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SÍNDROME DO ADOLESCENTE NORMAL

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SÍNDROME DA ADOLESCÊNCIA NORMAL 
Dra. Júlia Kerr
Pediatria I 
2022.2
CASO CLÍNICO
· Paciente sexo feminino, 15 anos, acompanhada da mãe
Consulta Acompanhada: 
· QD: Mudança de comportamento há 1 ano.
· HPMA: Há um ano está evitando o convívio familiar. Ex: Desobedece e responde para a mãe quando está com as amigas, recusa-se a ir almoçar na casa da avó aos fins de semana, e não quer mais ir na igreja
· ISDA: Sem anormalidades nos aparelhos cardiovascular, respiratório, digestivo, genitourinário, pele e fâneros.
· DUM: Há 3 semanas
· Ritmo de sono: Seria normal se não fosse o celular, que fica vendo na hora de dormir.
· DNPM: Está no 1º colegial de escola particular, período matutino e tem bom rendimento.
· Alimentação: Não toma café da manhã, 1ª refeição no intervalo da escola. No geral ingere quantidade adequada de carne e leite, poucas verduras e frutas, e tem preferência por guloseimas e carboidratos.
· Vacinação: Em dia e verificada, inclusive com as doses de HPV.
· AMP: Saudável, peso e altura adequados ao nascimento.
· AFH: Avó paterna tem diabetes tipo 2, pai tem hipertensão arterial controlada.
· Exame físico: Sem anormalidades, estatura p50, IMC p50, PA 100 x 70mmHg
Consulta sem Acompanhante:
· Família: Mora com os pais e irmão mais novo. Tem seu próprio quarto. Conflitos leves com o irmão. A mãe é “dramática” (SIC).
· Escola: Sem dificuldades
· Amigos: Afastou-se um pouco das amigas porque elas não aprovaram seu namorado.
· Atividades: Costumava encontrar as amigas na praça da cidade. Cada uma levava a sua bebida. Não pratica esportes.
· Drogas: Já experimentou bebida alcoólica das amigas, mas nega embriaguez. Nega uso ou experimentação de tabaco e drogas ilícitas.
· Sexualidade: Namorou um rapaz de 18 anos por 8 meses. Teve com ele sua 1ª relação sexual e usaram preservativo. Era um relacionamento turbulento, onde ele tinha muito ciúme e a depreciava frequentemente. A mãe e as amigas não gostavam dele, e ficavam dando palpite, piorando as coisas, e por isso a adolescente passou a evitá-las. Ela resolveu terminar o namoro, e sua mãe e amigas ficaram satisfeitas. Ficaram separados por um período de tempo, mas o rapaz voltou a procurá-la e há 3 meses mantém um relacionamento secreto. Ele ainda é ciumento e frequentemente a trata com grosserias, mas ela acredita que deve ficar com ele, porque foi ele com quem “perdeu a virgindade”
· Humor: Alterna momentos de felicidade e tristeza. Pretende ser psicóloga. Um dia quer ter um bebê. Autoimagem: Não gosta de sua barriga.
Hipóteses Diagnósticas:
· Crescimento P50 adequado
· Estado nutricional p50 adequado
· Alimentação inadequada
· Vacinação adequada
· DNPM adequado
Avaliação de Risco:
· Alto risco para gestação e DST
· Moderado risco para alcoolismo
· Baixo risco para suicídio
Comentários sobre o caso: 
· A princípio as queixas da mãe não chamam muita atenção, considerando que trata-se de uma paciente de 15 anos, por isso é tão importante seguirmos com todas as etapas da anamnese. 
· Como a queixa é de mudança de comportamento, a descrição do sono e dos hábitos alimentares são muito importantes por ajudarem na investigação da depressão e transtornos de imagem, tanto alterações para mais quanto para menos. 
· Nos antecedentes familiares é importante investigar a presença de transtornos mentais, com destaque para a depressão. 
· Quando a paciente descreve o relacionamento/sexualidade, a gente entende essa mudança de comportamento. Ela mantém o segredo de um relacionamento um tanto quanto turbulento, com muito ciúmes da parte do parceiro e desaprovação dos pais e amigas, é esperado que isso gere a mudança de comportamento. 
NEUROCIÊNCIAS
Os estudos da neurociência demonstraram que na faixa dos 15 anos ocorre a nossa última “grande poda” neuronal, onde toda a massa cinzenta é substituída por massa branca, sem que ocorra alteração do volume de massa encefálica, com isso ocorre uma alteração cerebral, e passamos a priorizar atividades mais importantes e deixar de lado aquelas que não são tão importantes assim. 
Além disso, ocorre também uma diminuição dos receptores de dopamina, então surge uma dificuldade maior de sentir prazer com as coisas simples, consequentemente há uma necessidade de que tudo seja muito intenso. Por exemplo, um adolescente nunca escuta música no fone de ouvido em um volume médio, é sempre muito alto. E também nunca pega um carro e anda na velocidade certa, sempre tem que correr, se aventurar, correr perigo. 
Outra coisa é que o lobo frontal, responsável pela empatia, é o último a se desenvolver, atingindo o ápice do desenvolvimento após os 25 anos, então é esperado que o adolescente seja mais individualista, pense somente nele. 
DEFINIÇÃO: “SÍNDROME DA ADOLESCÊNCIA NORMAL”
São características que estarão presentes frequentemente, vezes com maior vezes com menor intensidade, nos pacientes adolescentes. 
Adolescência ⇒ busca de si mesmo pela identidade adulta 
· Processo de autoconhecimento → “Quem sou eu?
· Essa construção de identidade pode refletir na aparência física
Características:
· Tendência e necessidade grupal 
· Necessidade de fantasiar com o futuro imaginário e a saída do presente 
· Questionamento das religiões e da religiosidade
· Deslocamento temporal
· Evolução sexual desde o auto-erotismo até a sexualidade genital
· Atitude social reivindicatória, agressividade e violência
· Contradições sucessivas em todas as manifestações de conduta 
· Separação progressiva ou brusca dos pais
· Constantes flutuações de humor e do estado de ânimo, com base depressiva
Tendência e necessidade grupal:
· O adolescente desloca o sentimento de dependência dos pais para o grupo de companheiros e amigos. 
· Neste momento, pertence mais ao grupo de companheiros/amigos do que aos pais e à família. 
· Começa a verdadeira socialização num caminho que leva ao sentimento de individualidade. 
· Portanto: saber quem são os amigos, quais as características e hábitos do grupo é importante, visto que o comportamento do grupo é determinante para o comportamento do adolescente.
· A grande preocupação hoje em dia é a substituição dos grupos pelas redes sociais. 
Necessidade de fantasiar com o futuro imaginário e a saída do presente:
· Mecanismos de defesa diante do que acontece em seu corpo (frequentemente vivenciando como algo que acontece e a que se “assiste” passivamente).
· É um tipo de fuga para o interior, espécie de reajuste emocional que leva à preocupação com princípios éticos, filosóficos, sociais e políticos.
· Teorização e imaginação de grandes reformas que poderiam acontecer no mundo exterior. 
Questionamento das religiões e da religiosidade:
· Crises religiosas que se manifestam por atitudes de ateísmo ou de misticismo, ambas geralmente como situações extremas e até cheias de fanatismo.
· O indivíduo e o grupo de adolescentes acompanham, aliam-se ou questionam essas seitas ou grupos fanáticos religiosos.
· O importante aqui é questionar os hábitos dos pais, se eles são religiosos o adolescente torna-se ateu e, da mesma forma, se são ateus o adolescente torna-se um fanático religioso. 
· Esse questionamento é com qualquer autoridade, não somente com a religião. 
Deslocação temporal:
· Existe certa desorientação temporal em que as urgências são enormes, e as postergações irracionais.
· Tudo pode chegar a ser “agora ou nunca” ou um permanente “ainda temos tempo”.
Evolução sexual desde o auto-erotismo até a sexualidade genital:
· Evolução da masturbação à aprendizagem: jogos eróticos, bailes, esportes, carinhos, todos com conteúdo exploratório de si mesmo e do outro
· Procura de uma parceria: momento dos contatos, carícias mais íntimas e/ou do “amor apaixonado” geralmente transitório e até fugaz.
Atitude social reivindicatória, agressividade e violência:
· Contradição entre as possibilidades materiais do ser humano, que praticamente tudo pode (ou poderia) e o adolescente, que diante desse “tudo” é marginalizado
· O jovem contesta e reivindica um mundo, uma sociedade, uma humanidade melhor, mais justa e mais cheia de amor. 
· Essa característicaé muito presente e serve inclusive para avaliação de risco de vida, porque são questionadores, são reivindicadores, e isso pode colocá-los em risco a depender da situação. 
· É importante, levando em consideração essa característica, não ficar fazendo “braço de ferro” com o adolescente, porque isso estimula esses comportamentos reivindicatórios. 
Contradições sucessivas em todas as manifestações de conduta:
· A conduta do adolescente está dominada pela ação
· O jovem não pode manter uma linha de conduta rígida e permanente
· Sua personalidade é permeável e a instabilidade necessária, ou seja, mudam de ideia constantemente. 
· Lida permanentemente com o imprevisível, tanto no seu mundo externo como no interno
Separação progressiva ou brusca dos pais:
· Para atingir a maturidade, é necessário ter individualidade e independência reais
· O conflito de gerações é uma realidade necessária para o desenvolvimento sadio, tanto dos filhos adolescentes como de seus pais
· Ambivalência dual: 
· Ambas as partes desejam e temem o crescimento, a maturação sexual, todas as responsabilidades e “riscos” decorrentes disso. 
· Tanto os pais quanto os adolescentes possuem sentimentos contraditórios, ambas as partes querem e ao mesmo tempo não querem se separar. 
· Os adolescentes querem ser independentes, mas quando a situação em questão demanda alguma responsabilidade, aceitam/pedem a proteção dos pais. 
Constantes flutuações de humor e do estado de ânimo, com base depressiva:
· A luta do adolescente com os pais, a sociedade, os preconceitos, o medo, seus triunfos físicos ou sua realização intelectual, uma aprovação, uma rejeição, tudo constante e vertiginosamente alternado no dia- a-dia, explicam sentimentos de solidão e de exaltação
· Essas flutuações aumentam o risco de suicídio. 
· O problema do suicídio na adolescência é muito importante, esse processo de descobrimento é muito instável e muito rápido, então em um momento tudo esta bem e no outro está péssimo. É importante vigiar e ser cuidadoso nessa questão.
PERDAS FUNDAMENTAIS DA ADOLESCÊNCIA
1) Perda do corpo infantil
2) Perda dos pais da infância 
3) Perda da identidade e do papel infantil
Finalizando o caso clínico: não trata-se de um caso de quebra de sigilo, pois embora o relacionamento seja conturbado, não há nenhum perigo iminente. Neste caso, o mais importante é orientar anticoncepção e levantar questionamentos simples sobre a real necessidade de ficar se relacionando com o rapaz só por ter perdido a virgindade com ele (na sua igreja não existem casais separados? essas pessoas não frequentam a igreja normalmente? então, porque aconteceria algo com você se você se separasse dele?)

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