição A suspensão ideal seria aquela que permitisse que o veículo flutuasse, tal como nos filmes de ficção cientifica, de forma que durante seu deslocamento, as forças provenientes das variações de distância relativa entre o veículo e solo, fossem transmitidas suavemente para a carroceria. Atualmente utiliza-se um sistema mecânico, ou eletromecânico, que, de forma geral, tem o objetivo de minimizar as desigualdades do terreno sobre o qual o veículo se desloca, proporcionando aos passageiros um adequado nível de conforto e segurança, protegendo a carga e o próprio veículo. Além disto, de forma mais específica, é função da suspensão limitar a rolagem da carroceria, manter o contato das rodas com o solo, de forma que ocorra a menor variação possível de carga, controlar o ângulo de camber e o esterçamento das rodas, e oferecer resistência às reações produzidas pelos pneus, tais como: forças longitudinais (acelerações e frenagens), forças laterais (curvas), torques gerados pela frenagem e pela mudança de direção. A massa do veículo pode ser separada em duas partes: massa suspensa (sprung) que é aquela que é suportada pelas molas da suspensão, e a não suspensa (unsprung), que é aquela que não fica suspensa pelas molas. A conexão entre estas duas partes materializa a suspensão propriamente dita. O sistema de suspensão é formado por todas as partes que são responsáveis pelo movimento relativo entre as rodas e o corpo do veículo: barras, eixos, articulações, buchas, etc. Todos estes componentes fazem parte de um mecanismo que tem como objetivo fazer a roda deslocar-se para cima e para baixo de forma controlada. A suspensão também é composta por um elemento flexível (molas helicoidais, mola de borracha, barra de torção, a gás ou ar, etc.) e um elemento amortecedor, que freia as oscilações das massas suspensas, originadas pela deformação do elemento flexível, 5 decorrentes dos carregamentos gerados pelas irregularidades do solo. Quanto menor a massa deste sistema melhor será seu desempenho. Os pneus e acentos de um veículo podem ser considerados como elementos complementares do sistema de suspensão. 2.3 Elementoflexível da suspensão 1.3.1 Molas em forma de lâmina As molas em forma de lâminas foram utilizadas inicialmente nas carruagens e nas locomotivas devido à facilidade de produção e a simplicidade do sistema mecânico que compõe a suspensão, pois não necessitam de barras, balanças, pivôs, etc. Até o início da década de 60 eram utilizados na maioria dos automóveis. Na Figura 4 podem ser vistas algumas formas de montagem. Pode-se perceber que a mesma mola pode colaborar mais ou menos com a massa da suspensão. Figura 4 – Configurações para molas laminares. Guitián, 2001. Estas molas são compostas por uma série de lâminas de aço, onde, geralmente, a primeira é mais larga e mais longa, com uma conformação em cada extremidade, de forma que aloje um pino formando uma junção articulada. As demais são menores e possuem curvatura mais acentuada. Quando o conjunto de molas se deforma uma parte da energia é transformada pelo atrito gerado entre as superfícies de cada lâmina que estão em contato provocando amortecimento. O feixe de molas é fixado na estrutura do veículo através de um eixo e um jumelo que permite a variação de seu comprimento longitudinal quando flexionadas. Estas molas possuem rigidez variável. Para cargas elevadas a rigidez é maior, o que as torna ideais para serem usadas em veículo de transporte de carga. Outra vantagem é que são montadas sobre a carroceira, o que permite que o volume de transporte seja melhor aproveitado. As molas semielípticas são robustas, permitindo que sejam utilizadas em qualquer eixo de caminhões, ou na traseira de pequenos veículos de carga, neste caso com menor 6 curvatura e com menor quantidade de lâminas. Veículos fora de estrada também as utilizam, pois, combinadas com o eixo rígido, possibilitam grande curso da suspensão. Atualmente, alguns veículos de pequeno porte, para transporte de carga, utilizam molas formadas por uma única lâmina plana. 1.3.2 Molas helicoidais As molas helicoidais substituíram os feixes de molas dos automóveis atuais. São leves, eficientes, compactas, o que as torna ideais para o uso na suspensão independente (Figura 5 e 6). As molas helicoidais consistem numa barra de aço enrolada em forma de hélice. A elasticidade depende de seu diâmetro, do diâmetro da barra, do número de helicoides, do passo, do comprimento e das características do material utilizado. Figura 5 - Suspensão com mola helicoidal. Guitián, 2001. Quando uma mola helicoidal é submetida a um esforço aplicado em seu eixo ocorre flexão e torção. As deformações são regidas principalmente por torção. Figura 6 – Mola helicoidal em compressão. A deflexão 𝛿 de uma mola helicoidal com N espiras ativa, carregada por uma força F pode ser calculada por δ = 8. F. D3. N d4. G 7 Como a constante de rigidez da mola é definida pela Força aplicada pela deflexão, o seu valor pode ser calculado por K = G. d4 8D3N A partir dos anos 80 a indústria automotiva utilizou num grande número de automóveis as molas helicoidais associadas a suspensão do tipo Mcpherson na dianteira e na traseira com eixo semirrígido. 1.3.3 Mola do tipo Barra de Torção A mola do tipo Barra de Torção (figura 7) é uma viga engatada submetida a um torque na extremidade livre que provoca a torção. A deformação da barra é proporciona ao seu comprimento e inversamente proporcional a quarta potência do diâmetro da espessura. Figura 7 – Barra de torção Quando é aplicado um torque T na extremidade da barra com diâmetro d na região central, a tensão de cisalhamento resultante na barra é calculada por 𝜏 = 𝑇. 𝑟 𝐽 = 16. 𝑇 𝜋. 𝑑3 O torque aplicado a extremidade da barra gera uma rotação cujo ângulo pode ser calculado por 𝜃 = 𝑇. 𝐿 𝐽. 𝐺 = 32. 𝑇. 𝐿 𝜋. 𝑑4. 𝐺 Observando a equação pode-se perceber que o ângulo aumenta com o comprimento da barra, ou seja, com a redução da rigidez. E diminui com o aumento do módulo de elasticidade transversal G e pelo momento polar de inércia J. O coeficiente de mola torsional k é dado pela relação entre o torque aplicado e a rotação e corresponde a 𝑘 = 𝑇 𝜃 = 𝐽. 𝐺 𝐿 = 𝜋. 𝑑4. 𝐺 32. 𝐿 As barras de torção foram utilizadas em automóveis pela primeira vez no modelo Traction Avant 7/11 da Citröen em 1934. A patente pertence a Ferdinand Porsche que a utilizou pela primeira vez, tanto na dianteira como na traseira, do Volkswagen Tipo 60 Kdf-Wagen, de 1938, popularmente conhecido no Brasil como Fusca. Após a grande guerra foi utilizada no DKW 102 e, posteriormente em 1965, no seu precursor, o Audi. 8 Na Figura 8 pode ser vista a suspensão dianteira de um Volkswagen sedan, com dois conjuntos de feixes de molas, formados por barras planas, engastados no centro. O torque é transmitido em cada uma das extremidades por quatro braços oscilantes que estão conectados a articulação superior do pino mestre. A maior dificuldade que Porsche teve no desenvolvimento deste tipo de mola foi o desenvolvimento do tratamento térmico. No início as molas partiam-se gerando um forte estampido, o que quase comprometeu o futuro do VW Sedan. Figura 8 - Suspensão com barra de torção formada por lâminas. Guitián, 2001. As barras de torção podem ser montadas tanto transversalmente como longitudinalmente, conforme Figura 9. Este tipo de elemento elástico, utilizado em alguns utilitários de médio e grande porte, é robusto, não ocupa espaço entre as barras que compõe o sistema de suspensão. Em veículos de transporte de carga de médio porte as barras de torção da suspensão dianteira estendendo-se ao lado das longarinas do chassi sob a cabine. Além de serem leves, tem a grande vantagem de fazerem parte da massa suspensa. Geralmente, possuem um sistema de regulagem no ponto de fixação da extremidade da barra com o chassis, ou carroceria, o que permite variar a altura do veículo. Figura 9 - Suspensão com barra de torção de seção circular. Guitián, 2001. 1.3.4 Barra Estabilizadora Quando um veículo percorre uma trajetória curvilínea as forças inerciais inclinam seu corpo para o lado de fora da curva (rolagem), provocando uma maior compressão das molas do lado externo, aproximando a carroceria destas rodas, e uma diminuição da compressão nas molas do lado interno, afastando-a destas rodas. Para minimizar este efeito se utilizam barras estabilizadoras que podem ser montadas no eixo dianteiro, traseiro ou em ambos. 9 As barras estabilizadoras são compostas, geralmente, por uma viga de aço de seção circular em forma de “U”. Suas extremidades são fixadas na suspensão, na base dos amortecedores, e a parte central é fixada através de duas articulações na carroceria, conforme pode ser visto na Figura 10. Figura 10 - Suspensão MacPherson com barra estabilizadora. Fonte Internet Se a barra estabilizadora fosse infinitamente rígida a carroceria não sofreria nenhuma inclinação na curvas, como se não existisse suspensão. Porém, se em linha reta o veículo avançasse sobre um aclive acentuado a suspensão funcionaria normalmente, e as duas rodas unidas pela barra estabilizadora sempre assumiriam a mesma posição em relação à carroceria. Como não é este seu objetivo, sua rigidez permite que ele funcione como uma mola que une cada roda de cada lado do veículo, minimizando a inclinação lateral nas curvas, ou quando uma das rodas passa por um obstáculo numa reta (Figura 11). Figura 11 - Esquema de funcionamento da barra estabilizadora. Adams. A elasticidade de uma barra de torção varia com seu comprimento, com o diâmetro da espessura (quarta ordem), e depende das características mecânicas do material utilizado. A principal vantagem da barra estabilizadora, na maioria dos casos, não é aumentar a estabilidade, mas sim o conforto, já que seu uso permite que as molas tenham rigidez até 30% menor. Neste caso o objetivo principal não é diminuir sensivelmente a rolagem, mas sim oferecer ganho em conforto sem prejudicar a 10 estabilidade.Sendo assim, um carro com estabilizador, não é mais estável que outro com as molas adequadamente mais rígidas. Se um veículo com suspensão adequadamente dimensionada, tiver seu projeto original alterado com o objetivo de diminuir a rolagem, através da instalação de barra estabilizadora num eixo (ou do aumento da rigidez das molas num eixo), fatalmente sua estabilidade será prejudicada neste eixo. Isto ocorrerá devido a transferência de carga da roda interna da curva para a roda externa, provocando uma diminuição da aderência dos pneus na pista neste eixo. Neste caso, a instalação de uma barra estabilizadora diminuirá a estabilidade. É claro que o enfoque dado anteriormente não é aplicável para veículos de competição, onde a barra estabilizadora tem o objetivo de aumentar o desempenho, não visando o conforto. Na Figura 12 pode ser visto um sistema de suspensão embarcada, onde os estabilizadores são formados uma barra em forma de “U” conectada por duas barras articuladas nas duas extremidades (bielas). A vantagem deste sistema é que além diminuir a massa não suspensa, o que aumenta significativamente o rendimento do sistema, permite que regulagens precisas sejam feitas rapidamente. Figura 12 - Suspensão embarcada com barra estabilizadora. Aird, 1997. 2.4 Amortecedores Quando os primeiros automóveis foram construídos sua suspensão era semelhante às utilizadas nas carroças. O desenvolvimento dos motores e, principalmente, dos pneumáticos permitiu que num espaço curto de tempo a velocidade aumentasse consideravelmente. Os automóveis, com suas primitivas suspensões, rodando em estradas inadequadas oscilavam descontroladamente gerando desconforto e insegurança. Surgia a necessidade do desenvolvimento de um sistema mais estável e uma nova peça foi introduzida, o amortecedor. Os amortecedores são utilizados desde o início do século, mas difundiram-se após comprovarem sua eficiência no Grande Prêmio da França de 1906. Os primeiros eram “de fricção” (Figura 13) formados por dois braços articulados, um fixo no chassis e outro no eixo da roda através de articulação. Cada braço é formado por uma ou mais lâminas de aço, que se unem alternadamente em um eixo comum, intercaladas com discos de fricção de madeira, tecido, couro ou amianto. 11 Figura 13 - Amortecedor de fricção. Guitián, 2001. Na década de 20 foram construídos os primeiros amortecedores hidráulicos, que inicialmente atuavam somente no curso de descendência da roda e, mais tarde, também durante a ascendência. A Figura 14 mostra um amortecedor hidráulico comumente utilizado por vários fabricantes de carro anos 30. Figura 14 – Amortecedor do Oldsmobile 1936. Museu da Tecnologia ULBRA. Em 1930 a Monroe criou o amortecedor hidráulico telescópico. Este tipo de amortecedor é o mais comumente encontrado nos automóveis atualmente e baseia-se na força gerada pela resistência ao movimento do óleo para ser transportado por um orifício. A Figura 15 mostra o esquema representativo de dois amortecedores telescópicos, o primeiro com dois tubos e o segundo com um tubo. 12 Figura 15 - Amortecedores telescópicos: com duplo tubo e monotubo. Milliken, 1995. Quando um automóvel passa com a roda sobre um obstáculo a suspensão se movimenta comprimindo a mola, evitando que a carroceria se levante rapidamente, porém, imediatamente a energia armazenada na mola tende a restituir sua posição original, transmitindo grande força para a carroceria e provocando oscilações até estabilizá-la na posição de equilíbrio. Se o amortecedor for de ação simples sua função será a de frear o movimento da suspensão durante a descendência da roda em relação a carroceria, diminuindo desta forma as forças transmitidas para as cargas transportadas pelo veículo e para os passageiros. Se oferecer resistência aos movimentos de descendência e de ascendência o amortecedor será de dupla ação. Num amortecedor telescópico de dupla ação, quando a suspensão é comprimida, a haste penetra no tubo e o óleo passa por válvulas com orifícios calibrados que oferecem uma pequena resistência ao movimento. Quando é tracionada estas válvulas fecham-se e outras, que oferecem maior resistência, são acionadas. Se uma força de compressão excessiva for aplicada ao amortecedor uma válvula de proteção permite que o óleo passe por outra via que não são os orifícios calibrados. A Figura 16 mostra a relação entre a força de resistência ao movimento de um amortecedor telescópico de dupla ação com o curso, para uma determinada velocidade de deslocamento da suspensão. Quanto maior for a velocidade, maior será a força de resistência. Figura 16 - Gráfico de Força por curso da suspensão. Milliken, 1995. 13 2.5 Suspensão com eixo rígido As suspensões dos veículos podem ser divididas em dois grupos: eixos rígidos e suspensão independente. Os fundamentos de funcionamento da suspensão de eixo rígido são significativamente mais simples que a suspensão independente, por este motivo, faremos uma breve descrição da primeira e utilizaremos a suspensão independente para apresentar a teoria sobre o tema. Os Eixos Rígidos originaram-se de veículos que existiam antes do surgimento dos automóveis. Atualmente são utilizados tanto na traseira como na dianteira em muitos automóveis, pequenos, médios ou grandes, em utilitários e em caminhões. Podem conter um par de rodas que giram livremente, montados na traseira ou na dianteira. Também podem conter um par de rodas responsáveis pela tração montados na traseira, sendo encontrados, atualmente, em carros de médio e grande porte, e na maioria dos utilitários e caminhões. Com tração na dianteira são utilizados em veículos fora de estrada (4x4). A simplicidade do sistema mecânico necessário para sua montagem, sua robustez e a pequena manutenção são suas principais vantagens. Nos veículos fora de estrada, além destes fatores, são utilizados por proporcionar um longo curso da suspensão, o que é fundamental para este tipo de uso, já que a área de contato do pneu com o solo está diretamente relacionada a eficiência. O eixo rígido não permite que as rodas sofram alteração de ângulo de camber quando o veículo é carregado, nem durante uma curva, seja pela rolagem da carroceria, nem devido a força lateral aplicada nas rodas pela pista. Um problema comum neste tipo de eixo é a vibração que ocorre nas rodas dianteiras causada pelas folgas do sistema mecânico. Estas oscilações ocorrem numa faixa de velocidade bem definida, na qual o conjunto é excitado em sua frequência natural. Este fenômeno é chamado de Shimmy. Uma das configurações mais comuns de montagem dos Eixos Rígidos (Hotckiss) é aquela em que dois conjuntos de molas semielípticas, montadas longitudinalmente, são utilizados para conectá-lo ao chassi, e o centro possui um diferencial, conectado a um cardan através de uma junta universal (Figura 17). Este tipo de tração foi utilizado em grande parte dos automóveis de passageiros dos anos 60. Atualmente é utilizado em veículos de carga, leves e pesados. Figura 17 - Suspensão com eixo rígido e molas semi-helipticas. Gillespie, 1992. Quando não são utilizados feixes de molas em eixos rígidos é necessário o uso de barras (Four Link) que restrinjam os movimentos laterais provocados pelas forças 14 geradas em curvas e a tendência de giro do eixo gerada pelas forças transmitidas através do cardan para o diferencial, e deste para as rodas (Figura 18). Figura 18 – Suspensão four-link. Gillespie, 1992. 2.6 Suspensão De Dion Um tipo de suspensão pouco utilizada, mas clássica, é a De Dion (1894), que é uma mistura entre o Eixo Rígido e a Suspensão Independente. Ele é composto por uma barra sólida que conecta as duas rodas, por dois semieixos e por um diferencial fixo no chassi, conforme pode ser visto na Figura 19. O fato do diferencial não ser fixado rigidamente ao eixo faz com que a massa não suspensa seja menor, proporcionando maioreficiência ao sistema. Figura 19 - Suspensão De Dion. Gillespie, 1992. 2.7 A Geometria da Suspensão 1.7.1 Restrição de movimento que a suspensão deve oferecer Um corpo em movimento no espaço apresenta seis Graus de Liberdade (GDL) em relação a outro corpo (Figura 20). A roda traseira de uma bicicleta possui apenas um (GDL), em relação ao seu chassi, que é a rotação em relação ao seu eixo. A roda traseira de um automóvel apresenta dois GDL, já que ela além de girar, também se desloca para cima e para baixo. A suspensão ideal é aquela que possibilita a restrição do movimento do flange da roda (knuckle) em cinco direções, permitindo apenas o deslocamento para cima e para baixo. 15 Figura 20 - Número de Graus de Liberdade e movimento da suspensão. Milliken, 1995. Para restringir o movimento em cinco graus são necessárias cinco barras. A estrutura em forma de “A”, mostrada na Figura 21 pode ser considerada como duas barras que possuem uma junção em comum. A suspensão do tipo McPherson é equivalente, para pequenos deslocamentos, a uma estrutura em forma de A com comprimento infinito. Figura 21 - Partes da suspensão e número de barras equivalentes. Milliken, 1995. A suspensão independente pode ser montada com sistemas equivalentes a cinco barras. A suspensão McPherson possui duas direções restritas pela estrutura superior, duas pela estrutura inferior em forma de “A” e mais uma imposta pela barra do sistema de direção. A suspensão com duas estruturas em forma de “A” apresenta duas restrições para cada “A”, mais uma pela barra do sistema de direção. 16 1.7.2 Centro Instantâneo de Giro O Centro Instantâneo de Giro (CI), ponto sobre o qual um corpo gira num determinado instante, é utilizado para auxiliar na determinação de vários parâmetros da suspensão. Encontra-se no cruzamento das linhas que contém os centros das articulações das barras que compõe a estrutura da suspensão. Na Figura 22 pode-se ver a representação de um sistema equivalente para um determinado instante. Para pequenos deslocamentos da suspensão pode-se considerar a distância do CI constante, porém, é fácil perceber que para deslocamentos significativos à distância do CI até a roda varia consideravelmente. Figura 22 - Centro Instantâneo de Rotação. Milliken, 1995. 1.7.3 Eixo Instantâneo de Giro O CI, conforme mostrado anteriormente, foi determinado através de uma análise bidimensional, onde as barras da suspensão foram projetadas no plano frontal. Foi determinado o cruzamento das linhas que passam pelas articulações de cada barra. Está mesma análise pode ser feita através da projeção das barras da suspensão num plano longitudinal do veículo. Desta forma dois CIs, com coordenadas diferentes serão determinados. A reta que contém estes dois pontos é o Eixo Instantâneo de Giro do flange da roda (knuckle) (Figura 23). Figura 23 - Eixo Instantâneo de Rotação. Milliken, 1995. 17 Como o CI da vista frontal varia de posição, o Eixo Instantâneo de Giro também varia. O CI da vista lateral é determinado pelas articulações das barras da suspensão na carroceria (ou chassi) do veículo. Como estes pontos são fixos, o CI da vista lateral também é fixo. 2.8 Suspensão independente A suspensão independente possui dois CIs, um que pode ser determinado através da vista lateral, e que está relacionado predominantemente com as acelerações longitudinais do veículo, outra que pode ser determinado por uma vista frontal e que está relacionado com as acelerações laterais. 1.8.1 Vista Frontal da Suspensão do Tipo Braço em Balanço (Swing Arm) Quando a suspensão desloca-se numa curva devido às acelerações ocorre um giro do corpo do veículo em relação a um ponto, o Centro de Rolagem (CR) (Roll Center RC), que é o ponto de intersecção das linhas que unem o CI até o ponto de contato do pneu com o solo (Figura 24(a)). Para definir o CR: 1) Determine o CI, que é o ponto virtual de encontro das linhas que contém as conexões de cada barra da suspensão. 2) Trace uma linha unindo o CI e o ponto de contato do pneu com o solo. 3) O ponto onde estas linhas se cruzaram é o CR Se o desenho da suspensão for simétrico o CR se encontrará na linha central. Porém se forem diferentes o CR se encontrará deslocado para um dos lados (Figura 24(b)), o que pode ser interessante para um veículo projetado para andar num circuito “oval”. descendência Figura 24 - Centro instantâneo de Rotação para dois desenhos de suspensão. Milliken 1995. 18 1.8.2 Variação de Ângulo de Camber Analisando a suspensão formada por duas estruturas e forma de “A” pode-se observar que a posição do Centro Instantâneo de Giro está relacionada com duas coordenadas: a distância do solo e da roda (Figura 25). Se substituirmos o sistema mecânico desta suspensão por uma barra simples equivalente que está conectada no eixo da roda e no CI a variação do ângulo de camber, que é o ângulo de inclinação da roda com o solo, será menor no segundo caso para uma mesma variação de deslocamento da roda. Figura 25 – Variação de camber. Milliken, 1995. A suspensão descrita com duas estruturas em forma de “A” pode apresentar a parte superior menor que a parte inferior. Para um deslocamento da roda na direção vertical a barra superior desloca-se mais que a barra inferior na direção horizontal, acentuando o ângulo camber. Este efeito e suas vantagens podem ser facilmente compreendidos através de uma análise da Figura 26. Figura 26 - Variação do ângulo de camber com o deslocamento da roda em relação à carroceria. Aird, 1997. 19 O gráfico da figura 27 mostra que o aumento do ângulo de camber gera aumento da força máxima lateral, independente do carregamento. Figura 27 – Gráfico com relação entre força lateral, força normal e ângulo de camber. Jazar, 2008. Observando o gráfico da A figura 28 pode-se observar que existe um ângulo ideal para cada nível de carregamento normal. Figura 28 – Gráfico de relação entre pico força lateral e ângulo de camber. Pneu 275/70R15. Milliken, 1995. 20 1.8.3 Distância do Centro de Rolagem ao Solo O Centro de Rolagem (roll center) é o ponto onde é aplicado o momento de força atuante entre a massa suspensa (corpo do veículo) e não suspensa (suspensão, partes do sistema de freio, rolamentos, rodas, etc.). Quanto maior for distância do CR do solo, e, consequentemente, menor a distância do CG, menor será o momento de rolagem. O produto da força lateral aplicada sobre o corpo do veículo x a distância do solo é chamado de momento de contra rolagem. Se o Centro de Rolagem está acima do nível do solo a força aplicada na base do pneu gera um momento no CI (Figura 29 e 30). Este momento provoca um deslocamento da roda para baixo e eleva o corpo do veículo (jacking). Se o CR está abaixo do nível do solo a força lateral aplicada sobre a roda provocara uma reação no CI, que fará o corpo do veículo deslocar-se para baixo. Figura 29 - Movimento do corpo do veículo relacionado com a posição do CR. Milliken, 1995. Figura 30 – Levantamento da carroceria em veículos com semi-eixo oscilante. Gillespie, 1992. 1.8.4 Desvio O Desvio (scrub) é o deslocamento que ocorre na vista frontal, no solo, quando a roda se desloca em relação ao corpo do veículo na vertical (Figura 31). O desvio é função do comprimento real das barras da suspensão, e do comprimento relativo, que está associado a posição do CI da vista frontal, assim como da altura do CI em relação ao solo. 21 Figura 31 - Escorregamento em função da altura do CI em relação ao solo. Milliken 1995. Se, na vista frontal, o CI não estiver posicionado no nível do solo o valor do módulo do desvio será mais elevado. Se o CI estiver posicionado abaixo do nível do solo e dentro do veículo, quando a suspensão for carregada, o desvio ocorrerá para dentro. Se o CI estiver posicionado acima do nível do solo e dentro do veículo o desvio ocorrerá para fora.Quando um veículo desloca-se em linha reta num terreno irregular a roda não seguirá exatamente a mesma direção (Figura 32). Figura 32 - Trajetória da roda com elevado desvio. Milliken 1995. Se o desvio for significativo uma instabilidade lateral pode ser gerada devido à alteração do ângulo de deslizamento do pneu (tire slip angle), que é a resultante das velocidades laterais associadas ao desvio e da velocidade de deslocamento do veículo. A variação deste ângulo está associada a um incremento no amortecimento viscoso dos pneus. Uma variação de bitola relacionada com a variação de desvio é indesejada. 2.9 Tipos de Suspensão Independente 1.9.1 Braço em Balanço Positivo O Braço em Balanço Positivo (Positive Swing Arm Geometry) é assim denominado por que o CR está localizado acima do solo (Figura 33). Figura 33 - Suspensão de Barra Curta e Longa. Gillespie, 1992. 22 Quando o veículo faz uma curva o CI da roda externa move-se para baixo devido ao deslocamento relativo entre a roda e o seu corpo, enquanto que o CI da roda interna move-se para cima. Os movimentos em direções opostas das rodas em relação ao corpo do veículo provocam uma assimetria no desenho da suspensão. A reação da força lateral que atua na roda externa (força dominante numa curva) faz com que o corpo do veículo tenha um movimento descendente, enquanto que reação da força resultante na roda interna provoca um movimente ascendente. Em consequência disto a reação das forças laterais que atuam no veículo provoca um movimento descendente de seu corpo, reduzindo a altura do CR. 1.9.2 Braço em Balanço Negativo Conforme pode ser visto na Figura 34, na suspensão com Braço em Balanço Negativo (Negative Swing Arm Geometry) o CR está localizado abaixo do nível do solo. Figura 34 - Braço em Balanço Negativo. Gillespie, 1992. 1.9.3 Braços Paralelos Horizontais Na suspensão de Braços Paralelos Horizontais (Parallel Horizontal Links) o CI está localizado no infinito. A linha que contém o ponto de contato do pneu com o solo e o CR é paralela as barras da suspensão. Neste caso o CR localiza-se na linha central e no solo, conforme pode ser visto na Figura 35. Figura 35 - Suspensão de Barras Paralelas Horizontais. Gillespie, 1992. 23 1.9.4 Braços Paralelos Inclinados Na suspensão de Braços Paralelos Inclinados (Inclined Parallel Links) o CI localiza-se no infinito e acompanha a inclinação das barras da suspensão. O CR encontra-se na linha central e acima do solo, conforme Figura 36. Figura 36 - Barras Paralelas Inclinadas. Gillespie, 1992. 1.9.5 McPherson A suspensão do tipo McPherson patenteada em 1946 por Earle Steele MecPherson foi utilizada em 1949, na França, na dianteira do Ford Vedete de tração traseira. No Brasil foi introduzida através do Simca Chambord. A suspensão mcpherson é a combinação de um suporte com o braço inferior, conforme pode ser visto na Figura 37. O CR está localizado na linha central do veículo com a intersecção da linha que contém o CI e o ponto de contato do pneu com o solo. Num veículo convencional a posição do CI tende a afastar-se muito para a direita do ponto indicado no esquema representativo. Isto ocorre porque o amortecedor é montado com uma inclinação mais próxima do eixo vertical. Figura 37 - Suspensão McPherson. Gillespie, 1992. Este tipo de suspensão é muito utilizado atualmente na dianteira de veículo pequenos e médios com tração dianteira, por ser eficiente, de baixo custo, simples e leve. Além disto ocupa menor espaço no cofre do motor, o que permite que veículos de pequeno porte sejam montados com motor transversal. Este tipo de suspensão restringe a variação de ângulo de camber durante o deslocamento da roda em relação a 24 carroceria. Nesta condição também ocorre grande variação da posição do CI, o que limita seu uso para veículos de competição. A suspensão mcpherson, geralmente, é montado com molas helicoidais e amortecedores concêntricos, mas pode ser com barras de torção, lâminas, etc. Sistemas semelhantes foram utilizados em automóveis com tração traseira, tais como o Porsche Boxster, o 911 e os BMWs. 1.9.6 Semieixo Oscilante A Suspensão do tipo Semieixo Oscilante (Swing Axle) é formada, como o próprio nome diz, por um semieixo articulado numa das extremidades e com a roda na outra, conforme pode ser visto na Figura 38. O CI localiza-se na articulação do semieixo e o CR na intersecção entre a linha central e a linha que contém o contém o ponto de contato do pneu com o solo e o CI. Figura 38 – Suspensão independente com semi-eixo oscilante. Gillespie, 1992. Este tipo de suspensão apresenta o inconveniente de que o ângulo de camber varia de forma acentuada com o curso da roda, passando de positivo com a mola sem carga para negativo com a mola carregada. Num veículo com este tipo de suspensão motoristas pouco habilidosos que tendem a reduzir a velocidade tirando o pé do acelerador bruscamente, ou pior, freando em curvas, podem perder o controle do veículo. A rolagem da carroceria, associada ao torque aplicado pelo sistema de transmissão faz com que o carregamento da mola da roda traseira interna diminua, aumentando seu curso e, consequentemente, promovendo um aumento significativo do ângulo de cmber. A força lateral aplicada na roda externa gera um momento que tende a fazer o ângulo de camber aumentar ainda mais, promovendo um levantamento da carroceria e uma diminuição da área de contato do pneu com o solo, até que a aderência seja insuficiente para permitir que o veículo faça a curva. Este tipo de suspensão foi utilizado no clássico Mercedes 300 SL de 1954. No Brasil este tipo de suspensão foi utilizado no VolksWagen Sedan, em seus derivados, e no Gordini. Muito curioso é o caso do excelente Courvair da GM, produzido nos Estados Unidos e projetado pela Porsche, com motor boxer de seis cilindros, bloco de alumínio, montado na traseira, tração traseira e suspensão com semieixo oscilante. O carro padrão estadunidense, com motor montado na dianteira, usava maior pressão nos pneus dianteiros. Ao contrário do que deveria usar o Courvair. Assim, com seus pneus diagonais inflados de forma inadequada, com uma suspensão que exige perícia do motorista, e uma sociedade ávida por processos jurídicos, foi condenado e considerado 25 culpado por acidentes. A GM mudou a suspensão traseira. Mas, era tarde. O Courvair gerou grande prejuízo. Para que as montadoras se protegessem foi criada uma nova teoria de projeto de suspensão, precursora da encontrada nos atuais livros sobre o tema. 1.9.7 Vista Lateral da Suspensão do Tipo Braço em Balanço A geometria da vista lateral da suspensão de Braço em Balanço controla os movimentos e forças que ocorrem na dianteira e na traseira do veículo, influenciando em parâmetros associados, além da trajetória da roda, aos movimentos ascendentes e descendentes. A Figura 39 mostra o eixo instantâneo de giro, formado pela linha que contém os CIS da vista frontal e da vista lateral. Figura 39 - Vista tridimensional da suspensão independente. Milliken, 1995. Usualmente se utiliza a preposição “anti” (antimergulho, antilevantamento, etc.) para definir efeitos controlados pela geometria da suspensão que estão relacionados com as forças verticais atuantes entre as massas suspensas e não suspensas, que são reações das forças longitudinais aplicadas ao corpo do veículo. Quando se acelera um veículo com tração traseira, normalmente, ocorre uma compressão da suspensão traseira, abaixamento da traseira da carroceria (squat). Consequentemente, a suspensão dianteira sofre um carregamento menor, provocando o levantamento da dianteira. Isto ocorre devido a tendência do corpo do veículo girar em trono do seu CG. A combinação destes efeitos provoca um giro no sentido transversal. O desenho apropriado da suspensão pode controlar a carga transferida para as molas e minimizar a rotação transversal do corpo do carro. É obvio queos recursos utilizados para minimizar o levantamento ou abaixamento da carroceria do veículo, tanto na dianteira como na traseira, numa análise quase estática, não vão influenciar na grandeza da força aplicada no solo pelas rodas. A força longitudinal gerada pela aceleração (positiva ou negativa) transferida para a suspensão do veículo é função da Distância das Rodas (l), Altura do CG (h), e da Força de Frenagem (max), conforme pode ser visto no diagrama de corpo livre mostrado na Figura 40a, que representa um veículo sendo desacelerado por uma força aplicada em seu centro de gravidade. 26 Figura 40 - Diagrama de corpo livre de veículo em desaceleração. Milliken, 1995. Para (a), ∆F × l = max × h ∆F = max × h l A geometria da suspensão antimergulho altera o carregamento sobre as molas e consequentemente o comportamento do veículo. A Figura 40b mostra o diagrama de corpo livre de um veículo onde o sistema de freios foi acionado causando sua desaceleração. Pode-se observar que surge uma componente de força vertical na roda. Como o somatório das forças em ambos os casos deve ser igual, a força que surge é subtraída das molas da suspensão, antimergulho. A distribuição de quantidade de frenagem para cada roda determina a força longitudinal que está relacionado com a força de reação vertical. A percentagem de antimergulho na dianteira é dada por %antimergulho diant. = max (%freiodiant. ) altura distância max h l %antimergulho diant. = (%freiodiant. ) altura distância l h 27 %antimergulho diant. = (%freiodiant. ) tanϕF l h Para calcular o antilevantamento da traseira substitui-se a tanF por tanR e a percentagem de frenagem na dianteira pela na traseira. Se a suspensão é 100 % antimergulho todo o carregamento que é transferido pelas forças longitudinais é aplicado sobre os braços da suspensão e nenhuma carga é aplicada sobre as molas. Neste caso a suspensão não sofre nenhuma deflexão quando o veículo acelera ou freia. Se a suspensão é zero % antimergulho, todo o carregamento é aplicado sobre a mola e deflexão da suspensão é proporcional ao carregamento exercido sobre a roda. Nenhum carregamento vertical é transferido para as barras da suspensão. Observando as equações que descrevem a % antimergulho pode-se concluir que a resultante será zero quando a tan for igual a zero, ou seja, quando for igual a zero. 28 2. Sistema de Direção 2.1 Introdução Um motorista experiente, após dirigir um automóvel, uma motocicleta, ou uma bicicleta, é capaz de perceber algumas características de seu “temperamento”, onde alguns adjetivos serão utilizados para descrever seu “espírito”, tais como: dócil, suave, agressivo, arisco, etc. Falar sobre o “espírito” de um veículo parece não ser uma tarefa técnica. Porém, existe algo que caracteriza cada modelo de forma única. Uma bicicleta europeia dos anos 50, com sua capacidade de fazer curvas suaves e harmoniosas pode oferecer a sensação de se “andar nas nuvens”. Já uma bicicleta, ou motocicleta, projetada para percorre trilhas com curvas acentuadas em locais com pouco espaço parece ser “arisca”, mudando de direção rapidamente. Esta “sensação” que um veículo gera quando é conduzido é o resultado do somatório de respostas de todas as partes do veículo, e, certamente, o motor e a suspensão tem grande influência. Porém, o sistema de direção é o que contribui com a maior parcela, que, conforme sua geometria, vai definir se vamos andar nas nuvens ou não. Assim como ocorreu com vários sistemas mecânicos utilizados em automóveis, o sistema de direção também veio da carroça (de quatro rodas), que utilizava um eixo rígido fixado através de uma articulação. Porém, este sistema rudimentar não era eficiente para veículos que se deslocam com velocidades superiores à de um cavalo. A mecânica ligeira dos eixos e esferas do final do século XIX foi utilizada na construção dos triciclos, que possuíam duas rodas traseiras e uma dianteira com função de dar direção do veículo. As bicicletas foram as grandes responsáveis pelo desenvolvimento da mecânica leve e precisa, e naturalmente seu sistema de direção, formado por uma forquilha, ou garfo, foi utilizado nos triciclos. Alguns automóveis com quatro rodas chegaram a utilizar este sistema de direção. O nascimento dos automóveis como parte do desenvolvimento das técnicas utilizadas na construção de bicicletas foi um processo natural. A Figura 41 mostra um automóvel Benz de 1897 pertencente ao Museu do Automóvel Clube da Argentina. Neste veículo pode se ver os dois garfos que compões o sistema de direção. 29 Figura 41 - Benz 1897. Museu do Automóvel Clube da Argentina. O incremento de velocidade a cada ano fez com que o motor, os pneus, a suspensão, o sistema de direção e todas as partes do automóvel evoluíssem para proporcionar conforto e segurança a carga e aos passageiros. No texto que segue será apresentada a teoria sobre cada parte do sistema de direção, e sua relação com o comportamento do veículo. Cabe salientar que o objetivo deste texto é o de apresentar teoria sobre geometria do sistema de direção, sendo assim não será apresentado detalhes sobre a construção mecânica de suas partes. 2.2 Definição O sistema de direção, como o próprio nome diz, tem a função de direcionar o veículo durante seu deslocamento. Um bom sistema de direção deve ser confortável, estável, confiável, exato e fácil de operar. Não deve transmitir para o volante as forças aplicadas nas rodas geradas durante o deslocamento do veículo. Estas forças podem ser resultantes da irregularidade do terreno - forças normais, ou resultantes das forças de inércia que fazem com que o veículo tenda a seguir em linha reta durante uma trajetória curvilínea - forças laterais, ou ainda resultantes de frenagens e de tração, se o veículo for de tração dianteira - forças longitudinais. O sistema de direção transforma o movimento circular do volante no movimento circular do eixo da roda, o pino mestre. Uma parte do sistema de direção está acoplada diretamente na base que possui o eixo da roda (flange da roda), que por sua vez se movimenta com o movimento da suspensão. Isto faz com que estes dois sistemas, suspensão e direção, não tenham limites bem definidos. A função do sistema de direção é controlar a rotação da roda sobre o pino mestre, não permitindo que sua posição seja alterada durante o deslocamento do veículo, nem mesmo quando as molas do sistema de suspensão são carregadas. Um bom exemplo da fusão do sistema de direção com a suspensão é mostrado na Figura 42, onde pode-se ver um veículo no qual o eixo principal, neste caso o correspondente ao pino mestre, contém a mola e o amortecedor do sistema de 30 suspensão. Provavelmente este tenha sido o primeiro modelo de suspensão do tipo McPherson, muito utilizada atualmente e que será analisada mais adiante. Figura 42 - Protótipo construído por Emile Claveau, 1926. Ludvigsen, 2000. Um sistema de direção simples é composto pelo volante, que é rotacionado pelo condutor para alterar a direção do veículo. O sistema mais utilizado é o que contém uma coluna de direção que transmite o movimento para um sistema pinhão cremalheira, que transforma o movimento circular e linear, ou contém um par de engrenagens com uma barra. Nas extremidades da cremalheira é conectado uma barra biarticulada, que, por sua vez, transmite o movimento para as rodas, que giram em torno do pino mestre, transformando novamente o movimento linear em rotacional. Na Figura 43 pode-se ver alguns exemplos de sistemas de direção. Figura 43. Exemplos de sistema de direção. Gillespie, 1982. O sistema pinhão e cremalheira, ou a caixa de direção com um par de engrenagens, são a primeira redução entre o movimento de rotação do volante e da roda, que para automóveis possui uma relação de aproximadamente 30 mm de deslocamento para cada giro completo do volante com reduçãototal entre rotação do volante e da roda de aproximadamente 15:1. Para caminhões esta relação é de aproximadamente 36:1. 31 Para acionar o sistema de direção é necessário que um torque seja aplicado no volante. A força aplica é inversamente proporcional ao seu diâmetro. Uma pequena alteração no tamanho do volante faz com que a resistência ao movimento do sistema seja alterada. Quando a largura, ou o diâmetro do pneu, é alterado esta resistência também muda. Porém, para que este fenômeno seja compreendido é necessário que outros temas sejam explanados, conforme veremos adiante. 2.3 Geometria de Ackermann Até o início do século XIX as carroças possuíam um eixo dianteiro direcional com uma roda em cada extremidade. Este eixo tinha uma articulação no meio que permitia o seu giro. Este sistema de simples construção fazia com que ambas as rodas assumissem o mesmo ângulo em curvas. Em 1817 Rudolf Ackermann patenteou um novo sistema de direção para carroças foi como base para o projeto de sistemas de direção de automóveis. A Figura 44 mostra as imagens de sua patente. Figura 44. Imagem da patente de Rudolf Ackeman de 1817. Jazar, 2008. Quando um automóvel percorre uma trajetória curvilínea suas rodas rolam sobre duas circunferências concêntricas. Para que nenhuma roda sofra escorregamento lateral é necessário que a roda dianteira interna gire um ângulo, δi, maior que o da roda externa, δo, já que o raio da circunferência interna é menor que o da externa, conforme pode ser visto na Figura 45. Figura 45. Geometria de Ackermann. Gillespie, 1982. 32 Analisando os triângulos da figura pode-se concluir que: )t+R( L tan=δ 2 1- 0 )2 t-(R L tan=δ 1-i A geometria de Ackermann pode ser obtida, aproximadamente, através da conexão das extremidades de uma barra nas articulações do flange da roda formando um trapézio, conforme pode ser visto na Figura 46. Neste caso, os prolongamentos das barras engastadas na base do flange da roda, devem interseccionarem-se no ponto sobre o qual o veículo vai girar durante seu deslocamento sobre uma trajetória curvilínea. No veículo representado no esquema da Figura 44 este ponto é o (centro) do eixo traseiro. Figura 46 - Arranjo de barras de forma trapezoidal. Gillespie, 1982. A geometria de Ackermann é eficiente quando as acelerações laterais são pequenas, como em automóveis de passeio. Para veículos de competição onde o deslizamento das rodas é acentuado este tipo de geometria não é recomendável. Por exemplo, num veículo que tende a deslizar as rodas dianteiras numa curva, em altas velocidades, a roda dianteira interna pode sofrer tanto deslocamento lateral que a pouca aderência gerada pode apenas freia-lo. Nestes casos se utiliza um sistema onde as rodas direcionais movimentam-se paralelamente, ou inversamente ao movimento gerado pela geometria de Ackermann (Gillespie, 1982). A Figura 47 mostra estas configurações. Figura 47 - Ackermann, paralela, e Ackermann invertido. Milliken, 1995. 2.4 Geometria do pino mestre do sistema de direção As rodas direcionais de um automóvel são fixadas numa estrutura mecânica, o flange da roda, que possui dois eixos, um sobre o qual a roda gira promovendo seu deslocamento, e outro que fica posicionado na parte interna do veículo. Este eixo permite que o flange gire alterando a direção de deslocamento do veículo, é o “pino mestre” (kingpin). O pino mestre pode realmente ser um eixo que permite a rotação do flange da 33 roda e, consequentemente, das rodas direcionais em relação ao corpo do veículo, ou pode ser uma linha que une duas rótulas que geram exatamente o mesmo movimento. Nos veículos com suspensão independente o pino mestre é definido pela intersecção entre as articulações que conectam o flange da roda a suspensão. A Figura 48 mostra um esquema da vista frontal e lateral do eixo do pino mestre. Figura 48. Vista frontal e lateral do pino mestre. Milliken, 1995. Na vista frontal, o ângulo formado entre o pino mestre e a linha horizontal é chamado de “inclinação do pino mestre”. A distância entre a projeção do eixo principal no solo e a linha central do pneu chama-se “desvio”. A distância horizontal entre o eixo principal e o plano central do pneu, na altura do eixo da roda é o “spindle”. Na vista lateral, o ângulo formado entre o pino mestre e a linha vertical é chamado de “ângulo de caster”. A distância horizontal do eixo principal até o eixo da roda é chamada de “offset do pino mestre”. A distância entre a projeção do eixo principal no solo e da projeção do centro da roda no solo é o Avanço (Milliken, 1995). A seguir serão descritos os componentes geométricos mais significativos do sistema de direção e de que forma estes influenciam no comportamento do veículo. 2.5 Ângulo de inclinação do pino mestre No início do desenvolvimento do sistema de direção existiam várias alternativas de sistemas mecânicos para dar direção ao veículo, estes sistemas evoluíram até a forma utilizada atualmente, ou seja, o flange da roda com um pino mestre. O pino mestre era paralelo à linha média da roda e perpendicular ao solo. Isto faz com que o automóvel seja muito desconfortável de dirigir, já que as forças geradas pelas irregularidades do terreno tendem a fazer o com que a roda gire sobre o pino mestre. Esta tendência de giro está relacionada com o momento aplicado no flange da roda. A distância entre o ponto gerado pela linha de projeção do pino mestre no solo e o centro da área de contato do pneu com o solo é o comprimento do braço de alavanca, que multiplicado pela força aplicada na roda gera o momento aplicado sobre o flange da roda. Com o objetivo de minimizar o momento reduziu-se o braço de alavanca inclinando-se a roda para um lado e o pino mestre para o outro. A Figura 49 apresenta um sistema de direção que é um bom exemplo desta configuração. 34 Figura 49. Vista frontal do sistema de direção do Oldsmobile 1904. Museu da Tecnologia da ULBRA Além de diminuir o torque aplicado sobre o flange da roda, a inclinação do pino mestre também restitui o alinhamento das rodas com o corpo do veículo. Sua inclinação faz com que a linha média da roda, perpendicular ao solo, descreva um cone de revolução durante o esterçamento da roda. Desta forma, quando o volante é rotado, o corpo do veículo é elevado, pois a roda tenderia a penetrar no solo. Numa curva, com as rodas esterçadas o corpo do veículo é elevado aumentando sua energia potencial. Ao sair da curva o sistema de direção tem uma tendência de restituir a direção, retornando a posição de menor energia. O efeito de alinhamento das rodas proporcionado pela inclinação do pino mestre é mais acentuado em baixas velocidades (assim como o efeito gerado pelo spindle length). Em altas velocidades o alinhamento é governado principalmente pelo avanço. Quando as rodas são esterçadas a inclinação do pino provoca um afastamento da parte superior e aproximação da parte inferior das rodas direcionais (a trajetória da linha média da roda forma um cone). O “ângulo de inclinação do pino mestre” varia de 1° a 9°, sendo 5° um valor mais usual. A inclinação do pino mestre também é conhecida em português por “saída”, em espanhol por “salida” ou “inclinación”, em inglês por “kingpin inclination” ou “outwar slant”. 2.6 Ângulo de camber O ângulo de inclinação da roda em relação ao solo é chamado de “ângulo de camber” e será positivo se as partes inferiores das rodas de cada lado se aproximarem e as superiores se afastarem. A expressão camber, de origem inglesa será utilizada neste texto por ser a mais popular; em espanhol é “caída” ,”despunte” ou “sopié”. 35 Nos automóveis antigos, além dos motivos citados anteriormente, o camber significativamente elevado também tinha o objetivo de compensar o carregamento do automóvel que provocaria a flexão do eixo da roda e conseqüentemente diminuiria o camber. Outro motivo é a tendência deque as estradas possuíam um perfil transversal curvilíneo e, teoricamente, um camber positivo aumentaria a área de contato do pneu com o solo, além de conservar a roda comprimida contará o flange da roda. A grande desvantagem do camber elevado é a tendência de diminuir área de contato do pneu minimizando a capacidade de absorção das forças laterais. Nos automóveis atuais o camber das rodas dianteiras tende a ser levemente positivo. Na maioria dos casos com ângulos próximos a ½ grau, e a inclinação do pino mestre é quem é determinante na diminuição do braço de alavanca que gera momento aplicado no flange da roda. Quando se utiliza eixo rígido o camber é constante, porém para suspensão independente o camber varia com o curso da roda. Este comportamento é determinado pela geometria de construção da suspensão. Nos veículos de competição o camber negativo é desejavel por aumentar a área de contato do pneu com o solo em curvas onde as acelerações laterais são elevadas, possibilitando que forças laterais geradas sejam maiores. 2.7 Ângulo de caster O “ângulo de caster” é o ângulo de inclinação lateral da linha central do pino mestre na vista lateral. Assim como a inclinação do pino mestre, faz com que a roda se desloque para cima ou para baixo durante o esterçamento. Ao contrário da inclinação do pino mestre, este movimento é oposto nas rodas de cada lado, ou seja, o aumento do ângulo de camber tende a diminuir o efeito da inclinação do pino mestre. Se as rodas de um veículo com ângulo de caster positivo são esterçadas, a carroceria sofre uma rolagem, subindo do lado interno da curva, e descendo no lado externo. Quando a roda é erterçada o ângulo de camber gerado pelo caster é favorável, ao contrário do efeito gerado pela inclinação do pino mestre. Se o caster é positivo a roda externa à curva o ângulo de camber tende a ser negativo (parte superior da roda desloca-se para o centro da carroceria), enquanto a roda interna tende a ser positivo. O ângulo de caster, normalmente, faz com que o ponto correspondente à intersecção no solo da projeção da linha do pino mestre posicione-se a frente do ponto correspondente a projeção vertical do eixo da roda no solo. Na vista lateral, a distância entre estes dois pontos é o “avanço”. Um bom exemplo de seu efeito pode ser percebido na forte tendência de alinhamento dos rodízios de um carro de supermercado, ou de uma cadeira de computador. As força de resistência ao arrasto aplicadas na área de contato do pneu com o solo, associadas com trail, geram momentos sobre o pino mestre, que tendem a restituir o alinhamento das rodas. Quanto maior o avaço, maior será a força necessária aplicada ao volante para alterar a direção do veículo. Em automóveis com sistema de direção simples (não cervo-assistida), o avaço pode ser bem próximo de zero. Sendo assim, valores elevados do ângulo de caster proporcionam uma direção firme. Se demasiado pequeno a direção não tem posição fixa, variando de um lado para o outro continuamente; se é invertido (negativo) a direção reage bruscamente, é dura e perigosa; se é excessivamente invertida o sistema de direção é incontrolável, desviando-se abruptamente para um lado podendo ainda provocar vibrações oscilantes conhecidas como shimmy (Guitián, 2001). 36 O ângulo de caster está relacionado com as forças de arrasto das roda e seu efeito não é percebido em baixas velocidades, ao contrário da inclinação do pino. É usual utilizar-se o ângulo de caster, que geralmente varia de 1º a 7º, inferior ao ângulo de inclinação do pino mestre. 2.8 Divergência e Convergência A convergência (toe-in), divergência (toe-out), é o ângulo que a linha média da roda forma com uma linha diagonal ao veículo e deve ser expresso em graus. Há poucos anos não existiam os equipamentos computadorizados que permitem a medição com exatidão do ângulo de convergência das rodas. Era comum se encontrar no manual de automóveis antigos um método simples de regular a convergência das rodas, que consistia em se medir a distância entre a extremidade de um entre os pneus. Atualmente, a medição de convergência corresponde a distância que a linha media da roda projetada a distância de um metro se desvia do ponto neutro. Assim, a convergência das rodas é expressa em milímetros. A força aplicada na área de contato da roda com o solo multiplicada pelo desvio, que corresponde distância do ponto de intersecção do pino mestre com o solo e a linha central da área de contato do pneu, gera um torque que tende que faz a roda tender a girar em relação ao pino mestre. Se a tração for traseira esta força se relaciona com a resistência de arrasto ao rolamento da roda dianteira. Se a tração for dianteira corresponde com a força de tração. Quando um automóvel de tração dianteira acelera a força aplica na área de contato dos pneus com o solo faz com que a roda tenda a girar para dentro da carroceria, se o a projeção do pino mestre estiver posicionada na metade interna da área de contato, e para fora se a projeção estiver na metade externa. O contrário ocorrerá se a tração for traseira (Guitián, 2001). Assim, se o sistema de direção tem tendência de gerar uma posição divergente, a posição das rodas deve ser regulada de forma convergente, e vice- versa. 2.9 O sistema de direção e a suspensão O sistema de suspensão é composto por barras e articulações que permitem que a roda se desloque para cima e para baixo em relação a carroceria do veículo de forma controlada. O sistema de direção também tem em suas partes barras e articulações que controlam a rotação da roda em relação ao pino mestre. A “barra de direção” (steering arm), junto com o pino mestre, é quem faz a conexão entre os dois sistemas, transmitindo o movimento da cremalheira para o flange da roda. O posicionamento desta barra é determinante no bom funcionamento do sistema. A Figura 50 mostra o esquema representativo de uma suspensão independente do tipo duplo A com sua respectiva barra de direção. Este tipo de suspensão é uma das mais utilizadas por ser simples e eficiente. 37 Figura 50 - Duplo A sobreposto. Milliken, 1995. Uma das maiores dificuldades no dimensionamento de um sistema de direção é a determinação da posição da articulação da cremalheira e da articulação do flange da roda. Se mal projetado pode provocar o esterçamento indesejado durante o curso de subida ou descida da roda, ou seja, quando a suspensão se movimenta as rodas direcionais tenderam a sofrer uma convergência positiva ou negativa. A Figura 51 mostra como a barra de direção deve ser posicionada para evitar este efeito indesejado. Figura 51 - Posição da Barra de direção, vista frontal. Milliken, 1995. Considerando a vista frontal do mecanismo de suspensão e direção, numa análise bidimensional, é possível obter uma excelente aproximação da posição das articulações da barra de direção. Isto pode ser feito com o uso das técnicas da determinação de movimentos de mecanismos formado por barras, utilizando ferramentas simples, tais como régua e compasso. Porém, para uma solução mais próxima do ideal é recomendável o uso de técnicas computacionais, já que o movimento da roda ocorre no espaço (3D). 38 2.10 Posicionamento da caixa de direção A maioria dos construtores de protótipos de competição utilizam uma geometria simples para montar a caixa de direção, que consiste em monta-la a frente do eixo e na mesma altura do eixo de fixação das bandejas superiores da suspensão dianteira no chassis. As articulações dos braços de controle do sistema de direção são alinhadas, na vista frontal, com os do eixo da balança superior, e com o do flange da roda. Isto permite que as variações de convergência/divergência durante ao movimento da suspensão sejam minimizadas. Outra vantagem é o acesso a caixa de direção, o que facilita a regulagem de geometria. Reimpell (2001) apresenta em seu livro “The Automotive Chassis: Engineering Principles” ummétodo para determinar a geometria da suspensão e do sistema de direção na vista frontal. Para isto é necessário anteriormente determinar a posição da articulação que recebe a barra axial do sistema de direção no flange da roda. Esta posição se relacionada com a geometria de Ackermann, o tamanho e o ângulo da barra conectada a flange de roda. O método consiste em projetar este ponto na vista frontal (U), Figura 52, o pino mestre, e as articulações que compõe a barra de direção. Para aplicar o método é necessário que as barras axiais conectadas a caixa de direção estejam alinhadas na vista superior. Inicialmente é determinado o centro instantâneo de giro da suspensão, P1, que consiste no ponto formado pela intersecção das linhas que contém os pontos EC e G D. Depois se determina o ponto P2, que consiste na intersecção das linhas que contém os pontos CD, e EG. A partir do ponto U é traçada uma linha até P1. Esta linha forma um ângulo α com a linha GP1. Traça-se uma linha que inicia em P1, com ângulo α entre a linha que contém P1 e P2. A intersecção entre esta linha e a linha que contém os pontos U e E formam o ponto P3. Traçando-se uma linha que contém os pontos P3 e C, pode- se determinar a posição do ponto T. Figura 52- Geometria do sistema de suspensão do tipo "duplo A" e direção montada atrás do eixo dianteiro. Reimpell, 2001. 39 Passo a passo: 1. Traçar linhas EC e GD, determinar P1 2. Traçar linhas CD, e EG, determinar P2. 3. Traçar linha UP1, determinar α. 4. Traçar linha EU, determinar interseção P3 5. Traçar linha P3C, determinar T Figura 53 – Suspensão duplo a com caixa montada a frente do eixo e Mcpherson com caixa montada atraz do eixo dianteiro. Reimpell, 2001. O ângulo formado (na vista superior) entre a linha de Inclinação do Pino Mestre (linha EG) e o pivô da direção na ponta de eixo (ponto U) é fixo, e é definido pela Geometria de Ackerman. 3. Considerações Finais Como pode ser visto esta apostila apresenta os fundamentos básicos sobre a geometria do sistema de direção e suspensão de um veículo. Esta teoria, apresentada de forma simples e sucinta, pode ser utilizada nas mais variadas formas de veículos, desde bicicletas, pequenos carros para lazer, motocicletas, até automóveis, camionetas e caminhões. Desta forma espera-se que este texto introdutório seja utilizado como ferramenta auxiliar para os trabalhos desenvolvidos na disciplina de Sistemas Mecânicos Automotivos, do curso Engenharia Mecânica Automotiva, que tem como objetivo capacitar o aluno a solucionar problemas ou/e projetar sistemas mecânicos para veículos. 4. Índice de nomes Avanço, é a distância entre a projeção no solo do eixo principal e do centro da roda. Camber, ângulo formado pela inclinação lateral da roda e vertical. Cardan, barra biarticulada que transmite movimento da caixa de câmbio para o diferencias, geralmente possui uma cruzeta em cada extremidade. Caster, ângulo de inclinação do pino mestre em relação a vertical. 40 Centro de Rolagem, CR, ponto sobre o qual a carroceria do veículo gira durante um movimento lateral. Centro Instantâneo de Giro, CI, (Instant Center, IC) ponto sobre o qual a roda gira durante o movimento da suspensão. Convergência do sistema de direção, é a o ângulo formado entre o prolongamento das linhas médias das rodas direcionais. Cruzeta, peça em forma de cruz que faz parte de uma junta universal; encontrada em eixos de transmissão (cardans); a junta universal é comumente chamada de cruzeta. Desvio, movimento da roda na direção transversal ao veículo associado movimento de ascendência e descendência da suspensão. Eixo instantâneo de giro, é o eixo que contém dois centros instantâneos de giro, um da vista frontal e outro da vista lateral; é o eixo sobre o qual a roda gira durante o movimento da suspensão. Esterçamento, movimento de rotação das rodas direcionais sobre o pino mestre. Jumelo, peça semelhante a uma barra bi articulada que engastada no chassi e numa das extremidades do feixe de molas, possibilitando o movimento da mola. Junta homocinética, articulação utilizada em veículos de tração dianteira para transmitir movimento para a roda; Homo=mesmo, cinética=velocidade, a velocidade angular do eixo motor é igual ao do eixo conduzido, o que não acontece com a cruzeta. Offset (lateral) do pino mestre, é a distância horizontal do eixo principal, ou pino mestre, até o eixo da roda. Offset (frontal) da roda, é a distância da linha média vertical da roda até a flange da roda. Pino mestre, (kingpin) eixo que permite o giro do flange da roda dianteira para que o veículo mude de direção. Flange da roda, (knuckle), peça que recebe o pino mestre, o eixo da roda, e o braço de controle do sistema de direção. 41 Bibliografia Adams, H. “Chassis Enginering”, SAE. Aid, F. “Race Car Chassis – Design and construction”, Motorbooks International Publishers & Wholesalers, 1997. Gillespie, T.D. “Fundamental of vehicle dynamics”, SAE, 1992. Guitián, M.A. “Manual de Automóviles”, CIE inversiones Editorales Dossat, 54ª edição, Espanha, 2001. Hünninghaus, K. “História do Automóvel”, Boa Editora Leitura Editora S.A., São Paulo, 1963. Jazar, R.N. “Vehicle Dynamics: Theory and Applications”, Sprinter Science, New York, USA, 2008. Ludvigsen, K, “Battle for the Beetle”, BemtleybPublishers, USA, pg 190, 2000. Pietsch,L.; Cavacanti,T. “Rodas”, Editora GB Rio Ltda, Rio de Janeiro, pg 41-45, 1962. Reimpell, J. The Automotive Chassis: Engineering Principles. 2a Ed., Oxford: Butterworth-Heinemann, 2001. Internet Samahá, Fabrício. “Estabilizador: as vantagens e os critérios para instalar” publicado no sitio “Best Cars Web Site”, visitado em 05/2005. Figura 1. http://jauburtin.free.fr/voitures/autres_mercedes/images/26-03/1erevoiture benz.jpg, visitado em Maio de 2005. http://jauburtin.free.fr/voitures/autres_mercedes/images/26-03/1erevoiture%20benz.jpg http://jauburtin.free.fr/voitures/autres_mercedes/images/26-03/1erevoiture%20benz.jpg
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