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Anderson Soares 5ºP IESVAP epilepsia definição Segundo último consenso da ILAE (lnternational League Against Epilepsy), a epilepsia é definida como desordem cerebral caracterizada por uma predisposição persistente, que leva ao aparecimento de crises epilépticas e a suas consequências neurobiológicas, cognitivas, psicossociais • Crise epiléptica: expressão clínica decorrente de descarga anormal e excessiva do tecido cerebral. • Crise aguda sintomática (ou crise provocada): Crise epiléptica decorrente de uma causa imediata identificada, como distúrbio metabólico, intoxicação exógena, abstinência de drogas sedativas ou insulto neurológico agudo. • Crise única (isolada): uma ou mais crises que recorrem no período de 24 horas. Pode corresponder a uma crise aguda sintomática ou à primeira manifestação de epilepsia. • Epilepsia: doença neurológica caracterizada por ocorrência de crises espontâneas recorrentes. Tipos de crise epiléticas • Focais (com ou sem perda de consciência); » Com sintomas motores; » Com sintomas somatossensitivos; » Com sintomas autonômicos; » Com sintomas psíquicos. • Crises primariamente generalizadas » Crises tônico-clônicas primariamente generalizadas; » Crises de ausência (típicas e atípicas); » Crises mioclônicas; » Crises tônicas; » Crises atônicas. • Crises não classificadas » Espasmos epilépticos; » Crises gelásticas e dacríticas. • Crises relacionadas a situações especiais » Crises febris; » Crises reflexas. Nas crises focais, as descargas elétricas anormais ocorrem em áreas circunscritas de um hemisfério cerebral levando a manifestações decorrentes da disfunção da região cerebral acometida. Crises focais podem propagar-se levando ao acometimento de outras áreas do córtex cerebral. Essa propagação pode levar ao acometimento de grande parte ou da totalidade do córtex (crise secundariamente generalizada). As crises primariamente generalizadas caracterizam- -se por alteração elétrica que acomete um ponto determinado de uma rede neural, com rápido acometimento de amplas redes neurais em ambos os hemisférios cerebrais, podendo incluir estruturas subcorticais. Dependendo do tipo de crise, podem ou não cursar com perda de consciência. A atividade elétrica cerebral anormal que ocorre durante as crises focais ou generalizadas pode ser medida com eletrodos colocados na superfície do couro cabeludo (eletrencefalograma). Tipos de epilepsia Epilepsias focais • De causa genética (ou possivelmente genéticas). epilepsia Anderson Soares 5ºP IESVAP » Epilepsia focal benigna da infância com descargas centro-temporais. » Epilepsia da infância com paroxismos occipitais (início precoce e tardio). • De causa estrutural-metabólica. » Epilepsia temporal associada à esclerose de hipocampo. » Epilepsia focal associada a distúrbios do desenvolvimento cortical (displasia cortical focal, hemimegalencefalia, heterotopias nodulares periventriculares, polimicrogiria, esquizencefalia, esclerose tuberosa). » Epilepsia associada a tumores de baixo grau de malignidade (ganglioglioma, gangliocitoma, tumores disembrioplásticos primitivos - DNETs, astrocitomas de baixo grau, oligodendrogliomas etc.). » Epilepsia associada a lesões sequelares (vasculares, infecciosas). » Epilepsia associada a lesões degenerativas (Alzheimer etc.). » Epilepsia associada a malformações vasculares (angiomas cavernosos, malformações artério- - venosas). » Epilepsia pós-traumatismo crânio-encefálico. » Encefalite de Rasm ussen. » Síndrome de Sturge-Weber (Angiomatose encéfalo- trigeminai). • Epilepsias focais de causa desconhecida. » Por localização (Temporal, frontal, occipital, parietal). Epilepsias generalizadas • Genéticas (ou provavelmente genéticas). • Epilepsia mioclônica benigna da infância. • Epilepsia ausência da infância. » Epilepsia com crises generalizadas de início da adolescência (epilepsia mioclônica juvenil, epilepsia ausência da juventude, epilepsia com crises tônico- clônico generalizadas do despertar). » Epilepsia generalizada com crises febris-plus (GEFS+). • De causa estrutural-metabólica. » Distúrbios do desenvolvimento cortical (complexo paquigiria-lissencefalia-heterotopia subcortical em banda). • De causa desconhecida. etiologia As epilepsias com crises focais ou generalizadas podem ser classificadas segundo a etiologia em: • Epilepsias de causa estrutural-metabólica; • Epilepsias genéticas (ou provavelmente genéticas); • Epilepsia de causa desconhecida. Nas epilepsias de causa estrutural-metabólica, identifica-se no exame de neuroimagem lesão estrutural, que determina a ocorrência de epilepsia ou existe condição metabólica em que ocorre inequívoca associação com epilepsia. As epilepsias genéticas constituem um grupo de epilepsias em que não existe lesão estrutural e que a epilepsia ocorra como resultado de um defeito genético conhecido ou presumido em que as crises epilépticas representem a manifestação fundamental desse defeito. Observam-se anormalidades de sistemas que regulam a excitabilidade neuronal ou de circuitos neurais, de natureza genética (elucidada ou presumida). Anderson Soares 5ºP IESVAP PRINCIPAIS CAUSAS: Crianças: as causas mais comuns são febres altas ou anormalidades metabólicas temporárias. Podem decorrer, também, de lesão durante o parto, uma anormalidade metabólica hereditária ou uma doença cerebral. Adultos: lesão cerebral decorrente de trauma, acidente vascular cerebral ou tumor podem ser causas de uma convulsão. Abstinência alcoólica também é uma causa comum. No entanto, em cerca de metade desses casos nesta faixa etária, a causa é desconhecida. Idosos: as causas mais comuns podem ser um tumor cerebral ou um acidente vascular cerebral. Quadros clínicos prejudiciais ao cérebro, como lesões, certos medicamentos, privação do sono, infecções, febre ou privação de oxigênio no cérebro, podem desencadear uma única convulsão quer a pessoa tenha um transtorno convulsivo ou não. Pessoas com epilepsia têm maior probabilidade de ter uma crise quando estão sob alto estresse físico ou emocional e com menos frequência, as convulsões são desencadeadas por sons repetitivos, luzes pulsáteis, jogos em vídeo ou até pelo toque em certas áreas do corpo. fisiopatologia A fisiopatologia da epilepsia se baseia em um desequilíbrio entre os mecanismos de excitação (glutamato) e inibição (GABA) do Sistema Nervoso Central. Isso ocorre devido à perda seletiva de neurônios gabaérgicos (inibitórios). Dessa maneira, podemos concluir que ocorre excitação excessiva pelo glutamato ou falta de inibição do GABA. Manifestações clínicas Os sinais e sintomas das crises são variáveis, podendo incluir quadros autolimitados a manifestações grandes, como perda abrupta de consciência, queda ao solo e abalos convulsivos nos quatro membros. Além disto, a convulsão também pode ocasionar aumento da salivação, ranger de dentes, perda do controle do processo urinário e de defecação. Subclassificação das principais crises generalizadas: 1. Crise tônico – clônica generalizada (grande mal): ocorre uma perda súbita de consciência, depois ocorre uma contração tônica e finaliza com fase clônica. Os 4 membros são afetados. Nesse tipo de crise, pode ocorre sialorreia e liberação esfincteriana. Depois da crise o paciente apresenta letargia, confusãomental e sonolência (período pós ictal, que dura de 15-30 minutos). Podem ocorrer logo em seguida a uma crise focal. 2. Crises de ausência (pequeno mal): a perda de consciência é súbita e breve (por até 30 segundos) e pode acontecer por várias vezes durante o dia. Podem ocorrer algumas alterações motoras discretas (ex: piscamento repetitivo dos olhos, sinais autonômicos, automatismos orais e manuais). As crises atônicas, clônicas, espasmos epilépticos, mioclônicas e tônicas podem ter início focal ou generalizado. 1. Crise atônica: Ocorre perda de tônus muscular. Esse tipo de crise pode causar queda e lesões físicas no paciente. 2. Crise clônica: ocorrem quando existe a presença de abalos musculares clônicos. 3. Espasmos epiléticos: consistem na contração de músculos axiais; são contrações tônicas rápidas. São espasmos que ocorrem, principalmente, em salvas, ao adormecer ou ao despertar. 4. Crise mioclônica: essas crises são descritas por contrações musculares breves e súbitas, lembrando o choque. 5. Crise tônica: podem ter início abrupto ou gradual. Esse tipo de crise costuma durar de 10 a 15 segundos, mas pode persistir por até 1 minuto. É comum ocorrer perda de consciência, com recuperação juntamente com o final da descarga elétrica. Subclassificação das crises focais parciais: 1. Simples: os sintomas são de determinada área cerebral, mas não ocorre alteração do nível de Anderson Soares 5ºP IESVAP consciência. Atualmente, também pode ser chamada de crise perceptivas. 2. Complexas: esse tipo de crise surge, geralmente, no lobo frontal ou temporal. Ocorre alteração do nível de consciência. No período pós ictal, o paciente fica desorientado. É também denominada como crise disperceptiva. 3. Gelásticas: o paciente apresenta crises de riso inapropriadas, associadas a hematomas hipotalâmicos. COMO PROCEDER • Tentar evitar que a vítima caia desamparadamente, cuidando para que a cabeça não sofra traumatismo e procurando deitá-la no chão com cuidado, acomodando-a; • Retirar da boca próteses dentárias móveis (pontes, dentaduras), após a crise; • Remover qualquer objeto com que a vítima possa se machucar e afastá-la de locais e ambientes potencialmente perigosos, como por exemplo: escadas, portas de vidro, janelas, fogo, eletricidade, máquinas em funcionamento; • Não interferir nos movimentos convulsivos, mas assegurar-se que a vítima não está se machucando; • Afrouxar as roupas da vítima no pescoço e cintura; • Virar o rosto da vítima para o lado, evitando assim a asfixia por vômitos ou secreções. • Não colocar nenhum objeto rígido entre os dentes da vítima; • Quando passar a convulsão, manter a vítima deitada até que ela tenha plena consciência e autocontrole; • Se a pessoa demonstrar vontade de dormir, deve- se ajudar a tornar isso possível. • Chamar ajuda: 192 / 193 anamnese Inicialmente, é fundamental detalhar os eventos, caracterizando os sintomas iniciais e a sequência em que eles ocorrem. O paciente deve descrever os fenômenos conscientes da crise, enquanto acompanhantes que tenham presenciado o evento devem descrever os fenômenos ocorridos durante o período de arresponsividade. Deve-se questionar ativamente a presença de sensação visceral ascendente, descrita como sensação de opressão iniciada em abdome que ascende até o tórax e por vezes até o pescoço, característica de crises originadas na porção mesial do lobo temporal. Taquicardia, sensação de medo e sintomas experienciais ou dismnésicos (déjà vu,jamais vu, despersonalização ou desrealização) são também comuns nesse tipo de crise. Podem ocorrer alterações sensitivas como parestesias, alterações visuais, olfativas, auditivas e gustativas. Pacientes com crises focais associadas à perda de consciência descrevem inicialmente suas crises como "ausências" pelo fato de não se lembrarem dela. Quando questionado, o acompanhante pode descrever olhar vago, automatismos manuais, mastigatórios. Nas crises focais motoras, pode ocorrer um fenômeno conhecido como marcha jacksoniana, em que os movimentos clônicos se iniciam na mão e, de forma progressiva, acometem o antebraço, braço e face, podendo evoluir com generalização secundária. Alterações motoras como abalos musculares repetitivos (clonias), posturas distônicas e tônicas assimétricas também devem ser caracterizados. Exame físico O exame deve incluir avaliação clínica completa, incluindo avaliação cardiovascular, seguido do exame neurológico completo. O retardo mental é um dos achados mais frequentes. Deve ser classificado em leve, moderado, grave ou profundo e investigada a presença de sinais focais. Estigmas cutâneos podem sugerir doenças neurocutâneas, dismorfismos indicar cromossomopatias e hemissomatoatrofia revelar doença hemisférica. Pacientes com epilepsia apresentam frequentemente queixas na esfera cognitiva (especialmente memória, linguagem, atenção e concentração). Comorbidades psiquiátricas (depressão, distúrbios ansiosos, transtornos psicóticos etc.) são mais frequentes em epilépticos que na população geral. Exames complementares Eletroencefalograma RM de crânio TC de crânio Monitorização por vídeo-EEG Tomografia por emissão de pósitrons – PET cerebral SPECT cerebral Anderson Soares 5ºP IESVAP conduta CRISE EPILÉTICA ÚNICA A conduta farmacológica com medicação antiepiléptica é reservada para casos selecionados, uma vez que a grande maioria das crises são autolimitadas. • Estabilização clínica conforme preconizado pelos protocolos de suporte básico e avançado de vida. • Exame clínico geral, incluindo parâmetros hemodinâmicos, temperatura, glicemia capilar, saturação de O2. • Exame neurológico completo, com ênfase à pesquisa de sinais meníngeos, exame do fundo de olho e ao estudo de achados neurológicos focais. • Realização de exames laboratoriais para afastar os principais distúrbios hidroeletrolíticos relacionados a crises agudas sintomáticas: glicemia, ureia, creatinina, sódio, cálcio, fósforo e magnésio séricos, hemograma, gasometria arterial. Em pacientes previamente epilépticos, é útil a dosagem dos níveis séricos das drogas antiepilépticas. • Eletrocardiograma e enzimas cardíacas (para afastar arritmias e síndrome do QT longo, levando a "síncope convulsígena") • Averiguação do efeito de drogas (medicamentos ou drogas de uso ilícito) e da absti nência de drogas (principalmente os sedativos hipnóticos ou outros depressores do SNC, incluindo o álcool). Exames de rastreio toxicológico podem ser úteis neste contexto. • Obtenção de dados de história sobre lesão neurológica prévia ou epilepsia. • Em pacientes epilépticos, é importante obter dados sobre as medicações em uso e a possível não adesão ao tratamento • Exame de neuroimagem craniano (ressonância magnética ou tomografia computadorizada, dependendo da disponibilidade, urgência e capacidade de cooperação do paciente). Nos pacientes epilépticos com etiologia já investigada, convém, criteriosamente, prescindir de novo exame de imagem. A tomografia pode ainda ser necessária para excluir lesões secundárias à crise, como traumatismo craniano. • Exame do líquido cefalorraquidiano (LCR) é fundamental nos casos suspeitos de meningite ou encefalite e quando a etiologia das crises não foi elucidada. • Investigação de foco infeccioso sistêmico (em casos selecionados). O paciente deve ser mantido em observação até que sejam afastadas as causas mencionadas anteriormente. CD FARMACOLOGICA O tratamento inicial deve ser feito com uma única droga antiepiléptica (monoterapia) em doseseficazes. A escolha da droga inicial deve levar em conta a eficácia da droga para o tipo de crise apresentado pelo paciente e os fatores relacionados a ele (tolerabilidade, comodidade posológica, potencial interação medicamentosa com outras drogas empregadas pelo paciente, como, por exemplo, anticoncepcionais orais, desejo de engravidar, facilidade em adquirir o medicamento). É de suma importância que o paciente que chegar em crise receba tratamento de urgência. A droga de escolha para cessar uma crise em andamento é um benzodiazepínico. No Brasil, as recomendações para o uso de benzodiazepínicos são: 1. Diazepam intravenoso (IV): dose inicial de 10 mg para adultos; 0,15 a 0,2 mg/kg/dose para crianças ou pacientes com menor peso, se necessário, pode ser repetida dose adicional (até duas vezes). 2. Midazolam intramuscular (IM): dose inicial de 10 mg se > 40 kg; reduzir para 5 mg se peso entre 13 e 40 kg; não existe recomendação para repetição. Lembrando que a administração do benzodiazepínico deve ser feita de preferência, pela equipe de resgate em ambiente pré- hospitalar pois diminui as chances de complicações. A Fenitoína não é iniciada de rotina para pacientes que se apresentam uma primeira crise. Este fármaco está indicado para pacientes com crises recorrentes ou que não exibiram recuperação do nível de consciência após uma crise epiléptica ou seja, apresentam suspeita de estado de mal epiléptico não convulsivo. A dose indicada de ataque é 15-20 mg/kg de peso, diluídos em soro fisiológico 0,9% e administrada em bomba de infusão a uma velocidade de 50 mg/min, com uso de filtro de linha. Nos pacientes idosos, cardiopatas ou com antecedente de arritmia, a velocidade pode ser de 20-25 mg/min. Anderson Soares 5ºP IESVAP A administração desse fármaco deve ser sempre feita com o paciente em decúbito e com monitorização de frequência cardíaca e pressão arterial. Os principais efeitos colaterais observados são: ardência e desconforto no local da aplicação, tontura, náuseas, bradiarritmias, hipotensão, bloqueio atrioventricular, ataxia e nistagmo. referência NITRINI, Ricardo. A neurologia Que todo médico deve saber. 3. ed. São Paulo: Editora Atheneu. 2015.
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