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CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE CARCINOGÊNESE Processo complexo, multifásico e dependente de fenômenos genéticos e epigenéticos que culminam no surgimento de clones de células imortalizadas que adquirem a capacidade de se multiplicar autonomamente, de invadir os tecidos vizinhos e de dar metástases. O câncer é considerado uma doença genômica de células somáticas resultante de alterações na expressão de certos genes, especialmente daqueles que regulam a proliferação e a diferenciação celular. Gatilhos genéticos ou ambientais para o risco de câncer? - Causas ambientais = 65% - Fatores hereditários = 26% a 42% para o risco de câncer - Não há escassez de fatores 1. TABAGISMO associado sobretudo aos cânceres dos pulmões, da boca, laringe, faringe, esôfago e bexiga; 2. DIETA RICA EM GORDURAS, especialmente em relação ao carcinoma colorretal; 3. OBESIDADE, associado ao adenocarcinoma do esofago, do endométrio, do pâncreas e da mama; 4. ALIMENTOS PROCESSADOS. Em 2015, a OMS incluiu carnes processadas entre os produtos sabidamente carcinogênicos; 5. ALCOOLISMO, particularmente quanto aos cânceres da laringe, faringe, esôfago e fígado (associação com cirrose); 6. INFECÇÕES, em especial por alguns vírus (p. ex, HPV); 7. EXPOSIÇÃO A CARCINÓGENOS AMBIENTAIS, como radiações (UV, ionizantes) e alguns compostos químicos (p. ex., asbestos). GRUPO 1 - Quando há evidências suficientes de que o agente é de certeza carcinogênico/ cancerígeno para humanos - Exemplos: Tabaco e tabagismo passivo, bebidas alcoólicas, vírus HIV, carnes embutidas e radiação solar GRUPO 2A - O agente é provavelmente carcinogênico a humanos - Quando existem evidências suficientes de que o agente é carcinogênico para animais e evidências limitadas ou insuficientes de que ele é carcinogênico para humanos - Exemplos: Anabolizantes, carne vermelha, emissões dos motores a diesel e inseticida lindano GRUPO 2B - O agente é possivelmente carcinogênico a humanos CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE - Quando existem evidências limitadas de que o agente é carcinogênico para humanos e evidências suficientes de que ele é carcinogênico para animais ou quando não há evidências suficientes em ambos os casos, mas há dados relevantes de que ele possa ser carcinogênico - Exemplos: Cafeína, gasolina e alguns herbicidas GRUPO 3 - O agente não é classificado como carcinogênico a humanos - Quando as evidências não são adequadas para afirmar que aquele agente é carcinogênico a humanos e animais ou quando o agente não se encaixa em nenhum outro grupo - Exemplo: Ácido acrílico, iluminação fluorescente e mercúrio A proliferação das células normais é regulada: - Inibição das proteínas codificadas pela expressão dos genes supressores de tumores (controle negativo) - Estímulo de proteínas codificadas pela expressão dos proto oncogenes (controle positivo) - Inibição de genes que condicionam a morte celular programada / apoptose (controle negativo) - Estímulo de genes que regulam a mobilidade celular e a produção dos fatores de crescimento (controle positivo) Sem alterações - célula normal Mutações de oncogenes - célula com potencial de malignização Perda dos genes supressores de tumor - Tumor em crescimento Ativação da mobilidade - Tumor infiltrativo PROTO-ONCOGENES Genes ativos em sua forma nativa e atuam no controle da proliferação celular normal. Podem tornar-se oncogenes quando: (1) Há alteração / mutação na estrutura do gene, resultando em produto anormal (oncoproteína); (2) Ocorre aumento da expressão gênica / proteínas superexpressadas (função exacerbada) ● Oncogenes promovem proliferação celular incontrolada. Quando uma célula produz o seu próprio fator de crescimento, ela adquire AUTONOMIA GENES SUPRESSORES DE TUMOR ● Envolvidos no controle da multiplicação e da diferenciação celulares, evitando a proliferação celular descontrolada das células (“freios” da divisão celular). CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE GENES DA MOBILIDADE CELULAR ● Normalmente encontrados nas células, mas normalmente somente expressados nas células móveis por natureza. Quando expressos nos oncócitos, permite que estes produzam substâncias (ex: Hialuronidase, TAF) que irão dissolver as barreiras tissulares e permitir invasão de outros tecidos e vasos sanguíneos (INVASIBILIDADE). FASES DA CARCINOGÊNESE 1. INICIAÇÃO: Resulta da exposição das células a uma dose suficiente de agentes carcinogênicos (iniciadores); - A célula iniciada torna-se potencialmente capaz de dar origem a um tumor. - Isoladamente, não é suficiente para a formação do tumor. - Provoca dano permanente ao DNA (mutações). - Rápida e irreversível, possuindo “memória”. - Agentes químicos iniciadores: Benzopirenos (fumaça do cigarro); vírus oncogênicos; Hidrocarbonetos Policíclicos e Heterocíclicos Aromáticos. Substâncias químicas que podem causar a iniciação da carcinogênese podem ser classificadas em duas categorias: de ação direta e de ação indireta Carcinógenos de ação direta: Não requerem a conversão metabólica para se tornarem carcinogênicos. Ex.: Agentes alquilantes (ciclofosfamida) Carcinógenos de ação de indireta: requerem a conversão metabólica para um carcinógeno em sua forma final antes que eles se tornem ativos. Ex.: Benzopirenos, hidrocarbonetos policíclicos, anilina. CARCINOGÊNESE QUÍMICA A maioria dos carcinógenos requer ativação metabólica para a conversão em carcinógenos em sua forma final. Outras vias metabólicas podem levar à inativação (destoxificação) dos pró-carcinógenos ou de seus derivados. - Potência carcinogênica de uma substância química - Determinada pela atividade inerente de seu derivado eletrofílico e pelo equilíbrio entre ativação metabólica e reações de inativação. Gene P-450, CYP1A1 - Produz enzima que metaboliza hidrocarbonetos - 10% da população tem mutação no gene - Aumenta em 7 vezes o risco, caso fume ALVOS MOLECULARES: RAS E P53 CARCINOGÊNESE FÍSICA A energia de radiação, quer seja na forma de raios UV da luz solar ou sob a forma de ionização eletromagnética e radiação particulada, é um carcinógeno bem estabelecido. CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE - Diversos tipos de cânceres - Principalmente câncer de pele A porção de UV do espectro solar pode ser dividida em três grandes gamas de comprimento de onda: UVA (320-400 nm), UVB (280-320 nm) e UVC (200 a 280 nm). - UVB - Responsável pela indução dos cânceres de pele - Formação de dímeros de pirimidina DNA - Via de reparo danificada - UVC - Potente mutagênico, mas não é considerado significativo porque é filtrado pela camada de ozônio ao redor da Terra. Radiações ionizantes - leucemias mielóides, câncer de tireóide, câncer de mama, pulmão e salivares CARCINOGÊNESE BIOLÓGICA Poucos vírus foram associados à carcinogênese humana - Vírus da Leucemia de Células T Humanas Tipo 1: linfomas e leucemias - HPV: câncer de colo de útero - Pelo menos 70 tipos geneticamente distintos de HPV foram identificados. ➢ 1, 2, 4 e 7: provocam o papiloma escamoso benigno (verrugas) em humanos. ➢ 16 e 18: foram envolvidos na gênese de diversos cânceres, principalmente do carcinoma de células escamosas do colo do útero e da região anogenital. ➢ Pelo menos 20% dos cânceres de orofaringe estão associados ao HPV ➢ O potencial oncogênico do HPV pode estar relacionado ao produto de dois genes virais, E6 e E7. Juntos, eles interagem com uma variedade de proteínas reguladoras do crescimento codificadas por proto-oncogenes e por genes supressores de tumor ➢ Os tipos de HPV de alto risco expressam proteínas oncogênicas que inativam os supressores de tumor, ativam ciclinas, inibem a apoptose e combatem a senescência celular. - EBV: linfomas ➢ Vírus Epstein-Barr: membro da família herpes, está envolvido na patogenia de diversos tumores humanos: a forma africana do linfoma de Burkitt; os linfomas de células B em indivíduos imunossuprimidos; linfomas de Hodgkin; carcinoma nasofaríngeo e algunscarcinomas gástricos e formas raras de linfomas de células T e linfomas de células natural killers. - HBV: hepatocarcinoma - Herpes vírus 8: sarcoma de Kaposi 2. PROMOÇÃO: Podem induzir os tumores nas células iniciadas, mas eles não são tumorigênicos por si mesmos. CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE - Não há formação de tumores quando o agente promotor é aplicado antes, ao invés de depois, do agente iniciador - Ex.: exposição prolongada a certos hormônios, tabaco 3. PROGRESSÃO: Multiplicação descontrolada e irreversível das células alteradas. Nesse estágio o câncer já está instalado, evoluindo até o surgimento das primeiras manifestações clínicas da doença. - Ex.: tabaco ESTUDO DIRIGIDO - CARCINOGÊNESE Quais são as capacidades adquiridas pelas células neoplásicas, segundo Hanaham e Weinberg? - Autossuficiência com relação a fatores de crescimento; - Insensibilidade a inibidores de proliferação; - Escape da apoptose (morte celular programada); - Potencial replicativo infinito; - Indução de angiogênese; - Invasão tecidual e metástase; - Alterações no metabolismo de energia; - Escape da destruição pelo sistema imune; - Instabilidade genética e mutação; - Indução de reação inflamatória. Que classes de genes são os principais alvos da lesão genética em neoplasias malignas? Quatro classes de genes são os principais alvos da lesão genética em neoplasias malignas: os genes promotores e inibidores do crescimento e os genes reguladores da apoptose e reparo do DNA. O que são proto-oncogenes e oncogenes? Os genes que promovem o crescimento celular autônomo são chamados de oncogenes e seus equivalentes normais são os proto-oncogenes. Os proto-oncogenes são reguladores fisiológicos da proliferação e diferenciação, enquanto os oncogenes se caracterizam por promover o crescimento celular de forma independente dos sinais mitogênicos normais. Como os proto-oncogenes podem se transformar em oncogenes? Os proto-oncogenes podem transformar-se em oncogenes de duas maneiras: 1. Mudanças na estrutura gênica causadas por pequenas mutações ou por translocações cromossômicas, resultando na síntese de oncoproteínas com função aberrante; 2. Mudanças na regulação da expressão gênica, com aumento ou produção inadequada de proteínas reguladoras do crescimento. A amplificação gênica pode resultar em várias cópias de um proto-oncogene nas células malignas. Quais são as principais categorias de oncogenes? CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE São quatro as principais categorias de oncogenes: - Fatores de crescimento; - Receptores de fatores de crescimento; - Proteínas envolvidas na transdução de sinais; - Proteínas reguladoras nucleares. O que são genes supressores de tumor? Os genes supressores de tumor codificam proteínas que inibem a divisão celular. Por desempenharem esta função e terem sido descobertos em neoplasias malignas, receberam esta denominação que, apesar de imprópria, é consagrada pelo uso. A falta de inibição do crescimento é uma das alterações fundamentais da carcinogênese. O primeiro gene supressor de tumor descrito foi o RB (RB1), localizado no cromossomo 13q14 e associado ao desenvolvimento do retinoblastoma, neoplasia maligna da retina que afeta aproximadamente uma em 20 mil crianças. O P53 (TP53) é o gene supressor de tumor mais comumente alterado em neoplasias malignas humanas. Alterações nestes genes são detectadas em cerca de 70% dos cânceres de colo do intestino, 30% a 50% dos de mama e 50% dos de pulmão. Além dos tumores epiteliais, mutações em P53 são encontradas em leucemias, linfomas, sarcomas e tumores neurogênicos. Quais são os estágios da carcinogênese? As causas de alteração genética associadas à transformação maligna são numerosas e variadas, como carcinógenos químicos, radiação e infecção por vírus oncogênicos. A oncogênese (ou carcinogênese) é um processo de múltiplas etapas e dividido em dois estágios principais: iniciação e promoção. Na iniciação as células são expostas a agentes que causam alterações permanentes no DNA (mutação) e na promoção ocorre a proliferação das células transformadas. Os agentes carcinógenos podem ser divididos em categorias. Quais são elas? Carcinogênese química: Uma grande quantidade de substâncias químicas (naturais ou sintéticas) possui potencial carcinogênico. Aquelas que não necessitam de transformação química para promover a carcinogênese são chamadas de carcinógenos de ação direta, e as que requerem conversão metabólica para que seus produtos finais tenham potencial carcinogênico são conhecidas como carcinógenos de ação indireta ou pró-carcinógenos. Os produtos de combustão do tabaco (hidrocarbonetos policíclicos aromáticos), asbesto, arsênico e cloreto de vinil são exemplos de substâncias que apresentam potencial carcinogênico. Radiação: A radiação sob a forma de raios ultravioleta da luz solar e radiações eletromagnéticas (raios x e raios gama) e particuladas (partículas alfa, beta, próton e nêutron) podem provocar alterações genéticas relacionadas com o desenvolvimento de neoplasias malignas. Os raios ultravioleta podem causar o carcinoma basocelular e o melanoma na pele. As radiações ionizantes de origem médica (radioterapia), ocupacional (mineiros de elementos radioativos) e a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki estão associados a uma grande variedade de tumores malignos. Carcinogênese viral: Vários tipos de vírus (DNA ou RNA) têm mostrado potencial para induzir a transformação maligna. Estima-se que aproximadamente 20% das neoplasias malignas conhecidas estejam associadas à infecção viral. Atualmente, sete tipos de vírus têm sido consistentemente ligados a diferentes tipos de cânceres humanos: EBV (vírus epstein-barr), HPV de alto risco (papilomavírus humano, tipos 16 e 18), HBV (vírus da hepatite B), HCV (vírus da hepatite C), HHV-8 CARCINOGÊNESE - Letícia Kariny Teles Deusdará / Odontologia UFPE (herpes vírus humano 8), MCVP (poliomavírus de célula de Merkel) e HTLV1 (vírus linfotrópico da célula humana do tipo 1). Entre os mecanismos mais estudados e conhecidos estão aqueles utilizados pelos vírus HPV 16 e 18, cujo potencial carcinogênico está relacionado a duas proteínas virais, E6 e E7, as quais são capazes de interagir com proteínas que regulam o ciclo celular e que atuam como supressoras de tumores, como a p53 e pRb. Essa interação provoca a degradação e a inativação das proteínas celulares, o que conduziria à transformação, imortalização celular, e posteriormente, formação de neoplasias. O que diferencia um carcinógeno de ação direta de outro de ação indireta? Aquelas que não necessitam de transformação química para promover a carcinogênese são chamadas de carcinógenos de ação direta, e as que requerem conversão metabólica para que seus produtos finais tenham potencial carcinogênico são conhecidas como carcinógenos de ação indireta ou pró-carcinógenos. Cite exemplos de neoplasias malignas relacionadas à carcinogênese física. Os raios ultravioleta podem causar o carcinoma basocelular e o melanoma na pele. As radiações ionizantes de origem médica (radioterapia), ocupacional (mineiros de elementos radioativos) e a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki estão associados a uma grande variedade de tumores malignos. Quais são os vírus que estão associados à carcinogênese humana? Atualmente, sete tipos de vírus têm sido consistentemente ligados a diferentes tipos de cânceres humanos: EBV (vírus epstein-barr), HPV de alto risco (papilomavírus humano, tipos 16 e 18), HBV (vírus da hepatite B), HCV (vírus da hepatite C), HHV-8 (herpes vírus humano 8), MCVP (poliomavírus de célula de Merkel) e HTLV1 (vírus linfotrópico da célula humana do tipo 1). Qual o papel da carcinogênese química, física e biológica no desenvolvimento do câncer de boca? O carcinoma espinocelular (CEC) corresponde a cerca de 95% das neoplasias malignas orais. A radiação solar é o principal fator etiológico para o CEC de lábio, e o consumo de tabaco associado ao de álcool o principal fator etiológicodo CEC da cavidade oral, que afeta principalmente homens acima dos 40 anos de idade. Existe um risco significativamente maior de desenvolvimento do CEC da cavidade oral em indivíduos tabagistas e etilistas do que na população em geral, com evidente sinergismo entre estes fatores. A infecção por vírus da família HPV tem sido associada aos CECs que acometem tonsila, base da língua e orofaringe, os quais têm apresentado incidência aumentada em adultos jovens de ambos os sexos, possivelmente em razão de mudanças no comportamento sexual. Alguns estudos também apontam que dieta pobre em proteínas, vitaminas e minerais e rica em gordura pode estar associada ao risco de desenvolvimento de CEC oral.
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