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Fundamentos de Sociologia Aplicada às Organizações Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Kátia Pellicci Cembrone Prof. Alexandre Augusto Giorgio Revisão Técnica: Profa. Ms. Katia Maria Lima Revisão Textual: Prof. Ms. Luciano Vieira Francisco Introdução à Sociologia • A Construção do Conhecimento em Sociologia • Formação das Ciências Humanas e Sociais • A Transformação das Sociedades a Partir dos Modos de Produção • O Desenvolvimento da Sociologia • Comte e Durkheim • Outros Importantes Pensadores que Influenciaram o Pensamento Sociológico e que Serão Estudados mais Adiante • Modelos Socioeconômicos e de Regimes Autoritários · Conhecer as origens da Sociologia como área do conhecimento, bem como as principais correntes do pensamento sociológico. · Conhecer as principais vertentes da Sociologia aplicada às organizações. OBJETIVO DE APRENDIZADO Introdução à Sociologia Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja uma maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como o seu “momento do estudo”. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar, lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo. No material de cada Unidade, há leituras indicadas. Entre elas: artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados. Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar, lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Introdução à Sociologia Contextualização Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que importa é transformá-lo. KARL Marx Por que o mais importante é transformar? Figura 1 Fonte: Wikimedia Commons A ideia de Marx introduz o pensamento sociológico partindo do pressuposto de que, por meio do estudo do comportamento humano e dos processos que interligam o indivíduo em associações, grupos e instituições, pode-se não apenas explicar os fenômenos e as transformações sociais, mas também buscar soluções e alternativas transformadoras para alcançar uma sociedade mais justa e menos desigual. Assim, iniciaremos o estudo introdutório à Sociologia, buscando a compreensão de sua importância e analisando a evolução histórica dessa Ciência. 8 9 A Construção do Conhecimento em Sociologia Senso Comum A primeira modalidade de conhecimento que devemos considerar nas Ciências Sociais é o senso comum. Trata-se de um saber popular distinto do código culturalmente dominante e se refere a um conjunto de opiniões, recomendações, práticas, normas e conselhos relativos à vida individual e coletiva em uma sociedade. Portanto, o senso comum diz respeito a princípios normativos populares – conhecimento convencional que se fundamenta na tradição, nos costumes e nas vivências cotidianas. O saber adquirido pelo senso comum orienta as ações pessoais e coletivas da imensa massa da população, tanto daqueles excluídos dos benefícios sociais e do conhecimento científico dominante, quanto as classes sociais mais favorecidas, isso porque podemos localizar repertórios geradores de sensos comuns até mesmo nas letras, nos veículos de imprensa – televisão, rádio, jornais, revistas, internet etc. – e nos “formadores de opinião”, desde articulistas políticos até pretensos intelectuais. Deve-se, portanto, a esse conhecimento popular, ao bom senso e ao senso comum, a garantia e as condições mínimas de vida com critério, inteligência, discernimento e reflexão prévia diante dos problemas cotidianos. Ao científico e acadêmico, devemos nos colocar, contudo, na disposição de reconhecer os méritos que necessitam ser atribuídos ao senso comum, o qual muito tem acrescentado à construção de novos saberes para a vida humana em sociedade. Mesmo assim, não se trata de negar, no cotidiano, o bom senso, o conhecimento popular, pois deste depende a vida de milhões de pessoas sobre a Terra, desde aque- les que não tiveram e continuam não tendo acesso à escola de qualidade e à convi- vência social mínima, até aqueles que se julgam “portadores de verdades absolutas”. Senso Crítico O senso crítico depende do harmonioso crescimento de duas dimensões da consciência: a reflexão sobre si e a atenção sobre o mundo. Se apenas uma dessas progride, há deformação, abalo no desenvolvimento do senso crítico. Suponhamos, por exemplo, o crescimento apenas da consciência do outro. Essa atenção unilateral ao mundo, sem a reflexão sobre si, conduziria à perda da identidade pessoal, à exaltação dos objetos externos, ao alheamento. Por outro lado, imaginemos o crescimento somente da consciência de si: essa reflexão em torno do eu, sem atenção ao mundo, conduziria ao isolamento, ao fechamento interior, ao labirinto narcisista. 9 UNIDADE Introdução à Sociologia O escritor alemão Wolfgang Goethe (1749-1832) dizia que o homem só conhece o mundo dentro de si se toma consciência de si mesmo dentro do mundo. Assim, o desenvolvimento da conscientização humana depende da superação do isolamento e do alheamento. Trata-se de um processo dialético, que se move do eu ao mundo e do mundo ao eu; do fazer ao saber; do saber ao refazer, e assim por diante. Conhecimento Científico O progresso científico, de modo geral, é produto da atividade humana, por meio da qual o homem, compreendendo o que o cerca, passa a desenvolver novas descobertas. E, por relacionar-se com o mundo de diferentes formas de vida, o homem utiliza-se de diversos meios de conhecimento, por intermédio dos quais transforma o meio em que vive, trazendo contribuições para a sociedade. O conhecimento científico procura alcançar a verdade objetiva dos fatos – objetos – e existe porque o ser humano tem necessidade de aprimorar-se constan- temente e buscar explicações sobre a realidade, a natureza das coisas e o compor- tamento das pessoas. Pela percepção sensorial – aquilo que percebemos por meio de nossos sentidos –, o ser humano adquire crenças particulares, recebe informações sobre os sentimen- tos e as motivações das pessoas; recebe normas e definições do mundo por meio dos pais, dos professores, dos escritores, formando uma visão sobre o mundo. No entanto, é necessário desenvolver um espírito crítico a partir da necessidade de obtenção de conhecimentos mais seguros que os fornecidos por outros meios. A Ciência foi desenvolvida primordialmente a partir de necessidades humanas, que prescindiriam da compreensão sobre os motivos e as formas pelas quais uma gama variada de fenômenos ocorreria. Há várias formas de se explicar o mesmo tipo de ocorrência – a chuva, por exemplo: se disséssemos que “chove porque Deus quer”, estaríamos recorrendo a uma explicação religiosa; se disséssemos que “São Pedroestá lavando o céu”, estaríamos utilizando da mitologia; quando recorremos à meteorologia, estamos utilizando a Ciência. O que difere a Ciência de outros tipos de conhecimento é o seu grau empírico, ou seja, a qualidade do conhecimento que produz tem o status de “prova”, que permite o estabelecimento de leis gerais que explicam a mais variada gama de ocorrências. Por sua vez, a “prova” só é possível de ser obtida pela Ciência porque esta utiliza criteriosos processos de investigação, envolvendo rigorosa metodologia de coleta e análise de dados, bem como procedimentos de experimentação, que resultam no conhecimento científico, desenvolvido primordialmente no século XVIII, com a consolidação do método experimental, e difundido no século XIX, com a sua ampliação para diversas áreas de conhecimento. Ciência significa conhecimento; mas, no sentido que buscamos aqui, não se trata de qualquer tipo de conhecimento, senão daquele que persegue as suas respostas utilizando rigorosos procedimentos metodológicos. Pode ser: 10 11 Ciências Naturais Formais Factuais Matemática Lógica Sociais Física, químicas biologia e outras Antropologia, economia, política sociologia e outras. Figura 2 Fonte: Lakatos e Marconi, 1982 Formação das Ciências Humanas e Sociais Sobre a classificação das Ciências, interessa-nos estudar a formação das Ciências Humanas e Sociais que se caracterizam a partir dos seguintes critérios: • O humano como objeto de investigação; • Percebe-se que o homem é diferente das coisas naturais e precisa ser estudado de forma distinta. Esta investigação filosófico-científica se realizou de três formas diferentes, divididas em períodos: 1– Período do humanismo: • Século XV • Ideia: o homem como centro do universo destinado a dominar e controlar a natureza e a sociedade. É diferente dos demais por ser racional e livre 2– Período do positivismo: • Século XIX ( com Augusto Comte) • Ideia: progresso humano. Propõe o estudo da sociedade. Esta ciência é desenvolvida pelo francês Emile Durkheim. Estuda a sociedade como fato que constitui as instituições sociais: família, trabalho, religião, estado etc. 3– Período do historicismo: • Final século XIX e ínicio do século XX • Ideia: insiste na diferença entre homem e natureza e entre ciências naturais e humanas. Estuda o desenvolvimento da humanidade e o progresso. (Os homens são dotados de valores e de sentidos por isto são diferentes dos fatos naturais) Figura 3 11 UNIDADE Introdução à Sociologia Com o avanço do conhecimento, tornou-se necessária uma divisão das Ciências Sociais em diversas disciplinas, tais como: Sociologia Estuda as relações sociais e as formas de associação, considerando as interações que ocorrem na vida em sociedade. A sociologia abrange o estudo dos grupos sociais; da divisão da sociedade em camadas; da mobilidade social, dos processos de cooperação, competição e conflitos em sociedade etc. Economia Estuda as atividades humanas ligadas à produção, circulação, distribuição e consumo de bens e serviços. Estuda a distribuição de renda num país, a política salarial, a produtividade de uma empresa, etc. Antropologia Estuda as semelhanças e diferenças culturais entre os vários agrupamentos humanos, a origem e a transformação das culturas. Estuda os tipos de organização familiar, as religiões, o casamento, etc. Política Estuda a distribuição de poder na sociedade, bem como a formação e o desenvolvimento das diversas formas de governo. A Sociologia é uma Ciência em construção que, desde o seu início, procurou explicar as estruturas e os processos sociais, políticos, econômicos e culturais da sociedade moderna. Trata-se de uma Ciência que se formou no decurso da consolidação do Estado liberal burguês. Isto nos ajuda a compreender que também essa não está ilesa das contradições que caracterizam a moderna sociedade capitalista, marcada pela desigual e injusta distribuição de renda. Pelo fato de vivermos em uma sociedade altamente complexa em sua forma de organização, em seus diferentes níveis de funcionamento e em seus avançados meios de comunicação, adquirimos muitas noções básicas que podem nos ajudar a compreender os acontecimentos sociais. Contudo, somente quando estudamos criticamente as questões teóricas e metodológicas das diferentes teorias sociológicas, apropriamo-nos das ferramentas necessárias e próprias para a compreensão da organização social e da vida humana em sociedade. Humanismo - séc XV a XVIII Ideia: domínio da natureza • Revolução Francesa Historicismo - �m do séc XIX a XX Ideia: diferença homem e natureza e ciências naturais e humanas • Primeira e segunda Guerra Mundial • Guerra fria Positivismo - �m do séc XVIII a XX Ideia: progresso humano • Revolução Industrial •Surgimento da Sociologia Figura 4 12 13 A Transformação das Sociedades a Partir dos Modos de Produção A sociedade passou por diversos processos de transformação a partir da produção de bens e serviços, como estes foram e são utilizados e distribuídos. Tal fenômeno é chamado também de sistema econômico. Assim, em determinada época, uma sociedade tem certa maneira de se organizar para produzir e distribuir a sua produção. O modo de produção de uma sociedade é formado por suas forças produtivas e pelas relações existentes nessa coletividade. Assim: Modo de produção = Forças produtivas + Relações de produção Cada modo de produção pode ter existido em lugares e épocas diferentes, definindo os principais tipos de sociedades. Tipos de Modos de Produção • Comunismo primitivo – os homens se unem para enfrentar os desafios da natureza; • Patriarcal – domesticação de animais, uso da agricultura, instituição da família, autoridade do pai; • Escravista – aumento da produção, propriedade privada e surgimento da primei- ra forma de exploração do homem, a partir da distinção primordial: proprietários dos meios de produção versus proprietários apenas de sua força de trabalho; • Feudal – o servo trabalha um tempo para si e outro para o senhor feudal, pagando impostos pelo uso do solo, da água e de ferramentas; • Capitalista – relação entre o burguês, que detém o capital, e o proletário, que possui apenas a sua força de trabalho. O Desenvolvimento da Sociologia Podemos entender a Sociologia como uma das manifestações do pensamento moderno. As transformações que levaram ao desenvolvimento do pensamento científico tornaram possível que esse passasse a cobrir, com a Sociologia, uma nova área do conhecimento ainda não incorporada ao saber científico, ou seja, o mundo social. Desenvolveu-se posteriormente à constituição das Ciências Formais, Naturais e de diversas outras Ciências Sociais. O seu desenvolvimento ocorreu inicialmente em um contexto histórico específico, que coincide com os derradeiros momentos de desagregação da sociedade feudal, a partir do século XV, e da consolidação da civilização capitalista, em meados 13 UNIDADE Introdução à Sociologia do século XVIII. As transformações econômicas, políticas e culturais que se aceleraram a partir dessa época colocaram problemas inéditos para os homens que experimentavam as mudanças que ocorriam no Ocidente europeu. As três revoluções que esse século testemunhou – industrial (inglesa), política (francesa) e filosófica (alemã) – constituíam os distintos lados de um mesmo processo, ou seja, a instalação definitiva da sociedade capitalista e a consolidação do mundo burguês. As revoluções Industrial e Francesa, respectivamente de natureza econômica e política, foram movimentos revolucionários que implantaram o processo liberal que deu sustentação ao desenvolvimento do modo de produção capitalista e ao Estado burguês no mundo ocidental. Desenvolveu-se e consolidou-se, no decorrer do tempo subsequente, o capitalismo que assegurou as condições de produção e reprodução do Mundo Moderno. A Sociologia nasceu, portanto, “de mãos dadas” com a modernidade. Como diz o sociólogo brasileiro Octávio Ianni (1988,p. 8): “Mais do que isso, o Mundo Moderno depende da Sociologia para ser explicado, para compreender-se. Talvez se possa dizer que sem ela esse Mundo seria mais confuso, incógnito”. O Mundo Moderno ganhou corpo com as revoluções burguesas no Ocidente. Historicamente, com esse ficaram estabelecidas as forças produtivas e as relações sociais capitalistas de produção. Trata-se de uma época em que a originalidade e as contradições do Estado burguês se encarregavam de construir e fortalecer os alicerces da atual sociedade. De lá para cá, foi sendo aprimorada a construção das estruturas da economia e do Estado, das tecnologias, dos atores e sujeitos sociais que asseguraram a originalidade do capitalismo: uma sociedade que produz mais valia ou trabalho não pago; que foi se tornando cada vez mais complexa; que concentra, de um lado, os meios de produção e a riqueza nas mãos de poucos e, de outro lado, cria uma imensa massa original e diferenciada de trabalhadores que deverão vender a própria força de trabalho, sobrevivendo e reproduzindo novos trabalhadores que continuarão a produzir, de forma cada vez mais sofisticada, a “magia da mercadoria”. Segundo o teólogo brasileiro Leonardo Boff (1999, p. 42), em uma de suas críticas ao modelo atual da sociedade em que vivemos: [...] o núcleo desta sociedade não está construído sobre a vida, o bem comum, a participação e a solidariedade entre os humanos. O seu eixo estruturador está na economia de corte capitalista. Ela é um conjunto de poderes e instrumentos de criação de riqueza – e aqui vem a sua característica básica – mediante a depredação da natureza e a exploração dos seres humanos. A economia é a economia do crescimento ilimitado, no tempo mais rápido possível, com o mínimo de investimento e a máxima rentabilidade. Quem conseguir se manter nessa dinâmica e obedecer a essa lógica acumulará e será rico, mesmo à custa de um permanente processo de exploração. 14 15 Portanto, o Mundo Moderno é o resultado de um grande processo que inclui su- jeitos, objetivos e/ou resultados esperados, tempo, lugar, recursos, relações, recicla- gem, avaliações, planejamentos, replanejamentos que produzirão fenômenos sociais complexos, construídos e aprimorados pelos homens em suas relações de classes so- ciais. Como veremos, para os pensadores positivistas, a grosso modo, as ocorrências ou fenômenos sociais são coisas produzidas pelos homens em sociedade. Comte e Durkheim Augusto Comte (1798-1857) Comte é tradicionalmente considerado o “Pai da Sociologia”. Foi quem, pela primeira vez, usou essa palavra, em 1839, em seu Curso de Filosofia Positiva. Físico francês, nascido e criado no bojo da Revolução Francesa, Revolução Liberal Burguesa que derrotou, a um só tempo, as críticas teóricas dos “pensadores socialistas” e as expressivas lutas e resistências do operariado, consolidando o Estado liberal capitalista no Ocidente. A formação do físico Comte permite-nos compreender seu empenho intelectual no sentido de estudar a sociedade nos mesmos moldes e padrões da Física: Ciência Natural, de cunho exato, cujo objeto, ou fenômeno estudado é regido por leis naturais. Daí a preocupação de Comte com a “máxima objetividade teórico- metodológica” ao conduzir seu estudo da sociedade; explicando-se seu empenho e “reação positivista”, principalmente contra as doutrinas e os pensadores socialistas – que criticava em suas análises sobre a sociedade capitalista. Comprometido com o Estado nacional, liberal capitalista, que se consolidava em nome do “progresso”, Comte preocupava-se, contudo, com a devassa da guilhotina nos “estratos médios” da sociedade francesa, criando, segundo esse pensador, um “desequilíbrio social” que ameaçava o “desenvolvimento natural” e o “progresso social”. Resulta dessas razões o seu comprometimento com o “espírito científico”, único capaz de situar as pessoas no intrincado e complexo mundo dos comportamentos sociais e das relações dos homens em sociedade, para restabelecer a pretendida condição de “ordem e equilíbrio social”. Entende-se daí porque o seu estudo denominava-se, inicialmente, Física Social, mais tarde, Sociologia. Contribuição Crítica ao Positivismo Comtiano Na Sociologia, é próprio do teórico “positivista mecanicista” procurar a compreensão e explicação da sociedade por meio da analogia mecânica. É verdade que não se trata de identificar a sociedade como uma máquina complexa, mas procurar na comparação, na similitude com a máquina compreender e explicar a organização interna e o funcionamento da sociedade. Comte recorreu ao relógio como analogia explicativa: um todo complexo com unidade de organização e de 15 UNIDADE Introdução à Sociologia funcionamento. O todo é mais importante do que as partes – estas que só podem ser explicadas em função do todo. Utilizando-se da analogia mecânica, Comte, em última instância, reconheceu que a sociedade e a complexidade das relações e da vida social, não podem ser conhecidas e explicadas em si, mas somente a partir de algo que “as retrate” – nesse caso, uma máquina. Uma das limitações cruciais do positivismo comtiano consiste na ideia de evolução, igualmente mecanicista, da sociedade. Todas as sociedades, diz Comte, partem da “estaca zero” e atingem o cume da organização social, do saber, da tecnologia etc., por meio de um processo natural, o qual regido por leis naturais. A história comprovou e tem comprovado que essa tese não se sustenta. Assim, a tese da igualdade e identidade do homem também está colocada. Nos termos propostos pelo autor, fica difícil sustentar que o homem e a mulher se fazem no processo social, no processo histórico. No pensamento comtiano, um índio, uma criancinha da favela, um garotinho de classe média, outro da elite são pessoas sócio e historicamente iguais. O que dizer de tal ponto de vista? Essas e outras afirmações positivistas comtianas incidem em um “erro teórico- -metodológico” ao admitirem e defenderem que fatos e fenômenos sociais são coisas da mesma natureza que a Física, Biologia, Química e, enquanto tais, são regidos por leis naturais e que somente nessa “condição objetiva” devem ser estudados. Émile Durkheim (1858-1917) Nascido na França, Durkheim é tido e aceito pelos estudiosos das Ciências Sociais como um dos principais fundadores da teoria sociológica. São inúmeras as contribuições e tentativas de Durkheim para superar o que já havia sido produzido sobre o estudo das sociedades até a sua época. Influenciado pelas conturbações de seu tempo, causadas pelas revoluções Francesa e Industrial, a ideia central de seu pensamento é a de que a humanidade avançaria para o aperfeiçoamento por meio da força do progresso, princípio herdado da filosofia iluminista. Durkheim desenvolveu um método de investigação dos acontecimentos sociais e estabeleceu um objeto de estudo: os fatos sociais. Desejava que a Sociologia, como as outras Ciências, tivesse um objeto específico que pudesse ser observado, explicado e que a distinguisse das demais áreas do saber (DURKHEIM, 2002). Fatos Sociais Um exemplo simples nos ajuda a entender o conceito de fato social, segundo Durkheim: se um aluno chegasse à escola vestido com roupa de praia, certamente ficaria em uma situação muito desconfortável: os colegas ririam, o professor lhe daria uma enorme bronca e provavelmente o diretor o mandaria de volta para que vestisse uma roupa adequada. 16 17 Logo, existe um modo de vestir que é comum, que todos seguem – e isso não é estabelecido pelo indivíduo. Afinal, quando esse entrou no grupo, já existia tal norma e, quando sair, a norma provavelmente permanecerá. Quer a pessoa goste, quer não, vê-se obrigada a seguir o costume geral. Se não o seguir, sofrerá punição. Portanto, o modo de vestir é um fato social. São fatos sociais também a língua, o sistema monetário, a religião, as leis e uma infinidade de outros fenômenos do mesmo tipo. Para Durkheim os fatos sociais são as maneiras de agir,de pensar e de sentir exteriores ao indivíduo e dotadas de um poder coercitivo sobre este, formando, assim, a consciência coletiva – ou senso comum –, que é a soma de todas as consciências sociais, ou seja, é criada a partir de como a sociedade percebe a si e o mundo. Dito de outra forma: Fato social é toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior: ou então, que é geral do âmbito de uma dada sociedade tendo, ao mesmo tempo uma existência própria, in- dependente das suas manifestações individuais (DURKHEIM, 2002, p. 65). Em virtude dessas características, para Durkheim os fatos sociais podem ser estu- dados objetivamente, tais como “coisas”. Da mesma maneira que Biologia e Física estudam os fatos da natureza, a Sociologia pode fazer o mesmo com os fatos sociais. A Ordem Social De acordo com Durkheim, os fatos sociais correspondem ao objeto de estudo da Sociologia, podendo ser definidos como padrões de comportamento que são capazes de exercer algum poder coercitivo sobre os indivíduos. Tais padrões são internalizados durante o processo de socialização e educação, passando a fazer parte da consciência individual. Essas restrições levam à obrigação moral de obedecer a regras que determinam a vida em sociedade. As características dos fatos sociais, segundo Durkheim são: Coletivo: comum a todos Exterior: independente do indivíduo Coercitivo: obrigatório a todos os indivíduos Figura 5 17 UNIDADE Introdução à Sociologia Essas forças externas são a consciência coletiva, definida como uma relação social expressa por ideias, valores, crenças que são institucionalizadas na estrutura social e internalizadas pelos membros da cultura em questão. Esse teórico analisa as causas e os efeitos do enfraquecimento dos laços entre os indivíduos em duas publicações: A divisão do trabalho social (1893) e O suicídio (1897). No livro A divisão do trabalho social, identifica duas formas de solidariedade que têm origens diferentes. A primeira é a solidariedade mecânica, que surge em sociedades relativamente homogêneas, em que as pessoas estão envolvidas em atividades semelhantes e vivem as mesmas experiências. Nessas sociedades, as poucas instituições existentes expressam valores similares e regras que se interligam e se reforçam. As normas, crenças e os valores são homogêneos e a consciência individual é virtualmente idêntica à consciência coletiva. De acordo com Durkheim, nessas sociedades tradicionais, as culturas experimentam alto grau de integração e pouco espaço para o individualismo. As pessoas, nessas sociedades, participam do mesmo tipo de atividade e têm os mesmos valores, portanto, todos se consideram parte do grupo. A segunda forma de solidariedade é definida pelo autor como solidariedade orgânica, sendo fruto da divisão do trabalho, que marca as sociedades mais complexas e como as experiências concretas tornam-se muito diversas, os interesses, valores e crenças tendem a se diferenciar. Nessas condições, os indivíduos têm cada vez menos valores em comum, contudo, devido às condições concretas, suas atividades estão interligadas e são interdependentes. O crescimento do individualismo, neste contexto, seria inevitável e levaria ao enfraquecimento dos valores coletivos e ao sacrifício do sentido de comunidade. A coesão social se enfraquece e os seus valores estruturantes deixam de garantir uma moral consistente e que fornece os parâmetros para o comportamento social. A diversidade de normas e valores é capaz de libertar o indivíduo das tradições criadas pelas instituições como família e igreja, contudo, tal potencial também se traduz em problemas para a vida em sociedade. O indivíduo tem inúmeras possibilidades de comportamento, que nem sempre são marcadas pelo bem comum, e como as regras as tornam mais frouxas, é possível que enverede pelas quais. Assim, seu comportamento passa a ser marcado pela ideia de que todos os seus atos devem ser pautados pela noção da seguinte dúvida: “Será que este comportamento atende às minhas necessidades?” – e não mais pela ideia de: “Será que este comportamento atende ao bem comum?” 18 19 Outros Importantes Pensadores que Infl uenciaram o Pensamento Sociológico e que Serão Estudados mais Adiante • Karl Marx (1818-1883), nascido na Alemanha – visão histórica, ideia principal: determinação do modo de produção de mercadorias a partir da força de trabalho; • Max Weber (1864-1920), nascido na Alemanha – visão culturalista, ideia prin- cipal: extrema valorização do trabalho para o acúmulo de riquezas. Define tipos de dominação: carismática, legal e patriarcal. Burocracia. Ação e ação social. Modelos Socioeconômicos e de Regimes Autoritários • Capitalismo – defende os interesses da burguesia, divisão em classes sociais, meios de produção e propriedade privada; • Socialismo – resolução de problemas sociais, reação contra o individualismo, subordina o indivíduo ao interesse e às necessidades do grupo. 19 UNIDADE Introdução à Sociologia Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros O que é Sociologia MARTINS, C. B. O que é Sociologia. São Paulo: Brasiliense, 2000. Vídeos Ilha das Flores (1989) https://youtu.be/e7sD6mdXUyg O que é Sociologia https://youtu.be/4tLRDjza0qQ Filmes A Ilha do Dr. Moreau Dir. Don Taylor. Estados Unidos, 1977. O Nome da Rosa Dir. Jean Jacques Annaud. Estados Unidos, 1980. 20 21 Referências BOFF, L. Ética da vida. Brasília, DF: Letraviva, 1999. COTRIM, G. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2000. DURKHEIM, E. As regras do método sociológico. São Paulo: Martin Claret, 2002. FACHIN, O. Fundamentos de metodologia. São Paulo: Saraiva, 2006. IANNI, O. A Sociologia e o Mundo Moderno. Aula inaugural. Campinas, SP: Unicamp, 1988. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1982. MATTAR, J. Metodologia científica na Era da informática. São Paulo: Saraiva, 2005. OLIVEIRA, P. S. Introdução à Sociologia. São Paulo: Atlas, 2003. 21
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