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Maio / 2020 Professor/autor: Dr. Antonio Carlos Barro Projeto Gráfico e Capa: Mauro S. R. Teixeira - Departamento de Marketing e Comunicação Todos os direitos em língua portuguesa reservados por: Rua: Martinho Lutero, 277 - Gleba Palhano - Londrina - PR 86055-670 Tel.: (43) 3371.0200 3Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | SUMÁRIO Desenvolvimento integral da igreja UNIDADE 1 - Plantação de igreja 1.1. O início da igreja protestante no Brasil...............................................04 1.2. Fundamentos para a plantação de igreja...........................................10 1.3. Plantação de novas igrejas.................................................................14 UNIDADE 2 - O crescimento da igreja 2.1. A preocupação com o crescimento....................................................25 2.2. O movimento de crescimento de igreja..............................................28 2.3. Bases bíblicas para o crescimento de igreja.....................................31 2.4. Tipos de crescimento..........................................................................36 2.5. Os responsáveis pelo crescimento da igreja.....................................38 UNIDADE 3 - Crescimento integral e encarnação 3.1. O mistério da igreja..............................................................................45 3.2. As dimensões do crescimento de igreja............................................48 3.3. As qualidades do crescimento da igreja............................................53 3.4. A importância do modelo encarnacional...........................................57 UNIDADE 4 - Desafi os contemporâneos da igreja 4.1. A igreja virtual.......................................................................................67 4.2. A igreja lar........................................................................................73 4.3. A igreja multimundo.............................................................................77 4.4. A igreja emergente...............................................................................80 4.5. A igreja pós-moderna...........................................................................85 Para fazer os exercícios, acesse o A.V.A | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA4 UNIDADE 1 – PLANTAÇÃO DE IGREJA Tem sido dito e já é um dado entender a igreja como sendo um organismo e ao mesmo tempo uma organização. Como organização a igreja, talvez fosse melhor dizer denominação, ela cumpre com os aspectos da legislação do país onde se localiza. Ela funciona como uma organização qualquer da sociedade e cumpre como todas as obrigações legais que lhe são impostas. Tem endereço, funcionários, tem CNPJ, paga pela manutenção do prédio, tem conta em banco, faz balanços etc. Como organismo a igreja, neste caso como corpo de Cristo, nasce, desenvolve, produz resultados e espera-se que não venha a morrer como alguns outros organismos vivos. Para alcançar longevidade a igreja como organismo precisa ser nutrida constantemente, pois pode ocorrer que caso não seja, ela venha mesmo a desaparecer ou tornar inoperante (Ap 3.1). Exercício de Aplicação - 01 Leia o artigo de Alessandra Assad e pense em como traçar alguns paralelos entre os conselhos que ela traz para as empresas e sua possível aplicação na igreja. Quais pontos destacados pela autora você acha que poderiam ser temas de refl exão, estudos bíblicos ou pregações em sua comunidade? a) Perdão, salvação e crescimento; b) Perdão, justifi cação e identidade; c) Identidade, unidade e missão; d) Organização, crescimento e erros; e) Ordem, hierarquia e administração. 5Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Saiba mais A metáfora do “organismo vivo” tem sido largamente empregada para explicar a organização diante de uma perspectiva. Da mesma forma que seres vivos, a organização busca a sobrevivência e, para isso, ela precisa de recursos. As organizações, assim como os seres vivos, buscam a vida, a sobrevivência, a longevidade, e a melhoria contínua. Fonte: Alessandra Assad 05/11/2015. https://administradores. com.br/artigos/empresa-organismo-vivo-para-aprendizado- existencial 1.1. O início da igreja protestante no Brasil De que igreja estamos falando? A implantação da igreja protestante no Brasil, por meio do trabalho missionário, data de meados de 1800. Ofi cialmente entendemos que isso ocorreu com a chegada do missionário Robert Kalley, escocês, vindo acompanhado de sua esposa Sarah Kalley, que aportam no Rio de Janeiro em 1854. O segundo missionário foi Ashbell Green Simonton, norte-americano que chega também na cidade do Rio de Janeiro em 1859. O primeiro da denominação congregacional e o segundo presbiteriano. Ambos estabelecem no Brasil igrejas de suas respectivas denominações. Antes destes dois missionários, temos notícias de alguns colportores que vinham em navios mercantes, especialmente da Inglaterra. Também do trabalho feito entre 1836 a 1840 por um colportor metodista, o jovem pastor Daniel Kidder (1815-1891), que foi nomeado o primeiro representante da Sociedade Bíblica Americana (SBA) no Brasil, realizando nesse período uma ampla distribuição de Bíblias, Novos Testamentos e Evangelhos, nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA6 Glossário Colportagem é a distribuição de publicações, livros e panfl etos religiosos por pessoas chamadas “colportores”. O termo não se refere necessariamente a livros religiosos. Na França, colportor tinha originalmente o sentido de mascate, ou seja, vendedor que transportava suas mercadorias. É importante ainda recordar uma história precedente quase esquecida da igreja brasileira sobre os primeiros protestantes a virem ao Brasil: A tragédia da Guanabara. Saiba mais Sobre essa expedição da chegada dos huguenotes franceses de tradição reformada sugiro a leitura deste artigo introdutório de Judiclay S. Santos. De Genebra para Guanabara em Teologia Brasileira no. 79. Fonte: https://teologiabrasileira.com.br/de-genebra-para-guanabara/ Vale igualmente registrar que antecedendo ao trabalho de Kelley e Simonton tivemos a presença de um ‘protestantismo de imigração’, ainda na primeira metade do século XIX, trazido por trabalhadores imigrantes que se estabeleceram no país. Eram anglicanos, que atuavam especialmente no comércio, e que construíram o primeiro templo protestante em solo brasileiro, em 1819, em Nova Friburgo, RJ. Também Luteranos, que se fi xaram como colônia de agricultores em São Leopoldo, na região sul do Brasil, em 1824. Esse tipo de protestantismo tinha como principais características a preservação do culto em sua língua de origem e ausência de trabalho evangelizador conversionista, ou seja, era voltado exclusivamente ao cuidado pastoral dos imigrantes, visando a preservação étnica de sua identidade e costumes. 7Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Essa igreja estabelecida por missionários teve um começo bastante difícil, tendo em vista que a religião ofi cial do Brasil era o catolicismo romano. Assim, como desenvolver uma igreja se ela precisava de membros e os candidatos a isso estavam dentro de uma igreja ofi cial? Certamente que não era uma tarefa fácil para estes missionários. Nas aulas de História do Cristianismo III, você estudará os pormenores desta implantação. Com o passar dos tempos, outras denominações se estabeleceram no Brasil e este período termina, ao meu modo ver, com a chegada da Igreja Quadrangular em 1951. Em 1955/56 temos o surgimento da primeira igreja nascida em solo brasileiro, com Manoel de Mello e Silva (1929-1990), O Brasil para Cristo. A partir deste momento a igreja brasileira começa um processo de divisões favorecendo o surgimento de centenas de novas denominações e comunidades independentes. Movimento que perdura atualmente. Exercício de Reflexão - 02 A igreja brasileira continua ainda em um processo acelerado de divisões. Refl ita sobre pelo menos dois motivos quena sua opinião levam a estas separações e inícios de novas igrejas. Produza um texto que contenha de 150 a 200 palavras. Reação: São muitas as causas que podem levar às divisões nas igrejas. Podemos citar algumas: • A chegada de um novo pastor ou liderança que possui uma proposta que confl ita com aquilo que está estabelecido ou em andamento na comunidade que ele passa a liderar; • Divergência sobre questões doutrinárias; • Disputas por controle das decisões ou por poder; • Ciúmes, invejas, confl itos de vaidades entre líderes; • Difi culdades de relacionamento e incapacidade para o trabalho em equipe; • Priorização de interesses pessoais em detrimento do coletivo. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA8 Nos dias de hoje é quase impossível estabelecer com precisão quantas denominações há no Brasil. Estima-se em Soube que vc está gravando aulinhas prè éNãomilhares entre grandes e pequenas, conhecidas e desconhecidas, nacionais e regionais. As tendências teológicas e doutrinárias são as mais diversas possíveis e encontrar alvos em comum entre estes grupos não é tarefa fácil. Certamente nunca na história houve tamanha profusão de igrejas como nos dias de hoje. Temos igrejas de todos os tipos, todos os nomes e predileções. Temos igrejas com doutrinas, sem doutrinas, barulhentas, silenciosas, pentecostais e neopentecostais, tradicionais, liberais, ortodoxas, a favor da mulher, contra a mulher, ceia restrita, ceia aberta, favor das curas, contra as curas, rock, rap ou samba, com coral, sem coral, louvor extravagante, sem bateria, somente órgão de tubo, com apóstolos, bispos e bispas, missionários, profetas, com dinheiro e sem dinheiro, terno e gravata, camiseta polo e jeans. A lista é interminável. Para encontrar elementos em comum nestas igrejas precisamos extrapolar o campo da teologia e doutrinas. a) Todas são chamadas ou se chamam de evangélicas. O nome evangélico, nesse caso, não signifi ca muita coisa e não constitui que necessariamente a igreja esteja sendo regida pelos valores e princípios do evangelho conforme anunciado por Jesus. Evangélica aqui quer dizer simplesmente uma coisa: não é Católica Romana. Assim tanto faz se o nome é Universal, Metodista, Batista, Luterana, Reformada ou Assembleiana – está tudo num mesmo espaço – é evangélica. b) Todas são adeptas dos dízimos e ofertas. Um outro elemento comum a todas as igrejas evangélicas é o dízimo. Ele é onipresente. Tanto faz a que denominação pertence a igreja ou mesmo sem pertencer, todas querem o dízimo dos fi éis. Umas são mais fi nas e polidas na hora de pedir: “Se você nos visita, fi que à vontade, pois esse é um compromisso dos membros dessa igreja”. Outras são ousadas: “Não seja tímido, coloque Deus a prova, ele dará a você conforme o tamanho da sua oferta”. “Deus retribui conforme o tamanho da sua fé em ofertar para a causa do evangelho”. c) Todas têm liderança messiânica ou caudilhesca. 9Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Certamente que as chamadas igrejas livres ou independentes não têm nenhum pudor em exercer a liderança tirana sobre o povo que corre em busca de algum paliativo para a vida vazia e sem sentido que estão vivendo. Apelam para os bordões: “Eu tenho o cajado”. “Deus me revelou”. “O Senhor me ungiu”. Por aí a coisa anda. Os históricos são mais refi nados: “A Bíblia diz”. “O presbitério impôs as mãos”. “A assembleia é soberana”. Essa última eu ouvi no primeiro dia de ordenação pastoral e nunca me esqueci mesmo tendo se passado 40 anos. No fi nal é tudo a mesma coisa. É proibido pensar, perguntar ou discordar. Talvez você diga: minha igreja não é assim. Ótimo! Levante as mãos para o céu e agradeça muito, pois é raro mesmo. A pergunta a se fazer é que tipo de igreja queremos plantar? Que tipo de comunidade devemos iniciar em um bairro ou cidade? Para levar uma igreja que é doente e que vai adoecer ainda mais as pessoas, é melhor nem se apresentar para tal tarefa. O papel da igreja é curar, pois foi para isto que Jesus Cristo veio ao mundo: salvar e curar os enfermos da alma e do corpo. Naturalmente que para curar a liderança precisa estar constantemente em processo de cura para não produzir um cristianismo enfermo. Ao fi m e ao cabo são tantas coisas que ninguém mais se lembra para que mesmo é que a igreja foi deixada na terra. Os textos de Mateus 28:18-20, João 20:21, Atos 1:8, vão caindo no vazio e a igreja atual corre sério risco de ser apenas mais uma organização nesta sociedade em caos. Sobre isto falaremos em seguida. Continuando o raciocínio, vou pensar na igreja local de cada um de vocês. Sei que mesmo pertencendo a uma denominação esta tem pouca infl uência na vida das igrejas locais, especialmente das pequenas comunidades. Minha experiência de quase 40 anos trabalhando como pastor de igreja local me mostrou que se há alguém preocupado com a igreja da qual sou membro ou estou pastoreando, sou eu mesmo. Raramente um(a) pastor(a) receberá ajuda da denominação para o desenvolvimento de sua igreja. Raríssimas vezes receberá a visita de um líder “importante” da igreja, quase impossível fazer parte do grupo de elite que dirige a denominação. A realidade para pastores é nua e crua: a tarefa é dele(a) e de mais ninguém. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA10 Exercício de aplicação - 03 Avalie as afi rmações abaixo e indique quais estão em sintonia com a ideia de plantação de igrejas como sinais do Reino de Deus. I - Deus é glorifi cado na construção de templos belos e confortáveis; II - A glória de Deus há de ser vista em toda a terra. Esse é o propósito último do Criador em relação às suas criaturas; III – Não existe nenhum indício de que a Grande Comissão de Mateus 28:18-20 direciona os cristãos ao cumprimento de fazer discípulos de todas as nações; IV - Jesus é o principal modelo de cidadão do Reino e nele o Reino se torna realidade pela prática da justiça, paz, bondade, amor, misericórdia, compaixão, solidariedade, salvação, esperança, etc; V - A igreja está no mundo não para servir-se a si mesma, mas para servir as pessoas que são objetos do amor de Deus. a) As afi rmações I, II e III são as que estão em sintonia; b) As afi rmações I, II e IV são as que estão em sintonia; c) As afi rmações II, III e IV são as que estão em sintonia; d) As afi rmações II, IV e V são as que estão em sintonia; e) As afi rmações III, IV e V são as que estão em sintonia; 1.2. Fundamentos para a plantação de igreja Nossa primeira tarefa é delinear, ainda que não rapidamente, alguns aspectos bíblicos e teológicos sobre a expansão da igreja neste mundo. Este mundo é o único lugar possível que serve de arena para a missão da igreja. Sem este mundo não existe absolutamente necessidade de igreja. Assim, ainda que pareça óbvia esta afi rmação uma grande parte dos cristãos e liderança de igrejas não fazem disso a razão de ser de suas igrejas. É necessário retomar alguns postulados básicos da razão de ser da igreja. a) A razão de ser da igreja é a glória de Deus Infelizmente se tornou um chavão evangélico dizer que todas as coisas 11Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | são para a glória de Deus especialmente quando se quer fazer alguma coisa que poderá gerar controvérsias. Por exemplo: se alguém quer comprar algo que custa muito dinheiro para os cofres da igreja, diz-se que é para a glória de Deus. Se quer instalar ar condicionado, diz-se que temos que ter o melhor para Deus. Não seria mais honesto dizer que está muito quente e por isso quer-se colocar ar condicionado? Deus é glorifi cado não na aquisição de bens, na construção de novos templos ou no acúmulo de dinheiro na conta bancária da igreja. Segundo o apóstolo Paulo, o próprio Deus é o objeto de glorifi cação: “Aquele que se gloria glorie-se no Senhor” (1Co 1:31, 2Co 10:17). O apóstolo João vai na raiz da questão ao colocar tudo de forma bem transparente: “Quem fala de si mesmo busca a sua própria glória; mas o que busca a glória daqueleque o enviou, esse é verdadeiro, e não há nele injustiça” (Jo 7:18). O contrário também é verdade: aquele que busca a sua própria glória é injusto. A glória de Deus está intimamente ligada ao evangelho de Cristo; evangelho este que é o próprio Cristo. Quando as pessoas recebem a mensagem elas se tornam recipientes da glória de Deus revelada em Cristo: “Aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, esperança da glória” (Cl 1:27). O Cristo em nós é o que Deus mais almeja e é como ele é glorifi cado. Essa glória de Deus há de ser vista em toda a terra. Esse é o propósito último do Criador em relação às suas criaturas. É a promessa feita em Habacuque 2:14: “E a terra se encherá do conhecimento da glória do Senhor, como as águas enchem o mar”. Saiba mais A música de Nelson Bomilcar refl ete essa ideia da glória de Deus entre as nações. Vale a pena ouvir, refl etir e orar para que isso se cumpra por meio da igreja: “Declarando sua glória entre as nações” (LP Missões & Adoração III) Fonte: https://youtu.be/SmzkZD7X5xE | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA12 b) A razão de ser da igreja é obedecer aos mandamentos de Jesus. Para que essa glória seja vista e percebida entre as nações é imprescindível retornar o olhar para a Grande Comissão de Mateus 28:18-20. Esse é um momento histórico para o desenvolvimento daquilo que Jesus Cristo começou a fazer, usando a linguagem de Lucas em Atos 1. Toda a sua vida, história, lutas e vitórias estão agora nas mãos de seus seguidores que ouvem dele a ordem de fazer discípulos de todas as etnias do mundo. O evangelho sairia dos limites de Israel e cruzaria fronteiras para sempre. E assim tem sido e assim precisa ser. O cristianismo somente tem e fará sentido se for o cristianismo para o outro. O avanço da fé cristã depende, do ponto de vista humano, da obediência dos cristãos em todas e de todas as épocas. Grande Comissão é o paradigma missionário máximo da igreja. Apresentada em todos os quatro evangelhos e no livro de Atos dos Apóstolos, a ordem de Jesus de expandir a mensagem do evangelho indica não apenas o que a igreja deve fazer, mas também o que ela deve ser. O texto de Mateus 28.19-20 se reveste de importância crucial por ser o relato mais completo da Grande Comissão. Ao mesmo tempo, temos vivido uma época em que a plantação de igrejas tem sido uma boa ênfase de muitas igrejas e denominações evangélicas e um modelo que merece destaque é o de plantação de igrejas por transplante. Tendo isso em vista, uma análise dos dois versículos fi nais de Mateus e a identifi cação das relações existentes entre eles e a prática da plantação de igrejas por transplante se torna digna de estudo. Neste artigo procurar-se-á demonstrar, preliminarmente, que o método de plantação de igrejas através do transplante de membros de uma igreja já estabelecida constitui uma aplicação correta do ‘ide’ da Grande Comissão conforme registrada por Mateus (Keller, 2011). 13Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | c) A razão de ser da igreja é demonstrar ao mundo os sinais do reino de Deus Se a igreja está no mundo para manifestar a glória de Deus e faz isso em obediência a Cristo consequentemente ela será um sinal visível do reino que Deus concretizou na pessoa de seu Filho. Jesus é o cidadão por excelência do reino e nele o reino se torna realidade. Os sinais do reino de Deus estão todos na pessoa de Cristo: justiça, paz, bondade, amor, misericórdia, compaixão, solidariedade, salvação, esperança etc. Os seguintes textos podem ser lidos para melhor compreender os sinais do reino de Deus: Mateus 4:23; 9:35; 10:7-8; 12:28; 16:19. Lucas 9:2, 11; 10:9; 11:20; Joao 2:23; 3:2; 4:48; 6:2. Ler ainda sobre o fruto do Espírito em Gálatas 5:22-23. Estes sinais devem estar presentes também na comunidade do Rei. Isto é mais do que óbvio, mas custa para entendermos isto. De que maneira a igreja instila nas pessoas o desejo de pertencer a este reino? Simplesmente mostrando em sua vida os mesmos sinais que Cristo mostrou enquanto peregrinou por este mundo. Este é um grande desafi o. Segundo C. René Padilla (2017) falta “consciência entre os cristãos de que somos cidadãos do Reino de Deus e do mundo. Estamos no mundo, mas não somos do mundo. O que signifi ca isso? Alguns querem poder porque com poder se pode ter mais dinheiro e se aproveitar das posições para proveito próprio e não para servir”. Naturalmente que sem o serviço não haverá sinais do reino de Deus neste mundo. d) A razão de ser da igreja é transformar o mundo com o evangelho da paz Como consequência do que estamos observando acima, o alvo da missão se torna realidade. O mundo é conquistado para Deus. Com isto estamos afi rmando que a igreja não é o alvo da sua missão. A igreja não é a razão de ser da missão. A igreja está no mundo não para servir-se a si mesma, mas para servir as pessoas que são objetos do amor de Deus. Em Jesus Deus está redimindo todo o cosmos. Falta a nós a dimensão cósmica da redenção, entendimento este que não faltou a Paulo quando disse: “Pois Deus estava em Cristo reconciliando consigo mesmo o mundo, não levando em conta as transgressões dos seres humanos”, e ele ainda enfatiza, “e nos encarregou da mensagem da reconciliação” (2Co 5:19). Em Cristo Deus inicia o processo de reconciliação e transfere | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA14 à igreja a mesma missão. Somos encarregados de zerar o débito deste mundo com o Criador. Todas as esferas da sociedade precisam desta cura divina passando pelo indivíduo e atingindo os setores mais amplos da política, economia, cultura, educação etc. Se queremos plantar novas igrejas este é o desafi o para este tempo que vivemos: Igrejas como sinais do Reino. Igrejas comprometidas com todo o evangelho para todo o ser humano. Qualquer mensagem fragmentada e distante dos ideais bíblicos não tem mais lugar nos dias de hoje. É esta igreja que queremos estabelecer em todos os cantos de nossas cidades e bairros. 1.3. Plantação de novas igrejas Como afi rmei acima a igreja é um organismo vivo e como tal ela precisa ser constantemente plantada e multiplicada. Esse termo “plantar” igreja pode soar um pouco estranho, mas tem sido a nomenclatura usada nas literaturas sobre o tema. Poderíamos usar outros como implantar, estabelecer, iniciar, principiar, começar etc. A ideia é que em algum lugar uma nova igreja terá início e proporcionará aos habitantes daquele lugar um espaço para ouvir o evangelho da salvação em Cristo Jesus. Também assumimos que este processo de plantar uma nova igreja se dará especialmente por uma igreja-mãe que por vezes também chamamos de sede ou central. Todavia, não exclusivamente, pois como veremos uma nova igreja pode surgir por outros meios. 1.3.1. O método tradicional de iniciar novas igrejas Segue uma palavra de testemunho da minha experiência neste campo para ilustrar o primeiro modelo de implantação de novas igrejas. Quando ainda adolescente fui levado pela minha mãe a uma pequena casa de madeira já bem deteriorada. Não havia absolutamente nada naquele espaço que fosse agradável. Morávamos num bairro pobre e assim aquela casa refl etia o nosso contexto de vida. Era um trabalho iniciado pela Igreja Presbiteriana de Marília que fi cava no centro da cidade. Todos os domingos para lá se dirigia o Presbítero Fausto Camargo César e ele dirigia uma escola dominical. Foi neste local que ouvimos o 15Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | evangelho pela primeira vez e toda a nossa família se tornou membro daquela igreja. Aquele espaço era carinhosamente conhecido como “igrejinha”. Assim era como as novas igrejas surgiam. A igreja central ou sede escolhia um bairro da cidade e para lá enviava um diácono ou presbítero com alguns poucos crentes para dar início a uma nova igreja. Ainda dentro deste sistema tradicional encontramos o surgimento de igrejas a partirda mobilidade urbana especialmente nas periferias das grandes cidades. O movimento migratório e o empobrecimento das famílias levaram pessoas a procurar moradias em lugares distantes dos centros urbanos. Muitas destas pessoas eram membros de igrejas evangélicas e assim era comum que por estarem distante da cidade elas começassem algum tipo de reunião em seus lares como encontros de oração, estudos bíblicos, cultos de evangelização. Mais tarde, quando o grupo já estava mais sedimentado a igreja sede era avisada sobre aquele ponto de pregação e iniciava-se então um processo de ofi cialização daquela igreja. Este modelo de implantação de igrejas foi o mais prevalente nas igrejas pentecostais, especialmente as mais estruturas como as Assembleias de Deus, O Brasil para Cristo e a Quadrangular. As igrejas históricas tinham mais facilidade em comutar seus membros dos bairros para a igreja central. Talvez isso explique em parte o grande crescimento das igrejas pentecostais nos grandes centros urbanos. Podemos ainda destacar uma terceira maneira como as igrejas começavam nos bairros. Era muito comum nas igrejas do interior que durante a semana houvesse cultos nos lares. Alguma família oferecia a sua casa para que numa noite da semana um grupo da igreja acompanhado do pastor fi zesse um pequeno culto com suas bíblias e hinários. Os hospedeiros convidavam seus vizinhos, parentes e amigos. Cantavam os hinos a capela mesmo, faziam orações e ouviam uma pregação evangelística, geralmente acompanhada de um apelo para aceitar a salvação em Cristo. Se houvesse naquele bairro um número razoável de convertidos, começava-se a pensar num espaço específi co, que não as casas, que eventualmente se tornaria uma igreja. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA16 É possível que em alguns lugares do Brasil ainda se use algumas destas metodologias e outras similares, todavia, os tempos são outros e vivemos num contexto muito diferente da sociedade dos anos 60 e 70. 1.3.2. Plantando igrejas nos dias de hoje Se pensarmos que alguns dos métodos antigos não funcionam mais com tanta efi cácia, então teríamos que buscar novas maneiras de iniciar igrejas. Com isto nos ocupamos agora. A primeira indagação seria a mais básica possível: as igrejas estabelecidas desejam iniciar novas igrejas? Aparentemente a resposta deveria ser sim, mas não é algo tão simples para ser resolvido. O modus operandi das igrejas de hoje é bem diferente daqueles dos anos 60 e 70. Mencionei acima os cultos que se faziam nos lares. Poderíamos dizer que foram os precursores do movimento celular que se espalhou por quase toda as igrejas do Brasil. Mas, não a mesma coisa. Os cultos nos lares tinham o objetivo de evangelizar e eventualmente estabelecer novas igrejas. As células de hoje, talvez com raras exceções, não têm esse objetivo. Você poderá observar que as grandes igrejas mantêm quatro ou cinco e até mais células em um determinado bairro que não se transformam em igrejas. As razões são muitas e aqui não é o espaço para discutir essa questão. O meu ponto é que as igrejas centrais, neste caso, as que tem mais recursos deixaram de plantar novas igrejas. É um fato comprovável bastando estudar ou pesquisar quantas novas igrejas surgiram na última década como estratégia pensada e executada. a) O contexto da nova igreja Diferentemente do passado quando as igrejas surgiam sem muito planejamento (na maioria das vezes), hoje temos ferramentas que nos ajudam a identifi car as cidades e bairros que precisam de novas comunidades. Muitas pesquisas já foram realizadas para detectar em quais bairros se tem mais necessidade de igrejas. Assim, é importante ter acesso a elas para determinar de forma estratégica a implantação de novas comunidades. Mas, caso não exista esta pesquisa, também não é 17Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | complicado para quem mora e conhece a sua cidade fazer uma análise de quais setores da mesma são mais carentes de igrejas. Uma ideia é visitar a prefeitura da cidade e ver se ela tem esse mapeamento. Estando na prefeitura é importante descobrir quais são os novos loteamentos aprovados para o crescimento da cidade. Com estes dados é imprescindível visitar o local várias vezes e em diversos horários para observar atentamente qual é a dinâmica daquela localidade. Notar a movimentação nas ruas, no comércio, nas escolas. Qual a situação socioeconômica, qual o perfi l cultural, educacional. Se há jovens ou se a população está envelhecida. Não é difícil “ler” o bairro para determinar que tipo de igreja vamos implantar e qual a abordagem apropriada. Falaremos mais sobre o contexto nos próximos capítulos. Exercício de fi xação - 04 Com base na argumentação sobre a importância de se conhecer o contexto onde se pretende plantar uma igreja, qual das opções abaixo representa um objetivo para esse tipo de abordagem? a) O objetivo de se conhecer o contexto antes da plantação de uma igreja é poder enviar apenas pastores que tenham o mesmo perfi l das pessoas que ali habitam; b) O objetivo de se conhecer o contexto antes da plantação de uma igreja é poder transformá-lo de acordo com o planejamento que as prefeituras fornecem sobre a localidade; c) O objetivo de se conhecer o contexto antes da plantação de uma igreja é poder decidir se ela deve ou não ser plantada por causa de diferenças entre o perfi l das pessoas da localidade e da igreja plantadora; d) O objetivo de se conhecer o contexto antes da plantação de uma igreja é poder planejar o tipo de linguagem, atividades e ações que atendam aquela população específi ca; e) Não é importante conhecermos o contexto de onde se pretende plantar uma igreja, uma vez que todas as igrejas são iguais desde os tempos apostólicos | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA18 b) Avaliar os recursos disponíveis Se no tópico acima olhamos para fora, para as necessidades que o bairro ou cidade apresentam para determinar o curso de ação temos agora que olhar para dentro da nossa comunidade. É preciso fazer um levantamento dos recursos que precisaremos para dar início a esta nova igreja. E que recursos são esses? Recursos humanos. Quantas pessoas serão necessárias e que vão se comprometer com este trabalho pioneiro. É importante que a liderança deixe claro o que será realizado, o que se espera de cada voluntário e por quanto tempo. Preciso observar que é muito importante determinar por quanto tempo se espera deste trabalho voluntário. Se não for explicitado corre-se o risco de não encontrar pessoas dispostas a este ministério que envolve bastante sacrifício e dedicação. Deve-se listar todas as pessoas e catalogar as habilidades que possuem. Talvez nem todas sejam necessárias no início do trabalho. Algumas podem contribuir durante um período da implantação da igreja. É bom atentar para a advertência de Ed Stetzer: [...] cuidado para não pôr simplesmente qualquer um para ‘tapar buraco’ numa função que você precisa preencher – um erro comum que observo nos plantadores de igreja. Não apresse o processo de identifi cação da pessoa certa para a função certa, ou você possivelmente acabará na situação incômoda de ter de tirar alguém da equipe. Isso, além do tempo e da energia perdidos, gera problemas de credibilidade e confi ança junto aos colaboradores remunerados e à igreja como um todo (2015, p. 142). ii. Recursos fi nanceiros. Que tipo de trabalho será realizado no início da comunidade? Uma reunião de oração nos lares dos crentes daquele bairro? Um culto semanal nos lares? Um missionário será contratado para liderar este ministério? Um dos pastores da igreja será designado para esta tarefa? Que material será necessário comprar, tais como literatura, bíblias, livros infantis? 19Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | A igreja deve votar verbas fi nanceiras para esse projeto pois isso evitará o desgaste entre as pessoas envolvidas e a direção da igreja. iii. Recursos diversos. Em qual etapado projeto será alugado um espaço para o funcionamento da igreja? Mobiliário necessário, matéria de berçário, instrumentos musicais, equipamento de som etc. Será bom que tudo isso esteja na mente da liderança. c) As estratégias utilizadas para a plantação da igreja Tendo defi nido o local e os recursos necessários é chegado o momento de reunir as pessoas interessadas para planejar quando e como dar início a execução do projeto. Quais estratégias serão usadas? Uma primeira ação seria descobrir se há membros da igreja morando naquele bairro e se estas pessoas estão dispostas a se envolver neste novo trabalho. Isto pressupondo que a liderança geral da igreja esteja de acordo. Estes membros nem sempre estão animados com esta ideia porque vão deixar um lugar em que tudo funciona para frequentar uma comunidade em que está tudo por fazer. Nem todas as pessoas estão dispostas a fazer este sacrifício e isto é perfeitamente compreensível. Se a igreja está funcionando dentro do movimento em células seria também interessante verifi car com a liderança se estas células podem se reunir para formar esta nova comunidade. Normalmente as lideranças das grandes igrejas não gostam desse tipo de estratégia porque certamente esvaziará um pouco os trabalhos da sede e diminuirá a contribuição fi nanceira. Portanto, espera-se alguma resistência sobre estas duas ações descritas acima. Como no bairro ainda não há estruturas para funcionar uma igreja em todos os aspectos necessários, pode-se iniciar em uma escola ou qualquer pequeno lugar que seja disponibilizado. Um salão social de um prédio residencial. Um galpão de alguma empresa. Nestas horas é necessário andar pelo bairro e pesquisar bem o local. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA20 Exercício de Fixação - 05 Ao pensarmos em plantar uma igreja e colocar em prática esse projeto, listamos algumas questões que precisamos levar em consideração. Abaixo, são indicadas três ações estratégicas, porém, uma delas não confi gura algo a ser seguido. Indique qual opção não deve fazer parte de um possível projeto de plantação de igreja. a) Precisamos estar preparados para o caso da nossa igreja ou comunidade se ressentir ao iniciar um trabalho de plantar uma nova igreja, pois certamente esvaziará um pouco os trabalhos da sede e diminuirá a contribuição fi nanceira, sendo que seus membros nem sempre estão animados com esta ideia, porque vão deixar um lugar em que tudo funciona para enfrentar difi culdades iniciais de uma nova igreja; b) Precisamos nos concentrar em tantos problemas que não devemos perder tempo fazendo um levantamento de recursos humanos, assim como a elaboração de um plano fi nanceiro. Tais atitudes são desnecessárias. Podemos simplesmente repetir as experiências e modelos passados, pois Deus é o mesmo e sustentará os nossos projetos; c) Ao iniciar um trabalho evangelístico num bairro, por exemplo, é preciso demonstrar interesse pelas pessoas de maneira integral, por todo tipo de problema que apresentarem e não somente com a salvação de suas “almas”. Passo a descrever algumas estratégias. Lembre-se que cada contexto ajuda a defi nir o que é mais apropriado para o bairro e para a igreja ou grupo que vai trabalhar no projeto. i. Fazer um levantamento do perfi l do bairro A idade do bairro já ajuda a determinar muito desse perfi l. É um loteamento novo e, portanto, distante do centro da cidade? É um bairro antigo? Se o loteamento é novo é mais provável que haja famílias em formação, casais 21Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | e casais com crianças pequenas. Renda fi nanceira ainda em construção. Num bairro antigo é provável encontrar uma boa população de pessoas com idade avançada, casais já sem os fi lhos em casa. Pessoas com renda fi nanceira estável. Existem vários modelos de pesquisas socioeconômica para fazer um levantamento com detalhes que poderão auxiliar nas estratégias da formação da nova igreja. Saiba mais Neste link você encontrará um modelo de questionário socioeconômico. Ele é bem completo. Você poderá modifi car para inserir as perguntas de cunho religioso ou outras que julgar importante. http://download.inep.gov.br/educacao_basica/encceja/ questionario_socioeconomico/2013/questionario_ socioeconomico_encceja_2013.pdf Uma ideia é usar os jovens da igreja para fazer este levantamento. Talvez em um sábado você possa reunir os voluntários e explicar o que será feito e dar instruções de como fazer a pesquisa. Uma boa coisa a fazer é que todos usem uma camiseta igual e que tenha algum tipo de identifi cação da igreja e nome do pesquisador. É uma atividade que vai dar trabalho, mas as informações colhidas serão extremamente úteis para o projeto a ser desenvolvido. ii. Encontrar os “desigrejados” Em todo bairro novo ou velho há dezenas de pessoas que já frequentaram alguma igreja evangélica. A razão pela qual deixaram de frequentar é quase impossível enumerar. Pode ter sido a mudança de residência para um local afastado, falta de dinheiro para locomoção, desavenças | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA22 com a antiga comunidade, falta de interesse de membros da família, necessidades não preenchidas etc. Esta informação pode ser um item no levantamento acima descrito. Não é difícil encontrar essas pessoas. Na verdade, assim que encontrar a primeira família dentro deste perfi l, ela irá apontar outras pessoas no bairro nas mesmas circunstâncias. Assim, pode-se começar visitando estas pessoas, orar com elas e informar a respeito da nova igreja no bairro. A possibilidade de ter essas pessoas envolvidos é bem grande. Naturalmente que é necessário ouvir estas pessoas atentamente, pois muitas estão feridas e magoadas com líderes e igrejas de onde vieram. Um processo de cura é fundamental para que a nova igreja não seja já no seu início um ajuntamento de gente crítica e amarga com a causa do evangelho. Saiba mais Você tem noção de quantas pessoas deixam de frequentar a sua comunidade todos os anos? Estas pessoas que foram embora recebem algum tipo de visita ou mesmo telefone? Em quanto tempo você imagina que estas pessoas serão completamente esquecidas pela comunidade? Indico a leitura do artigo “Os desigrejados” de Karina Passos Marinho em Teologia Brasileira no. 79 (2018), para uma melhor compreensão desse grupo cristão. Fonte: https://teologiabrasileira.com.br/os-desigrejados/ iii. Descobrir as necessidades do bairro Em qualquer lugar onde mora gente haverá todos os tipos de necessidades. Certamente, a igreja ou o grupo de implantadores não poderá suprir todas, pois as demandas são muitas. Mas, certamente que uma ou duas serão possíveis. 23Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | No levamento do perfi l do bairro algumas dessas necessidades serão descobertas. Alto índice de gravidez na adolescência, crianças muito tempo nas ruas, idosos sem atividades físicas, divórcio, violência familiar, desemprego etc. Após esses dados voltarem para a igreja/grupo, como já destacamos acima, pode-se verifi car quais recursos estão disponíveis para ajudar em alguma necessidade. É importante que a igreja chegue no bairro e demonstre que está interessada nas pessoas no seu todo e não somente em suas “almas”. As pessoas precisam ver a igreja como parceira e não somente uma agência religiosa que pouca se interessa por suas histórias. A igreja precisa ouvir antes de falar e não o contrário. Este modelo de igreja que queremos implantar se enquadra em uma nomenclatura que passou a ser conhecida há alguns anos chamada de igreja missional. Uma igreja preocupada em ser missão e não em fazer missão. Ela é herdeira da missio Dei, portanto, tem em Deus a origem do seu ministério sob a direção constante do Espírito Santo que a leva a semear a Semente que produz vida: Jesus Cristo. Para resumir, colocamos aqui uma distinção feita por Ricardo Agreste, sem mais considerações, sobre três modelos de igrejas. O modelo missionalé o que estamos priorizando em nossos estudos. A tabela a seguir apresenta os principais aspectos desses três modelos: Base Eclesiológica Modelo 1 Tradicional Modelo 2 Sociedade de Consumo Modelo 3 Missional Líder Capelão Empresário Mentor, Facilitador Palavra-Chave Manutenção Satisfação Missão Membros Pacientes Clientes Discípulos Papel Do Líder Consolar Impactar Equipar Relação Maior Visitação Culto-Evento Discipulado Sucesso Bem-estar Numérico Maturidade Disciplina Eutanásia Nenhuma Restauração Esta tabela foi adaptada do livro Formação de liderança e crescimento de igreja, de Eder Mello. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA24 Concluindo, nesta unidade apontamos para algumas difi culdades que a igreja enfrenta no desempenho de sua missão na terra. Mas, por outro é sempre importante ter em mente que esta igreja mesmo com todas as suas mazelas e fraquezas é a igreja que Cristo comissionou para pregar o evangelho da graça. Nos ajudaria muito em nossa missão recuperar a teologia da igreja como corpo de Cristo presente neste mundo na dispersão de todos os cristãos por todas as esferas da sociedade. É também importante recuperar o ímpeto missionário e evangelístico que foi marca da igreja brasileira a não muito tempo atrás. Essa motivação deve e precisa passar por nossas lideranças. Uma melhor compreensão dos mandamentos bíblicos e especialmente da ordem emitida por Cristo de pregar o seu evangelho por todos os cantos e a todas as pessoas. Essa compreensão passa também por um entendimento teológico especialmente de duas disciplinas que julgo de capital importância para os dias de hoje: eclesiologia e soteriologia. Acredito que nos dias de hoje e no futuro estas duas áreas vão ser crucias: precisamos de igrejas e Jesus Cristo é de fato o único Salvador da humanidade! Referências bibliográfi cas KELLER, Tim. A Grande Comissão como paradigma para a multiplicação de igrejas por transplante. https://veritatisverbum.wordpress. com/2011/04/15/a-grande-comissao-como-paradigma-para-a- multiplicacao-de-igrejas-por-transplante/. MELLO, Eber. Formação de liderança e crescimento de igreja. (falta a refrência completa PADILLA, C. René. “Somos cidadãos do Reino de Deus e do mundo”. Entrevista em 20/10/2017. http://tearfundbrasil.org/7066-2/. STETZER, Ed. Plantando igrejas missionais. São Paulo: Vida Nova, 2015. 25Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | UNIDADE 2 – O CRESCIMENTO DA IGREJA 2.1. A preocupação com o crescimento Quando conversamos com pastores e pastoras percebemos que a grande maioria tem como objetivo para suas igrejas o crescimento delas. Difi cilmente você encontra líderes de igreja evangélica que não querem crescer. A nossa cultura evangélica exige isso, o crescimento acelerado das igrejas neopentecostais pressiona a todos nessa direção. Os membros de outras igrejas questionam se isso não acontece com as delas e os próprios líderes entram em crise ministerial por falta do crescimento numérico. É correto pensar que uma igreja com mais membros tenha mais possibilidades de oferecer “bons serviços” para seus frequentadores. Uma igreja bem estruturada tem boas acomodações, salas apropriadas para as crianças, berçários adequados, excelente qualidade de som, assentos confortáveis, segurança particular para os carros estacionados nas ruas etc. Além das instalações físicas apropriadas, esta igreja tem um bom e qualifi cado número de voluntários para todos os departamentos. Quem frequenta uma igreja assim não fi ca preocupado com o que vai acontecer, por exemplo, com suas crianças e adolescentes. Sabe também que raramente alguém vai lhe pedir para ir tomar conta do berçário porque não tem ninguém fazendo isso. Mas, não queremos pensar que sejam estas as únicas razões para se buscar o crescimento de uma igreja, a fi m de oferecer “bons serviços” aos seus membros. Nesta unidade vamos estudar alguns aspectos que levam as igrejas a este crescimento e quais são as motivações bíblicas e coerentes com os princípios do reino de Deus estabelecidos nas páginas do Novo Testamento. Por que uma igreja declina? Vamos começar com esta pergunta. Quando leciono sobre Ministério Pastoral, costumo dizer que é mais fácil fazer uma igreja declinar do que crescer. Há um ditado nosso que diz: “para baixo todo santo ajuda”. Para declinar não precisa fazer muita coisa. Basta não fazer nada, não cumprir com algumas exigências do ministério, não se importar com o estado das ovelhas, e logo a igreja começa a murchar. A realidade é dura e a verdade é que as igrejas, em geral, não estão | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA26 crescendo, mas sim estagnadas ou em declínio. Há igrejas que estão do mesmo tamanho há décadas. Assim sendo, é bem provável que a maioria dos pastores, antes de ver a igreja crescer, precisa se preocupar em estancar o seu declínio. Ampliando a pergunta sobre o que leva uma igreja a declinar, podemos ainda questionar, o que leva uma igreja a perder o seu sabor? Ou, o que leva uma igreja a não cumprir com o seu propósito na missão de Deus? Thom S. Reiner, um estudioso de igrejas, aponta que o principal fator de declínio de uma comunidade é o seu foco para dentro das quatro paredes do templo, para tudo o que faz voltando os seus recursos apenas para o bem-estar da comunidade. Esse fato é corroborado com a afi rmação de um estudo que o autor realizou sobre igrejas que deixaram de existir. Em todas as igrejas que realizamos autópsia, um padrão fi nanceiro foi desenvolvido no decorrer do tempo. O padrão foi o lugar em que os recursos fi nanceiros foram usados para manter a máquina da igreja movendo; manter os membros felizes, e não para fi nanciar a grande comissão e a o grande mandamento. O dinheiro, no entanto, era sintomático de um problema do coração. A igreja se preocupava mais com suas necessidades do que com a comunidade e o mundo. E, nenhuma igreja pode sustentar um foco para dentro indefi nidamente. Ela eventualmente morrerá por falha no coração. (citação encontrada em https://infopastor.com.br/site/2-fatores- que-levam-uma-igreja-ao-declinio/) Percebemos então que quanto mais o pastor se voltar para agradar os frequentadores da igreja, mais rapidamente ele a leva à catástrofe. Outro fator que leva uma igreja ao declínio está intimamente ligado ao que foi descrito por Spurgeon, isto é, a falta de conteúdo nas pregações. A imensa maioria dos pregadores não se prepara para esta tarefa vital que é de pregar a palavra de Deus. Muitos vão aos púlpitos todos os 27Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | domingos com um alimento espiritual de pouca qualidade para entregar aos seus ouvintes. É importante mencionar que não é somente falta de teologia bíblica, mas também o desprezo por toda a teologia em geral. Vivemos em uma época de acomodação. Acomodamos todas as coisas para não molestarmos a ninguém com a nossa fé e assim nos adaptamos para experimentarmos este novo mundo onde a tônica é a pluralidade religiosa. Consequentemente a mensagem segue na mesma direção, ela se torna superfi cial. Assim, o púlpito fraco colabora imensamente para o declínio da igreja. Aliás, estudos apontam que a maioria das pessoas que retorna a uma igreja, o faz em virtude da pregação profunda das Escrituras. Uma igreja declina, então, por ser ensimesmada, por tornar-se o seu próprio alvo. Glossário Ensimesmar: Concentrar-se ou estar completamente absorvido pelos próprios pensamentos; voltar-se para o interior de si mesmo. É sinônimo de: concentrar, meditar, recolher, absorver. Tornou-se assim também por falta da pregação sólida sobre todo o conselho de Deus conforme o exemplo de Paulo: “Porque nunca deixei de vos anunciar todo o conselho de Deus” (At 20:27) e, esqueceu-se da instrução de Cristo: “‘Ensinai-os a observar todas as coisas que vos ordenei” (Mt 28:18-20). Exercício de fi xação - 06 De acordo com o texto, quais os principais fatores que levam uma igreja a morrer? a) Entretenimento,falta de conteúdo na pregação e focar apenas em questões internas. b) Falta de criatividade por parte da liderança. c) Músicos com pouco técnica e repertório desatualizado. d) Pregações doutrinarias ou teológicamente maçantes. e) Líderes que não sentem compaixão de suas ovelhas. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA28 2.2. Movimento de Crescimento de Igreja O Movimento de Crescimento de Igreja (Church Gowth Movement) popularizou-se no Brasil a partir das publicações C. Peter Wagner. Para uns ele é o mestre a ser reverenciado e seus escritos sobre como a igreja deve crescer fazem ou fi zeram bastante sucesso entre pastores e lideranças. Para os críticos do movimento, Wagner não sabe o que fala e os seus postulados são destituídos de bases bíblicas e teológicas. Creio que a conclusão não deveria ser uma coisa e nem outra. Peter Wagner tem várias contribuições importantes sobre como a igreja deve crescer. Muitas das suas estratégicas são derivadas de pesquisas, do apoio das ciências sociais e naturalmente da Palavra de Deus. Ele é um autor extremamente estudioso das questões que atrapalham e/ou ajudam no crescimento da igreja. É verdade também que Wagner muitas vezes usa os textos bíblicos fora de seus contextos tão somente para fundamentar algumas de suas pressuposições, e por isso ele tem sido muito criticado. O movimento de crescimento de igreja, conhecido nos Estados Unidos como “The Church Growth School” tem infl uenciado muitos pastores e líderes de todas as partes do mundo. As suas principais formulações foram disseminadas através do Seminário Teológico Fuller em Pasadena, Califórnia. O nosso propósito aqui não é o de fornecer uma história deste movimento, mas pincelar algumas contribuições e discordâncias do mesmo. 2.2.1. Os principais postulados do movimento a. O crescimento da igreja é bíblico – A Bíblia ensina que Deus tem interesse em ver a sua igreja crescendo e este crescimento é sinal de que ela está realizando bem a tarefa de evangelização mundial. b. O princípio dos grupos homogêneos – A igreja cresce mais rapidamente quando os seus membros pertencem a uma mesma classe social ou grupo racial. As pessoas gostam de estar em comunhão com as pessoas do seu mesmo nível, que falam a mesma língua, têm os mesmos 29Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | costumes. Esta teoria foi talvez a que mais recebeu críticas dos teólogos, principalmente os da América Latina. c. A opção pelos campos mais produtivos – Os campos onde a semente do evangelho não está germinando devem ser abandonados em favor dos campos onde as colheitas são mais abundantes. d. A importância do papel do pastor – O pastor é a pessoa chave no crescimento da igreja e ele deve incentivar o seu rebanho nesta direção. Sem a participação efetiva do pastor difi cilmente a igreja crescerá. e. O descobrimento dos dons espirituais – Wagner trabalhou bastante a questão de que cada membro da comunidade deve descobrir o seu dom espiritual e colocá-lo a serviço da igreja para que ela venha a crescer. f. A tarefa evangelizadora – O evangelismo é prioritário sobre todas as outras atividades de igreja. 2.2.2. As principais críticas ao movimento1 a. Este movimento exportou muitas das suas ideias a todas as partes do mundo, mas não levou em consideração os contextos dos povos e igrejas onde ele chegava. Assim, é possível ver líderes em regiões pobres tentando aplicar uma metodologia que era perfeitamente lógica no rico contexto norte-americano, mas que não fazia nenhum sentido fora daquele ambiente, especialmente em lugares da África, Ásia e América Latina. b. Este movimento dá prioridade à questão numérica da igreja em detrimento do crescimento qualitativo. Naturalmente que quando questionados a este respeito, os seus defensores negaram esta crítica, todavia, fi ca nítido nos escritos dos principais proponentes que há uma preocupação maior com o número de pessoas aderindo a uma igreja do que com o estado dessas pessoas e da própria igreja. 1 Os autores latino-americanos que mais criticaram este movimento foram: Orlando Costas, René Padilla e Samuel Escobar. Destes, creio que Costas se destaca porque além da crítica ofereceu contribuições para o enriquecimento desta trajetória da igreja rumo ao seu crescimento. As contribuições de Costas vamos estudar na Unidade 3. Ver a minha tese de doutorado: “Orlando Enrique Costas: mission theologian on the way and at the crossroad” Fuller Theological Seminary, 1993, para uma visão completa deste autor sobre o tema. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA30 c. Pouca importância foi dada a outros aspectos vitais da missão da igreja. Um destes é a diaconia (serviço). Quase nada se fala entre estes autores a respeito do envolvimento da igreja na mudança das estruturas pecaminosas da sociedade por meio uma diaconia bíblica. Este aspecto não é negado por eles, mas também não é enfatizado e, quando mencionado, ocupa lugar de menor destaque, pois a prioridade é a evangelização que leva ao crescimento numérico. d. Finalmente, este movimento contribuiu para que a dicotomia entre evangelização e ação social fosse aumentada, colocou a primeira como prioridade sobre a segunda. Assim, os autores não conseguiram perceber que a Bíblia e principalmente Jesus Cristo, não separam as pessoas em compartimentos e que Deus quer a restauração harmoniosa do ser humano em todo o seu ser. Exercício de Fixação - 07 A igreja deve crescer porque: a) Líderes dedicados buscam inevitavelmente crescimento. b) É a consequência natural de uma igreja que segue um bom modelo de crescimento. c) É dá vontade de Deus que igreja cresça. d) Igrejas assim busca avivamento e) Os líderes precisam ter igrejas grandes para investir mais na missão. 2.2.3. As principais contribuições do movimento a. Nos seus primórdios, ele contribuiu para desafi ar o movimento missionário a ter um envolvimento mais próximo com o povo evangelizado. As missões estavam se tornando um gueto nos países onde haviam se instalado e os missionários tinham pouco contato com o povo, pois fi cavam isolados em suas vilas missionárias e saiam de lá apenas para realizar os trabalhos evangelísticos. Com isso o crescimento da igreja já não acontecia mais, pois não havia parceria entre os missionários e os líderes locais. 31Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | b. Trouxe também desafi os para as denominações norte-americanas que não mais se preocupavam com a evangelização do ser humano. Com a infl uência do chamado “evangelho social”, muitas igrejas perderam por completo todo e qualquer desejo de pregar a salvação no sentido espiritual, preocupadas que estavam com a salvação social do indivíduo. O movimento critica esta situação e chama às igrejas de volta a um trabalho evangelístico. Saiba mais O movimento do “evangelho social”, liderado pelo teólogo batista americano Walter Rauschenbusch (1869-1918) difundiu-se nos países anglo-saxões. O pensamento básico do “social gospel” consistia em priorizar a missão social e política da igreja em detrimento da evangelização. Houve uma natural reação dos chamados teólogos fundamentalistas que assumiram uma posição oposta priorizando apenas o aspecto da proclamação do evangelho em detrimento das questões sociais e éticas do evangelho. Carlos Queiroz, “Missão Integral” s/d. c. Infl uenciou o desenvolvimento de um novo ramo de estudos na teologia que hoje é conhecido como “missiologia”. Ninguém pode negar que os professores do Fuller tiveram uma enorme participação na implantação de cadeiras de missões nos seminários mundo afora. Com isto, quebrou- se um pouco o elitismo acadêmico em que somente as teologias bíblicas e sistemáticas recebiam atenção. 2.3. Bases bíblicas para o crescimento de igreja Naturalmente que ao falar de crescimento de igreja estamos estabelecendo que ela necessitará compartilhar o evangelho de Cristo com outras pessoas. Isso por si só já constitui um problema na sociedade pós-moderna.| Desenvolvimento integral da igreja | FTSA32 Nesta sociedade essencialmente liberal, relativa e plural em todos os sentidos como a igreja proclamará uma verdade que crê não ser uma, mas a verdade? Que não é relativa, mas absoluta? Primeiramente, se cremos que a Bíblia é o nosso livro de fé e prática, precisamos olhar para ela e derivarmos dela a nossa autoridade para a proclamação do evangelho. Já pontuamos na Unidade 1 a importância da Grande Comissão de Mateus 28:18-20. Há na literatura cristã excelentes estudos sobre esta famosa passagem. Jesus Cristo antes de partir para reassumir a sua glória instruiu os seus seguidores para que andassem pelo mundo fazendo discípulos. Não diz para fazer discípulos da igreja, mas de todos os povos, todas as etnias. Todavia, ao instruir que os novos seguidores fossem ensinados e batizados Jesus estava explicitamente dizendo que essas pessoas formam uma comunidade. No dizer de Paulo, elas formam uma nova humanidade, ou conforme a versão King James Atualizada, “um novo ser humano” (Ef 2:15). O batismo, antes de ser um rito, é uma incorporação na vida comunitária, é a aceitação e inclusão em uma nova família, a igreja. 2.3.1. A vida e ministério de Jesus Cristo A vida do próprio Jesus estabelece o exemplo da importância de transmitir a mensagem de Deus. Logo no início do evangelho de João somos informados que o Cristo encarnou-se e veio habitar na terra. Era o Deus Conosco em forma concreta e visível. O evangelista faz uma afi rmação interessante: “Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens” (Jo 1:4). Mas adiante ele diz que essa luz ilumina a todo o homem (v. 9). Note que João faz referência ao escopo universal da missão de Jesus: luz para toda a humanidade. Jesus afi rma que veio ao mundo para buscar e salvar quem estava perdido (Lc 19:10). Este é centro de sua atividade missionária. Em outro lugar ele afi rma que quem não nascer de novo não pode ver o reino de Deus (Jo 3:3), e aos judeus declarou abertamente que quem nele cresse teria a vida eterna (Jo 6:47) e isto signifi ca obviamente não morrer eternamente (Jo 11:25). Ele afi rma ser o caminho de regresso a Deus (Jo 14:6) e 33Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | adverte que pessoas podem até mesmo conquistar todas as coisas que este mundo pode oferecer, mas o que adiantaria tudo isto se essa pessoa perdesse a sua alma (Mt 16:26). Por isso, ensina que é melhor ajuntar tesouros no céu onde não existe a menor possibilidade que venha a ser perdido ou corrompido (Mt 6:19; Mc 10:21). No Novo Testamento é correto afi rmar que há um forte sentido escatológico para o termo salvação: salvação do pecado, do julgamento, da condenação e da “ira” de Deus. Todavia, também pode ser usado para libertação da morte, doença, possessão demoníaca, escravidão do mal ou qualquer sorte de calamidade. Em Jesus todas estas dimensões são concretizadas. Esta salvação, então, que Jesus oferece não é meramente uma transferência do domicílio terreno para o celestial. É uma vida totalmente nova, modelada na pessoa dele que é o protótipo de como Deus quer que vivamos. Uma vida plena e abundante (Jo 10:10). É esta salvação que a igreja foi comissionada a proclamar. Ela é integral e visa o ser humano em sua totalidade. 2.3.2. A vida e ministério do apóstolo Paulo Qualquer refl exão sobre o crescimento da igreja precisa passar pela pessoa de Paulo. A Revista Super Interessante publicou em 2003 uma matéria cujo título causou curiosidade: Paulo: o homem que inventou Cristo. O conteúdo versa sobre como ele foi a pessoa por detrás do estabelecimento do cristianismo. Saiba mais Paulo desempenhou um papel maior na evangelização dos primeiros cristãos”, diz o biblista Jerome Murphy-O’Connor, professor da Escola Bíblica e Arqueológica de Jerusalém e um dos maiores estudiosos do santo. O historiador André Chevitarese, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), especialista em cristianismo e judaísmo antigos, concorda: “O cristianismo, tal como existe hoje, deve muito a Paulo. Se não fosse o apóstolo, ele provavelmente não teria passado de mais | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA34 uma seita judaica”. Isso não quer dizer que o trabalho dos 12 apóstolos tenha sido irrelevante, mas eles pregaram numa região, a Palestina, que viria a ser devastada pelos romanos entre os anos 66 e 70. “Sem dúvida, Paulo foi o apóstolo que teve maior repercussão com o passar dos séculos”, afi rma o teólogo Pedro Lima Vasconcellos, professor do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica (PUC), de São Paulo. Fonte: https://super.abril.com.br/historia/o-homem-que-inventou-cristo/ Não há como negar que sem a conversão e depois o entusiasmo e zelo de Paulo o cristianismo não teria tido o avanço que teve e na velocidade como aconteceu. Ele foi a pessoa que mais entendeu o propósito da vinda de Cristo ao mundo. Para ele não havia a menor possibilidade de existir a igreja divorciada de uma íntima relação como o seu Salvador. Assim, é bastante forte em Paulo o conceito de que a igreja é o povo de Deus. Antes de ser qualquer organização ou instituição ela é o ajuntamento de pessoas que seguem os mandamentos do Filho de Deus. A igreja é a nova humanidade formada como resultado do recebimento do evangelho da paz anunciado pelo Messias. Assim ele narra que Cristo “é a nossa paz. De ambos os povos [judeus e gentios] fez um só e, derrubando o muro da separação, em seu próprio corpo desfez toda a inimizade... para em si mesmo criar do dois um novo ser humano, realizando assim a paz” (Ef 2:14-15). Agora, Cristo e a igreja estão em uma íntima associação, que é um mistério. Ao narrar sobre o casamento, Paulo faz uma analogia para o relacionamento de Cristo e a igreja e então ele conclui: “Este é um mistério grandioso; refi ro-me, contudo, à união entre Cristo e sua Igreja” (Ef 2:32). Os textos abaixo descrevem o que Paulo ensinava sobre este tema: • Ora, vocês são o corpo de Cristo, e cada um de vocês, individualmente, é membro desse corpo (1Co 12:27) • Assim como cada um de nós tem um corpo com muitos membros e esses membros não exercem todos a mesma função, assim também em Cristo nós, que somos muitos, formamos um corpo, e cada 35Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | membro está ligado a todos os outros (Rm 12:4-5). • Ora, assim como o corpo é uma unidade, embora tenha muitos membros, e todos os membros, mesmo sendo muitos, formam um só corpo, assim também com respeito a Cristo (1Co 12:12). • Há um só corpo e um só Espírito, assim como a esperança para a qual vocês foram chamados é uma só... (Ef 4:4). • Agora me alegro em meus sofrimentos por vocês e completo no meu corpo o que resta das afl ições de Cristo, em favor do seu corpo, que é a igreja (Cl 1:24). • Além do mais, ninguém jamais odiou o seu próprio corpo, antes o alimenta e dele cuida, como também Cristo faz com a igreja, pois somos membros do seu corpo (Ef 5:29-30). • Que a paz de Cristo seja o juiz em seu coração, visto que vocês foram chamados para viver em paz, como membros de um só corpo. E sejam agradecidos (Cl 3:15). • Ele é a cabeça do corpo, que é a igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a supremacia (Cl 1:18). • Dele todo o corpo, ajustado e unido pelo auxílio de todas as juntas, cresce e edifi ca-se a si mesmo em amor, na medida em que cada parte realiza a sua função (Ef 4:16). • Vocês não sabem que os seus corpos são membros de Cristo? Tomarei eu os membros de Cristo e os unirei a uma prostituta? De maneira nenhuma! (1Co 6:15). Foi esse entendimento da igreja como o corpo de Cristo que motivou Paulo a realizar suas viagens missionárias, plantar novas igrejas, se interessar pelo desenvolvimento de cada uma, conforme atesta suas cartas, e ainda por não descansar até ver Cristo conhecido em lugares onde o evangelho ainda não havia sido anunciado: “Sempre fi z questão de pregaro evangelho onde Cristo ainda não era conhecido, de forma que não estivesse edifi cando sobre alicerce de outro. Mas antes, como está escrito: ‘Hão de vê-lo aqueles que não tinham ouvido falar dele, e o entenderão aqueles que não o haviam escutado’” (Rm 15:20-21). Inclusive é isso que ele pede aos cristãos de Éfeso: “Orem também por | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA36 mim, para que, quando eu falar, seja-me dada a mensagem a fi m de que, destemidamente, torne conhecido o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador preso em correntes. Orem para que, permanecendo nele, eu fale com coragem, como me cumpre fazer” (Ef 6:19,20). Paulo continua sendo uma inspiração a todos nós que seguimos a Jesus Cristo. Certamente, não temos espaço aqui para desenvolver toda a teologia paulina sobre a igreja. Há inúmeras fontes bibliográfi cas disponíveis sobre o tema. Mas, é importante ressaltar como incentivo para os cristãos de hoje que o evangelho somente tem sentido quando compartilhado com o outro. O cristianismo é, e Paulo deixa isso bem claro, a religião para o outro, pois sem o outro não há absolutamente a necessidade da igreja e mesmo do evangelho. 2.4. Tipos de crescimento Temos basicamente três tipos de crescimento de igreja. O primeiro é o crescimento biológico. Ele ocorre pela simples geração de fi lhos e fi lhas dos cristãos. Igrejas com casais novos vão experimentar este tipo de crescimento em grande escala. Devemos lembrar que a Bíblia valoriza bastante o papel das crianças nos lares e que é dever de todos os pais e mães educarem suas crianças nos caminhos do Senhor. Devemos notar ainda que a maioria das conversões se dá até a idade de 17 anos. Permita-me uma digressão aqui. Relacionado com o tema das crianças, creio que a igreja perde uma grande oportunidade de incentivar os infantes das igrejas a ser tornarem missionários. Não podemos nos esquecer que os fi lhos e fi lhas dos cristãos estão também inseridos na sociedade. São alunos de escolas, frequentam atividades esportivas, são convidados para festas de aniversários etc. Nossas crianças podem levar seus amigos e amigas para alguma atividade especial que a igreja possa promover. Certamente, esta é uma grande oportunidade de apresentar o evangelho para estas famílias. O segundo é o crescimento por transferência. Naturalmente que com 37Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | tantas igrejas disponíveis para congregar é bem provável que exista uma grande circulação de crentes por elas. O tempo da fi delidade doutrinária ou apego por uma tradição eclesiástica específi ca fi cou para trás há tempos. As razões que levam alguém a se transferir de comunidade para outra são as mais diversas possíveis: desavenças de todos os tipos; desgosto com o ambiente; mudança de cidade ou bairro; convite de amigos ou familiares; adaptação das crianças nos programas da igreja; busca por melhor estrutura para fi lhos adolescentes e jovens; espaços mais adequados e confortáveis; estilo de música; louvor de boa qualidade; profundidade da pregação e estudos bíblicos; células familiares próximas de casa; etc. Assim sendo, da mesma maneira que uma igreja pode receber muitas pessoas por transferência, ela também pode perder muitas destas pessoas. O crescimento por transferência não estende o reino de Deus, mas traz muita visibilidade para a igreja local, pois ela começa a ser comentada na cidade como uma “boa igreja”, como uma igreja que tem muitas qualidades e recursos para oferecer. Naturalmente que isto gerará desejos de ser conhecida e visitada. Finalmente temos o crescimento por conversão. Este crescimento ocorre quando alguém de forma consciente e inteligente deposita sua fé em Jesus Cristo para a sua salvação. Eventualmente esta pessoa será ensinada, batizada e se tornará membro da igreja local. Donald McGavran diz: “Esse é o único tipo de crescimento pelo qual as boas novas da salvação podem se espalhar para todos os segmentos da sociedade e para os limites mais remotos da terra. A Grande Comissão exige, evidentemente, um enorme crescimento de conversão” (https:// churchleaderinsights.com/3-kinds-of-church-growth/). O que deve fi car patente aqui é que Deus deseja que a sua igreja cresça espalhando a semente do evangelho por todos os lugares conforme lemos na parábola do bom semeador (Mt 13; Mc 4 e Lc 8). Não faz nenhum sentido a igreja existir apenas para si mesma ou crescer apenas biologicamente e por transferência. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA38 Exercício de Aplicação - 08 Olhando para a realidade atual, o que mais se vê é a rotatividade de crentes entre igrejas, inclusive muitas pessoas passaram por diversas igrejas ao longo de poucos anos, fi liando-se a elas, fazendo parte de sua membresia. Olhando para este tópico, o nome dado a este tipo de crescimento é: a) Crescimento biológico. b) Crescimento por divisão de outras igrejas. c) Crescimento celular. d) Crescimento por transferencia. e) Crescimento orgânico. 2.5. Os responsáveis pelo crescimento da igreja Se Deus deseja que a igreja cresça isto naturalmente implica em que o seu povo seja o instrumento para que isso ocorra. Temos em tese dois grupos responsáveis para que o crescimento ocorra: pastores e membros das igrejas. 2.5.1. O papel do pastor no crescimento da igreja O papel da liderança pastoral já foi estabelecido nas cartas paulina: capacitar ou equipar os santos para o ministério. Mais e mais isto tem que se tornar uma realidade. Igrejas nas quais os pastores e pastoras estão somente preocupados em pregar um bom sermão ou administrar os problemas das igrejas, mas sem tempo para o discipulado ou para preparar o povo para testemunhar no dia a dia, raramente experimentam algum tipo de crescimento. Esse ministério da capacitação é crucial na renovação da vida da igreja. A verdade que precisamos afi rmar é que o ministério do discipulado é uma das tarefas mais difíceis dentre as muitas atividades pastorais. Talvez a razão principal desta difi culdade seja que este ministério toma muito tempo e energia pastoral. Uma difi culdade para a falta do discipulado 39Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | é que muitos líderes não foram discipulados quando convertidos ou não tiveram este aprendizado durante o treinamento ministerial. Isto naturalmente leva a não realização desta parte da Grande Comissão e consequentemente muitos cristãos fracassam em suas vidas e assim perdem o potencial de compromisso com o reino de Deus. É um paradoxo pensar que a arte de fazer discípulos, prática tão comum nas Sagradas Escrituras, é algo ainda pouco exercido por muitos pastores, justamente eles que passaram tanto tempo nos seminários estudando a Bíblia. Pastores no Brasil, principalmente nas denominações mais tradicionais, são louvados por suas capacidades de oratória, mas não por causa da ênfase no treinamento dos membros de suas igrejas. O problema disto tudo é que justamente este ministério é o que mais contribui não só para o crescimento da igreja, mas também para uma melhor compreensão do papel do crente na sociedade de hoje. É este ministério que irá ajudar o fi el a relacionar a sua fé com o mundo e não fugir deste por causa da sua fé. Enquanto os pastores não atentarem para esta realidade, o crescimento da igreja local será uma tarefa quase que impossível. Mark A. Finley, em um pequeno artigo, antigo, mas ainda atual, intitulado O pastor: chave para o crescimento da igreja apontou para este fato com muita propriedade. A pessoa chave no inteiro processo do crescimento de igreja é o pastor. A igreja que tiver um pastor que creia que é da vontade de Deus que a sua igreja cresça e que compreenda que o propósito da igreja é redentivo, ver a sua igreja crescer. Se o crescimento da igreja é tão somente uma das muitas opções congregacionais, o mesmo será inconsistente e esporádico. Qualquer pastor que for sensível a direção do Espírito Santo, que leva a autoridadeda Bíblia com seriedade, e que ora inteligente e sistematicamente sobre as suas prioridades em como capacitar a sua igreja, verá crescimento (1982, p.4). Estes fatos não estão sendo mencionados para que o pastor se orgulhe de sua posição na igreja. Isto está sendo dito justamente para mostrar | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA40 que o pastor como líder de sua comunidade tem a obrigação de conduzir o seu rebanho com dedicação e fi delidade ao chamado de Deus. Uma das muitas maneiras do pastor mostrar esta fi delidade, é reconhecer que as ovelhas do seu rebanho também possuem dons outorgados por Deus. O papel do pastor como líder é reconhecer estes dons e encorajar os crentes a coloca-los em prática. Isto é muito difícil para a maioria dos pastores. Difícil porque muitos deles veem-se a si mesmos como a principal e mais importante fi gura dentro da igreja que pastoreiam. Listo algumas atividades pastorais que podem levar ao crescimento da igreja. a. Estimular o rebanho O pastor não somente supervisiona o rebanho, mas a ele cabe principalmente a tarefa de estimular os crentes à obra do Senhor. Se isto não acontecer, a igreja pode chegar ao ponto de eventualmente não precisar deste líder. Para estimular o rebanho, o pastor tem que passar por um processo de refl exão e atingir um certo grau de maturidade para que possa exercer o dom de estimular outros ao serviço. Caso isto não aconteça, o pastor consciente ou inconscientemente exercerá a função de “podador” dos sonhos e aspirações do povo de Deus. b. Prover oportunidades missionais Se a função da ovelha é gerar outras ovelhas, a função do pastor é prover avenidas ministeriais para que o crente venha a exercer a sua vocação. Esta responsabilidade cabe ao pastor e à liderança da igreja e não somente aos crentes. Para ser este provedor de oportunidades, a liderança tem que passar por um processo de mudança de paradigma. O nosso padrão de igreja está fundamentado na tradição que divide pastor e leigo. Para que isto aconteça a liderança deve ver o povo, principalmente aqueles que também têm habilidade de líder, não como competidores pelo “sucesso” do trabalho realizado, mas como pessoas que desejam ver o reino de Deus expandido. Portanto, para que o crescimento ocorra pastores e pastoras precisam repensar a igreja a partir da missio Dei e não tanto a partir das tradições de sua denominação. Uma igreja missional é uma igreja bem liderada e harmoniosa na tarefa de proclamar com palavras e ações o evangelho de Cristo. 41Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Exercício de Aplicação - 09 Em qual das realidades o pastor exerce a função de ser o responsável pelo crescimento da igreja? a) Quando estimula o rebanho, ensina e treina para a proclamação do evangelho. b) Quando os membros das igrejas são os principais responsáveis pelo amadurecimento da igreja. c) Quando o pastor é um administrador, atuando principalmente na gestão da igreja. d) Quando o pastor divide com os membros o amadurecimento da igreja. e) Quando apenas os líderes e supervisores de células podem produzir o crescimento da igreja. 2.5.2. O papel do povo de Deus no crescimento da igreja O dicionário assim defi ne o termo “leigo”, que muitas vezes é erroneamente usado por líderes cristãos: “aquele que não tem ordens sacras ou é estranho ou alheio a um assunto”. Assim, o leigo é aquela pessoa que não possui o conhecimento teológico profi ssional do clérigo. Uma defi nição sociológica diria que é aquele que ganha o seu sustento em uma ocupação secular e não pelo serviço à igreja. Estas defi nições partem do negativo. A palavra leigo vem do grego laos que em temos gerais signifi ca “todo o povo”. A frase ho laos to Theou, quando aplicada à igreja signifi ca: “o povo de Deus.” Neste sentido, todas as pessoas que foram incorporadas ao corpo de Cristo são laos, um povo chamado por Deus com uma missão especial neste mundo. As seguintes passagens bíblicas ilustram este fato: Atos 15:14; Hebreus 4:9 e 1Pedro 2:10. Todas referem-se ao povo como pertencendo a Deus. Estes autores não fazem distinções entre o clero e o corpo de fi éis. Da dualidade greco- romana da cidade-estado (polis), a igreja primitiva tomou emprestado as | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA42 distinções de kleros (magistrado) e laos (povo). Logo, se tornou comum falar de kleros e laos, o clero e o laico ou leigo. Este desvio das Escrituras nos levou à tradição de devotar um lugar especial para os clérigos e praticamente nenhuma responsabilidade aos então chamados leigos no desenvolvimento da igreja. Essa dicotomia não encontra respaldo nas Escrituras, mas sim na tradição das igrejas evangélicas por meio de práticas, conceitos ultrapassados e muita racionalização. O problema é que isto é disseminado não somente entre a liderança, mas também entre os membros. Esta dicotomia precisa ser superada para que se restaure o modelo bíblico de ministério e leve a igreja ao crescimento. O primeiro passo para esta mudança deve ser dado pelos pastores. Os líderes precisam de uma renovação teológica e de um entendimento correto do papel do povo no plano de Deus para a igreja e para o mundo. Outro obstáculo para que o ministério do povo de Deus não se desenvolva é que os próprios crentes menosprezam ou dão pouco valor àquilo que Deus dispensou a eles. Se esta discussão for aplicada ao contexto brasileiro veremos que em algumas denominações poucas pessoas que não são pastores têm tido papel em sua liderança. Na igreja local esta liderança quando existente está sempre atrelada à vontade e desejo dos pastores. Quando olhamos para as igrejas no Brasil, não existe dúvidas de que muitas delas estão crescendo bem abaixo daquilo que se esperaria, mesmo aquelas que se orgulham de possuir “o verdadeiro evangelho” ou a melhor das tradições e doutrinas. Seria de se esperar, portanto, um crescimento formidável entre elas, o que não ocorre. Note o interessante comentário, feito em 1972, por Charles Gates que publicou um estudo que realizou no Brasil. Ele diz que: As igrejas tradicionais no Brasil não experimentarão um rápido crescimento como visto entre as igrejas pentecostais a menos que haja mudanças funcionais e estruturais em seus meios. Deve haver por parte 43Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | do leigo um maior desejo e prontidão em se envolver mais com a vida de suas igrejas. Deve haver uma prontidão entre os pastores em aceitar a cooperação dos membros de suas igrejas para que o crescimento ocorra (1972, p. 64). O problema detectado por Gates ainda é o mesmo hoje. O crescimento de qualquer igreja não está nas mãos dos pastores — ainda que eles sejam responsáveis pelo mesmo —, mas nas mãos de milhares de fi éis que diariamente se misturam com os brasileiros das mais variadas camadas e segmentos da sociedade. Tradicionalmente, os membros das igrejas foram considerados pessoas que precisavam ser servidas, protegidas e alimentadas. Isto tem sido perpetuado por uma má compreensão dos pastores e dos próprios crentes. A maioria dos seminários teológicos não ensinam sobre a teologia do povo de Deus. Os pastores, portanto, não estão preparados para trabalhar com o povo de Deus, mas para este povo, assumindo muitas vezes uma função meramente sacerdotal de ministério. Quando os cristãos são reconhecidos como parceiros de ministério, alguns resultados podem acontecer: • Remover a falsa concepção de que o ministério pastoral tem um “quê” de divino e de uma experiência com Cristo diferente dos demais membros da igreja. • Dirimir as dúvidas para os fi éis, bem como para os pastores, de que Deus mesmo chamou a todos para o seu serviço. • Responsabilizar a todos os membros da comunidade na tarefa da expansão do reino de Deus. • Produzir um impacto total da comunidade cristã sobre o mundo não cristão. Concluindo, o povo de Deus precisa ser encorajado e equipado para usar os seus dons espirituais. É tarefado pastor descobrir uma metodologia adequada para que isto ocorra. Esta metodologia deve refl etir o contexto | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA44 onde a igreja está inserida. Vejamos como foi descrito o trabalho dos cristãos do primeiro século: Assim como na igreja primitiva não havia distinção entre ministros de tempo integral e leigos, quanto à responsabilidade de difundir o evangelho por todos os meios possíveis, também não havia distinção entre os sexos nesta questão. Era ponto pacífi co que todos os cristãos eram chamados para serem testemunhas de Cristo, com a vida e com as palavras. Todos deveriam ser apologistas, pelo menos a ponto de poderem dar satisfação da esperança que havia neles. Isto incluía as mulheres, com toda a certeza. Elas desempenham um papel importantíssimo na propagação do evangelho (Green, 1984, p. 215). Assim sendo, cada cristão que tem o desejo de ser útil no reino de Deus e no serviço cristão deve se juntar a esta linhagem de homens e mulheres que no decorrer dos tempos vêm fazendo grandes coisas para o Senhor e deve se perguntar: “qual é o meu dever espiritual?” Exercício de reflexão - 10 Tendo em vista que os pastores são os principais responsáveis pelo crescimento da igreja e isso se dá a partir do discipulado, treinamento e capacitação dos membros. Descreva quais seriam os conteúdos que deveriam ser contemplados para que uma igreja local tenha seus líderes devidamente preparados para contribuir com seu crescimento. Por se tratar de um exercício de refl exão, descreva refl etindo sobre o porquê dos conteúdos. Referências bibliográfi cas FINLEY, Mark A. Industrialization: Brazil Catalyst for Church Growth. South Pasadena: William Carey Library, 1972. GREEN, Michael. Evangelização na Igreja Primitiva. São Paulo: Editora Vida Nova, 1984 45Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | UNIDADE 3 – CRESCIMENTO INTEGRAL E ENCARNAÇÃO 3.1. O mistério da igreja A igreja que queremos não será nunca uma realidade pois tudo o que acontece na igreja é temporário. Ela somente será uma realidade naquele dia em que o reino for consumado conforme promessa de Jesus Cristo. Por isso, devemos ter em mente duas coisas a respeito da igreja. A primeira é que ela, em união com Cristo, é um mistério: “Este é um mistério profundo; refi ro-me, porém, a Cristo e à igreja” (Ef 5:32). Querer entender e dissecar a igreja como se ela fosse um amontoado de coisas é uma impossibilidade. Podemos refl etir sobre tudo a respeito da mesma, mas tendo sempre em mente que a igreja é um mistério. O segundo aspecto que precisamos observar é que a igreja está a caminho de ser o que ela não é hoje, em outras palavras: ela será aquilo que Jesus planejou e não o que vemos hoje. O apóstolo Paulo nos ensina que “Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, a fi m de a santifi car, tendo-a purifi cado com a lavagem da água, pela palavra, para apresentá-la a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem qualquer coisa semelhante, mas santa e irrepreensível” (Ef 5:25-27). Note que o próprio Cristo está encarregado de preparar a igreja para o fi m dos tempos. Veja ainda que ele apresentará a igreja a si mesmo. Ou seja, ele sabe que a igreja que entrará no reino eterno está em processo e quando chegar o dia de ela entrar triunfalmente no neste reino, ele não terá nenhuma surpresa pois ele mesmo a preparou para aquele dia. Naquele dia, na consumação dos tempos, a igreja será então santa e sem defeitos. Por isso, juntos, o apóstolo Paulo e tantos outros que nos antecederam, cremos que a nossa lealdade é com o evangelho de Jesus Cristo. Ele estava sempre pronto a anunciar o evangelho (Rm 1:15; 15:20; 1Co 1:17 e 9:16) e declarou que tudo fazia por causa do evangelho: “Faço tudo isso por causa do evangelho, para ser co-participante dele” (1Co 9:23). Assim, não somente tudo o que acontece com a igreja é temporário, como qualquer crítica a ela também é temporária. Ainda que seja uma crítica válida, ela é para hoje apenas. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA46 Parece-me que em nossa pressa em apontar as falhas da igreja, ainda que válidas, precisamos ter em mente que as nossas observações devem ter como motivação a causa do evangelho. É o próprio evangelho ao ser proclamado — também dentro da igreja — que é o corretivo para os alarmantes desvios da mesma. Orlando Costas, autor primário que vamos estudar nesta unidade, propõe uma pastoral social, [...] que leve a sério o caráter pastoral da igreja, a situação concreta dos povos latino-americanos, a herança da Reforma do Século 21 e a tradição evangélica latino- americana. A proposta pressupõe uma interpretação missiológica da pastoral, defi nindo-a como a expressão prática da missão com uma dimensão dupla: ao interior da igreja, com o propósito de renová-la, e ao exterior da mesma, para ajudá-la a encarnar-se na sociedade e contribuir com sua transformação integral (1984:14). Saiba mais Orlando E. Costas (1942-1987) nasceu em Porto Rico e faleceu nos Estados Unidos, vitimado por um câncer, aos 45 anos de idade. Era pastor e teólogo batista. Graduou-se doutor em teologia e missiologia nos Estados Unidos. Foi reitor e professor do Seminário Bíblico Latino-Americano de Costa Rica; fundou o Centro Evangélico Latino-Americano de Estudos Pastorais (CELEP), em 1973, em San José, Costa Rica. Atuou como administrador da faculdade do Eastern Baptist Theological Seminary, na Filadélfi a, onde também foi professor de missiologia e diretor de estudos hispânicos.Além disso, ocupou o cargo de segundo vice-presidente do Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI) e, na ocasião de seu falecimento, atuava como professor no Andover Newton Theological School, em Massachussetts, e como vice-presidente da Fraternidade Teológica Latino-Americana. 47Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Nota do professor da matéria: Costas graduou-se no seu doutorado na Universidade Livre de Amsterdã, Países Baixos, sob a supervisão do missiólogo Johannes Verkuyl (1908-2001) que deixou sobre ele grande infl uência. Fonte: https://ejesus.com.br/orlando-costas-e-a-igreja-brasileira/ Quando estudamos sobre o desenvolvimento integral da igreja estamos imediatamente remetendo o tema para a missão da igreja (missio ecclesiae). Muitos teólogos têm feito verdadeiro artifício para fazer uma teologia divorciada da missão. É simplesmente sem propósito essa relutância, tendo em vista que não existe teologia sem a missão. Fazer teologia ignorando a missão é o mesmo que tentar respirar sem ter o ar, é elaborar sobre o nada, é uma viagem no vácuo. A famosa frase de Emil Brunner precisa ser lembrada: “A igreja existe pela missão, assim como o fogo existe pela combustão. Onde não existe missão, não existe igreja; e onde não existe nem missão nem igreja, não existe fé [teologia]” (1931, p. 108). Martin Kähler também expressou de forma similar: “Missão é a mãe da teologia” (Bosch, 2002, p. 34). Seria interessante lembrar as palavras de Judo Poerwowidagdo quando aponta a communio sanctorum como a [...] comunidade que é distinta de outras comunidades porque foi Deus quem a ajuntou e não por causa da concordância social e política de seus membros. Eles não pertencem à ‘comunidade’ por causa de propósitos ou interesses mútuos. Não é uma comunidade por causa de um contrato sócio-político, nem por associação profi ssional. Ela é uma comunidade em continuidade, com seu início no Novo Testamento quase dois milênios atrás. Ela continua até o presente momento, e continuará até o eschaton, isto é, até a completude do reino de Deus. A sua existência continua não depende de seus membros, mas de uma ordenança divina (1994, p. 21). | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA48 O nosso ponto de partida para o desenvolvimento da igreja é sempre a missio Dei que engloba a refl exão teológica da ação de Deus tanto na criação como na redenção. Isso signifi ca que a missio Deicontém a missio ecclesiae e não o contrário. Tendo feito esta introdução sobre a importância da igreja, descrevo agora em detalhes aquilo que julgo ser a melhor contribuição para o crescimento de igreja feita Costas ao contribuir para o entendimento do crescimento da igreja em quatro dimensões. Exercício de Reflexão -11 Logo na introdução dessa unidade, vimos que a igreja está longe de ser aquilo que desejamos e querer entende-la é de certa forma uma impossibilidade. Para algumas pessoas é frustrante se deparar com problemas e confl itos, e a igreja é um lugar com essas situações e outras mais. Ao pensar a respeito da igreja, você consegue ter essa perspectiva de que ela está em um processo de aperfeiçoamento? Como lida com a realidade de que somente na consumação dos tempos a igreja será santa e sem defeitos? 3.2. As dimensões do crescimento de igreja Para se conhecer o racional por trás do conceito de crescimento integral de Costas (1983, p. 102) é necessário observar como ele explica estas dimensões. Quatro dimensões de crescimento fl uem da realidade de que a igreja é uma companhia crescente de pessoas compromissadas na jornada da fé. Como uma comunidade a caminho do reino de Deus, cujos membros vivem em comunhão uns com os outros, que são ouvintes e praticantes das Palavras de Deus, e que estão compromissados incondicionalmente a servir a humanidade no amor do evangelho, a igreja deve experimentar o crescimento em quatro direções: no aumento de número de seus membros, no desenvolvimento de sua vida orgânica, no aprofundamento de seu entendimento da fé, e na efi cácia de seu serviço ao mundo. 49Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Cada uma destas dimensões está relacionada com algum aspecto da vida em missão da igreja como eu destacarei a seguir. 3.2.1. Crescimento numérico Esta dimensão está relacionada com o aumento do número de pessoas entre as milhões que não conhecem a Jesus Cristo como Senhor e Salvador. Esta é uma parte fundamental da natureza da igreja por ser uma comunidade apostólica, enviada ao mundo como herdeira da mensagem e comissionamento dos apóstolos. Saiba mais Aos que desejam se aprofundar sobre a natureza missionária da igreja a sugestão é ler e estudar o livro de Johannes Blauw. A natureza missionária da igreja: exame da teologia bíblica da missão. Aste, 1966. Aqui ele desenvolve a ideia centrípeta e centrífuga da missão. Além do mais, a igreja é o sinal do reino de Deus e como tal deve semear a semente das boas novas do evangelho a todos e a cada setor da sociedade. Neste processo, a igreja se torna o fermento do mundo. Crescimento, para Costas, é um sinal fundamental da verdadeira igreja que confi rma que ela está participando na ação de expansão do Espírito (1979, p. 37) Com relação a vida em missão da igreja, este aspecto desafi a a igreja a se preocupar com aqueles que estão alienados de Deus, e necessitam da reconciliação e incorporação em uma comunidade onde serão amados e nutridos. A igreja deve ao mundo a proclamação do evangelho. Costas expande esta perspectiva em seu livro Compromiso y Misión (1979), onde esta dimensão é chamada de “crescimento em profundidade”. Aqui, deduzindo de algumas parábolas, ele destaca alguns princípios para o crescimento numérico: | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA50 • Semear a semente, • Cultivar o solo, • Podar os galhos secos, isto é, mudar de uma área que não produz frutos para um campo mais responsivo, • Realizar a colheita para não podemos perder frutos preciosos (1979, p. 38-47). Neste aspecto do crescimento numérico, Costas não difere muito do Movimento de Crescimento de Igreja — que será estudado mais adiante. Lembrando que este crescimento, além da evangelização para a incorporação de novos convertidos, pode incluir o crescimento por nascimento de fi lhos e fi lhas dos cristãos e por transferência de membros de uma igreja para a outra. 3.2.2. Crescimento Orgânico Se o crescimento numérico é, principalmente, o desenvolvimento externo da igreja, alcançando a sociedade com a proclamação do evangelho; o crescimento orgânico é o desenvolvimento interno da comunidade da fé. Costas diz: “Esta dimensão engloba a forma de governo da igreja, sua estrutura fi nanceira, seu estilo de liderança, o tipo de atividades nas quais ela investe seu tempo e dinheiro, e sua celebração litúrgica” (1983, p. 102). Na realidade, o crescimento orgânico está preocupado com aqueles que são acrescentados à igreja. Estes novos convertidos devem ser incorporados na vida comunitária e a liderança deve inserir cada um deles em algum ministério. Um erro muito comum nas igrejas é esperar muito tempo para envolver as pessoas em suas atividades. Às vezes exige-se um longo tempo explicando-se a tradição daquela igreja, às vezes cai-se no extremo oposto de ignorar que as pessoas estão ali. Assim, o tempo vai passando e muitas dessas pessoas vão perdendo o entusiasmo e a alegria da nova vida. Em relação ao aspecto da vida em missão da igreja, este crescimento tem a ver com cultura e contextualização, educação cristã e mordomia, comunhão e louvor. A igreja necessita ser relevante e signifi cativa onde está sendo formada. 51Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Um detalhe importante no crescimento orgânico é o cuidado que se deve ter com a chegada de muita gente. É necessário prestar atenção se os espaços da igreja são adequados aquele número de pessoas. Como as estruturas serão afetadas se cinquenta pessoas são acrescidas? Haverá assentos, salas de educação, banheiros, estacionamento, etc.? Além dessas questões do espaço, há outras como: os professores possuem sufi ciente treinamento para o discipulado? Há gente para cuidar das crianças ou para a assistência dos que precisam de ajuda? Veja que o crescimento numérico pode causar desconforto para os que já estão na igreja. Alguns serão incomodados com o jeito de ser desses novos que não têm a mesma cultura evangélica. A tudo isso a liderança precisa estar atenta. 3.2.3. Crescimento Conceitual Costas também chama este tipo de crescimento refl exivo. Ele tem a ver com o entendimento da fé; ele “envolve o aprofundamento do auto entendimento da Igreja e seu conhecimento da fé, incluindo seu entendimento das Escrituras, do desenvolvimento histórico da doutrina cristã, e do mundo na qual ela vive e ministra” (1983, p. 103). Este crescimento permitirá à Igreja encarar todos os desafi os que o mundo lhe apresenta em suas muitas e diversas formas. A igreja, sendo capaz de responder criticamente sobre sua fé, evitará se tornar estéril e protegerá sua criatividade orgânica, evangelística e ética. Em relação a vida em missão da igreja, este crescimento se relaciona a refl exão crítica a tudo que é pertinente a ela, como a oração, fé, Palavra e missão. O pano de fundo para esta refl exão é a realidade concreta socioeconômica e histórica nas quais a Igreja está imersa. 3.2.4. Crescimento Diaconal Este crescimento também é chamado de encarnacional. É o serviço que a Igreja presta ao mundo como uma demonstração concreta do amor redentor de Deus. Envolve a ação em direção daqueles que são pobres, | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA52 destituídos e que estão sofrendo a dor que vem de uma situação adversa imposta pelas estruturas da sociedade. “A igreja perde, sem esta dimensão, sua autenticidade e credibilidade. Somente à medida que a igreja é capaz de viabilizar concretamente sua vocação de amor e serviço é que pode esperar ser ouvida e respeitada” (1983, p. 103). Em relação a vida em missão este crescimento se relaciona com o lado ético e com a missão da Igreja. Está ligado ao envolvimento da igreja com as batalhas coletivas na solução, ou pelo menos, na ajuda quanto aos problemas estruturais da sociedade. É necessário que a igreja esteja atenta ao que afeta as pessoas de uma maneira geral. Se a igreja está em um bairro ela precisa observar como é vivernaquela localidade, quais são os problemas recorrentes, as necessidades básicas. Mesmo sabendo que ela não poderá preencher todas as demandas existentes, ela poderá escolher alguns ministérios e envolver o seu povo para ser agente de transformação daquela situação. Deve fi car bem claro que é nesta dimensão que a igreja ganha ou perde a estima das pessoas. Esta é a dimensão que coloca a igreja na rua para andar junto com as pessoas. A igreja sai do templo e encontra o povo no seu contexto para ministrar a ele. Exercício de fi xação - 12 A respeito das dimensões de crescimento da igreja no conceito de Orlando Costas, é correto afi rmar que: a) O crescimento numérico possui princípios, o quais são retirados de algumas parábolas: semear a semente, cultivar o solo, podar os galhos secos e realizar a colheita. (correta) b) O crescimento orgânico é o desenvolvimento externo da igreja, alcançando a sociedade com a proclamação do Evangelho. c) O crescimento conceitual engloba a forma de governo, a estrutura fi nanceira e a sua celebração litúrgica. d) O crescimento diaconal também pode ser chamado de crescimento refl exivo. 53Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | 3.3. As qualidades do crescimento da igreja Vimos como uma igreja pode crescer forma integral. Tenha em mente que Orlando Costas escreveu sobre isso na década de 70 e 80. Algumas coisas ainda permanecem como desafi os para hoje especialmente a dimensão encarnacional. Naturalmente que outros autores fi zeram contribuições para enriquecer estas dimensões. Charles Van Engen, por exemplo, escreveu um belo texto que deveria ser lido por pastores e líderes por uma redefi nição do papel da igreja local (1996). Complementando a ideia das várias dimensões do crescimento da igreja, Costas sugere ainda que existem três qualidades de crescimento: espiritualidade, encarnacionalidade e fi delidade. “Estas três qualidades representam as variáveis controláveis do modelo. Elas são os fatores com os quais avaliamos qualitativamente os vários tipos de crescimento, ou, em outras palavras, os princípios críticos que testam a validade teológica do crescimento da igreja” (1983, p. 101). Ou seja, para cada dimensão devemos aplicar estas qualidades. Neste sentido, como são quatro dimensões aplica-se as três qualidades para cada uma delas. Segue um pequeno resumo de cada qualidade. 3.3.1. Espiritualidade A espiritualidade está relacionada com o trabalho e a operação do Espírito Santo. Ela é o elemento que investiga se existe a vitalidade do Espírito no desenvolvimento da igreja. Para avaliar se existe espiritualidade nas dimensões do crescimento, três perguntas devem ser feitas: • A primeira pergunta tem a ver com a inspiração e a motivação. O crescimento é inspirado e motivado pelo Espírito Santo? • A segunda pergunta relaciona o crescimento ao fruto do Espírito. O crescimento da igreja refl ete este fruto? • A terceira pergunta tem a ver com a ação. O crescimento demonstra uma fé alegre, vibrante, amorosa e esperançosa? | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA54 A igreja deve demonstrar sua fé não para si mesma ou somente dentro de suas paredes, mas para as pessoas que estão do lado de fora do portão, àqueles que estão na periferia da sociedade. Espiritualidade não é um sinônimo de abstração. Deve-se valorizar a espiritualidade no caminho, tanto aquela que busca em Deus a direção por meio das disciplinas espirituais, bem como aquela que tem a ver com a comunidade dos fi éis, a comunhão que se dá no caminhar juntos no dia a dia da vida na terra. A aplicação que se faz aqui é se em cada dimensão do crescimento percebemos esta espiritualidade? Não são meramente atividades religiosas para cumprir rituais ou alcançar metas. É um crescimento que está debaixo da direção segura do Espírito Santo. 3.3.2. Encarnacional Qualidade encarnacional é a segunda variável para se avaliar o crescimento da igreja. Ela é entendida, e não pode ser diferente, baseando-se no nascimento e ministério de Cristo. A encarnação de Cristo se tornou um paradigma para todos os que querem segui-lo e participar em sua missão. A arena onde ela deve ser desenvolvida está entre o povo e suas situações concretas. Nós não estamos falando aqui sobre uma categoria abstrata da teologia, mas sobre um fato teológico, isto é, “Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3:16). Se a Igreja não deseja crescer nesta dimensão, “ela não poderá iluminar efetivamente o caminho da vida, nem dar adequadamente o sabor à terra nem levedar as estruturas da sociedade. Neste caso, ela irá se tornar funcionalmente e praticamente uma morta ambulante” (1983, p. 101) O crucial para Costas quanto ele relaciona encarnação ao crescimento da igreja é que nós devemos “perguntar até que ponto a igreja está experimentando um crescimento que demonstra um testemunho concreto (encarnado) ao compromisso e à presença compreensiva de Cristo entre os que são atormentados e as multidões sem esperança 55Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | deste mundo (Mt 9:36; 25:31-46)” (1983, p. 101). Se a igreja não refl ete esta dimensão, ela perde a sua validade. Saiba mais Leia o texto abaixo sobre este termo conforme descrito por Alan Hirsch: Eu uso a palavra (encarnacional) para descrever esse modo de engajamento missionário que leva a sugestão da doutrina da Encarnação de Deus em Cristo. Se missional se refere à nossa “sentença” como crentes / igreja, então encarnacional dá forma a entendermos como devemos nos envolver nessa missão. Deus veio ao mundo em um ato de identificação profunda, não só com a humanidade como um todo, mas com um grupo particular de pessoas. Que Ele estava na vizinhança por 30 anos e ninguém percebeu, isso nos diz muito sobre Deus e como Ele se envolveu na situação humana. A Encarnação nos mostra que Deus fala a partir de uma cultura particular, de maneira que as pessoas possam perceber, entender e responder. A Encarnação nos dá o modelo bíblico primário de engajamento - é assim que Deus faz isso e nós que seguimos seu Caminho. Devemos seguir os seus passos. A missão encarnacional exige que contextualizemos o Evangelho de forma que sejam valorizadas as situações culturais e existenciais particulares dos vários povos, sem comprometer a própria missão. Ser missional signifi ca sair (ser enviado) para o mundo, então, o ser encarnacional signifi ca entrar profundamente em uma cultura.” Fonte: http://evangelismoereforma.blogspot.com/2017/07/ conhecendo-o-conceito-encarnacional-de.html | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA56 3.3.3. Fidelidade Esta qualidade expressa a necessidade de a igreja viver “sintonizada” com a ação de Deus na história. Um desafi o que Costas nos apresenta é a ideia de que Deus está trabalhando no mundo não somente por meio da Igreja. Assim, a igreja deve estar sintonizada com a ação de Deus na história. Isto signifi ca que Deus pode trabalhar na história por meio da igreja e/ou por meio de outras agências. Pensemos em um exemplo que acontece com muita constância. Quando ocorre uma tragédia de grandes proporções como um terremoto, ou um alagamento, uma doença de grandes proporções. Muitas organizações colaboram para mitigar as dores e os sofrimentos de milhares e milhares de pessoas. O que Costas está dizendo é que a igreja precisa entender que estas organizações estão sendo usadas por Deus para preservar vidas preciosas. Elas são instrumentos de Deus. Nós devemos retornar a nossa primeira intenção e perguntar por que este entendimento da história é tão importante para o crescimento da igreja? Fidelidade a Deus implica em um compromisso com a história e com o mundo. Portanto é importante olhar para o crescimento da igreja e perguntar se este crescimento é a consequência deste compromisso com o outro. Um segundo aspecto é analisar se este crescimento levaráa igreja a se envolver com aquilo que Deus está realizando na história, isto é, sua transformação. Se o crescimento da igreja não tem quaisquer outras consequências e implicações, então, falta a este crescimento a qualidade da fi delidade. Nós podemos resumir estas três qualidades em poucas palavras. Crescimento espiritual é o trabalho do Espírito Santo; crescimento encarnacional acontece em situações concretas e tem suas raízes históricas, e o crescimento em fi delidade acontece quando a igreja está sintonizada com o agir de Deus na história. 57Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | 3.4. A importância do modelo encarnacional O que estamos delineando nesta unidade é a importância de se ter um desenvolvimento e crescimento de igreja que sejam inspirados no modelo encarnacional. John (Juan) Mackay foi um missionário escocês que na década de 1920 trabalhou como missionário no Peru. Foi muito infl uente no desenvolvimento da teologia na América Latina com seus escritos contextualizados para a nossa realidade. Ele desenvolveu uma metáfora que é usada até os dias de hoje: a sacada e o caminho. A sacada é o símbolo do espectador perfeito, “para o qual a vida e o universo são objetos permanentes de estudo e contemplação,” e “por caminho, eu quero dizer o lugar onde a vida é vivida intensamente, onde o pensamento nasce do confl ito e da preocupação, onde as escolhas são feitas e decisões são tomadas. É o lugar de ação, de peregrinação, de cruzadas, onde a preocupação nunca está ausente do coração do viajante” (1943, p. 29-30). A igreja que realiza seu ministério a partir da sacada será sempre distante da realidade que o povo está vivendo. O desafi o a ela é ministrar onde a vida acontece, pois ali é o lugar da ação. É no caminho que o drama da vida é experimentado. Descer da sacada e integrar ao caminho é um processo encarnacional. O apóstolo Paulo ilustra essa encarnação de maneira admirável e profunda no seu texto de Filipenses 2:5-11: Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz! Por isso Deus o exaltou à mais alta | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA58 posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai. Notemos que este texto paulino tem dois movimentos. A descida de Cristo ao nosso mundo e a ascensão à mais alta posição celestial. No primeiro movimento temos o modelo da encarnação. Sua voluntariedade em abandonar o lugar de superioridade, esvaziar-se de tudo o que era, tornar- se um servo e assumir a posição do outro. Essa descida foi humilhante, realizada em obediência e totalmente sacrifi cial. Assim, a igreja também deve ministrar no mundo de hoje, acompanhando esses movimentos de Jesus. No dizer de Mackay, descer da sacada e entrar na estrada da vida. No segundo movimento temos a ascensão de Cristo. Ele é exaltado por tudo o que fez, por ter cumprido a sua missão de reconciliar o mundo com Deus. Sua glória é eterna e para sempre será honrado e adorado. A igreja não pode querer o segundo movimento sem passar pelo primeiro. Não pode ter a honra sem o sacrifício. Não se pode ter um ministério que seja o oposto deste apresentado por Jesus. Seria incoerente e desfi gurado. Pois, como poderia a igreja representar Jesus com uma representação diferente daquilo que ele foi enquanto ministrava nesse mundo? John Stott (2005, p. 107) também faz um resumo interessante do ministério de Jesus que merece ser destacado e refl etido: Ninguém jamais demonstrou tanto quanto o próprio Senhor Jesus Cristo o que signifi ca esta “santa mundanidade”. Sua encarnação é a perfeita encarnação dessa mundanidade. Por um lado, ele desceu ao nosso mundo e assumiu a completa realidade da nossa humanidade. Tornou-se um conosco em nossa fragilidade, expondo-se às tentações. Comungou com gente comum, que se juntava ansiosamente ao seu redor. Ele aceitou todo mundo, sem desprezar ninguém. Identifi cou-se com as nossas tristezas, nossos pecados e nossa morte. Contudo, ao misturar-se livremente 59Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | com gente como nós, ele nunca sacrifi cou nem comprometeu sequer por um momento a sua própria identidade e unicidade. Ele vivenciou a perfeição da “santa mundanidade”. Alan Hirsch (2011), mencionado anteriormente, faz um resumo do que seria o modelo da encarnação de Deus em Cristo: 1. Presença: o ato de identifi cação com um grupo de pessoas. Estar ‘presente´ para eles. 2. Proximidade: Indo para onde as pessoas vão, estando em seus ‘espaços’ por assim dizer. 3. Preveniente (que chega antes): Confi ando que Deus já foi antes de nós e está chamando as pessoas para si mesmo por meio de Jesus e que assim podemos nos unir a ele. 4. Poder de menos: Na verdade, isso não signifi ca que não temos poder (temos no Evangelho e no Espírito), mas sim que tomamos sobre nós mesmos uma forma de servo e de ser humildes em nosso compromisso com os outros. 5. Pathos: Sofremos com os outros... sentimos/entendemos enfaticamente sua dor, sua luta. Em uma palavra... somos um povo de compaixão. 6. Proclamação: Que tendo amado e cuidado das pessoas que buscamos alcançar, nós amorosa, corajosa e verbalmente proclamamos o Evangelho de maneiras que fazem sentido para a cultura das pessoas que estamos alcançando. Eu descrevo esse modelo com outras palavras, mas que reforça o mesmo conceito. A igreja é: 1. O povo da missão – missio Dei; 2. O povo peregrino – caminha em direção ao fi nal dos tempos: • A igreja entre os “dois tempos”; • 2. Símbolos entre os tempos: tenda ou catedral. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA60 3. O povo servo – manifestação de Cristo ao mundo; 4. O povo libertador – em todos os níveis da sociedade; 5. O povo responsável – cada um participa do todo da missão; 6. O povo obediente ao Espírito Santo: • Originador da missão; • Condutor da missão; • Sustentador da missão. 7. O povo da Bíblia – única regra de fé e prática. Exercício de aplicação - 14 Há um aspecto no desenvolvimento e crescimento da igreja que é trabalhado por diferentes autores e ilustrado por Paulo em seu texto Filipenses 2:5-11, que aspecto é esse? a) Numérico c) Diaconal b) Espiritual d) Encarnacional Um dos aspectos que já mencionamos sobre a contribuição de Costas e que destaco também é o papel do Espírito Santo. Esse é um tema da teologia bíblica/sistemática que precisamos trazer para mais perto da igreja missional hoje. Qual é o papel do Espírito Santo na vida da comunidade? De que maneira se ouve o seu direcionamento? A questão que eu levanto é em termos práticos como isso acontece. No seminal trabalho de David Bosch, por incrível que pareça, não há um tratado mais detalhado sobre o Espírito Santo e a missão da igreja. Ele, ao destacar a teologia lucana, elabora em poucas linhas o papel do Espírito. Faço um resumo abaixo, porque é importante que a igreja contemporânea entenda o papel da terceira pessoa da Trindade em seu viver diário e crescimento. Bosch, que a seguir menciono, nos dá uma ideia sobre o papel do Espírito Santo na vida em missão da Igreja. Ele afi rma que: 61Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | ... através do Espírito que o Cristo ressurreto estava presente na comunidade... Lucas se deu conta de que a missão e o ministério de Jesus tinham de ser reinterpretados para a igreja de sua própria época, e acreditava que essa reinterpretação seria mediada pelo Espírito... O ministério do Jesus terreno já é descrito em termos da iniciativa e orientação do Espírito. Entretanto, a ideiade ser conduzido pelo Espírito à missão é, então, aplicada a maneira bem mais abrangente ao ministério dos discípulos. Eles se transformarão em testemunhas de Jesus tão logo sejam revestidos de poder do alto (Lc 24.49; At 1.8). O mesmo Espírito em cujo poder Jesus foi à Galiléia também impulsiona as discípulas para a missão. O Espírito torna-se o catalisador, a força orientadora e motriz da missão. A cada ponto a missão da igreja é tanto inspirada quanto confi rmada por manifestações do Espírito. O dom do Espírito é o dom de engajar-se na missão, pois a missão é a consequência direta do derramamento do Espírito... O Espírito não só inicia a missão, mas também orienta os missionários sobre aonde eles deveriam ir e como deveriam proceder. Eles não devem executar seus próprios planos, mas têm de esperar que os Espírito os guie... Em todas essas narrativas [no livro de Atos], a ênfase está no Espírito Santo como catalisador, guia e inspirador rumo à missão... o Espírito é, além disso, não só o iniciador e guia da missão, mas também aquele que capacita para a missão... Através do Espírito, Deus controla a missão (2002, p. 147-149). O papel do Espírito Santo para a vida em missão da igreja é de fundamental importância para que ela caminhe no rumo que Deus tem para que o | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA62 mundo ouça a mensagem transformadora do evangelho. Sobre isso John Stott assim expressa, contrariando o lugar comum sobre o que a igreja pensa sobre a grande comissão: “Nós precisamos deixar de pregar a Grande Comissão como uma ordem a ser obedecida. Devemos anunciá- la, isto sim, como uma lei que expressa a natureza da igreja e que governa a vida dela... O derramamento do Espírito é, por sua própria natureza, a efetivação da Grande Comissão na vida da igreja” (2005, p. 143). Outra contribuição importante para a encarnação da igreja refl etindo o ministério de Jesus Cristo é encontrada nos escritos de Charles Van Engen, professor emérito do Seminário Teológico Fuller. Van Engen escreveu como fruto de sua dissertação de doutorado aquela que talvez seja a mais completa análise do Movimento de Crescimento de Igreja. Um único livro (Povo missionário, povo de Deus) dele está em português e merece ser lido e aplicado nas comunidades cristãs. No capítulo dois ele trata do papel da igreja local no mundo, ou seja, da sua encarnação na sociedade. Van Engen inicia esse capítulo com a pergunta mais básica a ser feita para a igreja: qual é a sua fi nalidade de existir neste mundo? Em outras palavras: qual é a razão de ser da igreja? Esta pergunta tem sido, ou procurada ser, respondida por teólogos no decorrer dos tempos. Aparentemente a resposta deveria ser simples, mas este não é caso. Van Engen cita Alvin Lindgren: Defi nir a natureza e a fi nalidade da Igreja é uma questão intensamente pessoal para o ministro, já que o conceito de ministério brota diretamente do conceito de Igreja [...] Estamos afi rmando que o próprio conteúdo do evangelho predetermina os veículos capazes de transmiti-lo [...] O cumprimento da fi nalidade de Deus, não o ativismo, é a única preocupação da administração da Igreja [...] Fique claro que nossa preocupação é com 63Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | a fi nalidade essenciais, e não uma descrição do que é agora, ou senão o que tem sido na história da Igreja ou mesmo no Novo Testamento [...] A Igreja deve ser o que quer que Deus pretenda que seja, e buscarmos nas Escrituras descobrir os desígnios de Deus para ela (1996, p. 110). Essa tarefa é, então, fruto da leitura e compreensão do Novo Testamento sob a direção do Espírito Santo. Não é e não pode ser algo relativo em que para uma comunidade é uma coisa e para outra algo diferente. O ministério pode ter cores diferenciadas devido à situação, mas na sua essência a igreja tem a mesma fi nalidade em qualquer época e contexto. Van Engen (1996, p. 112) propõe quatro áreas que cada igreja local precisa trabalhar teologicamente e analisar como elas governam a sua vida em missão. Elas são: • Coinonia - “... que vos ameis uns aos outros...” (Jo 13.34-35; Rm 13:8; 1Pe 1:22) • Querigma - “... Jesus [é] Senhor...” (Rm 10:9; 1Co 12:3) • Diaconia - “... um destes mais pequeninos...” (Mt 25:30, 45) • Martiria - “... sereis minhas testemunhas...”; “... que vos reconcilieis com Deus...” (Is 43:10, 12; 44:8; At 1:8; 2Co 5:20) Van Engen coloca estas dimensões em relação ao reino de Deus: “Coinonia, querigma, diaconia e marturia brotam de uma perspectiva mais ampla do reino de Deus num mundo criado, sustentado, governado e redimido por Jesus Cristo, o Rei” (1996, p. 129). Estas quatro áreas, ou poderíamos chamar também de dimensões, formam a base do que a igreja deve realizar no mundo. O seguinte diagrama nos ajuda a entender como estas dimensões funcionam na vida da igreja local em relação à sua missão (1996, p. 124). | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA64 Não perca de vista que o nosso tema é o crescimento integral da igreja e é crucial que ela esteja no mundo em semelhança ao Senhor Jesus Cristo, isto é, de modo encarnacional. Ed Stetzer aprofunda a temática citando Michael Frost e Alan Hirsch: A igreja missional é encarnacional, e não atracional, em sua eclesiologia. Por encarnacional queremos dizer que ela não cria espaços santifi cados para os quais o não crente deva vir para ter um encontro com o evangelho. Pelo contrário, a igreja missional se autodesmonta e penetra pelas fi ssuras e fendas da sociedade para ser Cristo para aqueles que ainda não o conhecem” (212). 65Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Note que o conceito acima vai na contramão do que acontece no Brasil e boa parte do mundo, qual seja, as igrejas criam dezenas de bons programas para os seus membros e incentiva a que os mesmos convidem pessoas para “participarem” ou “assistirem”. Isto tudo dentro das estruturas físicas do templo. A ideia é que alguns permaneçam e eventualmente se tornem membros da comunidade. Quando isso acontece os membros da igreja vão aos poucos esquecendo a vida em missão. A organização eclesiástica é reforçada enquanto o organismo é enfraquecido. A igreja se desenvolve estruturalmente, mas se enfraquece em relação ao contexto em que está inserida. O ideal é que o crescimento da igreja resulte “em milhares de crentes comprometidos que não ingressarão no ministério vocacionado — pastores e missionários —, mas que, em vez disso, entrarão no mercado de trabalho para plantar igrejas nas casas, nas empresas, nos centros comunitários etc.” (Stetzer :221). O desafi o agora é ajudar estas pessoas a enxergarem que foram vocacionadas por Cristo para a vida em missão no momento da conversão e como tal elas não precisam de um chamado “especial” ou “sobrenatural” para engajar-se no ministério encarnacional modelado em Jesus Cristo. Concluindo, iniciamos esta unidade descrevendo os aspectos conceituais de desenvolvimento de Igreja, conforme delineado pelo missiólogo Orlando Costas, quando elabora as quatro dimensões e as três qualidades do crescimento. Na sequência procuramos elaborar com mais profundidade o tema da encarnação. Como a igreja é desafi ada a olhar para a vida e ministério de Jesus Cristo e incentivar, motivar e promover a vida em missão de todos os seus membros. Quando isto acontecer o sal da terra e a luz do mundo serão perceptíveis pelos membros da sociedade. “Uma vez que passamos a ser novas criaturas em Cristo, tornando-nos membros de sua nova sociedade, recebemos dele a responsabilidade de impregnar a velha sociedade, funcionando para esta como sal e luz” (Stott 2005, p. 154). | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA66 Referências bibliográfi cas BRUNNER, Emil. The word and the world. Londres: SCM, 1931. COSTAS, Orlando E. Compromiso y misión. Editorial Caribe, 1979. ______. The integrity of mission: The inner life and outreach of the church. Harper & Row, 1979. ______.“A wholistic concept of church growth.” Exploring Church Growth (1983): 95-107. ______. Teólogo en la encrucijada. In PADILLA, C. René (org.). Hacia una teología evangélica latinoamericana. San Jose (Costa Rica): Editorial Caribe, 1984. HIRSCH, Alan. What do I mean by Incarnational. https://www.facebook.com/notes/alan-hirsch/what-do-i-mean-by- incarnational/10150189514096009 (2011). MACKAY, John. A Preface to Christian Theology. New York: The Macmillan Company, 1943. PEREIRA, Josivaldo de França. Orlando Costas e a Igreja Brasileira. https://ejesus.com.br/orlando-costas-e-a-igreja-brasileira/ POERWOWIDAGDO, Judo. Towards the 21st Century: Challenges and opportunities for theological education. Geneva: World Council of Churches, 1994. STOTT, John. Ouça o Espírito, ouça o mundo. São Paulo: ABU Editora, 2005. VAN ENGEN, Charles. Povo missionário, povo de Deus. São Paulo: Vida Nova, 1996. 67Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | UNIDADE 4 – DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS DA IGREJA Na unidade anterior mencionei que é ideal que o crescimento da igreja resulte “em milhares de crentes comprometidos que não ingressarão no ministério vocacionado [pastores, missionários], mas que, em vez disso, entrarão no mercado de trabalho para plantar igrejas nas casas, nas empresas, nos centros comunitários etc.” (Stetzer, 2015, p. 221). Nesta unidade trataremos dos desafi os que a igreja cristã tem pela frente de se “reinventar” para não perder a sua signifi cância em um mundo que se transforma numa incrível velocidade. Quando a gente pensa que uma coisa foi aprendida e que se terá um tempo para digeri-la outras dezenas ou mesmo centenas de novidades estão nos esperando. Vivemos num mundo novo e precisamos ter ciência disso: A cidade contemporânea, rodeada de tecnologias, vem experimentando diferentes formas de relações sociais entre os seus usuários. As redes sociais digitais possibilitam que os indivíduos interajam com outros usuários da rede, que leiam notícias, opinem, reivindiquem, produzam seu próprio conhecimento, divulguem informações e até mesmo se mobilizem coletivamente. São novas maneiras de compartilhar, usufruir e fazer parte da sociedade em que vivem (Araújo e Vilaça, 2016, p. 18). Notemos acima a frase “produzam seu próprio conhecimento”. Isto será ao uma enorme vantagem para os cristãos, pois o acesso ao saber é ilimitado e necessariamente não se precisa da igreja para isso. Mas, por outro lado, como esses saberes chegarão aos membros de nossas igrejas? Serão sufi cientes para que a pessoa abandone sua comunidade? Enfi m, a pergunta que se faz é: precisamos da igreja no futuro? Se a resposta for não, cabe a igreja se reinventar para que as pessoas voltem a ter necessidade dela. Se a resposta for sim, outra pergunta deve ser feita: a que tipo de igreja as pessoas desejarão fazer parte? | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA68 Esta unidade tentará responder a segunda pergunta ao assumirmos que a igreja ainda tem um papel preponderante a realizar na sociedade brasileira. Tentaremos expor vários modelos que estão sendo utilizados em várias partes do mundo. Lembramos ainda que a contextualização é imprescindível, pois não se pode transferir, como feito no passado, um modelo de um lugar para o outro sem levar em conta a cultura do povo recipiente. Vejamos em mais detalhes alguns desafi os, ideias e conceitos que estão diante de nós como participantes e líderes de igrejas. 4.1. A igreja virtual Com certeza de todas as mudanças nos últimos anos a que mais revolucionou a sociedade em geral e também o mundo das igrejas foi o advento da era digital e mais recentemente a chegada das mídias sociais. Uma nova reunião de crentes está surgindo, uma igreja não no mundo real de tijolos e argamassa, mas no mundo virtual de endereços IP e experiências compartilhadas. Este tipo de igreja, é diferente de qualquer igreja que o mundo já viu. Tem o poder de quebrar barreiras sociais, unir crentes de todo o mundo e construir o reino de Deus com um fi nanciamento no valor da moeda da viúva pobre. É um tipo de igreja completamente diferente de qualquer uma que o mundo já viu (Estes, 2009, s/p). Neste novo cenário, que se renova todos os dias, como será a comunicação do evangelho? Um outro tipo de comunicação, certamente. O seguinte resumo feito por Pierre Lévy (2011, p. 65) explica que os dispositivos comunicacionais podem ser distintos em três categorias: a) Um-todos: em que um centro emissor envia suas mensagens a um grande número de receptores passivos e dispersos (Ex.: a imprensa, o rádio, a televisão); b) Um-um: específi ca de relações recíprocas entre interlocutores, mas apenas para contatos de indivíduo a indivíduo ou ponto a ponto (Ex.: correio, telefone); c) 69Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Todos-todos: quando o ciberespaço torna disponível um dispositivo comunicacional original, já que ele permite que comunidades constituam de forma progressiva e de maneira cooperativa um contexto comum (Ex.: conferência eletrônica, sistemas para ensino ou trabalho cooperativo, World Wide Web) (Silva, 2016, p. 44). Se observarmos o acima exposto podemos classifi car a igreja em duas das categorias mencionadas. Na categoria um-todos a igreja tradicionalmente torna os seus ouvintes em receptores passivos e dispersos. O modelo de culto e de ensino é antigo, similar a um teatro onde no palco se desenvolve o drama e nas cadeiras os ouvintes não interagem com o que está acontecendo a não ser em poucas ocasiões, como no cântico. Na categoria um-um temos o que chamamos de discipulado individual, pessoa a pessoa. Existe interação, todavia, limitada a duas pessoas. Algumas igrejas ainda colocam grande ênfase neste tipo de comunicação. O grande desafi o para as igrejas cristãs está na terceira categoria, o todos-todos. Esta área será onde acontecerá as grandes mudanças da igreja física —simbolizada pelo Templo fi xoa numa localidade — para a igreja virtual — simbolizada pela tenda que se move globalmente. A categoria todos-todos elimina quase toda a hierarquia eclesiástica, pois todos têm voz e podem opinar livremente sem medo de censura. A internet democratizou a fala e não existe mais a menor possibilidade de que isso deixe de ser assim. As comunidades virtuais vão se formar não tem torno de doutrinas, denominações, credos, tradições etc. Elas irão se formar em torno de temas comuns, afi nidades de geração, culturas similares e a cooperação será o grande atrativo destes ajuntamentos. Eis algumas perguntas que são feitas sobre a igreja virtual: a) Qual a teologia da igreja virtual? b) Que tipo de eclesiologia teremos na igreja virtual? c) O que signifi ca ser igreja no mundo virtual? | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA70 d) Qual a razão de ser da igreja virtual? e) Como será a comunhão na igreja virtual? f) O louvor tomará que forma na igreja virtual? g) Que tipo de pastor — ou se haverá pastor — na igreja virtual? h) Como manter os fi éis comprometidos com a igreja virtual? Naturalmente que acima temos um pequeno exemplo das dezenas de perguntas que são feitas sobre a igreja virtual. Talvez a mais importante de todas é se a igreja virtual irá substituir a igreja presencial. A meu ver duas perguntas são cruciais para a igreja virtual. A primeira tem a ver com a vida em missão que discutimos na Unidade 3. Os autores que citamos escreveram antes do advento da internet e tinham um ideal da missio Dei em perspectiva. Qual será a missão da igreja virtual e como se dará essa missão? Sobre a missão, Douglas Estes (2009) diz o seguinte: Outra teoria moderna da igreja argumenta que a orientação da igreja deve ser a igreja como missão. Lesslie Newbigin... argumentou que a igreja é missional em sua própria natureza, não apenas em seu dever. Uma vez que a ideia de Newbigin é uma crítica da igreja Ocidental como império, ela se encaixa bem com o espírito dinâmico das igrejas virtuais envolvendo umnovo mundo sem qualquer vestígio da cristandade. Resta saber como essa missão será desenvolvida. Que tipo de educação cristã será forte o sufi ciente para mover os membros desta igreja virtual para se inserirem no mundo como sal e luz? Todavia, pensando na igreja presencial talvez não seja muito diferente, pois tem sido uma tremenda luta incutir nos fi éis o compromisso missional. No livro de Douglas Estes não encontrei o termo encarnacional. A pergunta seria então como levar os membros da igreja virtual a encarnarem-se em seus contextos de forma a representar a pessoa de Cristo. Uma das igrejas mais conhecidas na internet é a ALM CyberChurch. Em sua página eletrônica o visitante tem a seguinte informação sobre a igreja: 71Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Nosso objetivo é romper a religião e as tradições e mitos feitos pelo homem e os métodos que nos levam a acreditar que a fi cção é a realidade para que possamos acreditar no máximo de coisas verdadeiras e no menor número possível de coisas falsas. Promovemos amor, empatia, aceitação e boa vontade, independentemente de crenças, identidade de gênero e estilo de vida. Venha como você está e seja amado! O visitante é convidado a escolher um nome para ser identifi cado, um avatar que o represente, e observar o culto. Poderá também, se quiser, se engajar em algum tipo de conversação via chat. Um “frequentador” desta igreja disse: “Eu já estive em muitas igrejas na vida real e nenhuma me deu tanta satisfação como na igreja virtual” (Johnson, 2010, p. 248). A igreja virtual existe e veio para fi car. Para encerrar este tema apresento a contribuição de Monsenhor Tarcisio Justino Loro (2009, p. 140-144). Ele entende que a missão evangelizadora da igreja, via internet, deveria estar atenta aos seguintes elementos, que descrevo apenas como tópicos sem entrar em maiores discussões: a) Utilização do diálogo. b) Utilização de uma linguagem evangelizadora nova. c) Nova postura dos internautas missionários. d) Novos conteúdos. Vivemos numa sociedade sedenta de Deus, de orientação, do sentido da vida. e) Banco de dados da fé cristã. Como quase tudo do campo secular pode ser encontrado na Internet, assim também é de se desejar que a ela seja um “depositum” de informações e conteúdos sobre a fé cristã. f) Os novos pagãos nas ondas da Internet. Com a Internet surgem novos “pagãos” individuais ou coletivos escondidos nos milhares de computadores do mundo. A igreja virtual não precisa ser vista como uma competidora da igreja presencial. Se pensarmos em termos de desenvolvimento integral da igreja | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA72 as possibilidades são imensas. Qualquer igreja local poderá, com criatividade e uso dos dons e talentos, especialmente da juventude, ter também a sua versão virtual. Assim, ela ocupa os vários espaços que da sociedade. O campo está branco para a ceifa e para isso é preciso levantar os olhos do lugar comum e ver: “Vocês costumam dizer: ‘Daqui a quatro meses teremos a colheita.’ Mas olhem e vejam bem os campos: o que foi plantado já está maduro e pronto para a colheita” (Jo 4:35). Se fi zéssemos uma tradução desse texto para hoje, poderia ser assim: “Vocês costumam dizer: ‘Está difícil trazer gente para igreja.’ Mas olhem e vejam bem a Internet: o que foi inventado já está disponível e pronto para a colheita”. Uma nova leitura da Grande Comissão poderia começar assim: “Portanto, naveguem por toda a internet e façam curtidores...”. Exercício de Fixação - 16 Na igreja virtual existem dispositivos comunicacionais que podem ser diferentes em três categorias: Um-um; Um-todos; Todos-todos. A igreja, por sua vez, pode ser classifi cada nessas três categorias. É correto afi rmar que a igreja classifi cada na categoria todos-todos contém a seguinte característica: I – a igreja todos-todos torna seus ouvintes em receptores passivos e dispersos. II – a igreja todos-todos possui o discipulado individual, de pessoa a pessoa. III – a igreja todos-todos elimina quase toda a hierarquia eclesiástica. Assinale a alternativa correta: a) I e III estão corretas. b) II e I estão corretas. c) II e III estão corretas. d) apenas a III está correta. e) nenhuma das alternativas estão corretas. 73Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | 4.2. A igreja lar Talvez, de todas as formas de igreja a comunidade que se reúne nos lares seja a mais antiga. O cristianismo que começa parecendo uma divisão do judaísmo, vai aos poucos tomando vida própria, todavia, por ser emergente, não possuía nenhuma estrutura pronta para recebê-lo. Ele era também um movimento, primordialmente, que ocorria entre as camadas mais pobres da população. Outro fator determinante é que ele existia às margens do Império Romano e, portanto, sem muitas condições de realizar reuniões em espaços públicos. Mesmo tendo iniciado com reuniões próximas ao templo (At 2:46), vemos que as casas foram se tornando a alternativa mais viável para as reuniões (At 5:42). Muitas casas possuíam um cômodo chamado cenáculo e que era utilizado para esses encontros. Saiba mais Cenáculo é a palavra utilizada para se referir a sala onde eram feitas as refeições ou a um quarto no primeiro andar de uma casa onde era utilizado como aposento de hóspedes desde tempos imemoriais. A palavra cenáculo não aparece originalmente na Bíblia. Na verdade, essa palavra vem do latim cenaculum, e é utilizada nos textos bíblicos para traduzir algumas palavras hebraicas e gregas. Basicamente, a palavra cenáculo signifi ca algo como “sala de refeições”, ou, de modo mais genérico, “quarto no andar superior de uma casa”. Essa palavra é derivada do termo latino cena, que signifi ca “jantar” ou “ceia”. A seguir, veremos alguns termos em que a palavra cenáculo é utilizada como tradução. Nos Evangelhos, cenáculo traduz a palavra grega anogeon, que se refere ao local que foi providenciado para que Jesus celebrasse a Páscoa acompanhado de seus discípulos. Esse local foi onde Cristo realizou a Última Ceia, às vésperas de sua crucifi cação. Tratava-se de um quarto no primeiro andar mobiliado, onde havia leitos baixos em que os participantes se reclinavam para cear conforme o estilo greco-romano (Mc 14:15; Lc 22:12). Muitos acreditam que o cenáculo mobiliado utilizado nesse episódio era originalmente uma | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA74 sinagoga, que acabou se tornando um ponto de encontro entre os primeiros cristãos. Daniel Conegero. O Que é Cenáculo e o Que Signifi ca? https://estiloadoracao.com/o-que-signifi ca-cenaculo/ Um pouco mais além desse começo, somos informados que Paulo — então Saulo —, “assolava a igreja, entrando pelas casas; e, arrastando homens e mulheres, os encerrava na prisão” (At 8:3). Após a sua conversão ele foi levado para a casa de Judas onde foi batizado por Ananias (At 9:12-19). Em uma de suas viagens ele tem um encontro com Lídia, responsável por uma casa-igreja na cidade de Tiatira (At 16:14-15). Mais tarde durante o desenvolvimento de seu ministério, muitas igrejas- casas foram estabelecidas: • Saudai também a igreja que está em sua casa. Saudai a Epêneto, meu amado, que é as primícias da Acáia em Cristo (Rm 16:5). • As igrejas da Ásia vos saúdam. Saúdam-vos afetuosamente no Senhor áqüila e Priscila, com a igreja que está em sua casa (1Co 16:19). • Saudai aos irmãos que estão em Laodicéia e a Ninfa e à igreja que está em sua casa (Cl 4:15). • E à nossa amada Áfia, e a Arquipo, nosso camarada, e à igreja que está em tua casa (Fl 1:2). Na história do cristianismo talvez o movimento que mais utilizou a reunião nas casas foi o metodismo. As classes formadas por John Wesley foram assim descritas: “Cada classe era guiada por um líder responsável por convocar a classe semanalmente, recebendo contribuições para o alívio dos pobres, investigando a vida espiritual de cada membro e oferecendo conselhos e orientações espirituais, conforme necessário” (Watson, 2014, p. 3). Recentementea igreja-casa ganhou grande ímpeto no Brasil e passou a ser chamada de célula familiar que é um novo nome para os cultos nos lares, reunião doméstica etc. É inegável que este movimento cresceu muito e está presente em quase todas as igrejas de médio e grande 75Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | porte. A diferença do passado é que existe hoje todo um aparato para consolidar e fazer esse ministério funcionar. A pergunta central recai sobre o objetivo destas células. Assim como perguntamos qual é a razão de ser da igreja, também devemos perguntar qual é a razão de ser de uma célula familiar? Os objetivos são os mais variados: evangelização, discipulado, comunhão e ajuda mútua. Avaliar se as células estão realizando um bom ministério não é tão fácil e muitas vezes ela fi ca limitada ao crescimento numérico. Os líderes são muitas vezes pressionados para multiplicar as células e depois promover a sua divisão e ocupam grande parte do tempo devotados aos membros de seus grupos. A crítica que tenho em relação a esse movimento é que, de maneira geral, as células (1) não são transformadas em igreja e (2) são reuniões privadas nos lares dos crentes com pouca exposição nos bairros. O segundo aspecto é mais fácil de solucionar. Para isso, bastaria que as lideranças das igrejas as entendessem como missionais e, assim, cada célula também seria missional. Cada grupo poderia ser transformado em agente de transformação do bairro onde está inserido. É possível que dependendo do tamanho da igreja haja em um determinado local da cidade mais de uma célula. Assim, seria relativamente fácil juntar estas células com o objetivo de promover a obra diaconal onde estão. O foco deve ser direcionado para juntar-se a Deus em sua missão. Cada grupo precisa de uma missão além de si mesmo. Lembre-se de que todo cristão nascido de novo é responsável pelo mundo. O crescimento e a maturidade acontecem tanto na missão quanto no conhecimento. Quanto mais você pode aprender sobre a missão? Como você pode dizer que está crescendo e amadurecendo em sua fé se não está em missão (Stetzer e Queiroz, 2017). Naturalmente, como advertem Stetzer e Queiroz, uma consequência trágica dessa falta de perspectiva da missão poderá ser a seguinte: “Grupos pequenos que se voltam apenas para si mesmos e não se preocupam com o evangelismo ou com o serviço amoroso ao próximo correm o risco de se tornar meros clubes sociais”. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA76 Vimos acima na descrição das classes de Wesley que o grupo coletava ofertas para aliviar o sofrimento dos pobres. O metodismo, dentre outros movimentos, nos legou essa história de compaixão e solidariedade: O envolvimento do metodismo com as questões relevantes da sociedade é uma marca que o acompanha desde seu início. A humanização dos presídios, o combate à escravidão, a luta por salários dignos para os operários, o fornecimento de ensino básico para as crianças pobres, distinguiram os metodistas quando ocorreu a assim chamada Revolução Industrial, na Inglaterra (Marques). Voltemos nossa atenção para aquilo que parecer ser o maior desafi o das grandes igrejas que adotam as células: permitir que certo número de células em uma determinada região da cidade possa se juntar e estabelecer uma nova igreja. Certamente, uma igreja estabelecida tem muito mais visibilidade e importância em um bairro do que cinco células “escondidas” em casas. Caso a igreja não deseje “perder esses membros” e nem a arrecadação que eles trazem, ela pode pensar em uma alternativa: constituir igreja satélites. Assim, estas igrejas menores continuariam a fazer parte do ministério da igreja maior e seus pastores participariam de um corpo pastoral. A primeira onda, que foi a implantação das células no Brasil deve agora caminhar para a segunda onda, que seria inserir as células no contexto diaconal e eventualmente permitir que se transformem em igrejas. Exercício de Aplicação - 17 Sobre o signifi cado da palavra cenáculo é correto afi rmar: Era um quarto no subsolo das casas dos cristãos para as reuniões secretas por causa da perseguição do Império Romano. Foi num lugar como esse que Jesus Cristo realizou a última Ceia, às vésperas de sua crucifi cação. Assinale ‘Verdadeira’ ou ‘Falsa’. 77Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | 4.3. A igreja multimundo Vivemos na era da diversidade. Talvez nunca tenhamos tido um período na história do mundo como o dos dias atuais. Tudo gira em torno da palavra “multi”. O prefi xo multi dá origem a uma infi nidade de termos. Muitos deles já existiam, todavia, novos foram criados. Mas, não é nem tanto a quantidade de palavras, mas o sentido novo que multi traz. Neste multimundo a igreja terá que encontrar seu espaço. Normalmente, a igreja prefere fi car à margem da estrada do novo. A igreja sempre teve difi culdade com o diferente, com a pessoa que não se enquadra no estereótipo do que signifi ca ser “crente”. Já faz tempo que os cristãos são conhecidos não por aquilo que fazem, mas, especialmente, por aquilo que não fazem. Assim, quem faz alguma coisa que a igreja não permite, ou muda ou não é aceito na comunidade. Como isto acontece no novo multimundo onde o que predomina é o multiculturalismo? Saiba mais O que é Multiculturalismo: O multiculturalismo é a convivência pacífi ca de várias culturas em um mesmo ambiente. É um fenômeno social diretamente relacionado com a globalização e as sociedades pós-modernas. O Canadá e o Brasil, por exemplo, são países multiculturais. Muito devido aos diferentes grupos de imigrantes recebidos, mas também por observar outros fatores de integração, como a não subordinação a cultura dominante, e desenvolvimento de novas culturas a partir do choque cultural inicial. O multiculturalismo também pode ser chamado de multiculturalidade e pluralismo cultural, e é um conceito da sociologia aplicado aos estudos em ciências sociais. A ideia de um grupo multicultural pressupõe que os grupos culturais estariam | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA78 cada vez mais interligados, em função do crescente contato que as culturas têm entre si e a quase inexistência de grupos isolados. A questão é correntemente debatida entre antropólogos e sociólogos de diferentes linhas de pensamento. Alguns estudiosos acreditam que esta visão multicultural não existe, e que houve uma imposição da cultura dominante com a chegada dos europeus, que teria culminado terminantemente com a hegemonização da globalização. Já outros pensadores veem diversos traços multiétnicos e defendem a existência das múltiplas culturas no continente americano, e que habitam em harmonia justamente em função da possibilidade das relações globais. O conceito de multiculturalismo tem grande infl uência do relativismo cultural, que questiona a ideia de que os hábitos e costumes de um grupo poderiam ser superiores a outros. Esta ideia de que as culturas são diversas e devem ser respeitadas na sua essência, sem existir um certo ou errado nos costumes, é a base do multiculturalismo Multiculturalismo no Brasil O Multiculturalismo no Brasil é diretamente associado ao processo migratório desde a chegada dos portugueses em 1500. A princípio houve o choque natural, mas sabe-se que vários costumes indígenas foram incorporados aos hábitos dos portugueses, como o banho diário, por exemplo. Ao longo dos séculos, o território brasileiro recebeu holandeses, franceses, espanhóis, italianos, japoneses, alemães. E na pós-modernidade, esta mistura de etnias só aumenta no nosso país. Internacionalmente o Brasil é conhecido por ser um dos países que melhor recebe seus visitantes, tentando adequar-se para receber bem as culturas alheias sem deixar de lado os costumes locais. A diversidade étnica dos próprios brasileiros é outra forte característica multicultural. As diferentes cores de pele, os diversos costumes compartilhados, a liberdade de credo religioso, tudo isso faz parte doconjunto multicultural. Fonte: https://www.signifi cados.com.br/multiculturalismo/ 79Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Neste contexto multicultural, cuja tendência é aumentar, surgem várias oportunidades de vida em missão para a igreja. Naturalmente que será necessária uma intencionalidade para ministrar no multimundo. Os ministérios não vão acontecer sem que a liderança mova a igreja nesta direção. A pergunta é se a liderança quer que isto aconteça. Há dois empecilhos que podem atrapalhar a marcha do desenvolvimento integral da igreja no multiculturalismo. O primeiro é teológico. A igreja demora para entender sua missão na terra. Ela pensa, fruto da má formação teológica de sua liderança, que é responsável em promover mudanças na vida das pessoas. Como dito acima, quando alguém não se enquadra no padrão vigente do que é ser crente e não manifesta as esperadas adaptações, pelo menos esteticamente, essa pessoa não será aceita na comunidade com a justifi cativa de que “Deus não aceita” ou “Deus não gosta”. Essa percepção teológica-religiosa não aceita que as necessárias mudanças na vida da pessoa convertida sejam realizadas pelo poder do Espírito Santo no tempo de Deus e não no tempo da igreja. Paulo fala sobre isso em suas cartas: “[...] porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2:13) e, “Mas, pela graça de Deus, sou o que sou. E a sua graça para comigo não foi inútil [...]” (1Co 15:10). Essa argumentação me parece sufi ciente para mostrar que é Deus e não a igreja que produz a nova humanidade em cada um de nós. O segundo empecilho que pode atrapalhar o desenvolvimento da igreja no multiculturalismo é o geracional. A maioria absoluta das denominações evangélicas tem uma grande quantidade de igrejas locais que são dirigidas e pastoreadas por pessoas com imensas difi culdades em aceitar o novo. Pessoas que não conseguem acompanhar os novos tempos e as mudanças que a nova sociedade traz todos os dias. Dizem que o evangelho é o mesmo e é assim que tem que ser. O problema não é o evangelho, que, sim, é o mesmo, mas a relutância em colocar o evangelho em outros moldes que não sejam aqueles do século passado ou de quando os missionários estrangeiros pisaram em solo brasileiro. A esperança é que surja uma nova geração de líderes, homens e mulheres, jovens e adolescentes, advindos todas as culturas e camadas | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA80 da sociedade que consigam dialogar com esta geração multicultural. Caso a geração antiga não consiga entender isso, fi cará ela só com a sua igreja porque os novos partirão para outros tipos de ministérios. No mundo dos negócios estudos são feitos em como trabalhar em ambientes multiculturais e geracionais: “Compreensão geracional é o novo treinamento sobre diversidade“, diz Sharalyn Orr, diretora executiva da Frank N. Magid Associates, empresa que realizou uma pesquisa que revelou que 52% dos profi ssionais afi rmam que são menos propensos a se relacionar bem com pessoas de outras gerações. Trabalhar com pessoas de todas as idades tornou-se essencial no ambiente multigeracional de hoje, uma vez que o mercado de trabalho hoje é composto por três ou mais gerações, construindo um ambiente de pluralidade como nunca visto antes. Isto signifi ca dizer que os membros de nossas igrejas já estão inseridos neste novo mundo. Portanto, se no mundo dos negócios os nossos crentes podem viver e conviver com os diferentes, por que não trazem esta mesma disposição para dentro das igrejas? Exercício de Reflexão - 18 Há dois empecilhos que podem atrapalhar a marcha do desenvolvimento integral da igreja no multiculturalismo: o teológico e o geracional. Discorra refl exivamente sobre estes dois empecilhos. 4.4. A igreja emergente O termo igreja emergente já está conosco há algum tempo. Nem sempre é fácil entender o que isto signifi ca. É necessário estudar o tema e entender o que deve e pode ser adequado ao contexto da vida em missão. As 81Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | defi nições abaixo são de pessoas que estão atuando ministerialmente com base nesta ideia: • Entendo Igreja Emergente como uma oportunidade de se fazer livremente perguntas incômodas à luz do evangelho de Jesus Cristo, repensar nossa forma cristã de ser tirando a infl uência do pensamento moderno que nos moldou e viver essa nova realidade, seja anunciando o Reino de Jesus Cristo a uma sociedade pós-moderna que está longe de ser alcançada pela igreja tradicional, seja curando esse mundo que ainda espera por uma redenção que somente Jesus Cristo pode dar (Luis Fernando – criador do RenovatioCafe) • Igrejas emergentes são comunidades que praticam o modo de vida de Jesus na cultura brasileira (Gustavo Frederico – criador do wiki Emergente) • A igreja emergente é um termo semelhante ao termo reforma. Não há unidade teológica, como não havia entre os diferentes movimentos reformadores protestantes…É verdade que existe um tema principal para o movimento emergente…E esse tema é: A igreja como agente missiológico na terra, livre de instituição e hierarquias, simples, um organismo vivo cuja cabeça é Jesus, e onde a vida cristã é uma vida de comunidade e de compartilhamento (Nuno Barreto – autor do blog Simplice) Fonte: https://servosdedeus.com/artigos/igreja-emergente-com-br A igreja emergente surge no contexto que descremos acima, o multiculturalismo. Neste ambiente as possibilidades de ministração são múltiplas, pois procura alcançar as pessoas nos lugares onde se encontram e não dentro dos templos das igrejas. Alguns exemplos para refl etirmos a viabilidade ou não de tais projetos. a. Cafés e confeitarias Locais agradáveis em que as pessoas podem ter momentos de lazer e convivência. A cortesia do serviço deve espalhar os valores de Cristo. Literatura com bom apelo visual e conteúdo cristão será disponibilizada. Uma ilustração deste ministério que está em funcionamento desde 2006: | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA82 Somos a Ebenezers Coffeehouse e servimos café com uma causa. Todo o nosso café é negociado de maneira razoável e também temos muitas opções de cultivo orgânico e à sombra. Para obter mais informações sobre comércio justo e nosso café, confi ra nossa torrefadora principal, One Village Coffee. Somos de propriedade e mantidos pela National Community Church e todos os lucros são direcionados aos nossos projetos de extensão comunitária, local e internacionalmente ( h t t p s : / / e b e n e z e r s c o f f e e h o u s e . c o m / s t o r y ) . Ainda no aspecto da gastronomia é interessante ver o ressurgimento, por parte especialmente dos homens, do desejo de se aprender a arte da culinária. Quase todas as igrejas têm cozinhas que fi cam sem utilidade ao longo do ano. Seria interessante montar cursos de culinária aos sábados ou outro dia da semana. Certamente isso atrairia muitas pessoas interessadas nesse tipo de atividade. b. Igreja Multiespaços Especialmente nos Estados Unidos é muito comum ter megaigrejas que funcionam em várias localidades ao mesmo tempo. O culto é transmitido desde a igreja sede para várias localidades. Nestes locais há um pastor e uma equipe de louvor que conduzem o culto até o momento da mensagem em que passam a assistir aquilo que é transmitido pela igreja sede. Naturalmente, este tipo de funcionamento exige um grande investimento em recursos humanos e fi nanceiros devido à complexidade da estrutura necessária. O Grupo Barna fez uma pesquisa com igrejas que optaram por este tipo de organização e obtiveram o seguinte resultado: • 44% disseram que foi mais difícil do que previram; • 50% disseram que fi cou dentro da expectativa; • 6% disseram que foi mais fácil do que previram. 83Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | No entanto, é importante ressaltar que como este tipo de estrutura multiespaços exige um alto grau de compromisso dos voluntários, muitasvezes, passado o entusiasmo inicial, as igrejas acabam por desistindo do projeto. c. ONG Existem centenas de ONG cristãs espalhadas pelas cidades do Brasil. A maioria absoluta dependente de ofertas e trabalhos voluntários. Muitos espaços destas ONG podem ser usados como locais de aconselhamento, consolo e demonstração de solidariedade. Além disso, esses espaços podem ser usados como locais para cultos, estudos bíblicos e momentos de louvor. Na cidade de Londrina, fruto da educação teológica na FTSA, o casal Sérgio e Clarissa Sanchez começaram a ONG Tok de Amor que provê assistência para pacientes com câncer e seus familiares durante cinco dias na semana. Por meio da ONG o casal já alcançou e tocou centenas de vidas com o amor de Deus (https://www.tokdeamor.org). Qualquer igreja pode adotar uma ONG e incentivar seus membros a serem voluntários para auxiliar o trabalho, apoiar com alimentos e fi nanças e assim ministrar às pessoas atendidas. d. Arte, artesanato, moda A arte sempre foi apaixonante para muitas pessoas e, nos últimos tempos, aliada ao lazer e terapia, elas estão descobrindo ou redescobrindo um amor por ela. Muitas igrejas têm espaços ociosos que poderiam ser usados como ofi cinas de arte. Há muitas mulheres e homens que poderiam ensinar alguma modalidade de arte. Certamente, o tempo e a convivência durante as atividades tornam-se preciosos para compartilhar o evangelho de Cristo. Outra ideia é usar a arte como projeto social, para atrair crianças, pessoas da terceira idade e, também, de baixa renda com poucas opções de lazer. Outra opção é usar os espaços de escolas, tanto públicas como particulares, para este ministério. Um espaço para artes, poesia, música etc. Lembremo-nos que o autor de toda a criação é o nosso Deus. | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA84 e. Esportes O brasileiro, em geral, é afi cionado por esportes. Existe hoje um apelo muito grande para o fi tness: saúde integral, prevenção, qualidade de vida, etc. Em qualquer igreja é possível organizar grupos para atividades como caminhar, correr, pedalar, futebol, vôlei etc. Podemos convidar amigos para a prática coletiva destas atividades. Devemos ter em mente que, talvez, estas pessoas não se juntem à igreja, mas, certamente, estarão mais abertas a ouvir o evangelho, frequentar alguma atividade especial. Outra ideia é usar as dependências da igreja para ensinar jogos de xadrez, dama, dominó, etc. Também, outra atividade bem simples e fácil de realizar é convidar os vizinhos da comunidade para a prática de exercícios de alongamento. Pessoas da terceira são um público alvo típico. f. Outras ideias • Musicalização para todas as faixas etárias. • Leitura pública de livros tanto para adultos como infantil. • Leitura e canto nos hospitais, praças, casa de idosos. • Biblioteca e empréstimo de livros para comunidades carentes. • Ensino de corte e costura. • Reforço escolar. • Educação continuada para adultos. • Qualifi car jovens para o mercado de trabalho g. Novos locais para se reunir como igreja • Salão sociais de prédios residenciais. • Auditórios de hotéis. • Shopping centers. • Escritórios. • Empresas, indústrias, lojas comerciais. • Padarias, confeitarias, restaurantes. • Parques, jardins. 85Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Algo que também será defi nitivo na busca de novas formas de ser igreja: a questão fi nanceira. O mundo de hoje caminha na direção do estilo de vida simples, minimalista. Portanto, creio que o tempo de construir grandes templos com alto grau de investimento fi nanceiro para a sua manutenção vai fi cando para trás. Exercício de Aplicação - 19 Sobre a igreja emergente é correto afi rmar que ela possui duas características bem peculiares: a) são igrejas surgidas dentro do multiculturalismo; b) são igrejas que procuram alcançar as pessoas nos ambientes onde elas se encontram e não dentro dos templos das igrejas. Assinale ‘Verdadeira’ ou ‘Falsa’. 4.5. A igreja pós-moderna Estamos vendo até agora algumas ideias sobre como o desenvolvimento da igreja pode se dar nos dias de hoje. Para alguns estudiosos, estamos num período que pode ser chamado de pós-moderno. Para outros, já passamos desse momento e estamos em outro momento “pós” na história: Pós-modernidade, modernidade líquida, modernidade em um estágio ‘avançado’. Não importa qual termo seja utilizado, é notável que há na contemporaneidade uma série de transformações em setores tão diversos como o social, o econômico e o artístico, todas compreendidas em algum desses termos (Freitas, 2012, p. 68). Outra maneira de compreender o termo: Não há como buscar uma verdade que se chama pósmodernidade. Mas há, sim, como colocar em evidência a construção de sentido sobre um processo de recomposição de diversos elementos (políticos econômicos, culturais, religiosos etc.), que leva à emergência do que se tem chamado hoje de pósmodernidade (Esperandio, 2007, p. 9). | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA86 Por ser complexa a nossa era, para a igreja é sempre importante fazer uma leitura do seu tempo. Por isso, a célebre referência a Karl Barth sobre “ler a Bíblia e o jornal”. Isto signifi ca estar constantemente atento ao que se passa na sociedade. É impressionante como a igreja está alheia ao que acontece no mundo. Frequentamos os cultos e podemos perceber o quanto estão divorciados da realidade que o povo sentado nos bancos está vivenciando. Para muitos, não interessa o que acontece na cidade, no país e no mundo; os sermões não tratam sobre isto. Muitas vezes, face a grandes tragédias nem orações são feitas pedindo o consolo de Deus. Uma igreja assim, tão alheia, tão insensível, terá capacidade de olhar para o mundo e tentar dialogar de forma respeitosa para apresentar o evangelho? Por isso, olhemos um pouco para a nossa sociedade tão diversa e plural com o desafi o de fazer desse povo discípulos de Jesus Cristo. Saiba mais Guilherme Kerr compôs uma canção chamada Unidade e diversidade que nos motiva a pensar numa multidão desorientada e sem pastor como o próprio Jesus nos oferece o modelo (Mt 9:36). h� ps://www.youtube.com/watch?v=lpO2q-mCibQ Como afi rmei, lendo os estudiosos do pós-modernismo podemos perceber que as ideias e refl exões sobre o tema são bem diversas. Como engajar os cristãos na vida em missão neste contexto? Como encarnar Jesus Cristo numa sociedade como a atual? Um desafi o que a igreja enfrentará é a mudança de paradigma. 87Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | Saiba mais Paradigma é um modelo ou padrão a seguir. Etimologicamente, este termo tem origem no grego paradeigma que signifi ca modelo ou padrão, correspondendo a algo que vai servir de modelo ou exemplo a ser seguido em determinada situação. São as normas orientadoras de um grupo que estabelecem limites e que determinam como um indivíduo deve agir dentro desses limites. O termo surgiu inicialmente em Linguística na teoria do signo linguístico criada por Ferdinand de Saussure, na qual relacionava o signo ao conjunto de elementos que constituem a língua. O paradigma seria o conjunto de elementos linguísticos que podem ocorrer no mesmo contexto ou ambiente. Os elementos são substituídos por outros que vão ocupar a mesma posição. Na fi losofi a, um paradigma está relacionado com a epistemologia, sendo que para Platão, um paradigma remete para um modelo relacionado com o mundo exemplar das ideias, do qual faz parte o mundo sensível. O norte-americano Thomas Samuel Kuhn (1922-1996), físico e fi lósofo da ciência, no seu livro “A Estrutura das Revoluções Científi cas” designou como paradigma as “realizações científi cas que geram modelos que, por período mais ou menos longo e de modo mais ou menos explícito, orientam o desenvolvimento posterior das pesquisas exclusivamente na busca da solução para os problemas por elas suscitados.” Fonte: “Signifi cado de paradigma” In https://www.signifi cados.com.br/ paradigma/ A igreja precisará entãosubstituir os moldes que ela usou por gerações, naturalmente preservando os princípios ou a essência do conteúdo, para alcançar o povo deste tempo. A difi culdade é que a igreja sempre vê o diferente como errado e ela quer que o outro se adeque a ela. Isso não vai mais funcionar. A sociedade seguirá seu curso, pois aos seus próprios olhos está indo bem. Arnold Toynbee em 1954 já falava que “a | Desenvolvimento integral da igreja | FTSA88 longo prazo só uma religião universal — que seria necessariamente uma fé sincrética — poderia garantir o futuro do planeta” (Esperandio, 2007, p. 34). Será nesta direção que caminha o mundo hoje: a sincretização da fé? É a igreja que precisa participar da sociedade. Ela possui uma mensagem e uma missão, afi nal todas as pessoas precisam de Deus. Portanto, cabe a igreja buscar meios e recursos para que isso aconteça. Se ela não o fi zer, falará apenas para os seus membros e ainda cuidando para não os perder como tem sido o caso. Concluindo, a cultura brasileira valoriza a comunhão e os fortes laços de relacionamentos. Por isso, torna-se altamente atrativo construí-los. Esse deverá ser o segredo de qualquer expansão da igreja nos dias atuais e futuros. Por mais que a sociedade se torne virtual, multicultural ou pós- moderna nada irá superar o contato e o convívio pessoal. Isto será ainda maior forte em lugares como o Brasil e a América Latina. Os ministérios que valorizarem os relacionamentos serão mais efetivos e encontrarão as pessoas mais abertas para ouvirem sobre Cristo e a salvação que ele promove. O papel da comunhão na igreja do futuro talvez seja uma das poucas coisas que atrairão pessoas para a comunidade dos fi éis. É necessário renovar a nossa fé e confiança que Deus está no controle da história e no controle da igreja. É necessário ousar e usar toda a criatividade do Deus Criador dos céus e da terra. É necessário o compromisso sério com os valores do reino para que se cumpra a profecia de Habacuque 2:14: “E a terra fi cará cheia do conhecimento da glória do Senhor, assim como as águas enchem o mar”. Exercício de Fixação - 20 Sobre a defi nição da palavra multiculturalismo é correto afi rmar: I – multiculturalismo é um fenômeno social diretamente relacionado somente com a globalização, mas não com as sociedades pós-modernas. II – multiculturalismo é a convivência confl ituosa de várias culturas num mesmo ambiente. III – multiculturalismo é um conceito da sociologia aplicado aos 89Desenvolvimento integral da igreja | FTSA | estudos em ciências sociais. IV – multiculturalismo não pode ser chamado de multiculturalidade e pluralismo cultural porque os termos diferem entre si. V - O multiculturalismo é a convivência pacífi ca de várias culturas em um mesmo ambiente. Assinale as alternativas corretas: a) I, II e III estão corretas. b) III, IV e V estão corretas. c) II e IV estão corretas. d) III e V estão corretas. e) nenhuma das alternativas estão corretas. Referências bibliográfi cas: Araujo. Elaine Vasquez Ferreira de. e Márcio Luiz Corrêa Vilaça. Sociedade Conectada: tecnologia, cidadania e infoinclusão. “Tecnologia, sociedade e educação na era digital.” VILAÇA, Márcio Luiz Corrêa, and Elaine Vasquez Ferreira de ARAÚJO (Orgs). Duque de Caxias: UNIGRANRIO (2016). Barna Group. 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