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GESTÃO DA TECNOLOGIA E INFORMAÇÃO EM LOGÍSTICA Roberto Amaral Schinoff Técnicas de custeio ABC Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever o funcionamento do método de custeio ABC. Apresentar os cálculos de custeio. Identificar as estratégias de custeio. Introdução No início dos anos 1980, dois professores norte-americanos da Uni- versidade de Harvard, Robert Kaplan e Robin Norton, apresentaram o método de custeio baseado em atividade (activity based costing), ou método ABC, cuja principal característica é tratar o custeio com base nas atividades que a empresa efetua no processo de fabricação do produto. Cabe salientar que, nesse método, não é levado em consi- deração o fator tempo, que é abordado em outro método, chamado custeio baseado em atividades e tempo (TDABC, do inglês time-driven activity based costing). O custeio ABC procura reduzir sensivelmente as distorções provocadas pelo rateio arbitrário dos custos indiretos e está ligado diretamente à base de atividades, tendo como principal objetivo a alocação dos custos em seus respectivos locais. Esse método simplifica o processo de custeio e permite que a alocação dos custos dos recursos seja feita por meio dos objetos de custos, sejam eles voltados a pedidos, produtos ou clientes. O método ABC é recomendado não só, mas principalmente, para organi- zações que estão inseridas em um ambiente competitivo, com aumento dos custos e de despesas, sejam elas indiretas ou de diversificação de produtos e/ou serviços. Assim, neste capítulo, você vai estudar aspectos inerentes ao funciona- mento do custeio por meio do método ABC, verificando seus respectivos cálculos e identificando as estratégias de custeio. Funcionamento do método de custeio ABC O método ABC teve origem nos Estados Unidos, em 1984, com o objetivo básico de fornecer uma visão de custos mais voltada às necessidades geren- ciais. A sua implementação pode ser trabalhosa, em função da necessidade de mapeamento das atividades e de levantamento de dados, mas o seu funcionamento é relativamente simples. O sistema ABC (Figura 1), na sua primeira etapa, aloca os custos dos recursos às atividades e, na segunda etapa, aloca os custos das atividades aos objetos de custos (produtos, clientes, canais, etc.). As vantagens primordiais desse sistema é ter uma visão de processos e estar orientado para as atividades da empresa. Entre outras vantagens do ABC, pode-se destacar: a alocação dos custos indiretos e das despesas indiretas de maneira mais criteriosa, evitando os subsídios cruzados de custo; o controle e o monitoramento voltado para as atividades, permitindo um gerenciamento mais eficiente dos processos da empresa; a flexibilidade para trabalhar com diferentes objetos de custos, permi- tindo mensurar os custos de produtos, serviços, canais de distribuição, clientes, etc. Além das vantagens já mencionadas, o ABC aplicado às atividades lo- gísticas permite a extensão do sistema por toda a cadeia de suprimentos, possibilitando a propagação desses benefícios para todas as empresas que a compõem. Nesse caso, o ABC seria também um facilitador para minimizar o custo total da cadeia de suprimentos, sem exigir a análise dos custos de maneira fragmentada, empresa por empresa. Técnicas de custeio ABC2 Figura 1. Metodologia ABC. Fonte: Adaptada de Lima (1998). Segundo Berto (2004), há vários métodos de custeio utilizados para se atribuir os custos apurados aos objetos de custos, sendo os principais deles: custeio por absorção, custeio variável (ou direto) e ABC. Para Cogan (2002), esses métodos de custeio marcaram suas épocas, criando paradigmas, deno- minados pelo autor de era da Revolução Industrial, era do custeio direto e da análise custo–volume–lucro e era do custeio baseado em atividades, conforme veremos a seguir. Paradigmas de custeio Conforme elabora Cogan (2002), o primeiro paradigma relacionado aos métodos de custeio, apontado pelo autor como era da Revolução Industrial, ocorreu nas primeiras décadas do século XX e se estendeu até os anos 1940. Caracterizou-se pelos custos baseados em padrões voltados para a engenharia. A difi culdade na determinação das despesas indiretas era resolvida por meio de rateios baseados em algum fator volumétrico, como o rateio das despesas indiretas em função de horas de mão de obra direta, conhecido como custeio por absorção, conforme leciona Cogan (2002). 3Técnicas de custeio ABC De acordo com o autor, o segundo paradigma dos métodos de custeio, denominado era do custeio direto e da análise custo-volume-lucro, caracterizou uma fase que se estendeu dos anos 1940 até os anos 1980, introduzindo a distinção entre custos fi xos e variáveis, levando à análise do custo-volume-lucro e ao custeio direto, em contraposição ao custeio por absorção. O terceiro paradigma, denominado pelo autor como era do custeio baseado em atividades, foi implantado no final dos anos 1980 e prosseguiu até os anos 1990. O custeio ABC difere do enfoque do custeio tradicional pela forma como os custos são acumulados. O ABC tem como foco os recursos e as atividades como geradores de custos, enquanto o custeio tradicional focaliza os produtos como geradores de custos, conforme aponta Cogan (2002). No Brasil, o sistema ABC vem sendo aplicado em uma série de empresas, porém, são poucas as aplicações focadas nas atividades logísticas. Para dar andamento ao uso desse sistema na logística, o movimento ECR Brasil criou um subcomitê, do qual participam 18 empresas dos setores da indústria e do varejo, cujos primeiros resultados foram apresentados no Congresso ECR Brasil, realizado em novembro de 2018. Em uma das seções do Congresso, foi apresentado um projeto piloto realizado pelas empresas Sonae/Cândida, Coca-Cola/Panamco-Spal e Copersucar–União. Esse projeto-piloto foi baseado na metodologia ABC e considera o processo desde a saída da linha de produção até a disponibilização dos produtos nas gôndolas dos varejistas. Este pode ser o início de uma conscientização da importância do tema para as empresas logísticas que operam no Brasil. Cálculos de custeio De acordo com Bornia (2010), o cálculo dos custos dos produtos pelo custeio ABC é realizado em quatro etapas: 1. mapeamento das atividades; 2. distribuição dos custos às atividades; Técnicas de custeio ABC4 3. distribuição dos custos das atividades indiretas para as diretas; 4. distribuição dos custos dos produtos. Mapeamento das atividades A primeira etapa do custeio ABC é um dos pontos fundamentais para a im- plantação do sistema. A empresa deve ser modelada em atividades, as quais, encadeadas, formam os processos. Essa visã o de processo, ou visã o horizontal, talvez seja a maior diferenç a entre o ABC e os mé todos tradicionais, pois facilita o apoio a aç õ es de melhoria da empresa. Para que esse apoio seja eficaz, as atividades devem ser mais detalhadas do que o centro de custos. Um centro de custos, que normalmente equi- vale a um departamento da empresa, executa vá rias atividades. O ní vel de detalhamento vai determinar a qualidade do modelo e, consequentemente, a adequabilidade das informações aos objetivos pretendidos. Quanto mais detalhadas forem as atividades, mais facilmente o gerente pode detectar possí veis melhorias, e as estimativas de custos e desperdícios do sistema se tornam mais acuradas. Por outro lado, a implantaç ã o e a manutenç ã o do ABC ficam mais caras. A Figura 1, vista anteriormente, representa a possível divisão de um pro- cesso genérico. O ní vel de detalhamento a ser empregado é uma decisã o im- portante na implantaç ã o do ABC e está intimamente relacionado aos objetivos do sistema. Se o objetivo for meramente o cá lculo dos custos dos produtos, pode-se usar um menor grau de detalhamento, ao passo que, se o objetivo for apoio ao controle operacional e melhoria do processo, é necessá rio detalhar mais as atividades.Distribuição dos custos às atividades, ou distribuição primária O cá lculo dos custos das atividades corresponde à distribuição primária do método dos centros de custos (RKW). O crité rio para essa distribuiç ã o é o mesmo do outro método: a distribuiç ã o dos custos deve representar o consumo dos insumos pelas atividades da melhor maneira possível (Figura 2). 5Técnicas de custeio ABC Figura 2. Detalhamento de um processo para dar início à distribuição de custos. Fonte: Bornia (2010, p. 115). A maioria dos autores usa o termo rastreamento para se referir a essa distribuiç ã o de custos, a fim de ressaltar o respeito ao real consumo dos recur- sos, contrapondo-se ao rateio dos sistemas tradicionais, o qual é considerado uma distribuição sem critério. De forma geral, podemos afirmar que, quanto mais detalhadas forem as atividades, mais difí cil e subjetivo será o cálculo dos custos das mesmas. Distribuição dos custos das atividades indiretas às diretas, ou distribuição secundá ria Uma das diferenç as entre o método ABC e o método RKW é que o ABC procura alocar os custos das atividades aos produtos sem a redistribuição secundária. Os custos de algumas atividades, como o PCP (planejamento e controle da produção) e a administração de materiais, são alocados diretamente aos produtos no ABC, diferentemente do que costuma ocorrer no RKW. De fato, muitos autores simplesmente desconsideram a existê ncia de atividades de Técnicas de custeio ABC6 apoio, como mostrado na Figura 3a. No entanto, sempre vã o existir atividades indiretas, as quais são mais facilmente associadas a outras atividades do que aos produtos. A Figura 3b mostra a alocação dos custos entre as atividades. Figura 3. Alocação dos custos aos produtos. Fonte: Bornia (2010, p. 117). Distribuição dos custos dos produtos/cá lculo dos custos dos produtos Para a distribuiç ã o dos custos das atividades aos produtos, o ABC utiliza o conceito de direcionadores de custos, os quais podem ser defi nidos como aquelas transaç õ es que determinam os custos das atividades, ou seja, sã o as causas principais dos custos das atividades. Com a utilizaç ã o dos direcionadores de custos, o ABC objetiva encontrar os fatores que causam os custos, isto é , 7Técnicas de custeio ABC determinar a origem dos custos de cada atividade para, dessa maneira, distribuí- -los corretamente aos produtos, considerando o consumo das atividades. De forma mais geral, os custos são alocados em objetos de custos, que podem ser produtos, clientes e canais de distribuiç ã o, entre outros. Ainda conforme Bornia (2010), existem custos cujos comportamentos sã o ditados por bases relacionadas apenas com o volume de produç ã o. Nessa categoria, estão inseridos os custos variá veis. Para esses custos, os direcionadores de custos a serem utilizados també m sã o relativos ao ní vel de atividades, como horas de mã o de obra direta, horas–máquina e custo de maté ria-prima. Tais direcionadores de custos, porém, nã o sã o apropriados para determinar o comportamento de alguns custos fixos, que variam a mé dio e longo prazo. No decorrer do tempo, esses custos se adaptam não somente à demanda, mas també m à estrutura de produç ã o. O fator determinante do custo desse tipo de atividade é o nú mero de vezes que é efetuado o serviç o bá sico dessa atividade para a fabricaç ã o dos produtos — quantidade de transações realizadas. Entã o, os direcionadores de custos a serem usados nesses casos são as transaç õ es efetuadas pela atividade em relação aos produtos. Para cada direcionador de custos empregado, podemos calcular um custo unitá rio, divi- dindo o custo total associado com a atividade considerada pelo nú mero de transaç õ es efetuadas. Por exemplo, se os custos associados com o recebimento de materiais forem de $ 1.000,00 e, no perí odo, houver o recebimento de 40 lotes, o custo associado com cada lote é $ 25,00 por lote (1.000/40). Em seguida, o custo é atribuí do aos produtos, a partir da identificaç ã o de quantos lotes estã o relacionados com cada produto. Estratégias de custeio Segundo Corbari (2012), a gestão estratégica de custos se refere à utilização de informações de custos para desenvolver estratégias mercadológicas, a fi m de se obter vantagem competitiva. Métodos de custeio são maneiras de apurar os valores de custos dos bens, mercadorias ou serviços das entidades públicas e privadas. Nesse sentido, Eller (2000) afi rma que os métodos de custeio têm como função determinar o modo de atribuição dos custos aos produtos. Técnicas de custeio ABC8 É clara a diferença entre o método de custeio tradicional e o método ABC. O modelo tradicional vê os custos indiretos como prestação de um serviço à unidade de custo, de onde os custos devem ser debitados. Por outro lado, o método ABC interpreta os custos indiretos como sendo causados pelas atividades (Figura 4). Figura 4. Diferença entre o método de custeio tradicional e o método ABC. Fonte: Adaptada de Corbari (2012). Método tradicional Os custos indiretos são, primeiro, atribuídos a centros de custos de produtos Os custos indiretos são, então, apropriados às unidades de custo usando-se uma taxa de recuperação destes custos Total dos custos indiretos Centro de custos de produto 1 Taxa de recuperação dos custos indiretos do centro de custos 1 Produtos Taxa de recuperação dos custos indiretos do centro de custos 2 Taxa de recuperação dos custos indiretos do centro de custos 3 DCBA Centro de custos de produto 2 Centro de custos de produto 3 Método ABC Os custos indiretos são, primeiro, atribuídos a pools de custos Os custos indiretos são, então, apropriados às unidades de custo usando-se taxas de fatores geradores de custos Total dos custos indiretos Centro de custos de produto 1 Taxa de fatores geradores de custos de atividades 1 Produtos Taxa de fatores geradores de custos de atividades 2 Taxa de fatores geradores de custos de atividades 3 DCBA Centro de custos de produto 2 Centro de custos de produto 3 Taxa de fatores geradores de custos de atividades 4 Centro de custos de produto 4 9Técnicas de custeio ABC No método tradicional, os custos indiretos são rateados entre os centros de custo de produtos, em que cada um destes deve, então, obter uma taxa de recuperação desses custos. No método ABC, os custos indiretos são anali- sados em pools de custos, sendo um para cada atividade geradora de custos, sendo então debitados das unidades produzidas por meio de taxas de fatores geradores de custos de atividades. Um diferencial do sistema de custeio ABC é que a sua utilização, por exigir controles pormenorizados, proporciona o acompanhamento e as correções devidas nos processos internos da empresa, ao mesmo tempo em que possibilita a implantação e/ou o aperfeiçoamento dos controles internos da entidade. O sistema de custeio ABC apresenta diversas vantagens, que devem ser cuidado- samente analisadas pelas empresas, no sentido de se tirar o máximo proveito de suas informações, colocando a entidade em uma posição privilegiada. Ao escolher um sistema de custeio, os analistas de custos devem posicionar- -se em busca de um conjunto de preceitos, coordenados entre si, que atenda à empresa, seja funcional e respeite o princípio da relação custo–benefício. Ou seja, de nada adianta implantar um sistema de custeio muito detalhado, em que as informações geradas não justificam os valores gastos para produzi-las. Embora muitas empresas adotem hoje o método ABC, os seus critérios assinalam que ele consome muito tempo e pode ser custoso. O custo de ajustar o sistema de custeio ABC, assim como os custos para administrá-lo e atualizá-lo, devem ser levados em consideração, uma vez que estes podem ser muito elevados, principalmente em casos que envolvem muitas atividades e de fatores geradores de custos na empresa. BERTO, A. R. Estimação de custos da atividade de importação: estudos de casos em empresas do Estado do Paraná.2004. 265 f. Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2004. BORNIA, A. C. Análise gerencial de custos: aplicação em empresas modernas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010. Técnicas de custeio ABC10 COGAN, S. Custos e preços: formação e análise. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 2002. CORBARI, E. C. Administração estratégica de custos. Curitiba: Iesde, 2012. ELLER, R. Análise crítica do ABC sob a ótica de diferentes visões. Revista Brasileira de Contabilidade, [s. l.], n. 126, p. 79-86, nov./dez. 2000. LIMA, M. Custos logísticos: uma visão gerencial. ILOS, Rio de Janeiro, RJ, 10 dez. 1998. Disponível em: http://www.ilos.com.br/web/custos-logisticos-uma-visao-gerencial/. Acesso em: 25 mar. 19. Leituras recomendadas ASSEF, R. Guia prático de formação de preços: aspectos mercadológicos, tributários e financeiros para pequenas e médias empresas. 3. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2005. YANASE, J. Custos e formação de preços: importante ferramenta para tomada de decisões. São Paulo: Trevisan, 2018. 11Técnicas de custeio ABC