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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA INSTITUTO DE ARTES E DESIGN BACHARELADO INTERDISCIPLINAR EM ARTES E DESIGN Isabella Isis Ribeiro Santos MODA E IDENTIDADE JUIZ DE FORA 2021 INTRODUÇÃO A moda é uma importante manifestação da cultura contemporânea. E como consequência disso, ela afeta a atitude da maioria das pessoas em relação a si mesmas e aos outros. A moda se insere de forma importante no contexto sociocultural da pós-modernidade, já que a liberdade de escolha de ser quem você almeja torna-se uma construção diária. Nesse sentido, a personalidade não se faz apenas de valores e princípios morais, mas ganha a extensão da imagem pública. Em outras palavras, roupas, bolsas, acessórios e até mesmo o comportamento de uma pessoa fazem parte de uma identidade construída e de uma busca pela própria identidade, a construção do “Eu”. As roupas são uma ferramenta de suma importância na construção da identidade, oferecendo uma vasta gama de opções para a expressão de estilos de vida ou identidades subculturais. (CRANE, 2006, p. 337) MODA E MÍDIA A exposição midiática cria efeitos e opera na produção de verdades alteradas.. Se tratando do corpo enquanto acontecimento discursivo espetacularizado, a mídia impõe um corpo magro, jovem e saudável à população, nos convencendo que a imitação de celebridades poderia permitir que a maioria da população entrasse em contato com o discurso produzido pela mesma, tendo a oportunidade de incorporar, à sua maneira, aqueles padrões estéticos à sua realidade social. As mídias especializaram-se cada vez mais em construir mundos perfeitos, possíveis, desejáveis, prováveis, e tantos outros nos quais se espelham os sujeitos e seus destinatários. Todas essas criações estão pautadas em estratégias narrativas, discursivas e mesmo nas de textualização que geram tais efeitos de sentido de construções de mundo, aos quais subjaz, sempre, a de ilusão de que determinado produto, publicizado pelas mídias, é absolutamente necessário, desejável, querido, fundamental, imprescindível para seus possíveis consumidores. (CASTILHO; MARTINS, 2005, p.22) A exigência da perfeição física já era um cenário que massacrava mulheres (em sua maioria) e servia como justificativa para que as mesmas não aceitassem nenhum tipo de imperfeição física, e que se possível se submetessem a uma cirurgia plástica para corrigir alguma parte do corpo. A mídia adquiriu um imenso poder de influência sobre os indivíduos atribuindo à aparência uma dimensão essencial na sociedade do espetáculo. Para muitos especialistas da saúde, a mídia é uma vilã. Entretanto, em algumas ocasiões, ela é responsável pela exposição para toda a sociedade de problemas que dificultam uma vida saudável Em nossa cultura, acostumada a rotular os indivíduos conforme sua aparência, não é suficiente combater o sobrepeso, é preciso também ter corpo firme, musculoso e definido (Lipovetsky, 2000). Gordura, flacidez, estrias e celulite são consideradas resultados de falta de disciplina, preguiça e desleixo com o próprio corpo, quase um defeito moral. MODA E IDENTIDADE A participação da Moda no processo de construção das identidades sociais dependeria não apenas do acesso ao discurso especializado ou daquilo que é veiculado na mídia. Os indivíduos formariam e compartilham os padrões estéticos criados pelos especialistas e a partir dessas informações estabeleceram relações de pertença (ou não pertença) a grupos que contribuíram positivamente para aspectos de suas identidades. A moda não se restringe ao vestuário. Ela é uma forma de manifestar e fortalecer nossas identidades. O ato de se vestir envolve autoestima e empoderamento. A identidade torna-se uma celebração móvel: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. (HALL, 2006, p.13) A identidade diz respeito à representação que o indivíduo faz de si, como a que o outro faz dele. Consiste no processo em que os indivíduos reconhecem as especificidades de uma pessoa, os elementos distintivos traduzidos em elementos físicos, corporais, emocionais, intelectuais, tribais e comunitários. Segundo Stuart Hall (2006) há três concepções de identidade: o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. O primeiro se refere à ideia de um indivíduo cuja identidade se mostra como essência do eu, permanecendo o mesmo desde o nascimento ao fim da vida, reforçada pela Reforma e pelo Protestantismo, pelo Humanismo Renascentista, que trouxe o antropocentrismo, as revoluções científicas e o Iluminismo, que colocaram o sujeito como ser racional, pensante e científico. Representa a noção de um indivíduo unificado e centrado. O sujeito sociológico, por sua vez, era formado pela sua relação com a sociedade, com outras pessoas, apresentando uma concepção menos individualista que a primeira. O sujeito não deixa de ter um “eu” na sua essência interior, mas este eu é construído por meio da sua relação com a sociedade, entre o interior e o exterior, o mundo público e o privado. Contudo, isto vem modificando e o sujeito está se tornando fragmentado, formado por várias identidades, que podem ser contraditórias. A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés, à medida que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente (HALL, 2006, p.13). Este é o sujeito pós-moderno, influenciado pelo surgimento do Modernismo, pelos pensamentos de Karl Marx que, ao tratar das relações, a exploração de força de trabalho e os seus modos de produção, ofereceu uma visão de sujeito não mais centrada nele mesmo. Os significados não são fixos, mas oriundos das relações de similaridade e diferença entre as palavras. Eles não possuem uma identidade fixa e permanente. MODA PLUS SIZE Ao longo das últimas décadas, a pressão pelo corpo ideal vem sendo fortemente alimentada pela sociedade de consumo. Por outro lado, é visível que algo vem mudando no que diz respeito às pessoas acima do peso, especialmente no mundo da moda. Estimulado principalmente pelo crescimento econômico, o mercado passou por uma reformulação que incluiu até a criação de um novo termo: plus size. O nome refere-se, mais do que ao manequim maior, refere-se a uma nova atitude. Ser uma mulher plus size não é apenas estar acima do peso, mas apresentar vaidade, sensualidade, alegria e orgulho de suas próprias formas. O cinema, a televisão e, sobretudo, a internet e os blogs de temática plus size têm sido os principais meios de veiculação dessa mensagem que reforça a autoestima da pessoa que está “acima do peso”. A forma e o peso do corpo são controlados socialmente, e na cultura contemporânea o fenômeno complexo da obesidade apresenta-se como um desafio a ser compreendido pelas ciências sociais tanto pelo estigma atribuído aos portadores dos corpos gordos quanto pela ideia de combate à obesidade apresentada como epidemia. A obesidade torna-se então uma questão de política pública ao mesmo tempo em que a bandeira da saúde é vista como empreendimento individual. Os corpos gordos alavancam mercados, tanto da indústria do emagrecimento quanto do consumo plus size. A partir do final da década de 2000, a mídia começou a veicular abordagens mais brandas em relação a esse grupo. Então a indústria e diversos setores da economia passaram a utilizar o movimento body positive como um segmento de grande potencial no mercado consumidor. Embora estejamos presenciando uma onda plus size na Internet que influencia fortemente o campo da moda, é preciso lembrar que as pessoas acima do peso sempre tiveram dificuldades em consumir roupas estilizadas pela escassez de oferta. Neste cenário, a busca por peças de tamanhos maiores significava frequentar lojas especializadas, o que acabava por estigmatizar tal consumidor. Nesse sentido, consumirmoda tamanho grande tornava-se uma fonte de angústia, de infelicidade, de tempo perdido e de exposição social de sua frustração com o peso, uma vez que, a percepção social acabava por julgar o corpo gordo como resultado da falta de cuidado, indisciplina, fruto da letargia e que está excluído dos padrões de beleza, ou seja, um não-corpo que foge das prescrições normativas do que seja um corpo saudável e normal. (MARCELJA, 2015) Marcelja (2015) traz que, frente ao desinteresse de marcas em produzir tamanhos maiores, há uma inversão de valores na relação peso-consumo, pois as roupas deveriam se adaptar aos corpos que existem, e não o contrário. A moda é usada como instrumento para provocar sentimento de vergonha e sofrimento nas pessoas gordas. A moda plus size não tem o objetivo de disfarçar o excesso de peso, mas de valorizar partes do corpo. De tirar do cliente aquela sensação de que nunca encontrará nada do seu tamanho ou ainda que, se encontrar, não será uma peça bonita. A liberdade de assumir sua identidade, seu estilo, seus princípios, seu corpo, sua imagem e suas particularidades mais autênticas se tornam cada vez mais necessárias e é aí que a moda entra como uma forma de expressão, de autocuidado. CONSIDERAÇÕES FINAIS As mídias representam papel central no processo de legitimação de gostos e referências estéticas na contemporaneidade. Cuidar de si na pós-modernidade significa cuidar do corpo, a partir de regras de conduta e de princípios impostos como verdades e prescrições, através da exposição incessante de imagem de corpos belos. Compreendendo o corpo como uma construção histórica e cultural, sobre a qual se articulam diferentes discursos e saberes. No imediatismo de uma sociedade que cultua a beleza e que se rende aos fenômenos midiáticos, aumenta, cada vez mais, a necessidade de os indivíduos se exporem em conformidade com os padrões de uma beleza perfeita. O excesso de exposição de belas modelos, tornando-as celebridades, ditou um novo padrão de beleza para as mulheres. O mito da beleza (Wolf, 1992) nunca foi tão explorado antes como nos dias atuais. Segundo Wolf (1992), a ditadura da beleza ainda tem o poder de controlar as mulheres e desviá-las de questões sociais importantes. Muitas mulheres não acreditam que são lindas até conquistarem a aprovação oficial de um cirurgião plástico. Há uma disciplinarização da mulher no sentido foucaultiano, vigiando e punindo, para conquistar a beleza ideal. A identidade visual de cada um depende não só da moda, mas também variam de acordo com a personalidade, o humor, o clima, a ocasião e tantos outros critérios, que são hierarquizados pelo próprio indivíduo. Cada critério tem suas especificidades e sua importância. REFERÊNCIAS BRASIL, Mondaine. Moda e Identidade: somos o que vestimos?. YouTube, 18 dez. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3op2hHC. Acesso em: 5 dez. 2021 BREMBATTI, Katia; TAKETANI, Yasmin. Moda e Identidade. Disponível em: https://bit.ly/3Ekw9uc. Acesso em: 28 nov. 2021. BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003. CASTILHO, Kathia; MARTINS, Marcelo. Discursos da moda, semiótica, design e corpo. São Paulo, Editora Anhembi Morumbi, 2005. COELHO, Cláudio Novaes Pinto. Mídia e poder na sociedade do espetáculo. Revista Cult. Disponível em: https://bit.ly/3pqo018. Acesso em: 4 dez. 2021. CRANE, Diana. A moda e seu papel social: Classe, Gênero e Identidade das Roupas. São Paulo, Senac São Paulo, 2006. FILHO, Manoel Dantas Macedo. A moda Plus Size e a valorização da mulher. 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