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Universidade Cruzeiro do Sul Apostila de Cozinha Clássica (Italiana e Francesa) e Contemporânea Curso Superior de Tecnologia em Gastronomia 2022/2 Universidade Cruzeiro do Sul Cozinha Clássica (Italiana e Francesa) e Contemporânea Curso Superior de Tecnologia em Gastronomia São Paulo 2022 2 Universidade Cruzeiro do Sul Coordenação do Curso Superior de Tecnologia em Gastronomia Prof. Nelson Almeida Elaboração do Material Didático Professor Patrick Ambrogi 2022 3 Introdução à disciplina: 5 Contextualização à disciplina: 5 França 6 Cozinha clássica francesa 6 Grandes chefs franceses 7 Nouvelle Cuisine 12 Cozinha francesa clássica e contemporânea 14 A gastronomia francesa 22 França - regiões 27 Norte e Nordeste da França 30 Noroeste da França 33 Centro da França e Alpes 36 Sudoeste da França 40 Sul e Sudeste da França 42 Itália 45 Selos italianos de qualidade e origem 49 Principais regiões e seus pratos típicos: 50 Região Norte 51 Piemonte 51 Veneto 59 Liguria 61 Emilia-Romanha 65 Região Central 70 Toscana 70 Lazio 75 Região Sul 79 Campânia 79 Puglia 84 Sicília 88 Massas 92 Massa Industrializada 92 Massa Fresca 93 Cozinha de criação 96 Técnicas e tendências 97 Criando um menu 104 4 Introdução à disciplina: A disciplina aborda os principais expoentes da cozinha clássica, trazendo à tona a compreensão sobre o papel do chef dentro do contexto da gastronomia atual, decompondo as referências clássicas de cozinha dentro da prática referencial das Cozinhas Italiana e Francesa e sua influência na gastronomia atual. Contextualização à disciplina: O estudo da cozinha clássica possibilita ao discente o exercício das habilidades gastronômicas, e o aprofundamento das técnicas clássicas de cozinha, despertando o senso artístico e o desenvolvimento cultural do aluno, valorizando as responsabilidades inerentes a atuação do profissional de gastronomia para a preservação e atualização de valores e fundamentos clássicos da gastronomia. 5 França Cozinha clássica francesa A gastronomia francesa é a base da cozinha clássica, e foi considerada em 2010 pela UNESCO, como "Patrimônio Cultural Imaterial do Mundo”. A França sempre explorou muito bem as suas características de clima e terreno para o desenvolvimento de sua gastronomia, extraindo da natureza os melhores ingredientes de suas regiões durante as diferentes épocas do ano. Os gauleses antigos eram ótimos agricultores e já utilizavam o trigo, a aveia, a cevada e o painço como base de suas preparações. O domínio da caça e dos métodos de conservação os transformou em mestres na arte do preparo de carnes. Com o passar dos tempos, muitos animais de caça foram domesticados para a criação em cativeiro. Os gregos introduziram as primeiras mudas de videiras na região e os romanos e seus refinados hábitos culinários influenciaram os gauleses desde o século I. A influência da igreja causou grande impacto nos métodos e na maneira como os trabalhos eram desenvolvidos. Os monges tiveram essencial responsabilidade pela seleção das melhores mudas de videiras e também pelo aperfeiçoamento da maturação dos queijos. Acima de tudo, a igreja mudou os hábitos de comer dos franceses, forçando a população a se abster de comer certos alimentos em determinadas épocas do ano. Nos séculos 8 e 9 ocorreu a abertura comercial do mar mediterrâneo novos ingredientes chegaram à mesa dos franceses. A partir da Renascença, a França buscou atingir todo o esplendor da gastronomia, e em seus diferentes movimentos, grandes Chefs formaram a base da cozinha francesa como a conhecemos hoje. François Pierre La Varenne, François Vatel, Marie-Antoine Carême, August Escoffier, Fernand Point, Pierre e Jean Troisgros, Paul Bocuse, Alain Chapel, Michel Guérard, Roger Vergé, Raymond Oliver… Esses são alguns dos nomes que moldaram e definiram os caminhos da Gastronomia Clássica francesa, e permitiram que esta se tornasse o que é hoje em dia - uma referência para a Cozinha Clássica mundial. 6 Grandes chefs franceses LA VARENNE François PierreLa Varenne nasceu em 1615, na França, onde foi um dos cozinheiros mais importantes de sua época. Foi o autor de Le Cuisinier François (1651) e Le Pâtissier François (1653), alguns dos livros de receitas mais influentes nos princípios clássicos da cozinha francesa. La Varenne rompeu com as tradições italianas que revolucionaram a culinária francesa medieval e renascentista no século XVI e início do século XVII. No livro Le Cuisinier François, rompeu com o jeito medieval de cozinhar, condenando o uso exagerado de temperos, o que omitia o sabor verdadeiro dos alimentos, criando um dos princípios básicos da culinária francesa - temperos para complementar, e não para esconder ou imitar o sabor. Foi dado especial cuidado para o cozimento de carnes, a fim de extrair o máximo sabor. Os vegetais e pescados tinham que ser frescos e cozidos no ponto ideal. As preparações passaram a respeitar a integridade gustativa e visual dos ingredientes. La Varenne era responsável pelas refeições de reis, duques e marqueses, e revolucionou a cozinha do século XVII inovando e descrevendo experimentos culinários praticados até hoje, tirando a cozinha da Idade Média e trazendo uma gastronomia mais leve e natural. Ele ainda definiu padrões sequenciais de refeição, como por exemplo entradas e pratos principais salgados e doces como sobremesa, banindo o gosto renascentista italiano por misturar ingredientes doces e salgados no mesmo prato ou na mesma parte da refeição. La Varenne foi o principal membro de um grupo de Chefs franceses, composto por outros especialistas em cozinhas e banquetes, escrevendo para um público profissional, 7 que codificou a cozinha francesa na era do rei Luís XIV. Os livros de receitas escrito pelo seleto grupo de La Varene redigiu obras de cozinha que foram utilizadas até a Revolução Francesa. Le Cuisinier François (1651) O livro Le Cuisinier François foi o mais expressivo trabalho de La Varenne, e trouxe as consideráveis inovações culinárias realizadas na França no século XVII, ao mesmo tempo em que codificava a preparação de alimentos de forma sistemática, de acordo com regras e princípios. Nesta obra, o Chef apresentou o primeiro preparo de uma bisque e ainda o molho Béchamel, que se tornou um molhos mãe da cozinha clássica. Na obra ainda há as primeiras referências ao uso dos termos bouquet garní, fonds de cuisine (fundos) e reduções, além do uso de clara de ovo para clareamento de consommé. Também contém a primeira receita impressa para o doce mille-feuille (mil-folhas) e aborda a questão de utilização de vegetais de modo inovador à época, trazendo ainda uma forma precoce de um outro molho mãe - o Molho Holandês. Além do livro Le Cuisinier François, ele ainda publicou mais três obras - Le Pâtissier François, em 1653, Le Parfaict Confiturier, em 1664 e L’École des Ragoûts, 1668. CARÊME Marie-Antoine Carême nasceu em 1784 e foi um Chef francês expoente do elaborado estilo da La Haute Gastronomie (Alta Gastronomia) ou Grande Cuisine, o 8 estado da arte da culinária francesa, sendo um estilo grandioso da gastronomia e reconhecido em todo o mundo. Carême é freqüentemente considerado um dos primeiros Chefs celebridade de renome internacional. Aos 10 anos de idade, Carême iniciou a sua carreira como assistente de cozinha em um pequeno restaurante em Paris, em troca de um local para comer e dormir. Em 1798, ele formalmente se tornou aprendiz de Sylvain Bailly, um famoso padeiro com uma padaria em Paris, próximo ao Palais-Royal, um bairro de alto padrão, com movimentos de moda e vida agitada em Paris, onde rapidamente teve o seu talento reconhecido e abriu sua própria loja, a Pâtisserie de la Rue de la Paix, que manteve até 1813. Ele ganhou fama em Paris construindo verdadeiras obras de arte, partindo somente de ingredientes simples, como açúcar, massa e recursos de confeitaria. Produziu peças com muitos pés de altura, adornando a sua vitrine e chamando a atenção dos comensais. A ele, são creditadas várias invenções clássicas de confeitaria. Carême fez vários trabalhos e criações principalmente para um famoso e influente diplomara francês e gourmand, Charles Maurice de Talleyrand-Périgord, o que lhe permit iu t rabalhar com outros membros da al ta sociedade par is iense, incluindo Napoleão Bonaparte. Napoleão sempre foi idiferente à gastronomia, mas entendia a importância do papel da culinária nas relações sociais dos processos diplomáticos, e com isso, forneceu à Talleyrand recursos para a compra do Château de Valençay, uma grande propriedade fora de Paris, para onde ele destinou Talleyrand. Napoleão pretendia transformar o castelo em uma espécie de lugar destinado a encontros diplomáticos. Quando Talleyrand se mudou para lá, ele levou Carême com ele. Lá, Carême foi desafiado por Talleyrand a criar vários menus em um único ano, utilizando apenas produtos sazonais e sem repetir um único menu. Carême passou no teste e completou o seu aperfeiçoamento nas cozinhas do Chateau de Valençay. Após a queda de Napoleão, Carême foi a Londres por um período e trabalhou como Chef de Cuisine ao Príncipe Regente, que se tornou o Rei George IV. Voltando ao continente, ele aceitou o convite do Czar Alexander I para se mudar para São Petersburgo e se tornar o cozinheiro oficial do Czar, mas ficou tão brevemente que não preparou nem uma refeição sequer. Ao retornar a Paris, ele se tornou chefe do banco James Mayer Rothschild. O impacto de Carême sobre assuntos culinários variou de trivial a teórico. Ele é creditado com a criação do chapéu padrão do chef, o toque, ele projetou novos molhos e pratos, e ele publicou uma classificação de todos os molhos em grupos, e classificando os molhos mãe - Béchamel, Espanhol, Holandês e Velouté com base em quatro molhos de 9 mãe. Car6eme também substituiu o estilo de serviço à francesa, onde todos os pratos são servidos de uma única vez, ao estilo buffet, pelo serviço à russe, onde cada prato é servido de acordo com a ordem pensada em um menu. Carême escreveu vários livros sobre culinária, além de centenas de receitas, planos de menus e configurações de mesa opulentas, e mais um histórico de culinária francesa com instruções para organizar cozinhas e definições de posições de brigada. Carême morreu em sua casa, na cidade de Paris aos 48 anos, por complicações pulmonares decorrentes dos muitos anos inalando os fumos tóxicos do carvão sobre o qual ele cozinhava. Ele é lembrado como o fundador do conceito de Alta Gastronomia e está enterrado no cemitério de Montmartre, em Paris. Carême estabeleceu a grande cuisine e escreveu um tratado cuidadoso detalhando numerosos pratos e molhos em sua obra, La Cuisine Classique, e em outros volumes. A grande cuisine sugeria uma sequencia de refeição baseada em uma "carte" disponível na cozinha. É dessa nova filosofia que surge o que se conhece por restaurante à la carte (com cardápio pré definido). A proposta de Carême foi levada adiante por seus sucessores – Dugleré, Urbain Dubois e Escoffier. ESCOFFIER Georges Auguste Escoffier foi um Chef francês nascido em 1846. Foi restaurateur e escritor culinário, popularizando a atualizados as técnicas e métodos tradicionais franceses de cozinha. Grande parte da técnica de Escoffier foi baseada na de Marie- Antoine Carême, porém a sua principal conquista foi simplificar e modernizar o elaborado e ornamentado estilo de Carême. Em particular, ele codificou as receitas partindo agora 10 de cinco molhos mãe os cinco molhos de mãe, Béchamel, Espanhol, Holandês, Velouté e incluindo o molho de tomate nesta categoria. Escoffier era reconhecido como o “rei dos cozinheiros e cozinheiro dos reis" , se tornando o pireipal Chef de cozinha da França no início do século XX. Além das receitas criadase reinterpretadas por ele, Escoffier elevou o status de cozinheiro para uma profissão respeitada e extremamente disciplinada e organizada. Escoffier nasceu próximo a Nice. A casa onde nasceu é hoje em dia o Museu da Arte Culinária, administrado pela Fundação Auguste Escoffier. Com apenas treze anos de idade Escoffier trabalhou com seu tio em um restaurante em Nice, onde demonstrou enorme aptidão para o gerenciamento de cozinha, e logo foi contratado por um grande hotel da região, e aos 19 anos foi contratado para trabalhar como aprendiz da praça de cocção de assados no Le Petit Moulin Rouge, em Paris. Porém pouco tempo após a sua chegada à cidade, foi convocado pelo exercito para o serviço militar obrigatório, onde recebeu o cargo de chefe do exército. Escoffier passou quase sete anos no exército, sendo o militar mais graduado e com posição principal em vários quartéis de toda a França, onde recebeu a incumbência de trabalhar como chef de cozinha do Exército do Reno, após o início da guerra franco- prussiana em 1870. Suas experiências no exército o levaram a estudar a técnica de conservas de comida. Em 1878, ele abriu seu próprio restaurante, Le Faisan d’Or, em Cannes, onde se casou em 1880. Em 1884, se mudou para Monte Carlo, onde foi empregado pelo empresario e hoteleiro César Ritz, para trabalhar como gerente do novo Grand Hotel, assumindo o controle das cozinhas em Monte Carlo durante o inverno, e durante os verões, as cozinhas do Grand Hôtel National em Lucerna, também administrado por Ritz. Em 1890, a César Ritz e Escoffier aceitaram um convite do para administrarem o novo Hotel Savoy, em Londres. Ritz então juntou o que ele se referia como "um pequeno exército de homens de hotel, para a conquista de Londres", enquanto Escoffier recrutou cozinheiros franceses e reorganizou as cozinhas. O Savoy, agora sob administração de Ritz e seus sócios foi um sucesso imediato, atraindo uma clientela distinta e de levada posição social, liderada pelo Príncipe de Gales. Gregor von Görög, chefe da família real, era um entusiasta da zelosa organização de Escoffier. As mulheres aristocráticas, até então desacostumadas a jantar em público, agora eram vistas nas salas de jantar do Savoy. 11 Escoffier criou muitos pratos famosos no Savoy, porém em março de 1898, Ritz e Escoffier foram demitidos do Savoy, sendo acusados de fraude, facilitações e desvio de produtos. Ritz e Escoffier ainda criaram a a Ritz Hotel Development Company, companhia responsa’vel pelo recrutamento e gerenciamento de cozinheiros e equipes completas de brigadas, prestando serviços para o Ritz de Paris e Carlton, de Londres. Em 1913, Escoffier assumiu a responsabilidade de realizar uma experiência culinária a bordo do Imperator, um dos maiores navios da rota Hamburgo - Nova Iorque, onde realizou um trabalho primoroso sendo reconhecido pelo próprio Kaiser alemão Wilhelm II, como o Imperador dos Chefs. Escoffier ainda trabalhou durante a Primeira Guerra, vindo a se aposentar das cozinhas em 1920. Em 1928, ele ajudou a criar a Associação Mundial de Sociedades de Chefs (World Association of Chefs' Societies - WACS) e tornou-se seu primeiro presidente. Escoffier publicou o Le Guide Culinaire , que ainda é usado como um trabalho de referência importante, tanto na forma de um livro de receitas como de um livro de texto sobre a culinária. As receitas, as técnicas e as abordagens de cozinha da Escoffier continuam a ser altamente influentes hoje em dia, e foram adotadas por chefs e restaurantes, não só na França, mas também em todo o mundo. Escoffier morreu em 12 de fevereiro de 1935, aos 88 anos, duas semanas depois de sua esposa. Nouvelle Cuisine Nouvelle Cuisine é um termo que designa a abordagem para a culinária e a apresentação de comida na cozinha francesa, criada na década de 1960, que é caracterizada por pratos leves, delicados em que há uma maior ênfase na apresentação das produções, criando um contraste com a cozinha praticada até então. O termo foi popularizado na década de 1960 pelos críticos Henri Gault e Christian Millau, em seu guia de restaurantes Gault-Millau. Historicamente o termo “Nouvelle Cuisine" tem sido usado várias vezes na história da culinária francesa, para marcar uma ruptura limpa com o passado. Nas décadas de 1730 e 1740, vários escritores franceses enfatizaram sua ruptura com a tradição, referindo-se à cozinha da época como "moderna" ou “nova". Nos anos 1880 e 1890, a culinária de Auguste Escoffier também foi descrita pelo termo. Porém o estilo que Gault- 12 Millau se referia, era uma reação à cozinha francesa clássica, colocada em primeiro plano por Escoffier. Gault e Millau "desenvolveram uma fórmula" contendo dez características deste novo estilo de culinária. As dez características identificadas foram: • Uma rejeição a complicações excessivas na culinária. • Os tempos de cozimento para a maioria dos peixes, frutos do mar, aves de caça, vitela, vegetais verdes e patés foram bastante reduzidos na tentativa de preservar os sabores naturais. • A cozinha deveria ser feita com os ingredientes mais frescos possíveis. • Grandes menus foram abandonados em favor de menus mais curtos. • As marinadas fortes para a carnes e caças deixaram de ser usadas. • Molhos pesados como Espanhol e Béchamel foram substituídos por temperos com ervas frescas, manteiga de alta qualidade, suco de limão e vinagre. • Pratos regionais substituídos por novas inspirações e combinações, fugindo à cozinha clássica. • Novas técnicas e equipamentos foram introduzidos. • Os Chefs passaram a se atentar às necessidades dietéticas de seus comensais, através dos pratos. • Os Chefs eram extremamente inventivos e criaram novas combinações e composições. Fernand Point (1897-1955) foi o chef proprietário do La Pyramide na França, o primeiro restaurante com as características da Nouvelle Cuisine que foi além da base clássica, até então aperfeiçoada por Escoffier, e introduziu novas mudanças na gastronomia e iniciou o movimento. Paul Bocuse e Jean Troisgros, discípulos de Point, juntamente com Roger Vergé e Michel Guerard, “popularizaram” a Nouvelle Cuisine, levando ao crescimento e desenvolvimento da cozinha contemporânea. Logo este novo estilo se tornou sucesso em todo o mundo, encorajando outros cozinheiros, menos treinados ou menos talentosos, a praticar esta nova cozinha, mas sem respeitar plenamente as regras, o que provocou um declínio na qualidade nas décadas seguintes. Na década de 1980 , o termo "cozinha nova" chegou a ter uma conotação pejorativa e levou o movimento a gerar espaço para novas técnicas e estilos de cozinhas. 13 Apesar do legado controverso da Nouvelle Cuisine, é inegável que muitas das suas características foram integradas na cozinha atual, como por exemplo: • Os produtos devem ser frescos e de alta qualidade. • O tempo de cozedura deve ser curto e preciso. • Os molhos devem ser leves. • A estética deve estar presente, bem como o sabor e as questões nutricionais. Cozinha francesa clássica e contemporânea Durante a idade média e no início da renascença, as comidas preparadas para a aristocracia eram exageradamente elaboradas e super condimentadas. Na metade do século 16, o estilo das comidas começou a mudar, graças a La Varenne. Ele salientou a importância dos sabores naturais, molhos mais leves e vegetais frescos. Ao mesmo tempo, trouxe ingredientes da Ásia, Oriente Médio e Américas. Esse leve e moderno estilo de cozinhar resultou em novos pratos e novas oportunidades. Com a evolução das técnicas, saladas e pratos leves ganharam lugar entre comidas mais pesadas e este modelo passou a se tornar um padrão na cozinha clássica. Combinações de carnes e vegetais passaram a formar agora pratos frios mais refinados, gerando um importante papel para novas posições de brigada,como o Garde Manger, que se expandiu de técnicas de preservação de alimentos à preparação de todos os pratos frios servidos nos restaurantes. Esta evolução da cozinha francesa, de La Varenne até Escoffier se refere à Cozinha Clássica Contemporânea. Para um futuro Chef, conhecer, entender e dominar essas técnicas é de extrema importância. TÉCNICAS CLÁSSICAS BÁSICAS MOLHOS Molho é um meio líquido utilizado para adicionar sabor, umidade, aparência e ajustar o sabor e a textura de preparações culinárias. Pode ser quente, frio, doce, salgado, liso ou com pedaços. A palavra molho, que deriva do latim salsus (salgado), nasceu da necessidade de salgar, temperar por igual um alimento. Depois o molho passou apenas a umedecer e complementar as preparações, chegando até a ser mais importante do que o próprio alimento. 14 Antigamente, os molhos eram utilizados para disfarçar o odor desagradável de alimentos que começavam a deteriorar, e eram compostos basicamente de vinagre, sal, azeite e cebola. Deve-se observar os seguintes aspectos em um bom molho: • Sabor • Umidade • Riqueza (proteínas, sais, etc.) • Apelo visual atraente Com raras exceções, o preparo dos molhos se baseia em alguns preceitos importantes: I. Uso de equipamentos adequados, como panelas de fundo grosso para garantir a distribuição uniforme de calor e evitar que o molho queime ou talhe; II. Uso de fundos de boa qualidade; III. Uso dos agentes espessantes apropriados para se obter boa textura, sabor e aparência; IV. Temperar corretamente, buscando um sabor adequado. Além disso, os molhos devem ser compatíveis com o prato, com o estilo de serviço, com o método de cocção e com o sabor final da preparação. MOLHOS MÃE Os 5 molhos mãe são: • Béchamel (leite + roux branco) • Velouté (fundo claro + roux amarelo) • Espanhol (fundo escuro + roux escuro + mirepoix) • Tomate (tomate + roux (opcional)) • Holandês (manteiga + gemas) Um molho é considerado molho mãe quando puder ser preparado em grandes quantidades, e depois aromatizado, finalizado e guarnecido de inúmeras maneiras, produzindo os famosos molhos compostos. 15 MOLHO BÉCHAMEL Molho à base de leite, roux branco e complementos aromáticos, com sabor e textura cremosa. É um molho de grande importância devido a seu caráter neutro e suave/ cremoso. Se preparado adequadamente, o resultado do béchamel deve ter um sabor cremoso e uma coloração clara, que reflita seu ingrediente principal, o leite. Deve ser cozido durante o tempo necessário, em fogo brando, para não ficar com gosto de farinha ou grumos. Embora se trate de um molho opaco, o béchamel deverá ter uma coloração final brilhante e ligeiramente marfim. O béchamel pode ser preparado com diferentes consistências, de acordo com a preparação no qual será utilizado. Na consistência mais leve, o béchamel pode ser utilizado como base para sopas, na consistência média pode ser usado como molho. O béchamel mais denso serve de base para recheios e pratos assados e gratinados. MOLHO VELOUTÉ O nome deste molho, que é a base para inúmeros molhos brancos, é traduzido do francês como “aveludado, suave e macio ao paladar”. O velouté é feito à base de fundo claro, roux amarelo e ingredientes aromáticos, e deve seguir alguns padrões de qualidade: • Seu sabor deve refletir o sabor do fundo utilizado, ou seja, quase neutro; • Deve ter coloração pálida em tons marfim, nunca acinzentada; • Sua aparência deve ser translúcida e brilhante; • A textura deve ser aveludada, sem grumos ou traços de farinha de trigo; • O molho deve ser encorpado, ter consistência de nappé médio. O molho velouté possibilita inúmeras derivações e é também muito utilizado como base para sopas. 16 MOLHO ESPANHOL É o molho base de preparo de todos os molhos escuros. Não costuma ser servido em seu formato original, mas ainda é muito utilizado nas cozinhas dos bons restaurantes. É usado para preparar demi-glace. Aspectos importantes no preparo do molho espanhol: • Partir de bons ingredientes. O fundo deve ser aquecido e provado antes de ser incorporado ao molho; • A adição de mirepoix deve ser feita com cautela, pois se o fundo utilizado já estiver bastante aromatizado, esta adição se torna desnecessária; • O purê de tomate deve ser caramelizado e cozido propriamente, podendo ser substituído por extrato, tomate fresco ou até mesmo molho de tomate*; • O roux escuro contribui muito na textura e sabor final deste molho e deve ser bem preparado (alguns chefes costumam preparar este roux no forno para evitar que queime e fique amargo); • Utilizar sempre roux quente com líquido frio e roux frio em líquido quente. *Pinçage: processo de caramelizar um ingrediente (tomate, ossos, aromáticos, carnes) na presença ou ausência de gordura, segundo o caso. Para o tomate, este processo reduz acidez, doçura ou amargor excessivos, o que pode afetar o resultado final do molho. MOLHO DE TOMATE Há várias formas de se produzir molho de tomate. Em algumas versões utiliza-se o azeite de oliva como gordura, em outras, banha de porco ou manteiga. Sua textura é menos aveludada e refinada do que a dos demais molhos mãe e, por este motivo, o molho de tomate levou mais tempo para ser reconhecido como um dos grandes molhos. O molho deve ter um sabor forte de tomate, sem traços de amargor, acidez ou doçura. Os demais ingredientes adicionados ao molho devem complementar o sabor, sem se destacar de qualquer maneira. Depois de pronto, o molho pode ser guarnecido e decorado com os ingredientes desejados, de acordo com a utilização do mesmo. A textura final deve ser de nappé e a cor levemente opaca. Todavia, se cozido, coado e processado corretamente, o molho terá uma cor marcante e um leve brilho. 17 O molho de tomate é o acompanhamento mais apropriado para produções crocantes (fritas), pratos à base de vegetais, massas e alguns salteados. MOLHO HOLANDÊS Molho clássico francês elaborado com manteiga clarificada, gemas, ácido, sal e pimenta. Este molho transformou os pratos cozidos à base de ingredientes como vegetais e peixes em algo especial. O molho holandês pertence ao grupo de molhos emulsionados (emulsão é a mistura mecânica de dois líquidos que não se misturam naturalmente, como por exemplo água e óleo), e é um molho bastante frágil por não se tratar de uma verdadeira mistura, podendo separar-se facilmente. O molho deve ter uma textura aveludada e macia, coloração ligeiramente amarelada e sabor marcante de manteiga, levemente ácido. MOLHOS CONTEMPORÂNEOS Estes molhos não pertencem nem à categoria de molhos mãe, nem à categoria de molhos compostos, e costumam serem preparações que exibem uma variedade muito grande de ingredientes, possibilitando uma série de novas criações. A função dos molhos contemporâneos, entretanto, é a mesma dos molhos mãe e seus compostos: dar sabor, textura, umidade e cor às preparações. Distinguem-se dos molhos mãe nos seguintes aspectos: • Demoram menos tempo para ser preparados; • São específicos para algumas preparações e/ou técnicas específicas; • Podem ser engrossados e finalizados mediante o uso de emulsões, amidos modificados, ou reduções, e quase nunca o roux; • Não permitem derivações. Os molhos contemporâneos incluem: JUS LIÉ Molho produzido pela recuperação dos sucos de cocção que, em cozinhas comerciais, substitui o demi-glace, uma vez que seu preparo é mais rápido. Pode ser espessado por redução ou com amidos, que agem mais depressa do que outros agentes espessantes. O sabor é menos rico e encorpado e a textura mais leve que o demi-glace. 18 BEURRE BLANC / BEURRE ROUGE Molho feito com vinho seco e cebola picada, reduzido em fogo médio, ao qualse acrescenta, gradualmente, manteiga sem sal, formando uma emulsão. Acompanhamento ideal para peixes e vegetais. O beurre blanc tem textura e leveza semelhante ao molho holandês. Seus três ingredientes básicos são: echalotas, vinho e manteiga. O beurre rouge é um molho preparado da mesma forma, com a substituição de vinho branco por tinto. Um bom beurre blanc e um bom beurre rouge têm sabor neutro, o que favorece a percepção de sabores de outros temperos quando adicionados, como por exemplo, ervas, especiarias e purê de vegetais, complementando assim os pratos que ele irá acompanhar. A coloração básica é pálida e brilhante, e somente se altera mediante a introdução de outros ingredientes saborosos. MANTEIGAS COMPOSTAS Fazem parte do rol dos molhos contemporâneos e são consideradas um tipo de molho usado na finalização de carnes grelhadas ou assadas. A manteiga é aromatizada com uma série de ingredientes, como ervas, nozes, raspas da casca de frutas cítricas, alho, échalotes, gengibre e vegetais. Ela dá sabor, cor e textura a vários outros molhos e preparações. Podem ser preparadas com muita antecedência e armazenadas em embalagem plástica sob refrigeração por muitos dias, sem perder a qualidade. COULIS Purê de legumes ou de frutas, aquecido em banho-maria ou cozido em fogo lento, que, no final, pode ou não receber manteiga ou creme de leite. SALSA Molho de origem mexicana, composto por legumes, ervas e às vezes frutas, quase sempre cruas, para que mantenham a sua natureza crocante. São sempre frias e acompanham pratos quentes ou frios. 19 COMPOTA Preparação à base de legumes ou frutas inteiras, geralmente banhados em uma calda, azeite ou vinagre, com ervas e/ou especiarias. RELISH Preparação de origem indiana que se assemelha ao chutney, mas é mais condimentada. Trata-se de um purê agridoce feito de frutas e vegetais ao qual se adicionam condimentos e especiarias. CHUTNEY Preparação de origem indiana, em forma de geléia agridoce e picante, feita com vários tipos de frutas ou vegetais cozidos em vinagre e ervas aromáticas. Normalmente serve-se frio. VINAGRETE Emulsão temporária de ácido e óleo, originalmente preparada com vinagre, azeite, sal e pimenta. Pode-se produzir inúmeras variedades de vinagrete, dependendo do tipo de ingrediente adicionado à composição inicial. INFUSÃO DE ÓLEOS Óleos aromatizados com ervas, especiarias, etc. SABAIONES SALGADOS Introduzidos com a Nouvelle Cuisine, resultam da mistura de gemas com fundos de cocção, azeite de oliva ou creme de leite, ervas, vinho seco ou champanhe, obtido pelo mesmo processo de um sabaione doce (emulsionado em banho-maria). A maioria dos molhos, tanto os molhos mãe quanto seus derivados e os contemporâneos, pode ser preparada com antecedência, ser resfriada e armazenada adequadamente. Na hora de servir, basta apenas esquentá-los sob fogo direto. 20 Entretanto, alguns molhos mais delicados, como os à base de creme de leite, devem ser aquecidos em banho-maria. Por mais simples que pareça a preparação de um molho, o Chef que os prepara deve ser extremamente habilidoso e seguir os princípios básicos de preparo e de armazenamento, o que resultará em um molho perfeito. VOCÊ SABIA? A formação de brigada de cozinha foi definida por Auguste Escoffier. Escoffier organizou sua cozinha criando a brigada de trabalho, onde cada um tem sua função e praça de trabalho, introduzindo organização e disciplina no local onde havia muita desordem e implantando uma hierarquia na cozinha. A brigada clássica é distribuída da seguinte maneira: • Chef: Principal executivo da cozinha, o chef é o responsável pela brigada. • Sous-chef: Segundo no comando. • Chef de partie: Responsável por cada praça. • Saucier: Prepara salteados, braseados e molhos. • Rotisseur: Prepara carnes e aves assadas. • Grillardin: Prepara grelhados. 21 • Poissonier: Prepara peixes. • Potager: Prepara sopas. • Garde manger: Responsável pela cozinha fria, ou seja, pelo preparo de patês, terrines, canapés, saladas e molhos frios. • Boucher: Faz parte do Garde Manger, é responsável pela limpeza, desossa e corte de carnes e aves. • Legumier: Prepara legumes para a cocção. • Entremetier: Responsável pelo cozimento de legumes, amidos, ovos e frituras por imersão. • Tournant: Não tem uma praça específica, trabalhando onde for necessário. • Pâtissier: Prepara massas e doces. • Aboyeur: Responsável por “cantar” as comandas para a cozinha. A gastronomia francesa A comida e a cozinha são relacionadas à identidade de um povo, são seu patrimônio cultural. As tradições alimentares não são estáticas e, por isso, houve um processo importante de transformação na cozinha entre a culinária e a gastronomia. A gastronomia não se define em uma única receita, não apresenta um modelo único, e sim movimentos, tendências e momentos, que estabelecem seu resultado e determina também qual é o tipo de gastronomia existente ou predominante em uma região ou, em um certo momento da história. Quando nasce a gastronomia, nasce com ela também as opiniões de quem as cria. Desta forma, a gastronomia é formada pelas opiniões de grandes chefs e de sua brigada, criada de diversas maneiras. Uma forma das pessoas participarem da vida social, política e cultural francesa era através do interesse pela comida, além da importante culinária exercida para a nobreza em suas residências. Os primeiros restaurateurs (proprietários de restaurantes) de Paris eram beneficiários do sistema de privilégios e status do regime antigo, e não suas vítimas, ao contrário do que dizia o senso comum a 22 respeito do surgimento do restaurante, que afirmava que seu aparecimento decorreu pelo desemprego dos chefs de cozinha da aristocracia pós Revolução Francesa. Este tinha que se estabelecer por conta própria e possibilitou assim, a democratização do acesso dos plebeus à culinária refinada e exclusiva da nobreza. O que diferenciava este estabelecimento dos demais já existentes era a presença de várias mesas, inclusive individuais, em que o cliente podia escolher sua companhia e sua comida através de um cardápio com preços estabelecidos, e pagava exatamente por aquilo que consumiu. Surge, então, a palavra menu, indicando uma refeição completa proposta pelo chef, com entrada, prato principal e sobremesa, diferenciando-se da palavra carte, que indica todas as opções que o restaurante oferecia ao cliente. Alguns relatos, designam o surgimento do restaurante juntamente à Revolução Francesa. Entretanto, há os que defendem que este tipo de comércio surgiu algumas décadas antes, com Roze de Chantoiseau, um francês fundador do banco privado no século XVIII e do restaurante. Ele oferecia caldos fortificados aos viajantes para restaurar a saúde. Esses caldos eram oferecidos por uma lista disponível a qualquer hora que o cliente chegasse e podiam ser escolhidos pelo viajante ou sugeridos pelo restaurateur. Essa ideia se assemelha muito ao surgimento dos bistrots. No início do século XVIII, o bistrot apareceu a partir de lugares que vendiam bebidas quentes e lenha para fogueira, e onde a vizinhança geralmente se encontrava para beber uma taça de vinho ou uma xícara de café. A tradição nasceu quando os donos desses estabelecimentos passaram a servir pratos de comida modestos para as famílias. Muito comum era encontrar o menu du jour, um cardápio do dia, sugerido pelo chef, com opções de entrada, prato principal e sobremesa, ou uma combinação entre eles, a um preço acessível. Na maioria dos lugares, eram servidas opções de entrada e prato principal ou prato principal e sobremesa,o que dava um toque diferenciado ao significado do menu. Com a abolição das guildas – associação de auxílio mútuo entre as corporações de operários, artesãos, negociantes e artistas na Idade Média, e a instauração do livre comércio, qualquer pessoa podia ter o direito de montar seu estabelecimento e vender sua comida, sem limitações. Alega que os primeiros restaurantes apareceram 23 por uma rivalidade entre a culinária e a medicina, tendo em vista também os acessórios que utilizam até hoje, como garfos, pinças, facas e tesouras. Esses estabelecimentos eram primeiramente lugares onde haviam encontros políticos e no futuro, como os bistrôs, seriam ambientes familiares, visitados por toda população parisiense e, posteriormente, esse modelo seria espalhado para todo o mundo. A partir de 1799, com a consolidação do Primeiro Império de Napoleão Bonaparte, os restaurantes passaram a crescer. Houve um incentivo à discussão das artes pelo Estado, na tentativa de distrair o povo em relação aos problemas militares e econômicos da época. Assim, a gastronomia passou a ser considerada uma questão de paladar, prazer e estética, e não mais um motivo de saúde. A atenção à culinária regional começou a despontar também, conforme esse tipo de cozinha crescia, e então, no início do século XX, surgiram os restaurantes especializados. Resgata-se aí também o conceito de terroir. Nitidamente, isso sinaliza o desenvolvimento e o interesse pela fonte de comércio que decorre de um restaurante e, o interesse do consumidor pelo desenvolvimento da sociedade. O interesse por este tipo de estabelecimento fica evidente nas elites parisienses, e passa a ter um novo significado em relação à aceitação do espaço e das atividades públicas realizadas por estes. O restaurante por oferecer um atendimento individualizado, diferente da table d'hôte, começou a atrair o empresário local, principalmente pós Revolução Francesa, quando muitos Chefs da nobreza mais empobrecida se disponibilizaram ao mercado. No formato table d'hôte, os empreendedores obtinham alguns clientes dispostos a pagar mais por uma comida melhor, mas a maioria não queria ou não podia gastar além do normal, então ficavam limitados às possibilidades de variar os cardápios e elevar a qualidade para se obter lucro. Entretanto, como restaurateurs conseguiam aumentar seus lucros por vender produtos diferenciados com preços mais altos, para um público com maior poder aquisitivo. O surgimento do restaurante foi resultado das necessidades sociais e econômicas, não só dos que precisavam de alimentação, mas também dos que a forneciam. 24 A partir do momento que a alta burguesia e os nobres passaram a ser atraídos pelas seleções de cardápios e pelo atendimento dentro de um restaurante, este passa a ser procurado também pela população restante, e claro, diferenciado pelo valor que cobrava e pelo cardápio e serviço oferecidos. Paris e seus restaurantes Paris é conhecido mundialmente como um importante centro gastronômico. Esse título deve-se não só ao grande número de bons restaurantes que lá existem, mas também aos fatos importantes que ocorreram desde muitos séculos na sua história da alimentação. Aqui a história será retratada a partir do século XVIII, quando surgiu um estabelecimento comercial bem característico: a table d'hôte. A tradução para este tipo de casa seria mesa do anfitrião, que era quem determinava aos clientes o que iriam comer, em qual horário e quanto iriam pagar. À época, fim do século XVIII, os frequentadores reclamavam constantemente pela falta de qualidade da comida servida, e além disso, os clientes que chegavam mais cedo, comiam mais e melhor, pois escolhiam a parte que mais lhe interessavam do prato servido. Outro tipo de estabelecimento importante no caminho para o surgimento do restaurante, é o café. Este tipo de casa já havia sido relatada na Arábia e Pérsia no século XV e, na França, mais precisamente em Marselha, no final do século XVII, e, na mesma época em Paris. Imagem: Restaurante parisiense com vista para a Torre Eiffel 25 O café era caracterizado normalmente por balcões ao ar livre, que serviam inicialmente somente a bebida café, mas em seguida passaram a vender outros tipos, como o chá e o chocolate quente. O chocolate quente veio da Espanha, assim como alguns produtos específicos de Viennoiserie, que se refere a produtos feitos a partir de fermento biológico, semelhante aos pães, mas com ingredientes que os aproximam da confeitaria, e Patisserie, que se refere a produtos de confeitaria. Os cafés eram locais frequentados por estudantes e intelectuais, palco de discussões políticas e sociais, e frequentemente associados às discussões que sucederam a Revolução Francesa, alguns anos mais tarde. A ligação com os restaurantes é essencial, pois os cafés tinham características que os restaurantes modernos têm, como pedidos individuais em mesas separadas, contas e, alguns tinham listas de produtos e preços afixados em cartazes na parede. Além disso, já havia o princípio do convívio e da união de classes sociais e da troca de informações entre elas. O primeiro café de Paris foi estabelecido em 1674, pelas mãos de um italiano, o napolitano Francesco Capelli. Um novo tipo de estabelecimento apareceu, ao final do século XVIII, próximo à Revolução Francesa. Foi exatamente o que chama-se hoje de restaurante: lugar onde se pode sentar, ser servido e pedir o que se deseja comer em horários inicialmente definidos por convenção - café da manhã, almoço e jantar – mas sem a rigidez das table d'hôte. Foi neste tipo de estabelecimento que surgiu uma brigada de salão, ou seja, funcionários que trabalham no salão de um restaurante, como garçon, mâitre, chefe de sala. Eram pessoas mais treinadas e preocupadas em servir o cliente bem. O mesmo ocorreu na cozinha, com o aparecimento da brigada de cozinha, com todas suas divisões definidas. 26 França - regiões • Paris e Île-de-France: A metrópole e maior cidade da França carrega todo o charme da cozinha francesa. Nos diversos restaurantess, pâtisseries, boulangeries, bistrots e cafés os franceses exploram o máximo da gastronomia francesa, sem deixar de lado a valorização pelos ingredientes regionais e artesanais. • Champagne, Lorraine e Alsace: Localizada no nordeste francês, essa região é mundialmente conhecida pela produção do mais famoso vinho espumante, o champanhe. A apreciação e o consumo de carnes de caça é frequente devido a proximidade com as florestas da região. De Lorraine vêm os embutidos e uma das mais famosas tortas francesas, a quiche lorraine. Na Alsácia, a influência e proximidade com os alemães, desenvolveu uma cultura gastronômica típica, unindo o melhor dos dois países. • Nord-Pas de Calais, Picardie, Normandie e Bretagne: Região banhada pelo canal da mancha, onde se desenvolveu um grande hábito de consumo de frutos do mar e pescados. O queijo camembert e a tarte tatin são originárias das região. • Bourgogne e Franche-Comté: A Borgonha é conhecida pela produção de excelentes vinhos, o que acabou influenciando diretamente no desenvolvimento dos pratos regionais, que em grande 27 parte levam a bebida em sua composição, com destaque para o Boeuf à la Bourguignonne. Borgonha também é o local de criação da mostarda Dijon. • Lyon e Rhône-Alpes: Lyon pode ser considerada a capital gastronômica da França. Berço da Nouvelle Cuisine, é também a terra dos mais famosos chefes franceses - Fernand Point, Paul Bocuse, Pierre e Jean Troisgros e Alain Chapel. Os mercados da região são abastecidos diariamente com os melhores ingredientesque a França oferece. Os embutidos também são muito apreciados nessa região. • Poitou-Charentes e Limousin: Ostras e mexilhões são iguarias muito cultivadas e apreciadas em Poitou-Charentes, e em Limousin grandes rebanhos de ovinos e bovinos são uma constante em suas paisagens. • Bordeaux, Périgord, Cascogne e Pays Basque (Aquitaine): Bordeaux é mundialmente conhecida pelo seus excelentes vinho de corte bordalês. A pesca tem papel fundamental nos pratos regionais. O foie-gras é uma das iguarias da região. • Toulousin, Quercy, Aveyron (Midi-Pyrénées) e Auvergne: Essa região é berço do cassoulet e também é conhecida pela sua água mineral de excelente qualidade. Queijos Roquefort, trufas e cogumelos de qualidade superior são provenientes dessa região • Languedoc, Roussillon e Les Cévennes: A cozinha mediterrânea, rica em ervas e aromas começa se mostrar influente a partir daqui. Frutos do mar dividem a mesa com carnes de caça, cordeiro, cogumelos e queijos de cabra, trazendo o conceito de mar e montanha nas preparações. Ensopados de peixe e frutos do mar, como moules marinières e a brandade de morue vêm dessa região. 28 • Provence e Cote d’Azur: A Cote d’Azur ou Costa Azul, é uma região extremamente charmosa e muito visitada na França. Pratos com frutos do mar são excelentes na região. Na Provence são cultivadas frutas, legumes, ervas e a maior parte das azeitonas que abastecem a França. A cozinha da Provence é rica em cores, aromas e sabores e se caracteriza por ser saudável e natural. • La Corse: Apesar de ser uma ilha, na Córsega encontramos excelentes pratos de caça, embutidos e carnes preparadas com métodos de cocção ancestrais, além de peixes e frutos do mar. 29 Norte e Nordeste da França O Nordeste da França possui planícies abertas e planas, limitadas pelas montanhas Vosges e pelas florestas das Ardennes. A área é conhecida pelos excelentes vinhos da Champanhe e da Alsácia , por algumas das mais belas catedrais góticas francesas e por lembranças de batalhas. Os visitantes que vão a Boulogne, Le Touquet e Calais conhecem melhor a região Norte pelos seus peixes. Os pratos transbordam de frutos do mar e o combinado de mexilhões quentes e batatas é um dos prazeres desta costa. Um clássico da região é a Truite Ardennaise, uma truta frita na panela com presunto defumado e creme. Os arenques são encontrados ao longo da costa da França e servidos grelhados ou defumados, acompanhados de batatas. O lúpulo, utilizado para fazer cerveja, é cultivado no interior, assim como a chicória, e ambos são servidos como legumes. A Alsásia e a Lorena compartilham a tradição de fazer cerveja, sendo que na Lorena, é utilizada na culinária também. A Alsácia é a maior produtora de cerveja da França, graças principalmente às cervejarias na região de Estrasburgo. Nesta região, o costume é de beber cerveja nas refeições. Métodos tradicionais de fazer cerveja, ainda são seguidos pelas cervejarias locais. A carbonnade flamande é um prato típico da região e também da Bélgica, e consiste em um ensopado de carne cozido na cerveja. É um prato antigo, feito desde a época em que se usava carvão. Na Lorena (Lorraine) e ao redor de Nancy, a culinária é apresentada de várias maneiras: em conserva, em pote, patê, geléia e até aguardente. Os ingredientes são 30 vários, com combinações magníficas de produtos da terra e da caça, charcutaria, peixes e cogumelos dos bosques. Apesar da quiche ser um prato tradicional da culinária francesa hoje em dia, sua origem é alemã, época em que a Lorena era um reino medieval. A famosa quiche Lorraine original nasceu no século XVI e era uma torta aberta recheada com creme feito leite e ovos, acrescido de bacon defumado. Apenas mais tarde, o queijo foi acrescentado à quiche Lorraine. A palavra "quiche" vem do dialeto da região de Lorraine, dialeto que mistura fonemas franceses e alemães, "kuchen" que significa torta. Logo após a Segunda Guerra Mundial, a quiche se tornou conhecida na Inglaterra e, na década de 1950, nos Estados Unidos. Atualmente, encontra-se uma grande variedade de quiches, desde a original Lorraine, até aquelas com alho-poró, champignon, espinafre, e outros. O pão de especiarias e o mel da região de Vosgues e os os biscoitos de amêndoas de Lorena, também são conhecidos em todo país. A cozinha da Alsácia é fortemente influenciada pela culinária alemã, caracterizada pelo uso da carne de porco em vários pratos. A charcutaria é muito marcante na região, e tem como ponto alto o choucroute garnie. O choucroute garnie é um prato simples de chucrute com bacon, lombo de porco defumado ou joelho de porco e salsichas frescas e defumadas – entre elas o boudin blanc (linguiça de porco branca), boudin noir (morcela preta) e salsicha de Estrasburgo (uma salsicha gorda). Deve acompanhar batatas cozidas e moustarde de Meaux. Para harmonizar, um copo de vinho Riesling alsaciano gelado. Outro prato maravilhoso da cozinha alsaciana é o porc aux deux pommes, uma carne de porco servida com batatas e maçãs. A salada de batatas com salsicha, deve ser servida quente e mostra a influência alemã na comida alsaciana. Outras especialidades alsacianas são o baeckeoffe, um tipo de ensopado; a fleischnacka, um “rocambole” feito de massa fresca de ovos, recheada de carne cozida, ovos e temperos. No sul da Alsácia, também chamado Sundgau, a carpe frite (carpa frita) é famosa. O brioche é um pão amanteigado enriquecido com ovos. Na Alsácia, os vários tipos e formas de brioches são associados a festividades – o neujohweka é o brioche de Ano Novo e os bonshommes, os do dia de São Nicolau (6 de dezembro). 31 Além dos famosos Brie de Meaux e Munster da Alsácia, a região Nordeste tem queijos menos conhecidos, mas igualmente saborosos, como os Maroilles, Vieux, Lille, Boulette d'Avesnes, Dauphin, Rollor e Coulommiers picantes. O queijo ocupa lugar de destaque à mesa dos franceses, independentemente da refeição. Das centenas de variedades de queijos, muitos possuem a classificação AOC (Appellation d´Origine Contrôlée), que certifica o tipo de leite utilizado, os métodos de produção e o tempo de maturação. Selo francês AOC - Appellation d´Origine Contrôlée Como sobremesa, tortas e bolos são apreciados, como o kougelhopf – bolo em forma de rosca com passas e amêndoas, às vezes molhado em Kirsch (aguardente de cereja); a tarte Alsacienne – torta com recheio de frutas e baunilha e massa de fermento; as madeleines – pãezinhos-de-ló; e o Rum Baba – massa de bolo, assada em formas individuais, molhada no rum e no açúcar. A Alsácia produz alguns dos mais notáveis Rieslings secos do mundo. É uma região vinícola por excelência e seus vinhos são principalmente brancos, com exceção do Pinot Noir, e tem uma grande influência germânica, sendo chamados de vins d'Alsace. Champagne é uma região vinícola compacta. Algumas áreas são identificadas com tipos particulares de vinho. Aube é famosa não só pelo champanhe, mas também por um excêntrico e caro vinho de mesa, o Rosé des Riceys. Apenas os vinhos da região feitos pelo Méthode Champagnoise podem ser chamados de champanhe. Cultivam-se três tipos de uvas: as tintas Pinot Noir e Pinot Meunier e a branca Chardonnay. A maioria dos champanhes é a mistura das três. 32 Noroeste da França A região é banhada pelo Canal da Mancha, com 480 quilômetros de costa, e por isso, encontra-se uma grande quantidade de peixes e frutos do mar. Pratos com produtos do mar, carneiro salgado, sidra e aguardente de maçã são típicos da cozinha bretã. Também se inclui o queijo de coalhada fresca ouleitelho e as galettes, que antigamente eram comidas simples, mas hoje faz parte da cozinha regional chique. As galettes são as famosas crepes feitas com trigo sarraceno, na Bretanha, e são consumidas desde o século XIII. São também a refeição típica da Chandeleur (Candelária; “candela” significa luz), também conhecida como “a festa dos crepes”, uma festa católica que celebra a apresentação do bebê Cristo (que era “a Luz”) ao templo e que é comemorada todo dia 2 de fevereiro. Nesse dia, as casas deveriam acender todas as suas velas, e até hoje, os franceses comem crepes para comemorar a data. Na Bretanha, há uma divisão não-política, que independe de departamentos oficiais que formam a região: a Haute-Bretagne (Alta-Bretanha), situada a leste, onde a população fala o idioma galês; e a Basse-Bretagne (Baixa-Bretanha), a oeste, onde o idioma é o bretão. A galette de sarrasin vem da Haute-Bretagne e é feita apenas com farinha de sarraceno, água e sal. Ela é mais grossa, mais mole, com buracos na superfície, assada só de um lado e comida sempre salgada, recheada com queijo, presunto e ovo. 33 Na Basse-Bretagne, a receita também é feita com trigo de sarraceno, mas eles a chamam de crêpe de blé noir (crepe de trigo preto), pois adicionam também ovo, leite e farinha de trigo. A massa é bem fina, crocante, assada dos dois lados, tem superfície lisa e fica quebradiça quando pronta. Um dos pratos mais famosos da Bretanha é o Crêpe Suzette. Os crepes, diferentemente das galettes, são consumidos doces e feitos com farinha de trigo branca. O crêpe Suzette é temperado com laranja ou licor Grand Marnier. Os carneiros pastam em terrenos alagados salgados, dando à carne um sabor exclusivo. Um prato típico é o Gigot d'agneau à la Bretonne – carneiro assado servido com feijão branco cozido com tomates, alho e cebola. Na Normandia, a produção de maçãs é abundante, então são produzidas diversas sobremesas, por exemplo a tarte tatin, uma torta de maçã caramelizada virada para baixo, inventada no Hôtel Tatin, no Vale do Loire. Na Normandia e na maior parte da Bretanha, as sidras, borbulhantes ou não- borbulhantes, são bebidas locais e ótimos acompanhamentos para crêpes e galettes. Mais forte que as sidras, é o conhaque de maçã Calvados, envelhecido em barris de carvalho no mínimo durante dois anos. O Calvados é uma bebida AOC (Appellation d'Origine Contrôlée, Denominação de Origem Controlada), ou seja, só pode receber o nome Calvados a bebida feita em acordo com a legislação francesa e produzida naquela região específica. A sidra também é utilizada para cocção de alguns pratos, como exemplo, o tripe à la mode de Caen, um prato típico da Normandia, que leva dobradinha e legumes cozidos lentamente na sidra. A pesca sempre foi considerada uma atividade fundamental para os franceses, entretanto, nos últimos cinquenta anos, com a chegada da tecnologia, o modo de vida da região sofreu mudanças notáveis, e os mares são basicamente devastados pelos navios pesqueiros industriais. O principal porto francês de peixe fresco é Boulogne. Linguado, vieiras, lagostas, mariscos, entre outros, são encontrados lá. São especializados na transformação do peixe, congelamento, salga e defumação, especialmente do arenque. 34 O fruits de mer é uma seleção de frutos do mar, que inclui ostras, amêijoas, mexilhões, caranguejos, lagostins, búzios, camarões e litorinas. São servidos, normalmente, sobre gelo e algas marinhas e tem como acompanhamento, limão, molho de cebolinha e vinagre, vinho Muscadet resfriado, pão de centeio fresco e manteiga. As ostras podem ser comidas cruas na casca ou rapidamente grelhadas e servidas com molho. Os moules marinières são mexilhões cozidos no vinho branco com cebola, cebolinha, salsa e manteiga. Antigamente, nessa região, os produtos do interior tinham uma atenção maior. Porém, atualmente, os frutos do mar foram incluídos nos cardápios de grandes restaurantes. A Bretanha sofreu um enorme processo de desenvolvimento nos últimos anos. Essa mudança permitiu que a vida miserável dos camponeses se transformasse. Iniciou-se então, uma agricultura industrial, facilitando a cultura de legumes e propagando a criação de gado, com galinhas, porcos e vacas leiteiras. Isso justifica também a fama do leite e da manteiga da região. Alguns dos melhores queijos da França vem da Normandia. Camembert, o picante Livarot e o cremoso Pont-l'Évêque. Outro produto típico da região é o Sel de Guérande. Cristais de sal marinho puro são raspados pelos fazendeiros da Península de Guérande, localizada a sudeste da Bretanha. Este sal natural retém todos os sais minerais e o inconfundível aroma do mar. Produtos característicos: • Arenque • Camembert • Alcachofra • Couve-flor • Sidra • Calvados • Agneau de pre-sale • Manteiga • Creme de leite • Sal de Guérande • Andouille 35 Centro da França e Alpes Os contrastes geológicos desta região mostram sua grande variedade, da metrópole industrial e gastronômica de Lyon à paisagem predominantemente agrícola da Borgonha. As montanhas do Massif Central e dos Alpes atraem visitantes para os esportes de inverno, caminhadas e demais atividades ao ar livre. Lyon é considerada a capital gastronômica francesa. É o lugar para se saborear o melhor da comida lionesa e borgonhesa. Suas ruas antigas estão cheias de pequenos restaurantes de ótima qualidade, os chamados bouchons ou mères. A produção local completa a riqueza deste talento culinário: os frangos de Bresse, a carne magra do Charolais, o presunto das colinas Morvan, as aves selvagens e rãs dos pântanos de Dombes, o peixe do Saône e Ródano, os caracóis conhecidos como “ostras da Borgonha”. A GASTRONOMIA LIONESA A base da gastronomia lionesa foi definida no início do século XVIII pelas chamadas mères (mães), que eram mulheres que trabalhavam para famílias de classe alta e mais tarde, abriram seus próprios restaurantes. Assim, os conhecimentos foram passados de geração a geração, chegando até os famosos Chefs contemporâneos, como o célebre Paul Bocuse. Bocuse foi um chef de cozinha, conhecido pela alta qualidade de seus restaurantes e pelas suas abordagens inovadoras à cozinha. Fez muitas contribuições para a gastronomia francesa, tanto direta quanto indiretamente, porque teve inúmeros estudantes, muitos dos quais se tornaram Chefs notáveis. Bocuse foi considerado um embaixador da cozinha francesa moderna. 36 O principal restaurante de Bocuse é o Auberge du Pont Collonges, que serve um menu tradicional há décadas. Possui nota máxima de três estrelas no Guia Michelin há cerca de quarenta anos. O Franche-Comté e o Jura contribuem para a variedade regional com embutidos defumados, queijos, óleo de nogueira e peixes de lagos supridos pelas geleiras. Em Auvergne, os pratos regionais apresentam presuntos salgados, queijos, batatas, repolho e lentilha. A mostarda de Dijon é o condimento básico na França. Seu sabor diferente é o resultado da combinação de sementes de mostarda de alta qualidade, do vinho local e de verjus (suco de uvas verdes). Pode ser encontrada nas variedades cremosa ou em grãos. Um prato típico que leva mostarda de Dijon é minute steak dijonnaise. Um filé, que pode ser vitela, coelho ou porco, servido com molho de creme de leite e mostarda. O boeuf bourguignon é o famoso, clássico e mais refinado cozido na França. A carne usada pelos borgonheses é, normalmente, a de gado Charolais. A carne marinada é lentamente cozida em vinho Borgonha ou Beaujolais até que fique macia. Cubos de bacon, cebolas novas e cogumelos são acrescidas. Um outro prato borgonhês famoso é o oeufes en meurette – ovos pochês em vinhotinto com molho de cebolas, cogumelos e bacon. Os escargots à la bourguinonne são servidos com salsinha e manteiga de alho, e necessitam de pinças para serem retiradas das conchas. Uma especialidade de Auvergne é o Falette, um peito de carneiro recheado, servido quente com repolho refogado ou com feijão. Outro prato típico de Auvergne é a carne de porco salgada com lentilhas. A carne é salgada e fervida em vinho com lentilhas de Puy. O Frango de Bresse, é um frango de origem controlada, servido com molho cremoso e ervas-mouras silvestres. O mais famoso embutido de Lyon é a Rosette de Lyon. Feito com carne de pernil e servido em finas fatias. As Andouillettes à la Lyonnaise são linguiças recheadas com vitela, e são servidas com cebolas fritas, receita típica lionesa. O Centro da França produz a mais rica seleção de queijos do país. Há os cremosos, os fortes, e os Epoisses da Borgonha, mergulhados em conhaque. Também há os tipo suíço dos Alpes, usados em fondue, o Cantal tipo cheddar e o Roquefort. Os exemplos de queijos borgonheses são o Epoisses, Pipo Crem e Bleu de Bresse. Os alpinos, Tomme au raisin, Raclette, Ementhal Français e Vacherin. E os do Maciço Central, St. Nectaire, Roquefort, Fourne d'Ambert e Cantal. 37 Em Auvergne, o gado Salers local ainda é mantido em estábulos no nos vales durante o inverno e conduzido a pastos na montanha no verão. A grama viçosa e as flores - genciana, murta e anêmona – que o gado come, produzem um leite aromatizado, base do queijo da região, o Cantal. Esse queijo é o ingrediente básico do alligot – purê de batatas e queijo temperados com alho, um dos pratos mais famosos da região. As sobremesas típicas da região são a torta de nozes e pêra, com duas camadas de massa feita com nozes moídas e recheada com fatias de pêra; e o flan de cerejas ou clafoutis, feito com cerejas escuras, coberto de creme e regado com kirsch. A fama dos vinhos da região vinícola de Bourgogne se espalhou pela Europa no século XIV, com os duques de Valois da Borgonha. A Bourgogne tem uma variedade relativamente simples de uvas. O Bourgogne tinto é feito de Pinot Noir, com aromas de framboesas, cerejas e morangos, enquanto que a Gamay produz o Mâcon e o Beaujolais tintos. Chardonnay é a principal variedade branca para o Chablis e o Bourgogne branco.Pequenas quantidades de Aligoté e Pinot Blanc são cultivadas e Sauvignon é uma especialidade de St-Bris. CHARCUTARIA Charcuteria ou Charcutaria é uma palavra de origem francesa que deriva de “Charcuterie“, que oriunda de carne (chair) e cozido (cuit) e denominava, no século XV, as lojas de produtos de porco e miúdos de diferentes animais. Frequente e erroneamente a charcutaria é ligada exclusivamente à produção de linguiças e/ou exclusivamente ao trato da carne de porco, mas a contextualização correta remete ao preparo, originalmente para fins de preservação, seja por métodos de salga, conservação, cura, fermentação, cozimento, desidratação, defumação ou até mesmo vários desses métodos juntos, de qualquer tipo de carne, como aves, peixes, bovinos, suínos e qualquer carne de caça. Dentre os diversos produtos, podemos citar os presuntos, salames, terrines, patês, mortadela, pastrami, copa, bacon, salsichas, linguiças, carne de sol, todas as carnes preservadas com sal, na gordura (confit), defumadas e etc. A charcutaria representa um dos mais antigos métodos de produção de alimentos da humanidade, figurando na própria história da evolução das sociedades humanas. A preservação dos alimentos, em especial das carnes, permitiu que a humanidade sobrevivesse durante períodos de escassez e possibilitou longas viagens de migração, onde nem sempre era possível obter alimentos frescos diariamente. Portanto, os procedimentos de manipulação dos produtos da charcutaria foram desenvolvidos 38 inicialmente para fins de preservação, pois inexistia tecnologia de refrigeração adequada que garantisse vida útil longa para as carnes. Hoje em dia esses produtos são muito apreciados pelo sabor específico derivado da aplicação de cada uma das muitas técnicas da charcutaria. Quando não se podia contar com uma geladeira, ou sequer imaginar os “milagres” de uma máquina a vácuo para conservar a carne, o homem utilizava métodos rústicos que hoje são reconhecidos não mais pela conservação do alimento, mas sim pelo sabor único que traz ao produto. Podemos dividir a charcutaria em seis grandes categorias: • Preparações cruas: Jambon, jamón, prosciutto; • Preparações cozidas: presuntos e lombos cozidos; • Preparações embutidas: salsichas, salsichões e linguiças; • Preparações curadas e defumadas: Pastrami, pancetta e bacon; • Recheios: Rillettes, pâtês, grattons e terrines; • Conservas: Confit. Imagem: Itens de charcuterie 39 Sudoeste da França O rei renascentista Henrique IV costumava afirmar que “a boa comida e o bom vinho criam um paraíso na terra”. Essa frase resume exatamente a culinária variada e maravilhosa do Sudoeste da França. Ao longo do litoral de Arcachon e Marennes há uma abundância de ostras e mexilhões. As ostras arcachon são tradicionalmente servidas com salsichas quentes e pão de centeio. Na zona rural, ao redor de Bordeaux, o vinho é de tal importância que é utilizado na preparação de praticamente todos os pratos regionais: à la bordelaise, que pode ser traduzido por “ao molho de vinho”. Em Périgord, Quercy e Gasconha, criam-se gansos, patos e cabras para a produção de foie gras, confit (carne cozida e conservada na própria gordura) e queijo. O foie gras é o fígado de ganso ou pato, que foi aumentado com uma superalimentação com milho. É cozido em vinho do Porto ou conhaque. O pato com cèpes é um prato típico feito com confit de pato, cogumelos silvestres e alho. O ganso gordo é usado na preparação de pratos como cassoulet e o daube de boeuf. O cassoulet é um prato que desperta as mais ferrenhas disputas entre os cozinheiros do Sudoeste. Consiste em um ensopado de feijão branco cozido com uma variedade de embutidos e pedaços de carne. Há várias versões de cassoulet, que podem incluir pato, carne de porco, fresca ou salgada, ou ainda carne de carneiro. Para os franceses, colher cogumelos silvestres é um dos passatempos favoritos. As variedades da região incluem os cèpes, grandes e carnudos; os chanterelles, com sua cor de gema de ovo; e os morilles (erva-moura). Os cogumelos selvagens podem substituir as trufas, pois são mais baratos e igualmente deliciosos. 40 As trufas encontradas nas florestas são caras e usadas em sopas, molhos, patês e recheios. As trufas de Périgord são consideradas as melhores. Uma excelente forma de se consumir e muito usual na região é cozinhar trufas frescas em uma omelete para realçar seu sabor natural. O queijo de cabra está sempre presente nos menus da região, especialmente em saladas. O famoso chèvre chaud consiste em queijo de cabra grelhado sobre uma rodela pão acompanhado de salada verde, azeite de oliva ou vinagre balsâmico. O queijo de cabra é normalmente conservado em azeite de oliva, com folhas de louro, grãos de pimenta e tomilho, para dar sabor. No País Basco, a pimenta picante local – piment d'Espellete – é usada para temperar tudo, desde o presunto e o piperade Bayonne até peixes e ensopados. O piperade é um prato popular e trata-se de uma omelete, ou ovos mexidos, com alho, pimentões, piment d'Espellete e presunto. O óleo de nozes é um molho para saladas popular no Sudoeste. Lá, as nogueiras crescem nos vales, florescendo até mesmo no solo fraco das regiões montanhosas. Dordogne é a região francesa que mais produz nozes. Bordeaux é a maior região produtora de vinhos finos do mundo e, quanto a vinhos tintos, certamente a mais conhecida fora da França. Após as bodas deHenrique II com Eleanora de Aquitânia, três séculos de comércio com a Inglaterra garantiram que o claret fosse servido nas mais finas mesas do mundo. No século XIV, mercadores sagazes capitalizaram essa fama, trazendo enorme prosperidade financeira à região, juntamente com a famosa classificação dos Médoc, em 1855, uma tabela de excelência dos châteaux que ainda vigora. As principais variedades de uvas tintas da região são Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Petit Verdot e Malbec. Cabernet Sauvignon é predominante no oeste de Gironde e Merlot, no leste. Grande parte dos Bordeaux é uma mescla de uvas. Sauvignon Blanc e Sémillon são cultivadas e combinadas para vinhos secos e doces. Além dos bons vinhos, a bebida mais famosa da região é o conhaque, feito com uvas brancas. É destilado tanto em Cognac quanto em Armagnac, e deve ser bebido no fim da refeição. Em Quercy há um aperitivo chamado Quercy Noix, que é feito de nozes. 41 Sul e Sudeste da França O Sul/Sudeste da França é a região mais visitada nas férias. A agricultura é um dos alicerces da economia, produzindo frutas e uma abundância de vinho. As indústrias de alta tecnologia de Nice e Montpellier refletem o papel da região no desenvolvimento do cinturão do sol da costa sul, enquanto a Córsega ainda preserva muito de sua beleza natural. Na região de Languedoc, Roussillon e Les Cévennes começa-se a entrar em contato com a cozinha mediterrânea, rica em ervas e aromas. Frutos do mar convivem com carne de caça, cordeiro, cogumelos e queijo de cabra. A cozinha do Languedoc está enfeitada com azeite e ervas aromáticas (tomilho, rosmarino, …) que perfumam seus pratos, e aves acompanhadas de saborosas verduras: beringelas, tomates, abobrinhas, pimentas. As aldeias dos Pirineus de Roussillon produzem deliciosas linguiças, presuntos e charcutaria. Roussillon supre a França com os primeiros pêssegos, cerejas e damascos da temporada. Suas águas trazem mexilhões, ostras e tellines (mariscos minúsculos). Ensopados de peixe e frutos do mar, como Moules Marinières, tielles de polvo – massa de pão, polvo, tomates, cebolas e especiarias – e a brandade de bacalhau – purê de bacalhau salgado com creme, azeite de oliva, alho e batatas – , vêm dessa região. Como sobremesa típica, um delicioso crème brulée, feita com creme de leite, ovos, açúcar e baunilha, com uma crosta de açúcar queimado por um maçarico. É servido 42 gelado e em ramekins individuais. Além da baunilha, pode-se usar também chocolate, café, canela, coco, raspas de limão ou laranja, licores ou outros saborizantes. Na Provença, observar um mercado pode ser uma experiência fantástica. Os balcões mal aguentam as pilhas de alhos rosados, pimentões frescos e coloridos, tomates, berinjelas, abobrinhas e aspargos. No outono e no inverno, um cheiro de terra impregna o ar, e cogumelos silvestres, acelgas suíças, alcachofras, nozes, marmelos, abóboras, erva-doces e azeitonas pretas enchem as prateleiras. Na Provença, é cultivada a maior parte das azeitonas que abastecem a França, bem como a produção de um excelente azeite. No fim da colheita, come-se pão e tapenade, uma pasta de azeitonas, alcaparras, enchovas e azeite. Sua culinária é rica em cores, aromas e sabores, caracterizando a culinária mediterrânea, saudável e natural. Sua costa é famosa pelas sopas de peixe, incluindo a bouillabaise e o bourride, um cozido de peixe com alho. O cordeiro é a carne mais comum na Provença, sendo que a melhor vem de Camargue e do Crau, onde os cordeiros pastam ervas e grama de charco salino. A bouillabaise é uma sopa de peixe originária de Marselha, considerada atualmente um luxo. Trata-se de vários produtos do mar – como o diabo-marinho, salmonete, vermelho, peixe-escorpião e enguia-marinha – temperados com tomates, açafrão e azeite de oliva. O caldo de peixes é servido primeiro, com torradas cobertas com rouille. O peixe vem depois. O rouille, que significa “ferrugem”, é uma maionese com pimenta malagueta e alho. A sopa pistou é uma rica sopa de vegetais e feijão, temperada com pistou – molho feito com majericão, alho e azeite. O ratatouille é um cozido de cebolas, abobrinhas, tomates, pimentões em azeite de oliva e alho. A salada Niçoise é servida em muitas versões, mas sempre inclue alface, vagem, tomate, azeitona verde, ovo e enchova. O aioli é um molho feito com gemas de ovo, alho e azeite de oliva. Serve-se com bacalhau, ovos, escargots ou vegetais crus. O boef em daube é feito com carne de boi e vinho tinto, cozidos lentamente em um tipo de caçarola chamada daubière. Em toda boulangerie da Provença encontra-se a pissaladière, semelhante à pizza e leva cebolas, azeitonas e enchovas. Fougasse é um pão achatado, tipo treliça, que pode ser crivado com azeitonas pretas, enchovas, cebolas ou especiarias. A versão doce leva amêndoas. 43 Uma sobremesa típica é a tarte au citron, uma torta recheada com creme de limão. A cidade de Menton é famosa por sua produção de limões. As tisanes, infusões de chá de flores e ervas, são bebidas apreciadas especialmente após as refeições. A de flor de limeira (tilleuil) é a mais popular, considerada boa para digestão e sono. O chá de camomila estimula os rins e o de verbena (verveine) acalma o fígado. O mel da região vem em muitos sabores, dependendo da dieta das abelhas, que inclui uma ampla variedade de flores e ervas, como lavanda, flor de laranjeira, alecrim ou tomilho. É na província de Vaucluse na Provence que encontramos uma das iguarias mais caras do mundo – as trufas. Mais para o sul, a ilha de Córsega tem uma cozinha marcante, com forte influência italiana. Apesar de ser uma ilha, abriga melhores caçadores que pescadores, e encontra- se na mesa dessa região não só peixes e frutos do mar, mas também, excelente embutidos, carne de porco, carneiro, coelho e javali, na forma de assados aromáticos, preparados vagarosamente como séculos atrás. A região vinícula do Sul forma um grande arco, que vai de Banyuls, no extremo sul da França, até Nice, próximo à fronteira italiana. Os vinhedos mediterrâneas de Languedoc-Roussillon e Provença, durante um século, produziu vinho em massa – ainda muito de sua produção tem a qualidade do vin de table. Hoje, porém, produtores mais dinâmicos aplicam novas tecnologias às variedades tradicionais e clássicas da uva, para retomar o mais nobre legado do Sudoeste francês, que vai de vinhos generosos e aromáticos, cheirando a pedra ressecada pelo sol, ao aroma de ervas silvestres e águas do Mediterrâneo. Uvas produzidas em massa, como Carignan e Aramon estão sendo substituídas por Syrah, Mourvèdre e Grenache. Cabertnet Sauvignon e Viognier são cada vez mais utilizadas para vins de pays. Brancos doces e ricos são feitos da açucarada Muscat. 44 Itália A Itália é um país localizado ao sul do continente europeu, e compreende a Península Itálica, além de uma série de ilhas, incluindo a Sicília e a Sardenha, as duas maiores ilhas do mar Mediterrâneo. Sua capital Roma, está localizada no centro do país, e lá se encontra o Vaticano, centro da Igreja Católica. Possui o formato de uma bota e seu relevo é marcado, ao norte, pelos Alpes e pela planície do rio Pó, e de norte a sul, pela cadeia montanhosa dos Apeninos, que corta quase toda sua extensão. É banhado pelo mar Mediterrâneo e faz fronteira com França, Áustria, Eslovênia, Suíça, San Marino e Cidade do Vaticano, sendo esses dois últimos, enclaves no interior da Itália. A Itália foi terra de civilizações importantes ao longo da história, como os etruscos, fenícios, gregos e romanos. Sofreu invasões e migrações dos povos celtas, sarracenos, normandos, árabes, germanos, espanhóis, francos e outros.45 No período pós-romano a Itália era fragmentada em vários reinos e cidades- estado, até que em 1861, houve a unificação do país. Após a unificação italiana, deu-se início à questão da unidade nacional. Massimo Dazeglio, escritor e político do primeiro parlamento da recém nascida nova Itália, disse em 1864: “Fizemos a Itália. Agora temos que criar os italianos”. De fato, os “regionalismos”, marcados pela história milenar das cidades-estado italianas, continuam até hoje, pois, para criar a nação não bastou unir no mapa o que séculos de história e de culturas diferentes mantiveram separados. Ainda hoje, cada italiano se sente íntima e primeiramente cidadão da sua região. Considera-se piemontês, veneto, lombardo, siciliano, etc. e só em seguida italiano. Desde a Idade Média, cada cidade da Itália se desenvolveu autonomamente do ponto de vista político, social, cultural e linguístico. Por isso, é um país com riquíssima cultura estampada na arquitetura, nas artes, no grande número de dialetos e na incrível gastronomia. A Itália tem o maior patrimônio artístico do mundo, e é conhecida como “Il Belpaese” (o belo país), devido à variedade das suas paisagens e à beleza natural. A gastronomia italiana é uma das cozinhas internacionais mais conhecidas e consumidas no mundo, e teve grande influência em nossos pratos e na maneira como cozinhamos e comemos. É também uma das mais antigas de toda a Europa. Derivada inicialmente dos gregos e sua influência oriental, ganhou características e particularidades e se moldou perfeitamente ao país, sofrendo pouquíssimas modificações ao longo dos séculos. A arte culinária italiana floresceu no período renascentista, onde os cozinheiros da nobreza desenvolveram técnicas e criaram diversos pratos, a partir da cozinha tradicional camponesa. A cozinha italiana é bem dividida e diversa conforme as suas regiões, que possuem climas muito distintos entre o norte, frio e o sul, quente com clima mediterrâneo. As características gastronômicas são bem marcadas e diversas na Itália. Algumas características são bem amplas, como a divisão em relação ao uso da gordura: no norte, de origem animal, a manteiga; e, no centro e no sul, de origem vegetal, o azeite. Outras são bem mais restritas, como o uso de alguns ingredientes ou preparações limitadas a pequenas cidades, mesmo que hoje algumas já tenham se espalhado por todo o país, bem como pelo mundo. 46 Na culinária italiana preza-se o frescor e a qualidade dos alimentos. Verduras, legumes e frutas são consumidos cada qual na sua época, e não há importações ou plantios em estufas. São produtos sazonais, e por isso, conservam seu sabor e frescor. O mesmo ocorre com carnes e peixes, que não são congelados. O tempo de maturação de queijos e embutidos é respeitado para a preparação que serão empregados. Por essa valorização do produto in natura, a cozinha italiana se torna muito simples, mas de sabor extremamente intenso. O terroir na Itália é muito valorizado. Um produto pode ser o mesmo, cultivado em regiões diversas, mas com sabor completamente único e diferente. Há uma diversidade de especialidades em cada cidade, cada região, muito grande, por exemplo: cebola de Tropea, tomate de Pachino, azeitona da Liguria, tartufo de Alba, mozzarella da Campania, massa de Gragnano, pão da Toscana, chocolate de Torino, orégano da Sicilia, pistache de Bronte, mortadella de Bologna, presunto de Parma, mostarda de Cremona, pimenta da Calabria, bottarga da Sardegna, aceto balsamico de Modena. Nas regiões central e sul, principalmente, os italianos são adeptos à chamada dieta mediterrânea, que é uma cozinha rápida, leve, nutritiva e saborosa. Essa cozinha é baseada no uso de verduras, legumes, frutas, massas e pães, carnes magras, peixes, azeite e vinho, ricos em polifenóis, que previnem doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer. Os italianos, depois dos japoneses, são os maiores consumidores de peixe de todo mundo, devido à sua vasta costa marítima e seus diversos lagos. Eles possuem 500 variedades de peixes, 70 de crustáceos e 30 de cefalópodes. Dentre esses peixes, estão as anchovas e as sardinhas, exemplos dos chamados peixes azuis, que contêm Ômega 3, importante no combate ao colesterol. Os pratos italianos se constroem a partir da base, que eleva e prioriza o ingrediente principal. A cozinha italiana parte de três técnicas básicas: • Batutto: é o processo de “bater” os ingredientes numa tábua de corte. Os componentes que entram neste processo são: toucinho, salsa e cebola, todos cortados bem fininho. Alguns pratos pedem alho, salsão e cenoura; • Soffritto: é o termo utilizado quando o battuto é levado à cocção até caramelizar levemente. Os italianos afirmam que um soffrito mal executado 47 resulta em um prato perdido, comprometendo totalmente o seu sabor do prato; • Insaporire: conferir sabor. É o acréscimo do ingrediente principal a base do soffritto e sobre fogo bem alto salteando-os vigorosamente até que se tenham tornado completamente envolvidos pelo sabor dos ingredientes básicos. A composição da refeição na Itália se dá da seguinte forma: • Aperitivi/antipasti - entradas variadas quentes ou frias; • Primo piatto - farináceos - massa seca e fresca e sopas, amidos - arroz e gnocchi; • Secondo piatto - carne, ave, caça e peixe; • Contorno - verdura - acompanhamento; • Dolci - sobremesas, gelato, queijos ou frutas; • Cafe e picolla pastisseria. 48 Selos italianos de qualidade e origem Nos textos sobre enogastronomia, muito frequentemente são utilizadas algumas siglas que acompanham o nome dos produtos. Na Itália elas possuem uma grande importância pois são certificados de qualidade e origem do produto, e são eles: 49 Principais regiões e seus pratos típicos: Norte: • Principais Regiões: Piemonte, Lombardia, Veneto, Liguria e Emilia Romagna. • Pratos principais: Bagna Caoda, Risoto alla Milanese, Trenette ao pesto, Pansôti com molho de avelã, Manzo al Barolo, Cacciuco, Costolette alla Milanese, Ossobuco, Zabaglione, Panettone, Antipasti di frutti di mare, brodo di Pesce, Risi e Bisi, Risotto alle seppie, carpaccio, Zuppa de Cozze, Fiori di Zucchini, Spaghetti alle vongole, Polenta, Sarde in saor, Anguielle in Úmido, Fegato alla veneziana, Tiramisú. Centro: • Toscana, Lazio, Umbria e Marche. • Pratos principais: Panzanella, Tortelloni, Spaghetti al ragú, Cannelloni, Crostini, Baccalà, Bisteca alla Fiorentina, Torta di limone, Panforte, Cantucci, Supli di riso, Filetti di bacallà, Gnocchi alla Romana, Risoto alla Romana, Bucatini al’Amatriciana, Spaguetti alla Carbonara, Coda a Vaccinara, Saltimboca alla Romana. Sul: • Campania, Abruzzo, Molise, Puglia, Basilicata, Calábria, Sicília. • Pratos principais: Pizza Napolitana, Maccheroni com le sarde, Pesce spada, Agnello arrosto, Cassata siciliana, Nougat, verduras fatiadas regadas com azeite (pimentão assado, abobrinha grelhada, fundo de alcachofra, berinjela grelhada), prato de frutos do mar (cozze, ostriche, gamberetti, polpi). 50 Região Norte Piemonte Piemonte, que vem da palavra “piedemonte” (ao pé das montanhas), é a região entre os Alpes e os Apeninos, e é a mais ocidental da Itália, fazendo divisa com a França a oeste, com o Vale d’Aosta e a Suíça ao norte, com a Lombardia ao leste e com a Liguria e a Emilia Romagna, ao sul. É a terra dos tartufos, funghi, avelãs, caças, queijos e arroz. A cozinha piemontesa sofreu muita influência francesa, e também a influenciou, o que gerou pratosextremamente refinados e elegantes de cozinha camponesa. Algumas de suas especialidades são a bagna caoda, um fondue de legumes regados ao molho quente de anchovas, alho e azeite, e os famosos queijos Castelmagno e Gorgonzola, feitos de leite de vaca, curados em cavernas. O TARTUFO: Embora o Gorgonzola e os vinhos Barbera, Barbaresco, Barolo e Moscato D’Asti sejam mundialmente conhecidos, nada mais cultuado que os Tartufi Bianchi D’Alba. O tartufo, ou trufa em português, é uma iguaria entre um fungo e um tubérculo, e não pode ser cultivado, apenas caçado por cães treinados. Pode ser encontrado apenas em algumas regiões da Itália e da França, e um dos mais famosos e apreciados são os encontrados na cidade de Alba, em Piemonte. 51 Imagem: Trufas brancas de Alba (Tartufi Bianchi D’Alba) O preço do tartufo bianco pode chegar em até 6500 euros o quilo, mas há também o tartufo nero, que possui o aroma menos intenso, e por isso é bem mais barato. Para que seus sabores e perfumes sejam conservados ao máximo, os tartufos devem ser consumidos em até 10 dias após serem encontrados. Podem ser utilizados sobre ovos, polentas, massas com manteiga ou fonduta, creme de queijo, em finas lâminas e crus. Além disso, muitos produtos também são feitos com tartufos: manteigas, azeites, vinagres, molhos, mel, queijos, conservas, cremes, etc. Há um dilema entre os piemonteses: o tartufo necessita de um verão chuvoso para desenvolver-se no outono, enquanto o vinho de um verão seco e quente, para que a uva amadureça e produza excelentes resultados. Por isso dizem: tartufo bom, vinho ruim, e vice-versa. LINK (VÍDEO): Tartufo - https://youtu.be/JChJMK9T9Uo Pratos típicos Outros pratos importantes da cozinha piemontesa: • Bollito Misto: feito com sete cortes de carne e sete miúdos de espécie bovina característica da região, sete vegetais e sete acompanhar; molhos diversos para 52 • Panissa: risotto com feijão e carne de porco; • Grissini: criados no ano de 1668 em Torino para o Duque de Savoia que, devido a problemas digestivos, tinha na sua dieta restrição ao miolo de pão, necessitando de um pão que fosse pura casca; • Agnolotti: um tipo de ravioli, recheado com carne e couve moídas e especiarias; • Zabaione: um creme de gemas e vinho; e os biscoitos Amaretti e Savoiardi. O ARROZ: O arroz é um produto extremamente importante na região. Seu cultivo é feito em todo norte da Itália, nas planícies alagadas do rio Pó. A maior zona produtora concentra-se nas regiões de Vercelli e Novara, províncias piemontesas, em Pavia, província de Milano, no Veneto e em Oristano, província da Sardenha. O cultivo do arroz iniciou logo após a Peste Negra, que abalou toda Europa, na Idade Média, e intensificou-se no século XIX. A Itália tornou-se a maior produtora de arroz na Europa, após a construção de canais que permitem a irrigação das plantações. São produzidas 1300 toneladas de arroz por ano. O arroz é um cereal da família das gramíneas, e seu plantio é feito na primavera e a colheita se dá 6 meses depois. O arroz italiano tem sua origem dos grãos japoneses e tem sua forma arredondada. É classificado em 4 categorias de acordo com seu tipo: • Riso Comune: é muito pequeno, tem cocção rápida e é bastante usado para sopas e doces. • Riso Semi Fino: um pouco maior que o comum e mais arredondado, é mais usado na região do Veneto. Tem muito amido e boa absorção de líquidos. O mais conhecido é o Vialone Nano. • Riso Fino: é alongado e estreito. Tem menos amido e é usado para saladas ou pilaf. O mais difundido é o Sant’Andrea. 53 • Riso Super Fino: tem mais amido, são maiores e o percentual de quebra é bem mais baixo. O mais utilizado na Itália é o Carnaroli, que resiste mais tempo à cocção, não perdendo o ponto “al dente”. O Arbório, mais difundido fora do território italiano, tem mais amido e é mais fácil de “mantecar”. Outros tipos: Roma e Baldo. Um dos pratos mais emblemático da cozinha italiana, é certamente o risotto. O risotto é um prato onde o arroz, no seu processo de cocção, libera amilopectina, amido encontrado dentro do grão, proporcionando um resultado cremoso. O risotto pode ser feito com qualquer produto comestível que lhe dê sabor: aves, peixes, carnes, verduras, legumes, queijos, e até mesmo, frutas. Existe uma variedade enorme de risottos. Alguns exemplos famosos são o Risotto alla Piemontese, feito com Barolo e Funghi; Risotto Vercelli, onde é usada rã; Risotto alla Milanese, feito com açafrão. 54 Lombardia O nome Lombardia (em alemão Langbärte, que significa longas barbas) foi herdado pelos lombardos, povo bárbaro que veio da Escandinávia, norte da Europa. Os lombardos derrotaram os bizantinos em 569, e dominaram a região durante 2 séculos. Ao se revoltarem contra a Igreja, esta se uniu aos Francos, que então, dominaram a região. A partir deste momento, a região e todo resto da Itália ficou a mercê da Igreja, que a vendia de acordo com seus interesses. O sistema de feudos foi desenvolvido pelo governo dos Francos, e dominou a Europa no período Medieval. A Lombardia passou por diversos domínios, a partir do século XV: francês, espanhol, austríaco, mais uma vez francês com Napoleão, depois novamente austríaco, até que em 1859, conseguiu voltar a ser independente, expulsando seus invasores. A Lombardia é a região mais rica e desenvolvida da Itália. Milão, capital da Lombardia, é um grande centro comercial, industrial e financeiro, com sedes de grandes empresas italianas. É o centro econômico do país e a segunda cidade mais populosa da Itália, depois de Roma, com mais de 1.300.000 habitantes. Também é muito importante pelo seu patrimônio artístico, e considerada a capital mundial da moda. A cozinha lombarda é uma das mais variadas da Itália, devido às fronteiras que faz com a Suíça ao norte, Piemonte a oeste, Emilia-Romagna ao sul e Veneto a leste. Além disso, sofreu muitas influências dos povos que a dominaram. É caracterizada pelo uso de manteiga e não do azeite, devido à ausência das oliveiras e pela criação de gado, nos grandes pastos. Possui características da cozinha dos Alpes, protéica e gorda, e também de planícies, com o uso de massas e 55 do arroz, principalmente. O consumo de ossobuco e de pratos à base de tripas é muito grande. Por não possuir uma costa marítima, há uma lacuna na produção de pratos de origem marinha, mas com o mercado de peixes de Milão, alguns restaurantes os fazem com perfeição, entretanto não pode ser dita como uma cozinha tradicional da região. Apesar disso, na região dos lagos Como, Garda, Maggiore e Lecco, a cozinha de peixes de água doce é muito importante. A influência da cozinha francesa ainda existe, em pratos como a cassoela. Um prato típico de inverno, substancioso, composto por vários cortes de carne de porco (orelha, pé, rabo, pele, focinho, costelas), cozidos junto com repolho, cenoura, salsão e cebola. Os espanhóis, que dominaram a região nos séculos XVI e XVII, deixaram também suas influências com o açafrão, resultando no Risotto alla Milanese. Os austríacos, por sua vez, trouxeram a Cotolleta alla Milanese, apesar da contestação dos milaneses, dizendo que a sua é que influenciou a austríaca. Milão possui restaurantes étnicos de todo o mundo, destacando os restaurantes chineses, que estão há mais de 60 anos na cidade. Em Milão, a alimentação é diferente do restante da Itália. Por levarem uma vida muito corrida, ela é feita de forma rápida e frenética. Os milaneses também criaram muitos pratos com as sobras do dia anterior, como os Mondeghili, polpetas de carnecozidas ou assadas, e o Riso al Salto, com sobras de risotto. A produção de arroz na Itália é uma das mais importantes de toda a Europa. Desenvolveu-se muito a partir da criação de grandes sistemas de irrigação por Leonardo da Vinci, utilizando águas dos rios Ticino e Pó. O Carnaroli é o principal arroz utilizado, possui grão grande, e produz risottos com muita cremosidade. A maior parte da produção de queijos na Lombardia é feita pelo leite de vaca, devido à vasta criação de gados. Os dois queijos mais importantes são o Grana Padano e o Gorgonzola. LINK (VÍDEO): Produção do Grana Padano - https://youtu.be/jWCrTussypk 56 CARNES: A carne bovina utilizada nos pratos italianos possui diversas nomenclaturas: • Bovino: normalmente o animal bovino em geral, independentemente do sexo e da idade. • Vitello da Latte: animais com 70 dias. • Vitello: animais com 120 dias de idade. • Vitellone: macho não castrado, de idade até 18 meses. • Toro: macho não castrado, em idade adulta, com mais de 4 anos. • Bue: o animal castrado, de idade superior aos 4 anos. Possui a carne mais gorda. O boi, sendo mais manso e menos nervoso, tem a carne um pouco mais macia que do “toro”. • Manzo: são as fêmeas com idade entre 1 e 3 anos, que ainda não tiveram cria. • Vacca ou Mucca: fêmea do bovino adulta, que já teve cria. O termo “mucca” indica mais especificadamente a vaca que produz leite. A carne de cavalo é bastante popular e apreciada na Itália. São importados cerca de 170 mil animais por ano, de países do Leste Europeu e da Espanha. Possui altos níveis proteicos e baixo teor de gorduras e colesterol. Possui o sabor um pouco adocicado, diferente das outras carnes. Produtos típicos: A Mostarda di Cremona é um outro produto importante da região, feita com grãos de mostarda e frutas cozidas em calda de açúcar. É um composto doce e picante, e pode acompanhar os Bollitos ou caças. A mais conhecida é da cidade de Cremona, mas também é produzida em outras cidades. O Panettone foi criado em Milão e sua receita natalina foi desenvolvida no final do século XIII, e é usada até hoje. O nome vem do dialeto milanês para aumentativo de pane (pão). A colomba é a versão pascal do panetone de Pavia. 57 Outros pratos da cozinha lombarda: • Nervitt: tendões e pés de vitello, cozidos e cortados em cubos, servidos com condimentos picantes; • Casonsei di Bergamo e Brescia: massa recheada de lingüiça ou espinafre e ovos, uvas passas e Grana Padano; • Zuppa Pavese: caldo com ovos e pão amanhecido; • Gnocchetti Alla Lariana: bolinhas de massa feitas com pão amanhecido, ovos, queijo e manteiga. Servidos com caldo de carne; • Minestrone Alla Milanese: substanciosa sopa feita com vários vegetais e arroz; • Risotto con le Lumache: risotto feito com caracóis; • Risotto con Gamberi, Funghi e Piselli: risotto feito com camarões de água doce, cogumelos e ervilha; • Polenta Taragna: feita com farinha de granoturco e grão sarraceno. 58 Veneto O Veneto é uma região situada ao nordeste da Itália, e que faz divisa com o Friuli-Venezia Giulia e com o Mar Adriático ao leste, com a Áustria e o Trentino-Alto Adige ao norte, com a Lombardia ao oeste e a Emilia-Romagna ao sul. É considerada uma das regiões mais turísticas de toda a itália, atraindo cerca de 60 milhões de turistas por ano, por conta do seu patrimônio natural, histórico, artístico e arquitetônico. Dentre as localidades mais conhecidas mundialmente, estão Veneza, as Dolomitas, Cortina d’Ampezzo e Verona. Além do turismo, outra fonte de renda é a agricultura e a vinicultura. A gastronomia do Veneto é diversificada e baseada na utilização dos legumes e hortaliças, como o Radicchio di Treviso, os aspargos e cogumelos. Os risottos na região são muito apreciados quando produzidos com o arroz tipo Vialone Nano, e normalmente são acompanhados de pescados e hortaliças. Desde o século XVI o é cultivado próximos à cidade de Verona, onde há uma interessante produção da qualidade “vialone nano veronese”, tutelada com a garantia de de origem e qualidade DOP. As características de terroir* da região permite que este arroz seja cultivado sem a necessidade da adição de agrotóxicos ou intervenções externas, exceto pelo plantio. Terroir: é uma expressão francesa que designa classicamente um conjunto de terras de uma mesma região e que devido às suas características, fornece produtos agrícolas típicos. 59 Um dos pratos mais consumidos na região é a polenta feita de milho branco ou amarelo. Antes da chegada do milho à região, trazido pelos espanhóis, esse prato era produzido com farinha de feijão, cevada ou trigo sarraceno. Hoje a polenta é um ícone da região, e é servida de várias maneiras, sendo servida sozinha ou acompanhada de carnes, peixes ou queijos. Outros pratos tradicionais: Alguns pratos importantes da cozinha do Veneto são: • Carpaccio di Cipriani: finas fatias de carne, temperadas com molho à base de maionese e outros condimentos; • Baccalà alla Vicentina: Bacalhau preparado com cebola, alho, salsinha, anchova, leite e parmigiano, servido tradicionalmente com polenta frita ou grelhada; • Sarde ou Sardelle in Saor: sardinhas empanadas e fritas, depois marinadas em cebolas suadas no azeite e banhadas com vinagre, açúcar, pinoli e uva passas; • Seppie al Nero: lulas guisadas com alho, azeite, vinho branco, salsinha e a tinta doelula. Servida tradicionalmente com polenta branca • Bigoli: massa que tem a aparência de spaghetti grossos e rústicos, preparados com um especial instrumento de cobre, chamado bigolaro; • Risi e Bisi: sopa feita de arroz e ervilhas, preparada em um caldo feito com as próprias cascas das ervilhas frescas; • Fegato alla Veneziana: fígado de vitela cortado em fatias finas cozidos lentamente com cebola, manteiga e azeite; • Fritelli: doces típicos dos carnavais venezianos, são massas doces fritas em banha de porco e polvilhadas de açúcar; • Pandoro: bolo com formato de estrela, muito apreciado na época das festas de final de ano, com sabor semelhante ao panetone milanês. 60 Liguria A Liguria fica na região noroeste da Itália e faz fronteira com a França, Piemonte, Emilia-Romanha e com a Toscana. É banhada pelo mar Mediterrâneo, chamado de Mar Lígure na região. Uma das atividades econômicas mais importantes da região é o turismo. Turistas do mundo todo e da própria Itália são atraídos pelo clima ameno, pelas paisagens e pelas cidades famosas como Portofino, Genova, Portovenere, Cinque Terre e Sanremo. A Liguria possui mais de 300 quilômetros de costa, suas praias são de areia ou de cascalho, e também possui belíssimas encostas rochosas em forma de penhascos. Além disso, há uma cadeia montanhosa que atravessa toda região. Sua gastronomia possui influência de pescados e de animais de pequeno porte, devido às características geográficas. Sua cozinha é chamada de mar e terra ou mar e montanha. O clima úmido proporciona uma abundância de ervas, legumes e verduras, que desempenham papel importante nas suas produções culinárias. Apesar da vasta costa, ela não propicia a pesca e com isso os pescadores deviam seguir navegando em alto mar para obter peixes e frutos do mar. Houve então, uma necessidade de desenvolver a cozinha da terra, pois os pescadores navegavam meses a fio e quando retornavam às suas casas não suportavam a ideia de comer os pescados e esperavam comer outros pratos com verduras, legumes e queijos. Assim desenvolveram-se pratos com ingredientes como o espinafre, funghi, queijo fresco e ricota. A cebolatambém era muito utilizada, pois ajudava a combater 61 doenças trazidas das viagens em alto mar, já que contém um alto poder bactericida. Os lígures possuem a fama de produzirem excelentes recheios tanto para massas, como para carnes. As tortas recheadas eram pratos que as mulheres dos pescadores preparavam para esperar os maridos, já que podiam ser feitas e assadas com antecedência. Genova era uma das cidades portuárias mais importantes, assim como Pisa, Venezia e Amalfi. Sua alimentação nas viagens era muito calóricas, onde as gallette eram normalmente consumidas. Gallette é uma espécie de pão achatado seco, de longa duração, umedecida com água ou azeite, e consumida com carne de porco salgada, feijões e favas, peixes frescos, salgados ou secos, além do vinho. Trazidos do norte da Europa para a alimentação lígure, o stoccafisso e o bacalhau salgado são métodos para conservação de peixes, sem perder seu valor nutritivo. O stoccafisso é seco ao ar livre, pela ação do vento, e o bacalhau é salgado e depois seco. Os dois métodos são feitos com peixes da família do merluzo. O SAL Na antiguidade, o sal era símbolo de poder. O sal era usada como forma de pagamento pelos romanos, e a partir daí que surgiu o nome “salário”, continuando mesmo depois de adotado o dinheiro. Palavras que vem da mesma origem são “salumeria”, usada para embutidos italianos, e “salsa”, molho. O sal vindo da Sicília, pelos navegadores genoveses, era exportado da Liguria pela via “salária”, que cortava o Piemonte, França e Alemanha. Teve um papel muito importante para o desenvolvimento econômico da região, principalmente em Genova. O sal também supria a necessidade de absorção de sódio pela população da Liguria, pois sua alimentação era baseada na dieta mediterrânea, rica em legumes e verduras. O uso das ervas foi muito importante para a alimentação, além de verduras, alcachofras, limões, pêssegos e damascos e muitos outros produtos provenientes da terra, já que a utilização de ovos e especiarias nos pratos do povo mais humilde, os camponeses, não era feita, por serem produtos muito caros. 62 Com o intuito de conservar a abundande produção de manjericão do verão por todo outono e inverno, foi criado o pesto genovês. Pesto, vem do verbo pestare e significa triturar. Era feito com a adição de azeite e queijo Pecorino Sardo, vindo da Sandenha com as navegações. A produção de azeite é extensa na região, porém muito dificultada pelos terrenos montanhosos. Entretanto, é extremamente delicado e de alta qualidade, pois a colheita de azeitonas, da variedade taggiasche, é feita manualmente, obtendo uma melhor seleção dos frutos maduros e sem oxidação proveniente das colheitadeiras. A fritura é muito consumida, devido à abundância do azeite. Desde peixes e frutos do mar, a legumes e verduras, sozinhos ou em pastella (empanados). A FOCACCIA A focaccia é uma produção da panificação italiana tão simbólica quanto a pizza napolitana. O povo da Liguria produzia pães de baixa qualidade, porque a ação do fermento era impedida pelo ar salgado e úmido, devido à proximidade com o mar. Os pães eram murchos, de crosta pouco crocante e de interior úmido. Assim a focaccia surgiu como uma alternativa: um pão achatado, com crosta crocante, resultado da abundância de azeite, e ao final da cocção, era salgado com adição de sal grosso. Peixes secos, como a anchova e o atum, pesto e alecrim, versão clássica, eram colocados sobre a focaccia. Uma lei medieval foi feita para a produção da focaccia e é utilizada até hoje: deve-se ter pelo menos 6% de azeite na constituição da massa, fermentar por no mínimo 8 horas, ter uma cor dourada na superfície e esbranquiçada nos seus “buracos”. Algumas produções gastronômicas: • Capon Magro: salada à base de peixe e verdura, condimentada com um molho verde preparado com anchovas, alho, pinoli, alcaparras, azeitonas, salsinha, azeite e vinagre. • Bianchetti: filhotes de peixe azul, feitos fritos ou cozidos. 63 • Acciughe di Monterosso: considerada a melhor produção de anchovas de toda a Itália. • Sardenara: variação lígure da Pissaladière provençal. Espécie de pizza, mais alta, guarnecida de anchovas, cebolas, azeitonas, alcaparras, alho e tomate. • Torta Pasqualina: torta de massa folhada com beterraba ou espinafre cozido, ricota fresca, • parmigiano reggiano e pecorino. • Corzetti: discos decorados de massa, condimentados com molho de mangerona e pinoli, • ou salmão fresco, cebola e nozes. • Seppie in Zimino: lulas ensopadas com bieta (variedade de beterraba cultivada por suas folhas) e outras ervas. • Fricasse di Agnello com Carciofi: guisado de cordeiro com alcachofras. • Asado: peito de vitello cozido por 7 horas. • Stoccafisso Accomodato: stoccafisso cozido com funghi, pinoli e tomates. • Preboggion: mescla de verduras, geralmente selvagens, cuja composição varia dependendo • da estação do ano. É usado como recheio de massas, omeletes ou sopas. • Pandolce: doce natalino, semelhante ao Panetone milanês, porém mais compacto, • aromatizado com sementes de anis, água de flor de laranjeira e vinho Marsala. 64 Emilia-Romanha Formada por duas regiões distintas historicamente e banhada à leste pelo Mar Adriático, a Emilia-Romanha faz divisa com a Lombardia, Veneto, Piemonte, Liguria, Toscana e com Marche, além da República de San Marino. Esta região é responsável, junto à Campanha, pela popularização da gastronomia italiana em todo o mundo. As distinções territoriais da região, também são traduzidas em sua gastronomia. A Emilia possui uma cozinha mais sóbria e refinada, baseada em massas frescas, carnes bovinas e laticínios, herança do período da renascença, onde importantes famílias emilianas faziam banquetes com cozinheiros famosos da época, e que acabaram por desenvolver uma gastronomia rica, farta e criativa. Já na Romagna, encontramos uma cozinha simplista e camponesa, por conta do período de dominação do Estado da Igreja, e é baseada em carnes de caça de animais de pequeno porte e peixes de água doce, além de ervas e produtos mais simples. Na Emilia encontramos diversos produtos típicos importantes e reconhecidos internacionalmente, como o presunto de Parma, o culatello, o Parmiggiano Reggiano, a mortadela de Bologna, o zampone pé de porco recheado), o cotechino (lingüiça de pele de porco e condimentos) e o aceto balsamico de Modena. A Emilia-Romanha é a região italiana que possui o maior número de fábricas de produtos alimentícios, seja para atender o consumo interno, seja para o externo. É uma das maiores produtoras de produtos agrícolas, junto à Campanha e Puglia. 65 Em toda a região, são encontradas mais de 300 tipos de massas, geralmente de grano duro, recheadas ou não. ACETO BALSAMICO O vinagre balsâmico, ou aceto balsamico, como os italianos o chamam, nasceu no período medieval como uma substância medicinal, e só começou a ser utilizado como condimento na cozinha por volta do século XV. Antes disso era usado como dote de noivas, e oferecido como presente especial ou saboreado como licor. Os verdadeiros vinagres balsâmicos são produzidos em cantinas ou sótãos nos quais são maturados e envelhecidos sob variações climáticas intensas, do inverno rígido ao verão abafado e úmido. Produzido a partir do mosto de uvas brancas Trebbiano, este produto é cozido, concentrado e depois misturado a uma parte de uma preparação mais antiga, que é conhecida como madre. Após este processo é acondicionado e transferido em vários barris de diversas madeiras, de diferentes tamanhos, podem ser acrescentados de algumas especiarias, como cravo, noz moscada, canelaou alcaçuz, dependendo da receita. É envelhecido por no mínimo 12 anos. Esse líquido de incrível consistência viscosa e sabor agridoce é usado para condimentar as mais variadas produções, desde saladas, molhos e carnes, até sobremesas. O vinagre balsâmico é um produto distinto devido ao processo de elaboração e às características aromáticas que adquire. O mais conhecido é o "Vinagre Balsâmico Tradicional de Modena" que é protegido por uma "Denominação de Origem" desde 1983. A história do vinagre balsâmico inicia-se na região de Modena, pois as condições de clima da região proporcionavam apenas produção de vinhos com baixa graduação alcoólica, portanto não recomendados para exportação, mas apropriados para a produção do vinagre. O vinagre balsâmico é o produto obtido da fermentação alcoólica e acética do mosto de uva Trebbiano, cozido, o qual é obtido a partir da uva esmagada e separado no início da fermentação alcoólica. O cozimento (longo e demorado – de 24 a 30 horas) é feito em fogo direto até o teor de açúcar alcançar valor compreendido entre 28 e 33oBabo, o que corresponde a uma redução de 20% a 30% do volume inicial do mosto. Um mosto mais cozido dará origem a um vinagre 66 balsâmico mais doce. Os vinagres feitos de mostos menos cozidos são os preferidos e necessitam de mais tempo para serem feitos. O mosto, assim concentrado, é colocado em recipientes de madeira, até tornar-se vinagre. Imagem: Acetaia para a produção de Aceto Balsâmico Uma bateria adequada para a elaboração de vinagre balsâmico é constituída de uma barrica de madeira de Amoreira de 60 L, uma de Castanheira de 50 L, uma de Cerejeira de 40 L, uma de Fresno de 30 L e uma de Carvalho de 20 L (fig. acima). Uma vinagreira em condições deve ter as barricas perfeitamente limpas e esterilizadas. Os recipientes utilizados para elaborar o vinagre balsâmico são colocados em locais quentes e bem arejados, para favorecer a atividade das bactérias acéticas. Geralmente, no inverno, quando a atividade microbiana é reduzida devido ao frio, é o momento recomendável para efetuar trasfegas e adição de mosto cozido. Nos demais períodos do ano, o vinagre necessita de repouso e de um discreto acompanhamento. O tempo necessário para a elaboração do vinagre balsâmico é de, no mínimo, 20 anos e é comum encontrarem-se vinagres com até 50 anos. No início do processo de elaboração do vinagre balsâmico, é recomendável deixar a abertura superior da barrica coberta apenas com um pano, para proteger da entrada de poeira e insetos e favorecer a aeração. Somente mais tarde é recomendável utilizar um batoque de madeira para fechar a abertura da barrica. 67 Visto que o vinagre balsâmico é considerado um produto tradicional na Itália, é muito difícil definir um processo de produção em escala industrial. O aspecto microbiológico da formação de vinagre balsâmico é importante, pois as fermentações alcoólica e acética ocorrem simultaneamente no mosto. A fermentação alcoólica acontece, geralmente, com a participação de leveduras osmofílicas do gênero Zygosaccharomyces, que se caracterizam pela baixa capacidade fermentativa, pois fermentam lentamente e produzem apenas de 5% a 6% de álcool, além de quantidades elevadas de acidez volátil. Essa fermentação ocorre no primeiro recipiente e, normalmente, não adquire aspecto tumultuoso. Por isso, muitas vezes, não é percebida e até mesmo questionada na produção de vinagre balsâmico. A fermentação acética também acontece no primeiro recipiente e conta com a participação de bactérias acéticas do gênero Acetobacter que formam película na superfície, constituindo a "mãe do vinagre". Assim, no primeiro recipiente se concentra a atividade microbiológica; nos demais, as transformações são de ordem físico-químicas (oxidação, combinações químicas, evaporação). O vinagre balsâmico, quando pronto, adquire aspecto denso, xaroposo e escuro, com perfume e sabor doce/ácido inconfundível, resultado de todas as operações efetuadas durante o longo período de elaboração e estocagem/envelhecimento nos diferentes tipos de madeira. O vinagre balsâmico é considerado um dos mais refinados condimentos. É recomendável utilizá-lo em saladas e frituras, além de combinar perfeitamente e exaltar o gosto e o aroma quando utilizado em pratos com carnes. É utilizado também em gargarejos para proteger a garganta de determinadas infecções, além de ser considerado um ótimo antioxidante. LINK (VÍDEO): Produção de Vinagre Balsâmico - https://youtu.be/CoZPGQy-JGw Mais alguns exemplos de pratos da Emilia-Romanha: • Ravioli: massa recheada com assado de carne e parmigiano ou com miolo de pão, ovo e verduras; 68 • Crespelle: massa similar ao crepe, recheado de espinafre e ricota fresca; • Tagliatelle Verdi con Prosciutto: massa fresca com ovos e espinafre, cortada em tiras, condimentada com presunto cru em cubos salteados na manteiga; • Chizze: focaccia recheada de parmigiano e frita em banha de porco; • Densissime: sopa feita com 10 variedades de peixes; • Piadina: um tipo de pão achatado e grelhado, comido com os mais variados ingredientes • Zampone e Cotechino con Lenticchie: embutidos de porco em pele e tripa, acompanhados de lentilha cozida; 69 Região Central Toscana A Toscana localiza-se na região central da Itália, e faz fronteiras com a Emilia- Romanha ao norte, com a Ligúria ao noroeste, com Marcas e Umbria ao leste, e com o Lazio ao sul. É considerada uma das regiões mais lindas e maiores de toda a Itália. Possui extrema importância devido ao seu patrimônio histórico, artístico, econômico, cultural e paisagístico. É também o berço da língua italiana. O Renascimento, movimento cultural que se iniciou ao fim da Idade Média, teve origem na Toscana. Associado ao humanismo, os acadêmicos europeus tiveram intenso interesse pelos textos clássicos, em grego e em latim, das civilizações da Grécia e Roma antiga, dos períodos anteriores ao triunfo da Igreja Católica na cultura européia e das invasões bárbaras. No século XVI, os estudiosos da antiguidade greco-romana passaram a influenciar a vida cultural, que deixou de ser feita pela Igreja Católica. A Toscana, hoje, é a região de maior concentração de obras de arte renascentistas: pinturas, esculturas e maravilhosas obras arquitetônicas. Seus maiores artistas renascentistas foram Leonardo da Vinci, Michelangelo Buonarroti e Rafael Sanzio. Na gastronomia, começou a ser imprescindível servir refeições bonitas e criativas. Para embelezar os pratos e torná-los mais finos e delicados, a carne cortada passou a ser muito usada. As carnes de boi e vitela começaram a ser mais usadas do que no período medieval. Uma nova paixão surgiu entre os Chefs 70 Renascentistas: o uso de miúdos, tanto de aves quanto de animais de grande porte, e também o uso de ovas de peixes. Os grandes cozinheiros renascentistas aproveitam e transformam tudo em iguarias gastronômicas refinadas. Passam a aproveitar as cabeças principalmente de novilho, peru e cabrito, utilizando tudo: língua, focinho, miolos, bochechas, céu da boca e olhos. Os molhos passam a ser muito usados, mas agora mais refinados, à base de ervas aromáticas e frutas, engrossados com pão torrado ou moído, farinhas, amêndoas trituradas ou ovos, e aromatizados com misturas de especiarias. As massas se desenvolveram extraordinariamente junto com uma grande quantidade de guisados e cozidos. A fruta in natura passa a ser servida entre as comidas como entrada e saladas, e as frutas e cítricos são usados como aromatizantes básicos. Assim como ocorria com outras artes,a cozinha no Renascimento foi notada por valorizar a harmonia dos pratos e pelo cuidado com os detalhes. Os banquetes extravagantes da Idade Média e o uso exagerado de especiarias foram rejeitados. Os cortes de carne são bem mais definidos, assados ou preparados em cozimento lento. Passam a ser usadas reduções à base de sucos obtidos na cocção e fundos aromatizados com cogumelos, amêndoas e trufas. Os livros de culinária começaram a aparecer e, os cozinheiros italianos começaram a divulgar essa arte pelo mundo, no final do século XVI. Entre os séculos XV e XVII, a Toscana sofreu grande influência da Família Medici, com 4 papas e 2 rainhas na França. Caterina di Medici foi para França casar- se com Enrico II, em 1533, e levou uma grande quantidade de cozinheiros. A cozinha francesa se baseava ainda na gastronomia medieval, acreditando que ingredientes caros e exóticos eram melhores e mais nobres que aqueles regionais e frescos, com pratos extremamente condimentados, cozidos e elaborados de forma que ninguém sabia ao certo o que se comia. A chegada de Caterina mudou totalmente esse cenário. A sequência de pratos foi introduzida – entrada, primo piatto, secondo piatto, etc… - o que mudou a forma de servir tudo, até os doces, ao mesmo tempo. Copos delicados de vidro veneziano, pratos de cerâmica e o garfo foram adotados. A elegância e o bom tom foram levados à mesa. Acrescentou pratos refinados como braseados, guisados, galantines e sorbês, além de verduras e alcachofras. Os princípios da cultura gastronômica de grande influência ocorreram por causa de Caterina. Ela era seguida por quem queria seguir os bons costumes na França. 71 A cozinha toscana hoje é rusticamente simples, baseada na cozinha camponesa, mas exigente com relação à matéria prima e aos métodos de cocção. Muito produtos são feitos na brasa, mas para cada tipo de alimento é utilizado um tipo de lenha diferente, conferindo sabores específicos. As ervas são extremamente utilizadas em pratos também regados a óleo de oliva. Óleo esse considerado um dos melhores desde a antiguidade. Todos os anos, os Medici obrigavam a plantação de algumas oliveiras nos olivários. Essas árvores vivem mais de 400 anos, então até hoje usufruímos os frutos desse período. O terroir influencia diretamente nas características do azeite. Em locais com clima temperado, normalmente próximo ao mar, ele é mais delicado e redondo, já em lugares de colina, com baixas temperaturas, onde não há um total amadurecimento das azeitonas, o sabor é forte, frutado e levemente amargo. Em algumas preparações na cozinha toscana não são usados molhos, gordura animal, especiarias, recheios e nem mesmo o sal. O tempero dos pratos é feito com a utilização abundante de ervas, também usadas para fins medicinais. O sabor do queijo pecorino é especial devido à alimentação abundante com ervas pelas ovelhas. As verduras têm um papel primordial. Existe uma enorme variedade de funghi e até mesmo um tartufo que se compara ao de Alba. No século XII, período em que ocorreu o auge da rivalidade entre Pisa e Firenze, os pisanos proibiram a entrada do sal aos fiorentinos, fazendo com que a ausência do sal nos pratos, marcasse a época. O sabor dos embutidos, queijos e presuntos crus é ressaltado pelo pão sem sal. O pão é extremamente apreciado pelos toscanos. Eles o consomem no café da manhã embebido no café com leite, antes do almoço fazem a Fettunta (Bruschetta da região) com tomates, pasta de azeitonas, fígado de frango ou somente com azeite. O pão é o principal ingrediente da salada Panzanella, os caldos Ribollita e Pappa al Pomodoro são engrossados com pão. O Panforte di Siena, é o doce típico de Siena, e é um pão redondo cheio de especiarias, mel, frutas secas, amêndoas e frutas cristalizadas. Também utiliza-se o pão para acompanhar sopas, massas e carnes. Na Toscana, aliás, o pão é a mais importante fonte de carboidrato, e em segundo plano estão o arroz e a massa, diferente das outras regiões da Itália. Um outro prato famoso da região, é a Bisteca alla Fiorentina é um famoso corte bovino e tem ao menos 450 gramas, podendo chegar a 1,5 quilogramas, não tem 72 sal, apenas leva azeite, é rapidamente selada na brasa, sendo consumida praticamente crua, tamanha maciez. O cordeiro tem papel em destaque na Toscana, sendo que sua qualidade é incomparável. A carne de boi também tem sua importância, e o porco é extremamente utilizado pois sua criação é muito simples. São feitos salames especiais, presuntos crus e o especial lardo de Colonnata. Também fazem-se presentes as carnes de caça, como a lebre, coelho, pombo, faisão e javali. A costa marítima tem grande importância na gastronomia da região. Na cidade de Livorno, existe o Cacciucco, uma sopa com diversos tipos de peixes, frutos do mar, tomates, servida sobre uma fatia de pão tostado. Mais algumas produções típicas da Toscana: • Pappardelle Aretine: Massa de largo formato, condimentada com molho de pato. Existem também versões com pedaços de peixes. • Trippa alla Fiorentina: Estômago cortado em fatias finas, cozido com azeite, ervas, tomate e manjericão. • Tonno Del Chianti: Apesar do nome, de atum (tonno) não tem nada. É feito com carne de vitello cozido em vinho, e depois submerso em azeite. Por incrível que pareça, a produção tem um sabor de peixe intenso. • Tordelli: Massa em forma de meia lua, recheada com carne de vitela, queijo pecorino, ovos e especiarias. Geralmente são temperados com um ragù de vitela. • Ribollita: Sopa densa de feijões, pão, cavolo nero. Seu nome significa cozida pela segunda vez, pois é preparada na véspera para que adquira maior sabor e fervida novamente antes de ser consumida. • Triglie alla Livornese: Trilhas com azeite, alho, salsinha, tomates, aipo, sal e pimenta. • Agnello alla Cacciatora: Guisado de cordeiro cortado em pedaços e cozido com azeite, alho, cebolas, tomates e vinho branco. • Castagnaccio: Espécie de torta à base de farinha de castanhas, água e pouco azeite. Geralmente é recheada com pinoli, uva passa e alecrim. 73 • Cavalluci: Biscoitos em forma de losangos típicos de Siena, à base de farinha, nozes, zests cristalizados de laranja, anis e canela. 74 Lazio Lazio ou Lácio, é a região central da Itália. Sua capital é Roma, que também é capital da Itália. Faz fronteira ao noroeste com a Toscana, ao norte com a Umbria, ao nordeste com Marche, ao leste com Abruzzo e Molise, ao sudeste com a Campania e ao oeste com o mar Tirreno. Na região do Lazio, está o território do Estado do Vaticano. LINK (VÍDEO): https://youtu.be/DEJx0CYrDHk A região de Lazio, fora de Roma, é pobre e carente de recursos naturais. Sua gastronomia não sofreu alterações nos últimos séculos, sempre baseada na cozinha da cidade de Roma e mantendo sua originalidade. Roma permaneceu apegada às tradições culinárias antigas, baseadas em produtos exclusivos da região, influenciada pelo estado papal. Apesar disso, a história da Roma antiga é diferente. Antes do Império Romano, havia o consumo de uma papa feita de cereais cozidos até se desmancharem, acrescidos de cebola e alho. O consumo de carne suína, aves, ovos e queijos eram exclusividade de poucas famílias mais ricas. Conforme o Império Romano conquistou novas regiões, novos hábitos alimentares foram se formando. Os romanos aprenderam a dieta mediterrânea e a arte grega dos banquetes, vindas da Sicília. Foram os primeiros a ter chef de cozinha, símbolo de status social. Contratavam cozinheiros sicilianos excelentes para realizar banquetes incríveis. 75 A gastronomia era muito ricae havia uma grande valorização dos ingredientes. A alimentação dos romanos podia ser dividida basicamente em duas categorias. O almoço era composto por uma alimentação mais frugal, baseada em verduras, legumes e frutas. Essa alimentação estava relacionada à valorização simbólica de certos alimentos, ligadas a uma vida saudável e a uma sociedade menos viciosa. A agricultura foi um marco de civilização: o homem cultivava seu próprio alimento, controlando a natureza devido ao processo de domesticação das plantas, divergindo-se à caça e à pecuária, relacionadas ao espaço selvagem da natureza. O jantar já era marcado por grandes eventos, às vezes gigantescos e teatrais. Alimentos vindos de toda Itália, da Grécia, do Oriente Médio, do Egito e da Índia eram consumidos. Visando suprir seus enormes banquetes, os mais ricos cultivavam plantas e criavam animais de origem estrangeira. Com as conquistas de terras, mais riquezas eram trazidas para Roma e aumentavam também os exageros à mesa. Um banquete era composto de três partes: a primeira parte era o gustatio, onde eram servidas saladas e pequenos pratos semelhantes aos antipastos de hoje; a segunda, era o mensae primae, principal etapa composta pelos pratos mais consistentes; a terceira e última parte era o mensae secundae, onde serviam doces, bolos, frutas frescas e secas. Era muito comum nas mesas romanas servirem frangos, patos, gansos, galinhas d’angola e pavões, pássaros silvestres como codornas, perdizes, gralhas, avestruzes, flamingos e garças, além de rãs, peixes, mexilhões, ostras e ouriços. Usavam praticamente em todos os pratos, uma espécie de molho, chamado “garum”, obtido a partir da fermentação dos interiores de peixes, preferencialmente atum e cavala, aos quais adicionava-se sal. Essa fermentação era feita ao sol, por cerca de dois meses. Hoje em dia, na cozinha da Campania, utiliza-se um condimento semelhante ao antigo garum romano, a “Colatura di Alici”. Nos banquetes romanos se deu o início dos princípios de etiqueta. Haviam regras rigorosas de precedência entre os convidados. O anfitrião sentava-se ao centro da mesa e, à sua direita, o convidado de honra, como ainda é usado nos dias de hoje. Os habitantes comuns de Roma tinham uma alimentação muito parecida com a atual, baseada em pães, carnes, legumes e vinho. 76 O consumo de pratos frios ou o hábito de alimentar-se em tavernas era comum, pois o fogo dentro de casa era proibido devido ao risco de incêndios. Com o tempo, o número de homens era muito maior que o de mulheres na cidade, e a população de visitantes cresceu, então muitos lugares se aprimoraram em fornecer pratos prontos vendidos a essas pessoas, dando origem ao serviço de buffet. Bartolomeu Scappi - o primeiro grande Chef Bartolomeu Scappi foi o maior nome da cozinha romana, e transformou a cozinha do Vaticano durante o período renascentista, sendo muitas vezes considerado como um dos primeiros Chefs celebridade de renome internacional. A sua origem e história já foram objetos de discussão e especulação, porém pesquisas recetes mostram que ele nasceu em Dumenza, na Lombardia. Seu primeiro fato conhecido está relacionado a um banquete organizado para o cardeal Lorenzo Campeggio, onde ele esteve a frente do serviço. Scappi serviu a outros cardeais e papas ao longo de sua vida. Ele adquiriu fama em 1570, quando no auge de sua carreira publicou o seu livro de receitas monumental - Opera Dell'arte del Cucinare, que incluiu mais de mil receitas da culinária renascentista e descreve técnicas e ferramentas de cozinha, documentando tudo o que ele acreditava ser necessário para o conhecimento de um cozinheiro em alto nível, incluindo a imagem de um garfo como o conhecemos hoje em dia. O trabalho ainda inclui formas de utilização de novos ingredientes levados da América, inúmeras receitas de macarrão, massas recheadas, tortas e produções de confeitaria. O trabalho antecipa muito das características da cozinha italiana atual. Scappi morreu em 13 de abril de 1577 e foi enterrado na igreja Santi Vincenzo e Anastasio alla Regola ou Igreja dos Santos Vicente e Com o crescimento do cristianismo, surgiu a necessidade de criar pratos para servir viajantes e peregrinos nas tavernas: Bavette alla Carretiere, Spaghetti alla Puttanesca, Spaghetti all’Amatriciana, Spaghetti alla Carbonara. Os matadouros passaram a fornecer as víceras ou partes menos nobres dos animais, com os quais diversos pratos são preparados, como exemplos: Coda alla Vaccinara (rabo de boi) e o Rigatoni alla Paiata (intestinos do vitello). Mais que em qualquer lugar da Itália, os romanos adoram as massas. Consomem também alcachofras de diversas formas: recheadas, cozidas, cruas e fritas, agridoces, com alho e hortelã, ou recheadas de carne de porco. Todas as hortaliças são muito consumidas em forma de salada. Adoram também sopas ricas em carnes e leguminosas, como a minestra de grão de bico com costela de porco. 77 Em Roma, a gordura usada para fritura é a banha de porco, diferente do norte, que é a manteiga e, do sul, que é o azeite. Pratos típicos • Fiori di Zucca Farciti: flores de abóbora recheadas com mozzarella, farinha de rosca e anchovas, depois passadas em pastella e fritas. • Gnocchi alla Romana: gnocchi feitos com uma polenta de semolina, à qual, depois de fria, são incorporados manteiga, ovos e queijo. Corta-se então a polenta em formato de discos que são colocados sobrepostos em uma forma, polvilhados de parmesão e levados ao forno para gratinar. • Stracciatella: sopa preparada com caldo fervente, ao qual é adicionada uma mistura de ovos batidos com parmigiano e noz moscada, de modo que se coagule formando fios solidificados. • Baccalà in Guazzetto: filés de bacalhau enfarinhados e fritos, cujo cozimento é completado em molho de tomates com anchovas, pinoli e uvas passas. • Abbacchio alla Romana ou Abbacchio alla Cacciatora: provavelmente o prato mais renomado da cozinha da região. Cordeiro de leite cozido com alho, alecrim, vinho branco, anchovas e pimenta vermelha. • Puntarelle con Salsa di Acciughe: salada preparada com os jovens brotos da catalonha que se formam na parte interna do maço. Servida crua, com molho à base de alho, vinagre ou limão, sal, pimenta e anchovas. • Crostata: torta de massa doce assada com uma camada de geleia, geralmente de um tipo de cereja denominadas visciole. 78 Região Sul Campânia A Campânia fica na região sul da Itália e sua capital é Nápoles. Tem limites ao oeste e ao sudoeste com o mar Tirreno, ao noroeste com o Lazio, ao norte com Molise, a nordeste com Puglia e a leste com Basilicata. Nápoles fica situada no golfo de Nápoles, no mar Tirreno. É um importante porto e o principal centro industrial e comercial do sul do país. Também é um importante centro turístico, pois nos seus subúrbios localizam-se vários locais de interesse: o vulcão do monte Vesúvio, as ruínas de Pompéia e de Herculano, e as ilhas de Capri e de Ísquia. Seu centro histórico é declarado patrimônio mundial pela UNESCO. Nápoles foi fundada pelos gregos, no século VIII a.C. Foi dominada pelos romanos no século III a.C. e depois dominada pelo Império Bizantino, no século VI d.C. Entre os anos de 1500 e 1700, foi dominada pelos espanhóis e depois pelos franceses, e finalmente em 1861, com a unificação da Itália, se tornou parte do estado italiano. Hoje, possui quase 1 milhão de habitantes, e é a terceira mais populosa do país. É terra de grandes escritores e poetas, juntamente com Palermo, na Sicília. Sua cozinha é vigorosa, saborosa e simples, reconhecida como a de maior expressão da cozinha italiana. Seusprodutos possuem sabor inigualável, devido à terra fértil, que une a lava do vulcão e as algas do mar. Os peixes e frutos do mar são maravilhosos e possuem uma variedade grande de moluscos bivalves. A produção de massas secas, as melhores de todo mundo, é feita com o trigo de grão 79 duro. Essa região sempre foi fornecedora de itens agrícolas para a capital Roma, o que propiciou muito seu desenvolvimento. A partir disso tudo, a maravilhosa cozinha napolitana nasceu, à base de legumes, verduras, peixes e frutos do mar. Seus incríveis tomates, cultivados ao sopé do Vesúvio, e sua espetacular mozzarella di bufala são ingredientes que criaram os dois pratos mais simbólicos da Itália: o spaghetti al pomodoro e a pizza. O tomate foi levado à Itália pelos espanhóis, vindo da América, no século XVI, mas durante 200 anos foi considerado fruto venenoso e então, usado apenas como planta ornamental. Começou a ser usado na cozinha napolitana, após constatação do seu sabor, de diversas formas, como salada, guisado, recheado e claro, como molho, a melhor maneira de mostrar suas características. Atualmente na Campânia existe o cultivo de inúmeros tipos de tomates, porém o mais famoso é o San Marzano. O tomate San Marzano é um fruto alongado, com polpa firme e adocicada. Sua colheita é realizada apenas no verão e, para garantir sua presença nas mesas italianas por todo ano, foram desenvolvidas diversas formas de conservas: tomate pelado, concentrado de tomate, passata de tomate ou polpa de tomate. Só a província de Salerno processa cerca de 1.250.000 toneladas de tomates por ano. A Campânia, ao lado da Emilia Romagna, é o maior produtor e exportador desses tomates em todo mundo. Os melhores moinhos de trigo de grão duro estão na província de Gragnano. Com esse trigo são produzidas as maravilhosas massas secas e os pães de casca rústica e miolo ácido, que permanecem macios por longo tempo. O nome pizza deriva do latim pinsa, verbo passado de pinsere, que significa amassar. A história da criação da pizza tem muitas vertentes. Há quem acredite que seja herança da época do império romano, pois existia um pão achatado chamado picea. Outros dizem que nasceu em Genova, em 1490. A verdade é que somente em torno de 1700, os napolitanos transformaram aquele pão achatado em pizza, com molho de tomate e anchovas, e em 1850 se tornou popular e conquistou adeptos até mesmo entre os reis. Após a unificação italiana, o pizzaiolo Raffaele Esposito, em sua pizzaria Brandi, criou a pizza Margherita, usando tomate, mozzarella e majericão, - vermelho, branco e verde, cores da Itália, em homenagem à visita da rainha Margherita e do rei Umberto I, em 1889. 80 Ao contrário do que se imagina, a pizza não teve sua expansão tão rápida pela Itália. Ela se popularizou inicialmente nos EUA, a partir de 1902 com a primeira pizzaria napolitana inaugurada no país, e então, só nos anos 70 é que se espalhou por toda Itália, mas sempre foi muito consumida em Nápoles. Lá, os italianos comem com as mãos, dobrando-a em quatro e dando apenas quatro mordidas! Mozzarella, margherita, marinara, alici, quattro formaggi, napoletana, capricciosa, quattro stagioni são os sabores mais tradicionais. São feitas sempre com produtos locais, abertas com as mãos e assadas em forno a 485ºC. Algumas variações são encontradas hoje em dia, como abacaxi ou batata frita, para desespero dos apreciadores da verdadeira pizza napolitana. LINK (VÍDEO): https://www.youtube.com/watch?v=rh6SY0KM24c Prezado aluno, clique em legendas automáticas no símbolo contendo uma engrenagem, e em seguida, selecione o idioma português. O gado de búfalo se adaptou muito melhor aos terrenos alagados da região da Campânia, que o bovino. Esse é um dos motivos que fazem a mozzarela di bufala da Campânia tão excelente. Um queijo de sabor suave e marcante ao mesmo tempo, textura macia e suculenta, leitoso, levemente salgado e adocicado. Possui vários tamanhos e formas: as ciliegine de 25 gramas, os bocconcini de 50 gramas, a aversana de 500 gramas, além das tranças. O ideal é que sejam consumidas no mesmo dia da produção para que se possa obter todo o esplendor de suas características. As melhores são feitas entre as cidades de Salerno, Eboli e Paestum. Outros queijos produzidos na região são a muçarela de leite de vaca, chamada Fior di Latte; a provola, que é a muçarela defumada, com tom dourado por fora e branca por dentro; e o caciocavallo, um queijo mais magro que pode ser conservado por até um ano. Uma parte muito importante da alimentação dos napolitanos são os peixes, camarões e frutos do mar. Os peixes são vendidos quase vivos, mostrando todo seu frescor. Há uma imensa variedade de camarões e os moluscos bivalves existem em grande quantidade e também diversas espécies. Os frutos do mar são fresquíssimos e consumidos de formas muito simples, podendo ser salteados com azeite e alho, com spaghetti ou, crus com um pouco de suco de limão. 81 A ilha de Capri e a costa Amalfitana possui receitas deliciosas à base de peixes e frutos do mar, tomates frescos e ervas perfumadas, destacando o manjericão. A Salada Caprese, muito conhecida, é feita com mozzarella di bufala, tomate e manjericão, e em Capri também há muitos pratos à base de coelho. Encontramos em Amalfi e Sorrento uma grande produção de licor feito com limão siciliano, o famoso Limoncello. Os doces são também muito apreciados na região. A doçaria mais importante da Itália está na Campania e na Sicília, com sua Pastiera di Grano, doce típico de Páscoa; seus Babàs, de origem polonesa/ francesa; sua Sfogliatella, nas versões frola e riccia; e seus Susamielli e Struffoli, típicos de Natal. Algumas produções de origem da Campania: • C r ost i ni al l a N apol et ana - F at i as de pão es pal m ado de m ant ei ga, c ober t os d e mozzarella, tomates frescos, anchovas e orégano, assadas no forno. • G at t ò di P at at e - E s péc i e de t or t a f ei t a c om pur ê de bat at as m i s t ur ado c om ovos, salame, provolone e parmesão, assada no forno. • Z u c c hi ne a S c apec e - E s c ab ec he de abobr i nhas f r i t as em az ei t e e m ar i nada s numa mistura de água e vinagre, alho, pimenta e hortelã. • R av i ol i al l a N apol et ana - M as s a em f or m at o de m ei a l ua, r ec heada c om mozzarella, ricota, presunto cru e salsinha, condimentados com molho de tomate ou ragù. • M i ne s t r one al l a N apol et ana - A di f er enç a des t a s opa de v er dur as , em r el aç ão àquelas das demais regiões, é a presença da abóbora e de alguma massa curta. • A l i c i A m m ol l i c at e - A nc hov as f r es c as ao f or no c om al ho, v i nho br anc o, salsinha e farinha de rosca. • P ol pi al l a Luc i ana - P equenos pol v os c oz i dos e t em per ados c om az ei t e, al h o, salsinha, pimenta e limão. • Braciole di Maiale alla Napoletana - Bifes à rolê feitos com carne de porco, recheados com um composto de alcaparras, presunto cru, farinha de rosca, 82 uvas passas e pinoli. São cozidos em molho de tomate com pouca pimenta vermelha. • Pastiera di Grano - Torta doce recheada com ricota, trigo cozido em leite e banha, água de flor de laranjeira, fruta cristalizada, ovos e especiarias. • B abà al R um - D oc e de m ass a l ev edada em bebido em c al da de aç úc ar e r um. Imagem: Pratos típicos da Campanha 83 Puglia Bari, Foggia, Polignano a Mare, Gargano, Vieste, Gallipolli, Lecce... A região da Puglia ou Apuglia, como todo sul da Itália, mais pobre, por vezes enfrentou dificuldades. Por este motivo, a cozinha da região se caracterizacomo mais simples, mas de sabores marcantes, baseada na simplicidade de saborosos ingredientes. Desde a antiguidade, a região foi uma “ponte” ao oriente, e com seus quase oitocentos quilômetros de costa marítima, foi extremamente cobiçada e dominada por diversos povos, cmo gregos, romanos, góticos, bizantinos, longobardos, normandos, venezianos, espanhóis e franceses. A Puglia, assim como a Campania, também destaca-se como celeiro do trigo de grão duro da Itália. Suas massas caseiras, como exemplo os orecchiette e cavatelli, e os pães, como o pão de Altamura, têm papel importantíssimo na alimentação dos seus habitantes. Na posição de segundo lugar em importância, estão as verduras, legumes e leguminosas – escarola, catalonha, chicória, couve, couve flor, brócolis, alcachofra, berinjela, abobrinha, lampascioni (pequenas cebolas típicas), espinafre, pimentão, batata, grão de bico, lentilha, fava e feijões. Na terceira posição, vem o azeite, extremamente intenso e frutado, com 40% de toda produção da Itália e 15% da produção mundial, considerada a maior produtora da Itália. A região também produz 500 mil toneladas de uva de mesa, o que resulta em uma enorme quantidade de vinho popular. A população consome muita carne de cordeiro e de cabrito. 84 Imagem: Orecchiette e cavatelli - massas típicas da Puglia Os frutos do mar, como ostras, vôngoles, polvos, são consumidos salteados, gratinados ou crus, e vêm principalmente do Golfo de Taranto. Os peixes são preparados assados ou em crosta de sal, pegos com os trabucchi. Todos eram usados como moeda de troca com os camponeses da região, que davam aos pescadores seus queijos e ricota. Como destaque de queijo típico, há a Burrata, uma mozzarella recheada de creme de leite ou mascarpone. A Puglia é uma grande planície, fácil de cultivar, e por este motivo possui abundância em todos esses produtos. A alimentação na Puglia é muito nutritiva, por todos esses ingredientes, sendo exemplo da dieta mediterrânea, inspirada nos gregos, da época que era parte da Magna Grécia. Um fato merece destaque quanto à preparação dos pratos: na Antiguidade, o governo da Puglia proibia a construção de fornos nas casas, para evitar o risco de incêndios, e assim ficava responsável em construir fornos públicos. Porém, a população tinha que pagar pelo seu uso e então começaram a aparecer fornos clandestinos no interior, fora dos limites da cidade, mas que a qualquer momento podiam ser derrubados, caso aparecesse algum fiscal. Esses fornos foram 85 extemamente importantes e responsáveis pela construção da cozinha pugliesa. Assados de carne maravilhosos, pães excelentes, panzerotti (pastéis recheados de tomate, mozzarella, anchovas e cebola) são alguns exemplos. As Tiella, potes de cerâmica onde os alimentos eram colocados e depois levados aos fornos, também era outra produção muito utilizada. Algumas produções da Puglia: • Cruschill - Bruschetta de pão integral. • F o c ac c i a di P at at e - F oc ac ci a c uj a m as s a é f ei t a c om bat at as am as s adas e m purê, farinha, fermento, sal e azeite. • P om odor i S ec c hi S ot t ’ ol i o - Tom at es s ec os ao s ol e c ons er v ados em az ei t e com alcaparras, alho e outros temperos. • C av at el l i - P equenos gnoc c hi f ei t os c om f ar i nha de gr ão dur o e águ a, presentes tanto na Puglia quanto na Basicata, em Molise, na Calabria e na Sicilia. Os condimentos dessa massa variam, mas um dos mais típicos é o soffritto à base de azeite, alho e anchovas. • M ac c her oni di F uoc o - M as s a l onga, do t i po dos buc at i ni, t em per ada c om u m pesto feito com muita pimenta vermelha seca refogados em alho e azeite. • O r e c c hi et e - S em dúv i da a m as s a m ai s c onhec i da da P ugl i a, f ei t a c o m semolina e água. Com a massa são formadas pequenas conchas, com a ajuda do polegar ou com a ponta de uma faca. As orecchiette tradicionais são condimentadas com cime di rapa, inflorescências de uma espécie de nabo (Brassica campestris), que podem ser substituídas por brócolis, refogadas em alho, azeite, pimenta vermelha e, às vezes, anchovas. A massa costuma ser cozida na água de cozimento da cime di rapa. Muito popular também é o uso do ragù barese, feito com involtini de vitello. • La C i am bot t a - M as s a c ondi m ent ada c om s ugo de pei x e. • P anc ot t o c on R uc ol a e P at at e - S opa de f at i as de pão am anhec i do mergulhadas na água de cozimento das batatas e da rúcula, condimentado com um sofritto de alho, azeite e pimenta vermelha. 86 • A l i c i A r r ac anat e - A nc hov as f r es c as di s pos t as em c am adas em um a f or ma, alternadas com uma mistura de farinha de rosca, parmesão, hortelã, alcaparras, orégano e azeite, e assadas no forno. • A gnel l o al l a C ar bonar a - P i c adi nho de c or dei r o c oz ido no f or no c o m cogumelos locais, chamados Cardoncelli, e aromatizado com azeite, alho e pimenta vermelha. • B r as c i ol e al l a B ar es e - B i f es de v i t el a enr ol ados , r ec heados c om pr es unt o c r u, salsinha, queijo pecorino e cozidos lentamente com azeite, alho, tomates e ervas aromáticas. • P anv i nes c o - D oc e de m os t o c oz i do e s em ol i na. D epoi s de c oz i do o c r em e é despejado em • pe qu enas f or m as , des enf or m ado e pol v i l hado c om pequenos c onf et es doc e s coloridos. • C as t agnedde - B i s c oi t os f e i t os c om am êndoas m oí das , f ar i nha, r as pas de limão e açúcar. Com a massa se fazem pequenas bolinhas que, depois de assadas, são cobertas com uma calda de cacau. 87 Sicília A Sicília é a maior ilha do mar Mediterrâneo, ao sul da Itália, separada do continente pelo estreito de Messina. Devido à sua posição geográfica, sempre teve importante papel nos eventos históricos com os povos do Mediterrâneo como protagonistas. Palermo, Catania, Agrigento, Siracusa, Tormina, Trapani, Erice, Messina, Ragusa... Uma terra de contrastes e cruzamentos culturais. Os vizinhos de inúmeras civilizações engrandeceram a Sicilia com assentamentos urbanos, monumentos e vestígios do passado, que tornaram a região um lugar privilegiado onde a história pode ser revista através de imagens que não se apagaram com o tempo. Possui um povo cortês e prestativo. Sua cozinha é variada e agridoce, rica em perfumes e sabores fortes. A gastronomia da região possui a marca dos vários povos que passaram por lá nos últimos dois milênios. Vinho, pães e azeite trazidos pelos gregos. Criação de gansos introduzida pelos romanos. A arte de fazer pratos recheados e agridoces ensinada pelos bizantinos. Pratos de carne, bacalhau e o stoccafisso ensinados pelos normandos. Cores vivas e produtos do novo mundo trazidos pelos espanhóis: tomate, batata, milho, cacau e abóbora. A maior contribuição gastronômica veio com os árabes: pêssego, açúcar, cítricos (trazidos da China, Japão e Índia), arroz, açafrão, uva passa, noz moscada, cravo, canela, pimenta do reino, figo, amêndoa e pistache. E através dos franceses, vieram a arte do serviço e a paixão pela cebola. Diante disso tudo, certamente a gastronomia na Sicilia é a mais complexa, antiga e criativa de toda Itália. Não é a toa que possui o primeiro livro de culinária, que se tem notícia, do século V a.C.. 88 Uma das características da cozinha siciliana é que um mesmo prato pode ser elaborado de uma forma mais modesta e de outra mais rica, devido à disponibilidade dos ingredientes. Por isso, na Sicília encontram-se restaurantes com pratos elaboradíssimos e, também, excelente comida derua a preços populares. Pasta alla Norma, pasta con le sarde, panelle (espécie de polenta de grão de bico frita), pane con la milza (pão recheado com rim e pulmão de vitello, com ou sem queijo caciocavallo). O uso da manteiga é quase nulo, prevalecendo o azeite e com o uso da banha de porco para alguns doces. Os produtos que enriquecem a região são inúmeros. A vivacidade das frutas e legumes. Lentilhas, grão de bico, favas. As berinjelas usadas na produção da maravilhosa caponata, junto a pimentões, cebola, alho, azeitonas, alcaparras. A vasta variedade de cítricos. Figos da Índia introduzidos da América. A abundância dos peixes, em especial o espada e o atum, servidos com alcaparras, alho, azeitonas, laranja, limão e farinha de rosca condimentada ou cebolas roxas agridoces. A bottarga, ovas de peixe secas. Crustáceos, mariscos, camarões e ouriços do mar, consumidos crus. Os melhores pistaches do mundo, de Bronte. As amêndoas de Agrigento, usadas na riquíssima pasticceria (confeitaria) e no latte di mandorla. As alcaparras de Lipari. A ricota de ovelha usada em pratos salgados, mas sobretudo nos doces. A abundância de ervas como o manjericão, orégano, salsa, hortelã, alecrim, sálvia e, sobretudo, o finocchietto selvatico (o equivalente às nossas folhas da erva doce). Numerosos tipos de pães e o sfincione, similar a uma pizza, porém mais alta e macia, condimentada com tomate, alho, filés de anchova e orégano. Alguns pratos famosos tiveram suas origens na época do antigo sistema hereditário siciliano, onde as terras de sistema feudal eram passadas para o primogênito, restando aos outros filhos a pobreza ou o clero. Nos monastérios foram criados os arancini (bolinhos de arroz com açafrão, recheados de ragú de carne e ervilhas, queijo ou espinafre, além de outras versões, depois empanados e fritos), as azeitonas recheadas com carne, empanadas e fritas, e os cannelloni. A influência dos árabes na doçaria da região, resultou nos mais fantásticos doces de toda Itália, como a pasta reale e fruta di Martorana, a cassata siciliana e o cannoli. 89 Por muito tempo, a Sicília supriu a Itália com o trigo e com suas massas, trazidas pelos árabes. A qualidade da pasta e do couscous é excelente. A Sicília teve um papel importantíssimo com seus vinhos, pois foi o mercado fornecedor da bebida, não só para Itália, como para toda Europa, na época que a praga Phylloxera devastou todo o continente. Seus vinhos são inúmeros e excelentes, tendo destaque os vinhos de sobremesa, o Marsala e os passitos. O sal siciliano de Trapani era exportado pelos navegadores da Liguria para todos os cantos da Europa. Isso provia riqueza aos proprietários das salinas semelhante aos que detém o petróleo atualmente. A indústria do sal entrou em crise após a evolução dos métodos modernos de conservação de alimentos, como resfriamento, congelamento, pasteurização e esterilização. Os sicilianos atribuem a si a invenção do sorvete. Primeiro com o sorbet, que existe até hoje, chamada granita, muito consumida nos sabores limão, amêndoa ou café. A granita era feita com a neve do vulcão Etna, armazenada em cavernas, durando até o verão, acrescentada de suco de fruta e mel. Depois começou-se a introduzir o creme de leite e ovos. Um siciliano chamado Procópio Del Coltelli foi o primeiro a abrir uma sorveteria em Paris, que fez estrondoso sucesso e existe até hoje, 400 anos após sua inauguração. Mais algumas produções sicilianas: • C aponat a - Ver dur as r ef ogad as e t em per adas em agr i doc e. E x i s t em i núm er as versões que podem incluir: berinjelas, cebolas, pimentões, tomates, azeitonas, manjericão, pinoli, cravo da Índia, amêndoas, fatias de pera, açúcar e vinagre. Algumas receitas chegam a incluir cacau amargo. • Millassata - Grande fritada aromatizada com alho, salsinha, fundos de alcachofra e aspargos selvagens. • O l i v e F ar c i t e - A z ei t onas , ger al m ent e v er des , r ec headas c om al c apar r as e anchovas e conservadas em azeite. • S ar d e a B ec c af i c o - S ar di n has l i m pas e s em c abeç a, di s pos t as aber t as e m uma forma untada de azeite e cobertas com farinha de rosca, anchovas, pinoli, canela e uva passa. Temperadas com suco de laranja e limão, são levadas ao forno. 90 • Cuscuso - Prato evidentemente de origem árabe. Segue o mesmo procedimento do Couscous do Norte da África, mas o caldo é geralmente à base de peixes e o acompanhamento consiste em berinjelas fritas, frango ou um ensopado de cordeiro. • Pasta alla Norma - Massa seca, geralmente spaghetti ou penne, condimentada com molho de tomate, manjericão fresco, ricota salgada e coberta de fatias de berinjelas fritas. • Pasta con le Sarde - Bucatini cozidos em água aromatizada com folhas de erva doce fresca e condimentados com um composto de sardinhas, alcaparras, anchovas amassadas, cebola picada, pinoli, uva passa, pimenta do reino e folhas de erva doce. Pode incluir também o açafrão. Essa massa não é acompanhada de queijo mas de farinha de rosca condimentada com alho e anchova. • M ac c u - S opa m ui t o densa f ei t a c om f av as s ec as am as s adas em pur ê, aromatizadas com folhas de erva doce selvagem e azeite extra virgem de primeira qualidade. • P es t o S i c i l i ano ou Tr apanese - É pr epar ado es m agando no pil ão pi nol i , al ho, tomates sem pele nem sementes, manjericão, salsinha, azeite, sal e pimenta do reino. Existe uma versão que substitui os pinoli por amêndoas. • A c c i ughe al l ’ A r anc i a - A nc hov as f r es c as di s pos t as em c am adas , em um a forma, alternadas com azeitonas, alcaparras, fatias de limão, cozidas no forno, aromatizadas com suco de laranja. • Tun ni na F r i t t a - F at ias de at um pas s adas na panel a e t em per adas c om l i m ão e orégano. • G r a s s at u - P i c adi nho de c ar ne m agr a de c or dei r o e c abr i t o, gui s ado c o m vinho tinto, batatas e cebolas refogadas, aromatizado com alho, salsinha e, no final do cozimento, caciocavallo e pecorino ralado. É usado também para condimentar massas. • Insalata Turca - Verduras grelhadas servidas frias, temperadas com azeite extra virgem, alho, sal e pimenta do reino. 91 • I ns a l at a di A r anc i a - S al ada de l ar anj a c om az ei t e, s al e pi m ent a. P odem ser adicionadas azeitonas pretas e fatias de cebola roxa. • Pitaggio - Guisado de ervilhas frescas, favas e corações de alcachofras. Geralmente acompanha linguiças grelhadas. • C as s at a S i c i l i ana - P ão- de- ló r ec heado de r i c ot a bat i da c om aç úc ar, pedaç o s de chocolate, baunilha, fruta cristalizada, licor Maraschino e coberta com marzipã à base de pistache e fondant. Decorada com frutas cristalizadas. Massas A farinha: a farinha de trigo é o produto dos grãos de trigo livres de impurezas. Comercialmente, as farinhas são avaliadas com base no grau de peneiramento (quantidade de farinha em quilos, por 100 quilos de trigo limpo). A farinha integral é o produto da moagem do trigo, sem peneiramento. A semolina: é o produto do grão duro, moído e peneirado. Sêmola: é o produto residual da extração da semolina. Massa Industrializada As massas secas industrializadas incluem formatos conhecidos como espaguete, penne, fusilli, etc. A semolina (grano duro) e a água são os ingredientes que compõem as massas industrializadas. A semolina é submetida à moagem e é peneirada, a água deve conter baixos teores de sódio, magnésio, cloro e ferro. Desde a mistura da farinha à água, tudo é feito por máquinas. A massa é misturada, aberta e cortada mecanicamente, depois é submetida a uma ventilação intensa para secagem, antes do empacotamento. De acordo com a legislaçãoa massa seca industrializada deve ser feita de semolina. 92 Massa Fresca A composição básica da massa fresca é: farinha, ovos, sal e azeite (opcional). A proporção média é de 100g de farinha de trigo para cada ovo, diminuindo progressivamente até chegar a 1 quilo de farinha para 7 ovos (em produções em masseiras), podendo usar uma proporção de até 50% de farinha de trigo para 50% de semolina. A massa é feita manualmente, aberta à mão (com o rolo de macarrão) ou à máquina, cortada ou recheada. Instalações e Equipamento: • Mesa comprida e larga de superfície lisa e limpa. • Rolo de abrir massa ou máquina de abrir massa (manual ou automática). • Espátula de ferro (para recolher resíduos da mesa). • Carretilha (para cortar a massa). Método de abrir a massa com uma máquina: 1) Corte um pedaço de massa e alise-a até formar um retângulo ou ficar oval. 2) Coloque a alavanca da máquina na abertura mais larga e passe a massa. 3) Dobre a massa em três e repita o processo algumas vezes. 4) Coloque a alavanca na próxima abertura, um pouco mais estreita, e passe a massa novamente. 5) Repita o processo até estar com a massa na espessura desejada. 6) Enxugue a massa com farinha de trigo (se necessário) e corte no formato desejado. Como abrir a massa na mão: 1) Corte um pedaço da massa e estenda-a com um rolo de macarrão. 2) Abra a massa uniformemente com movimentos para frente e para trás até que ela fique na espessura desejada. 3) Enxugue a massa com farinha de trigo (se necessário) e corte com uma faca no formato desejado. 93 Como cozinhar a massa: 1) Coloque a quantidade correta de água numa panela adequada – 1 litro para cada 100g de massa. 2) Leve à fervura e salgue a água – 1 colher de sopa de sal por litro de água. 3) Coloque a massa quando a água estiver no ponto mais alto de ebulição e mexa imediatamente para que se mova livremente no líquido. 4) Cozinhe a massa até estar "al dente", ou no ponto de cocção desejado. 5) Escorra imediatamente e sirva acompanhada de um molho, ou resfrie-a imediatamente, acrescentando um fio de óleo neutro ou azeite, e guarde-a para uso posterior. Como colorir a massa: • Açafrão: dissolver um pouco do pó nos ovos batidos. • Trocar o peso de um ovo (50g) pelo equivalente em purê do legume a ser utilizado para colorir, ex: espinafre. As massas italianas podem ser divididas em três grupos: I. TIRAS: Fettuccine, Spaghetti, Capellini, Lasagna, Tagliatelle, etc. II. TUBOS: Rigatoni, Manicotti, Ziti, Penne, Spira, etc. III. FORMAS: Conchiglie, Farfalle, Fusilli, Rotelle, Orzo, etc. Outro grupo importante, e que não se encaixa dentre as anteriores é o grupo das massas recheadas: Ravioli, Cappelletti, Cannelloni, Tortelli, etc. A escolha do molho: A escolha do molho é fundamental para o sucesso de um prato à base de massa. Cada tipo/formato de massa assimila melhor um tipo de molho. Massas finas e compridas pedem um molho leve, massas tubulares e curtas podem levar um molho de consistência média (como bechamel, ragù, etc.), massas largas pedem molhos enriquecidos e massas recheadas necessitam de um molho que complemente seu recheio em sabor e textura. 94 Massa fresca recheada Para se preparar massa fresca recheada, alguns fatores devem ser levados em consideração, a saber: • Trabalhe apenas com massa fresca, úmida recém preparada. • Prepare o recheio com antecedência para que ele esteja frio (ou gelado) e sem excesso de umidade. • Utilize um saco de confeitar para otimizar e acelerar a produção. • Defina previamente o tipo de corte a ser produzido. Os tipos/formatos mais comuns de massa recheadas são: • Tortellini ou Capelletti: a partir de massa retangular com 3 cm de largura, dobrados diagonalmente ao meio (formando 2 triângulos, um sobre o outro) e unidos pelas pontas. • Tortelloni, Tortelli ou Taviolli: a partir de massa retangular, o recheio deve estar no centro e a massa deve ser recortada na forma de quadrados com o auxílio de uma carretilha. • Cannelloni: quadrados de massa de aproximadamente 10 cm x 10 cm recheados e fechados como um tubo. • Lasagna: camadas regulares de massa delicada e leve intercalada por camadas de recheio salgado e molho. O tamanho da massa deve estar de acordo com o tamanho do recipiente onde ela será preparada. 95 Cozinha de criação E agora… como transformar a base clássica em uma cozinha autoral e contemporânea? A expressão de criatividade na cozinha pode ser exercida de diversas formas e em aplicações distintas. Uma coisa é certa, criar significa não copiar. O estudo das técnicas e de conceitos aplicados à cozinha ao longo da história é essencial para se criar novos pratos. Se analisarmos as cozinhas dos últimos anos, evoluímos mais nas últimas duas décadas do que em toda a história, desde a descoberta e o domínio do fogo pelo homem. Chefs como Ferran e Albert Adrià em seu restaurante El Bulli, mesmo estando fora do eixo da cozinha clássica - Itália x França, conseguiram traduzir as bases e referências de cozinha em um formato totalmente novo, e revolucionaram a maneira como vemos a gastronomia, trazendo consigo uma horda de chefs dispostos a levar a cozinha para um novo patamar, elevando a refeição para uma experiência sensorial. Conhecer o ingrediente e suas possibilidades é fundamental para que um cozinheiro consiga explorar e extrair todo o potencial de um alimento. Os estudos sobre as formas como apreciamos as características sensoriais dos alimentos, mostram que o conhecimento sobre o que torna a comida saborosa e prazeirosa para nós é extremamente importante na cozinha. A compreensão dos fatores que determinam o prazer de comer são de suma importância, pois fornecem uma base para desenvolvermos pratos saudáveis e nutritivos, e acima de tudo, saborosos. Estudos recentes realizados na Espanha, tem traçado relações na forma como relacionamos os aromas e as sensações, como mostrado na figura a seguir: O sentido do sabor Há evidencias crescentes de que as nossas preferências alimentares são influenciadas por variações individuais na percepção do gosto. Estas variações individuais podem ajudar a determinar as preferências dos sabores pessoais. Geralmente a língua pode distinguir entre o salgado, doce, azedo (ácido), amargo e umami. Os receptores gustativos podem conter um número de células de sabor, que estão localizados dentro das papilas, e detectam gosto na superfície da língua. 96 Acredita-se que as diferentes áreas da língua humana correspondam a gostos específicos, e que o gosto umami é detectado em toda a superfície. • Doce; • Salgado; • Amargo; • Á c i d o (azedo); • Umami. A ciência sensorial tem desempenhado um papel importante na promoção da nossa compreensão de percepção de sabor e na elaboração de pratos. Testes realizados na Universidade de Nottingham apontaram diferentes conclusões em decorrência de influências externas como a falta de sono, estresse, clima, estados emocionais, entre outros fatores, estão relacionadas com a maneira como interpretamos os sabores. Mesmo pessoas acostumadas com as cinco classes de sabor, podem ter diferentes percepções de um mesmo gosto, em dias diferentes. Para um chef, considerar esses fatores é extremamente importante no momento de desenvolver um novo prato ou até mesmo um cardápio completo. Técnicas e tendências Desde que os cozinheiros ocuparam um papel fundamental nas cozinhas dos castelos, chegando a exercer até cargos de confiança e com altos salários, a aplicação de novas técnicas sempre foi uma busca constante, seja para a melhoria de um prato, para criação de outros e atémesmo para a otimização das rotinas de trabalho. Hoje em dia, muitas dessas técnicas desenvolvidas ao longo dos tempos se tornam parte do que conhecemos como cozinha clássica e hoje servem de base para o desenvolvimento de novos conceitos. Porém, para muitos chefs, o espaço da cozinha já não é mais suficiente para suas criações, levando a gastronomia para patamares muito 97 além das cozinhas convencionais - laboratórios, indústrias, centro de pesquisas, universidades renomadas, entre outros. Aliar ciência e cozinha deixou de ser algo inimaginável. A introdução à pesquisa sobre novos equipamentos se faz presente nas preparações atuais. MÉTODOS CRIATIVOS Existem diferentes formas de se desenvolver métodos criativos na cozinha, porém a paixão pela inovação e criatividade são os principais elementos que mantém os chefs em evidência e a frente do seu tempo, independentemente do estilo de cozinha seguido. Isso porque a consequência deste trabalho se traduz em pratos, e é justamente isso que o comensal procura. Os irmãos Adrià, por exemplo, dividiam o seu método de criação em três conceitos que se baseavam em diferentes fatores: Métodos criativos I: • Cozinhas tradicionais e locais; • Influência de outras cozinhas; • Pesquisa por novos conceitos e técnicas; • Aplicação de conceitos e técnicas ao alimento; Métodos criativos II: 98 • Associação; • Inspiração; • Adaptação; • Desconstrução; • Minimalismo; • Mudança na estrutura e decomposição do menu; • Procura por novos ingredientes; Métodos criativos III: • As sensações como fator principal e ponto de partida; • Sexto sentido; • Simbiose entre os sabores doces e salgados; • Cozinha comercial aplicada a alta gastronomia; • Novas maneiras de servir o alimento; • Mudança na estrutura dos ingredientes. Estes fatores podem servir de inspiração para a criação de uma cozinha autoral, porém acima de tudo, é necessário que o chef conheça e domine as técnicas as quais irá trabalhar. COZINHAS SUSTENTÁVEIS É de extrema importância, que nós, enquanto Chefs, tenhamos a ideia clara de que nos tornamos referências quando tratamos do assunto “comida”. Nós possuímos o ingrediente, as ferramentas e a capacidade de buscar e selecionar a nossa matéria prima, buscando recursos que sejam sustentáveis e que possam garantir a existência das futuras gerações, que é uma das premissas da sustentabilidade. Conhecer a origem, os processos e as etapas que os ingredientes percorrem até chegar em nossas mãos, é parte da nossa responsabilidade socioambiental, e devemos levantar essa bandeira e promover ações de conscientização da população. Diversas iniciativas e movimentos ao redor do planeta têm colocado os chefs como líderes de movimentos e campanhas em prol da nossa existência. Dentre estes movimentos, destacamos alguns: 99 • Farm to table (da fazenda à mesa): Movimento que consiste em reduzir os intermediários entre o produtor e o consumidor, permitindo que os produtos cheguem à mesa do consumidor em um prazo reduzido e a custos enxutos, reduzindo os grandes trechos logísticos de deslocamento. • Food Mile (milhas alimentares): É uma forma de tentar medir a distância que os alimentos viajam antes de chegar ao consumidor com o intuito de analisar o impacto ambiental dos alimentos e seus ingredientes, já que além de incluir o deslocamento para receber o alimento, calcula também a distância até o destino final do lixo produzido (ORGANIC LINKER, 2011). • Locavorismo: Movimento que prioriza a produção de alimentos locais. Locavore é o termo que identifica as pessoas que se interessam por esse movimentos. Tanto o movimento Food Mile, quanto o Locavorismo são conceitos transversais às discussões sobre agricultura e consumo alimentar sustentáveis e processos decoloniais, e abordam a territorialidade dos hábitos alimentares e da gastronomia a partir da sua tendência ecossocial contemporânea que percebe a culinária local como estratégia de reforço da identidade cultural dos povos e como apoio à agricultura familiar. • Slow Food: Movimento que aborda um conjunto de princípios, que englobam movimentos voltados ao prazer da alimentação, e se estendem às correlações sociais e à lógica dos sistemas de produção alimentar contemporâneas e a sua sinergia com o meio ambiente. Defende a necessidade da informação ao consumidor, onde este faz parte da cadeia, tornando-se co-produtor. Permeia o compartilhamento de tradições, receitas, ingredientes e métodos, valorizando a biodiversidade, a sustentabilidade, o pequeno produtor e o prazer hedonista de se alimentar. • Ecogastronomia: Termo inserido dentro do movimento Slow Food, que relaciona as ações de produtores, restaurantes e relaciona a alimentação com a problemática social e ambiental, discutindo a ética da alimentação e alternativas possíveis ao atual sistema de organizações. A alimentação e o modelo de produção atual são atividades que envolvem uma longa cadeia de produção, que vai desde o campo até a mesa do consumidor final, passando por etapas que por vezes são desconsideradas, como a seleção de sementes, o plantio e a colheita, onde a natureza exerce papel fundamental para o sucesso até logística de distribuição. 100 Nas etapas produtivas, no campo, as interrelações com a sustentabilidade parecem claras. De fato, o próprio termo sustentabilidade foi cunhado com forte influência da atividade agrária. No entanto, as etapas posteriores, até que o alimento chegue a nossas mesas e, posteriormente, seu descarte envolvem questões complexas, que não são abarcadas por uma única área de conhecimento, e que possuem uma dinâmica cotidiana crescentemente artificial e acelerada. Nesse complexo trajeto, diversas interfaces caminham na contramão da sustentabilidade e é necessário que os processos sejam compreendidos e adaptados à realidade atual. A capacidade criativa aliada à gastronomia têm muito a oferecer a sociedade, e ainda há muito a ser explorado e alcançado. O respeito ao ingrediente, ao produto final e as suas origens, é fundamental para que tenhamos continuidade e disponibilidade de alimentos para a nossa geração e para as gerações futuras. O resultado de nossas atitudes como chefs são importantes não somente nos menus de restaurantes estrelados, mas também têm grande funcionalidade em nossas vidas e em nossa dieta diária, onde podemos cada vez mais, comermos de forma saudável aquilo que realmente gostamos, aliando o alimento ao prazer de comer. 101 Vegetarianismo Vegetarianismo é o regime alimentar que exclui todos os tipos de carnes. Porém evitar carne é somente uma parte do que constitui o vegetarianismo. Diferentes razões fazem com que as pessoas se tornem vegetarianas, dentre elas fatores relacionados a saudabilidade, religião, preocupação com o direito dos animais e ainda questões sustentáveis e ambientais. Além disso, quando analisamos esses fatores mais profundamente e também de uma forma global, ainda encontramos populações vegetarianas que seguem este tipo de dieta devido a escassez de carne. O acesso a produtos vegetarianos tem se tornado mais disponível e acessível ao longo dos últimos anos, devido ao crescente demanda por produtos de origem vegetal e por influência de culinárias e culturas que têm em suas dietas, uma base em alimentos vegetarianos e plantas. O Brasil conta com um considerável aumento de restaurantes vegetarianos nas grandes cidades, e hoje existem mais de 200 restaurantes vegetarianos em todo o Brasil (Guia de Restaurantes da Revista dos Vegetarianos, 2014) e a crescente oferta de produtos estritamente vegetarianos, os chamados veganos, é ainda mais expressiva compondo cardápios deinúmeros estabelecimentos não-vegetarianos, como lanchonetes, hamburguerias, pizzarias e restaurantes em geral. Nas grandes redes de varejo também é possível observar uma crescente expansão na linha de produtos sem carne e derivados. Segundo pesquisa do IBOPE, cerca de 8% dos brasileiros (mais de 15 milhões de pessoas) se declaram vegetarianos (IBOPE, 2012). Segundo a Associação de Franquias Sustentáveis, o mercado de alimentos saudáveis cresceu 80% ao ano entre 2004 e 2009. Em 2011 este mercado movimentou R$ 40 bilhões e até o final de 2015, deverá movimentar cerca de R$ 55 bilhões (fonte: ISTOÉ Dinheiro, 2012). Segundo o IPSOS, 28% da população brasileira quer reduzir o consumo de carne (fonte: PEGN, 2007) Tradicionalmente, a investigação sobre o vegetarianismo voltada principalmente para potenciais deficiências nutricionais, tem apontado benefícios a saúde, indo de encontro ao que se acreditava anteriormente. Hoje em dia, alimentação baseada em vegetais é reconhecida não apenas como nutricionalmente suficiente, mas também como uma maneira de reduzir o risco de muitas doenças crônicas. Em julho de 2009, a American Dietetic Association concluiu um estudo apontando que "dietas vegetarianas adequadamente planejadas, incluindo dietas veganas são 102 nutricionalmente saudáveis e podem proporcionar benefícios à saúde e também na prevenção e no tratamento de diversas doenças" (Jornal da Associação Americana de Dietética, Julho de 2009). É importante ressaltar que quando da criação de um menu vegetariano deve-se diferenciar uma dieta com embasamento técnico, de uma dieta a base de refrigerante, pizza de queijo, e doces, que tecnicamente poderia ser “vegetariana”, já que não há produtos de origem animal acrescidos ao menu, porém isso não tem nenhuma relação com o vegetarianismo. É preciso estudar os diferentes tipos de dietas vegetarianas, e aplicar as devidas necessidades à cada uma delas. O vegetarianismo costuma ser classificado da seguinte forma: • Ovolactovegetarianismo: utiliza ovos, leite e laticínios na sua alimentação. • Lactovegetarianismo: utiliza leite e laticínios na sua alimentação. • Ovovegetarianismo: utiliza ovos na sua alimentação. • Vegetarianismo estrito (veganismo): não utiliza nenhum produto de origem animal na sua alimentação. 103 Criando um menu Atingir as notas certas em termos de sabores para um único prato é uma tarefa bem diferente de harmonizar uma seqüência completa de pratos em uma refeição. Apesar de um menu apresentar-se como uma lista de pratos, o menu não é simplesmente um momento de inspiração de um indivíduo, mas expõem a personalidade do chef, seu ponto de vista e suas idéias, além de oferecer a oportunidade única de demonstrar a sua expressão artística. Um menu deve estimular e excitar o paladar, inclusive nas definições utilizadas na descrição das produções e design do cardápio. Os pratos devem resgatar memórias, estimular a curiosidade dos comensais, levá-los a uma viagem por regiões distintas e tornar-se uma experiência gastronômica agradável e prazerosa. Para tanto, um ambiente agradável, uma louça graciosa e decoração apropriada, além da música como estimulante dos sentidos ajudam a tornar a simples tarefa da alimentação em uma viagem multissensorial. Independentemente de valores e classificações sócio-econômicas, a arte de compor um menu ou preparar uma refeição equilibrada pode, e deveria sempre, transparecer inclusive nas refeições mais modestas e breves. Um piquenique ao ar livre em um parque é capaz de oferecer uma experiência gastronômica com a possibilidade de recompensar os cinco sentidos – uma boa comida, sons e paisagem relaxantes, além de uma companhia agradável, podem ser tão ou até mais reconfortante que um jantar em um restaurante de padrão superior. Uma experiência gastronômica deve, em contrapartida a simplesmente ordenar pratos, servir como uma experiência holística. O alimento, além de proporcionar energia ao nosso organismo, apresenta um quociente emocional que não deve ser esquecido por nenhum chef. Logicamente, a composição de um menu, além da inspiração dos chefs e cozinheiros, depende de certos parâmetros como sazonalidade, público, horários, entre outros mais. A sensibilidade e o conhecimento do chef, em adição a forma como o alimento é adquirido, armazenado, manipulado, preparado e servido permitirão a criação do menu. Dicas de empratamento Quando possível, trabalhar os 5 sentidos: visão, olfato, toque/tato, paladar e audição. 104 ELEMENTOS BÁSICOS As montagens e disposições dos pratos devem ser planejadas com antecedência, considerando-se a melhor disposição dos elementos e também a escolha dos utensílios. Procure fazer esboços (desenhos) utilizando lápis colorido e papel, pois isso ajuda a visualizar o aspecto final do prato. Utilize equilíbrio, unidade, ponto focal e fluxo (EUPF). As regras de apresentação EUPF foram desenvolvidas como um guia para os Chefs, permitindo que sejam desenvolvidas montagens agradáveis e atraentes. EQUILÍBRIO O equilíbrio na apresentação de uma preparação incorpora vários fatores, como sabores, condimentos e grupos de alimentos que complementam o alimento principal. Finalmente, o método de cozimento para a preparação do alimento deve ser escolhido levando em consideração que este elemento deve complementar a apresentação. Para entender melhor o que o equilíbrio se refere, os seguintes conceitos devem ser equilibrados: seleção de alimentos, combinação de cores, cor natural do alimento, métodos de cocção, forma, texturas, aromas e condimentos. UNIDADE Procure estabelecer uma unidade padrão na apresentação do prato, harmonizando tanto sabor, quanto a aparência. A idéia é apresentar os alimentos agrupados e dispostos em equilíbrio harmonioso no prato, oferecendo uma deliciosa combinação visual e gustativa. PONTO FOCAL O ponto focal é justamente o objeto que receberá o maior enfoque em sua montagem. O ponto focal varia de acordo com a proposta e os componentes do empratamento. É necessário buscar uma boa posição e relação entre os elementos presentes. Quando possível, utilizar a regra dos terços, explorando as Intersecções entre as linhas. Use a regra dos terços*. 105 FLUXO O fluxo é o resultado da soma dos conceitos anteriores (equilíbrio, unidade e ponto focal), gerando uma uma espécie de movimento em uma direção, com objetivo de apreciar sua totalidade ou direcionar a visão para um ponto específico. Quando a apresentação não está uniforme e bem distribuída, se torna impossível formar um caminho lógico para os olhos seguirem. Portanto, não há nenhum fluxo evidente. *A regra dos terços é uma teoria utilizada na hora de compor uma imagem. Se caracteriza em dividir uma imagem em duas linhas horizontais e duas linhas verticais, em que os 4 pontos de interseção dessas são os pontos onde os nossos olhos têm maior atenção. LINK (VÍDEO): https://www.youtube.com/watch?v=xL1oA2JMrRo&t=1s Prezado aluno, clique em legendas automáticas no símbolo contendo uma engrenagem, e em seguida, selecione o idioma português. Além da regra do EUPF, você ainda pode deixar o seu prato mais interessante trabalhando alguns conceitos: • Trabalhar com leve assimetria; • Distribuir os elementos em números ímpares; • Utilizar cores que se complementam; • Cor, métodos de cocção, forma, texturas e sabores; • Trabalhe diferentes alturas no prato; • Buscar pratos que permitam adicionar vários elementos; • Surpreender com novas propostas; • Utilizar louça que valorize a montagem; • Deixar espaços vazios no prato; • Criar um tema utilizando formas semelhantes; • Manter a apresentação simples e refinada; • Lembre-se,as vezes menos é mais, então cuidado com excessos. Alguns utensílios podem te auxiliar no processo de empratamento: • Colher de inox (funda e com bico, preferencialmente); • Espátula angular pequena de ponta redonda; • Bisnaga plástica com pontoa fina; 106 • Aro em tamanhos diversos; • Pinça de inox com ponta lisa ou estriada. LINK (VÍDEO): https://www.youtube.com/watch?v=wapdvQEpz98&t=38s Prezado aluno, clique em legendas automáticas no símbolo contendo uma engrenagem, e em seguida, selecione o idioma português. Futuros Chefs A capacidade criativa aliada à gastronomia têm muito a oferecer a sociedade, e ainda há muito a ser explorado e alcançado. O respeito ao ingrediente, ao produto final e às suas origens, é fundamental para que tenhamos continuidade e disponibilidade de alimentos para nós e para as gerações futuras. O resultado de nossas atitudes como Chefs são importantes não somente nos menus de restaurantes estrelados, mas também têm grande funcionalidade em nossas vidas e em nossa dieta diária, onde podemos cada vez mais, comermos de forma saudável aquilo que realmente gostamos, aliando o alimento ao prazer de comer. Desejo sorte e muito sabor em sua jornada! Um grande abraço, Patrick Ambrogi. 107 Referências: CARLUCCIO, Antonio. Cozinha Italiana Completa. São Paulo: Editora Globo, 2006. HAZAN, Marcella. Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica. São Paulo: Martins Fontes, 1997. Larousse Gastronomique. New Concise Larousse Gastronomique: The World's Greatest Cookery Encyclopedia. Revised edition, Londres, Hamlyn, 2007. 1440 p. MEDAGLIANI, Eugenio. STEMPELL, Ruprecht. PIRAS, Claudia. Culinária Itália – Especialidades Italianas. H.F. Ullmann, 2008 MONTANARI, Massimo (Org.). História da Alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 1998 ZAVAN, Laura. Larousse da Cozinha Italiana. São Paulo: Larousse do Brasil, 2006. CAUVIN, Véronique. A cozinha francesa [tradução Grenissa Bonvino Stafuzza], São Paulo, Larousse do Brasil, 2008. 128 p. FRANÇA JUNIOR, Saul Galvão De. A cozinha e seus vinhos. 3 ed. São Paulo: Senac, 2003. 415 p. Larousse Gastronomique. New Concise Larousse Gastronomique: The World's Greatest Cookery Encyclopedia. Revised edition, Londres, Hamlyn, 2007. 1440 p. OLIVER, Jamie. Jamie viaja [tradução Mário Leite Fernandes], São Paulo, Globo, 2011. 360 p. VARNOM, John. Cozinha francesa de bistro, Lisboa, Lisma, 2005. 128 p. 108 Material Complementar: • A Itália de Jamie (livro): OLIVER, Jamie. A Itália de Jamie. São Paulo: Editora Globo, 2007. 317 p. • Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica (livro): HAZAN, Marcella; KRETSCHMANN, Karin. Fundamentos da cozinha italiana clássica. São Paulo: Martins Fontes 2002. 698 p. • Escoffier: o rei dos chefs (livro): JAMES, Kenneth. Escoffier: o rei dos chefs. Sao Paulo: Senac, 2008. 471 p • Carême: cozinheiro dos reis (livro): KELLY, Ian. Carême: cozinheiro dos reis. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005. 271 p. ISBN 8571108722. • Itália - o País e Sua Cozinha (livro): PALMER, Stefan / PILS, Ingeborg. Cozinha Italiana Completa. São Paulo: Melhoramentos, 2013. • A Arte da Cozinha Italiana (livro): Academia Barilla. Culinária Itália – A Arte da Cozinha Italiana. São Paulo: Vergara & Riba, 2014. • BIRD, Brad (filme): Ratatouille, 2007 • Cozinha Italiana - FERREIRA, Roberto Carlos. Cozinha italiana. Franca, 2013. 16 p. Pós-Graduação - GASTRONOMIA (trabalho de conclusão de curso): http:// 201.85.23.88:8080/pergamumweb/vinculos/tcc/T141566.pdf • Chef's Table" Massimo Bottura - Temporada 1 - Episódio 1 (vídeo): https:// www.netflix.com/br/title/80007945 • Prosciutto di Parma (vídeo): https://youtu.be/K0o1dGXj7Ds • GOSTO, Portal. 9 massas em Roma para comer antes de morrer. Disponível em: <http://www.revistagosto.com.br/9-massas-em-roma-para-comer-antes-de-morrer/>. - • GOSTO, Portal. Queijo é o segredo para uma vida longa, indica estudo. Disponível em: <http://www.revistagosto.com.br/queijo-e-o-segredo-para-uma-vida-longa-indica- estudo/ • LANARI, Massimo. 10 cibi con i nomi più strani. 2016. 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