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TELETRABALHO EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS Copyright © 2020 de Luiz Fernando de Melo. Todos os direitos reservados. Este ebook ou qualquer parte dele não pode ser reproduzido ou usado de forma alguma sem autorização expressa, por escrito, do autor ou editor, exceto pelo uso de citações breves em uma resenha do ebook. Primeira edição, 2020. SOBRE O AUTOR Luiz Fernando de Melo, advogado e consultor na área do Direito Ambiental e do Trabalho. Pós-Graduado em Direito do Trabalho pela Magistratura do Trabalho da 12ª região (AMATRA 12). Pós-Graduando em Processo Civil pela Universidade Candido Mendes (UCAM-RJ) e Escola Nacional da Advocacia (ENA). Formado no Curso Geral Sobre Propriedade Intelectual promovido pelo INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial e WIPO - World Intellectual Property Organization. Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO. 5-9 1.1 CONCEITO DE TELETRABALHO. 10-12 1.2 ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO TELETRABALHADOR / Pessoalidade / Não eventualidade / Onerosidade / Subordinação Jurídica. 12-26 1.3 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO TELETRABALHO / Para Empresa / Para empregado. 26-30 1.4 O REGIME JURÍDICO DO TELETRABALHO NO BRASIL, CONFORME ART. 75 DA CLT/ Formalidades contratuais/ Responsabilidade pelos custos da infraestrutura do trabalho remoto/ Controle de jornada do teletrabalhador/ Meio ambiente de trabalho. 31- 75 1. INTRODUÇÃO Temos observado há alguns dias as mudanças abruptas que nossas vidas sofreram em decorrência da nova epidemia de coronavírus (COVID-19), descoberta no final do ano de 2019 na China. Analisando pelo âmbito empresarial/trabalhista, tivemos também mudanças abruptas, o que fez com que todas as empresas que possuíssem meios alternativos de forma de trabalho, optassem pelo tão conhecido teletrabalho/home office. Modalidade da qual a CLT (consolidação das leis do trabalho) recepcionou em sua última reforma trabalhista ocorrida no final do ano de 2017. Tivemos recentemente, no dia 22 de março de 2020 a publicação da medida provisória 927 da qual dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid- 19). Em seu capítulo I, dentre várias alternativas dadas pelo legislador, observamos o Art. 3º, do qual dispõe: “Para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da renda, poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas: I - o teletrabalho” Adiante, em seu capítulo II, o legislador dispõe integralmente a respeito do teletrabalho: Art. 4º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho. § 1º Para fins do disposto nesta Medida Provisória, considera-se teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo, aplicável o disposto no inciso III do caput do art. 62 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943. § 2º A alteração de que trata o caput será notificada ao empregado com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, por escrito ou por meio eletrônico. § 3º As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho. § 4º Na hipótese de o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, do trabalho remoto ou do trabalho a distância: I - o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial; ou II - na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato de que trata o inciso I, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador. § 5º O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del5452.htm#art62iii prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo. Art. 5º Fica permitida a adoção do regime de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância para estagiários e aprendizes, nos termos do disposto neste Capítulo. Por óbvio, até mesmo antes de entrar em vigor a medida provisória 927/20, muitas empresas já se anteciparam e trataram de dirigir parte ou a totalidade de seus colaboradores no regime de teletrabalho. Porém, como sabemos, essa medida “obrigatória/compulsória” para empresas que conseguem realizar a gestão de serviços via teletrabalho e se preocupam de fato com a saúde de seus colaboradores, estão em muitas das vezes sendo pegas de surpresa. Afinal, todos nós fomos surpreendidos com tamanha evolução do coronavírus (COVID-19) e sua repercussão mundial. Com toda certeza, o teletrabalho que muitas empresas brasileiras e muitos colaboradores imaginavam, não está saindo como o esperado. Primeiramente pelo fato de que ninguém se preparou para este cenário em tão pouco tempo. Muitos colaboradores não possuem ambientes de trabalho adequados para implantar o teletrabalho em seu ambiente domiciliar, outros tantos sequer possuem boa conexão com internet, além do medo que assola toda a população mundial, o que contribui para o baixo desempenho de todos. Muito provavelmente, o colaborador que está trabalhando em regime de teletrabalho não vê a hora dessa fase passar para imediatamente retornar ao trabalho presencial, poder ver pessoas, abraça-las, conviver, enfim, como um ser humano livre e desimpedido. Não quero dizer aqui que o regime de teletrabalho é ruim, muito pelo contrário. O fato é que os tempos que estamos vivendo são de fatos ruins, o que acabam por refletir em tudo que fazemos em nossa vida. Como venho dizendo, muito embora tenhamos todos sido pegos de surpresa com a pandemia de coronavírus (COVID-19), muitas empresas estão vendo muitos resultados positivos na adoção do regime de teletrabalho para seus colaborados. Empresas que nunca imaginariam ser possível ter até 95%/99% de seus colaboradores trabalhando de casa, em harmonia, mantendo as metas e resultados previstos. Tal fato só foi possível porque foram obrigados a implementarem esse regime extraordinário. O que fica aberto ainda é a questão, e quando voltarmos à normalidade? Quais serão as atitudes das empresas das quais viram que de fato o Teletrabalho nunca antes implementado, funcionou? Para isso, tento trazer o máximo de informação neste livro sobre o regime de teletrabalho, seja pra você empresário seja pra você colaborador, para que você, mais uma vez, não seja pego de surpresa. Estamos diante de uma nova realidade de regime de trabalho, da qual será muito provavelmente adotada em curto espaço de tempo pelas empresas, seja em porcentagem mínima ou em porcentagem máxima. 1.1 CONCEITO DE TELETRABALHO O teletrabalho é a modalidade especial de trabalho a distância, subvertendo a relação de trabalho clássica, sendo responsávelpor novos tipos de atividade descentralizada, que reúne informação e comunicação, podendo ser executado por pessoas com média ou alta qualificação, as quais se utilizam da informática ou da telecomunicação no exercício das atividades.[1] De origem etimológica grega, tele significa distância, nos EUA utiliza-se o termo networking, telecommuting, remote working, nos países de língua portuguesa emprega-se o termo teletrabalho, nos países de idioma francês, télétravail, nos países de idioma espanhol, teletrabajo.[2] Conforme leciona Quintal, inicialmente chamado de telecommuting, tinha como propósito a redução dos deslocamentos entre a casa e o local de trabalho através do repasse ao trabalhador de tarefas periódicas a serem realizadas fora do escritório principal, por meio das tecnologias da comunicação e da informática, reduzindo a necessidade da sua presença física na empresa de forma parcial ou total. Posteriormente, passou a se chamar teleworking para abranger uma gama maior de alternativas que substituíssem as viagens profissionais pelo uso da tecnologia. [3] Segundo a Organização Internacional do Trabalho, o teletrabalho é a “forma de trabalho efetuada em lugar distante do escritório central e/ou do centro de produção, que permita a separação física e implique o uso de uma nova tecnologia facilitadora da comunicação.” Franco Filho, conceitua o teletrabalho como "aquele no qual o trabalhador não mantém contato pessoal com os colegas, mas tem condições de comunicar-se, utilizando as telecomunicações e a teleinformática".[4] Para Pinho Pedreira, teletrabalho "é a atividade do trabalhador desenvolvida total ou parcialmente em locais distantes da sede principal da empresa, de forma telemática. Total ou parcialmente, porque há teletrabalho exercido em parte na sede da empresa em parte em locais dela distantes".[5] O teletrabalho distingue-se do trabalho a domicílio tradicional não só por implicar, em geral, a realização de tarefas mais complexas do que as manuais, mas também porque abrange setores diversos como: tratamento, transmissão e acumulação de informação; atividade de investigação; secretariado, consultoria, assistência técnica e auditoria; gestão de recursos, vendas e operações mercantis em geral; desenho, jornalismo, digitação, redação, edição, contabilidade, tradução, além da utilização de novas tecnologias, como informática e telecomunicações, afetas ao setor terciário. [6] Este fenômeno é decorrência das inovações tecnológicas e da expansão econômica mundial, que provocaram a descentralização do trabalho, a propagação e modernização do trabalho a distância, que deixou de ser apenas o trabalho em domicílio tradicional, a fiscalização do serviço sem a presença física do fiscal, a flexibilização das jornadas, a preponderância da atividade intelectual sobre a manual, a ponto de considerar-se que as sociedades atuais não são mais terciárias (comércio) e sim quaternárias (informações/telecomunicações). O trabalho a distância é o gênero que compreende várias espécies, uma delas o teletrabalho.[7] O teletrabalho cresce a cada dia, especialmente nos setores onde o uso da tecnologia da informação é essencial, como no setor de vendas, atendimentos, instituições de ensino, serviços jurídicos, finanças e diversos outros, incluindo a prestação de serviços jurídicos e o próprio Poder Judiciário; nessa linha, o teletrabalho está sujeito a contínuas transformações. [8] 1.2 ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO TELETRABALHADOR A relação de emprego pressupõe os requisitos dos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)[9]: uma pessoa física deve prestar pessoalmente serviço não eventual de forma onerosa a um empregador a quem ela se subordina. A relação de emprego, portanto se dá entre dois polos - de um lado o empregado; do outro o empregador. Enquanto o empregado é, necessariamente, pessoa física, o empregador pode ser pessoa física, jurídica ou ente despersonalizado. Além disso, por força do art. 2º da CLT, em uma relação de emprego os riscos são assumidos pelo empregador. Por fim, uma relação de emprego pressupõe duas obrigações principais, uma dirigida ao trabalhador e a outro ao empregador. A configuração da relação de emprego exige requisitos para que seja configurada, são eles: pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação jurídica. 1.2.1 Pessoalidade A contratação de um empregado leva em consideração todas as suas qualidades e aptidões pessoais. Por conta dessas características é que o empregador espera ver o empregado, e não outra pessoa por ele designada, realizando o serviço contratado. No conceito de “pessoalidade” existe, portanto, a ideia de intransferibilidade, ou seja, de que somente uma específica pessoa física, e nenhuma outra em seu lugar, pode prestar o serviço ajustado. Assim, toda vez que se verificar que, contratualmente, um trabalhador pode ser substituído por outro no exercício de suas atividades, não estará ali presente um contrato de emprego, mas sim ajuste contratual diverso. [10] Conforme leciona Bernardes, o requisito da pessoalidade é também denominado “intuitu personae”, infungibilidade ou caráter infungível, significando que o trabalho do empregado somente pode ser realizado pela pessoa dele, não podendo ser substituído por outro. [11] Diante desse pressuposto, Barros ensina que este não é aferido com muito rigor na relação jurídica do teletrabalho, levando em conta que o empregado trabalha em seu domicílio, onde o auxílio dos familiares vem sendo permitido.[12] Com os avanços tecnológicos e os novos meios de trabalho conforme já mencionado, a pessoalidade nem sempre será exigida na modalidade do teletrabalho, pois não é relevante quem realiza o trabalho, e sim, que seja apresentado o resultado esperado. Não havendo no contrato cláusula de pessoalidade na execução do teletrabalho, presume-se que este poderá ser realizado por qualquer pessoa. Se o tomador dos serviços pretender que o trabalho seja prestado pessoalmente pelo teletrabalhador, deverá manifestar tal intenção, por escrito, pois até mesmo quando o trabalho é personalíssimo, singular e contem fatores subjetivos como estilo, criatividade, imaginação, poderá ser executado por outra pessoa. A atividade intelectual, científica, artística ou cultural, que exigem a produção ou manifestação de aptidões literária, musical, corporal, pintura, escultura, desenho, interpretação, criação ou reprodução, podem também serem transferidas à outra pessoa, sendo suficiente que possua os atributos necessários à sua realização. Se a pessoalidade na execução do trabalho não for exigida, o trabalho poderá ser executado por qualquer pessoa, na medida em que o que espera o tomador é que o resultado seja atingido. [13] 1.2.2 Não eventualidade Para que haja relação empregatícia é necessário que o trabalho prestado tenha caráter de permanência, mesmo que por um curto período de tempo, não se qualificando como trabalho esporádico. [14] Significa um grau mínimo de permanência no contexto da relação de emprego, trabalhando de forma repetida, nas atividades permanentes do tomador e a este fixado juridicamente.[15] Nas palavras de Cassar, o termo não eventual, quando relacionado ao Direito do Trabalho, no ponto referente ao vínculo de emprego do urbano e rural, tem conotação peculiar, pois significa necessidade permanente da atividade do trabalhador para o empreendimento. [16] Logo, mesmo que descontínuo, isto é, intermitente, o serviço executado pelo empregado poderá ser de natureza não eventual. Basta para isso que seja necessário ao desenvolvimento da atividade normal do empregador. A exemplo é o que ocorre com os professores que comparecem aos estabelecimentos de ensino para ministrarem determinada disciplina durante dois ou três dias na semana. O pressuposto da não eventualidade diverge da exclusividade, a qual é dispensável no Direito do Trabalho. [17] Mais uma vez, na relação do teletrabalho, o significado da não eventualidade perde importância, uma vez que a exigência e demandaexigidos por essa modalidade pode mudar em função das necessidades empresariais. Trabalhador eventual é aquele que trabalha ocasionalmente. No entanto, a eventualidade da prestação é aferida no tempo, e não será eventual aquele que presta serviços por algumas horas do dia, ou, em alguns dias da semana ou do mês, por vários meses ou anos, ao mesmo tomador. Se o teletrabalhador prestar serviços em algumas horas do dia, ou, em um ou dois dias por semana, em vários meses, ou em alguns dias no mês, durante anos, não é eventual, pois não presta um serviço esporádico, especial, ou particular, como, por exemplo, a digitação de um pequeno texto, a criação/desenvolvimento de um único e simples programa de computador etc.. Não se intitula eventual o teletrabalhador contratado com a finalidade de atender necessidades permanentes do tomador, como desenvolver programas informáticos, de alta complexidade, ainda que descontínuo seja o trabalho. [18] Se o trabalho exigir um tempo razoável para sua conclusão, como tradução de várias obras ou digitação de textos longos, que demandam muitos meses ou anos de trabalho, o contrato poderá ser celebrado por prazo determinado. O teletrabalho somente será eventual quando a prestação de serviços, além de eventual, for realizada de acordo com as conveniências do teletrabalhador, que organiza as suas atividades de modo a compatibilizá-las com os serviços prestados a outras pessoas, impondo suas próprias condições de trabalho, trabalhando apenas quando quiser, como quiser, a quem quiser e pelo tempo que quiser. Se a prestação for contínua, seguida e sucessiva, com os demais requisitos da relação de emprego, o teletrabalhador será um empregado de curta ou longa duração, e o contrato será regido pela CLT, por prazo determinado ou indeterminado. Eventual é o teletrabalhador contratado para realizar, especificamente, um serviço ocasional, esporádico, não diretamente relacionado à atividade-fim do contratante. Portanto, o conceito não é meramente temporal. Se o tomador pretender contratar um teletrabalhador para substituir outro em período de férias ou licenças, deverá formalizar contrato por prazo determinado, podendo fazê-lo quantas vezes forem necessárias. Enfim, para configurar a não eventualidade, não se exige que o trabalho seja duradouro, importante é que seja mais ou menos duradouro, conforme princípios da razoabilidade e boa-fé. [19] 1.2.3 Onerosidade Conforme ensina Barros, a onerosidade é vista como a contraprestação devida e paga diretamente pelo empregador ao empregado em virtude do contrato de trabalho, que poderá ser pago em dinheiro ou in natura (alimentação, habitação, etc.).[20] O contrato de trabalho é necessariamente a título oneroso, pois do contrário se aproxima de uma atividade de voluntariado ou nem ao menos se configura como uma forma de prestação de serviços, com base nisso, a onerosidade é uma característica marcante na formação de uma relação de emprego.[21] Nas palavras de Silva, há também outro elemento que complementa a onerosidade: [...] nem sempre enaltecido nas atividades civis e comerciais, que vem a ser a garantia absoluta de recebimento dos salários pelo empregado, independente do que possa ter ocorrido com o empregador. Esse elemento complementar não tem um nome fácil de ser apontado, sendo comum a referência à palavra alteridade como forma de frisar que o trabalho é prestado por conta e risco alheio. A palavra não encontra consenso na doutrina, mas é satisfatória para se destacar que o caráter oneroso não pode ser afastado por dificuldades financeiras ou conjunturais por parte do empregador.[22] Portanto, a onerosidade tem mão dupla, evocando simultaneamente o caráter sinalagmático do contrato de trabalho – prestação de trabalho e contraprestação em dinheiro ou em bens e dinheiro – e o caráter de assunção dos riscos apenas por um dos lados da relação. Se ambos os lados concorrerem para os riscos e para os prejuízos, perde-se a noção de contrato de trabalho. [23] Verificado o elemento da onerosidade na relação de emprego, pode-se concluir que este não teve alteração com a inovação do teletrabalho, embora seja realizado fora do local do empregador, permaneceu intacta as características da remuneração e dos riscos da atividade explorada. 1.2.4 Subordinação Jurídica Na verificação dos elementos da relação de emprego, a subordinação é o elemento de maior importância, sendo elemento central para a caracterização da relação de emprego. Colin, citado por Moraes Filho, nos fornece um dos melhores e mais aceitos conceitos para a subordinação jurídica: “Por subordinação jurídica entende-se um estado de dependência real criado por um direito, o direito do empregador de comandar, dar ordens, onde nasce a obrigação correspondente para o empregado de submeter- se a essas ordens. Eis a razão pela qual chamou-se a esta subordinação de jurídica, para opô-la principalmente a subordinação econômica e a subordinação técnica que comporta também uma direção a dar aos trabalhos do empregado, mas direção que emanaria apenas de um especialista.”[24] Para Delgado, a subordinação é o elemento mais proeminente na conformação do tipo legal da relação de emprego, sendo ela o principal elemento diferenciador entre a relação de emprego e o segundo grupo mais relevante de fórmulas de contratação de prestação de trabalho no mundo contemporâneo, o trabalho autônomo.[25] Consiste na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pelo qual o empregado compromete-se a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços. [26] Segundo Delgado, a subordinação vem sofrendo adequações ao longo dos dois últimos séculos, seja em decorrência de alterações na realidade do mundo do trabalho ou mesmo de novas percepções aferidas pelo direito acerca desse elemento fático da relação de emprego. Três são as dimensões da subordinação: clássica, objetiva e estrutural. A subordinação clássica manifesta-se pela intensidade de ordens do empregador sobre o empregado, que é direcionado no seu modo de prestação dos serviços. A subordinação objetiva é a integração do empregado nos objetivos da empresa. A subordinação é estrutural quando o empregado é inserido na dinâmica do tomador de serviços, independentemente de receber suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento. Na subordinação estrutural, não importa que o trabalhador se harmonize (ou não) aos objetivos do empreendimento, nem que receba ordens diretas de seu superior hierárquico, o fundamental é que esteja estruturalmente vinculado à dinâmica operativa da atividade do tomador de serviços.[27] A subordinação estrutural é a que mais se adequa ao teletrabalho, embora as três dimensões se complementam e permitem o enquadramento de novos tipos de prestação de serviço dentro da relação de emprego. Jair Teixeira Reis comenta que, modernamente, a partir da implementação de novas tecnologias à distância e de telecomunicações ou da informática, o exercício da atividade econômica se distanciou do modelo tradicional de produção, que concentrava máquinas e pessoas no interior de grandes fábricas, onde o trabalhador laborava em tempo integral sob o olhar atento do empregador e sob o método fordista de produção. Em razão dessas mudanças tecnológicas, o Direito do Trabalho passou a ser visto de uma forma redimensionada. [28] Para Barros, o teletrabalho não neutraliza o contrato de emprego, pois o empregado poderá prestar serviços subordinados sob a égide da CLT ou como autônomo, exercendo suas atividades por conta própria, fora da tutela do empregador. Deve-se observar que não é o lugar da prestação de serviços que irá distinguir as duas situações e atribuir tratamento distinto para as atividades, mas sim o fato de o trabalho ser realizado mediante controle do credor do trabalho ou com poderes para gerir sua própria atividade. [29] Pode-se concluir, que a teoria da subordinação estrutural é responsável em trazer para dentro do Direitodo Trabalho trabalhadores que se encontram inseridos nas novas formas de organização do trabalho, e, por conseguinte, afastados do conceito tradicional e objetivo de subordinação jurídica. É em decorrência das novas formas de gestão administrativa ou de reestruturação produtiva advindas dos efeitos da globalização na organização produtiva e do trabalho que o legislador brasileiro teve o objetivo de traçar o critério de subordinação estrutural, tendo como instrumento a introdução da Lei nº 12.551/2011 ao art. 6º, da CLT. [30] A Lei nº 12.551 de 15.12.2011 conferiu nova redação ao artigo 6º da CLT[31], mostrando um legislador atento à compreensão moderna da subordinação de tal modo, equiparando a subordinação jurídica por meios pessoais e diretos, a exercida por meios telemáticos e informatizados. Nas palavras de Delgado, a redação do caput do art. 6º, incorporou, implicitamente os conceitos de subordinação objetiva e de subordinação estrutural, equiparando-os, para os fins de reconhecimento da relação de emprego, à subordinação tradicional (clássica), que se realiza por meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio, sendo assim, o novo preceito da CLT permite considerar subordinados profissionais que realizem trabalho a distância, submetidos a meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão.[32] Martins menciona que a CLT em seu art. 6º, não traz qualquer distinção entre o teletrabalhador desempenhar as suas tarefas no estabelecimento do empregador, ou fora dele, pelo que é perfeitamente possível enquadrar o trabalhador a domicílio dentro do contrato de trabalho típico. [33] Tal alteração legislativa permite considerar subordinados teletrabalhadores, ou seja, aqueles que são submetidos a conexões remotas por meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão. Cabe ressaltar que a subordinação clássica e objetiva não são mais suficientes para abarcar as novas formas de organização produtiva do empregador que se encontram em determinada zona cinzenta no Direito do Trabalho. Em razão disso, a inovação legislativa teve a finalidade de atribuir à atividade prestada pelo teletrabalhador o status de legítima relação de emprego, de modo que o trabalhador possa executar o seu labor de forma não mais autônoma, mesmo porque o critério da subordinação objetiva já não se mostra suficiente para traçar a distinção entre o trabalho autônomo e o subordinado.[34] Conforme Barros, a novidade que a subordinação jurídica apresenta no teletrabalho, advém de três fatores, entre os quais: [...] o controle é facilitado pelos aparelhos de videofiscalização, capazes de fazer registros diversos, até superiores aos que seriam realizados pela inteligência humana, que seleciona, mas esquece; essa memória é associada a uma capacidade de síntese inviável ao espírito humano, e, por fim, os métodos de controle se tomam cada vez mais discretos, senão invisíveis, como ocorre quando se utilizam câmeras escondidas, as quais, na nossa opinião, não poderão ser instaladas sem o conhecimento do empregado.[35] O que de fato ocorre, é que a subordinação não desaparece, mas sim a tecnologia usada cria um novo método para este elemento configurador da relação empregatícia. No trabalho a distância, do qual o teletrabalho é modalidade, o controle alusivo ao poder de direção poderá se apresentar com maior ou menor intensidade, tomando a subordinação jurídica a denominação de telessubordinação, que poderá manifestar-se durante a execução do trabalho ou, mais comumente, em função do seu resultado. Se o trabalhador se encontra, por exemplo, em conexão direta e permanente, por meio do computador, com o centro de dados da empresa, o empregador poderá fornecer instruções, controlar a execução de trabalho e comprovar a qualidade e a quantidade de tarefas de forma instantânea, como se o empregado estivesse no estabelecimento do empregador. A internet permite, inclusive, aferir o tempo de conexão do terminal do empregado, bem como quando foi acessado pela última vez o teclado. Esse controle revela, sem dúvida, a subordinação jurídica, que poderá estar presente ainda quando a execução do serviço seja desconectada (offline). Tudo irá depender da análise do programa de informática utilizado. [36] Os elementos caracterizadores da subordinação jurídica capazes de revelar o vínculo empregatício deverão ser examinados em conjunto, para que resultem significativos. São apontados pela doutrina indicadores valiosos da subordinação jurídica, entre os quais: a submissão do teletrabalhador a um programa informático confeccionado pela empresa, que lhe permite dirigir e controlar a atividade do empregado; o fato de o credor do trabalho ter a faculdade de escolher e substituir o programa operativo específico, com assunção de riscos; disponibilidade de tempo em favor do empregador, com a obrigação de assistir a reuniões ou cursos de treinamento, sob pena de sanção disciplinar. Outro indício consiste em ser a empresa proprietária dos equipamentos de produção (computador, linha telefônica, fax, impressora, etc.); percebimento de importância fixa pelos serviços prestados; assunção de gastos pelo credor do trabalho com água, luz, aluguei, estacionamento, manutenção de equipamentos e outros. A esses indícios acrescente-se a integração do teletrabalhador na organização empresarial, a qual se manifesta pelo grau elevado de confiança, e participação na vida da empresa, dispondo de crachá, de autorização para chamadas telefônicas externas, código para acesso informativo à empresa, figuração nas listas de distribuição interna de documentos aos diretórios eletrônicos da empresa ou aparecimento de sua representação virtual na respectiva página, fatos que não ocorrem com os profissionais que trabalham como sujeitos de um contrato civil ou mercantil. [37] 1.3 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO TELETRABALHO O teletrabalho tem como foco principal a substituição do trabalho subordinado realizado de forma tradicional no estabelecimento do empregador, tendo como principal característica a utilização de modernos equipamentos tecnológicos e de meios de comunicação como internet e telefonia. Com o grande avanço tecnológico e o aumento significativo dessa modalidade de trabalho, temos que suas vantagens são cada vez maiores, mas não ficam afastadas as desvantagens que essa modalidade apresenta. O teletrabalho impacta diretamente a relação empregado- empregador e indiretamente toda a sociedade em que tal relação se desenvolve, oferecendo vantagens e desvantagens conforme é empregado. Segundo Serra, “há que dizer que as vantagens e as desvantagens devem ser entendidas como potenciais, dependendo a sua existência efetiva das reais condições, oferecidas pela empresa e pela sociedade global, em que se efetua o teletrabalho”. [38] Deste modo, necessário se faz ressaltar algumas das vantagens e desvantagens nas perspectivas do empregador e do teletrabalhador. 1.3.1 Para a empresa Para a empresa, suas principais vantagens estão na redução do espaço imobiliário, com diminuição de custos inerentes à aquisição de locais, aluguéis, manutenção, transporte, etc. A par dessas vantagens, propicia uma atenção melhor aos clientes mediante a conexão informática/telemática; gera maior produtividade pelo empregado, em face do desaparecimento do absenteísmo, da eliminação de tempo perdido, sobretudo no trânsito, da maior motivação e da satisfação no exercício da atividade. Além desses aspectos, a empresa se vê livre das greves de transporte, dos acidentes no trajeto do trabalho, dos fenômenos meteorológicos, entre outros. [39] As vantagens não se limitam, no entanto, apenas ao empregado e empregador, extrapolam as fronteiras dos sujeitos em si, abrangendo o meio ambiente a sociedade de um modo geral. Isso porque o fato do teletrabalho reduzir o uso de transportes, por exemplo, permite a redução da poluição e até do congestionamento do trafego. Paralelamente a essas vantagens, o teletrabalho gera a necessidade de investimentosexpressivos com equipamentos que se tomam com frequência obsoletos, além da presença física de equipe de manutenção. A esses fatos acresce a dificuldade de direção e controle dos trabalhadores, dependendo da forma do teletrabalho, a perda da coesão na organização empresarial e a ameaça à confidencialidade da informação.[40] 1.3.2 Para o teletrabalhador Segundos Barros, a principal vantagem apontada em favor do trabalhador é a flexibilidade de horário capaz de facilitar-lhe a conciliação das atividades profissionais com os encargos familiares. Em consequência, o teletrabalho poderá ser um meio propício à melhora da qualidade de vida do trabalhador, desde que ele consiga distinguir entre tempo de trabalho e tempo livre. [41] Outra vantagem consiste na possibilidade de o teletrabalho se estender a um contingente humano que enfrenta dificuldade de obter emprego formal, como é o caso das donas de casa, trabalhadores com idade avançada ou com deficiência física e presidiários. Visto sob esse ângulo, o teletrabalho poderá atuar como um meio capaz de contribuir para diminuir a desigualdade de oportunidades. [42] Além do mais, a modalidade em questão tem gerado empregos com um maior alcance de beneficiários, como no caso dos portadores de deficiências que poderão trabalhar sem ter de enfrentar a dificuldade de locomoção e de ambientes de trabalho devidamente adaptados. Há de ser considerado também como vantagem, a diminuição de despesas com transportes e refeições, havendo assim um grande aumento na qualidade de vida do teletrabalhador, que poderá por exemplo ter tempo hábil para fazer sua própria comida, ao contrário de estar trabalhando na empresa, em que muitas vezes acaba se optando por comidas embutidas ou rede de fast foods, por serem mais rápidos devido ao curto tempo de intervalo para refeição. Por outro lado, essa modalidade de trabalho a distância apresenta como desvantagem a possiblidade de deterioração das condições de trabalho, tendo como a principal causa o isolamento nocivo do teletrabalhador, visto que a falta de convívio profissional pode gerar no empregado a sensação de exclusão da empresa, tornando seu trabalho mais solitário pois fica excluída a figura do ambiente tradicional de trabalho, perdendo todo o contato presencial com outros trabalhadores. Outra desvantagem desse tipo de trabalho é a eliminação da carreira e, consequentemente, de qualquer promoção; menores níveis de proteção social, de tutela sindical e administrativa, além de conflitos familiares, na hipótese de o trabalhador não conseguir separar o tempo livre do tempo de trabalho. [43] Nas palavras de Rodrigues: “A ausência de estreitamento nas relações de trabalho pode impedir, muitas vezes, a ascensão profissional e as novas promoções. Esta desvantagem pode, no entanto, ser neutralizada com o teletrabalho parcial, onde o comparecimento na empresa em alguns dias da semana elimina, ou ao menos minimiza, a sensação de isolamento social.” [44] O teletrabalho apresenta, ainda, uma nova questão a respeito da fronteira entre o exercício do poder diretivo do empregador, do poder de fiscalização da autoridade administrativa, e o direito à intimidade e à vida privada do empregado. Quando o controle se verifica no domicílio do empregado, ele poderá imiscuir-se com a sua vida familiar. [45] Por outro lado, no que tange à fiscalização, ressalte-se que o fiscal do trabalho só poderá entrar no domicílio do empregado com sua aquiescência, sob pena de violar lhe a vida privada. Nos EUA (Los Angeles), para contornar esse problema, exige-se que os teletrabalhadores designem um local ou um cômodo para esse tipo de atividade, com passagem direta à parte externa do domicílio, para que a administração do trabalho tenha acesso sem que viole o domicílio do trabalhador. [46] Capítulo 2 O REGIME JURÍDICO DO TELETRABALHO NO BRASIL 2.1 ANÁLISE DO ART. 75 DA CLT CONFORME REFORMA TRABALHISTA Conforme demonstrado no primeiro capítulo, o teletrabalho é uma atividade executada em forma de uma espécie de telessubordinação, ou seja, uma subordinação jurídica à distância, que se diferencia do trabalho prestado na empresa por tratar-se de um modo particular de organizar o trabalho. É notório que o trabalho à distância, normalmente realizado no ambiente doméstico do próprio empregado, vem se fortalecendo no mercado empresarial como suposta forma de imprimir maior competitividade ao negócio, com redução de custos com instalações prediais (aluguel, construção, manutenção), insumos (água, energia elétrica), deslocamento de empregados (vale-transporte), etc. Por outro lado, o Direito do Trabalho brasileiro ainda não possuía regulamentação do teletrabalho e a jurisprudência sempre tendeu a tratá-lo como uma modalidade de trabalho autônomo, por vezes, um empregado em domicílio, quando presentes todos os elementos qualificadores da relação de emprego. [47] A figura do home office ganha espaço a cada dia, entretanto, o empregador encontrava inúmeras dificuldades em adotar essa forma de trabalho pois não havia segurança jurídica nessa modalidade. No dia 11 de novembro de 2017 entrou em vigor a lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017 (Reforma Trabalhista), que dentre outras significantes mudanças, incluiu em seu Título II da CLT (Das normas gerais de tutela do trabalho) o Capítulo II-A, para consagrar o regime jurídico do teletrabalho no Brasil. Com isso, necessário se faz realizar a análise do texto legal, abordando as principais mudanças trazidas pelo legislador. 2.1.1 Conceito de teletrabalho conforme art. 75-B A reforma trabalhista utiliza o nome de teletrabalho para fazer referência ao home office, e define o modelo de trabalho da seguinte forma: “Art. 75-B. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.” Desta forma, embora o teletrabalho e trabalho externo sejam considerados trabalhos à distância[48], esses não se confundem, pois, o trabalho externo é realizado fora das dependências do empregador, conforme sua própria natureza o obriga, por exemplo: instaladores de antenas de TV, leitores de relógios de energia, etc.[49] Todo trabalho considerado externo, pode vir a ser enquadrado no dispositivo do art. 62, inciso I da CLT[50], ainda que utilizem equipamentos informáticos, como palms, smartphones e rastreadores para se comunicar com o empregador. Já o teletrabalho, embora pudesse ser realizado na empresa, por opção de empregado e empregador, passa a ser realizado de fora das suas dependências. Assim, o teletrabalhador exerce suas atividades sem a necessidade de se locomover para o exercício de suas atribuições, mas tendo como ponto base, que o trabalho ocorra fora das dependências do empregador, como por exemplo em residência própria, biblioteca, cafeteria, etc., mas desde que esteja utilizando das tecnologias da informação e telecomunicação. Caso isso não ocorra, restará descaracterizado o regime de teletrabalho, com a inclusão do trabalhador no capítulo de duração do trabalho. [51] O Art. 75-B conta também com seu parágrafo único, que dispõe: “O comparecimento às dependências do empregador para realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime do teletrabalho.” O comparecimento do empregado no estabelecimento do empregador para realização de atividades especificas é comum, como por exemplo reuniões, atualizações de sistema e software das quais o teletrabalhador necessita de instruções para realizar suas atividades conforme atualizações apresentadas, entre outros, que se faz necessária a presença do empregado, sem que com isso fique descaracterizado o teletrabalho. Conforme entendimento de Melo: “O fato de eventualmente o empregado ir na empresa não afasta sua condição de teletrabalhador, pois o contato esporádico é salutar até para se evitar o isolamento totale estimular o convívio social entre colegas ou treinamento e, porventura, entrega de documentos pessoais ou profissionais. O que não pode acontecer é a exigência contínua de comparecimento ao ambiente de trabalho que se equipare a um controle diário e fixo de forma camuflada. Havendo um simples agendamento para melhor organizar as atividades, não há descaracterização do regime de teletrabalho.” [52] Interessante notar que a previsão da Reforma se assemelha muito com a definição de teletrabalho do Código do Trabalho Português previsto em seu art. 165[53], segundo o qual considera-se teletrabalho a prestação laboral realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação. Nas palavras de Miziara, pode-se afirmar que, no Brasil, o teletrabalho possui as seguintes características: “a) prestação de serviços preponderantemente (mais da metade do tempo) fora das dependências do empregador; b) utilização de tecnologias de informação e de comunicação; c) exercício de suas atribuições deve se dar sem necessidade de constante locomoção, sob pena de configurar-se como trabalhador externo.” [54] 2.1.2 Formalidades contratuais Conforme disposto no Art. 75-C da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, a modalidade de trabalho deverá constar expressamente no contrato, especificando as atividades que serão realizadas: “A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado..” Com isso, pode-se afirmar que o contrato de trabalho do teletrabalhador somente poderá ser ajustado por escrito, pois o dispositivo fala que a condição de teletrabalhador deverá “constar expressamente” e, ainda, “especificar as atividades”. Outrossim, o contrato individual de trabalho do teletrabalhador deve trazer em seu bojo a especificação das atividades que serão realizadas pelo empregado. Especificar um serviço é enumerar, discriminar e pormenorizar as tarefas atinentes a função, de modo a que o trabalhador não tenha nenhuma dúvida de quais tarefas ele desempenhará em favor do empregador. [55] Conforme entendimento de Miziara: “A finalidade da Lei, ao mencionar que os serviços devem ser especificados, foi evitar a utilização indiscriminada dos trabalhadores em atividades genéricas. É preciso especificar a exata dimensão das tarefas a serem desempenhadas. Se qualquer das formalidades for descumprida restará descaracterizado o regime de teletrabalho com a consequente inclusão do trabalhador na disciplina normal de duração do trabalho.” [56] É de se esperar que, descumprida qualquer das etapas da celebração do contrato de trabalho, restará descaracterizado o regime de teletrabalho com a inclusão do trabalhador na disciplina normal de duração do trabalho. Adiante, no parágrafo primeiro do art. 75-C, ficou previsto, que para alteração do regime de teletrabalho é necessário mútuo acordo. “§ 1º Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.” Porém, o parágrafo segundo afirma que o empregador pode determinar, sem anuência do obreiro, o retorno do empregado ao ambiente empresarial. “§ 2º Poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual.” Conforme interpreta Melo, a disposição conflita com o art. 468 da CLT, que exige bilateralidade nas alterações contratuais, em razão do princípio da inalterabilidade contratual lesiva, bem como por força do art. 7° da CF/88 que diz que os direitos devem visar a melhoria da condição social do trabalhador.[57] Nesse contexto, entende-se que o parágrafo segundo deve ser lido à luz do princípio da inalterabilidade e da CF/88. Assim, apenas se o teletrabalhador entrar em acordo com o empregador é que poderá retornar ao ambiente intramuros empresarial, garantindo-se o prazo de transição mínimo de quinze dias. Essa é a determinação do art. 166, item 6, do Código do Trabalho de Portugal , aplicável como direito comparado por força do art. 8° da CLT[58]. [59] 2.1.3 Responsabilidade pelos custos da infraestrutura do trabalho remoto Com reforço, o art. 75-D da CLT traz em seu dispositivo, quem determinará a responsabilidade relativa aos gastos com aquisição, manutenção dos equipamentos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, conforme dispõe: “As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso das despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.” Pode-se observar mais uma vez, que deverá estar estabelecido no contrato de trabalho essa responsabilidade, dando total liberdade para as partes estipularem quem ficará responsável pelos custos e despesas dessa modalidade de trabalho. Havendo a necessidade de previsão em contrato escrito sobre os custos envolvidos, entende-se, em uma primeira leitura, que poderão ser negociadas as formas e o tipo de reembolso sobre determinadas questões na relação estabelecida entre empregado e empregador. Tal situação pode encontrar obstáculos no princípio da alteridade[60], onde é vedado o repasse do risco da atividade empresarial ao empregado juntamente com o art. 2, caput da CLT[61]. Conforme entendimento de Bratefixe Junior: “Desta forma, as ferramentas básicas de trabalho (telefone, computador, conexão de internet etc.) devem ser disponibilizadas pela empresa ou, no limite, reembolsados os gastos com toda a estrutura para o atendimento das atividades. Admite-se negociar as formas de como o reembolso possa ser realizado, e as formas de desenvolvimento dessas atividades conforme as particularidades de cada caso, entretanto, não nos parece razoável a negociação que transfere os custos de atividade ao empregado de forma total e indiscriminada.” [62] Na mesma esteira, Hassen Borges: “Esses dispositivos legais demonstram a intenção do Legislador de transferir ao empregado os custos do empreendimento, pois não estipulam que a responsabilidade pela aquisição, pela manutenção e pelo fornecimento dos instrumentos de trabalho e da própria estrutura do trabalho será do empregador. De forma diversa, as normas abrem margem à possibilidade de transferência do ônus do empreendimento ao empregado ao estabelecer que as disposições sobre essas questões serão previstas em contrato escrito e que a negociação coletiva pode amplamente tratar da matéria.” [63] Sobre essa questão, necessário se faz a compreensão de que o simples fato de a prestação de serviços ocorrer fora das dependências do empregador, não pode transferir ao empregado, parte hipossuficiente da relação empregatícia e que somente detém a força de trabalho, os custos da prestação de serviço. No teletrabalho, o ambiente de trabalho estende-se para o local em que o empregado efetivamente labora, mesmo que “longe dos olhos do empregador”.[64] De outro norte, em casos específicos, podemos analisar o exemplo do profissional que possui um dispositivo até mesmo mais moderno do que o fornecido pela empresa, uma conexão de navegação na rede de maior qualidade que a da empresa e pretende utilizar sua própria estrutura. Tal situação poderá ser acomodada pela livre negociação e, ainda, negociadas as formas de suportar os custos, que podem ser por via de pagamento de ajuda de custo. Sobre esse tema, a lei também explicita que os pagamentos não integram a remuneração do empregado, trazendo maior segurança em sua aplicação.[65] Em verdade, o contrato é que preverá as regras no tocante a responsabilidade pela aquisição, manutenção e fornecimento dos equipamentos tecnológicos e, por fim, a infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalhoremoto. Se a compra for efetivada pelo empregado, obrigatoriamente o reembolso deverá ocorrer na forma como estará prevista no contrato uma vez que o art. 75-D, parágrafo único da CLT deixa claro: “As utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado.” Nesse mesmo sentido, em relação ao art. 75-D da CLT, Melo faz a seguinte interpretação: “observa-se que não ocorre a transferência para o empregado das despesas relativas à atividade, pois essas são do empregador, pelo princípio da alteridade. Apenas determina-se que o reembolso das despesas deve ser previsto em contrato escrito. Por isso, deve ser disciplinado o prazo para os pedidos de reembolso por parte do trabalhador, os documentos que serão necessários e a disponibilidade de equipamentos e material que podem ser adquiridos ou se o empregador realizará a aquisição diretamente, como prevê claramente o art. 168, item I, do CT de Portugal[66].”[67] No entendimento de Miziara, há pelo menos uma hipótese na qual o empregado, custeará parte dos equipamentos e infraestrutura, qual seja, quando aquelas despesas já forem despesas ordinárias do cotidiano do empregado.[68] “Por exemplo, se ele já for o dono do computador e já arcar com os custos de internet. Trata-se de despesa ordinária do empregado. Do mesmo modo, se o empregado ordinariamente já possui a infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto ele não deverá ser reembolsado por nada, pois se trata de despesa ordinária. Essa mesma lógica já vinha sendo seguida por alguns ministros do TST[69] no tocante às despesas com lavagem de uniforme.”[70] Pode-se, inclusive, falar-se em aplicação analógica do art. 456-A, parágrafo único da CLT, pelo qual a higienização do uniforme é de responsabilidade do trabalhador, salvo nas hipóteses em que forem necessários procedimentos ou produtos diferentes dos utilizados para a higienização das vestimentas de uso comum.[71] Logo, se o empregador exigir uma máquina especial ou uma conexão mais potente ou, até mesmo, outros custos com a infraestrutura como condição necessária ao trabalho, deverá arcar com os custos correspondentes. Por exemplo, se o empregado possui um computador que, depois de contratado, se revelar insuficiente para as funções (lentidão excessiva, baixa memória, etc.), caso o empregador exija nova máquina, devera custeá-la, exatamente por se tratar de despesa extraordinária. Da mesma forma, exigências empresariais quanto a determinadas especificações de infraestrutura (como velocidade de internet) deverão ser por ela custeadas, caso ultrapasse o ordinário para aquela determinada região.[72] Nesta visão, pode-se concluir que a existência de qualquer gasto extraordinário com equipamentos tecnológicos, infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto e com despesas arcadas pelo empregado que ultrapasse o limite da despesa ordinária, deverá ser reembolsada. Diante a análise de todos os posicionamentos acerta do art. 75-D da CLT, conclui-se que o legislador não cumpriu a finalidade de proteção jurídica ao teletrabalhador, uma vez que questões relacionadas a responsabilidade pelo pagamento de despesas são todas remetidas ao acordado entre as partes, o que impõe à maioria dos empregados brasileiros a subsunção às ordens empresariais, sob o receio do desemprego iminente.[73] 2.1.4 Controle de jornada do teletrabalhador O controle da jornada de trabalho é mais um aspecto fundamental relativo ao contrato de emprego. Para Delgado, a jornada de trabalho é o lapso temporal diário, semanal ou mensal em que o trabalhador presta serviços ou se coloca à disposição total ou parcial do empregador, e para que se afira, no plano concreto, uma jornada de trabalho efetivamente prestada, é necessário que exista um mínimo controle ou fiscalização sobre o tempo de trabalho ou de disponibilidade perante o empregador.[74] De outro norte, trabalho não fiscalizado ou controlado minimamente é insuscetível de propiciar a aferição da real jornada laborada pelo obreiro: por essa razão é insuscetível de propiciar a aferição da prestação (ou não) de horas extraordinárias pelo trabalhador.[75] Por essa razão é que distingue o Direito do Trabalho entre jornadas submetidas a controle empresário e jornadas não submetidas a esse efetivo controle. As primeiras (jornadas controladas) podem ensejar a prestação de horas extraordinárias, caso evidenciada a extrapolação da fronteira temporal regular da jornada padrão incidente sobre o caso concreto. As segundas (jornadas não controladas) não ensejam o cálculo de horas extraordinárias, dado que não se pode aferir sequer a efetiva prestação da jornada padrão incidente sobre o caso concreto.[76] Como é sabido, a CLT em seu art. 62, exclui do direito às horas extras e, de demais direitos que regulamentam a duração do trabalho, os trabalhadores que atuam externamente, sem possibilidade de controle de horário, e aquele que exerce cargo de confiança. Na atual redação da Lei nº 38 de 2017 , existe a inclusão de um novo inciso no art. 62 para que sejam excluídos de tais direitos os empregados em regime de teletrabalho. Sob o manto da garantia de uma maior comodidade, alguns empregadores poderiam enxergar no teletrabalho uma ferramenta de grande utilidade para aumentar ilegal e excessivamente sua produtividade, o que acabou tomando força pela inclusão do regime do teletrabalhador no art. 62, inciso III: “Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo. III- os empregados em regime de teletrabalho .” O inciso III do artigo 62 da CLT estabelece nítida distinção de direitos entre o empregado que realizada suas atividades no ambiente empresarial e aquele que as exerce no seu domicílio ou à distância, uma vez que exclui estes do capítulo correspondente à duração do trabalho e permite a supressão dos direitos às horas extras, ao intervalo intrajornada, ao intervalo interjornada, à hora noturna e ao adicional noturno, conquanto seja possível o controle de jornada e fiscalização do trabalho por meio de instrumentos telemáticos ou informatizados.[77] O teletrabalho não deve se tornar uma forma sofisticada de exploração, por meios virtuais, do trabalho do empregado. Da mesma forma que a tecnologia possibilita ao empregado realizar tarefas longe da http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10759319/artigo-62-do-decreto-lei-n-5452-de-01-de-maio-de-1943 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10759319/artigo-62-do-decreto-lei-n-5452-de-01-de-maio-de-1943 sede da empresa, também viabiliza o controle da jornada por parte do empregador em qualquer lugar em que ele se encontre. O parágrafo único do art. 6º da CLT reconhece que os meios telemáticos e informatizados permitem ao empregador efetuar um controle eficaz sobre os seus empregados. Assim, ainda que estes prestem o serviço à distância, o tomador de serviços possui os meios para a fixação e controle da jornada do empregado, tendo condições de verificar se o serviço está sendo prestado. Sendo assim, na interpretação de Thomaz de Aquino e Pasqualeto: “As hipóteses de inaplicabilidade dos limites constitucionais de jornada de trabalho são excepcionais e restritas às situações em que o controle do horário não é possível, de modo que o inciso III do artigo 62 da CLT (incluído pela Lei nº 13.467/2017) deve ser aplicado somente nos casos em que os empregados em regime de teletrabalho possuam atividade verdadeiramente incompatível com o controle de jornada. Nos demais casos em que o controle for possível, inclusive por meios telemáticos e informatizados, como autoriza o parágrafo único do artigo 6º da CLT, não incide a nova regra trazida pelo inciso III do artigo 62 da CLT.” [78] Assim, a interpretação que garante a consonância entre o disposto nos artigo 6º e artigo 62, III, CLT e que respeita o art. 7º, XIII, CF é aquela que entende que o teletrabalho somente retira direitos relativos ao limite de jornada (incluindo horas extras, adicional noturno, hora noturna, intervalo intrajornada, intervalo interjornada) nassituações em que não seja possível o controle da jornada exercida pelo empregado, sob pena de tratamento desigual entre os teletrabalhadores e os trabalhadores exercentes de atividade externa que têm possibilidade de controle de jornada e, portanto, aos direitos que dele derivam . [79] O avanço tecnológico aliado aos meios indiretos de controle e fixação da jornada do empregado como o estabelecimento de metas de produção, prazos, relatórios e rotinas, por exemplo, são suficientes para a aferição da jornada do trabalhador. Assim, torna-se cada vez menos justificável a alegação de impossibilidade de controle da jornada do empregado por parte do empregador, haja vista o arsenal de meios ao seu dispor para que isso seja feito. A exemplo disso, Sako traz exemplos de softwares modernos que possibilitam o monitoramento de toda a rotina do trabalhador, conforme dispõe: “O programa geofencing, criado pela empresa Xora, incorporada aos celulares, possibilita o envio de avisos por e-mail sobre o deslocamento dos trabalhadores. Os microprocessadores e transmissores infravermelhos permitem identificar o teletrabalhador e mantê-lo em total controle onde quer que esteja, podendo ser filmado de modo permanente, ter os movimentos e ritmo de trabalho controlados. Programas específicos registram, inclusive, os horários em que o trabalhador acionou cada tecla de seu computador. Ainda que esteja há milhares de quilômetros, empregado e empregador podem ver, ouvir e interagir como se estivessem presentes, permitem identificar o trabalhador e mantê-lo em total controle, tanto nos locais de trabalho, como nos de descanso, em sua residência ou qualquer lugar. O programa Spector 360 é capaz de registrar todas as atividades realizadas no computador de cada um dos trabalhadores e alimentar um banco de dados com relatórios completos e personalizados, com informações sobre os lugares visitados na internet, quanto tempo ficou em cada um, quanto tempo ficou “surfando”, os bate-papos, o acesso a serviços de e-mail como hotmail e gmail, enfim, um sistema completo de monitoramento e filtragem. Esse programa captura automaticamente todas as atividades de internet do trabalhador e de seu ambiente de trabalho, permitindo aferir se está no escritório, em viagem ou trabalhando remotamente no Windows ou Mac OS; faz registros de e-mail/webmail, pesquisas online, transferência de arquivos, bate-papo/mensagens, teclas digitadas, documento tracking, atividade do usuário, atividade da rede, aplicação de programa/uso, mostra em detalhes visuais exatamente o que um trabalhador faz a cada passo do caminho; registra as atividades e alimenta as informações em um banco de dados, fornecendo mais de 50 built-in, personalizando relatórios completos; permite ao empresário saber, por exemplo, o horário em que o trabalhador chega e sai do trabalho, o tempo gasto nos intervalos de refeições. O nível de detalhamento é preciso. É mais do que monitoramento, pois permite o controle proativo de como os trabalhadores usam a web pela integração de filtragem de Internet. Disponível em: <http://www.helos.com.br/spector-360> Acesso em: 1º.11.2011.” [80] Cumpre ressaltar que no exercício do controle da jornada devem sempre ser respeitadas a intimidade e a privacidade do empregado, não podendo os meios informatizados de controle e supervisão tornarem-se instrumentos de intimidação e invasão da vida privada do teletrabalhador, sob pena de configuração de dano existencial ou moral. Na mesma esteira, Melo faz a seguinte interpretação: “Os teletrabalhadores que sofrerem vigilância dos períodos de conexão, controle de login e logout, localização física, pausas ou ligações ininterruptas para saber o andamento dos trabalhos, especialmente se de forma periódica, estão enquadrados na disposição do art. 7° da CF/88 e no art. 6°, parágrafo único da CLT e possuem direito à proteção da jornada, inclusive eventuais horas extras”. [81] Cabe concluir que o empregador, no teletrabalho, pode adotar vários tipos de controle. Assim, não poderá invocar o inciso III do art. 62 da CLT e alegar ausência e/ou impossibilidade de controle para esquivar- se do dever de remunerar o tempo integral dedicado pelo empregado ao trabalho. Se optar pela não-adoção de controle de jornada de trabalho, estará assumindo o risco de, quando demandado, pagar horas extras, inclusive pelos intervalos, de acordo com o que for alegado pelo empregado na petição inicial, caso possua mais de 10 empregados, conforme art. 74, §2 da CLT[82]). [83] Com posicionamento contrário ao exposto acima, o controle efetivo de jornada pelo empregador vem em sentido oposto ao conceito de teletrabalho, visto que a maior vantagem deste, é justamente a do empregado poder escolher os melhores horários para realizar suas tarefas, trazendo maior conforto e mobilidade, deste modo, com o efetivo controle de jornada realizado pelo empregador, inviabilizaria um dos maiores objetivos do teletrabalho, qual seja, a opção do empregado por escolher o horário em que irá trabalhar, a citar o exemplo mais comum nos casos em que o teletrabalhador opta pelo horário em que irá trabalhar, temos os imprevistos do dia a dia, onde seria impossível, na modalidade do teletrabalho, ter horário certo para começar e terminar sua jornada de trabalho. Marlos Melek destaca outro exemplo comum nesta modalidade de trabalho: “O trabalhador tem uma meta de realizar 200 vendas no mês. Não se exige dele horário fixo de trabalho, mas apenas o cumprimento da meta. Neste caso não haverá o pagamento de horas extras.” [84] Deste modo, partindo da análise do empregado criar seu próprio horário de trabalho, não caberá o pagamento de horas extras. Nesse sentido, o fato do empregador ter que empregar meios de controle de jornada efetivos como alguns doutrinadores sustentam, poderá criar conflitos entre as anotações efetivamente lançadas no controle de jornada e os horários de trabalho definidos pelo empregador, retirando assim, todo o objetivo que se busca com o teletrabalho. Sendo assim, ao surgir dúvidas acerca da jornada de trabalho, no caso de processo judicial, quem poderá testemunhar? Nessa linha de pensamento, podemos afirmar que o legislador acertou em inserir o teletrabalho entre as atividades previstas no art. 62 da CLT, pois evita-se, assim, a ocorrência de lides quase insolúveis. Mesmo com o posicionamento favorável ao trabalhador ser inserido no art. 62 da CLT, há situações em que o empregador pode cobrar o cumprimento formal de horários, desconstituindo assim o conceito de teletrabalho, conforme Melek dispõe: “Mesmo com essa previsão legal, alerto que sendo cobrada no teletrabalho, a marcação de ponto ou cumprimento formal de horários poderá a justiça reconhecer horas extras, se foram realizadas; explico: imagine a situação de um trabalhador que deve permanecer em frente ao computador de maneira fixa das 13h às 20h para atender via chat clientes da empresa, o que ocorre normalmente com supervisão remota, horários fixos e inclusive meta de produtividade” [85] Neste caso, estará presente o controle de jornada e desaparece o conceito de teletrabalho, podendo assim ser concedidas horas extras ao trabalhador se dessa forma restar comprovado no processo.[86] 2.1.5 Meio ambiente de trabalho A proteção ao meio ambiente - incluída neste o meio ambiente do trabalho - é direito fundamental previsto no art. 7º, XXII[87], no art. 225, caput[88], e no art. 200, VIII[89], todos da Constituição Federal. Somam-se a estes o art. 170[90] e 193[91], ambos da Carta Maior, os quais, ao estabelecer os valores sociais do trabalho como pilares da Ordem Econômica e da Ordem Social, ordenam a plena proteção da saúde e da integridade física do trabalhador no ambiente onde exerce suas atividades laborais. Para José Afonso da Silva, meio ambiente do trabalho é "o local em que se desenrola boa parte da vida do trabalhador, cuja qualidade de vida está, por isso, em íntima dependência da qualidade daquele ambiente" [92] Para Luiz Alberto David Araujo e Vidal SerranoNunes Júnior, meio ambiente do trabalho é "o espaço-meio de desenvolvimento da atividade laboral, como o local hígido, sem periculosidade, com harmonia para o desenvolvimento da produção e respeito à dignidade da pessoa humana".[93] Celso Antonio Pacheco Fiorillo, a seu turno, afirma que meio ambiente do trabalho é "o local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais relacionadas à sua saúde".[94] A integridade física do trabalhador é um direito da personalidade oponível contra o empregador. Em geral, as condições em que se realiza o trabalho não estão adaptadas à capacidade física e mental do empregado. Além de acidente do trabalho e enfermidades profissionais, as deficiências nas condições em que ele executa as atividades geram tensão, fadiga e a insatisfação, fatores prejudiciais à saúde. Se não bastasse, elas provocam, ainda, o absenteísmo, instabilidade no emprego e queda na produtividade.[95] Para a Organização Mundial da Saúde -OMS, saúde “é o completo bem-estar psíquico, mental e social do indivíduo”. A CLT impõe o dever patronal de instruir os empregados acerca de prevenção de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. Esses comandos já estavam insertos, com as mesmas ideias e objetivos, nos artigos 157[96] e 158[97] da CLT. Conforme consta no art. 75-E, incluído pela Lei nº 13.467/2017: “Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.” Inova o Legislador ao inserir no parágrafo único, que o empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador. Seria isso uma forma de tirar do empregador a responsabilidade por eventuais acidentes ou doenças do trabalho ocorridas dentro do ambiente do teletrabalhador? O principal questionamento que se faz acerca deste artigo, seria se a responsabilidade do empregador ficaria eximida tendo em vista que o teletrabalhador terá que assinar termo de responsabilidade comprometendo- se a seguir a instruções fornecidas pelo empregador, a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. Primeiramente, cabe ressaltar que o meio ambiente de trabalho é um dos direitos humanos fundamentais e tem como um dos seus objetivos o respeito à dignidade da pessoa humana. Com essa premissa, busca-se a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas aplicáveis na relação entre empregador e trabalhador a fim de garantir um meio ambiente de trabalho hígido, salubre e seguro.[98] O princípio da proteção tem como finalidade básica a proteção do trabalhador, a busca de um equilíbrio entre o empregador e o empregado em todos os aspectos, segurança, higiene e saúde do trabalhador que são complementos ao direito à vida e por isso não podem ser negociáveis.[99] No entendimento de Barros: “O princípio da proteção é consubstanciado na norma e na condição mais favorável, cujo fundamento se subsume à essência do Direito do Trabalho. Seu propósito consiste em tentar corrigir desigualdades, criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante d sua condição de hipossuficiente.” [100] A Constituição Federal consagrou, em seu art. 7º XXII, “o direito de todos os trabalhadores rurais e urbanos à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. Conforme artigo colacionado acima, será sempre do empregador o ônus da avaliação técnica dos riscos labor-ambientais. Saliente-se o dever do empregador de custear a implantação de todas as medidas de controle de riscos ambientais, inclusive os equipamentos de proteção individual, conforme redação do art. 166 da CLT: “A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados”. O Capítulo V da Consolidação das Leis do Trabalho, que dispõe sobre segurança e medicina do trabalho, estabelece, em seu art. 154, que a “observância, em todos os locais de trabalho, do disposto neste Capitulo, não desobriga as empresas do cumprimento de outras disposições que, com relação à matéria, sejam incluídas em códigos de obras ou regulamentos sanitários dos Estados ou Municípios em que se situem os respectivos estabelecimentos, bem como daquelas oriundas de convenções coletivas de trabalho”. No mesmo sentido, Barros entende que o fato de o empregado trabalhar fora do ambiente empresarial, não desonera o empregador de cumprir com as leis de higiene e segurança no trabalho, entendendo que essa pode se dar da seguinte forma: “Salienta-se que o teletrabalhadores, em geral, fazem uso de computador. Por isso, recomenda-se que o aparelho não fique contra a luz ou de frente para ela (se for natural), seja também móvel, com tela plana, imagem estável e dimensão suficiente. O monitor do computador deverá estar na altura dos olhos. A par desses aspectos, torna-se necessário, ainda, que a mesa ou superfície em que se assenta o computador seja também plana, de dimensão suficiente, de cor fosca ou clara, com suporte para documentos, além de assento regulável. Se a pessoa que for se utilizar do equipamento tiver estatura baixa e não conseguir encostar o pé no chão, torna-se necessário colocar um encosto para os pés. Recomenda-se também o uso de cadeira giratória. A exigência se justifica porque a inadequação desses elementos poderá provocar fadiga visual e problema músculo-esquelético na região dorsolombar, considerando a posição sedentária em que se desenvolve o trabalho.”[101] Em resumo, nada muda com a figura do teletrabalhador, cabendo ao empregador instruir e capacitar este, plena e continuamente, quanto aos riscos ambientais trabalhistas a que estará sujeito, inclusive de ordem psicossocial e de prevenções a serem tomadas para evitar acidentes de trabalho. Nesse sentido, Maranhão aduz: “Não se pode interpretar o novel art. 75-E da CLT no sentido de que, assinando o empregado compromisso de seguir à risca as instruções patronais sobre riscos à saúde humana no teletrabalho, doravante qualquer infortúnio que venha a sofrer será fruto de seu puro descaso. Essa cultura de culpabilização do obreiro pelos infortúnios laborais é técnica assaz inadequada, porquanto todo acidente de trabalho ou doença ocupacional sempre há de receber análise contextual, adotando-se a teoria da condição insegura ao invés da teoria do ato inseguro, já abandonada pelo nosso ordenamento jurídico. Logo, o compromisso documental do obreiro não pode ser encarado como um salvo-conduto de deveres patronais que, em verdade, são inegociáveis e incontornáveis. [...] Por isso, será equivocada qualquer ilação de que, com a nova regência jurídica, caberia ao trabalhador, a partir de seu ingresso no especial regime do teletrabalho, identificar e controlar tais riscos.”[102] Na mesma esteira, Miziara discorre: “Não obstante, diante da alegação de acidente de trabalho ou doença ocupacional, o simples fato de o empregado ter assinado termo de responsabilidade não eximirá a empresa de indenizar eventuais danos causados, caso seja evidenciada sua conduta culposa ou dolosa. Apesar do termo de responsabilidade, o empregador tem o dever de fiscalizar, respeitada a inviolabilidade de domicílio, a ergonomia do trabalho e o meio ambiente laboral como um todo.”[103] Conforme já sedimentado pelo art. 7º XXII, o ônus da avaliação técnica dos riscos no meio ambiente de trabalho, será sempre do empregador, juntamente com a análise dos princípios jusambientais da prevenção, precaução, in dubio pro ambiente-trabalhador e poluidorpagador. Sendo assim, a mera assinatura, por parte do trabalhador, de termo de responsabilidade, comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador, não afasta o dever fundamental patronal de contínuo controle e redução de riscos labor-ambientais inerentes ao teletrabalho.[104] Não restam dúvidas quanto a responsabilização do empregador mesmo nas situações em que o teletrabalhador terá que assinar termo de responsabilidade. Caberá agora saber sob qual imputação de responsabilidade, subjetiva ou objetiva, o empregador será responsabilizado. É sabido que em nosso ordenamento jurídico brasileiro foi adotado como regra geral a responsabilidade civil subjetiva, ou seja, prescinde de dolo ou culpa do agente o dever de reparar o dano, salvo quando ser der por culpa exclusiva da vítima ou em decorrência de caso fortuito ou força maior, onde não caberá a reparação ao dano.[105] Em contrapartida, como já salientado no tópico responsabilidade subjetiva e objetiva, temos a figura da responsabilidade objetiva nas situações em que a própria atividade cria riscos, tornando presumida a responsabilidade do empregador, visto que seria muito difícil ao empregado comprovar a culpa do tomador de serviços. A jurisprudência acerca da responsabilidade civil do empregador nos casos de acidente de trabalho passou a seguir o entendimento da responsabilidade objetiva quando constatadas o risco da atividade, conforme entendimento majoritário do TST: "RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO EMPREGADO BANCÁRIO VÍTIMA DE ASSALTOS. APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA. POSSIBILIDADE. FORTUITO INTERNO. PRESERVAÇÃO DO NEXO CAUSAL. Perante o Direito do Trabalho, a responsabilidade do empregador, pela reparação de dano, no seu sentido mais abrangente, derivante do acidente do trabalho ou de doença profissional a ele equiparada, sofrido pelo empregado, é subjetiva, conforme prescreve o artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988. No entanto, pode-se considerar algumas situações em que é recomendável a aplicação da responsabilidade objetiva, especialmente quando a atividade desenvolvida pelo empregador causar ao trabalhador um risco muito mais acentuado do que aquele imposto aos demais cidadãos, conforme previsto no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil Brasileiro. Na hipótese, o Tribunal Regional consignou que o autor foi acometido por abalo moral, com sensação de horror impotência e medo, consequências inerentes a qualquer situação de assalto. Destarte, independentemente de a recorrente ter culpa ou não pelos assaltos que resultaram em lesão, não cabe ao autor assumir o risco do negócio, considerando- se que os infortúnios ocorreram em decorrência das funções exercidas no banco, o que acertadamente potencializa a ação delituosa. A responsabilidade da ré é objetiva, nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil. Precedentes. Recurso de revista de que não se conhece" (Processo: RR - 763-53.2010.5.04.0021 Data de Julgamento: 16/11/2016, Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/11/2016, destaquei). "RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. MOTOCICLISTA. VENDEDOR EXTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. Esta e. Subseção vem decidindo no sentido de que a regra prevista no artigo 7º, XXVIII, da CF deve ser interpretada de forma sistêmica aos demais direitos fundamentais, e a partir desta compreensão, admite a adoção da teoria do risco (artigo 927, parágrafo único, do CCB), sendo, portanto, aplicável a responsabilização objetiva do empregador no âmbito das relações de trabalho para as chamadas atividades de risco. No caso, o autor utilizava motocicleta da empresa no exercício da atividade de vendedor externo. Enquanto transitava na BR-470 - denominada RSC-470 - no km 222, sentido Garibaldi-Bento Gonçalves, sofreu acidente de trânsito, quando um caminhão atravessou a pista, causando colisão. O acidente de trabalho resultou em incapacidade laboral parcial e definitiva, em grau médio, com perda de função do tornozelo direito. É inegável que o uso de motocicleta em rodovias para o exercício da função de vendedor externo representa alto risco de acidentes automobilísticos. Corrobora esse entendimento recente regulamentação do Ministério do Trabalho, que aprovou o Anexo V da NR-16, considerando perigosa a atividade laboral com utilização de motocicleta no deslocamento de trabalhador em vias públicas (Portaria MTE nº 1.565 de 13 de outubro de 2014). Recurso de embargos conhecido por divergência jurisprudencial e não provido" (TST-E-RR - 66800-15.2008.5.04.0512, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 19/12/2014). "RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO PELA RECLAMADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. TRANSPORTE DE VALORES. VIGILANTE. Esta Corte Superior tem entendido que o art. 7º, XXVIII, da CF, ao assegurar, como direito indisponível do trabalhador, o ‘seguro contra acidente do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa’, não obsta a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva às lides trabalhistas. Ademais, o Tribunal Superior do Trabalho tem se posicionado no sentido de que o transporte de valores em carro forte configura atividade de risco. Recurso de embargos conhecido e desprovido" (TST-E-ED-RR - 120740- 23.2007.5.03.0134, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 16/08/2013). Como principal argumento para a criação da teoria objetiva, observa-se a grande dificuldade de o empregado comprovar todos os elementos da responsabilidade, em especial, a culpa. Embora não haja jurisprudência a respeito de acidente de trabalho envolvendo teletrabalhadores, cabe fazer analogia a outros casos semelhantes como o vendedor externo e o transportador de valores os quais se adotam a teoria do risco. Segundo Cavalieri, pela concepção clássica, a vítima só obterá a reparação do dano se provar a culpa do agente, o que nem sempre é possível na sociedade moderna com o desenvolvimento industrial, maquinários e outros inventos tecnológicos, além do crescimento da população, fatores que geraram inúmeras novas situações não mais possíveis de serem amparadas pelo tradicional conceito de culpa.[106] Conforme já verificado no art. 154 da CLT, poderá ser aplicada a segurança e medicina do trabalho mesmo aos trabalhadores que não exercem sua atividades dentro da empresa, em contrapartida, na modalidade de teletrabalho, entende-se que o empregador poderá ter limitações para exercer a fiscalização do empregado, como adequada utilização da cadeira, utilização do encosto para os pés, a distância entre os olhos e a tela e o teclado do computador, entre outras acomodações exigidas para o melhor desempenho das profissões que se utilizam de meios telemáticos de alta tecnologia. Nesse sentido, diante da dificuldade de fiscalização do empregador, em decorrência da necessidade de respeito ao domicílio do empregado, verifica-se a possibilidade de um crescimento acentuado no desenvolvimento de doenças ocupacionais, conforme exposto por Winter: “As doenças chamadas ocupacionais, nas quais desponta a LER (lesões por esforço repetitivo), assim como a perda progressiva da visão, o stress, pela repetição de tarefas, muitas vezes eliminando a capacidade de inovação e de criação do teletrabalhador, acrescidos à insegurança e à competição com os demais empregados [...].”[107] Diante disso, acaba-se criando um risco ao teletrabalhador em decorrência da possível falha na fiscalização do meio ambiente de trabalho por parte do empregador, sendo equivocada qualquer ilação de que, com a nova regência jurídica, caberia ao teletrabalhador, identificar e controlar tais riscos. As obrigações patronais relativas ao cumprimento de normas de saúde e segurança aplicam-se irrestritamente ao regime de teletrabalho,
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