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Autora: Profa. Carolina Menezes Ferreira Colaboradores: Profa. Mônica Teixeira Prof. Welliton Donizeti Popolim Planejamento de Cardápios nos Ciclos da Vida Professora conteudista: Carolina Menezes Ferreira É doutora em Informação e Comunicação em Saúde (FioCruz/2016) e foi investigadora convidada do Institut de la Comunicació (Incom) da Universitat Autònoma de Barcelona (UAB/2015), na Espanha, como parte integrante do doutorado sanduíche. Integrou o grupo de pesquisa CNPq na linha em Saúde e Mídia (ICICT – Fiocruz/2014-2016). É mestre em Saúde Pública (USP/2006) e tem master em Marketing de Alimentos, Venda e Consumo no Âmbito Internacional (Cesma – Madrid/2008). É especialista em Fisiologia do Exercício (Unifesp/2005) e graduada em Nutrição (UNI-BH/2003) e em Comunicação Social (UNIP/2011). Atualmente faz pós-graduação em Gastronomia Funcional (Famesp). Atua como revisora da revista Journal of Health Sciences Institute (JHSI-UNIP) desde 2016 e como docente em cursos universitários em Saúde Humana desde 2005. É professora titular na Universidade Paulista e consultora em Comunicação em Saúde com experiência na área de nutrição e comunicação. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) F383p Ferreira, Carolina Menezes. Planejamento de Cardápios nos Ciclos da Vida / Carolina Menezes Ferreira. – São Paulo: Editora Sol, 2020. 176 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Planejamento alimentar. 2. Planejamento dietético. 3. Ciclos da vida. I. Título. CDU 642.09 U508.77 – 20 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Giovanna Oliveira Jaci Albuquerque de Paula Sumário Planejamento de Cardápios nos Ciclos da Vida APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS DA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL: CONCEITOS E DESAFIOS PARA O PLANEJAMENTO ALIMENTAR ......................................................................................................... 11 1.1 Os guias alimentares ........................................................................................................................... 13 1.2 Dos alimentos à refeição ................................................................................................................... 17 1.2.1 Café da manhã ......................................................................................................................................... 18 1.2.2 Almoço e jantar ....................................................................................................................................... 19 1.2.3 Pequenas refeições ................................................................................................................................. 20 1.3 O ato de comer e a comensalidade............................................................................................... 20 1.4 Compreendendo e superando obstáculos .................................................................................. 22 1.4.1 Informação ................................................................................................................................................ 23 1.4.2 Olhar crítico .............................................................................................................................................. 23 1.4.3 Oferta ........................................................................................................................................................... 23 1.4.4 Custo ............................................................................................................................................................ 24 1.4.5 Habilidades culinárias ........................................................................................................................... 24 1.4.6 Tempo .......................................................................................................................................................... 25 1.4.7 Os 10 passos da alimentação saudável .......................................................................................... 25 2 PLANEJAMENTO DIETÉTICO: PRINCÍPIOS E FERRAMENTAS ........................................................... 26 2.1 Conceitos em dietética ...................................................................................................................... 26 2.2 Fundamentos do planejamento de cardápios .......................................................................... 27 2.3 Os grupos de alimentos ..................................................................................................................... 27 2.3.1 Grupo dos feijões .................................................................................................................................... 28 2.3.2 Grupo dos cereais ................................................................................................................................... 28 2.3.3 Grupo das raízes e tubérculos ........................................................................................................... 28 2.3.4 Grupo dos legumes e verduras (hortaliças).................................................................................. 28 2.3.5 Grupo das frutas ..................................................................................................................................... 29 2.3.6 Grupo das castanhas e nozes (oleaginosas) ................................................................................ 30 2.3.7 Grupo do leite e dos queijos .............................................................................................................. 30 2.3.8 Grupo das carnes e ovos ...................................................................................................................... 30 2.3.9 A importância da ingestão diária de água ................................................................................... 31 2.4 Planejamento alimentar e os grupos de alimentos ............................................................... 32 2.5 Escolhas alimentares saudáveis ...................................................................................................... 33 2.5.1 Alimento fonte ......................................................................................................................................... 34 2.6 Densidade energética ......................................................................................................................... 35 2.7 As tabelas de composição nutricional .........................................................................................36 2.7.1 As tabelas de composição nutricional e o planejamento dietético ................................... 36 2.8 Planejamento dietético: cálculos e necessidades nutricionais .......................................... 38 2.8.1 O gasto energético total (GET) e seus componentes ............................................................... 38 2.9 Passo a passo para o planejamento dietético ........................................................................... 40 3 RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS E O PLANEJAMENTO DIETÉTICO .......................................... 44 3.1 Recomendações nutricionais........................................................................................................... 44 3.2 Planejamento dietético: valor energético total da dieta ..................................................... 45 3.2.1 VET: equações IOM (DRI) ...................................................................................................................... 45 3.2.2 Valor energético total da dieta ......................................................................................................... 48 3.3 Recomendações: macronutrientes ................................................................................................ 50 3.3.1 Planejamento da distribuição dos macronutrientes ................................................................ 52 3.4 Recomendações: micronutrientes ................................................................................................. 53 3.4.1 Planejamento dietético: DRIs ............................................................................................................ 54 3.5 Alimentos fonte e o planejamento dietético ............................................................................ 55 3.6 Grupos de alimentos e os alimentos – fonte no planejamento dietético .................... 56 3.7 A escolha dos nutrientes no planejamento dietético ........................................................... 56 4 PLANEJAMENTO DIETÉTICO: ADULTO ...................................................................................................... 57 4.1 Prevalência de excesso de peso e obesidade............................................................................. 57 4.2 Estado nutricional e estilo de vida: Brasil .................................................................................. 59 4.3 Planejamento dietético: adulto ...................................................................................................... 60 4.3.1 Mudança comportamental ................................................................................................................. 60 4.4 Diretrizes nutricionais ........................................................................................................................ 62 4.4.1 Macronutrientes e micronutrientes ................................................................................................ 63 4.5 Exemplo: cálculo das necessidades de macro e micronutrientes no indivíduo adulto ........................................................................................................................................... 64 4.6 Orientações nutricionais: planejamento adulto ...................................................................... 67 Unidade II 5 PLANEJAMENTO DIETÉTICO NA GESTAÇÃO E NA AMAMENTAÇÃO ............................................ 77 5.1 O ganho de peso e a diferenciação celular ................................................................................ 78 5.2 Placenta .................................................................................................................................................... 78 5.2.1 Principais hormônios e suas funções na gestação ................................................................... 79 5.3 Situações e sintomas durante a gestação: práticas alimentares ...................................... 80 5.3.1 Náuseas e vômitos ................................................................................................................................. 80 5.3.2 Constipação intestinal .......................................................................................................................... 84 5.4 Recomendações nutricionais na gestação ................................................................................. 85 5.4.1 Necessidades energéticas .................................................................................................................... 85 5.5 Necessidades proteicas ...................................................................................................................... 90 5.5.1 Necessidades proteicas na lactação ................................................................................................ 90 5.5.2 Necessidades de lipídios na gestação e na lactação ................................................................ 91 5.5.3 Necessidades de micronutrientes (vitaminas e minerais) na gestação ............................ 91 5.5.4 Necessidades de micronutrientes (vitaminas e minerais) na lactação ............................. 95 5.6 Planejamento dietético para gestantes e nutrizes: orientações gerais ......................... 96 6 PLANEJAMENTO DIETÉTICO NA INFÂNCIA: LACTENTE, PRÉ-ESCOLAR E ESCOLAR ............... 98 6.1 Lactentes .................................................................................................................................................. 99 6.2 Necessidades nutricionais do lactente ......................................................................................100 6.2.1 Alimentação complementar .............................................................................................................104 6.3 A introdução alimentar ....................................................................................................................106 6.3.1 Alimentação por faixa de idade ......................................................................................................108 6.4 Pré-escolares ........................................................................................................................................114 6.5 Escolar .....................................................................................................................................................120 Unidade III 7 PLANEJAMENTO DIETÉTICO NA ADOLESCÊNCIA...............................................................................133 7.1 Crescimento e maturação sexual .................................................................................................133 7.2 Alterações psicológicas ....................................................................................................................135 7.3 Consumo alimentar adolescente .................................................................................................135 7.4 Necessidades e recomendações nutricionais ..........................................................................136 7.4.1 Energia ..................................................................................................................................................... 137 7.4.2 Macronutrientes ................................................................................................................................... 138 7.4.3 Micronutrientes .................................................................................................................................... 139 8 PLANEJAMENTO DIETETICO NA SENESCÊNCIA..................................................................................141 8.1 O processo de envelhecimento .....................................................................................................142 8.1.1 Alterações no processo de envelhecimento .............................................................................. 142 8.1.2 Aspectosgerais do envelhecimento ............................................................................................. 143 8.1.3 Sensações e percepções .................................................................................................................... 143 9 APRESENTAÇÃO Esta disciplina aborda os conceitos relativos ao cálculo de dietas específicas para diferentes ciclos da vida, bem como a formulação de cardápios. Compreende, também, o entendimento e aprofundamento de questões referentes à alimentação e à nutrição, a seus condicionantes nos distintos estados fisiológicos e suas características biopsicossociais, bem como às recomendações e necessidades nutricionais de indivíduos e grupos populacionais. O objetivo geral da disciplina refere-se ao planejamento, avaliação e preparo de dietas em distintos ciclos da vida, de acordo com as recomendações nutricionais vigentes. Entre os objetivos específicos, pretende-se que você, aluno, seja capaz de: • Descrever os aspectos biopsicossociais nos diferentes ciclos de vida. • Identificar as recomendações e necessidades nutricionais individuais e de grupos populacionais segundo as DRIs (Dietary Reference Intakes). • Elaborar cardápios, preparar e analisar a adequação de dietas normais e modificadas sob o ponto de vista quantitativo, qualitativo e sensorial. Identificar, elaborar e preparar a dieta de aleitamento artificial e de transição no primeiro ano de vida. • Avaliar dietas conforme recomendações nutricionais e o novo Guia alimentar para a população brasileira (BRASIL, 2014). • Utilizar tabelas de composição química dos alimentos para cálculos da necessidade estimada de energia e micronutrientes da dieta. INTRODUÇÃO Uma alimentação adequada e equilibrada favorece a promoção da saúde e é fator de proteção contra doenças, propiciando o crescimento e desenvolvimento adequado dos indivíduos. Ao longo da vida, identificamos distintas fases que se destacam por apresentarem características específicas: gestação, infância adolescência, idade adulta e senescência. Alguns períodos são considerados críticos, pois apresentam necessidades fisiológicas e psicossociais específicas, o que demanda maior atenção referente à alimentação. Cada fase da vida apresenta suas especificidades. Contudo, a nutrição é de fundamental importância em todas elas, já que fornece os nutrientes necessários em cada ciclo da vida. Nossa discussão será dividida em três etapas principais: a primeira será aprender um pouco sobre os fundamentos da dietética, os princípios básicos, conceitos e ferramentas do planejamento de cardápios, 10 bem como apresentar contribuições importantes sobre as recomendações nutricionais e como os aspectos comportamentais e cognitivos contribuem na eficácia de planejamentos dietéticos. Num segundo momento, abordaremos as especificidades dos ciclos da vida: gestação, lactância, fase pré-escolar e escolar (infância). Por fim, na terceira etapa de nossa discussão, serão apresentados conteúdos sobre o planejamento de cardápios em adolescentes e idosos. Todo o conteúdo está apresentado de maneira sucinta, mas com vasto potencial de exploração. 11 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS DA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL: CONCEITOS E DESAFIOS PARA O PLANEJAMENTO ALIMENTAR A alimentação adequada e saudável é um direito humano básico que envolve a garantia ao acesso permanente e regular, de maneira socialmente justa, relacionada a uma prática alimentar adequada aos aspectos biológicos e sociais de cada indivíduo. Deve estar em consonância com as necessidades alimentares que lhe são específicas (ciclos da vida), ser baseada em aspectos culturais e também nas dimensões de gênero, raça e etnia, bem como ser acessível do ponto de vista físico e financeiro. Por fim, deve atender aos princípios de equilíbrio, moderação e prazer, ser baseada em práticas produtivas adequadas e sustentáveis, e estar em acordo com as Leis de Pedro Escudeiro. Segundo Escudero (apud PHILIPPI; AQUINO, 2015) as leis da alimentação são: • Lei da quantidade: a alimentação deve atender às necessidades de cada nutriente e às exigências energéticas do organismo. Em cada fase da vida, são necessárias quantidades específicas de nutrientes, ou seja, a quantidade de vitaminas e minerais, por exemplo, vai variar em cada ciclo da vida, conforme as recomendações das DRIs. • Lei da qualidade: a alimentação deve ser completa em sua composição, com a presença de todos os grupos de alimentos. Deve-se atentar à qualidade dos alimentos selecionados, aos tipos de carboidratos – preferencialmente os integrais – e tipos de gordura – preferencialmente as insaturadas, de modo a dar preferência a alimentos de alta densidade nutritiva. Assim, ao se introduzir o consumo de alimentos fonte de gordura, deve-se incluir o consumo das chamadas “gorduras saudáveis” (fonte de W3 e W6). O mesmo deve ser pensado em termos de carboidratos: a indicação é aumentar o consumo de carboidratos complexos em detrimento do consumo dos simples). • Lei da harmonia: deve haver proporcionalidade entre os diversos nutrientes, de maneira a permitir seu completo aproveitamento – ou seja, ao se planejar um cardápio, deve-se ter um equilíbrio na ingestão de nutrientes, de forma a conferir a harmonia entre cores, sabores e texturas dos alimentos e/ou preparações sugeridas no planejamento alimentar de modo a estimular os sentidos por meio da introdução de temperos (ervas e especiarias); texturas (preparações com técnicas de preparo distintas), sensações térmicas (quente/frio); cores; tipos distintos de cortes etc. • Lei da adequação: a alimentação deve ser adequada à sua finalidade e a cada ciclo de vida ou situação fisiológica individual. É preciso observar os fatores que interferem no planejamento dietético, tais como: peso, altura, idade, sexo, disponibilidade dos alimentos, poder aquisitivo, gasto energético e estados fisiológicos, por exemplo. A necessidade de cada nutriente (macro e 12 Unidade I micro) varia de acordo com a especificidade do ciclo da vida. Gestantes, por exemplo, apresentam necessidades nutricionais distintas de uma criança, uma mulher adulta e uma idosa, por exemplo. Exemplo de aplicação No exemplo de planejamento dietético infantil a seguir, pode-se observar a aplicação das leis de Escudero: Quadro 1 Planejamento dietético (refeição) Criança de 1 a 2 anos Preparação/alimento Quantidade Grupos de alimento Arroz 2 colheres sopa Cereais Feijão 1 colher sopa cheia Leguminosas Músculo cozido com tomate 2 colheres de sopa cheia Carnes e ovos Mandioquinha 1 colher de sopa cheia Cereais Abobrinha paulista 1 colher de sopa cheia Hortaliças Espinafre refogado 1 colher de sopa Hortaliças Laranja 1 unidade pequena Frutas Cálculos nutricionais (base de uma dieta com VET: 1300 kcal/dia) Valor energético (da refeição): 331,00 kcal % da refeição: 25,5% Macronutrientes: CHO: 44 g – 51,8% PTN: 17 g – 19,8% LIP: 11 g – 28,4% Micronutrientes: Ácido fólico: 117,28 mcg Vit. C: 65,29 mg Vit. A: 312,48 mcgRE Cálcio: 125,12 mg Ferro: 4,31 mg Zinco: 1,06 mg Você consegue apontar, analisando esse planejamento, de que forma ele segue as leis de Escudero? Pela lei da quantidade e adequação, observa-se que o planejamento foi elaborado para uma criança cujas demandas nutricionais específicas se encontram adequadas conforme as recomendações preconizadas pelas DRIs, respeitando as necessidades dessa fase da vida. Convém, entretanto, fazer a ressalva de que o planejamento respeitou a quantidade de alimentos ofertadas para a criança de acordo com o seu ritmo de crescimento e desenvolvimento, bem como a aceitação da oferta alimentar. Verifica-se, também, que há um equilíbrio no consumo de alimentos de todos os grupos alimentares, conforme preconizado pelo Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos (BRASIL, 2019a). É possível constatar, nesse planejamento, uma harmonia (lei da harmonia) nos alimentose preparações. Há diferentes cores, sabores, texturas e aromas, que contribuem no estímulo dos aspectos sensoriais, tão importantes nessa fase da vida. 13 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA No quesito lei da qualidade, o planejamento dietético reforçou a oferta no consumo de alimentos in natura e minimamente processados, também conforme preconizado pelo Guia (BRASIL, 2019a), incluindo alimentos dos diferentes grupos alimentares e respeitando as preferências e hábitos alimentares da criança. A alimentação é mais do que ingerir nutrientes. A escolha do que consumir se baseia em fatores econômicos, sociais, educacionais, culturais, entre outros. A correta combinação de alimentos fornece nutrientes necessários ao desenvolvimento e à manutenção da saúde em todos os ciclos da vida (desde a gestação e a infância até o envelhecimento). Isso significa dizer que a alimentação em todos os ciclos da vida deve conter todos os grupos de alimentos (cereais, frutas e hortaliças, leite e derivados, ovos e carnes, leguminosas). É importante também sempre valorizar o consumo de alimentos in natura em detrimento dos ultraprocessados e dos orgânicos em vez daqueles que são cultivados através do emprego de um excesso de agrotóxicos. Igualmente interessante é procurar consumir os alimentos regionais e em época de safra. Em todas as fases da vida, essa premissa, a da saudabilidade, permanece. O que se modifica, em cada fase, são as recomendações quantitativas de macronutrientes (carboidratos, proteínas e lipídios) e de micronutrientes (vitaminas e minerais). Observação O conceito de saudabilidade se refere à qualidade do que é saudável de uma maneira bem ampla. Relaciona-se à procura por consumo de alimentos mais saudáveis. Isso se deve ao fato principalmente de que estudos científicos (WHO; FAO, 2003; BRASIL, 2014) têm demonstrado que uma alimentação inadequada (rica em gorduras saturadas, açúcar e sal, em detrimento do consumo de frutas, hortaliças, alimentos integrais e in natura) contribui de maneira significativa com o aumento da incidência e prevalência das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 1.1 Os guias alimentares O acesso à informação de confiabilidade é determinante na busca de uma alimentação adequada e saudável e contribui para que indivíduos e populações ampliem a autonomia em fazer escolhas alimentares, desenvolvendo a capacidade do autocuidado e também de agirem sobre os fatores do ambiente que determinam a saúde. A adoção de uma alimentação saudável não é somente uma questão individual. Muitos fatores (de natureza física, econômica, política, cultural ou social) podem influenciar (positiva ou negativamente) 14 Unidade I o padrão alimentar das pessoas. Por exemplo, morar em bairros onde se encontram feiras e mercados próximos que comercializam frutas e hortaliças com boa qualidade torna mais fácil a adoção de padrões saudáveis de alimentação. Contudo, há fatores que podem dificultar a adoção desses padrões, como o custo mais elevado dos alimentos minimamente processados em vez dos ultraprocessados, a necessidade de fazer refeições em locais onde não são oferecidas opções saudáveis de alimentação e a exposição intensa à publicidade de alimentos não saudáveis. Assim, instrumentos e estratégias de educação nutricional e alimentar devem apoiar essas pessoas e populações na adoção de práticas alimentares que propiciem a promoção da saúde. Uma das ferramentas promotoras da saúde é o Guia Alimentar para a população brasileira, documento do Ministério da Saúde que apresenta um conjunto de informações e recomendações sobre alimentação que objetivam promover a saúde de pessoas, famílias e comunidades e da sociedade brasileira como um todo, hoje e no futuro. O Guia alimentar (BRASIL, 2014, p. 49-50) apresenta quatro recomendações e uma regra de ouro: 1. Faça de alimentos in natura ou minimamente processados a base de sua alimentação. Alimentos in natura ou minimamente processados, em grande variedade e predominantemente de origem vegetal, são a base de uma alimentação nutricionalmente balanceada, saborosa, culturalmente apropriada e promotora de um sistema alimentar socialmente e ambientalmente sustentável. 2. Utilize óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias, desde que utilizados com moderação em preparações culinárias com base em alimentos in natura ou minimamente processados, óleos, gorduras, sal e açúcar contribuem para diversificar e tornar mais saborosa a alimentação sem torná-la nutricionalmente desbalanceada. 3. Limite o uso de alimentos processados, consumindo-os, em pequenas quantidades, como ingredientes de preparações culinárias ou como parte de refeições baseadas em alimentos in natura ou minimamente processados. Os ingredientes e métodos usados na fabricação de alimentos processados – como conservas de legumes, compotas de frutas, queijos e pães – alteram de modo desfavorável a composição nutricional dos alimentos dos quais derivam. 4. Evite alimentos ultraprocessados. Devido a seus ingredientes, alimentos ultraprocessados – como biscoitos recheados, “salgadinhos de pacote”, refrigerantes e “macarrão instantâneo” – são nutricionalmente desbalanceados. Por conta de sua formulação e apresentação, tendem a ser consumidos em excesso e a substituir 15 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA alimentos in natura ou minimamente processados. Suas formas de produção, distribuição, comercialização e consumo afetam de modo desfavorável a cultura, a vida social e o meio ambiente. *A regra de ouro: prefira sempre alimentos in natura ou minimamente processados e preparações culinárias a alimentos ultraprocessados. Opte por água, leite e frutas no lugar de refrigerantes, bebidas lácteas e biscoitos recheados; não troque a “comida feita na hora” (caldos, sopas, saladas, molhos, arroz e feijão, macarronada, refogados de legumes e verduras, farofas, tortas) por produtos que dispensam preparação culinária (“sopas de pacote”, “macarrão instantâneo”, pratos congelados prontos para aquecer, sanduíches, frios e embutidos, maioneses e molhos industrializados, misturas prontas para tortas) e fique com sobremesas caseiras, dispensando as industrializadas. Observação Alimentos ultraprocessados são formulações industriais contendo substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, açúcar, amido, proteínas), derivadas de constituintes de alimentos (gorduras hidrogenadas, amido modificado) ou sintetizadas em laboratório com base em matérias orgânicas como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes, realçadores de sabor e vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de propriedades sensoriais atraentes). Exemplos: biscoitos, sorvetes, balas e guloseimas em geral, misturas para bolo, salgadinhos em pacote, entre outros. Por que evitar: oficialmente chamado néctar, o suco de caixinha apresenta muito açúcar adicionado e baixa proporção de polpa de fruta. O efeito no organismo é comparável ao dos refrigerantes. Alimento in natura Alimento processado Alimentoultraprocessado Abacaxi fresco Abacaxi em calda Suco em pó de abacaxi Figura 1 – Classificação dos alimentos de acordo com o Guia Alimentar para a população brasileira 16 Unidade I Por que evitar: alta concentração de gorduras totais, realçador de sabor, corantes, estabilizantes e aromatizantes. Alimento in natura Alimento processado Alimentoultraprocessado Espiga de milho Milho em conserva Salgadinho de milho de pacote Figura 2 – Classificação dos alimentos de acordo com o Guia Alimentar para a população brasileira Por que evitar: alta concentração de gorduras totais, realçador de sabor, corantes e estabilizantes. Alimento in natura Alimento processado Alimentoultraprocessado Peixe fresco Peixe em conserva Empanado de peixe (nuggets) Figura 3 – Classificação dos alimentos de acordo com o Guia Alimentar para a populaçãobrasileira De acordo com o novo Guia alimentar (BRASIL, 2014), os alimentos são classificados de acordo com o nível de processamento e não com a pirâmide de alimentos e o porcionamento. O conceito de porção pode gerar dúvidas, prejudicando o entendimento da população sobre o tamanho e a quantidade a ser consumida de um determinado alimento ou grupo de alimento. A pirâmide de alimentos não é um instrumento de fácil compreensão, uma vez que pode confundir a população em relação ao que deve ser consumido e ao que deve ser evitado. Ademais, acaba incluindo em um mesmo grupo alimentos muito diferentes, que apresentam níveis de processamento distintos. É o caso, por exemplo, da mandioca e do macarrão instantâneo. Ambos, de acordo com a pirâmide de alimentos, se apresentam no grupo dos cereais. Porém, esses dois alimentos apresentam composição nutricional bem distinta, além de níveis de processamento bem diferentes. Enquanto a mandioca é um alimento in natura (de acordo com a nova classificação do Guia alimentar – BRASIL, 2014), o macarrão instantâneo é um alimento ultraprocessado fonte de gordura, sódio e açúcar. 17 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA E o mesmo ocorre com uma série de outros alimentos. A mandioquinha, por exemplo, de acordo com a pirâmide de alimentos, seria classificada em qual grupo de alimentos? Cereais ou hortaliças? O iogurte que a pirâmide recomenda consumir é o natural, sem aditivos, ou uma versão de iogurte ultraprocessado (produzido a partir do leite em pó, contendo açúcar, conservantes e corantes)? Um pão de forma apresenta a mesma característica nutricional que uma torrada industrializada, que, por sua vez, pode ser classificada dentro de um mesmo grupo da pirâmide que um pão de fermentação natural e com uso de farinha integral? Essa mesma dificuldade de compreensão se faz com preparações de alimentos. Como enquadrar uma determinada receita num grupo de alimentos de acordo com a pirâmide alimentar? Uma sopa de legumes, por exemplo, apresenta uma série de ingredientes e nutrientes distintos. Ademais, a pirâmide alimentar não consegue abordar aspectos relacionados à cultura alimentar. É impossível adicionar à pirâmide de alimentos aspectos sociais, culturais e ambientais. 1.2 Dos alimentos à refeição Entende-se por refeição um grupo de alimentos que são consumidos em horários pré-estabelecidos e que apresentam uma determinada constituição, forma de preparo e tipos de alimentos presentes em um certo momento característico do dia alimentar. Exemplo: almoço, tipicamente feito às 12:00 horas e composto de arroz, feijão, bife acebolado e salada. O ideal é que, ao planejarmos um cardápio, ele preveja que o indivíduo realize no mínimo três grandes refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar), intercaladas com lanches, compondo seis refeições ao longo do dia alimentar. Dados da Pesquisa de Orçamento Familiar Brasileira (POF 2008/2009) (BRASIL, 2010a) indicam forte tendência ao consumo de alimentos ultraprocessados. Segundo a mesma pesquisa, arroz e feijão correspondem a um quarto da alimentação, seguidos por carnes (gado ou porco), carne de frango, leite, raízes e tubérculos (em especial mandioca e batata), frutas, peixes, legumes, verduras e ovos. Entre os alimentos ultraprocessados mais consumidos, destacam-se os pães e sanduíches, bolos industriais, biscoitos, doces e guloseimas em geral, refrigerantes, salgadinhos de pacote, bebidas lácteas, salsicha e outros embutidos, e queijos (BRASIL, 2010a). Esses dados demonstram que a alimentação do brasileiro é insuficiente em termos de fibras e algumas vitaminas e minerais, e excessiva no consumo de alimentos fonte de açúcar e gorduras (trans e saturadas). Assim, pequenas mudanças na alimentação do brasileiro, privilegiando alimentos in natura e minimamente processados (mais hortaliças e menos carnes vermelhas) tornaria o perfil nutricional de sua alimentação mais saudável. 18 Unidade I A seguir, apresentaremos exemplos de refeições saudáveis, nas quais são priorizados alimentos in natura e minimamente processados, bem como preparações culinárias, de modo a corresponderem a um montante entre 85% e 95% do total de calorias da alimentação. Eles são exemplos de cardápios que apresentam combinações que, de maneira geral, atendem às recomendações do Guia Alimentar (BRASIL, 2014). Vale ressaltar que as combinações apresentadas podem ser substituídas por outros alimentos do mesmo grupo alimentar que tenham composição nutricional e uso culinário semelhantes (exemplo: o feijão pode ser substituído por lentilhas ou grão-de-bico; a mandioca, por batata ou cará), o que contribui para uma alimentação mais variada, ampliando, assim, a diversidade no aporte de nutrientes. Utilizar alimentos substitutos propicia, além da variedade alimentar, o aumento do prazer, já que permite a diversificação de sabor, aroma, cor e textura do que se come. A variedade, além disso, é indispensável para acomodar as preferências alimentares regionais e individuais. 1.2.1 Café da manhã Refeição na qual podem ser incluídos alimentos como: frutas, café, leite, podendo ser substituídos por suco da fruta, café puro e queijos. De uma maneira geral, trata-se de uma refeição que inclui, também, o consumo de alimentos à base de cereais ou de tubérculos (tapioca, cuscuz, bolo, pão de queijo, pães). Ovos também podem estar presentes nessa refeição, sendo possível prepará-los de maneiras distintas (mexido, cozido, pochê, outros). Café com leite, pão de queijo e mamão Suco de laranja natural, pão francês com manteiga e mamão Café com leite, bolo de mandioca, queijo e mamão Café com leite, cuscuz e manga Figura 4 – Exemplos de preparações: café da manhã 19 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA 1.2.2 Almoço e jantar A mistura de arroz e feijão é uma combinação nutricionalmente equilibrada e traduz a realidade alimentar de uma imensa maioria de brasileiros que privilegiam o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados. Feijões podem ser substituídos por outras leguminosas, tais como lentilha e grão-de-bico. Já o arroz pode ser substituído por preparações à base de milho (angu e polenta, por exemplo). O ideal é que hortaliças estejam presentes em todos os almoços, podendo se apresentar sob diferentes formas (cozidas, assadas, refogadas, ensopadas, cruas). De acordo com o Guia alimentar (BRASIL, 2014), carnes vermelhas (de gado e porco) devem estar restritas a um terço das refeições, com prioridade para os cortes magros e preparações grelhadas ou assadas. Carnes vermelhas podem ser substituídas por preparações à base de frango ou peixe, ovos (omelete) ou legumes. O consumo de sobremesas pode ser alternado entre frutas e doces caseiros (em detrimento de doces ultraprocessados). Arroz, feijão, coxa de frango assada, beterraba e polenta com queijo Feijoada, arroz, vinagrete de cebola e tomate, farofa, couve refogada e laranja Aroz, feijão, omelete e jiló refogado Salada de tomate, arroz, feijão, bife grelhado e salada de frutas Figura 5 – Exemplos de preparações: almoço e jantar 20 Unidade I 1.2.3 Pequenas refeições As pequenas refeições devem, também, limitar o consumo de alimentos processados e ultraprocessados. Frutas frescas e secas são opções interessantes, bem como leite, iogurte natural e oleaginosas (castanhas ou nozes), pois são alimentos que apresentam alta densidade nutritiva e grande poder de saciedade, além de praticidade no consumo e transporte. Iogurte com frutas Leite batido com frutas Castanhas Salada de frutas Figura 6 – Exemplos de preparações: pequenas refeições 1.3 O ato de comer e a comensalidade O ato de comer engloba dimensões que influenciam, entre outros aspectos, o aproveitamento dos alimentos consumidos e o prazer que a alimentação pode proporcionar. Assim, o tempo e a atenção dedicados ao comer, bem como o ambiente onde se realizam as refeições, influenciam o processo da alimentação. São três as orientaçõesbásicas, mas fundamentais sobre o aspecto da comensalidade: comer com regularidade e atenção; comer em ambientes apropriados; comer em companhia. A adoção dessas três premissas apresenta uma série de benefícios: • melhoria da digestão dos alimentos; • controle mais eficiente do que se come; • maior oportunidade de convivência com familiares e amigos; • maior interação social; • maior prazer com a alimentação. 21 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA Observação Recomenda-se fazer as refeições diárias em horários semelhantes, evitando “beliscar” nos intervalos entre as refeições. O ideal é comer sempre devagar, desfrutando do que se está comendo, sem se envolver em outra atividade. Comer com regularidade e atenção Alimentar-se em horários semelhantes (diariamente), com atenção e sem pressa, favorece a digestão e evita um consumo exagerado de alimentos e ou preparações. Os mecanismos de regulação do apetite são complexos e dependem de uma série de estímulos, levando um certo tempo até sinalizarem a saciedade (sensação de que já comemos o suficiente). Assim, comer de maneira regular e com atenção é uma boa forma de se controlar naturalmente o que se come e o quanto se come. O ato de “beliscar” se torna mais forte e desejável quando somos estimulados visualmente pela presença do alimento. Esse desejo se torna ainda maior e evidente quando o alimento é ultraprocessado (guloseimas, salgadinhos de pacote, outros) e apresenta em sua formulação ingredientes que acentuam o sabor. É recomendável evitar esses alimentos. Boas opções para substitução são frutas secas ou frescas e oleaginosas. Comer em ambientes apropriados O local onde nos alimentamos influencia a quantidade do que ingerimos e interfere no prazer que temos ao desfrutar de uma refeição. Cheiros, sons, iluminação, conforto, condições de limpeza entre outros são fatores importantes no ato de comer. Devem-se evitar celulares sobre a mesa e os aparelhos de televisão ligados. Igualmente, não é recomendado comer na mesa de trabalho, em pé ou andando, dentro do carro ou do transporte público. Observação Procure comer sempre em locais limpos, confortáveis e tranquilos, onde não haja estímulo para o consumo de quantidades ilimitadas de alimentos. Comer em companhia Compartilhar o ato de comer e as atividades que se inserem nele é uma maneira de desenvolver relações entre pessoas. 22 Unidade I Lembrete Sempre que possível, prefira comer na companhia de familiares, amigos ou colegas (de trabalho ou da escola). Refeições realizadas em casa são fortalecedoras dos laços familiares. Para casais, constituem o momento de compartilhar as experiências e vivências do dia a dia. Para crianças e adolescentes, são importantes na formação de hábitos alimentares e da valorização da importância das refeições regulares em ambientes apropriados. Refeições realizadas em companhia evitam o consumo rápido e exagerado das preparações; favorecem ambientes mais adequados para o ato de comer (já que demandam locais mais apropriados) e possibilitam que as pessoas compartilhem umas com as outras o prazer de comer. Envolver toda a família nas atividades de planejar as refeições, adquirir, preparar e servir os alimentos e cuidar da limpeza dos utensílios utilizados favorece o convívio. A participação de crianças e adolescentes em todo o processo alimentar (desde a compra de alimentos ao preparo de refeições) permite o conhecimento de novos alimentos e novas formas de prepará-los, bem como o entendimento sobre de onde eles vêm e como são produzidos. Adquirir bons hábitos alimentares e valorizar o compartilhamento de responsabilidades são outros benefícios do envolvimento de crianças e adolescentes em atividades relacionadas à preparação de refeições. Nos tempos atuais, o compartilhamento de responsabilidades no processo doméstico envolvido com a preparação de refeições e a divisão das tarefas entre todos os membros da família (homens, mulheres, crianças e adolescentes) são essenciais para que a carga de trabalho não pese de modo desproporcional sobre apenas um dos membros da família. 1.4 Compreendendo e superando obstáculos Para se planejar adequadamente um cardápio nos distintos ciclos da vida, há que se conhecer os possíveis obstáculos que dificultam a introdução de uma alimentação equilibrada e saudável. Compreender esses potenciais obstáculos, bem como superá-los, pode facilitar a adoção de uma alimentação equilibrada. É importante ressaltar que tais obstáculos podem ser fáceis ou difíceis de serem superados, dependendo de sua natureza, dos recursos com os quais as pessoas contam para superá-los e do ambiente onde as pessoas em questão vivem. Alguns serão superados, outros podem requerer mais persistência. E, em alguns casos, na superação, há necessidade de reflexão do indivíduo sobre a importância da alimentação no seu dia a dia. 23 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA 1.4.1 Informação Há muitas informações sobre alimentação e saúde, porém nem todas são confiáveis. Atualmente, há um crescente aumento no número de notícias relacionadas à alimentação, o que se deve em parte ao grande interesse do público em consumir esse conteúdo com o intuito de reduzir o risco de doenças e promover a saúde e o bem-estar. Essas informações afetam os hábitos e modos de viver, bem como o cotidiano dos indivíduos, a relação que mantêm com seu corpo e a expectativa que nutrem com relação à vida. Nesse sentido, enfatizam alimentos específicos que se propagam como “superalimentos” e ignoram a importância da variedade e harmonia alimentar, induzindo, assim, modismos alimentares que levam à depreciação de alimentos e práticas alimentares tradicionais. Não raro, a alimentação saudável é confundida com dietas restritivas com o objetivo de emagrecer. 1.4.2 Olhar crítico Deve-se estar atento às fontes de informação escolhidas (sobre alimentação e saúde) entre os meios de comunicação. O Guia Alimentar (BRASIL, 2014) é uma fonte confiável de informações e recomendações sobre alimentação adequada e saudável. Seu conteúdo se baseia em conhecimentos atuais e abrangentes de distintas áreas do conhecimento – e, dessa forma, em evidências científicas. 1.4.3 Oferta Alimentos ultraprocessados são encontrados em todas as partes e locais, de maneira geral, sempre acompanhados de muita propaganda, descontos, promoções; enquanto alimentos in natura e minimamente processados nem sempre oferecem fácil acesso e comercialização. Como superar esse obstáculo e aumentar o consumo de alimentos in natura e minimamente processados? Há algumas medidas que podem ser tomadas nesse sentido: • evitar fazer compras de alimentos saudáveis em locais onde também se comercializam alimentos ultraprocessados; • evitar comer em redes de fast-food; • elaborar uma lista de compras antes de ir ao supermercado, evitando, assim, a compra de alimentos desnecessários; • tentar realizar as compras de alimentos em mercados, feiras livres, feiras de produtores e outros locais que incentivem a comercialização de alimentos in natura, minimamente processados, orgânicos e de base agroecológica; • cultivar hortas em casa. 24 Unidade I 1.4.4 Custo Apesar de hortaliças (legumes, verduras) e frutas apresentarem preço superior ao de alguns alimentos ultraprocessados, o custo total de uma alimentação baseada em alimentos in natura ou minimamente processados ainda é menor no Brasil do que o custo de uma alimentação baseada em alimentos ultraprocessados. De maneira geral, tem-se a impressão de que uma alimentação saudável é necessariamente mais cara. Essa ideia é muitas vezes criada pelo alto preço de alimentos ultraprocessados “enriquecidos” com vitaminas e outros nutrientes ou comercializados como ideais para quem quer emagrecer. Como aumentar o consumo de hortaliças e frutas sem extrapolar o orçamento? Algumas sugestões são: • fazer compras de hortaliças e frutas que estejam em safra, pois apresentarão boa qualidade e preçomais baixo; • comprar hortaliças e frutas em locais onde não haja muitos intermediários até chegar ao consumidor final; • tentar comprar diretamente dos produtores; • tentar levar a comida de casa (marmitas e lanches) ou fazer as refeições em restaurantes por quilo. 1.4.5 Habilidades culinárias A diminuição do conhecimento de práticas e habilidades culinárias entre gerações favorece o consumo de alimentos ultraprocessados. Alimentos in natura e minimamente processados precisam ser selecionados, pré-preparados, temperados, cozidos e combinados com outros alimentos, o que demanda, de certa maneira, além de tempo, habilidades culinárias. Essa prática alimentar vem perdendo força no mundo atual e moderno, onde o consumo de alimentos ultraprocessados vem ganhando cada vez mais espaço. A redução das habilidades culinárias entre as pessoas envolve a desvalorização do ato de preparar, combinar e cozinhar alimentos como prática cultural e social, que se dá inclusive através das propagandas que reforçam que o preparo de alimentos em casa seria uma perda de tempo. Essas mudanças no ato de preparar as refeições podem implicar uma redução no consumo de alimentos in natura e minimamente processados, tornando-os cada vez menos atraentes. Em contrapartida, os alimentos ultraprocessados se tornam cada vez mais irresistíveis (em sabor, aroma, textura, preço e aparência). Como incentivar práticas e habilidades culinárias? Duas sugestões possíveis são: • valorizar o ato de cozinhar e estimular as pessoas em seu entorno a também fazê-lo; • inscrever-se em cursos culinários para aumentar sua prática e habilidade culinária. 25 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA 1.4.6 Tempo Para alguns indivíduos, alimentar-se de maneira saudável demanda tempo. O consumo de alimentos in natura e minimamente processados exige todo um processo desde a seleção até seu preparo, bem como a higienização e limpeza dos utensílios após o término das refeições, o que, naturalmente, exige tempo. Como racionalizar o tempo e aumentar o consumo de alimentos saudáveis? É importante ressaltar que a falta de habilidades culinárias pode requerer ainda mais tempo no preparo das refeições e alimentos. Assim, reforça-se a importância de resgatar e praticar o hábito de preparar as próprias refeições. Habilidades culinárias também se relacionam ao planejamento de compras e ingredientes culinários, à organização da despensa doméstica e à definição previa do que se vai comer ao longo da semana. Alimentos que demandam mais tempo de cocção (como feijão, por exemplo) podem ser preparados em maior quantidade em um único dia, congelados em porções menores e utilizados nas preparações ao longo da semana. Já preparações mais práticas, como omeletes, legumes e sopas, são excelentes opções nos dias nos quais a disponibilidade de tempo é menor. Hortaliças e frutas podem ser pré-preparadas com antecedência ao longo da semana. 1.4.7 Os 10 passos da alimentação saudável O Guia alimentar (2014) fornece várias dicas de combinações saudáveis para as diferentes refeições realizadas ao longo do dia (café da manhã, almoço, jantar e lanches) respeitando as diferenças regionais e sugerindo alimentos e bebidas de fácil acesso aos brasileiros. Ademais, apresenta, ainda, 10 simples passos para alcançar uma alimentação saudável. São eles: 1. Fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da alimentação. 2. Utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias. 3. Limitar o consumo de alimentos processados. 4. Evitar o consumo de alimentos ultraprocessados. 5. Comer com regularidade e atenção, em ambientes apropriados e, sempre que possível, com companhia. 6. Fazer compras em locais que ofertem variedades de alimentos in natura ou minimamente processados. 7. Desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias. 8. Planejar o uso do tempo para dar à alimentação o espaço que ela merece. 26 Unidade I 9. Dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições preparadas na hora. 10. Ser crítico quanto a informações, orientações e mensagens sobre alimentação veiculadas em propagandas comerciais. Saiba mais A fim de obter informações adicionais sobre a nova proposta de classificação dos alimentos, leia o segundo capítulo do Guia Alimentar: BRASIL. A escolha dos alimentos. In: ___. Guia alimentar para a população brasileira. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. 2 PLANEJAMENTO DIETÉTICO: PRINCÍPIOS E FERRAMENTAS 2.1 Conceitos em dietética A palavra dieta tem origem no latim diaeta, que deriva do grego díaita, cujo significado se relaciona a “modo de vida”. O que se observa é que seu conceito tem se modificado ao longo dos anos. A palavra dieta já esteve relacionada a restrições alimentares (dietas restritivas), seja suprindo carências ou eliminando excessos. Quando associada a doenças, a palavra dieta se relaciona às texturas e consistências, bem como à exclusão ou inclusão de alimentos específicos. Atualmente, o conceito de dieta se define pelo conjunto de alimentos e bebidas ingeridos diariamente por uma pessoa, ou seja, baseia-se no conceito de alimentação adequada na qual atende-se às necessidades nutricionais diárias do indivíduo. As dietas podem ser alteradas e adaptadas aos diferentes objetivos e de acordo com as demandas e exigências nutricionais. Uma dieta balanceada deve conter alimentos em quantidade adequada para garantir os requerimentos nutricionais dos diferentes ciclos da vida. A prescrição dietética baseia-se em distintos critérios de seleção de alimentos, pautando-se no conhecimento dos nutrientes e substâncias alimentares e suas funções, bem como nos efeitos fisiológicos no organismo. Observação A dietética estuda e aplica as premissas básicas do processo da alimentação no organismo humano, propiciando o planejamento, a execução e a avaliação das dietas, considerando-se as características biopsicossociais, culturais, econômicas e os hábitos e comportamentos alimentares do indivíduo. 27 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA O planejamento de uma dieta é uma tarefa complexa, pois exige, além da organização e disposição dos alimentos ao longo do dia, também a incorporação e adoção de novos hábitos de vida, com o objetivo de promover a saúde. Assim, o planejamento dietético é chamando também de cardápio, já que apresenta, de maneira discriminativa e organizada, todas as preparações e alimentos consumidos ao longo do dia. Observação Em estabelecimentos comerciais, a palavra cardápio apresenta conotação referente ao menu, com os nomes fantasia das preparações culinárias. 2.2 Fundamentos do planejamento de cardápios Entende-se por alimentação o processo pelo qual os indivíduos adquirem do meio ambiente os alimentos que compõem a dieta. Em outras palavras, a alimentação é um ato voluntário e consciente no qual o indivíduo obtém (do meio) alimentos para seu consumo, que exercerão a função de nutrição no organismo. Uma nutrição adequada assegura o consumo de uma variedade de alimentos com o intuito de compor uma dieta equilibrada e saudável, a qual deve ser planejada considerando-se aspectos biopsicossociais (dados pessoais e demográficos, tais como gênero, idade, escolaridade, renda, tipo de trabalho, nível de atividade física), hábitos e práticas alimentares, frequência e local onde se realizam as refeições, estado nutricional (antropometria, exames bioquímicos e clínicos), além de atitudes e comportamento alimentar (aspectos emocionais e sociais relacionados às escolhas alimentares). A partir desse conjunto de variáveis, cabe ao nutricionista realizar o planejamento do cardápio de maneira a discriminar os horários e frequências das refeições, os alimentos e/ou preparações, discriminando sua composição nutricional e aspectos quantitativos (em gramas e medida usual de consumo), além de orientar e recomendar escolhas alimentares substitutas deacordo com os grupos alimentares. Cabe também ao nutricionista indicar locais de compras, bem como orientar sobre a seleção, higienização, armazenamento e técnicas de preparo dos alimentos com o objetivo de melhorar o valor nutricional e os aspectos sensoriais. 2.3 Os grupos de alimentos Ao longo do dia, devem-se consumir alimentos e/ou preparações de todos os grupos de alimentos. Assim, com a combinação de feijões, cereais, raízes, tubérculos, farinhas, macarrão, legumes, verduras, frutas, castanhas, leite, carnes, ovos, café, chá e água, incluem-se na dieta alimentos de todos os grupos e possibilitam-se infinitas preparações saudáveis, diversificando as alternativas em cada refeição do dia a dia (café da manhã, almoço, jantar e para as pequenas refeições). 28 Unidade I De acordo com o novo Guia Alimentar (BRASIL, 2014), os alimentos se dividem e oito grupos: 2.3.1 Grupo dos feijões Inclui, além dos diferentes tipos de feijões, todas as outras leguminosas (ervilha, soja, vagem, grão-de-bico e lentilhas), que são fonte de proteínas, fibras, vitaminas do complexo B e minerais (ferro, zinco, cálcio). Os alimentos desse grupo apresentam alto teor de fibras e quantidade moderada de calorias por grama, o que confere alto poder de saciedade. No Brasil, há uma enorme variedade de feijões: preto, branco, mulatinho, carioca, fradinho, feijão-fava, feijão-de-corda, entre outros. Além do feijão, outras leguminosas compartilham das mesmas propriedades nutricionais e uso culinário, o que pode ampliar as opções de preparo e sabor, além de diversidade na dieta. No Brasil, é hábito consumir a mistura feijão com arroz. Porém, há várias preparações à base de feijão que também se fazem presentes em nossa culinária: tutu à mineira, feijão tropeiro, sopa de feijão, acarajé etc. 2.3.2 Grupo dos cereais Grupo que inclui alimentos como arroz, milho (grão e farinha), trigo (grãos, farinha, macarrão e pães), além de outros cereais tais como aveia, cevada e centeio. São fonte de carboidrato, fibras, vitaminas (principalmente do complexo B) e minerais. Ao se combinarem com as leguminosas, constituem-se como excelente fonte de proteína. 2.3.3 Grupo das raízes e tubérculos Inclui alimentos como mandioca (macaxeira ou aipim), batata (inglesa, doce, baroa ou mandioquinha), cará e inhame. Trata-se de um grupo de alimentos bem versáteis que podem ser utilizados de diferentes maneiras (cozidos, assados, ensopados, sob a forma de purê etc.) e que são fonte de carboidratos, fibras, alguns minerais e vitaminas (potássio e vitaminas A e C). 2.3.4 Grupo dos legumes e verduras (hortaliças) O Brasil apresenta uma variedade enorme de hortaliças que podem ser consumidas de diferentes maneiras e através de diversas técnicas de preparo (salada, refogado, ensopado, assado, gratinado, recheado, sob a forma de purê etc.). As hortaliças são alimentos muito saudáveis, apresentam alta densidade de nutrientes, ou seja, são uma excelente fonte de várias vitaminas e minerais e, portanto, são muito importantes para a prevenção de deficiências de micronutrientes. 29 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA São fonte de fibras e apresentam (de maneira geral) uma quantidade relativamente pequena de calorias, contribuindo, assim, com a prevenção da obesidade e das doenças crônicas associadas a essa condição, como o diabetes e as doenças do coração. As hortaliças podem também ser fator protetor contra alguns tipos de cânceres, pois apresentam substâncias antioxidantes. Aumentar o consumo de hortaliças pode ser uma excelente alternativa para reduzir o consumo excessivo de carnes vermelhas, já que elas apresentam uma série de propriedades nutricionais e uma ampla versatilidade culinária. Mix de legumes refogados Abóbora refogada com cebola, cebolinha e/ou salsinha Figura 7 – Grupo dos legumes e verduras (hortaliças) 2.3.5 Grupo das frutas Assim como as hortaliças, o Brasil apresenta uma enorme variedade de frutas. Elas podem ser consumidas frescas, secas (desidratadas ou liofilizadas), assadas, cozidas, sob a forma de suco ou purê, como parte das refeições principais, em pequenas refeições ou como sobremesa. São uma excelente fonte de fibras, vitaminas e minerais, além de apresentarem compostos bioativos que contribuem com a prevenção de doenças. Salada de folhas com manga Salada de frutas Figura 8 – Grupo das frutas 30 Unidade I 2.3.6 Grupo das castanhas e nozes (oleaginosas) Nesse grupo, encontram-se as oleaginosas tais como: castanhas (caju, baru e castanha-do-pará ou castanha-do-brasil), nozes, amêndoas, macadâmia e amendoim. São fonte de minerais, vitaminas, fibras e gorduras saudáveis (gordura insaturada) e apresentam compostos bioativos que previnem doenças. Salada de folhas com castanhas de caju Castanhas Quibe de carne assado com nozes Figura 9 – Grupo das castanhas e nozes 2.3.7 Grupo do leite e dos queijos Inclui alimentos como leite, coalhada, iogurtes e queijos, que constituem fonte de proteína, vitaminas (em especial vitamina A) e cálcio. Quando na forma integral, também são fonte de gorduras (gordura saturada). Iogurte natural com fruta Vitamina de mamão com leite de vaca Figura 10 – Grupo dos leites e queijos 2.3.8 Grupo das carnes e ovos Inclui carnes vermelhas (gado, porco, cabrito, cordeiro), carnes de aves, pescado e ovos (de galinha e outras aves) que caracterizam-se por serem uma excelente fonte de proteína de alta qualidade, de micronutrientes (ferro, zinco, vitamina B12) e de gordura (saturada). 31 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA Omelete com legumesCozido de carne com batata e legumes Peixe assado Figura 11 – Grupo das carnes e ovos 2.3.9 A importância da ingestão diária de água A ingestão diária de água é essencial para a manutenção da vida. A quantidade a ingerir por dia varia de acordo com vários fatores (idade, peso do indivíduo, prática de atividade física, clima, temperatura do ambiente, entre outros). Figura 12 – Água com limão Saiba mais A fim de obter informações adicionais sobre os grupos de alimentos, leia o terceiro capítulo do Guia Alimentar: BRASIL. Dos alimentos à refeição. In: ___. Guia alimentar para a população brasileira. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. 32 Unidade I 2.4 Planejamento alimentar e os grupos de alimentos Lembrete Entende-se por refeição um grupo de alimentos que são consumidos em horários pré-estabelecidos e que apresentam uma determinada constituição, forma de preparo e tipo de alimentos, presente em um certo momento característico das 24 horas que compõem o dia alimentar. O ideal é que, ao planejarmos um cardápio, busquemos garantir que ele preveja que o indivíduo realize no mínimo três grandes refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar), intercaladas com lanches, compondo seis refeições ao longo do dia alimentar. Tabela 1 – Distribuição (%) do valor energético total (VET) por refeição Refeição % VET Sá (1990), Galisa; Esperança (2008) Assis; Vasconcelos (2007) Café da manhã 20 20 - 25 Lanche da manhã - 5 Almoço 30 – 40 35 – 40 Lanche da tarde 10 10 -15 Jantar 30 – 40 15 – 25 Lanche da noite - 5 As refeições principais (café da manhã, almoço e jantar) devem perfazer em média de 15% a 40% das recomendações diárias de energia, sendo intercaladas com pequenas refeições (média de 5% a 15% das recomendações diárias de energia). Baseando-se numa dieta de 2.000 kcal elaborada para um indivíduo saudável e usando como referência para a distribuição calórica entre as refeições as recomendações registradas na tabela anterior, elaborada a partir de dados obtidos de Sá (1990); Galisa e Esperança (2008) e Assis e Vasconcelos (2007), temos a tabela a seguir: Tabela 2 – Distribuição do VET baseada em uma dieta de 2.000 kcal Refeição % VET Sá (1990), Galisa; Esperança (2008) Assis; Vasconcelos (2007) Café da manhã 400 kcal = 20% VET 400 kcal = 20% VET Lanche da manhã --- 100 kcal = 5% VET Almoço 700 kcal = 35% VET 700 kcal = 35% VETLanche da tarde 200 kcal = 10% VET 200 kcal = 10% VET Jantar 700 kcal = 35% VET 500 kcal = 25% VET Lanche da noite --- 100 kcal = 5% VET 33 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA Entre as de preparações básicas que compõem as refeições principais, estão os alimentos presentes no grupo dos cereais (arroz, por exemplo) e no grupo dos feijões. Entre os acompanhamentos (guarnições), estão: • grupo de carnes e ovos (vermelhas, aves) em suas diferentes formas de preparo: cozido, assado, grelhado, entre outras. • grupo das verduras e legumes (refogado, assado, grelhado, no vapor, na salada). Em todas as refeições, há que se atentar ao uso de ingredientes culinários tais como óleos e gorduras, açúcares e sal. Quadro 2 – Esquema de refeições de acordo com os grupos de alimentos Refeição Grupo de alimentos Café da manhã Grupo dos cereais; do leite e dos queijos; das frutas. Exemplos: pão com requeijão, café com leite e banana. Almoço e jantar Grupo dos cereais; das verduras e legumes; das frutas; dos feijões; das carnes e ovos. Exemplos: arroz, feijão, bife acebolado, salada de alface e tomate, laranja. Lanches e outras pequenas refeições Grupo dos cereais; das frutas; de leite e queijo; das castanhas e nozes. Exemplos: pães, goiaba, iogurte, castanhas, outros. Adaptado de: Philippi e Aquino (2015). 2.5 Escolhas alimentares saudáveis Escolhas alimentares saudáveis se referem a escolhas inteligentes nas quais há seleção de alimentos baseadas nos hábitos alimentares do indivíduo que possam contribuir com a promoção da saúde e a prevenção de doenças. Esse processo de escolha de alimentos engloba não só aspectos nutricionais (escolha de alimentos de melhor densidade nutritiva) e relacionados à sustentabilidade e ao meio ambiente, mas também a todo o processo de escolha e/ou preparação com o intuito de reduzir o consumo de alimentos fonte de açúcar, sal e gordura, aumentando o consumo de frutas, hortaliças, grãos integrais, entre outros. Essas escolhas se baseiam em aspectos culturais e regionais, incentivando o consumo de alimentos com melhor valor nutritivo, reduzindo, assim, o consumo de alimentos processados e ultraprocessados. 34 Unidade I Quadro 3 – Escolhas alimentares saudáveis e os grupos de alimentos Grupo dos cereais e grupo das raízes e tubérculos Preferir alimentos e preparações culinárias regionais; alimentos com grãos integrais (pães, biscoitos, arroz, massas); preparar arroz e outros cereais com pouco óleo e sal; evitar o uso de temperos prontos; elaborar lanches com pães integrais, incluindo alimentos do grupo das hortaliças; optar por preparações assadas ou cozidas; incluir grãos integrais como aveia e quinoa Grupos das frutas Consumir frutas regionais e de safra; variar os tipos de frutas; preferir sucos naturais aos processados e ultraprocessados; consumir (quando possível) as frutas in natura com casca e bagaço Grupo dos legumes e verduras Variar as preparações (cruas, cozidas, com casca); cozinhar os alimentos utilizando pouca água ou vapor; preparar molhos naturais utilizando tomate, cebola, pimentão, ervas e temperos frescos; consumir folhas verde-escuras Grupo do leite e queijos Preferir o consumo de leite e iogurte desnatado e queijos magros, evitar o consumo de iogurtes ultraprocessados Grupo das carnes e ovos Preferir cortes de carnes magras; retirar a gordura aparente das carnes e a pele das aves; aumentar a frequência de consumo de peixes; preferir ovos cozidos aos fritos; utilizar carnes assadas e grelhadas e evitar o consumo de embutidos; reduzir o consumo de carne vermelha. Grupo dos feijões e grupo das castanhas e nozes Consumir uma parte de feijão para duas de arroz; evitar colocar carnes gordas e muito óleo, sal ou temperos prontos no preparo do feijão; consumir nozes e castanhas, mas com moderação Adaptado de: Philippi e Aquino (2015). 2.5.1 Alimento fonte O valor nutricional de um alimento pode ser determinado pela quantidade de energia e nutrientes presentes em sua composição. Assim, cada alimento pode ser fonte de algum nutriente. Por exemplo, a laranja, que pode ser fonte de vitamina C e fibra. O alimento pode ser classificado em: alimento fonte; alimento boa fonte e alimento excelente fonte. Quadro 4 – Classificação dos alimentos Alimento fonte Apresenta mais de 5% do valor da DRI em uma porção usual Alimento boa fonte Contém entre 10% e 20% do valor da DRI em uma porção usual Alimento excelente fonte Apresenta mais de 20% do valor da DRI em uma porção usual Fonte: Philippi e Aquino (2015, p. 14). DRIs ou dietary reference intakes constituem-se como valores de referência para a ingestão de nutrientes de indivíduos e grupos. Trata-se de um novo conceito em termos de recomendação nutricional, já que se apresentam como um grupo composto por quatro (RDA, AI, EAR, UL) valores de referência cujo objetivo é contribuir com a redução da incidência e prevalência das DCNT. 35 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA As DRIs fornecem também valores com limites superiores (upper level – UL) para a ingestão de nutrientes, de maneira a prevenir os riscos de efeitos adversos pela ingestão excessiva. Lembrete As DRIs devem ser utilizadas e aplicadas em avaliação e planejamento de dietas de indivíduos e/ou grupos com o objetivo de otimizar a saúde, diminuir o risco de doenças e o consumo excessivo de alguns grupos de alimentos e nutrientes. 2.6 Densidade energética Ao se planejar um cardápio, é de suma importância conhecer a quantidade de energia (quilocalorias) em relação ao peso do alimento (kcal por grama), relacionada à sua porção usual de consumo, conhecida como densidade energética (DE). Um alimento com alta DE apresenta alto valor calórico em uma pequena porção, enquanto alimentos com baixa DE apresentam baixo valor calórico na mesma porção. Aconselha-se o consumo de alimentos com baixa DE. A gordura é o nutriente com maior DE, fornece 9 kcal/g, o dobro da quantidade de carboidratos e proteínas (4 kcal/g). A quantidade de água presente no alimento irá influenciar sua DE. Quanto maior a quantidade de água, menor será sua DE. Alimentos que apresentam essa característica estão presentes nos grupos das frutas, legumes e verduras. Densidade Energética (DE) = Energia (kcal) Peso do alimento (g) na porção usual De acordo com Philippi e Aquino (2015), para realizar escolhas alimentares e incluir no cardápio alimentos saudáveis, é possível utilizar as informações referentes à DE do alimento e/ou à preparação, que, de maneira geral, vai variar entre 0 e 9 kcal/g. Quadro 5 – Densidade energética e escolhas saudáveis DE Classificação Grupos e/ou alimentos 0 – 0,6 kcal/g Baixa Frutas, legumes e verduras 0,6 – 1,5 kcal/g Média Cereais (principalmente integrais) e leguminosas 1,5 – 3,0 kcal/g Alta Pães, leite integral, carnes ≥ 3,0 kcal/g Muito alta Alimentos ultraprocessados fonte de açúcar e gordura Adaptado de: Philippi e Aquino (2015). 36 Unidade I A DE é uma informação nutricional que não se encontra presente em rótulos de alimentos processados e ultraprocessados, porém, é possível estimá-la: basta dividir o valor energético (kcal) pelo peso da porção do alimento. Deve-se comparar o total de quilocalorias com a quantidade de gramas da porção. Se houver menos quilocalorias do que gramas, a porção apresenta DE menor do que 1 kcal/g e o alimento em questão tem uma DE considerada de baixa a média. Se houver duas vezes ou mais kcal do que gramas, o alimento possui DE igual a 2 kcal/g, ou seja, apresenta alta DE. Esse cálculo pode contribuir com as escolhas saudáveis. 2.7 As tabelas de composição nutricional Conhecer a composição dos alimentos é de suma importância para alcançar a segurança alimentar e nutricional. As informações nutricionais contidas em uma tabela de composição de alimentos são pilares básicos para a educação nutricional, o controle da qualidade dos alimentos e a avaliação da ingestão de nutrientes de indivíduos ou populações.É com o uso das tabelas de composição nutricional que autoridades de saúde pública podem estabelecer metas nutricionais e guias alimentares que levem a uma dieta mais saudável. Ao mesmo tempo, é sua função fornecer subsídios a pesquisadores para estudarem a relação entre a dieta e os riscos de doenças. As tabelas são a base necessária para a elaboração da rotulagem nutricional com o intuito de auxiliar consumidores na escolha dos alimentos. Compreender a composição de alimentos consumidos nas diferentes regiões do Brasil é fundamental para elaborar ações de orientação nutricional baseadas nos princípios de desenvolvimento local e diversificação da alimentação, em contraposição à massificação de uma dieta monótona e desequilibrada. As tabelas, entretanto, precisam ser confiáveis, atualizadas e o mais completas possíveis, a fim de evitar decisões ou conclusões equivocadas. 2.7.1 As tabelas de composição nutricional e o planejamento dietético O planejamento dietético compreende a organização dos alimentos e/ou preparações; a avaliação dos aspectos quantitativos (calorias, macronutrientes e micronutrientes); fundamentadas nas premissas das leis de Escudero. Lembrete As leis de Escudero são a lei da quantidade, da qualidade, da harmonia, e da adequação. 37 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA A quantificação dos nutrientes presentes em um alimento é definida por sua composição química, que fornece informações básicas para ações de promoção da saúde. As tabelas de composição nutricional apresentam os macronutrientes quantificados em gramas. É necessário, ao final de todo planejamento alimentar, somar o total de carboidratos, proteínas e lipídios provenientes de cada alimento e multiplicar por seu valor energético de acordo com os fatores de Atwater. Tabela 3 – Calorias dos macronutrientes por grama Nutriente Calorias fornecidas por grama Carboidrato 4 Proteína 4 Lipídio 9 1 grama de álcool equivale a 7 calorias Observação Total de carboidratos em gramas × 4 = total de carboidratos em kcal Total de proteínas em gramas × 4 = total de proteínas em kcal Total de lipídios em gramas × 4 = total de lipídios em kcal Esse somatório de cada macronutriente (carboidrato, proteína e lipídeo) corresponde ao VET da dieta. Com o VET se calculam os percentuais (a distribuição em %) provenientes de cada macronutriente. Exemplo: Carboidrato: 280 g × 4 = 1.120 kcal Proteínas: 70 g × 4 = 280 kcal Lipídios: 70 g × 4 = 630 kcal VET = 2.030 kcal Distribuição % do VET: Carboidrato = 55,2% Proteínas = 13,8% Lipídios = 31% Total (VET) = 100% 38 Unidade I Tabela 4 – Distribuição percentual dos macronutrientes Nutriente OMS (WHO; FAO, 2003) DRI (IOM, 2001) SBAN (Vannuchi et al.,1990) Proteína 10% a 15% 10% a 35% 10% a 12% Lipídios 15% a 30% 20% a 35% 20% a 25% Carboidratos 55% a 75% 45% a 65% 60% a 70% Baseando-se numa dieta cujo VET é de 2.000 kcal/dia, tem-se a distribuição adequada de macronutrientes, conforme tabela seguinte: Tabela 5 – VET e distribuição percentual dos macronutrientes Nutriente OMS (WHO; FAO, 2003) DRI (IOM, 2001) SBAN (Vannuchi et al., 1990) Proteína 300% kcal15% VET 400% kcal 20% VET 240% kcal 12% VET Lipídios 500% kcal25% VET 400% kcal 20% VET 460% kcal 23% VET Carboidratos 1200% kcal60% VET 1200% kcal 60% VET 1300% kcal 65% VET 2.8 Planejamento dietético: cálculos e necessidades nutricionais A necessidade nutricional é a quantidade de energia e de nutrientes biodisponíveis nos alimentos que um indivíduo sadio deve ingerir para atender a todas as suas necessidades fisiológicas normais e para prevenir deficiências nutricionais. Observação A biodisponibilidade de nutriente se define como a eficiência com que um nutriente é utilizado por meio de vias metabólicas normais, ou seja, a parte do nutriente que é absorvida e apresenta potencial para atender às demandas fisiológicas em tecidos alvos. 2.8.1 O gasto energético total (GET) e seus componentes O GET é composto por: gasto energético basal (GEB) + gasto energético pela atividade física (Geaf) + efeito térmico dos alimentos (ETA). Gasto energético basal (GEB) Necessidade energética para manter a vida e as funções fisiológicas do indivíduo em condições de repouso. É, quantitativamente, o componente mais importante do GET e representa entre 60% e 65% do GET. 39 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA Gasto energético pela atividade física (Geaf) É o gasto energético referente à prática de atividade física. Varia conforme o tipo de atividade, a intensidade e o peso corporal do indivíduo. Pode representar cerca de 25% do gasto energético. Efeito térmico dos alimentos (ETA) É o gasto de energia gerado pelo consumo e metabolismo do alimento (pelos processos de digestão, absorção, utilização e armazenamento dos nutrientes). Depende da quantidade e da qualidade da dieta, sendo que alimentos proteicos exercem efeito termogênico maior. Representa de 10% a 15% do gasto energético. GET ETA GEAF 25% 60% 15% Figura 13 – Composição do GET Há diversas fórmulas propostas para o cálculo da necessidade energética dos indivíduos. Grande parte dessas equações preditivas foram criadas por meio de análise de estudos considerando a necessidade metabólica de populações diferentes e desenvolvidas para estimar esses valores em indivíduos saudáveis. Balanço energético (BE) Refere-se ao equilíbrio resultante entre a ingestão de energia (IE) da dieta alimentar e o GET. Dessa maneira: • Equilíbrio energético (IE igual ao GET) = manutenção do peso corporal; • BE positivo (IE acima do GET) = aumento do peso corporal; • BE negativo (IE abaixo do GET) = redução de peso corporal. 40 Unidade I 2.9 Passo a passo para o planejamento dietético A seguir veremos cada um dos passos necessários para fazer um planejamento dietético: • Anamnese (informações e dados): é um instrumento de avaliação nutricional que auxilia na estruturação de um plano alimentar adequado às necessidades do paciente tendo como objetivos: — compreender as necessidades do indivíduo; — obter informações relacionadas à alimentação (refeições, horários, composição de cada refeição, preferências, aversões, intolerâncias alimentares, pessoa responsável pela preparação das refeições, tempo disponível para realizar as refeições, local onde serão realizadas e outras informações relacionadas aos hábitos alimentares); — ponderar os aspectos socioeconômicos, a disponibilidade de alimentos, as condições de aquisição e preparo; — saber o objetivo do indivíduo (exemplo: promoção da saúde, redução de peso, aumento de peso, planejamento para patologia específica, entre outros). • Determinação do VET: — determinar as necessidades energéticas por meio de equações preditivas considerando as variáveis, tais como: gênero, idade, peso, altura e nível de atividade física. • Seleção das refeições: — fracionar a dieta em porções menores e mais frequentes; — realizar de quatro a seis refeições por dia, observando a rotina alimentar do indivíduo; — observar as refeições que compõem o dia: café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar, lanche da noite (e, se houver necessidade, intercalar com outros lanches intermediários). • Planejamento e distribuição do VET: — o percentual por refeição pode variar entre 5% e 35% do VET; — refeições principais devem conter de 20% a 35% do VET, e os lanches entre 5% e 15%; — os conceitos de alimentos fonte e densidade energética devem ser aplicados ao planejamento dietético; 41 PLANEJAMENTO DE CARDÁPIOS NOS CICLOS DA VIDA — a distribuição de energia preconizada para indivíduos sadios segundo WHO e FAO (2003) deve ser observada: – proteínas: 10% a 15% VET ou 0,75 g/kg de peso; – lipídios: até 30% do VET (entre 15% e 30%); – carboidratos: completam o VET (entre 55% e 75%). • Seleção de alimentos e preparações/refeições: — elaborar as refeições ao longo do dia; — compor o café da manhã de alimentos dos seguintes grupos: – leite