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Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 PARTE II 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais Muitas empresas dizem que valorizam seus funcionários, mas a OhioHealth literalmente estende o tapete vermelho para os seus. Após 20 anos de trabalho, e a cada cinco de- pois deles, os funcionários da maior empresa de saúde do estado de Ohio são levados a um shopping center local e aplaudidos pelos colegas enquanto atravessam um tapete vermelho em um centro de conferências. Alguns funcioná- rios adiam sua aposentadoria apenas para participar desse evento especial. Não é à toa que a OhioHealth é um dos me- lhores lugares para se trabalhar nos EUA e têm um índice de rotatividade de pessoal muito abaixo da média do setor. “Queremos trabalhadores engajados, felizes e bem remunerados”, diz David Blom, CEO da OhioHealth. “Essa recompensa e reconhecimento [o passeio de compras por tempo de serviço] mexe com as emoções e paixões das pessoas”. Além da retenção da equipe, a OhioHealth é igualmen- te bem-sucedida na atração de candidatos para ocupar vagas de enfermagem e outras profissões com escassez de mão de obra. Vários hospitais da OhioHealth são cre- denciadas pela Associação Americana de Enfermagem como organizações Magnet (imã). Os hospitais Magnet possuem ambientes de trabalho amigáveis e não hierár- quicos, centrados em serviços de alta qualidade e que dão autonomia, respeito e representação aos enfermeiros nas decisões. “Na enfermagem, temos governança comparti- lhada e muitas de nossas instalações têm a designação Magnet”, explica Paul Patton, vice-presidente sênior de recursos humanos da OhioHealth. “Usamos o processo de comunicação forte desenvolvido nessa atmosfera em nossa tomada de decisões”. A OhioHealth mantém níveis baixos de absenteísmo com um programa de incentivos que estimula os funcio- nários a se manterem saudáveis e comerem bem. Além disso, ela fortalece o desempenho dos funcionários com programas de treinamento de alta qualidade, estabeleci- mento de metas estruturado e bastante feedback. Uma iniciativa, a GOFAR (gotta own functional areas of res- ponsibility, ou “tem que assumir áreas funcionais de res- ponsabilidade”) encoraja os funcionários a “tomar a ini- ciativa, ser proativo nos relatórios, buscar resultados sem descanso, superar obstáculos e cumprir prazos”, afirma Pam Carlisle, diretora corporativa de serviços de acesso do paciente da OhiopHealth. Jane Berkebile, outra exe- cutiva da OhioHealth, acrescenta que “a mensagem mais forte e consistente que recebemos de nossa equipe é que os funcionários sabem exatamente o que devem fazer, quais são seus objetivos e qual o seu nível de desempe- nho em um determinado momento”. 1 A OhioHealth enfrentou bem a recessão econômica e prosperou quando o crescimento econômico deixou ou- tras empresas da área da saúde com muitas vagas não preenchidas. Sua estratégia foi ser o empregador preferi- do pelos candidatos, minimizar o absenteísmo e a rotativi- dade, encorajar comportamentos extrafuncionais e apoiar o alto desempenho. Este capítulo analisa essas formas de comportamento individual e também os fatores que in- fluenciam tais comportamentos. O capítulo começa com o modelo MARS, que des- creve os quatro fatores que influenciam diretamente o comportamento e os resultados individuais. A seguir, ele revisa os cinco tipos de comportamento individual que representam as variáveis dependentes do nível dos indi- víduos mais utilizadas nas pesquisas de comportamento organizacional. A segunda metade do capítulo analisa mais de perto duas das características mais estáveis dos indivíduos: personalidade e valores. A seção sobre per- sonalidade examina especificamente o desenvolvimento da personalidade, os traços de personalidade e a relação entre personalidade e comportamento em contextos orga- nizacionais. A última parte do capítulo enfoca os valores, incluindo os diversos tipos de valores pessoais, a relação entre valores e comportamento individual, a dinâmica da congruência de valores, os valores e as práticas éticas e os valores interculturais. A OhioHealth festeja o tempo de serviço dos funcionários. McSchane_02.indd 29McSchane_02.indd 29 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 30 PARTE II Comportamento Individual e Processos MODELO MARS DO COMPORTAMENTO E DO DESEMPENHO INDIVIDUAL Na maior parte do século passado, os especialistas investigaram os preditores diretos do com- portamento e do desempenho individual.2 Uma das primeiras fórmulas foi desempenho = pessoa × situação, onde pessoa inclui as características individuais e situação representa as influências externas sobre o comportamento do indivíduo. Outra fórmula bastante mencio- nada é desempenho = capacidade × motivação3. Conhecida ocasionalmente como modelo “habilidade e vontade”, a fórmula considera duas características específicas da pessoa que influenciam o desempenho individual. Capacidade, motivação e situação são disparadamente os preditores diretos do comportamento e desempenho individual mais mencionados, mas na década de 1960 os pesquisadores identificaram um quarto fator importante: as percepções da função desempenhada (as obrigações previstas para a função do indivíduo).4 A Figura 2.1 ilustra as quatro variáveis (motivação, capacidade, percepções do papel e fatores situacionais) que são representadas pelo acrônimo MARS.5 Os quatro elementos têm influência fundamental sobre o comportamento voluntário do indivíduo e seu desempenho; se qualquer um deles estiver baixo em uma determinada situação, o funcionário executará mal a tarefa. Por exemplo, vendedores motivados com percepções claras da sua função e re- cursos suficientes (fatores situacionais) não executarão bem suas tarefas se não possuírem habilidades de vendas e conhecimento relacionado (capacidade). Motivação, capacidade e percepção do papel estão agrupadas no modelo porque se situam na pessoa. Os fatores situa- OA1 Objetivos de aprendizagem Após estudar o Capítulo 2, você deve ser capaz de: OA1 Descrever os quatro fatores que influenciam dire- tamente o comportamento individual e o desem- penho. OA2 Resumir os cinco tipos de comportamento indivi- dual nas organizações. OA3 Descrever personalidade, os Big Five (cinco gran- des) traços de personalidade e os quatro tipos de MBTI e explicar a relação entre a personalidade e o comportamento individual nas organizações. OA4 Resumir o modelo dos valores individuais de Schwartz e discutir as condições sob as quais os valores influenciam o comportamento. OA5 Discutir três princípios éticos e discutir quatro fa- tores que influenciam o comportamento ético. OA6 Revisar os cinco valores mais estudados nas cul- turas e discutir a diversidade cultural nos Estados Unidos. Personalidade Características individuais Modelo MARS Valores Autoconceito Percepções Emoções e atitudes Estresse Motivação Capacidade Percepções de função Fatores situacionais Comportamento e resultados • Desempenho nas tarefas • Cidadania organizacional • Comportamentos de trabalho contraproducentes • Ingresso/permanência na organização • Manutenção da assiduidade FIGURA 2.1 Modelo MARS do comportamento e dos resultados individuais. McSchane_02.indd 30McSchane_02.indd 30 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 31 cionaissão externos ao indivíduo, mas ainda afetam o seu comportamento e desempenho.6 A seguir, analisamos cada um desses quatro fatores em mais detalhes. Motivação do funcionário A motivação representa as forças internas de uma pessoa que afetam a direção, a intensidade e a persistência do seu comportamento voluntário.8 Direção refere-se ao caminho em que as pessoas empreendem seus esforços; elas têm uma noção do que buscam e em que nível de qualidade, quantidade e assim por diante. Em outras palavras, a motivação é voltada para ob- jetivos, não é aleatória. As pessoas são motivadas a chegar ao trabalho no horário estipulado, a terminar um projeto algumas horas antes ou a visar a muitos outros objetivos. O segundo elemento da motivação, chamado intensidade, é a quantidade de esforço empregado no ob- jetivo. A intensidade reflete o quanto as pessoas incentivam a si próprias a completar uma tarefa. Por exemplo, dois funcionários estão motivados a concluir seu projeto algumas horas antes do prazo estipulado (direção), mas apenas um deles empreende um esforço suficiente (intensidade) para alcançar esse objetivo. Finalmente, a motivação envolve níveis variados de persistência, ou seja, a continuação do esforço durante certo tempo. Os funcionários mantêm seus esforços até atingirem o objetivo, ou desistem de antemão. Para lembrar desses três elementos da motivação, pense na metá- fora de dirigir um carro no qual a força do motor é seu esforço. A direção seria o local para onde você está dirigindo, a intensidade é quanto seu pé aperta o acelerador e a persistência é por quanto tempo você dirige até o destino final. Lembre-se que a motivação é uma força que existe dentro dos indivíduos, não seu comportamento real. Assim, direção, intensidade e persistência são condições cognitivas (pensamentos) e emocionais que são causas diretas de nossas ações. Capacidade As capacidades do funcionário fazem diferença no comportamento e no desempenho das tare- fas. Capacidade inclui tanto as aptidões naturais quanto as capacidades aprendidas necessárias para concluir uma tarefa com êxito. Aptidões são talentos naturais que ajudam os funcionários a aprenderem tarefas específicas com mais rapidez e desempenhá-las melhor. Existem muitas aptidões físicas e mentais, e a nossa capacidade para adquirir habilidades é afetada por tais aptidões. Por exemplo, a destreza dos dedos é uma aptidão pela qual os indivíduos aprendem mais rapidamente e têm um potencial de atingir um desempenho mais elevado na separação e manuseio de objetos pequenos com seus dedos. Os funcionários com alta destreza dos dedos a princípio não são necessariamente melhores do que os outros; em vez disso, sua aprendizagem tende a ser mais rápida e seu desempenho potencial tende a ser mais elevado. As capacidades aprendidas são as habilidades e o conhecimento que você possui atualmente, incluindo as ha- bilidades físicas e mentais, além do conhecimento que você adquiriu. As capacidades aprendi- das tendem a diminuir ao longo do tempo, se não são utilizadas. As atitudes e as capacidades aprendidas estão intimamente relacionadas às competên- cias, um termo que hoje é utilizado com frequência nos negócios. Competências são ca- racterísticas de uma pessoa que resultam em um desempenho superior.7 Tais característi- cas incluem conhecimento, habilidades, aptidões e comportamentos. Alguns especialistas estendem o significado do termo para incluir personalidade e valores, enquanto outros sugerem que as competências são resultados orientados para ações que envolvem tais ca- racterísticas, como atender clientes, lidar com cargas de trabalho pesadas e oferecer ideias criativas. Alguns estudos tentaram identificar uma lista das competências centrais para o desempenho em qualquer cargo ou profissão. Por exemplo, uma corrente de pesquisa identificou as competên- cias mais importantes em todas as situações profissio- nais, como liderar/decidir, apoiar/cooperar, criar/con- ceitualizar, adaptar/lidar e quatro outras.9 motivação Forças interiores de uma pes- soa que afetam a direção, a intensidade e a persistência do seu comportamento voluntário. capacidade As aptidões naturais e as ca- pacidades aprendidas neces- sárias para concluir uma tarefa com êxito. competências Habilidades, conhecimento, aptidões e outras característi- cas pessoais que levam a um desempenho superior. McSchane_02.indd 31McSchane_02.indd 31 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 32 PARTE II Comportamento Individual e Processos O desafio é combinar as competências de uma pessoa com os requisitos de competência do trabalho. Uma boa combinação pessoa–trabalho não só gera um desempenho superior, mas tam- bém tende a aumentar o bem-estar do funcionário. Uma maneira de combinar as competências de uma pessoa com as exigências da tarefa de trabalho é selecionar candidatos que demonstrem as competências necessárias. Por exemplo, as empresas pedem a candidatos que realizem parte do trabalho como amostra, que forneçam referências para confirmar o desempenho pregresso e que completem diversos testes de seleção. Uma segunda estratégia é oferecer treinamento, o que tem uma forte influência sobre o desempenho individual e a eficácia organizacional.10 A terceira estratégia de combinação pessoa–trabalho é reorganizar o trabalho de modo que os funcionários recebam apenas tarefas que refletem suas capacidades aprendidas atuais. Por exemplo, uma tare- fa complexa pode ser simplificada, com parte do trabalho transferido para terceiros, para que o novo funcionário realize apenas aquelas que já sabe fazer. À medida que o funcionário se torna mais competente nessas tarefas, outras são readicionadas à sua função. Percepções da função Motivação e capacidade são influências importantes sobre o comportamento e o desempenho do indivíduo, mas os funcionários também necessitam de boas percepções da função para desempenhar bem o seu trabalho. As percepções da função se referem à clareza com a qual as pessoas entendem os deveres de trabalho (funções) designados a elas ou esperados delas. Por exemplo, os funcionários da OhioHealth desempenham bem seus trabalhos em parte porque “eles sabem exatamente o que devem fazer”. Essas percepções são fundamentais, pois orientam a direção do esforço e melhoram a coordenação com colegas, fornecedores e outras partes interessadas. Funcionários com percepções mais claras da função que devem desem- penhar também tendem a ser mais motivados. Infelizmente, muitos funcionários não têm percepções claras da função. Uma pesquisa concluiu que apesar de 76% dos funcionários entenderem os objetivos de negócio da organiza- ção, apenas 39% afirmavam compreender como atingir tais objetivos em seu próprio trabalho. Da mesma forma, quando uma pesquisa global recente perguntou o que mais ajudaria a me- lhorar seu desempenho, os funcionários da maioria dos países identificaram “maior clareza so- bre o que a organização precisa de mim” como o primeiro ou segundo fator mais importante.12 A compreensão da função existe em três formas. Primeiro, os funcionários têm percep- ções claras quanto a suas funções quando compreendem as tarefas específicas designadas a eles, ou seja, quando sabem os deveres ou consequências específicos pelos quais são responsá- A Black Friday, dia seguinte ao Dia de Ação de Graças nos EUA, é o maior dia de compras do ano, en- tão a Best Buy realiza ensaios es- peciais para garantir que todos os funcionários tenham percepções absolutamente claras sobre suas funções. A foto mostra Aaron San- ford, supervisor de atendimento ao cliente, orquestrando um treino de Black Friday em uma loja Best Buy em Denver. Os eventos ajudam os funcionários a compreenderem seus deveres e responsabilidades específicas, a prioridade dessas tarefas e a maneira correta de realizá-las.11 McSchane_02.indd 32McSchane_02.indd 32 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 33 veis. Podeparecer óbvio, mas os funcionários ocasionalmente são avaliados com relação a de- veres que nunca souberam serem suas responsabilidades. Por exemplo, o sistema de metrô de Washington, DC, sofreu um descarrilamento grave alguns anos atrás porque o departamento de trilhos não lubrificou os trilhos. Uma investigação revelou que o departamento lubrifica- va os trilhos alguns anos antes, mas a atividade parou depois que os gerentes anteriores do departamento se aposentaram ou foram transferidos. Os novos gerentes não sabiam sobre os deveres de lubrificação de trilhos do departamento, então não informaram aos funcionários que tal atividade era parte do seu trabalho.13 A segunda forma de compreender a função se refere a quanto os funcionários entendem a prioridade de suas diversas tarefas e expectativas de desempenho. Um bom exemplo é o dile- ma clássico de priorizar quantidade versus qualidade, como quantos clientes são servidos em uma hora (quantidade) versus como o funcionário deve atender cada cliente (qualidade). Isso também se refere a alocar adequadamente o tempo e os recursos às várias tarefas, por exem- plo, quanto tempo um gestor deve despender treinando os funcionários em uma semana típi- ca versus tempo dedicado a fornecedores e clientes. A terceira forma de compreensão envolve entender os comportamentos prediletos ou procedimentos para realizar as tarefas designadas. Isso se refere a situações nas quais os funcionários possuem o conhecimento e as habilidades para realizar uma determinada tarefa de mais de uma maneira. Os funcionários com percep- ções claras da função sabem quais métodos são preferidos ou exigidos pela organização. Fatores situacionais O comportamento e o desempenho dos funcionários também dependem da situação.14 A situação se refere principalmente a condições que estão além do controle imediato do funcio- nário e que limitam ou facilitam seu comportamento e desempenho.15 Por exemplo, funcio- nários motivados e habilidosos que conhecem as obrigações de sua função ainda assim terão mau desempenho se não tiverem tempo, orçamento, instalações físicas e outras condições situacionais. Algumas limitações situacionais, como as preferências dos consumidores e as condições econômicas, se originam do ambiente externo e, por consequência, estão além do controle do funcionário e da organização. Além das restrições situacionais, os fatores situacionais também podem se referir aos si- nais de clareza e consistência fornecidos pelo ambiente para os funcionários quanto às obri- gações e oportunidades de suas funções.16 A importância da clareza e consistência situacio- nais também é ilustrada pelos acidentes de trabalho. Digamos que você é motivado, capaz e tem a obrigação clara de atuar de maneira segura em seu trabalho. Ainda assim, é provável que você sofra um acidente caso o ambiente de trabalho não comunique clara e consistente- mente a presença de um risco elétrico ou outro problema de segurança. Seu comportamento inseguro e sua probabilidade de sofrer um acidente são afetados pela situação, a saber, a falta de sinais e outros indicadores de risco de segurança, ou o posicionamento inconsistente des- ses avisos no local de trabalho. TIPOS DE COMPORTAMENTO INDIVIDUAL Os quatro elementos do modelo MARS (motivação, capacidade, percepções da função e fa- tores situacionais) afetam todos os comportamentos voluntários no local de trabalho e os resultados de desempenho. Os comportamentos individuais são multivariados, mas a maioria pode ser organizada nas cinco categorias descritas nas próximas páginas: o desempenho nas tarefas, a cidadania organizacional, os comportamentos profissionais contraproducentes, o ingresso e a permanência na organização e a assiduidade no trabalho (ver Figura 2.2). Desempenho nas tarefas Desempenho nas tarefas refere-se aos comportamentos do indivíduo que apoiam os objetivos organizacionais.17 Os comportamentos de desempenho nas tarefas transformam matérias- -primas em produtos e serviços ou apoiam e mantêm as atividades técnicas. Por exemplos, corretores de câmbio da BGC Partners, Inc., tomam decisões e realizam diversas tarefas para OA2 percepções da função Quanto uma pessoa com- preende exatamente as responsabilidades do trabalho (funções) que a ela são atribuí- das ou que dela se esperam. McSchane_02.indd 33McSchane_02.indd 33 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 34 PARTE II Comportamento Individual e Processos comprar e vender moeda estrangeira. A maioria dos trabalhos é composta de diversas tarefas. Por exemplo, os corretores de câmbio da BGC precisam ser capazes de identificar oportuni- dades lucrativas rapidamente, analisar dados econômicos, controlar e completar informações de contas, auxiliar no treinamento de novos membros e usar software e equipamentos espe- cializados sem cometer erros. Em termos mais gerais, as tarefas podem envolver o trabalho com dados, pessoas ou objetos, sozinho ou com terceiros, e diversos graus de influência sobre outras pessoas.18 Cidadania organizacional Poucas empresas sobreviveriam se os funcionários cumprissem apenas seus deveres formais. Eles precisam se envolver em comportamentos de cidadania organizacional (CDOs), ou seja, diversas formas de cooperação e prestimosidade com as outras pessoas que apoiam o contexto social e psicológico da organização.19 Em outras palavras, as empresas prosperam quando seus funcionários se esforçam além dos deveres exigidos. Os comportamentos de cidadania organizacional assumem várias formas. Alguns são voltados para os indivíduos, como ajudar os colegas em seus problemas de trabalho, ajustar a sua agenda para acomodá- -los, demonstrar cortesia genuína em relação a eles e compartilhar seus recursos de trabalho (suprimentos, tecnologia, pessoal). Outros CDOs representam cooperação e prestimosidade em relação à organização em geral, como apoiar a imagem pública da empresa, tomar medi- das discricionárias para ajudar a organização a evitar problemas em potencial, oferecer ideias além das exigidas para a sua própria função, executar funções voluntárias que apoiem a orga- nização e manter-se a par dos novos desenvolvimentos internos.20 Comportamentos de trabalho contraproducentes O comportamento organizacional está interessado em todos os comportamentos no local de tra- balho, incluindo as atividades disfuncionais conhecidas coletivamente como comportamentos de trabalho contraproducentes (CTCs). Esses comportamentos voluntários têm o potencial de prejudicar direta ou indiretamente a organização.22 Alguns dos muitos tipos de CTCs incluem assediar colegas, criar conflitos desnecessários, desviar dos métodos de trabalho preferenciais (ex.: atalhos que colocam a qualidade em risco), ser desonesto, roubar, sabotar o trabalho, evitar obrigações (atrasos) e desperdiçar recursos. Os CTCs não são preocupações menores: as pesqui- sas sugerem que eles podem prejudicar significativamente a eficácia da organização. Tipos deTipos de comportamentocomportamento individualindividual Tipos de comportamento individual Desempenho nas tarefas Ingresso/ permanência na organização C id ad an ia or ga ni za ci on al C om portam ento contraproducente Ma nu ten çã o da as sid uid ad e FIGURA 2.2 Cinco tipos de comportamento individual no local de trabalho. McSchane_02.indd 34McSchane_02.indd 34 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 35 Ingresso e permanência na organização O desempenho nas tarefas, a cidadania organizacional e a ausência de comportamentos de trabalho contraproducentes obviamente são importantes; mas, se pessoas qualificadas não ingressarem e permanecerem na organização, nenhum desses comportamentos associados ao desempenho ocorrerá. Pense na escassez de enfermeiros. Apesar da recessão dos últimos anos ter aliviado temporariamente o problema, a tendência de longo prazo é que o núme- ro de vagas de enfermagem seja muito maior do que o número de enfermeirosdisponíveis. Os Estados Unidos e outros países já tiveram diversos casos de leitos eliminados e serviços hospitalares que se deterioraram devido à falta de enfermeiros.23 A OhioHealth reduziu pro- ativamente esse risco. Como descreve a história que abre este capítulo, a empresa de saúde se tornou o empregador preferencial com a conquista da designação Magnet da associação de enfermagem e sua avaliação como um dos melhores lugares para se trabalhar nos EUA. Mesmo quando as empresas conseguem contratar profissionais qualificados em momen- tos de escassez, elas precisam garantir que esses funcionários permanecerão na organização. As empresas com altos índices de rotatividade sofrem devido ao custo significativo de subs- tituir os ex-funcionários. Mais importante ainda, como mencionamos no capítulo anterior, é que boa parte do capital intelectual da organização é composto pelo conhecimento que fica guardado nas mentes dos funcionários. Quando as pessoas vão embora, parte desse co- nhecimento vital é perdida, resultando frequentemente em menor produtividade, piora no atendimento ao cliente, e assim por diante. Alguns empregadores atraem candidatos e mini- mizam a rotatividade com um ambiente de trabalho prazeroso. Por exemplo, a cena de aber- tura descreveu como a OhioHealth homenageia funcionários com bastante tempo de serviço e cria um ambiente de alto envolvimento no qual a equipe é consultada regularmente sobre questões organizacionais. Manutenção da assiduidade no trabalho Além da atração e retenção dos funcionários, as organizações precisam que todos compareçam ao trabalho nos horários agendados. Os funcionários americanos perdem cinco dias de trabalho regular por ano, um número menor do que na maioria dos outros países. Por exemplo, um estudo concluiu que mais de 25% dos professores do ensino médio e funda- mental da Índia, Uganda e Indonésia não comparecem no comportamentos de cidadania organizacional (CDOs) Diversas formas de cooperação e prestimosidade com as outras pessoas que apoiam o contexto social e psicológico da organi- zação. comportamentos de trabalho contraproducentes (CTCs) Comportamentos voluntários que têm o potencial de preju- dicar direta ou indiretamente a organização. Um carregamento importante de materiais chegou na alfândega para a Procter & Gamble (P&G) in- diana, mas o governo fechou todos os seus escritórios (incluindo a al- fândega) devido a chuvas pesadas. Um engenheiro da fábrica da P&G enfrentou a chuva e conseguiu transportar um agente alfandegário até o escritório para que pudesse completar os documentos de liberação. A seguir, o engenheiro fez com que os materiais fossem entregues na fábrica no mesmo dia. O engenheiro da P&G indiana realizou comportamentos de cida- dania organizacional (e encorajou comportamentos semelhantes por parte do agente alfandegário), o que manteve as linhas de produção em funcionamento.21 McSchane_02.indd 35McSchane_02.indd 35 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 36 PARTE II Comportamento Individual e Processos local de trabalho todos os dias. O relatório alerta que esse nível crônico de absenteísmo prejudi- ca a qualidade da educação a ponto de ameaçar o desenvolvimento econômico desses países.24 A maioria dos funcionários culpa algumas situações por seu absenteísmo, como mau tempo, greve de ônibus ou obrigações familiares (ex.: crianças ou pais doentes). Entretanto, algumas pessoas comparecem no trabalho sob essas condições pois sua motivação para trabalhar é forte, enquanto outras se ausentam mesmo quando o problema não é tão grave. Os funcionários insa- tisfeitos com o trabalho ou sofrendo com estresse têm maior probabilidade de se ausentarem ou chegarem atrasados, pois esse tempo de folga é uma maneira de se afastarem temporariamente de condições estressantes ou insatisfatórias. O absenteísmo é maior nas organizações com licen- ças médicas generosas, pois esse benefício limita o impacto financeiro negativo de se afastar do trabalho. Os valores e a personalidade são outro fator que afeta o absenteísmo.25 Finalmente, os estudos afirmam que o absenteísmo também é mais forte em equipes com normas de ausência fortes, ou seja, em que os membros toleram e até esperam que os colegas tirem folgas.26 Presenteísmo Além de comparecerem no trabalho nos momentos esperados, a manuten- ção da assiduidade no trabalho exige que os funcionários se ausentem quando sua presença seria disfuncional para eles e para a organização. Na verdade, especialistas em CO alertam que o presenteísmo, ou seja, a assiduidade quando a capacidade de trabalhar é prejudicada significativamente por doença, fadiga, problemas pessoais ou outros fatores, pode ser mais grave do que a ausência de quem está em condições de trabalhar.27 Os funcionários que com- parecem no local de trabalho quando estão doentes ou incapazes podem piorar sua própria condição e aumentar os riscos de saúde de seus colegas. Esses funcionários também são me- nos produtivos e podem prejudicar a produtividade dos colegas. O presenteísmo é mais comum entre funcionários com baixa estabilidade no emprego (como os temporários e os recém-contratados), que não recebem licenças médicas ou outras margens de segurança financeira, e cuja ausência afetaria imediatamente muitas outras pes- soas (ou seja, alta centralidade). As normas da empresa ou da equipe sobre absenteísmo tam- bém impactam o presenteísmo. A personalidade é outro fator importante: algumas pessoas possuem traços que as motivam a comparecer enquanto outras se contentam em se recuperar em casa. A personalidade é um preditor bastante citado da maioria das formas de comporta- mento individual. Ela também é a característica pessoal mais estável, então é o próximo tema a ser trabalhado. PERSONALIDADE NAS ORGANIZAÇÕES Ao se candidatar para diversas vagas em editoras, Christina ficou surpresa em descobrir que três delas exigiam que completasse um teste de personalidade. “Uma página tem uma lista de características, como sentimental, aventureira, atraente, convincente e prestativa, e você marca aquelas que melhor descrevem o que os outros esperam de você”, Christina conta sobre o teste. “A segunda página mostra a mesma lista, mas você marca as palavras que descrevem você de verdade”. Christina não ouviu de volta da primeira empresa após completar seu teste de per- sonalidade, então para a segunda ela completou o teste “de acordo com uma personalidade de vendas”, pois a vaga era no setor de vendas. Ao fazer o teste de personalidade para a terceira empresa, ela respondeu as perguntas da maneira que imaginou que alguém faria se fosse “uma boa pessoa, mas honesta”. Nenhuma das candidaturas resultou em uma oferta de emprega, dei- xando Christina na dúvida sobre o perfil que as empresas buscavam entre os candidatos e se sua estratégia de adivinhar a melhor resposta nesses testes seria mesmo uma boa ideia.28 A personalidade é uma característica individual importante, o que explica por que diver- sas empresas tentam estimar os traços de personalidade dos candidatos e funcionários. Quase todo mundo pensa sobre personalidade todos os dias quando interage. Usamos esses traços (falante, orientado para riscos, pensativo, etc.) para simplificar nossas percepções sobre os outros e prever seu comportamento futuro. A personalidade é um padrão relativamente du- radouro de pensamentos, emoções e comportamentos que caracteriza uma pessoa, além dos processos psicológicos subjacentes a tais características.29 Basicamente, a personalidade é o conjunto de características que nos torna semelhantes ou diferentes dos outros. Nós estima- mos a personalidade dos indivíduos pelo que dizem ou fazem e fazemos inferências sobre os OA3 McSchane_02.indd 36McSchane_02.indd 36 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 37 estados internos de indivíduos, deduzindo pensamentos e emoções, a partir desses compor- tamentos observáveis. Uma premissabásica da teoria da personalidade é que as pessoas possuem características ou traços inerentes que podem ser identificados pela coerência ou estabilidade do seu com- portamento ao longo do tempo e de acordo com as situações.30 Por exemplo, provavelmente você tem amigos que são mais comunicativos do que outros. Você pode conhecer pessoas que gostam de assumir riscos e outras que são mais avessas a eles. Essa tendência comportamental é uma característica fundamental da teoria da personalidade, pois atribui o comportamento de uma pessoa a algo dentro dela, sua personalidade, e não a influências puramente ambientais. Certamente, as pessoas não agem da mesma maneira em todas as situações; na prática, esse pensamento seria considerado anormal, pois indicaria uma insensibilidade às normas sociais, sistemas de recompensa e outras condições externas.31 As pessoas variam seu com- portamento para se adequarem à situação, mesmo que determinado comportamento esteja em desacordo com a sua personalidade. Por exemplo, as pessoas falantes ficam relativamente quietas em uma biblioteca onde as regras de silêncio são explícitas e estritas. Entretanto, as di- ferenças de personalidade ainda se manifestam nessas situações, pois pessoas falantes tendem a conversar mais nas bibliotecas se comparados com outros tipos de pessoas. Tradicionalmente, as pessoas exibem uma ampla gama de comportamentos, ainda que den- tro dessa variedade existam padrões discerníveis que chamamos de traços de personalidade. Os traços são conceitos amplos que nos permitem rotular e compreender as diferenças individuais. Além disso, os traços predizem o comportamento de um indivíduo no futuro distante. Por exemplo, estudos afirmam que a personalidade de um indivíduo na infância prediz vários com- portamentos e resultados na vida adulta, incluindo o nível de escolaridade, o sucesso profissio- nal, o estado civil, as atividades ilegais e os comportamentos que colocam a saúde em risco.32 Determinantes da personalidade: natureza versus educação O que determina a personalidade de um indivíduo? A maioria dos especialistas concorda que a personalidade é moldada tanto pela natureza quanto pela educação, embora a impor- tância relativa de cada uma continue a ser debatida e estudada. A natureza refere-se às nossas origens genéticas ou hereditárias, ou seja, aos genes que herdamos dos nossos pais. Estudos de gêmeos idênticos, particularmente os que foram separados ao nascer, revelam que a he- reditariedade surte um grande efeito sobre a personalidade; até 50% da variação no compor- tamento e 30% das preferências do temperamento podem ser atribuídos às características genéticas.33 Em outras palavras, o código genético não só determina a cor dos nossos olhos, o tom da nossa pele e o nosso formato físico, como afeta de maneira significativa as nossas atitudes, decisões e comportamentos. Algumas semelhanças entre gêmeos criados em famílias diferentes são surreais. Pense no exemplo de Jim Springer e Jim Lewis, separados quando tinham apenas quatro semanas de vida e que não se reencontraram até os 39 anos de idade. Apesar de terem crescido em famílias e comunidades diferentes em Ohio, os “gêmeos Jim” tinham empregos semelhantes, fumavam o mesmo tipo de cigarro, dirigiam um carro com a mesma marca e cor, passavam as férias na mesma praia da Flórida, tinham o mesmo hobby de marcenaria, deram aos seus primeiros filhos nomes quase idênticos e tinham se casado duas vezes. A primeira e a segun- da esposas de ambos tinham o mesmo primeiro nome!34 Embora a personalidade seja fortemente influenciada pela hereditariedade, também é afe- tada pela educação, ou seja, a socialização da pessoa, as experiências de vida e outras formas de interação com o ambiente. O desenvolvimento e a mudança da personalidade ocorrem principalmente até o início da vida adulta; a personalidade se estabiliza quando o indivíduos chega aos 30 anos, ainda que algumas mudanças continuem até os 50.35 A principal explicação para a estabilização da persona- lidade com o tempo é que, à medida que envelhecemos, nós formamos um autoconceito mais claro e rígido.36 Essa maior clareza sobre “quem somos” funciona como âncora para nosso comportamento, pois a função executiva (a parte do cérebro que gerencia os comportamentos direcionados para presenteísmo Comparecer no trabalho em mo- mentos programados ou agen- dados quando a capacidade de desempenho é afetada por doença ou outros fatores. personalidade Padrão relativamente duradou- ro de pensamentos, emoções e comportamentos que carac- terizam uma pessoa, além dos processos psicológicos subja- centes a essas características. McSchane_02.indd 37McSchane_02.indd 37 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 38 PARTE II Comportamento Individual e Processos metas) tenta manter nosso comportamento condizente com nosso autoconceito. Como o auto- conceito se torna mais claro e estável com a idade, nosso comportamento e personalidade por consequência se tornam mais estáveis e consistentes. O autoconceito será analisado em mais detalhes no próximo capítulo. Por ora, nossa tese é que a personalidade não é determinada totalmente pela hereditariedade; as experiências de vida, especialmente nos primeiros anos, também moldam os traços de personalidade de cada indivíduo. Modelo dos cinco fatores da personalidade Uma das ideias mais importantes da teoria da personalidade é que os indivíduos possuem traços de personalidade específicos. Traços como sociável, deprimido, cauteloso e falante re- presentam grupos de ideias, sentimentos e comportamentos que nos permitem identificar, diferenciar e entender os outros.37 Os pesquisadores descreveram centenas de traços de per- sonalidade com o passar dos anos, de modo que os especialistas no tema tentaram organizá- -los em agrupamentos menores. O conjunto mais respeitado de traços de personalidade é o modelo dos cinco fatores (FFM), grupo de dimensões da personalidade também conhecido como Big Five (cinco grandes). Décadas atrás, especialistas em personalidade identificaram mais de 17 mil palavras que descrevem a personalidade de um indivíduo. Essas palavras fo- ram destiladas e resumidas em cinco dimensões de personalidade abstratas. Estudos em idio- mas diferentes produziram resultados semelhantes, sugerindo que o modelo dos cinco fatores é robusto interculturalmente.38 Essas cinco grandes dimensões, representadas em inglês pelo acrônimo CANOE, (Conscientiousness, Agreeableness, Neuroticism, Openness to experience e Extraversion) estão descritas na Figura 2.3 e nos parágrafos a seguir: • Escrupulosidade. A escrupulosidade caracteriza indivíduos organizados, confiáveis, focados em metas, detalhistas, disciplinados, metódicos e esforçados. As pessoas com baixa escrupulosidade tendem a ser negligentes, menos detalhistas, desorganizadas e irresponsáveis. • Sociabilidade. A dimensão inclui os traços de ser confiante, prestativo, simpático, aten- cioso, tolerante, altruísta, generoso e flexível. Alguns estudiosos preferem o rótulo “con- formidade amigável” para esta dimensão, com o seu oposto sendo “não conformidade hostil”. As pessoas com baixa sociabilidade tendem a ser pouco cooperativas e intole- rantes com as necessidades alheias, além de mais desconfiadas e autocentradas. • Neuroticismo. O neuroticismo caracteriza pessoas que tendem a ser ansiosas, insegu- ras, inibidas, deprimidas e temperamentais. As pessoas com baixo neuroticismo (alta estabilidade emocional), por outro lado, são equilibradas, seguras, positivas e calmas. • Abertura para a experiência. A dimensão é a mais complexa e a que tem o menor consenso entre os estudiosos. Geralmente, refere-se a quanto as pessoas são imaginativas, criativas, Dimensão da personalidade Indivíduos com pontuação elevada nesta dimensão tendem a ser mais: Escrupulosidade Organizados, confiáveis, focados em metas, detalhistas, disciplinados, metódicos, esforçados Confiantes, prestativos, simpáticos, atenciosos, tolerantes,altruístas, generosos, flexíveis Ansiosos, inseguros, inibidos, deprimidos, temperamentais Imaginativos, criativos, pouco convencionais, curiosos, não conformistas, autônomos, perceptivos Expansivos, falantes, enérgicos, sociáveis, assertivos Sociabilidade Neuroticismo Abertura para a experiência Extroversão FIGURA 2.3 Dimensões da personalidade no modelo dos cinco fatores. McSchane_02.indd 38McSchane_02.indd 38 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 39 pouco convencionais, curiosas, não conformistas, autônomas e esteticamente sensíveis. As pessoas com baixa pontuação nesta dimensão tendem a ser mais resistentes à mudança, menos abertas a novas ideias e mais convencionais e rígidas em suas preferências. • Extroversão. A extroversão caracteriza indivíduos expansivos, falantes, enérgicos, soci- áveis e assertivos. Seu oposto é a introversão, que caracteriza indivíduos quietos, caute- losos e menos interativos. Os extrovertidos captam energia do mundo externo (pessoas ou coisas à sua volta), enquanto os introvertidos captam energia do mundo interno, como a reflexão pessoal sobre conceitos e ideias. Os introvertidos não carecem necessa- riamente de habilidades sociais. Em vez disso, eles preferem direcionar seus interesses para ideias do que para eventos sociais. Os introvertidos sentem-se bastante confortá- veis ficando sozinhos, ao contrário dos extrovertidos. Dimensões de personalidade Big Five e comportamento no local de trabalho As dimensões de personalidade no modelo dos cinco fatores influenciam de diversas formas a motivação dos funcionários e a clareza com que eles percebem suas funções.39 Alguns espe- cialistas sugerem que as características de sociabilidade, escrupulosidade e estabilidade emo- cional (baixo neuroticismo) se aglutinam em torno da característica geral de “dar-se bem com os outros”. Indivíduos com alta sociabilidade são mais sensíveis aos outros (mais atenciosos e altruístas), os com alta escrupulosidade são mais confiáveis e os mais emocionalmente está- veis são mais animados. Alguns autores sugerem que a extroversão também está relacionada com a ideia de dar-se bem com os outros, pois os extrovertidos são mais sociáveis. Abertura para a experiência, extroversão, escrupulosidade e estabilidade emocional se aglutinam em torno da característica geral de “avançar na vida”. Aqueles com alta abertura para a experiên- cia estão mais dispostos a experimentar novas ideias, os extrovertidos são mais assertivos, os com alta escrupulosidade são mais orientados para objetivos e os emocionalmente estáveis têm mais confiança em sua capacidade de ter um bom desempenho. Os traços de personalidade refletem as tendências de comportamento de um indivíduo, tornando-as bons preditores de diversos comportamentos e resultados no local de trabalho, mesmo após controlarmos a capacidade do funcionário e outros fatores. Os traços de perso- nalidade se manifestam até no conteúdo de nossos perfis no Facebook e em outras informa- ções que fornecemos a sites. A escrupulosidade e a estabilidade emocional (baixo neuroti- cismo) destacam-se como os traços de personalidade que preveem um melhor desempenho individual em quase todos os grupos de trabalho.40 Ambos são componentes motivacionais da personalidade, pois criam uma disposição voltada ao cumprimento das obrigações pro- fissionais dentro das regras estabelecidas (escrupulosidade) e para alocar recursos para rea- lizar essas tarefas (estabilidade emocional). Diversos estudos mostraram que os funcionários escrupulosos estabelecem objetivos pessoais maiores para si mesmos, são mais motivados e têm expectativas de desempenho mais altas do que os funcionários com níveis baixos de escrupulosidade. Eles também tendem a ter níveis mais elevados de cidadania organizacional e trabalham melhor nas organizações que concedem aos funcionários mais liberdade do que a encontrada nos locais de trabalho tradicionais de comando e controle.41 As outras três dimensões da personalidade preveem tipos mais específicos de comporta- mento e desempenho do funcionário.43 A extroversão está associada ao desempenho nos tra- balhos de vendas e gestão, nos quais os funcionários têm de interagir com pessoas e influen- ciá-las. A sociabilidade está associada ao desempenho nos trabalhos nos quais se espera que os funcionários sejam cooperativos e úteis, como trabalhos em equipes, relações com clientes e outras situações de resolução de conflitos. As pessoas com uma dimensão de personalidade de grande abertura para a experiência tendem a ser mais criativas e adaptáveis a mudanças. modelo dos cinco fatores (FFM) Cinco dimensões abstratas que representam a maioria dos tra- ços de personalidade: escrupu- losidade, estabilidade emocio- nal, abertura para a experiência, sociabilidade e extroversão. escrupulosidade Dimensão da personalidade que descreve as pessoas que são prudentes, confiáveis e autodis- ciplinadas. neuroticismo Dimensão da personalidade que descreve as pessoas com altos níveis de ansiedade, hostilidade, depressão e inibição. extroversão Dimensão da personalidade que descreve as pessoas expansi- vas, comunicativas, sociáveis e afirmativas. McSchane_02.indd 39McSchane_02.indd 39 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 40 PARTE II Comportamento Individual e Processos Finalmente, a personalidade influencia o bem-estar do funcionário de várias maneiras.44 Em geral, ela influencia as reações emocionais típicas de um indivíduo ao trabalho, como ele en- frenta o estresse e qual carreira o tornaria mais feliz. Teoria junguiana da personalidade e indicador tipológico de Myers-Briggs O modelo dos cinco fatores da personalidade é o mais respeitado e apoiado na pesquisa, mas não é o mais popular na prática. Essa distinção vai para a teoria junguiana da persona- lidade, que é medida pelo indicador tipológico de Myers-Briggs (MBTI, Myers-Briggs Type Indicator) (ver Figura 2.3). Quase um século atrás, o psiquiatra suíço Carl Jung propôs que a personalidade é representada principalmente pelas preferências do indivíduo pertinentes à percepção e ao julgamento das informações.45 Jung explicou que a percepção, que envolve o modo como as pessoas preferem reunir informações ou perceber o mundo ao seu redor, ocorre por meio de duas orientações concorrentes: sensação (S) e intuição (N). A sensação en- volve a percepção da informação diretamente por meio dos cinco sentidos, baseando-se em uma estrutura organizada para adquirir detalhes factuais e preferencialmente quantitativos. A intuição, contudo, está fundamentada mais na perspicácia e na experiência subjetiva. Os tipos sensoriais se concentram no aqui e agora, enquanto os tipos intuitivos, nas possibilida- des futuras. Jung também propôs que o julgamento, ou seja, o modo como as pessoas processam as informações ou tomam decisões com base no que percebem, consiste em dois processos con- correntes: razão (T) e sentimento (F). As pessoas com uma orientação para a razão se baseiam na lógica racional de causa e efeito e na coleta sistemática de dados para tomar decisões. As pessoas com uma forte orientação para o sentimento, por outro lado, baseiam-se em suas respostas emocionais para as opções apresentadas, bem como na forma que essas escolhas afetam as outras pessoas. Jung observou que além de diferir nos quatro processos principais de sensação, intuição, razão e sentimento, os indivíduos também são diferentes quanto a seus graus de extroversão/introversão, introduzido anteriormente como um dos cinco grandes traços de personalidade ou Big Five. Além da medição dos traços de personalidade identificados por Jung, o MBTI mede as categorias junguianas mais amplas da percepção e do julgamento, que representam a atitude de uma pessoa em relação ao mundo exterior. As pessoas com uma orientação para a per- cepção são abertas, curiosas e flexíveis; preferem se adaptar espontaneamente aos eventos à medida que elesse desdobram; e preferem manter suas opções em aberto. Os tipos julgadores preferem ordem e estrutura e querem resolver os problemas rapidamente. As empresas gastam trilhões de dólares com testes de personalida- de, mas estudos recentes mostram que os candidatos já revelam seus traços de personalidade no conteúdo de suas páginas no Face- book, blogs e outros sites pessoais. O simples ato de ter um blog ou participar de redes sociais on-line pode indicar traços de persona- lidade específicos. Extroversão, abertura para a experiência e sociabilidade costumam ser os traços mais fáceis de estimar a partir do conteúdo de fontes on- -line, enquanto o neuroticismo é o mais difícil.42 McSchane_02.indd 40McSchane_02.indd 40 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 41 O MBTI é um dos testes de personalidade mais utilizados nos ambientes de trabalho, no aconselhamento de carreira e no treinamento de executivos.47 Ainda assim, o apoio dado ao MBTI e ao modelo dos tipos psicológicos de Jung tem sido problemático.48 Por um lado, o MBTI parece melhorar a autoconsciência em termos de desenvolvimento de carreira e com- preensão mútua, além de representar razoavelmente os tipos psicológicos junguianos. Por outro, o MBTI não é bom para prever o desempenho profissional, geralmente não sendo recomendado para a seleção de funcionários ou para as decisões pertinentes à promoção. Por exemplo, apesar de um estudo informar que os tipos intuitivos são mais comuns na alta gerência do que na baixa, outras pesquisas não encontraram relação entre tipos MBTI e lide- rança eficaz. Um estudo recente de larga escala também informou que os resultados de MBTI de membros de equipe não preveem o êxito do desenvolvimento da equipe. Finalmente, o MBTI é redundante com quatro das cinco dimensões do modelo de personalidade dos cinco fatores, mas não mensura as quatro tão bem quanto as escalas Big Five existentes.49 Teste de personalidade nas organizações A personalidade se tornou um tema controverso no campo do comportamento organizacional e recebe bastante atenção no ambiente de trabalho. Em geral, os testes são aplicados para fins de desenvolvimento de pessoal, como planos de carreira e dinâmicas de equipe. Por exemplo, muitos funcionários da Southwest Airlines colocam seus resultados do indicador tipológico de Myers-Briggs (MBTI) em seus escritórios. “É só dar uma passada e você encontra as quatro letras [tipo MBTI] da pessoa penduradas no cubículo”, diz o diretor de desenvolvimento de liderança da Southwest. A companhia aérea começou a usar o MBTI na década passada, com a ideia de ajudar a equipe a compreender e respeitar as diferentes personalidades e estilos de raciocínio dos colegas. “Comportamentos que antes poderiam ter causado mal-entendidos e frustração hoje são vistos por um prisma diferente”, sugere o gerente da Southwest Airlines.50 Como Christina descobriu enquanto procurava um emprego no mercado editorial (ver a história que abre esta seção), os testes de personalidade também estão sendo incorporados ao processo de decisão de seleção e promoção. Quando a Amtrak venceu o contrato para operar o serviço de passageiros Metrolink no sul da Califórnia, por exemplo, a empresa pediu que os engenheiros ferroviários e condutores da empresa anterior completassem um teste de perso- • Comunicativo • Foco externo • Assertivo Obtenção de energia Percepção da informação Tomada de decisão Orientação para o mundo exterior Extroversão (E) • Concreto • Realista • Prático Sensorial (S) • Lógico • Objetivo • Impessoal Racionalista (T) • Organizado • Orientado para cronogramas • Focado em fechamento Julgador (J) • Quieto • Foco interno • Abstrato Introversão (I) • Imaginativo • Focado no futuro • Abstrato Intuitivo (N) • Empático • Solidário • Foco na emoção Sentimental (F) • Espontâneo • Adaptável • Focado em oportunidades Perceptivo (P) FIGURA 2.4 Tipos junguianos e indicadores tipológicos de Myers-Briggs.46 Fonte: Modificado e reproduzido com permissão especial de Publisher, CPP, Inc., Mountain View, CA 994043 from Introduction to Type and Careers by Allen L. Hammer. Copyright 1993 by CPP, Inc. Todos os direitos reser- vados. Reprodução subsequente proibida sem consentimento por escrito de Publisher. Indicador Tipológico de Myers–Briggs (MBTI) Instrumento concebido para medir os elementos da teoria junguiana da personalidade, particularmente as prefe- rências que dizem respeito a perceber e julgar as infor- mações. McSchane_02.indd 41McSchane_02.indd 41 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 42 PARTE II Comportamento Individual e Processos nalidade Big Five como condição para emprego futuro. A Amtrak prefere que a equipe dos veí- culos tenha personalidades de “introvertidos focados”, pois funcionários com esses traços não ficam distraídos enquanto operam o trem ou realizam tarefas repetitivas. A Amtrak menciona um acidente horrível da Metrolink antes de seu contrato como justificativa para o teste de personalidade. Mais de vinte pessoas perderam suas vidas quando um engenheiro ignorou um sinal vermelho enquanto mandava um SMS (supostamente, um indicador de extroversão).51 Os testes de personalidade não foram sempre populares nas organizações. Menos de vin- te anos atrás, muitas empresas rejeitavam os instrumentos por se preocuparem com a pos- sibilidade deles não preverem comportamentos de trabalho e discriminarem injustamente minorias visíveis e outros grupos identificáveis. Aos poucos, os testes de personalidade fo- ram ganhando aceitação, pois os estudos foram relatando que traços específicos estavam cor- relacionados com indicadores específicos de desempenho no trabalho (como descrevemos anteriormente). Hoje, os testes de personalidade são tão populares que alguns especialistas alertam contra sua dependência excessiva em ambientes organizacionais. VALORES NO LOCAL DE TRABALHO Os pais de Colleen Abdoulah ajudaram a filha a desenvolver um conjunto de valores pessoais fortes. Por exemplo, seu pai enfatizava que “não importa quanto ganha, você não é melhor do que os outros e eles não são melhores do que você”, lembra Abdoulah. Ela também aprendeu a importância de ter coragem para fazer a coisa certa de se relacionar com pessoas para que tivessem um sentimento de pertencimento. Além de praticar esses valores pessoais todos os dias, Abdoulah os injeta na Wide Open West, a empresa de Internet, TV a cabo e telefonia OA4 DEBATE As empresas devem utilizar testes de personalidade para selecionar candidatos? A teoria da personalidade fez avanços significativos nas últimas duas décadas, especialmente no que trata de de- monstrar que traços específicos estão associados com com- portamentos e resultados de trabalho específicos. Diversos estudos relatam que certas dimensões Big Five preveem o desempenho geral no trabalho, cidadania organizacional, liderança, comportamentos de trabalho contraproducen- tes, desempenho de treinamento, desempenho de equipe e diversos outros resultados importantes. Essas descobertas são um voto de peso em favor dos testes de personalidade no local de trabalho. Mas alguns especialistas proeminentes no campo da per- sonalidade aconselham cautela.52 Eles lembram que, apesar dos traços estarem relativamente associados a comportamen- tos no local de trabalho, existem outros preditores melhores para o desempenho de trabalho, como amostras de trabalho e desempenho pregresso. Além do mais, os procedimentos de seleção muitas vezes pressupõem que quanto mais de um de- terminado traço, melhor, mas diversos estudos (ainda que não todos) indicam que os melhores candidatos podem estar mais próximos do ponto médio do que dos extremos da amplitude.53 Por exemplo, o desempenho de trabalho parece aumentar com a escrupulosidade, mas funcionários altamente escrupu- losos podem ser tão dedicados que se tornam perfeccionistas, o que pode prejudicar o desempenho em vez de fortalecê-lo.54Uma terceira preocupação é que, dependendo de como são aplicados os resultados do teste, os instrumentos de perso- nalidade podem prejudicar injustamente determinados grupos de pessoas.55 Uma quarta preocupação é que os testes de personalida- des costumam ser estruturados na forma de escalas autopre- enchidas, de modo que os candidatos podem tentar mentir em suas respostas. Pior ainda, os resultados podem não repre- sentar a personalidade do indivíduo ou qualquer outra carac- terística significativa, pois os respondentes muitas vezes não sabem quais traços de personalidade a empresa está buscan- do. Os estudos mostram que os candidatos tentam falsificar resultados de personalidade “bons” para alterar os resulta- dos da seleção. Os defensores dos testes de personalidade respondem que poucos candidatos tentam falsificar suas res- postas (ou seja, Christina é uma exceção).56 Um grande estudo recente descobriu que observadores estimam a maioria das dimensões de personalidade melhor do que autoavaliações, mas poucas empresas utilizam avaliações de terceiros.57 Finalmente, os testes de personalidade podem não comuni- car uma imagem favorável da empresa. O uso de testes de per- sonalidade por parte da Amtrak na Metrolink resultou em con- flitos com o sindicato dos ferroviários. As operações britânicas da PricewaterhouseCoopers (PwC) descobriram que seus tes- tes de personalidade desincentivavam as candidatas do sexo feminino devido a preocupações com a impessoalidade dos testes e a facilidade de falsificar resultados. “Nosso teste de personalidade era visto como alienador pelas mulheres, então foi preciso reagir”, afirma o diretor de diversidade da PwC.58 McSchane_02.indd 42McSchane_02.indd 42 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 43 de Denver com 1.300 funcionários da qual ela é CEO. “[Nossos funcionários] demonstram a coragem para fazer a coisa certa, atendem uns aos outros e aos clientes com humildade e comemoram nossas aprendizagens e sucessos com elegância”, diz Abdoulah. “Qualquer um pode estabelecer valores, mas nós operacionalizamos os nossos para que afetem tudo que fazemos, todos os dias”.59 Colleen Abdoulah e outros profissionais de sucesso costumam fazer referência a seus va- lores pessoais e aos eventos críticos que formaram esses valores em sua juventude. Os valores, um conceito que introduzimos no Capítulo 1, são crenças estáveis e avaliativas que guiam nossas preferências por resultados ou cursos de ação em uma série de situações.60 São per- cepções conscientes sobre o que é bom ou ruim, certo ou errado. Os valores nos dizem o que “deveríamos” fazer. Eles servem como uma bússola moral que direciona nossa motivação e, potencialmente, nossas decisões e ações. As pessoas organizam os valores em uma hierarquia chamada sistema de valores. Algu- mas valorizam novos desafios mais do que a conformidade. Outras, mais a generosidade do que a frugalidade. O sistema de valores exclusivo de cada pessoa é desenvolvido e reforçado pela socialização por meio dos pais, das instituições religiosas, dos amigos, das experiências pessoais e da sociedade na qual vive. Assim, a hierarquia de valores de uma pessoa é estável e duradoura. Por exemplo, um estudo constatou que os sistemas de valores de uma amostra de adolescentes era notavelmente similar depois de 20 anos, quando adultos.61 Repare que a nossa descrição dos valores se concentrou em indivíduos, enquanto os exe- cutivos muitas vezes descrevem os valores como se pertencessem à organização. Na realidade, os valores existem apenas nos indivíduos; nós os chamamos de valores pessoais. No entanto, grupos de pessoas podem ter valores iguais ou similares, então tendemos a atribuir esses va- lores compartilhados à equipe, departamento, organização, profissão ou sociedade como um todo. Os valores compartilhados pelas pessoas em toda a empresa (valores organizacionais) receberão uma discussão mais completa no Capítulo 14, pois são uma parte fundamental da cultura empresarial. Os valores compartilhados pela sociedade (valores culturais) serão deta- lhados mais adiante, neste capítulo. Os valores e traços de personalidade estão relacionados entre si, mas os dois conceitos possuem algumas diferenças.62 A distinção mais importante é que os valores são avaliativos, ou seja, nos informam o que deveríamos fazer, enquanto os traços de personalidade descre- vem como tendemos naturalmente a agir. A segunda distinção é que os traços de personali- dade têm níveis de conflito relativamente baixos entre si (ex.: é possível ter alta sociabilidade e alta introversão), enquanto alguns valores se opõem a outros. Por exemplo, uma pessoa que valoriza a animação e os desafios teria dificuldade em valorizar a estabilidade e a moderação. Terceiro, apesar da personalidade e os valores serem determinados em parte pela heredita- riedade, os valores são muito mais influenciados pela socialização, enquanto os traços de personalidade são muito mais influenciados pela hereditariedade. Tipos de valores Os valores assumem várias formas e os especialistas no tema dedicaram uma atenção conside- rável a organizá-los em grupos. Várias décadas atrás, o psicólogo social Milton Rokeach desen- volveu duas listas de valores, distinguindo os meios (valores instrumentais) dos objetivos finais (valores terminais). Embora as listas de Rokeach ainda sejam mencionadas em algumas fontes sobre comportamento organizacional, elas foram substituídas por outro modelo quase duas décadas atrás. A distinção entre valores instrumentais e terminais não era precisa nem útil, e o modelo de Rokeach ignorava valores que agora estão incluídos no atual modelo dominante. Atualmente, o modelo de valores pessoais mais aceitado é o Circumplexo de Valores de Schwartz.63 Desenvolvido e testado pelo psicólogo social Shalom Schwartz e seus colegas, o modelo organiza 57 valores em 10 conjuntos no modelo circular (circumplexo) apresentado na Figura 2.5.64 Estudos realizados em todo o mundo demonstram consistentemente que os 57 valores se agrupam nessas 10 categorias. Por exemplo, o conformismo inclui os valores específicos da polidez, respeito aos pais, autodisciplina e obediência. Além disso, os dez agru- pamentos de valores estão associados uns com os outros de maneiras similares ou opostas. Por exemplo, o grupo de valores da benevolência é semelhante (correlacionado positivamente com) ao universalismo, mas oposto (correlacionado negativamente com) ao hedonismo. McSchane_02.indd 43McSchane_02.indd 43 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 44 PARTE II Comportamento Individual e Processos O modelo do circumplexo também organiza as dez categorias de valores em quatro qua- drantes. • Abertura à mudança. O quadrante representa a motivação para buscar procedimentos inovadores. Ela inclui as categorias de valor da autodireção (criatividade, independên- cia de pensamento), estímulo (entusiasmo e desafio) e hedonismo (busca do prazer, fruição, gratificação de desejos). • Conservadorismo. Oposto à abertura à mudança, o quadrante representa a motivação para preservar o status quo. Ele inclui as categorias de valores da conformidade (adesão às normas e expectativas sociais), proteção (segurança e estabilidade) e tradição (mo- deração e preservação das coisas como estão). • Autovalorização. O quadrante se refere a quanto uma pessoa se sente motivada pelo interesse próprio. Ele abrange as categorias de valor da realização (busca do sucesso pessoal), poder (domínio sobre as outras pessoas) e hedonismo (categoria de valor compartilhada com a abertura à mudança). • Autotranscendência. O quadrante, oposto à autovalorização, representa a motivação da pessoa para promover o bem-estar alheio e da natureza. Ela inclui os valores da bene- volência (preocupação com a vida de alguém) e do universalismo (preocupação com o bem-estar de todas as pessoas e da natureza). Valores e comportamento individual Os valorespessoais guiam nossas decisões e ações até certo ponto, mas essa conexão nem sempre é tão forte quanto muita gente acredita. O comportamento habitual tende a ser coe- rente com os nossos valores, mas nossas decisões diárias e ações conscientes aplicam nossos valores de forma bem menos coerente. A principal razão para a distância entre os valores Autotranscendência Autovalorização Universalismo Tradição Benevolência Conformismo Segurança Poder Realização Hedonismo Estimulação Autodireção Conservadorismo Abertura à mudança FIGURA 2.5 Circumplexo dos valores de Schwartz. Fontes: S. H. Schwartz, “Universals in the Content and Structure of Values: Theoretical Advances and Empirical Tests in 20 Countries,” Advances in Experimental Social Psychology 25 (1992), pp. 1–65; S. H. Schwartz and G. Sagie, “Value Consensus and Importance: A Cross-National Study,” Journal of Cross-Cultural Psychology 31 (July 2000), pp. 465–97. McSchane_02.indd 44McSchane_02.indd 44 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 45 pessoais e o comportamento individual é que os valores são conceitos abstratos, de modo que sua relevância em situações específicas quase nunca é óbvia. Três condições reforçam a ligação entre os valores pessoais e o comportamento.65 Primei- ro, tendemos a aplicar nossos valores apenas quando podemos pensar em razões específi- cas para fazê-lo. Em outras palavras, precisamos de motivos lógicos para empregar um valor específico em uma situação específica. Segundo, tendemos a aplicar nossos valores quando a situação permite ou encoraja tal ação. Os ambientes de trabalho influenciam nosso com- portamento, pelo menos no curto prazo, então eles necessariamente encorajam ou desenco- rajam comportamentos consistentes com nossos valores. Terceiro, somos mais propensos a empregar os valores quando pensamos ativamente sobre eles. Isso ocorre naturalmente quan- do somos confrontados com situações que obviamente violam nossos valores. Por exemplo, quando pedem que realize uma tarefa arriscada, você fica ciente de toda a sua segurança. Também ficamos mais cientes de nossos valores (e, por consequência, agimos de modo consistente com eles) quando somos literalmente lembrados deles por terceiros. O efeito fica claro em um estudo recente:66 Os estudantes responderam uma prova de matemática e foram pagos por cada resposta correta. Um grupo entregou os resultados para avaliação por parte do pesquisador, para que não pudessem mentir sobre os resultados. Um segundo grupo podia mentir, pois corrigia a própria prova e informava o experimentador sobre o resultado. Um terceiro grupo era semelhante ao segundo (corrigia sua própria prova), mas precisava assinar seu nome sob a seguinte declaração: “Compreendo que esta pequena pesquisa é abrangida pelo código de honra da Universidade” (a universidade não possuía um código de honra). Os pesquisadores estimam que alguns alunos trapacearam quando corrigiram suas próprias provas sem a afirmação sobre o “código de honra”, mas nenhum dos alunos que recebeu o formulário com o “código de honra” mentiu sobre os resultados. Os resultados foram seme- lhantes quando, em vez da afirmação sobre honra, o terceiro grupo foi solicitado a repetir os Dez Mandamentos. A mensagem é que as pessoas têm maior probabilidade de aplicar seus valores (honestidade, no caso) quando lembradas explicitamente deles. Congruência de valores Os valores nos dizem o que é certo ou errado e o que deveríamos fazer. Essa característica avaliativa afeta nosso conforto com organizações e indivíduos específicos. O conceito funda- mental é a congruência de valores, ou seja, a semelhança entre a hierarquia de valores pessoais de um indivíduo a hierarquia de valores da organização, de um colega ou de outra fonte de comparação. A congruência de valores pessoa-organização ocorre quando os valores de um indivíduo são semelhantes aos valores dominantes de uma organização. Essa forma de congruência de valores aumenta (em certa medida) a probabilidade de que os funcionários tomem decisões e ajam de maneiras consistentes com as expectativas organizacionais, além de gerar maior satisfação, lealdade e cidadania organizacional no trabalho e menos estresse e rotatividade.67 “A realização mais difícil, embora recompensadora, em qualquer carreira é ‘viver com fidelidade’ a seus valores e encontrar empresas onde você possa contribuir no nível mais elevado e ao mesmo tempo ser você mesmo, de maneira autêntica”, afirma Cynthia Schwalm, executiva sênior da Optimer Pharmaceuticals na cidade de Nova Iorque.68 As empresas mais bem-sucedidas empregam pessoas cujos valores pessoais são idênticos aos valores da organização? Nem de perto! Embora um grau confortável de congruência de valores seja necessário pelos motivos mencionados acima, as empresas também se beneficiam de algum nível de incongruência. Os funcionários com valores diversos oferecem perspecti- vas diferentes que podem levar a melhores decisões. Além disso, congruência demais pode criar uma “seita corporativa” que pode minar a criatividade, a flexibilidade organizacional e a ética empresarial. Um segundo tipo de congruência de valores envolve a medida da coerência dos valores aparentes nas nossas ações (valores promulgados) com o que dizemos que acreditamos (va- lores defendidos). A congruência de valores defendidos e promulgados é especialmente impor- tante para as pessoas em posições de liderança, pois qualquer lacuna óbvia entre os valores defendidos e os promulgados mina a sua integridade percebida, que é uma característica im- portante dos líderes eficazes. Uma pesquisa global relatou que 55% dos funcionários acredi- tam que a alta gerência se comporta de modo coerente com os valores centrais da empresa.70 McSchane_02.indd 45McSchane_02.indd 45 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 46 PARTE II Comportamento Individual e Processos Algumas empresas tentam manter níveis elevados de congruência de valores defendidos e promulgados fazendo um levantamento entre subordinados e colegas sobre se as decisões e ações do gestor são coerentes com os valores promulgados pela empresa. Um terceiro tipo, a congruência de valores organização-comunidade, abrange a semelhança entre os valores dominantes de uma organização e os valores predominantes da comunidade ou sociedade na qual realiza negócios.71 Uma empresa sediada em um determinado país que tenta impor seu sistema de valores aos funcionários e a outras partes interessadas localizadas em outra cultura pode sofrer de alta rotatividade de funcionários e ter relações mais difíceis com as comunidades nas quais opera. Assim, a globalização exige um certo malabarismo: as empresas dependem de valores compartilhados para manter padrões e comportamentos coerentes, mas precisam operar dentro dos valores das diferentes culturas em todo o mundo. VALORES ÉTICOS E COMPORTAMENTO Quando precisam identificar o atributo mais importante de um líder, os funcionários cos- tumam mencionar inteligência, decisão e compaixão, mas nenhuma dessas características fica em primeiro lugar. Em inúmeros levantamentos, os funcionários costumam escolher a honestidade ou a ética como a característica mais importante dos líderes corporativos efica- zes.72 Ética refere-se ao estudo dos princípios ou valores morais que determinam se as ações são certas ou erradas e se os resultados são bons ou ruins (ver Capítulo 1). As pessoas se ba- seiam em seus valores éticos para determinar “a coisa certa a se fazer”. A conduta empresarial ética é integrada aos programas de negócios e aparece regularmente no noticiário, ainda que não pareça haver nenhum declínio perceptível nas transgressões. Em uma pesquisa recente, quase metade dos funcionários americanos afirmou ter testemunhado desvios de conduta no trabalho, como uso ilegítimo dos recursos da empresa, comportamento abusivo, mentir para os funcionários, abuso no uso de e-mail ou Internet, conflitosde interesse, discriminação e mentir para as partes interessadas externas à empresa.73 A Figura 2.7 lista os países menos corruptos do mundo. Três princípios éticos Para compreender melhor a ética empresarial, precisamos considerar três tipos distintos de princípios éticos: utilitarismo, direitos individuais e justiça distributiva.75 Embora seus valores pessoais possam empurrar você mais para um princípio do que para os outros, OA5 Logo depois de ir trabalhar na Chick-fil-A, antes mesmo de se formar no Ensino Médio, Scott Reed (direita) descobriu que os fortes valores familiares da rede de restaurantes eram semelhantes a seus próprios valores pessoais. “Os valores fundamentais da Chick-fil-A se alinham bem com os meus”, afirma Reed, que abriu uma franquia da rede em Marietta, no estado da Geórgia, após se formar na universidade duas décadas atrás. Os dois irmãos de Reed também trabalharam na empresa por vários anos. Lauren McGuire, sua irmã, se tornou franqueada da Chick-fil-A recentemente. A con- gruência de valores também foi um fator importante. “É uma empresa que representa meus princípios de corpo e alma”, explica McGuire.69 McSchane_02.indd 46McSchane_02.indd 46 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 47 todos os três devem ser considerados ativamente para colocar em teste as questões éticas importantes. • Utilitarismo. O princípio aconselha a buscar o maior bem para o maior número de pessoas. Em outras palavras, devemos escolher a opção que proporcione o mais alto grau de satisfação para as pessoas afetadas. O conceito também é conhecido como princípio da consequência, pois se concentra nas consequências das nossas ações e não em como as realizamos. Um problema com o utilitarismo é que é quase impossível avaliar os benefícios ou custos de muitas decisões, particularmente quando as partes interessadas têm necessidades e valores divergentes. Outro problema é que a maioria de nós não se sente confortável ao adotar comportamentos que parecem antiéticos para alcançar resultados éticos. • Direitos individuais. O princípio reflete a crença de que todas as pessoas têm direitos que as permitem agir de certa maneira. Alguns dos direitos mais citados são o da liber- dade de ir e vir, segurança física, liberdade de expressão, julgamento justo e proibição da tortura. O princípio dos direitos individuais inclui mais do que direitos legais, mas também os direitos humanos, concedidos a todas as pessoas como uma norma moral da sociedade. Um problema com os direitos individuais é que uns podem conflitar com outros. O direito dos acionistas de serem informados sobre as atividades da empresa pode acabar conflitando com o direito de um executivo à privacidade, por exemplo. • Justiça distributiva. O princípio sugere que as pessoas similares às outras devem re- ceber benefícios e ônus similares; os que são diferentes devem receber benefícios e ônus diferentes na proporção da sua dessemelhança. Por exemplo, esperamos que dois funcionários que contribuem igualmente em seu trabalho recebam recompensas similares, enquanto os que fazem uma contribuição menor devem receber menos. Uma variação do princípio da justiça distributiva diz que as desigualdades são aceitá- veis quando beneficiam os menos favorecidos na sociedade. Assim, os funcionários em empregos arriscados devem ser mais bem pagos se o seu trabalho beneficiar ou- tras pessoas menos favorecidas. Um problema com o princípio da justiça distributiva trata da dificuldade em chegar a um consenso sobre quem é similar e quais fatores são relevantes. FATOR DE INTENSIDADE MORAL QUESTÃO DE INTENSIDADE MORAL A INTENSIDADE MORAL É MAIS ELEVADA QUANDO Magnitude das consequências Quanto dano ou benefício ocorrerá às outras pes- soas em consequência dessa ação? O dano ou benefício é maior. Consenso social Quantas outras pessoas concordam que essa ação é eticamente boa ou má? Muitas pessoas concordam. Probabilidade do efeito (a) Qual é a chance dessa ação vir a ocorrer? (b) Qual é a chance dessa ação vir a causar conse- quências boas ou más? A probabilidade é maior. Imediatismo temporal Quanto tempo depois da ação as consequências ocorrerão? O intervalo de tempo é mais curto. Proximidade O quão próximas de mim em termos sociais, psico- lógicos e/ou físicos estão as pessoas afetadas por esta decisão? As pessoas afetadas estão mais próximas e não distantes. Concentração do efeito (a) Quantas pessoas são afetadas por esta ação? (b) As pessoas afetadas por esta ação podem ser identificadas facilmente como um grupo? Muitas pessoas são afetadas. As pessoas afetadas são identificadas facilmente como um grupo. FIGURA 2.6 Fatores que influenciam a intensidade moral percebida.* *Estes são fatores que as pessoas tendem a questionar consigo mesmas quando determinam a intensidade moral de uma questão. Se algumas des- sas questões devem ser relevantes é em si uma questão ética. Fonte: Baseado em informações de T. J. Jones, “Ethical Decision Making by Individuals in Organizations: An Issue Contingent Model,” Academy of Management Review 16 (1991), pp. 366–95. McSchane_02.indd 47McSchane_02.indd 47 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 48 PARTE II Comportamento Individual e Processos Intensidade moral, sensibilidade ética e influências situacionais Além dos princípios éticos e seus valores subjacentes, outros quatro fatores influenciam a conduta ética no ambiente de trabalho: a intensidade moral de uma questão, a sensibilidade ética de um indivíduo, os fatores situacionais e a atenciosidade.76 Intensidade moral é quanto uma questão exige a aplicação de princípios éticos. As decisões com alta intensidade moral são mais importantes, então o tomador de decisão deve ser mais cauteloso ao aplicar princí- pios para resolvê-las. Diversos fatores influenciam a intensidade moral de uma questão, in- cluindo aqueles listados na Figura 2.6. Lembre-se de que a lista representa os fatores sobre os quais as pessoas tendem a pensar; alguns podem não ser considerados moralmente aceitáveis quando as pessoas tomam formalmente decisões éticas.77 Mesmo que uma questão tenha alta intensidade moral, alguns funcionários podem não reconhecer sua importância ética porque possuem baixa sensibilidade ética. A sensibilidade ética é uma característica pessoal que capacita as pessoas a reconhecerem a presença de uma questão ética e determinarem sua importância relativa.78 As pessoas eticamente sensíveis não são necessariamente mais éticas, mas sim mais propensas a detectar se uma questão requer consideração ética, ou seja, elas conseguem estimar com mais precisão a intensidade moral da questão. As pessoas eticamente sensíveis tendem a ter uma empatia maior, e têm mais informações sobre a situação específica. Por exemplo, os contadores seriam mais eticamente sensíveis em relação à pertinência de procedimentos contábeis específicos do que alguém que não recebeu treinamento nessa profissão. O terceiro fator explica por que as pessoas boas se envolvem em decisões e comportamen- tos antiéticos: é a situação na qual ocorre a conduta. Os funcionários afirmam que a alta gerên- cia os pressiona regularmente para mentir para os clientes, violar as normas ou cometer outros atos antiéticos. Segundo uma pesquisa global com gestores e gerentes de recursos humanos, a pressão proveniente da alta gerência ou do conselho de administração para cumprir prazos e objetivos empresariais irreais é a principal causa de comportamento empresarial antiético.79 Os fatores situacio- nais não justificam a conduta antiética. Em vez disso, pre- cisamos estar a par desses fatores para que as organizações possam reduzir sua influência no futuro. CATEGORIA PAÍS PONTUAÇÃO CATEGORIA PAÍS PONTUAÇÃO 1 Dinamarca 9,3 11 Islândia 8,5 1 Nova Zelândia 9,3 11 Luxemburgo 8,5 1 Singapura 9,3 13 Hong Kong 8,4 4 Finlândia 9,2 14 Irlanda 8,0 4 Suécia 9,2 15 Áustria 7,9 6 Canadá 8,9 15 Alemanha7,9 7 Holanda 8,8 17 Barbados 7,8 8 Austrália 8,7 17 Japão 7,8 8 Suíça 8,7 19 Qatar 7,7 10 Noruega 8,6 20 Reino Unido 7,6 FIGURA 2.7 Os vinte países menos corruptos do mundo.74 Fonte: Os resultados de 2010 vêm do Corruption Perceptions Index publicado pela Transparency Interna- tional. O índice é calculado com base em até 13 relatórios. Reproduzido de Corruption Perceptions Index. Copyright © 2010 Transparency International: the global coalition against corruption. Usado com permissão. Para mais informações, visite http://www.transparency.org. intensidade moral Quanto uma questão exige a aplicação de princípios éticos. sensibilidade ética Uma característica pessoal que capacita as pessoas a reco- nhecerem a presença de uma questão ética e determinarem sua importância relativa. McSchane_02.indd 48McSchane_02.indd 48 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 49 Um último motivo para as pessoas participarem de condutas antiéticas é que elas se com- portam de maneira irracional. Em outras palavras, elas não pensam conscientemente sobre a ética de suas ações.80 Como explicamos anteriormente neste capítulo, as pessoas seguem seus valores apenas quando pensam sobre eles. As pesquisas sugerem que muitos comportamen- tos ocorrem no piloto automático, então os funcionários raramente avaliam se suas ações violam seus valores pessoais ou princípios éticos. O comportamento irracional é particular- mente comum quando (uma situação frequente) os funcionários estão localizados longe das situações em que suas decisões produzem impacto (ou seja, baixa intensidade moral). O comportamento irracional também é apoiado por pressupostos de que os principais tomadores de decisão possuem altos padrões morais. Os funcionários desprezam as preo- cupações éticas com seu trabalho quando acreditam que o chefe que designou a tarefa é ine- rentemente ético. Por exemplo, um dos maiores casos de fraude contábil ocorreu por que o diretor financeiro da empresa era altamente respeitado no setor, de modo que os funcionários imaginaram que ele estava introduzindo procedimentos con- tábeis inovadores dentro dos limites da lei. Na realidade, suas atividades eram formas extremas de fraude contábil.81 Apoiar o comportamento ético A maioria das empresas de grande e médio porte aplica uma ou mais estratégias para melhorar a conduta ética. Um dos passos mais básicos nesse sentido é elaborar um código de conduta ética, ou seja, uma de- claração sobre as práticas desejadas, regras de conduta e filosofia sobre o relaciona- mento da organização com suas partes in- teressadas e o meio ambiente. Quase todas as empresas da lista Fortune 500 nos Esta- dos Unidos e a maior parte das 500 maiores empresas da Grã-Bretanha possuem códi- gos de ética.82 O objetivo desses códigos é motivar e orientar o comportamento dos funcionários, sinalizar a importância da conduta ética e fortalecer a confiança na empresa por parte das partes interessadas. Mas os críticos sugerem que elas não têm muito sucesso na redução da conduta anti- ética. Um exemplo flagrante é que a Enron tinha um código de ética bem desenvol- vido, mas os altos executivos da empresa ainda se envolveram em transgressões em grande escala, resultando na falência da empresa de energia.83 Muitas empresas complementam os códigos de ética com treinamento em éti- ca. Na Texas Instruments, os funcionários recebem um panfleto do tamanho de um cartão de visitas. Nele, as seguintes per- guntas devem funcionar como sua bússola moral: “A ação é legal? Ela está de acordo com nossos valores? Se você fizer isso, vai A Texas Instruments (TI) é considerada uma das empresas mais éticas e bem conceituadas do mundo. A TI dá a cada funcionário o “Livreto de Ética da TI” (disponível em 10 idiomas), que inclui os códigos de ética da empresa de produtos eletrônicos e sete perguntas usadas para orientar os funcionários em dilemas éticos. O escritório de ética da TI possui uma linha- -direta confidencial. Os funcionários precisam completar uma série de pequenas módulos de treinamento em ética e conformidade por computador para cada unidade de negócios. “Queremos que os funcionários tenham as ferramentas e o treinamento que precisam para trabalhar dentro da lei e das normas da TI, e para preservar nossa reputação de empresa que opera com integridade”, afirma David Reid, vice-presidente da TI e diretor de ética e confor- midade da empresa.85 McSchane_02.indd 49McSchane_02.indd 49 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 50 PARTE II Comportamento Individual e Processos se sentir mal? Como ficaria se saísse no jornal? Se você sabe que é errado, não faça! Se não tem certeza, pergunte. Continue perguntando até ouvir uma resposta”. A Molson Coors de- senvolveu um premiado programa de treinamento on-line em forma de uma expedição: os funcionários devem resolver as violações éticas em cada “acampamento” à medida que esca- lam uma montanha. Os primeiros acampamentos apresentam cenários reais com violações relativamente claras da códigos de ética da empresa, enquanto fases posteriores apresentam dilemas mais ambíguos, exigindo uma reflexão mais cuidadosa sobre os valores fundamen- tais da organização.84 Algumas empresas também têm maneiras de comunicar transgressões confidencialmen- te, como uma “linha direta” anônima ou um link na web que os funcionários podem acessar para discutir questões éticas ou preocupações com a conduta ética. Algumas empresas em- pregam ombudsmans de ética que recebem informações confidenciais dos funcionários e in- vestigam possíveis transgressões proativamente. As auditorias éticas também são conduzidas em algumas organizações, mas são mais comuns em avaliações de práticas de responsabilida- de social da empresa.86 Essas medidas adicionais apoiam a conduta ética até certo ponto, mas a base mais po- derosa é um conjunto de valores compartilhados que reforce a conduta ética. “Se você não tiver uma cultura de tomada de decisão ética, todos os controles e normas de conformidade que você se preocupar em implantar não necessariamente impedirão o desvio da conduta ética”, alerta um alto executivo da gigante britânica das comunicações Vodafone. Essa cultura é apoiada pela conduta ética e pela vigilância dos líderes empresariais. Ao agirem com os mais elevados padrões de conduta moral, os líderes não só ganham apoio e confiança dos seguidores, eles também modelam os padrões éticos que os funcionários são mais propensos a seguir.87 VALORES INTERCULTURAIS Sean Billing trabalhava como diretor de hotelaria no Fairmont Hotels, em Chicago, quando casualmente perguntou ao seu chefe se a rede de hotéis poderia usar as habilidades e conheci- mentos dele em outro lugar. Logo depois, a Fairmont transferiu Billing para uma vaga admi- nistrativa no Quênia, com a missão de elevar as novas propriedades da rede no país africano aos padrões internacionais mediante treinamento e tecnologia, sem perder o caráter quenia- no diferenciado. Billing aproveitou a oportunidade, mas logo descobriu o desafio de incutir em outra cultura os valores profundos da Fairmont de atendimento ao cliente, ambientalismo e capacitação. “É um pouco de choque cultural hoteleiro… as coisas são bem diferentes aqui”, admitiu Billing.88 A Fairmont Hotels & Resorts opera hotéis de nível internacional em vários países e está ávida para ajudar Sean Billing e outros funcionários a desenvolverem e reforçarem sua com- petência intercultural. Como descreve a seção Conexões 2.1, as pessoas pensam e agem de maneiras diferentes em culturas diversas e essas diferenças se devem a normas singulares de comportamento e também à ênfase em valores diferentes. Individualismo e coletivismo Dos muitos valores estudados entre culturas, os cinco resumidos na Figura 2.8 são os mais populares. A figura também lista os países que dão ênfase alta, média ou baixa a esses valores. Dois valores interculturais aparentemente inseparáveissão o individualismo e o coletivismo. O individualismo representa a valorização da independência e da singularidade pessoal. As pessoas altamente individualistas valorizam a liberdade pessoal, a autossuficiência, o con- trole sobre as próprias vidas e a apreciação das qualidades exclusivas que as distinguem das demais. Americanos, chilenos, canadenses e sul-africanos costumam ter níveis altos de in- dividualismo, enquanto Taiwan e Venezuela são países com baixo nível de individualismo.90 O coletivismo representa a valorização das nossas obrigações em relação aos grupos dos quais participamos e à harmonia do grupo. As pessoas com alto coletivismo se definem pela participação nos grupos, enfatizam sua conexão pessoal com outros membros do grupo e va- lorizam os objetivos e o bem-estar das pessoas nesses grupos.91 Países com baixo coletivismo OA6 McSchane_02.indd 50McSchane_02.indd 50 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 51 incluem Estados Unidos, Japão e Alemanha, enquanto os israelenses e taiwaneses têm níveis relativamente altos de coletivismo. Ao contrário do que muitos acreditam, individualismo não é o oposto do coletivismo. Na verdade, uma análise da maioria dos estudos anteriores mostrou que os dois conceitos não guardam uma relação entre si.92 Por exemplo, as culturas que valorizam muito a obrigação com o grupo ao qual uma pessoa pertence não dão necessariamente uma baixa prioridade à liberdade pessoal e à singularidade. Em geral, as pessoas em todas as culturas se definem tanto pela sua singularidade quanto por sua relação com as outras pessoas. É uma caracte- rística inerente do autoconceito de todos os indivíduos, tema analisado no próximo capítulo. Algumas culturas claramente enfatizam a singularidade ou as obrigações com o grupo mais do que outras, mas ambos têm seu lugar nos valores e no autoconceito das pessoas. Observe também que os japoneses têm níveis relativamente baixos de coletivismo, ao contrário do que afirmam muitos livros sobre relações interculturais, que dizem que o Japão é um dos países mais coletivistas do mundo! Esse erro de in- terpretação histórico têm muitas explicações, desde proble- mas com a definição e mensuração do coletivismo a relatos errôneos das primeiras pesquisas interculturais. Indepen- dente dos motivos, os estudos são consistentes em informar que os japoneses tendem a ter níveis relativamente baixos de coletivismo e moderados de individualismo (como indi- cado na Figura 2.8).93 A Infosys aproxima as diferenças interculturais89 A Infosys Technologies, uma empresa de terceirização de tecnologia na Índia, estava preparada para as diferenças in- terculturais quando adquiriu uma empresa australiana. Sean Fernando, gerente-geral de recursos humanos da Infosys na Austrália, oferece um exemplo claro de uma dessas diferen- ças culturais: quando precisavam viajar a trabalho, os fun- cionários da Infosys na Índia faziam suas malas sem hesitar e estavam prontos para partir mesmo sem ter detalhes sobre a viagem. A equipe australiana, por outro lado, queria saber mais sobre as acomodações, diárias e detalhes do projeto an- tes de se sentir à vontade. Em outras palavras, os funcionários indianos tinham níveis significativamente menores de aversão à incerteza. Outra diferença é que a equipe indiana esperava que o chefe desse instruções sobre o que fazer, enquanto os aus- tralianos esperavam ser consultados. Em outras palavras, os funcionários australianos tinham níveis muito menores de distância do poder. Fernando lembra de um incidente no qual um gerente de projetos australiano se reuniu com uma equipe de projeto da índia. Ele descreveu o projeto e sugeriu que compartilhassem ideias sobre maneiras de completá-lo com sucesso. “Eles não sabiam o que ele queria dizer”, conta Fernando. “Então uma das pessoas simplesmente disse: ‘Es- távamos nos perguntando quando você ia nos contar qual é o plano’”. Para minimizar o conflito intercultural, a Infosys Austra- lia realiza sessões de três horas nas quais os funcionários de ambos os países aprendem sobre suas culturas e conversam sobre como gerenciar funcionários com valores diferentes. C O N E X Õ E S 2 . 1 A Infosys está treinando seus gerentes para se conscientizarem das diferenças interculturais quando trabalham com funcionários de outros países. individualismo Valor intercultural que descreve quanto as pessoas em uma cul- tura enfatizam a independência e a singularidade pessoal. coletivismo Valor intercultural que descreve quanto as pessoas em uma cul- tura enfatizam seu dever em rela- ção aos grupos aos quais perten- cem e à harmonia do grupo. McSchane_02.indd 51McSchane_02.indd 51 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 52 PARTE II Comportamento Individual e Processos Distância do poder Distância do poder refere-se a quanto as pessoas aceitam uma distribuição desigual de poder em uma sociedade.94 Indivíduos com alta distância do poder aceitam e valorizam o poder desigual. Eles valorizam a obediência à autoridade, sentem-se confortáveis em receber ordens de seus superiores sem consulta ou debate e preferem resolver as diferenças com procedimen- tos formais em vez de diretamente. As pessoas com baixa distância do poder, por outro lado, esperam uma divisão relativamente igual do poder. Elas encaram sua relação com o chefe como uma relação de interdependência, não de dependência; ou seja, acreditam que seu chefe também depende delas, então esperam divisão de poder e consulta antes que sejam tomadas decisões que as afetem. As pessoas da Índia e da Malásia tendem a ter alta distância do poder, enquanto os dinamarqueses e israelenses têm baixa distância do poder. Coletivamente, os americanos têm nível entre médio e baixo de distância do poder. Para entender o efeito da distância do poder, pense sobre a experiência de um engenhei- ro do sudeste asiático que imigrou para o Canadá pouco tempo atrás. Em seu país de origem, o engenheiro gerava relatórios de análise de dados e os apresentava para seu supervisor sem fazer recomendações. O chefe analisava as informações factuais e tomava uma decisão. In- cluir recomendações nesses relatórios seria um desrespeito pela posição mais elevada do supervisor, o que teria resultado em demissão. Mas quando o engenheiro foi morar no Ca- nadá, seu chefe esperava que ele propusesse recomendações junto com os dados técnicos. Excluir as recomendações em um relatório de engenha- ria no Canadá seria sinal de incompetência, um motivo para demissão. Para perma- necer empregado, o enge- nheiro precisou superar uma enorme mudança em termos de expectativas e valores de distância do poder.95 VALOR EXEMPLOS DE PAÍSES CRENÇAS REPRESENTATIVAS/COMPORTAMENTOS EM CULTURAS “ALTAS” Individualismo Alto: Estados Unidos, Chile, Canadá, África do Sul Médio: Japão, Dinamarca Baixo: Taiwan, Venezuela Define o eu mais pela singularidade; objetivos pessoais têm prioridade; decisões têm pouca consideração sobre efeito entre outros; relacionamen- tos são vistos como mais instrumentais e fluidos. Coletivismo Alto: Israel, Taiwan Médio: Índia, Dinamarca Baixo: Estados Unidos, Alemanha, Japão Define o eu mais pela participação em um grupo; objetivos de autossacrifí- cio e harmonia têm prioridade; comportamento regulado por normas inter- nas do grupo; participações em grupos são vistas como estáveis, com forte diferenciação com grupos externos. Distância do poder Alto: Índia, Malásia Médio: Estados Unidos, Japão Baixo: Dinamarca, Israel Relutante em discordar ou contradizer o chefe; espera-se e prefere-se que os gerentes sejam tomadores de decisão; percepção de dependência (ver- sus interdependência) com o chefe. Aversão à incerteza Alto: Bélgica, Grécia Médio: Estados Unidos, Noruega Baixo: Dinamarca, Singapura Prefere situações previsíveis; valoriza emprego estável, leis estritas e baixo conflito; rejeita desvios do comportamento normal. Orientação paraa realização Alto: Áustria, Japão Médio: Estados Unidos, Brasil Baixo: Suécia, Holanda Foco em resultados (versus relacionamentos); decisões baseadas em con- tribuição (equidade versus igualdade); baixa empatia ou demonstrações de emoções (versus forte empatia e solidariedade). FIGURA 2.8 Cinco valores interculturais. Fontes: As descrições e resultados sobre individualismo e coletivismo vêm da metanálise informada por D. Oyserman, H. M. Coon, and M. Kemmel- meier, “Rethinking Individualism and Collectivism: Evaluation of Theoretical Assumptions and Meta-Analyses,” Psychological Bulletin 128 (2002), pp. 3–72. As outras informações vêm de G. Hofstede, Culture’s Consequences, 2d ed. (Thousand Oaks, CA: Sage, 2001). distância do poder Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura aceitam a distribuição desigual de poder na socie- dade. aversão à incerteza Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura toleram a ambiguidade (baixa aversão à incerteza) ou se sentem ameaçadas pela ambiguidade e a incerteza (alta aversão à incerteza). orientação para realização/ proteção Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura enfatizam as relações competitivas versus colaborati- vas com as outras pessoas. McSchane_02.indd 52McSchane_02.indd 52 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 53 Aversão à incerteza Aversão à incerteza é quanto as pessoas toleram a ambiguidade (baixa aversão à incer- teza) ou se sentem ameaçadas pela ambiguidade e incerteza (alta aversão à incerteza). Os funcionários com alta aversão à incerteza preferem situações estruturadas nas quais as regras de conduta e tomada de decisão estão documentadas claramente. Em geral, eles preferem comunicações diretas e não ambíguas ou indiretas. A aversão à incerteza tende a ser alta na Bélgica e na Grécia e ainda mais elevada no Japão. Em geral, ela é baixa na Dinamarca e em Singapura. Coletivamente, os americanos têm nível entre médio e baixo de aversão à incerteza. Orientação para realização/proteção A orientação para realização/proteção reflete uma visão competitiva versus cooperativa das relações com outras pessoas.96 As pessoas com alta orientação para a realização valorizam a assertividade, a competitividade e o materialismo. Elas apreciam pessoas fortes e aceitam a acumulação de dinheiro e de bens materiais. As pessoas de culturas orientadas para a prote- ção, por outro lado, enfatizam os relacionamentos e o bem-estar alheio. Elas enfocam a inte- ração humana e a solidariedade, não a competição e o sucesso pessoal. A Suécia, a Noruega e a Holanda têm níveis bastante baixos de orientação para a realização (ou seja, têm forte orientação para a proteção). A Áustria e o Japão, por outro lado, têm altos níveis de orienta- ção para realização. Os Estados Unidos fica um pouco acima da média em orientação para realização/proteção. Ressalvas com conhecimento intercultural A pesquisa organizacional intercultural recebeu bastante atenção nas últimas duas décadas, provavelmente em consequência do crescimento da globalização e da diversidade cultural dentro das organizações. Nosso conhecimento sobre dinâmica intercultural se multiplicou e muitas dessas descobertas serão discutidas neste livro, especialmente com relação à liderança, à resolução de conflitos e às táticas de influência. Entretanto, também é preciso fazer algumas ressalvas sobre o conhecimento intercultural. Um problema é que muitos estudos dependem de amostras pequenas e convenientes (ex.: estudantes) para representar toda uma cultura.97 O resultado é que muitos estudos interculturais tiram conclusões que não podem ser generali- zadas para as culturas que pretendem representar. Um segundo problema é que os estudos interculturais muitas vezes pressupõem que cada país possui uma cultura.98 Na realidade, muitos países (incluindo os EUA) se tornaram culturalmente diversos. À medida que mais países adotam a globalização e o multicultura- lismo, torna-se ainda menos apropriado pressupor que cada país possui uma única cultura unificada. Uma terceira preocupação é que as pesquisas e textos sobre relações interculturais con- tinuam a depender de um grande estudo realizado quase quatro décadas atrás, com 116.000 funcionários da IBM em dezenas de países. O estudo estimulou muitas pesquisas intercultu- rais subsequentes, mas suas descobertas estão começando a ficar desatualizadas, pois os valo- res de algumas culturas mudaram com o passar dos anos. Por exemplo, parece estar havendo uma convergência de sistemas de valores na Ásia à medida que esses países interagem mais uns com os outros e adotam práticas de negócios padronizadas.99 Diversas análises recentes recomendam que estudos futuros não dependam do estudo da IBM como valores de referên- cia para determinadas culturas.100 Diversidade cultural nos Estados Unidos Lendo alguns estudos interculturais, é fácil imaginar que os Estados Unidos são um país ho- mogêneo no qual as pessoas têm crenças e valores idênticos ou bastante semelhantes. Obvia- mente, qualquer um que more nos EUA ou visite o país por tempo o suficiente sabe que isso não é verdade. Mas até os americanos podem se surpreender com a diversidade cultural do país, mesmo quando excluímos a incrível variedade de novos cidadãos que cresceu em outras partes do mundo.101 McSchane_02.indd 53McSchane_02.indd 53 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 54 PARTE II Comportamento Individual e Processos No Capítulo 1, descrevemos o alto nível de diversidade no local de trabalho nos Estados Unidos. As características de diversidade superficial estão em evolução constante, como a porcentagem crescente de americanos não brancos, e especialmente da população hispâni- ca como maior grupo étnico não branco dos EUA. Atualmente, entretanto, a maioria dos especialistas em diversidade no local de trabalho reconhece que a diversidade profunda é mais importante e tem maior impacto no ambiente de trabalho. Essas diferenças em crenças, valores e expectativas muitas vezes se aglomeram em torno de fatores demográficos como idade, gênero e etnia. Em uma seção anterior deste capítulo, citamos evidências de que os Estados Unidos têm alto nível de individualismo e baixo de coletivismo. Essa generalização esconde variações significativas dentro do país. Uma metanálise de estudos anteriores revela que, em média, os afro-americanos são significativamente mais individualistas do que os brancos de origem europeia e hispânicos, enquanto os de origem asiática têm o menor nível de individualismo entre esses grupos demográficos. Os americanos de origem europeia têm níveis ligeiramente menores de coletivismo do que os de origem asiática e hispânica.102 Diversidade regional nos Estados Unidos Os Estados Unidos também possuem uma forte tradição de variações inter-regionais. Um estudo recente revela que os perfis de per- sonalidade típica variam entre as regiões. Os valores de neuroticismo são mais elevados no nordeste e sudeste do país e menores no meio-oeste e sudoeste. As regiões da Nova Inglaterra, Atlântico Central e Pacífico têm maior abertura para a experiência, enquanto os moradores dos estados das Grandes Planícies, do meio-oeste e do sudeste do país têm as menores pon- tuações. As diferenças regionais são menos marcantes para as outras dimensões de persona- lidade Big Five. Outros estudos revelaram agrupamentos regionais dos valores de Schwartz e outros sistemas de crença semelhantes.103 Além disso, alguns estudos informam que os ame- ricanos têm estereótipos distintos de pessoas de regiões diferentes e que tais estereótipos são semelhantes aos perfis de personalidade reais nessas regiões.104 O coletivismo também pare- ce variar no país. Usando indicadores sociais (porcentagem morando sozinho, profissionais independentes, residências com netos, etc.) e não levantamentos, um estudo informa que o coletivismo é mais fortenos estados do sul, na Califórnia e no Havaí, mas menor entre os estados das montanhas, noroeste e Grandes Planícies.105 Algumas possibilidades explicam a ocorrência das variações regionais.106 Uma explicação é que instituições locais, não nacionais (ex.: prefeituras, sistemas educacionais e grupos reli- giosos dominantes) influenciam as práticas de socialização, o que reforça os valores pessoais. Um argumento correlato é que, em parte, o ambiente natural molda a cultura. As pessoas podem enfatizar valores diferentes em consequência do ambiente físico (plano versus monta- nhoso), condições climáticas (temperado versus tropical) e condições socioeconômicas (bai- xa renda versus relativamente próspero). Uma terceira explicação é que as pessoas migram para locais que acreditam ser mais consistentes com seus valores e com a ideia que fazem de si mesmos. Uma pessoa criada no meio-oeste, por exemplo, poderia ficar mais motivada para morar na Califórnia se seus valores enfatizassem descoberta e mudança, não tradição e dedicação. Esse breve panorama da cultura americana destaca duas questões importantes. Primeiro, é preciso lembrar que os Estados Unidos, assim como muitos outros países, possuem diversas formas de diversidade superficial e profunda. Descrever os americanos como se fossem uma cultura homogênea é uma distorção da realidade. Segundo, a diversidade cultural se estende além das diferenças demográficas. Como observamos, os Estados Unidos possuem uma rica tradição de diversidade cultural entre regiões e esses agrupamentos são menos visíveis do que as diferenças demográficas. No Capítulo 1, também observamos que existem diferenças entre gerações. No geral, os líderes organizacionais e os funcionários precisam estar cientes dessas formas complexas de diversidade e se sensibilizarem com o quanto elas produzem variações em autoconceitos, percepções sociais e atitudes. Esses três temas serão examinados em mais detalhes nos próximos dois capítulos. McSchane_02.indd 54McSchane_02.indd 54 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 McShane_Iniciais.indd xxivMcShane_Iniciais.indd xxiv 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 Esta página foi deixada em branco intencionalmente.