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- 1 - BENS - 2 - BENS - 3 - BENS Nota do Autor Este livro foi elaborado visando contribuir com os estudos em Direito Civil nas questões relacionadas aos Bens envolvendo legislações, doutrinas, jurisprudências, provimentos do Conselho Nacional de Justiça, entre outros, para que haja uma maior compreensão sobre os bens jurídicos. Agradeço aos acadêmicos pelos mais diversos questionamentos durante as aulas de Direito Civil, pois permitiram um aprofundamento da temática que resultou neste livro. Espero que todos possam usufruir deste livro, pois procurei desenvolvê-lo com todos os cuidados e dedicação na transmissão dos meus conhecimentos. Ariquemes-RO, 10 de junho de 2022. - 4 - BENS - 5 - BENS Abreviações ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade CC/1916 Código Civil de 1916 CC/2002 Código Civil de 2002 CNJ Conselho Nacional de Justiça CP/1940 Código Penal de 1940 CRFB/1988 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 DGE/CGJ-RO Diretrizes Gerais dos Extrajudiciais da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de Rondônia EI Estatuto do Idoso ECA Estatuto da Criança e do Adolescente EPD Estatuto da Pessoa com Deficiência LAP Lei de Alienação Parental LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação LRP Lei de Registros Públicos STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TRF Tribunal Regional Federal CC/1916 Código Civil de 1916 CC/2002 Código Civil de 2002 - 6 - BENS - 7 - BENS Sumário 1. Notas Introdutórias ........................................................................................................................................ 9 2. Classificações dos Bens ................................................................................................................................ 11 2.1. Quanto a materialidade ........................................................................................................................ 11 2.1.1. Bens corpóreos .................................................................................................................................................... 11 2.1.2. Bens incorpóreos ................................................................................................................................................. 11 2.2. Quanto à mobilidade ............................................................................................................................ 11 2.2.1. Bens imóveis ........................................................................................................................................................ 11 2.2.2. Bens móveis......................................................................................................................................................... 13 2.3. Quanto à Fungibilidade ......................................................................................................................... 14 2.3.1. Bens infungíveis ................................................................................................................................................... 14 2.3.2. Bens fungíveis ...................................................................................................................................................... 14 2.4. Quanto à Consuntibilidade ................................................................................................................... 14 2.4.1. Bens consumíveis ................................................................................................................................................ 15 2.4.2. Bens inconsumíveis ............................................................................................................................................. 15 2.4.3. Bens destinados à alienação ................................................................................................................................ 15 2.5. Quanto à sua Durabilidade ................................................................................................................... 15 2.5.1. Bens não duráveis ............................................................................................................................................... 15 2.5.2. Bens duráveis ...................................................................................................................................................... 15 2.6. Quanto à sua Divisibilidade................................................................................................................... 15 2.6.1. Bens divisíveis ...................................................................................................................................................... 15 2.6.2. Bens indivisíveis ................................................................................................................................................... 16 2.7. Quanto à individualidade ...................................................................................................................... 16 2.7.1. Bens Singulares .................................................................................................................................................... 16 2.7.2. Bens Coletivos ..................................................................................................................................................... 16 2.8. Bens Principais e Bens Acessórios ......................................................................................................... 17 2.8.1. Bens Principais ..................................................................................................................................................... 17 2.8.2. Bens Acessórios ................................................................................................................................................... 17 2.8.3. Pertenças ............................................................................................................................................................. 19 2.8.4. Partes integrantes ............................................................................................................................................... 19 2.8.5. Coisa Ajudante..................................................................................................................................................... 20 2.9. Quanto a titularidade do domínio ......................................................................................................... 21 2.9.1. Bens privados ...................................................................................................................................................... 21 2.9.2. Bens públicos ....................................................................................................................................................... 21 3. Bens de Família ............................................................................................................................................ 26 3.1. Bem de Família Voluntário .................................................................................................................... 26 3.1.1. Os Bens ................................................................................................................................................................ 26 3.1.2. Efeitos do Bem de Família ................................................................................................................................... 26 3.1.3. Administração dos Bens ...................................................................................................................................... 27 3.1.4. Instituição ............................................................................................................................................................27 - 8 - BENS 3.1.5. Extinção do bem de família ................................................................................................................................. 27 3.2. Bem de Família Legal ............................................................................................................................ 27 3.3. Impenhorabilidade ............................................................................................................................... 28 3.4. Bens Gravados com Cláusula de Inalienabilidade .................................................................................. 29 4. Coisas fora do Comércio ............................................................................................................................... 32 5. Coisas sem dono .......................................................................................................................................... 34 5.1. Bens de natureza arqueológica ou pré-histórica .................................................................................... 34 6. Bens Abandonados ...................................................................................................................................... 36 7. Bens Perdidos .............................................................................................................................................. 38 8. Bem Ambiental ............................................................................................................................................ 40 9. Animais ........................................................................................................................................................ 42 9.1. Animais no Direito de Família ............................................................................................................... 42 9.2. Projetos de Lei ...................................................................................................................................... 42 9. Índice ........................................................................................................................................................... 44 10. Referências ................................................................................................................................................ 46 - 9 - BENS 1. Notas Introdutórias O Direito regula as relações sociais e protege tudo o que for de interesse da sociedade, sendo esse "tudo" o que conhecemos por objeto do Direito, base sobre a qual se desenvolvem as condutas humanas. Assim, surge o conceito de bens, que são coisas materiais ou imateriais com valor econômico ou jurídico, que podem ser objeto de uma relação jurídica. O Código Civil não define bens, pode-se compreender bem como objetos tangíveis (coisas) ou ideias (bens imateriais) que tenham utilidade para as pessoas, além de poder ser objetos de relações jurídicas. A doutrina faz uma distinção entre coisas e bens, sendo a coisa tudo que existe objetivamente excluindo o homem, enquanto os bens são coisas, porém suscetíveis de apropriação e tem um valor econômico. Dessa forma, coisa constitui gênero e o bem a espécie - coisa que proporciona ao homem uma utilidade sendo suscetível de apropriação. Todos os bens são coisas; porém nem todas as coisas são bens. Há muitas divergências doutrinárias sobre as diferenças entre bens e coisas. No entanto, parece mais adequado adotarmos o entendimento de que coisa é gênero da qual bem é espécie: coisa é o que proporciona ao homem uma utilidade, sendo suscetível de apropriação, e bem são coisas com interesse econômico ou jurídico. Conceituação de Bens Definição Autor(es) É tudo que nos agrada Caio Mário da Silva Pereira São coisas que, por serem úteis e raras, são suscetíveis de apropriação e contêm valor econômico Silvio Rodrigues Conceituação de Coisas Definição Autor(es) São materiais e concretas, enquanto que se reserva para designar imateriais ou abstratos o nome bens, em sentido estrito Caio Mário da Silva Pereira É tudo que existe objetivamente, com exclusão do homem Silvio Rodrigues Compreendido a visão sobre bens e coisas, tem-se a percepção dos seres vivos. Quanto aos animais, são enquadrados atualmente como coisas dentro do Direito Brasileiro. Todavia, há uma tendência em se sustentar que são sujeitos de direito e não devem ser tratados como coisas, mas até como um terceiro gênero, assim como já ocorrem em outros países como Alemanha e Suíça, entre outros, que dá aos animais um tratamento diferente das coisas, remetendo a uma legislação específica. O tema está aprofundado no capítulo 9 desta obra. A importância dos bens está além de uma relação material, pois como se extraí da Teoria do Patrimônio Mínimo devem ser assegurados um mínimo de direitos patrimoniais para que as pessoas possam viver com dignidade. Esta Teoria pode ser observada, por exemplo, no Código Civil quando “é nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador” (art. 548 do CC/2002) ou “o incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes” (art. 928 do CC/2002). Coisas Bens - 10 - BENS - 11 - BENS 2. Classificações dos Bens O Código Civil de 2002 apresenta algumas classificações entre os artigos 79 a 103, apresenta a classificação dos bens em três grandes grupos, que são subdivididos em categorias, são eles: Bens considerados em si mesmos (podem ser móveis e imóveis; fungíveis e infungíveis; consumíveis e inconsumíveis; divisíveis e indivisíveis; singulares e coletivos); Bens reciprocamente considerados (podem ser principais e acessórios); e Bens em relação a seus titulares (podem ser públicos e privados). Porém outras são apresentadas pela doutrina. 2.1. Quanto a materialidade Esta classificação não está prevista em lei, porém está presente ao longo do ordenamento jurídico. Na prática, os bens corpóreos são objetos de contrato de compra e venda, enquanto os bens incorpóreos são objetos de contratos de cessão (transferência a outrem). Mas ambos podem integrar o patrimônio de uma pessoa. 2.1.1. Bens corpóreos Os bens corpóreos, também são conhecidos como materiais, tangíveis ou concretos, são aqueles que possuem existência física, ou seja, existência material, podendo ser tocados. Exemplo Terrenos, edificações, joias, veículos, dinheiro, livros etc. 2.1.2. Bens incorpóreos Os bens incorpóreos, também conhecidos imateriais, intangíveis ou abstratos, são aqueles não existem fisicamente (possuem apenas existência abstrata). Exemplo Programas de computador (software), concessões obtidas para a exploração de serviços públicos, fundo de comércio (ponto comercial), etc. Ainda dentro desta classificação “os perfis em redes sociais, quando explorados com finalidade empresarial, podem se caracterizar como elemento imaterial do estabelecimento empresarial” (Enunciado nº 95 da III Jornada de Direito Comercial do CJF/STJ). O Código Penal brasileiro, por exemplo, traz tipos próprios para atos ilícitos praticados contra a propriedade imaterial (bens incorpóreos), como a violação de direito autoral (art. 184), além de haver expressa disciplina de outros crimes contra a propriedade intelectual (patentes, desenhos industriais, marcas etc.) na Lei nº 9.279/1996, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. A condição de incorpóreo não pode ser confundida com a materialidade dos títulos de crédito que servem de suporte para a demonstração um direito. 2.2. Quanto à mobilidade Os bens móveis estão classificados nos artigos 79 a 81 do Código Civil enquanto os bens imóveis do 82 a 84. Porém a doutrina aprimorou esta classificação. A distinçãolegal tem especial importância prática, pois a alienação de bens imóveis reveste-se de formalidades não exigidas para os móveis. A exemplo do inciso I do art. 1.647 do CC/2002 em que nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta, alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis. 2.2.1. Bens imóveis O Código Civil de 2002 considera que “são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente” (art. 79 do CC/2002), ainda “consideram-se imóveis para os efeitos legais” (art. 80 do CC/2002): “os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram” (art. 80, I do CC/2002) e “o direito à sucessão aberta” (art. 80, II do CC/2002). Da mesma forma, que “não perdem o caráter de imóveis” (art. 81 do CC/2002): “as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local” (art. 81, I do CC/2002) e “os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem” (art. 81, II do CC/2002). Os bens imóveis não podem ser removidos ou transportados de um lugar para o outro sem que haja alteração em sua substância ou da destinação econômico- social, uma vez que “são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem - 12 - BENS alteração da substância ou da destinação econômico-social” (art. 82 do CC/2002). Ocorre que com avanço da engenharia e da ciência em geral esse conceito perdeu parte de sua força. Atualmente há modalidades de imóveis que não se amoldam perfeitamente a este conceito (ex: edificações que, separadas do solo, conservam sua unidade, podendo ser removida para outro local - arts. 81, I e 83, CC/2002). O Código anterior definia que “são bens imóveis” (art. 43 do CC/1916): “o solo com a sua superficie, os seus accessorios e adjacencias naturaes, comprehendendo as arvores, etc e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo” (art. 43°, I do CC/1916), “tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios e construções, de modo que se não possa retirar sem destruição, modificação, fratura, ou dano” (art. 43°, II do CC/1916) e “tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade” (art. 43, III do CC/1916). Ainda “consideram-se imóveis para os efeitos legais (art. 44 do CC/1916): “os direitos reais sobre imóveis, inclusive o penhor agrícola, e as ações que os asseguram” (art. 44°, I do CC/1916), “as apólices da dívida pública oneradas com cláusula de inalienabilidade” (art. 44, II do CC/1916) e “o direito à sucessão aberta” (art. 44, III do CC/1916). No qual “os bens de que trata o art. 43, n. III, podem ser, em qualquer tempo, mobilizados” (art. 45 do CC/1916), porém “não perdem o caráter de imóveis os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele mesmo se reempregarem” (art. 46 do CC/1916). Os bens imóveis podem ser divididos em: imóveis por sua própria natureza (ou essência) e imóveis por acessão física, industrial ou artificial. 2.2.1.1. Bens imóveis por sua própria natureza Os bens imóveis por sua própria natureza ou essência é o solo (terreno) e tudo quanto se lhe incorporar naturalmente (árvores, frutos pendentes etc.), mais adjacências (espaço aéreo e subsolo), legalmente “são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social” (art. 82 do CC/2002). As árvores destinadas ao corte, utilizadas pela indústria madeireira, são consideradas bens móveis por antecipação 2.2.1.2. Bens imóveis por acessão física, industrial ou artificial Os bens imóveis por acessão física, industrial ou artificial é tudo que o homem incorporar permanentemente ao solo, não podendo removê-lo sem gerar a destruição, a sua modificação ou gerar danos. Também são considerados bens imóveis, os bens móveis incorporados ao solo por ação humana. Exemplo Um caminhão de tijolos, cimento, caibros, etc. São bens móveis. Quando se realiza uma construção, sendo incorporados ao solo pela aderência física, passam a ser imóveis, pois não podem ser retirados sem causar dano à construção onde estão. Não perdem o caráter de imóvel (art. 81 do CC/2002), as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local (ex: “casa pré- fabricada” transportada de uma localidade para outra) e os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem (telhas retiradas de uma casa para reforma do telhado, sendo reempregado posteriormente). 2.2.1.3. Bens imóveis por acessão intelectual Os bens imóveis por acessão intelectual ou destinação do proprietário são os bens móveis que aderem intencionalmente a um bem imóvel pela vontade do proprietário, para exploração industrial, aformoseamento ou comodidade, constituindo uma ficção jurídica. Exemplo Um trator destinado a uma melhor exploração de propriedade agrícola, máquinas de uma fábrica têxtil, para aumentar a produtividade da empresa, veículos, animais e até objetos de decoração de uma residência. Seguindo a doutrina moderna, o Código qualifica estes bens como pertenças, onde a coisa deve ser colocada a serviço do imóvel e não da pessoa, constituindo, portanto, a categoria de bens acessórios, nesse sentido há os doutrinadores Maria Helena Diniz, Flávio Tartuce, Álvaro Villaça Azevedo. Anote-se que há julgados que admitem tal entendimento: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. DECRETO-LEI N. 911/69. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. PESSOA JURÍDICA. TESES DE OCORRÊNCIA DE SIMULAÇÃO, NOVAÇÃO E DA AUSÊNCIA DE LIBERAÇÃO DE RECURSOS RECHAÇADA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. MORA CARACTERIZADA. BEM DADO EM GARANTIA JÁ PERTENCENTE AO PATRIMÔNIO DO DEVEDOR. POSSIBILIDADE. SÚMULA 28 DO STJ. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL POR ACESSÃO INTELECTUAL. VIABILIDADE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. TJ-SC - AC: 501022 SC 2007.050102-2, Relator: Ricardo Fontes, Data de Julgamento: 04/04/2008, Primeira Câmara de Direito Comercial, Data de Publicação: Apelação Cível n. , de Pomerode Vale citar que “não persiste no novo sistema legislativo a categoria dos bens imóveis por acessão intelectual, não obstante a expressão ‘tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente’, constante da parte final do art. 79 do Código Civil” (Enunciado nº 11 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ). 2.1.1.1. Bens imóveis por disposição legal Os bens que são considerados imóveis pois o legislador assim resolveu enquadrá-los (art. 80 do CC/2002), possibilita, como regra, receber maior segurança e proteção jurídica nas - 13 - BENS relações que os envolve. Trata-se, também, de uma ficção jurídica1. São bens imóveis por disposição legal: - Direito à sucessão aberta, - Direitos reais sobre os imóveis, Penhor agrícola e as ações que o asseguram, jazidas e as quedas d’água com aproveitamento para energia hidráulica são consideradas bens distintos do solo onde se encontram (arts. 20, inciso IX e 176, CRFB/88). 2.2.2. Bens móveis Os móveis são divididos em três categorias distintas: por natureza; por antecipação; e por determinação da lei. Os móveis por natureza são os bens que se movimentam por força própria (chamados de semoventes, como os animais) ou alheia; por antecipação são os bens incorporados ao solo, mas que se destinam à separação, como uma árvore que se tornará lenha; os móveis por determinação legal são por vontade do legislador. São aqueles que podem ser removidos ou transportados, de um lugar para outro, por força própria ou alheia, sem que haja a alteração da substância ou da destinação econômico-social (art. 82 do CC/2002). 2.2.2.1. Bens móveis por natureza São os bensque podem ser transportados de um local para outro sem a sua destruição por força alheia, ou que possuem movimento próprio. No qual força alheia são os bens móveis propriamente ditos - carro, cadeira, livro etc., enquanto força própria (suscetíveis de movimento próprio) são os semoventes, ou seja, os animais2 de uma forma geral (bois, cavalos, carneiros etc.). Os semoventes são os bens que se movem de um lugar para outro, por movimento próprio, como é o caso, seguindo entendimento tradicional, dos animais. Vale destacar, porém, que há forte tendência a dar aos animais um status diferenciado, não mais os identificando como “coisas”, 1 Ficção jurídica: conceito criado pela doutrina, para explicar casos que aparentemente são contrários a lei, porém precisam de soluções que satisfaçam a sociedade. 2 Registre-se que está tramitando no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Senado nº 3670/2015, dispondo expressamente que os animais não são embora não se lhes seja firmemente reconhecida ainda a condição de sujeitos de direitos. Com efeito, no julgamento do REsp 1713167/SP, decidiu a 4.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, seguindo o voto do Ministro Relator Luis Felipe Salomão, garantir o direito de um homem a visitar sua cadela, que ficou com a ex-companheira na separação. Trata- se de uma demanda que não deve ser mais interpretada como uma futilidade, mas sim como reflexo de uma nova sociedade, que cada vez mais valoriza o convívio com os animais. “Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio” (art. 84 do CC/2002), assim os bens materiais destinados a uma construção, enquanto não empregados, conservam a sua mobilidade sendo, por isso, denominados bens móveis propriamente ditos. 2.2.2.2. Bens móveis por antecipação São os bens que por vontade humana pode mobilizar bens imóveis em função da sua finalidade econômica. Exemplo Uma árvore é um bem imóvel; no entanto se ela pode ser plantada especialmente para corte futuro (fábrica de papel, transformação em lenha etc.). Portanto, embora imóvel tem como finalidade final, ser um bem móvel. Assim, mesmo que temporariamente imóvel isto não lhe retira o seu caráter de bem móvel, em razão de sua finalidade. Outros exemplos: Os frutos de um pomar que ainda estão no pé, mas destinados à venda (safra futura); pedras e metais aderentes ao imóvel etc. O que se percebe, é que há uma situação oposta à imobilização por acessão física industrial. A segunda parte do art. 84 do CC/2002 dispõe que, no caso de demolição, os bens imóveis podem ser mobilizados, ocorrendo a antecipação. 2.2.2.3. Bens móveis por determinação legal Por vontade do legislador, “consideram-se móveis para os efeitos legais” (art. 83 do CC/2002): “as energias que tenham valor econômico” (art. 83, I do CC/2002), “os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes” (art. 83, II do CC/2002) e “os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações” (art. 83, III do CC/2002). As energias que tenham valor econômico: a energia elétrica, embora não seja um bem corpóreo, é considerada pela lei como sendo um bem móvel. Observem que o art. 155, §3° do Código Penal também a equipara com um bem móvel, podendo ser objeto do crime de furto. Direitos reais sobre bens móveis e as ações correspondentes: ex.: direito de propriedade e de usufruto coisas, o que vai ao encontro de anseios também manifestados em outros países. Trata-se de uma demanda que não deve ser mais interpretada como uma futilidade, mas, sim, como um reflexo de uma nova sociedade, que cada vez mais valoriza o convívio com os animais. Bens Móveis Por natureza Por antecipação Por determinação legal - 14 - BENS sobre bens móveis etc. Direitos pessoais de caráter patrimonial e as respectivas ações. Direitos autorais, propriedade industrial (direitos oriundos do poder de criação e invenção da pessoa), quotas e ações de capital em sociedades etc. Cabe esclarecer que os navios e aeronaves são bens móveis especiais ou sui generis. Apesar de serem móveis pela natureza ou essência, são tratados pela lei como imóveis, necessitando de registro especial e admitindo hipoteca. Justamente porque pode recair também sobre navios e aviões, pelo seu caráter acessório e pelo princípio de que o acessório deve seguir o principal, a hipoteca, direito real de garantia, pode ser bem móvel ou imóvel. No Código Civil anterior estava previsto que “são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia” (art. 47 do CC/1916), ainda “consideram-se móveis para os efeitos legais” (art. 48 do CC/1916): “os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes” (art. 48°, I do CC/1916), “os direitos de obrigação e as ações respectivas” (art. 48°, II do CC/1916) e “os direitos de autor” (art. 48°, III do CC/1916). Sendo que “os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam a sua qualidade de móveis, readquirem, em vem de readquirindo essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio” (art. 49 do CC/1916). 2.3. Quanto à Fungibilidade Os bens fungíveis e infungíveis estão previstos no artigo 85 do Código Civil. O atributo da fungibilidade, em geral, decorre da natureza do bem, mas nem sempre é assim. A vontade das partes poderá, por exemplo, tornar um bem essencialmente fungível em bem infungível. Como exemplo o caso do empréstimo gratuito de uma cesta de frutas apenas para a ornamentação de uma mesa, de modo que o bem deverá ser devolvido ao final da celebração, não se admitindo seja substituído por outro, trata-se portando do comodato ad pompam. A fungibilização também pode decorrer do valor histórico de um determinado bem. Por exemplo, um vaso da dinastia Ming é, hoje, sem dúvida, um bem infungível enquanto registro de uma época remota, mas, em seu próprio tempo, nada mais era do que um utensílio doméstico perfeitamente substituível. A distinção é de grande importância prática, pois haverá casos que as questões jurídicas no direito contratual uma vez que em razão da fungibilidade os contratos de mútuo e comodato que têm como elemento diferenciador justamente a natureza do bem fungível ou infungível, respectivamente, desta relação de empréstimo. No direito obrigacional, o credor de coisa infungível não pode ser obrigado a receber outra coisa, ainda que mais valiosa, segundo enuncia o art. 313 do Código Civil. Também relacionada com as obrigações, é pertinente lembrar que a compensação, forma de pagamento indireto, efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis (art. 369 do CC/2002). O Código Civil anterior previa que “são fungíveis os móveis que podem, e não fungíveis os que não podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade” (art. 50 do CC/1916). 2.3.1. Bens infungíveis São os bens que possuem alguma característica especial, que os tornam distintos dos demais, não podendo ser substituídos por outros, mesmo que da mesma espécie, qualidade e quantidade. São bens considerados em sua específica individualidade, pois, de alguma forma, estão devidamente personalizados ou individualizados. Exemplo Imóveis de uma forma geral, veículos, um quadro famoso etc. Os veículos são bens infungíveis, característica que também pode estar relacionada com os bens móveis, eis que todos os automóveis são identificados pelo número do chassi. Além disso, justifica-se o fato de que os veículos são bens complexos, com características próprias, a fundar a sua infungibilidade, para fins contratuais, por exemplo. Todos os bens imóveis são personalizados, eis que possuem registro, daí serem infungíveis. 2.3.2. Bens fungíveis “São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade”(art. 85 do CC/2002), como gado, peças de máquinas e cereais; bens infungíveis são os corpos certos, que não podem ser substituídos por outros do mesmo gênero, qualidade ou quantidade, como uma obra de arte, por exemplo. São os bens que se contam, se medem ou se pesam e não se consideram objetivamente como individualidades. Exemplo Uma saca de arroz, uma resma de papel, gêneros alimentícios de uma forma geral, dinheiro. 2.4. Quanto à Consuntibilidade Os bens consumíveis ou inconsumíveis estão previstos no artigo 86 do Código Civil. Assim, a consuntibilidade pode ser de fato, como os alimentos, ou de direito, como o dinheiro. Podem ser consumíveis de direito as mercadorias de um estoque, que, ao serem adquiridas pelo consumidor, passam a ser inconsumíveis, ou seja, permitem o uso continuado sem que se verifique sua destruição total ou parcial. Há certos direitos que não podem recair sobre bens consumíveis, como o direito real de usufruto. Se tal ocorrer, surge a figura do chamado usufruto impróprio ou quase usufruto. - 15 - BENS Nada impede seja considerado inconsumível, pela vontade das partes, um determinado bem naturalmente consumível: uma garrafa rara de licor, apenas exposta à apreciação pública. Não se pode confundir a fungibilidade com a consuntibilidade física ou fática, apesar do tratamento conjunto na Parte Geral do Código Civil de 2002. Ilustrando, um bem pode ser consumível e ao mesmo tempo infungível, caso da última garrafa de uma bebida famosa. O bem também pode ser inconsumível e fungível, caso de uma ferramenta ou de um talher. O Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 26, traz classificação muito próxima da relacionada com a consuntibilidade física ou fática, porém são classificações distintas. Pela Lei nº 8.078/1990, os produtos ou bens podem ser classificados em duráveis e não duráveis. Os bens duráveis são aqueles que não desaparecem facilmente com o consumo, enquanto os não duráveis não têm permanência com o uso. Os prazos para reclamação de vícios decorrentes de tais produtos são de 90 e 30 dias, respectivamente, contados da tradição ou entrega efetiva da coisa (quando o vício for aparente) e do conhecimento do problema (quando o vício for oculto). 2.4.1. Bens consumíveis “São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação” (art. 86 do CC/2002). A consuntibilidade física é um atributo dos bens cujo uso importa na destruição imediata da própria coisa. Exemplo Gêneros alimentícios, bebidas, lenha, cigarro, giz, dinheiro, gasolina, etc. No Código Civil anterior estava previsto que “são consumíveis os bens móveis, cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados a alienação” (art. 51 do CC/1916). 2.4.2. Bens inconsumíveis São os que permitem reiterados usos sem refletir na sua destruição imediata (inconsuntibilidade física), sendo a sua destruição em decorrência do perecimento progressivo e natural. Exemplo Roupas de uma forma geral, automóvel, casa, etc., ainda que haja possibilidade de sua destruição em decorrência do tempo. Também são bens inconsumíveis, os inalienáveis (inconsuntibilidade jurídica). 2.4.3. Bens destinados à alienação Como um aparelho celular vendido em uma loja especializada, adquirem, por força de lei, a natureza de consumíveis. Por outro lado, nada impede seja considerado inconsumível, pela vontade das partes, um determinado bem naturalmente consumível: uma garrafa rara de licor, apenas exposta à apreciação pública. 2.5. Quanto à sua Durabilidade De acordo com o Código de Defesa do Consumidor “o direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em” (art. 26 do CDC) “trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis” (art. 26, I do CDC), e em “noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis” (art. 26, II do CDC). 2.5.1. Bens não duráveis Os bens não duráveis são feitos para serem consumidos imediatamente. Exemplo Sorvete de casquinha. 2.5.2. Bens duráveis São aqueles que podem ser utilizados repetidas vezes, por um determinado período. Exemplo Máquina de lavar. 2.6. Quanto à sua Divisibilidade Os bens divisíveis e indivisíveis estão previstos nos artigos 87 e 88 do Código Civil, de modo que a indivisibilidade pode decorrer da natureza do bem, como uma casa, por exemplo, por outro lado há a indivisibilidade jurídica ou legal, que se dá com a imposição da lei, como no caso da herança, e a indivisibilidade convencional, na qual as partes de determinado negócio concordam que certa coisa será indivisível. 2.6.1. Bens divisíveis Os “bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam” (art. 87 do CC/2002), portanto podem se fracionar em porções reais e distintas, formando cada qual um todo perfeito, sem alteração em sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam. Exemplo Uma folha de papel, uma quantidade de arroz, milho, etc. Se repartirmos uma saca de arroz, cada metade conservará as mesmas qualidades do produto. Definia o Código Civil anterior que “coisas divisíveis são as que se podem partir em porções reais e distintas, formando cada qual um todo perfeito” (art. 52 do CC/1916). - 16 - BENS 2.6.2. Bens indivisíveis São os bens que não podem ser fracionados em porções, pois deixariam de formar um todo perfeito. Ex.: uma joia, um anel, um par de sapatos etc. Definia o Código Civil anterior que “são indivisíveis” (art. 53 do CC/1916): “os bens que se não podem partir sem alteração na sua substância” (art. 53°, I do CC/1916) e “os que, embora naturalmente divisíveis, se consideram indivisíveis por lei, ou vontade das partes” (art. 53°, II do CC/1916). No entanto a indivisibilidade pode ser subdividida em: 2.6.2.1. Bens indivisíveis por sua própria natureza Exemplo Um cavalo, um relógio, um quadro etc. 2.6.2.2. Bens indivisíveis por determinação legal ou judicial Alguns bens poderiam ser divididos fisicamente, porém é a lei que os torna indivisíveis. Exemplo A herança (artigo 1. 791 do CC/2002); o módulo rural (art. 65 do Estatuto da Terra); os lotes urbanos, a hipoteca, etc. 2.6.2.3. Bens indivisíveis por convenção “Os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes” (art. 88 do CC/2002), assim um bem fisicamente é divisível pode se tornar indivisível por força da autonomia privada. Exemplo Entregar 100 sacas de café. Em tese é uma obrigação divisível (eu poderia entregar 50 sacas hoje e 50 na semana que vem). Mas pode ser pactuado no contrato a indivisibilidade da prestação: ou seja, todas as 100 sacas devem ser entregues hoje. 2.7. Quanto à individualidade Os bens singulares e coletivos, previstos nos artigos 89 a 91 do Código Civil, diferem-se em virtude da união dos elementos que os caracterizam, assim os bens singulares são aqueles que, embora reunidos, podem ser considerados independentes dos demais, enquanto os bens coletivos são os que se encontram agregados em um todo: os bens coletivos são constituídos por várias coisas singulares, consideradas em conjunto e formando um todo individualizado. No Código Civil anterior “as coisas simples ou compostas, materiais ou imateriais, são singulares ou coletivas” (art. 54 do CC/1916): “singulares, quando, embora reunidas, se consideram por si, independentemente das demais” (art. 54°, I do CC/1916) e “coletivas, ou universais, quando se encaram agregadas em todo” (art. 54°, II do CC/1916). De modo que “nas coisas coletivas, em desaparecendo todos os indivíduos, menos um, se tem por extinta a coletividade” (art. 55 do CC/1916) e “na coletividade,fica sub-rogado ao indivíduo o respectivo valor, e vice-versa”. (art. 56 do CC/1916). Nota-se que “o patrimônio e a herança constituem coisas universais, ou universalidade, e como tais subsistem, embora não constem de objetos materiais” (art. 57 do CC/1916). 2.7.1. Bens Singulares “São singulares os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais” (art. 89 do CC/2002). Os bens singulares também são conhecidos como bens individuais. Exemplo Um cavalo, uma casa, um carro, uma joia, um livro etc. Os doutrinadores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho apontam uma divisão a esta classificação no qual podem ser simples, quando as suas partes componentes se encontram ligadas naturalmente (uma árvore, um cavalo), ou compostos, quando a coesão de seus componentes decorre do engenho humano (um avião, um relógio). Para a sua caracterização, portanto, deve-se levar em conta o bem em relação a si mesmo. 2.7.2. Bens Coletivos O bem coletivo ou universal “constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária” (art. 90 do CC/2002), ou seja são os bens que se encontram agregados em um todo, tratados como uma universalidade. Esta universalidade é a pluralidade de bens singulares autônomos que, embora ainda conservem sua identidade, são consideradas em seu conjunto, formando um todo único (universitas rerum), passando a ter individualidade própria, distinta da dos seus objetos componentes, formando um todo homogêneo, tratando-se de um gênero que tem como espécies: de fato ou de direito. Não há necessidade de que os bens pertençam à mesma pessoa, conforme entendimento extraído no enunciado em que "a pertinência subjetiva não constitui requisito fundamental para a configuração das universalidades de fato e de direito” (Enunciado nº 288 da IV Jornada de Direito Civil do CJF/STJ). 2.7.2.1. Universalidade de Fato nos bens coletivos É um conjunto de bens singulares, corpóreos e homogêneos, agrupados pela vontade humana. Exemplo Biblioteca (livros), pinacoteca (quadros), rebanho (bovino, ovino, suíno, caprino etc.) Embora apresentado o enunciado nº 288, há um entendimento doutrinário que devem pertencer à mesma pessoa e ter destinação unitária (fim específico) para caracterizar universalidade de fato, pois se o bem não pertencer à mesma pessoa não haverá o caráter homogêneo - 17 - BENS exigido para a universalidade fática. Este é o entendimento Flávio Taruce, Maria Helena Diniz, Gustavo Tepedino, Heloísa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes. 2.7.2.2. Universalidade de Direito nos bens coletivos “Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico” (art. 91 do CC/2002) que a ordem jurídica atribui caráter unitário. Exemplo O patrimônio; a herança (ou espólio), a massa falida etc. A cerca do patrimônio, doutrinadores como Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald consideram como um bem coletivo. Importante citar que “os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias” (art. 90, parágrafo único do CC/2002). 2.8. Bens Principais e Bens Acessórios Os bens reciprocamente considerados estão definidos nos artigos 92 a 97 do Código Civil. Esta forma de classificação é feita a partir de uma comparação entre os bens. Quanto aos bens reciprocamente considerados, há os bens principais e os bens acessórios. Os bens acessórios sempre acompanham o bem principal e se dividem em frutos, produtos e pertenças. 2.8.1. Bens Principais O bem “principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal” (art. 92 do CC/2002), ou seja, independentemente de outros exercem função e finalidades autônomas. Exemplo O solo, um crédito, uma joia etc. Constava no Código anterior que bem “principal é a coisa que existe sobre si, abstrata ou concretamente. Acessória, aquela cuja existência supõe a da principal” (art. 58 do CC/1916). 2.8.2. Bens Acessórios Os bens acessórios ou dependentes são os bens cuja existência pressupõe a existência de outro bem; sua existência e finalidade dependem de um bem principal, como ocorre com um fruto em relação à árvore, uma árvore em relação ao solo, um prédio em relação ao solo, os juros etc. Cuida-se para a aplicação do princípio da gravitação jurídica, pois “os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso” (art. 94 do CC/2002). Assim o bem acessório segue o principal (acessorium sequitur suum principale), salvo disposição especial em contrário. É interessante esclarecer que esta regra não está mais explícita no atual Código Civil, no entanto a doutrina é unânime em considerar que ela ainda prevalece em nosso direito. Por essa razão, quem for o proprietário do principal, em regra, será também o do acessório. Tal regra estava prevista Código Civil anterior no qual “salvo disposição especial em contrário, a coisa acessória segue a principal” (art. 59 do CC/1916). Outro efeito desta relação, “a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso” (art. 233 do CC/2002), portanto trata-se do princípio da gravitação jurídica no direito obrigacional. Os bens acessórios, embora sempre acompanhem os bens principais, nem sempre estão a eles vinculados, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. É o que ocorre com as benfeitorias voluptuárias em uma compra e venda, por exemplo: podem ser retiradas do bem imóvel sem prejuízo à sua substância. São bens acessórios: frutos e produtos. No CC/2016 havia um detalhamento sobre os acessórios de modo que “entram na classe das coisas acessórias os frutos, produtos e rendimentos” (art. 60 do CC/1916). Ainda “são acessórios do solo” (art. 61 do CC/1916): “os produtos orgânicos da superfície” (art. 61°, I do CC/1916), “os minerais contidos no subsolo” (art. 61°, II do CC/1916) e “as obras de aderência permanente, feitas acima ou abaixo da superfície” (art. 61°, III do CC/1916). “Também se consideram acessórias da coisa todas as benfeitorias, qualquer que seja o seu valor, exceto” (art. 62 do CC/1916): “a pintura em relação à tela” (art. 62°, I do CC/1916), “a escultura em relação à matéria prima” (art. 62°, II do CC/1916) e “a escritura e outro qualquer trabalho gráfico, em relação à matéria prima que os recebe (art. 614)” (art. 62°, III do CC/1916). 2.8.2.1. Frutos São as utilidades que a coisa principal produz periodicamente, no qual a sua percepção não afeta o bem principal. “Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico” (art. 95 do CC/2002). Os frutos podem ser considerados: naturais, industriais e civis. Naturais Quando decorrentes da essência do bem, são gerados pelo bem principal sem necessidade da intervenção humana direta. Decorrem do desenvolvimento orgânico vegetal (laranja, soja) ou animal (crias de um rebanho). Industriais Quando decorrem da atividade industrial humana (bens manufaturados). Civis - 18 - BENS São utilidades que a coisa frutífera periodicamente produz, viabilizando a percepção de uma renda (juros, aluguel), parte da doutrina considera autônomo e categoriza como rendimentos. Exemplo Aluguel Quanto à ligação com a coisa principal a) colhidos ou percebidos – são os frutos já destacados da coisa principal, mas ainda existentes; b) pendentes – são aqueles que ainda se encontram ligados à coisa principal, não tendo sido, portanto, destacados; c) percipiendos – são aqueles que deveriam ter sido colhidos, mas não o foram; d) estantes – são os frutos já destacados,que se encontram estocados e armazenados para a venda; e) consumidos – são os que não mais existem. 2.8.2.2. Produtos São bens se são retirados do principal, mas gera alteração da sua substância, com a diminuição da quantidade até o seu esgotamento. Consideram-se os bens acessórios que saem do bem principal, diminuindo a sua quantidade, como o ouro retirado de uma mina. Já as pertenças são bens destinados a servir um outro bem principal, como os móveis de uma casa, por exemplo. As pertenças se diferem das partes integrantes, pois estas estão unidas ao bem principal, como as janelas e portas de uma casa. Exemplo Pedras de uma pedreira, minerais de uma jazida, carvão mineral, lençol petrolífero etc. Os frutos e os produtos, mesmo que não separados do bem principal, já podem ser objeto de negócio jurídico (art. 95, CC/2002). Exemplo Posso vender uma possível safra de laranjas que ainda estão ligadas ao principal, por ser prematura a sua colheita no momento do contrato. Cabe esclarecer que o sentido de produto no âmbito do Direito Civil, é bem diferente daquele tratado pelo Direito do Consumidor, exposto no art. 3º, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), produto é qualquer bem colocado no mercado de consumo, seja ele móvel ou imóvel, material ou imaterial. 2.8.2.3. Benfeitorias Há ainda as benfeitorias, que são introduzidas em um bem para conservá-lo ou melhorar a sua utilidade. São obras ou despesas que são realizadas pelos homens em um bem para conservá-lo, melhorá-lo ou embelezá-lo. “Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor” (art. 97 do CC/2002), ou seja, se for acrescido pela natureza não é considerado como benfeitoria. Note-se “não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor” (art. 97 do CC/2002). Lógica já prevista no CC/1916, “não se consideram benfeitorias ou melhoramentos sobrevindos à coisa sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor” (art. 64 do CC/1916). A identificação da natureza da benfeitoria não é fácil, em função da circunstância de que os bens não têm uma única utilidade intrínseca e absoluta. Exemplo Uma piscina pode ser uma benfeitoria voluptuária (em uma mansão), útil (em uma escola) ou necessária (em uma escola de hidroginástica). Compreender as diferenças implicam em diversas questões jurídicas, a citar a Lei de Locação (Lei nº 8.245/1991) em que “salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção” (art. 35 da Lei nº 8.245/1991), enquanto “as benfeitorias voluptuárias não serão indenizáveis, podendo ser levantadas pelo locatário, finda a locação, desde que sua retirada não afete a estrutura e a substância do imóvel” (art. 36 da Lei nº 8.245/1991). “As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias” (art. 96 do CC/2002). As benfeitorias seguem a lógica do Código anterior, de modo que “as benfeitorias podem ser voluntárias, úteis ou necessárias” (art. 63 do CC/1916): “são voluntárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual da coisa, ainda que a tornem mais agradável ou sejam de elevado valor” (art. 63°, § 1 do CC/1916), “são úteis as que aumentam ou facilitam o uso da coisa” (art. 63°, § 2 do CC/1916) e “são necessárias as que têm por fim conservar a coisa ou evitar que se deteriore” (art. 63°, § 3 do CC/1916). Necessárias “São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore”. (art. 96, § 3° do CC/2002), se tais benfeitorias não forem realizadas o bem pode perecer. Exemplos Reforços em alicerces, reforma de telhados, substituição de vigamento podre, desinfecção de pomar, etc. Úteis “São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem” (art. 96, § 2° do CC/2002), elas não são indispensáveis, mas se forem feitas darão um maior aproveitamento à coisa. Exemplo - 19 - BENS Construção de uma garagem, de um lavabo dentro da casa, instalação de aparelho hidráulico moderno etc. Voluptuárias “São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor” (art. 96, § 1° do CC/2002). Exemplo Construção de uma piscina, uma churrasqueira, uma pintura artística, um jardim com flores exóticas etc. Esta classificação não é absoluta, pois uma mesma benfeitoria pode enquadrar-se em uma ou outra espécie, dependendo de uma circunstância concreta. Exemplo Uma pintura pode ser necessária em uma casa de praia para evitar uma infiltração ou voluptuária se for apenas para embelezá-la. 2.8.3. Pertenças “São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro” (art. 93 do CC/2002). Exemplo A moldura de um quadro; acessórios de um veículo; um trator destinado a uma melhor exploração de propriedade agrícola, as máquinas utilizadas em uma fábrica, os implementos agrícolas, as provisões de combustível, os aparelhos de ar-condicionado etc. Vale acrescentar que as pertenças não se submetem à regra geral da “gravitação jurídica” (no sentido de que o acessório segue a sorte do principal), nos termos do art. 94 do CC/2002. De acordo com Flávio Tartuce as pertenças podem ser classificadas em essenciais ou não essenciais. Para o autor, se a pertença for essencial ao bem principal seguirá o último, não merecendo aplicação o que consta na primeira parte do art. 94 do CC/2002, pois assim quis o proprietário da coisa principal. Nesse mesmo entendimento há a Maria Helena Diniz. Exemplo Um piano no conservatório musical, logicamente, quando a pessoa compra o conservatório, espera que o piano, pertença essencial, acompanhe o primeiro. Em casos tais, a pertença constitui um bem móvel incorporado a um imóvel, ou seja, um bem imóvel por acessão física intelectual. O mesmo não se pode dizer de um piano que se encontra na casa de alguém, também pertença, mas não essencial, aí sim merecendo aplicação a primeira parte do art. 94 do CC/2002. Esse raciocínio desenvolvido pelos autores demonstra que continua com força total a regra pela qual o acessório segue o principal (princípio da gravitação jurídica). Por outro lado, há aqueles que apresentam entendimento diverso Inácio de Carvalho Neto. Cumpre destacar que a pertença pode surgir por destinação da vontade do proprietário, no qual “para a existência da pertença, o art. 93 do Código Civil não exige elemento subjetivo como requisito para o ato de destinação” (Enunciado nº 535 da VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ). Expõe Flávio Tartuce que “apesar da louvável tentativa do enunciado, fica difícil imaginar um exemplo concreto pertinente em que a pertença surge por razão de ordem objetiva, sem que esteja presente a vontade do proprietário, seja direta ou indiretamente”, no qual parte da doutrina pátria tem sustentado que, para a qualificação de determinada coisa como pertença, é necessária a existência de requisito subjetivo, assentado em ato de vontade do titular da coisa principal ao destinar determinada coisa para atender a finalidade econômico-social de outra. 2.8.4. Partes integrantes Embora não disciplinadas expressamente pela legislação civil, entende-se por partes integrantes os bens acessórios que, unidos a um principal, formam com ele um todo independente, sendo desprovidos de existência material própria, embora mantenham a sua identidade. Exemplo Uma lâmpada em relação a um lustre, pois, mesmo admitindo-se a sua identidade autônoma, carece a lâmpada de qualquer utilidade individual. O Informativode Jurisprudência do STJ nº 594 apresenta o caso envolvendo partes integrantes, no qual houve a adaptação de um veículo introduzindo aparelhos para direção por deficiente físico, após à celebração de alienação fiduciária em garantia do bem, e o devedor fiduciante tem o direito a retirá-los. PROCESSO REsp 1.305.183-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 18/10/2016, DJe 21/11/2016. RAMO DO DIREITO Direito Civil TEMA Alienação fiduciária em garantia. Ação de busca e apreensão. Aparelhos de adaptação para condução veicular por deficiente físico. Pertenças que não seguem o destino do principal (carro). Direito de retirada das adaptações. DESTAQUE Havendo adaptação de veículo, em momento posterior à celebração do pacto fiduciário, com aparelhos para direção por deficiente físico, o devedor fiduciante tem direito a retirá- los quando houver o descumprimento do pacto e a consequente busca e apreensão do bem. - 20 - BENS INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR O cerne da insurgência apreciada pelo STJ limitou-se a definir se devem ser considerados acessórios de veículo automotor os equipamentos viabilizadores de condução por deficiente físico, instalados em automóvel objeto de contrato de financiamento com alienação fiduciária. De início, convém destacar que o Código Civil adotou, dentre outros critérios de classificação, o de bens reciprocamente considerados. Estes serão vistos em relação a si mesmos, a partir de uma relação que se forma entre eles. Encontram-se nessa classe, os bens principais, os acessórios, as pertenças e as benfeitorias. Importa destacar que o novo diploma civil trouxe relevante alteração ao regime de bens reciprocamente considerados. Ao contrário do CC de 1916, no qual imperava a categoria do imóvel por destinação, no Código Civil em vigor, além de expressamente restar consignada a existência das partes integrantes no sistema jurídico, veio a ser regrada, nos artigos 93 e 94, a pertença. Como se verifica da leitura do art. 93, a parte geral do CC/2002 não apresentou um conceito de parte integrante, fazendo tão somente uma referência à categoria para contrapor-se à definição de pertença. Por essa peculiaridade legal, a parte integrante é conceito jurídico indeterminado. Diante desse quadro, parece necessário classificar adequadamente os instrumentos de adaptação para condução veicular por deficiente físico. Nesse sentido, ao afirmar que os instrumentos adaptados ao carro alienado fiduciariamente, eram simplesmente bens acessórios, o Tribunal de origem desconsiderou o fato de que, ainda que sejam acessórios, por vezes, as espécies desse gênero recebem disciplina diametralmente oposta. Exemplo disso são os frutos e as pertenças. Por expressa disciplina legal, seguirão os frutos a sorte do bem principal a que se vinculam. Noutro ponto, as pertenças, em regra, serão autonomamente consideradas e, apenas quando declarado, seguirão a sorte do principal. Ambos acessórios, porém, com destinos diferentes. Não bastasse o tratamento unitário e não distintivo conferido aos bens acessórios pelo Tribunal paulista, houve outro equívoco ao deixar de referir-se às partes integrantes de um bem, conceito que da mesma forma merecia ser considerado na solução da contenda. Com efeito, destinam- se as pertenças a dar alguma qualidade ou vantagem ao bem, fator que lhes fornece o caráter de acessoriedade. Há vinculação com a coisa principal, pois são criadas para lhe imprimir maior serventia, a aumentar a utilização, ou a trazer vantagens no desfrute. Todavia, adverte a doutrina, "mantêm essas coisas a sua individualidade e autonomia, não se incorporando no bem principal, ou constituindo uma unidade". Nessa linha de raciocínio, a pertença, por não ser parte integrante do bem principal, não é alcançada pelo negócio jurídico que o envolver, a não ser que haja imposição legal, ou manifestação das partes nesse sentido. No caso, há um bem principal (automóvel), e também as pertenças, os aparelhos de adaptação para direção por deficiente físico (acelerador e freio manuais), a induzir a aplicação da regra insculpida no art. 94 do CC, segundo a qual aquela espécie de acessórios, as pertenças, não segue o destino do bem principal a que se vinculam. É que o bem principal, o carro, tem "vida" absolutamente independente dos aparelhos de aceleração e frenagem manuais, que a ele se encontram acoplados tão somente para viabilizar a direção por condutor com condições físicas especiais. Se retirados esses aparelhos, o veículo se mantém veículo, não perde sua função ou utilidade, ao revés, recupera sua originalidade. Assim, é direito do devedor fiduciante a retirada das pertenças consistentes nos aparelhos de adaptação para direção por deficiente físico, se anexados por ele ao bem principal e, por óbvio, se realizada a adaptação em momento posterior à garantia fiduciária. 2.8.5. Coisa Ajudante Anote-se o julgado STJ, REsp 1.667.227/RS, 3.ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 26.06.2018, DJe 29.06.2018 que cita o conceito coisa ajudante. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE CAMINHÃO, DADO EM GARANTIA FIDUCIÁRIA EM CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. PROCEDÊNCIA, DECORRENTE DO INADIMPLEMENTO. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO EQUIPAMENTO DE MONITORAMENTO ACOPLADO AO CAMINHÃO. PERTENÇA. RESTITUIÇÃO AO DEVEDOR FIDUCIÁRIO. NECESSIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Ainda que se aplique aos bens acessórios a máxima de direito, segundo a qual "o acessório segue o principal", o Código Civil conferiu tratamento distinto e específico às pertenças, as quais, embora tidas como bens acessórios, pois, destinadas, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de um bem principal, sem dele fazer parte integrante, não seguem a sorte deste, salvo se houver expressa manifestação de vontade nesse sentido, se a lei assim dispuser ou se, a partir das circunstâncias do caso, tal solução for a indicada. 2. O equipamento de monitoramento acoplado ao caminhão consubstancia uma pertença, a qual atende, de modo duradouro, à finalidade econômico-social do referido veículo, destinando-se a promover a sua localização e, assim, reduzir os riscos de perecimento produzidos por eventuais furtos e roubos, a que, comumente, estão sujeitos os veículos utilizados para o transporte de mercadorias, caso dos autos. Trata-se, indiscutivelmente, de "coisa ajudante" que atende ao uso do bem principal. Enquanto concebido como pertença, a destinação fática do equipamento de monitoramento em servir o caminhão não lhe suprime a individualidade e autonomia - o que permite, facilmente, a sua retirada -, tampouco exaure os direitos sobre ela incidentes, como o direito de propriedade, outros direitos reais ou o de posse. 2.1 O inadimplemento do contrato de empréstimo para aquisição de caminhão dado em garantia, a despeito de importar na consolidação da propriedade do mencionado veículo nas mãos do credor fiduciante, não conduz ao perdimento da pertença em favor deste. O equipamento de monitoramento, independentemente do destino do caminhão, permanece com a propriedade de seu titular, o devedor fiduciário, ou em sua posse, a depender do título que ostente, salvo se houver expressa manifestação de vontade nesse sentido, se a lei assim dispuser ou se, a partir das circunstâncias do caso, tal solução for a indicada, exceções de que, no caso dos autos, não se cogita. 2.3 O contrato de financiamento de veículo, garantido por alienação fiduciária, ao descrever o veículo, objeto da avença, não faz nenhuma referência à existência do aludido equipamento e, por consectário, não poderia tecer consideração alguma quanto ao seu destino. Por sua vez, o auto de busca e apreensão, ao descrever o veículo, aponta a existência do equipamento de monitoramento, o que, considerada a circunstância anterior, é suficiente para se chegar a compreensão de que foi o devedor fiduciário o responsável por sua colocação no caminhãopor ele financiado. 3. Recurso especial provido. STJ - REsp: 1667227 RS 2017/0086302-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 26/06/2018, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2018 Esta terminologia foi desenvolvida na doutrina por Gustavo Haical, trata-se indiscutivelmente a coisa que atende ao uso do bem principal, enquanto concebido como pertença, - 21 - BENS a destinação fática do equipamento de monitoramento em servir o caminhão não lhe suprime a individualidade e autonomia, o que permite, facilmente, a sua retirada. 2.9. Quanto a titularidade do domínio A definição ocorre em função da titularidade, o que importa para avaliar se algo é um bem público ou privado repousa sob a natureza jurídica do seu proprietário. Assim os bens privados atendem exclusivamente aos interesses dos seus proprietários, que podem ser pessoas naturais ou jurídicas. Enquanto os bens públicos são aqueles que pertencem aos entes federativos e estão sob sua responsabilidade. Outro modo apresentado pela doutrina para definir o que é um bem público defende que o critério é dado pela finalidade. Nesse contexto, a titularidade é irrelevante, pois o que importa é a destinação dada ao bem, independentemente de pertencer a uma pessoa de Direito Público ou de Direito Privado. Assim, se o bem tem como finalidade a prestação de qualquer serviço público, ele será tratado como um bem público. Outra corrente doutrinária relevante é aquela que integra tanto o critério da titularidade quanto o da finalidade. Assim, ambos os critérios são considerados condições necessárias, mas, tomados isoladamente, são insuficientes para definir o que é e o que não é um bem público. A despeito das divergências doutrinárias, o conceito de bem público é estabelecido de maneira clara, no qual os bens públicos podem ser conforme o Código Civil de 2002. No seu antecessor, “são públicos os bens do domínio nacional pertencentes à União, aos Estados, ou aos Municípios. Todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem” (art. 65 do CC/1916). 3 Art. 20. São bens da União: I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005) V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VI - o mar territorial; VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII - os potenciais de energia hidráulica; IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré- 2.9.1. Bens privados Os bens particulares ou privados se definem por exclusão em razão da omissão legislativa, de modo que são aqueles não pertencentes ao domínio público, mas sim à iniciativa privada, cuja disciplina interessa, em especial, ao Direito Civil. 2.9.2. Bens públicos “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem” (art. 98 do CC/2002). Também considerado bens de Estado, serão aqueles pertencentes à União, aos Estados ou aos Municípios, essa classe de bem, objeto de domínio público, é disciplinado pelo Direito Administrativo. “O critério da classificação de bens indicado no art. 98 do Código Civil não exaure a enumeração dos bens públicos, podendo ainda ser classificado como tal o bem pertencente a pessoa jurídica de direito privado que esteja afetado à prestação de serviços públicos” (Enunciado nº 287 da IV Jornada de Direito Civil do CJF/STJ), de modo que incluiu como bens públicos, aqueles pertencentes as pessoas jurídicas de direito privado que estejam afetados à prestação de serviços públicos, portanto o art. 98 do CC/2002 é meramente exemplificativo (numerus apertus) e não taxativo (numerus clausus). A Carta Magna elenca, em seu art. 203, os bens pertencentes à União. Os bens de domínio do Estado vêm previstos em seu art. 264. Por exclusão, o que não pertencer ao domínio federal ou estadual ingressa no patrimônio público municipal. “São bens públicos” (art. 99 do CC/2002): os de uso comum do povo; os de uso especial; e os dominicais. ➢ Bens de uso comum do povo: “os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças” (art. 99, I históricos; XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. § 1º É assegurada, nos termos da lei, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 102, de 2019) § 2º A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei. 4 Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros; III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União. - 22 - BENS do CC/2002), são bens públicos inalienáveis cuja utilização não se submete a qualquer tipo de discriminação ou ordem especial de fruição, é o caso das praias, estradas, ruas e praças. Como o próprio nome indica, eles são caracterizados em função da destinação ao povo em geral, de modo que todo mundo está em condições de usufruí-los sem qualquer autorização prévia por parte da administração. Porém, embora sejam, via de regra, gratuitos, isso não significa que eles não possam ser eventualmente onerosos, uma vez que não perdem esta característica se o Estado regulamentar sua utilização de maneira onerosa, como no caso dos pedágios em uma estrada. ➢ Bens de uso especial: “os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias” (art. 99, II do CC/2002), são bens públicos inalienáveis cuja fruição, por título especial, e na forma da lei, é atribuída a determinada pessoa, bem como aqueles utilizados pelo próprio Poder Público para a realização dos seus serviços públicos, denominada afetação. São bens de uso especial os prédios e as repartições públicas. Nesse contexto, é correto identificá-los com tudo aquilo que a administração precisa para que os serviços públicos e administrativos possam ser satisfatoriamente executados. Importante frisar que estes bens podem ser tanto móveis quanto imóveis. ➢ Bens dominicais ou dominiais: “os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objetode direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades” (art. 99, III do CC/2002), são bens públicos disponíveis e não afetados à utilização direta e imediata do povo, nem aos usuários de serviços, mas que pertencem ao patrimônio estatal, abrangendo móveis e imóveis, portanto são aqueles que não possuem uma destinação determinada. Podem ser alienados, observadas as exigências da lei. São exemplos de bens dominicais os terrenos de marinha, as terras devolutas, as estradas de ferro, as ilhas formadas em rios navegáveis, os sítios arqueológicos, as jazidas de minerais com interesse público, o mar territorial, entre outros. As divisões dos bens públicos estavam prevista no Código de Civil de 1916. “Os bens públicos são” (art. 66 do 5 Art. 20. São bens da União: I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005) V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; CC/1916): “os de uso comum do povo, tais como os mares, rios, estradas, ruas e praças” (art. 66, I do CC/1916); “os de uso especial, tais como os edifícios ou terrenos aplicados a serviço ou estabelecimento federal, estadual ou municipal” (art. 66, II do CC/1916); e “os dominicais, isto é, os que constituem o patrimônio da União, dos Estados, ou Municípios, como objeto de direito pessoal, ou real de cada uma dessas entidades” (art. 66°, III do CC/1916). “Os bens de que trata o artigo antecedente só perderão a inalienabilidade, que lhes é peculiar, nos casos e forma que a lei prescrever” (art. 67 do CC/1916). O ordenamento brasileiro inclina-se à publicização do regime dos bens pertencentes a empresas públicas, sociedades de economia mista e entidades controladas pelo Poder Público, uma vez que “não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado” (art. 99, parágrafo único do CC/2002) Embora a definição do conceito de bens públicos seja apresentada no Código Civil, a relevância do tema ultrapassa as fronteiras do Direito Civil. Nesse contexto, na medida em que está intimamente relacionada com a administração pública, a noção de bens públicos desempenha um papel central tanto para o Direito Administrativo quanto para o Direito Constitucional. Os recursos naturais, como o mar, os rios e o ar, não podem ser objeto de propriedade. No entanto, contam com regulamentação legal específica e, para fins tão somente de organização teórica, a Constituição Federal as considera bens federais5. A propósito dos bens estaduais e distritais estão no art. 266 da Constituição Federal nos oferece uma lista, também exemplificativa, porém no que diz respeito aos bens municipais, embora não sejam citados explicitamente na Constituição Federal, é certo que eles também são titulares de alguns bens. Nesse contexto, atribui-se aos municípios, por exemplo, as ruas, as praças e os edifícios públicos da administração municipal. Existem muitas espécies de bens públicos. Dentre elas, podem-se destacar algumas, tais como os terrenos de VI - o mar territorial; VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII - os potenciais de energia hidráulica; IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré- históricos; XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. 6 Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros; III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União. - 23 - BENS marinha7, os terrenos acrescidos aos de marinha, os terrenos reservados ou marginais, o mar territorial e a plataforma continental. É muito comum confundir o termo bem público da União, art. 20 da Constituição Federal de 1988 com o termo patrimônio nacional, tal qual apresentado no art. 225, § 4º8, da Constituição. No cerne da confusão está a ideia de que, se um bem é patrimônio nacional, então ele deve necessariamente ser da União. Para desfazê-la, chamamos a sua atenção para o seguinte. Em primeiro lugar, segundo o art. 23, VI e VII, da Constituição, temos que a proteção ao meio ambiente é de competência comum de todos os entes federativos (BRASIL, 1988). Nesse contexto, qualquer dano ambiental acarretará um interesse abstrato e genérico por parte da União. Porém, isso — por si só — não significa que a Justiça Federal terá competência para julgar um caso qualquer que envolva o patrimônio nacional. Em segundo lugar, o art. 109 da Constituição enumera de modo taxativo as competências da Justiça Federal. Além disso, os crimes contra o patrimônio ambiental não constam de modo explícito no rol de incisos do artigo supracitado. De modo que, via de regra, ele será de competência da Justiça Estadual, que possui competência residual. No que tange à disponibilidade, os bens públicos podem ser: indisponíveis por natureza; patrimoniais indisponíveis; e patrimoniais disponíveis. Os bens indisponíveis por natureza são aqueles que não tem uma avaliação fundamentalmente monetária. Os bens de uso comum do povo são geralmente considerados indisponíveis por natureza. Já os bens patrimoniais indisponíveis são aqueles que, a despeito do seu caráter fundamentalmente patrimonial, o poder público não pode dispor, pois a Administração Pública necessita deles para a realização das suas atividades. Por fim, como o próprio nome indica, os bens patrimoniais disponíveis são aqueles que tanto possuem um valor patrimonial estabelecido quanto podem ser alienados pelo Estado. É comum que a doutrina também apresente o conceito de domínio público, o termo não se confunde com o termo bem público. Na base da diferença entre os bens públicos e os bens privados está o regime jurídico a que eles estão sujeitos. Se os bens estiverem sujeitos ao regime jurídico de Direito Público, eles serão públicos e, em função disso, decorrerá uma série de atributos ou características que tem por objetivo a sua 7 Decreto-Lei nº 9.760/1943 Art. 2º - São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831: a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés; b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés. Parágrafo único. Para os efeitos dêste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano. proteção. “O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem” (art. 103 do CC/2002).Mesma lógica do CC anterior, “o uso comum dos bens públicos pode ser gratuito, ou retribuído, conforme as leis da União, dos Estados, ou dos Municípios, a cuja administração pertencerem”. (art. 68 do CC/1916). 2.9.2.1 Características Tipicamente, a doutrina identifica quatro características essenciais aos bens públicos: a inalienabilidade relativa; a impenhorabilidade; a não onerabilidade; e a imprescritibilidade Inalienabilidade relativa A Inalienabilidade relativa, significa, basicamente, que ele não pode ser alienado ou a sua propriedade não pode ser transferida para outrem, pois “os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar” (art. 100 do CC/2002), por outro lado “os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei” (art. 101 do CC/2002). Assim, podemos inferir que a inalienabilidade dos bens públicos não é absoluta, mas apenas relativa, pois, conforme nosso ordenamento jurídico, não basta que um bem seja público para possuir a característica da inalienabilidade, devendo ele também ser de uso público comum do povo ou de uso especial. Impenhorabilidade Ao atribuir a característica da impenhorabilidade aos bens públicos, torna-se possível compreender que eles não podem ser objeto de penhora, isto é, não podem ser alienados para os interesses do credor sejam satisfeitos. Quanto a isso, é importante destacar que, diferentemente do que acontece com a inalienabilidade, a impenhorabilidade aplica-se também aos bens dominicais. Não Onerabilidade Atribuir a característica da não onerabilidade para um bem público significa, basicamente, considerar que ele não pode ser deixado como garantia para algum eventual credor (como, por exemplo, hipotecados). Logo, se o Estado possui alguma dívida, o credor não terá o direito de buscar ressarcimento por meio dos bens públicos. Para tal, conforme mencionado anteriormente, existe o sistema de precatórios, 8 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo- se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. [...] § 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. - 24 - BENS que garante o pagamento das dívidas do Estado sem que com isso seja necessário executar seus bens, tal qual aconteceria com os bens dos particulares. Imprescritibilidade Na base do atributo da imprescritibilidade está a ideia segundo a qual os bens públicos não podem ser adquiridos em virtude do decurso de algum prazo, isto é, por usucapião, haja vista que “os bens públicos não estão sujeitos a usucapião” (art. 102 do CC/2002). Diferentemente dos bens privados, ainda que alguém passe a vida inteira em um determinado bem público, isso não gerará qualquer direito em seu nome. 2.9.2.2. Espécies de Bens Públicos Na medida em que existem muitas espécies de bens públicos e o tópico é muito vasto, vamos nos limitar a apresentar alguns dos principais na sequência. Terras devolutas As terras devolutas consistem em áreas territoriais que são integradas ao patrimônio de alguma das pessoas federativas. Para que algo seja considerado uma terra devoluta, ela não deve ter um uso público específico, ou seja, ela não pode ter uma finalidade no contexto da Administração Pública. Terreno de marinha e os seus acrescidos Conforme o art. 2º do Decreto-Lei nº. 9.760/1946. Já os terrenos acrescidos, conforme os arts. 2º e 3º do Decreto-Lei em questão, são aqueles que se formaram de modo natural ou artificial, anexos aos terrenos de marinha. Terrenos reservados ou marginais Os terrenos reservados ou marginais são aqueles banhados por correntes de água navegáveis que não sofram qualquer influência das marés. Tal terreno tem uma extensão de 15 metros horizontais a partir de uma linha definida com base na média da enchente do rio em questão. Terras ocupadas pelos índios Com base no art. 20, XI, da Constituição Federal, os terrenos tradicionalmente ocupados pelos índios são propriedade da União. Já o art. 231, § 1º, da Constituição Federal, define que as terras ocupadas pelos índios. Plataforma continental A plataforma continental consiste, basicamente, na extensão de área continental sob o mar até uma profundidade de 200 metros. Embora não exista, na nossa Constituição Federal, um artigo prevendo literalmente que a plataforma continental pertença a União, isso se infere do seu art. 20, I. A Constituição Federal de 1967 previa que a plataforma continental era um bem da União, e o artigo citado da Constituição Federal de 1988 afirma que seguem sendo da União todos os bens que atualmente (à época da sua instituição) lhe pertençam. O mar territorial O mar territorial é a área que consiste nas 12 milhas marítimas (em média, 1.850 metros), a contar a linha de baixo mar do continente brasileiro. O Brasil exerce soberania plena sobre o mar territorial, conforme o art. 2º da Lei nº. 8.617, de 4 de janeiro de 1993. Ilhas Ilhas consistem em porções elevadas de terra que, além de estarem acima do nível das águas, também são completamente cercadas por elas. A ilhas se subdividem em marítimas, fluviais e lacustres. Faixa de fronteira As faixas de fronteira consistem em áreas de até 150 km de largura do território nacional que façam divisa com territórios de outros países. - 25 - BENS - 26 - BENS 3. Bens de Família Bem de família é um instituto do direito civil pelo qual se vincula o destino de um prédio para ser domicílio ou residência de sua família. Em nosso atual sistema coexistem duas espécies de bem de família: bem de família voluntário (art. 1.711 e segs., CC/2002) e bem de família legal (Lei nº 8.009/1990). O bem de família é uma exceção, visando à preservação do mínimo patrimonial para uma vida digna a todos, nesta perspectiva “o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas” (Súmula nº 364 do STJ). Esta proteção não se limita ao imóvel, isoladamente, mas também a outros bens, considerados acessórios, para a finalidade garantista declarada, pois no Brasil a regra é que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens, presentes ou futuros, salvo as exceções previstas em lei. 3.1. Bem de Família Voluntário Trata-se de instituto que é instituído por ato de vontade, por meio de registro imobiliário. Suas principais características são: • Ato voluntário – deve ser registrado. • Deve representar no máximo um terço do patrimônio líquido da pessoa que está registrando. • Acarreta inalienabilidade e impenhorabilidade do bem. • Admitem-se apenas duas exceções: dívidas decorrentes de condomínio e as dívidas tributárias que recaem sobre o bem. 3.1.1. Os Bens “O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando- se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família” (art. 1.712 do CC/2002). “Os valores mobiliários, destinados aos fins previstos no artigo antecedente, não poderão exceder o valor do prédio instituído em bem de família, à época de sua instituição” (art. 1.713 do CC/2002) “Deverão os valores mobiliários ser devidamente individualizados no instrumento de instituição do bem de família” (art. 1.713, § 1° do CC/2002). “Se se tratar de títulos nominativos, a sua instituição como bem de famíliadeverá constar dos respectivos livros de registro” (art. 1.713, § 2° do CC/2002). 3.1.2. Efeitos do Bem de Família Assim, gera dois efeitos principais: a impenhorabilidade por dívidas futuras, pois “o bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio” (art. 1.715, CC/2002); e a inalienabilidade relativa do referido imóvel (art. 1716, CC/2002). “No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz” (art. 1.715, parágrafo único do CC/2002). “A isenção de que trata o artigo antecedente durará enquanto viver um dos cônjuges, ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade” (art. 1.716 do CC/2002). A respeito das dívidas, o CC/1916 previa que “para o exercício desse direito é necessário que os instituidores no ato da instituição não tenham dívidas, cujo pagamento possa por ele ser prejudicado” (art. 71 do CC/1916). “A isenção se refere a dividas posteriores ao ato, e não ás anteriores, se verificar que a solução destas se tornou inexequível em virtude de ato da instituição”. (art. 71, parágrafo único do CC/1916). E “o prédio, nas condições acima ditas, não poderá ter outro destino, ou ser alienado, sem o consentimento dos interessados e dos seus representantes legais” (art. 72 do CC/1916). - 27 - BENS Súmula 486 do STJ: “É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família”. 3.1.3. Administração dos Bens “O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem da família, não podem ter destino diverso do previsto no art. 1.712 ou serem alienados sem o consentimento dos interessados e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público” (art. 1.717 do CC/2002). “O instituidor poderá determinar que a administração dos valores mobiliários seja confiada a instituição financeira, bem como disciplinar a forma de pagamento da respectiva renda aos beneficiários, caso em que a responsabilidade dos administradores obedecerá às regras do contrato de depósito” (art. 1.713, § 3° do CC/2002). “Qualquer forma de liquidação da entidade administradora, a que se refere o § 3 o do art. 1.713, não atingirá os valores a ela confiados, ordenando o juiz a sua transferência para outra instituição semelhante, obedecendo- se, no caso de falência, ao disposto sobre pedido de restituição” (art. 1.718 do CC/2002). “Comprovada a impossibilidade da manutenção do bem de família nas condições em que foi instituído, poderá o juiz, a requerimento dos interessados, extingui-lo ou autorizar a sub- rogação dos bens que o constituem em outros, ouvidos o instituidor e o Ministério Público” (art. 1.719 do CC/2002). “Salvo disposição em contrário do ato de instituição, a administração do bem de família compete a ambos os cônjuges, resolvendo o juiz em caso de divergência” (art. 1.720 do CC/2002). “Com o falecimento de ambos os cônjuges, a administração passará ao filho mais velho, se for maior, e, do contrário, a seu tutor” (art. 1.720, parágrafo único do CC/2002). 3.1.4. Instituição Uma vez que “podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial” (art. 1.711 do CC/2002). Devido a lógica do Pátrio Poder, o Código Civil de 1916 previa que “é permitido aos chefes de família destinar um prédio para domicilio desta, com a clausula de ficar isento de execução por dividas, salvo as que provierem de impostos relativos ao mesmo prédio” (art. 70 do CC/1916) e “essa isenção durará enquanto viverem os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade” (art. 70°, parágrafo único do CC/1916). “O bem de família, quer instituído pelos cônjuges ou por terceiro, constitui-se pelo registro de seu título no Registro de Imóveis” (art. 1.714 do CC/2002). Já o anterior previa que “a instituição deverá constar de escritura publica transcrita no registro de imóveis e publicado na imprensa e, na falta desta, na da capital do Estado” (art. 73 do CC/1916). “O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada” (art. 1.711, do parágrafo único do CC/2002). 3.1.5. Extinção do bem de família Os artigos 1721 e 1722 do CC/2002 tratam da extinção do Bem de família voluntário. “A dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de família” (art. 1.721 do CC/2002). No entanto “dissolvida a sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges, o sobrevivente poderá pedir a extinção do bem de família, se for o único bem do casal” (art. 1.721, parágrafo único do CC/2002). “Extingue-se, igualmente, o bem de família com a morte de ambos os cônjuges e a maioridade dos filhos, desde que não sujeitos a curatela” (art. 1.722 do CC/2002). 3.2. Bem de Família Legal É a segunda espécie de bem de família, está prevista na Lei nº 8.009/1990, que visa a proteção ao patrimônio mínimo, conforme estabelecido em plano constitucional. Assim, “o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei” (art. 1° da Lei nº 8.009/1990). Vejamos as diferenças entre o Bem de Família Voluntário e o Bem de Família Legal: • Este independe de valor; • Prescinde (dispensa) a individualização em escritura e registro cartorário; • Ocorre uma impenhorabilidade do bem de família derivada automaticamente da lei; • Não há inalienabilidade. Assim, observa-se que a proteção legal é extremamente ampla, sendo, inclusive, considerado pela lei como residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Ainda, a lei protegerá apenas o bem de menor valor, caso o casal ou entidade familiar possua mais de um imóvel utilizado como residência. Desta forma, em caso de diversos imóveis residenciais, a proteção automática legal do art. 5º, da Lei nº 8.009/1990 abrangerá apenas o imóvel de menor valor, portanto, caso o indivíduo queira proteger o bem de maior valor, será necessária a instituição do bem de família - 28 - BENS voluntário conforme os arts. 1.711 do CC/2002 e ss. Súmula nº 205 do STJ: a lei 8.009/90 aplica-se a penhora realizada antes de sua vigência. Ademais, o STJ admite a interpretação do parágrafo único do artigo 1º, que para evitar abuso de direito, em situações justificadas, o desmembramento do imóvel para efeito de penhora, desde que não haja prejuízo para a área residencial. 3.3. Impenhorabilidade Têm sido considerados impenhoráveis, por força da Lei nº 8.009/1990, os seguintes bens: o “freezer”, as máquinas de lavar e secar roupas, o teclado musical, o computador, o televisor, o videocassete, o ar-condicionado, e, até mesmo, a antena parabólica. O norte para a interpretação sobre a qualificação como bem de família não deve se limitar apenas ao indispensável para a subsistência, mas sim ao necessário para uma vida familiar digna, sem luxo, o que tem encontrado amparo na jurisprudência pátria. Nesse diapasão, tem-se admitido a extensão da impenhorabilidade do bem de família até mesmo ao jazigo familiar, numa ideiade que tal proteção reside, fundamentalmente, em uma concepção de tutela da dignidade humana e o respeito à memória dos mortos. A própria lei prevê algumas exceções à impenhorabilidade do bem de família legal (art. 3º da Lei nº 8.009/1990). Trata-se de rol um exemplificativo segundo o STJ, podendo ser reconhecido outras possibilidades. • Titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato: exemplo, compra de apartamento financiado. Nesses casos, não se pode arguir bem de família, já que a dívida foi contraída em prol da entidade familiar; • Credor de pensão alimentícia: a impenhorabilidade do bem de família não pode ser oposta pelo devedor ao credor de pensão alimentícia decorrente de indenização por ato ilícito. Também se aplica para dívidas de pensão alimentícia familiar; • Cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar: a cobrança da taxa condominial também pode levar à penhora do imóvel. Contudo, o STJ tem entendido que contribuições criadas por associação de moradores não se equiparam a despesas de condomínio, para efeito de penhora; • Execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar: nesse caso, o devedor não poderá, com base no princípio da confiança e da regra proibitiva do venire contra factum proprium, pretender voltar atrás posteriormente, alegando a proteção do bem de família, tendo que provar que a família foi beneficiada. Contudo, o próprio STJ invoca a irrenunciabilidade da proteção legal, e admite que o devedor possa voltar atrás invocando a proteção ao bem de família, caso haja apenas indicado o bem à penhora. Ademais, o fato de a hipoteca não ter sido registrada não pode ser utilizado como argumento pelo devedor para evitar a penhora do bem de família. A exceção prevista no art. 3º, inciso V, da Lei nº 8.009/1990, deve ser interpretada restritivamente, somente atinge os bens que foram dados em garantia de dívidas contraídas em benefício da própria família, não abrangendo bens dados em garantia de terceiros. (STJ. 3ª Turma. REsp 1115265/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 24/04/2012.) Ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens: o bem adquirido com produto de crime é penhorável mesmo que tenha havido extinção da punibilidade pelo cumprimento do SURSIS processual. Na execução civil movida pela vítima, não é oponível a impenhorabilidade do bem de família adquirido com produto do crime, ainda que a punibilidade do acusado tenha sido extinta em razão do cumprimento das condições estipuladas para a suspensão condicional do processo, conforme demonstrado no Informativo nº 575 do STJ. Na execução civil movida pela vítima, não é oponível a impenhorabilidade do bem de família adquirido com o produto do crime, ainda que a punibilidade do acusado tenha sido extinta em razão do cumprimento das condições estipuladas para a suspensão condicional do processo. De acordo com o art. 3º da Lei nº 8.009/1990, "A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: [...] VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens". Especificamente acerca da exceção mencionada (inciso VI), infere-se que o legislador, entre a preservação da moradia do devedor e o dever de reparação dos danos oriundos de conduta criminosa, optou por privilegiar o ofendido em detrimento do infrator, afastando a impenhorabilidade do bem de família. Percebe-se que o legislador especificou duas hipóteses distintas de exceção à impenhorabilidade no mencionado inciso VI, quais sejam: a) bem adquirido com produto de crime; b) para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. Com efeito, à incidência da norma inserta no inciso VI do art. 3º da Lei nº 8.009/1990, isto é, da exceção à impenhorabilidade do bem de família em virtude de ter sido adquirido com o produto de crime, forçoso reconhecer a dispensa de condenação criminal transitada em julgado, porquanto inexiste determinação legal neste sentido. Afinal, caso fosse a intenção do legislador exigir sentença penal condenatória para a exceção prevista na primeira parte do inciso VI, teria assim feito expressamente, como o fez com a segunda parte do referido dispositivo. Logo, não havendo determinação expressa na lei no sentido de que a exceção (bem adquirido com produto de crime) exija a existência de sentença penal condenatória, temerário seria adotar outra interpretação, sob pena de malograr o propósito expressamente almejado pela norma, direcionado a não estimular a prática ou reiteração de ilícitos. Assim, o cometimento de crime e o - 29 - BENS fato de o imóvel ter sido adquirido com seus proveitos é suficiente para afastar a impenhorabilidade do bem de família. Na hipótese, a conduta ilícita praticada consubstancia-se no cometimento de crime, tanto que fora oferecida e recebida denúncia, bem assim ofertada proposta de suspensão condicional do processo, cujo pressuposto para sua concessão é a prática de crime em que a pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano (art. 89, caput, Lei nº 9.099/1995). REsp 1.091.236-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 15/12/2015, DJe 1º/2/2016. Obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação: de acordo com STJ, é constitucional e possível a penhora do bem de família do fiador na locação geral. Mesmo que o fiador renuncie ao benefício de ordem, sua obrigação é subsidiária. Se a pessoa tem um imóvel familiar, ele é impenhorável, enquanto o do fiador não. Súmula 549 do STJ: É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. Ademais, de acordo com o art. 2º da Lei nº 8.009/1990, estão excluídos, também, da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos. Contudo, mais uma vez a lei traz uma exceção: no caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo. Conforme a Súmula nº 449 do STJ “A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora”. “A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados” (art. 1°, parágrafo único da Lei nº 8.009/1990). “Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos” (art. 2° da Lei nº 8.009/19902) “No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica- se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo” (art. 2°, parágrafo único da Lei nº 8.009/1990) “A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido” (art. 3° da Lei nº 8.009/1990): - “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato” (art. 3°, II da Lei nº 8.009/1990). - “pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida” (art. 3°, III da Lei nº 8.009/1990). - “para cobrançade impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar” (art. 3°, IV da Lei nº 8.009/1990). - “para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar” (art. 3°, V da Lei nº 8.009/1990). - “por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens” (art. 3°, VI da Lei nº 8.009/1990). - “por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação” (art. 3°, VII da Lei nº 8.009/1990). “Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga” (art. 4° da Lei nº 8.009/1990). “Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese” (art. 4°, § 1° da Lei nº 8.009/1990). “Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural” (art. 4°, § 2° da Lei nº 8.009/1990). “Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente” (art. 5° da Lei nº 8.009/1990). Sendo que “na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil” (art. 5°, parágrafo único da Lei nº 8.009/1990). “São canceladas as execuções suspensas pela Medida Provisória nº 143, de 8 de março de 1990, que deu origem a esta lei” (art. 6° da Lei nº 8.009/1990). 3.4. Bens Gravados com Cláusula de Inalienabilidade São aqueles que se tornam inalienáveis pela vontade humana, por meio de uma cláusula temporária ou vitalícia, nos casos previstos em lei, por ato inter vivos (ex: doação) ou causa mortis (ex.: testamento). Exemplo Um pai, percebendo que seu filho irá dilapidar o patrimônio, faz um testamento, com essa cláusula especial, a fim de que os bens não saiam do patrimônio do filho protegendo esses bens do próprio filho, impedindo que os atos de irresponsabilidade ou má administração possam levar o filho à insolvência - dívidas superiores aos créditos. O art. 1.911 do CC/2002 determina que “a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, - 30 - BENS implica impenhorabilidade e incomunicabilidade”. Atualmente essa cláusula tem valor um pouco mais restrito, pois o testador deve apontar expressamente a justa causa para essa sua decisão de tornar o bem inalienável (art. 1.848 do CC/2002), ou seja, deverá justificar o porquê desta medida. Um caso justificável é a prodigalidade do filho. - 31 - BENS - 32 - BENS 4. Coisas fora do Comércio Embora o Código Civil de 2002 não haja feito expressa referência às coisas fora do comércio, o tema interessa ainda em nível doutrinário, pois o Código Civil anterior previa que “são coisas fora do comércio as insuscetíveis de apropriação, e as legalmente inalienáveis” (art. 69 do CC/1916). De modo geral, todos os bens podem ser apropriados e alienados, tanto a título oneroso quanto gratuito. Há, todavia, exceções a essa regra, constituindo-se o que se convencionou chamar de bens fora do comércio ou inalienáveis, consistentes nos bens que não podem ser negociados. A expressão “comércio” é utilizada no sentido da possibilidade de circulação e transferência de bens de um patrimônio para outro (susceptibilidade de apropriação), mediante compra e venda, doação etc. Tais bens se classificam em: a) inapropriáveis pela própria natureza: bens de uso inexaurível, como o mar e a luz solar. São as conhecidas res communes omnium (coisas comuns a todos), que não podem ser chamadas propriamente de coisas, pois falta o requisito da ocupabilidade. Nesta classificação enquadram-se, também, os direitos personalíssimos, uma vez que são insusceptíveis de apropriação material, havendo também norma legal que embasa tal circunstância; b) legalmente inalienáveis: bens que, embora sejam materialmente apro-priáveis, têm sua livre comercialização vedada por lei para atender a interesses econômico-sociais, de defesa social ou proteção de pessoas. Só excepcionalmente podem ser alienados, o que exige lei específica ou decisão judicial. É o caso dos bens públicos de uso comum do povo, bens dotais, terras ocupadas pelos índios, o bem de família etc. São também chamados de bens com inalienabilidade real ou objetiva; c) inalienáveis pela vontade humana: bens que, por ato de vontade, em negócios gratuitos, são excluídos do comércio jurídico, gravando-se a cláusula de inalienabilidade e impenhorabilidade. Admite-se a relativização de tais cláusulas, pela via judicial, em situações excepcionais, como moléstias graves do titular, para garantir a utilidade do bem, mas, nesse caso, o sentido da jurisprudência é na busca da prevalência do fim social da norma. Também são chamados de bens com inalienabilidade pessoal ou subjetiva. Vale destacar, porém, que há coisas que até podem vir a integrar o patrimônio das pessoas – ou seja, são passíveis de apropriação –, mas que não estão no complexo de bens de qualquer pessoa, antes de apro-priadas. É o caso da res nullius, coisa que não pertence atualmente a ninguém (ou seja, não é de titularidade de qualquer pessoa), mas que pode vir a pertencer pela ocupação, como, por exemplo, os animais de caça e pesca. Da mesma forma, a res derelictae, que é a coisa abandonada, como uma guimba de cigarro. Note-se que o abandono é necessariamente voluntário, sendo distinto da hipótese da coisa perdida (involun-tariamente), que continua, abstratamente, a pertencer ao patrimônio do titular. - 33 - BENS - 34 - BENS 5. Coisas sem dono A coisa sem dono (res nullius) não pertence a alguém, mas encontra-se à disposição do primeiro que se interessar, como, por exemplo, o peixe no rio e a caça na mata. Por uma questão lógica, esses somente poderão ser bens móveis, pois os imóveis que não pertencem a qualquer pessoa são do Estado (terras devolutas). 5.1. Bens de natureza arqueológica ou pré-histórica LEI No 3.924, DE 26 DE JULHO DE 1961 Art 17. A posse e a salvaguarda dos bens de natureza arqueológica ou pré-histórica constituem, em princípio, direito imanente ao Estado. Art 18. A descoberta fortuita de quaisquer elementos de interêsse arqueológico ou pré-histórico, histórico, artístico ou numismático, deverá ser imediatamente comunicada à Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ou aos órgãos oficiais autorizados, pelo autor do achado ou pelo proprietário do local onde tiver ocorrido. Parágrafo único. O proprietário ou ocupante do imóvel onde se tiver verificado o achado, é responsável pela conservação provisória da coisa descoberta, até pronunciamento e deliberação da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Art 19. A infringência da obrigação imposta no artigo anterior implicará na apreensão sumária do achado, sem prejuízo da responsabilidade do inventor pelos danos que vier a causar ao Patrimônio Nacional, em decorrência da omissão. Art 20. Nenhum objeto que apresente interêsse arqueológico ou pré-histórico, numismático ou artístico poderá ser transferido para o exterior, sem licença expressa da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, constante de uma "guia" de liberação na qual serão devidamenteespecificados os objetos a serem transferidos. Art 21. A inobservância da prescrição do artigo anterior implicará na apreensão sumária do objeto a ser transferido, sem prejuízo das demais cominações legais a que estiver sujeito o responsável. Parágrafo único. O objeto apreendido, razão dêste artigo, será entregue à Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. - 35 - BENS - 36 - BENS 6. Bens Abandonados A coisa abandonada não é a coisa sem dono, assim a coisa abandonada era objeto de direito, mas deixou de ser porque o dono a renunciou intencionalmente. Pode ser apropriada pelo primeiro que se interessar, salvo se tal apropriação for proibida por lei, pois “quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei” (art. 1.263 do CC/2002). CIVIL. PROCESSO CIVIL. LOCAÇÃO. BENS ABANDONADOS. REMOÇÃO PARA DEPÓSITO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. 1. Nos termos do artigo 65, § 1º, da Lei n.º 8.245/91, combinado com o artigo 840, § 1º, do Código de Processo Civil, os móveis e utensílios abandonados pelo locatário ficarão, na hipótese da inexistência de depositário judicial, em poder do locador. 2. É possível a remoção dos móveis e utensílios abandonados pelo antigo locatário ao depósito público, quando, excepcionalmente, a sua guarda for excessivamente onerosa ao proprietário do imóvel. 3. Recurso conhecido e parcialmente provido. STJ - REsp: 1667227 RS 2017/0086302-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 26/06/2018, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2018 - 37 - BENS - 38 - BENS 7. Bens Perdidos O tratamento dado ao bem perdido é diferente do bem sem dono. Assim, “quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor” (art. 1.233 do CC/2002). “Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá direito a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, e à indenização pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la” (art. 1.234 do CC/2002). “Na determinação do montante da recompensa, considerar-se-á o esforço desenvolvido pelo descobridor para encontrar o dono, ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de encontrar a coisa e a situação econômica de ambos” (art. 1.234, parágrafo único do CC/2002). No entanto, “não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente” (art. 1.233, parágrafo único do CC/2002). Art. 1.235. O descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor legítimo, quando tiver procedido com dolo. Art. 1.236. A autoridade competente dará conhecimento da descoberta através da imprensa e outros meios de informação, somente expedindo editais se o seu valor os comportar. Art. 1.237. Decorridos sessenta dias da divulgação da notícia pela imprensa, ou do edital, não se apresentando quem comprove a propriedade sobre a coisa, será esta vendida em hasta pública e, deduzidas do preço as despesas, mais a recompensa do descobridor, pertencerá o remanescente ao Município em cuja circunscrição se deparou o objeto perdido. Parágrafo único. Sendo de diminuto valor, poderá o Município abandonar a coisa em favor de quem a achou. REINTEGRAÇÃO DE POSSE - INTERESSE DE AGIR - ARRENDAMENTO MERCANTIL - VRG - AUSÊNCIA DE DESCARACTERIZAÇÃO - BEM PERDIDO - EXECUÇÃO. O contrato de arrendamento mercantil é um contrato complexo, que envolve financiamento, locação e possível compra e venda, sendo celebrado entre a pessoa interessada no bem, que o indica à financeira, para que esta o adquira e venha a arrendá-lo, com a opção de compra ao final de determinado prazo. A conversão de ritos somente é possível se compatíveis os procedimentos, se houver previsão legal permitindo e a se for anterior a citação do réu. Não há previsão legal que permita a conversão da ação de reintegração de posse em casos de arrendamento mercantil quando há a perda do objeto arrendado em execução. Recurso não provido. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0446.08.010244-0/001 - COMARCA DE NEPOMUCENO - APELANTE (S): BFB LEASING S/A ARRENDAMENTO MERCANTIL - APELADO (A)(S): RODRIGO TEOFILO GONÇALVES - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. EVANGELINA CASTILHO DUARTE - 39 - BENS - 40 - BENS 8. Bem Ambiental O meio ambiente, protegido pelo art. 225 da Constituição Federal e pela Lei 6.938/1981, visando à proteção da coletividade, de entes públicos e privados, cuja proteção visa assegurar a sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações, ou seja, amparando-se direitos transgeracionais ou intergeracionais. O Informativo de Jurisprudência do STJ nº 415 apresenta este entendimento. PROCESSO REsp 1.120.117-AC, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 10/11/2009. TEMA ACP. REPARAÇÃO. DANO AMBIENTAL. INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR Cuida-se, originariamente, de ação civil pública (ACP) com pedido de reparação dos prejuízos causados pelos ora recorrentes à comunidade indígena, tendo em vista os danos materiais e morais decorrentes da extração ilegal de madeira indígena. Os recorrentes alegam a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a causa, uma vez que caberia à Justiça estadual a competência para julgar as causas em que o local do dano experimentado não seja sede de vara da Justiça Federal. Porém a Min. Relatora entendeu que a Justiça Federal, segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal e do STF, tem competência territorial e funcional nas ações civis públicas intentadas pela União ou contra ela, em razão de o município onde ocorreu o dano ambiental não integrar apenas o foro estadual da comarca local, mas também o das varas federais. Do ponto de vista do sujeito passivo (causador de eventual dano), a prescrição cria em seu favor a faculdade de articular (usar da ferramenta) exceção substancial peremptória. A prescrição tutela interesse privado, podendo ser compreendida como mecanismo de segurança jurídica e estabilidade. O dano ambiental refere-se àquele que oferece grande risco a toda humanidade e à coletividade, que é a titular do bem ambiental que constitui direito difuso. Destacou a Min. Relatora que a reparação civil do dano ambiental assumiu grande amplitude no Brasil, com profundas implicações, na espécie, de responsabilidade do degradador do meio ambiente, inclusive imputando-lhe responsabilidade objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, também está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de estar expresso ou não em texto legal. No conflito entre estabelecer um prazo prescricional em favor do causador do dano ambiental, a fim de lhe atribuir segurança jurídica e estabilidade com natureza eminentemente privada, e tutelar de forma mais benéfica bem jurídico coletivo, indisponível, fundamental, que antecede todos os demais direitos - pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer – o último prevalece, por óbvio, concluindo pela imprescritibilidade do direito à reparação do dano ambiental. Mesmo que o pedido seja genérico, havendo elementos suficientes nos autos, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação. A ampla proteção fundamenta o princípio do poluidor- pagador, com a responsabilidade objetiva – independentemente de culpa –, e solidária de todos aqueles que causam danos ambientais, nos termos da Lei nº 6.938/1981. O meio ambiente ou Bem Ambiental constitui espécie do gênero bem de uso geral do povo, mascom natureza difusa e não meramente pública. - 41 - BENS - 42 - BENS 9. Animais Os animais, são enquadrados atualmente como coisas dentro do Direito Privado Brasileiro. Todavia, há uma tendência em se sustentar que são sujeitos de direito e não devem ser tratados como coisas, mas até como um terceiro gênero, sendo que já há Projetos de Lei que pretendem mudar o ordenamento jurídico pátrio para seguir este caminho. Na mesma linha do Código Civil Alemão, Código Civil da Suíça de 1902 alterado em 2002, o Código Civil Austríaco ABGB (Allgemeines Bügerliches Gesetzbuch), entre outros, que dá aos animais um tratamento diferente das coisas, remetendo a uma legislação específica. 9.1. Animais no Direito de Família RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. AQUISIÇÃO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. INTENSO AFETO DOS COMPANHEIROS PELO ANIMAL. DIREITO DE VISITAS. POSSIBILIDADE, A DEPENDER DO CASO CONCRETO. 1. Inicialmente, deve ser afastada qualquer alegação de que a discussão envolvendo a entidade familiar e o seu animal de estimação é menor, ou se trata de mera futilidade a ocupar o tempo desta Corte. Ao contrário, é cada vez mais recorrente no mundo da pós-modernidade e envolve questão bastante delicada, examinada tanto pelo ângulo da afetividade em relação ao animal, como também pela necessidade de sua preservação como mandamento constitucional (art. 225, § 1, inciso VII -"proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade"). 2. O Código Civil, ao definir a natureza jurídica dos animais, tipificou- os como coisas e, por conseguinte, objetos de propriedade, não lhes atribuindo a qualidade de pessoas, não sendo dotados de personalidade jurídica nem podendo ser considerados sujeitos de direitos. Na forma da lei civil, o só fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não pode vir a alterar sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica. 3. No entanto, os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Dessarte, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade. 4. Por sua vez, a guarda propriamente dita - inerente ao poder familiar - instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um munus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho. Não se trata de uma faculdade, e sim de um direito, em que se impõe aos pais a observância dos deveres inerentes ao poder familiar. 5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós- modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal. Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade. 6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal. 8. Na hipótese, o Tribunal de origem reconheceu que a cadela fora adquirida na constância da união estável e que estaria demonstrada a relação de afeto entre o recorrente e o animal de estimação, reconhecendo o seu direito de visitas ao animal, o que deve ser mantido. 9. Recurso especial não provido. STJ - REsp: 1713167 SP 2017/0239804-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 19/06/2018, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/10/2018 9.2. Projetos de Lei Há o projeto de Lei do Senado Federal nº 351/2015 no qual prevê alteração nos arts. 82 e 83 do Código Civil. Assim, além da definição de que “são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem - 43 - BENS alteração da substância ou da destinação econômico-social” (art. 82 do CC/2002), haveria o acréscimo do parágrafo único que prevendo que os animais não serão considerados coisas. Ainda, acrescentará o inciso IV no art. 83, “consideram-se móveis para os efeitos legais” (art. 83 do CC/2002): “as energias que tenham valor econômico” (art. 83, I do CC/2002), “os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes” (art. 83, II do CC/2002) e “os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações” (art. 83, III do CC/2002); e no inc. IV “Os animais, salvo o disposto em lei especial”. O Projeto de Lei da Câmara Federal nº 145/2021 alinha- se com uma tendência legislação brasileira, a partir da interpretação do art. 225, § 1º, VII da Constituição Federal, em reconhecer os animais como sujeitos de direitos, o que já ocorre, por exemplo, por meio do art. 216 da Lei nº 15.434/2020, do Estado do Rio Grande do Sul, do art. 34-A da Lei nº 12.854/2003, com redação dada pela Lei nº 17.485/2018, do Estado de Santa Catarina e do art. 5º da Lei nº 11.140/2018, do Estado da Paraíba. O art. 1º desta lei prevê que “os animais não-humanos têm capacidade de ser parte em processos judiciais para a tutela jurisdicional de seus direitos”, ainda prevê que a tutela jurisdicional individual dos animais prevista no caput deste artigo não exclui a sua tutela jurisdicional coletiva. Ainda, acrescenta inc. XII no art. 75 do CPC, “serão representados em juízo, ativa e passivamente” (art. 75 do CPC/2015), no qual “os animais não-humanos, pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pelas associações de proteção dos animais ou por aqueles que detenham sua tutela ou guarda”. - 44 - BENS 9. Índice B Bens consumíveis, 15 Bens corpóreos, 11 Bens divisíveis, 16 Bens duráveis, 15 Bens fungíveis, 14 Bens imóveis, 11 Bens inconsumíveis, 15 Bens incorpóreos, 11 Bens indivisíveis, 16 Bens infungíveis, 14 Bens móveis, 13 Bens não duráveis, 15 J Jornada de Direito Civil I Jornada Enunciado nº 11, 13 IV Jornada Enunciado nº 287, 21 Enunciado nº 288, 17 VI Jornada Enunciado nº 535, 19 Jornada de Direito Comercial III Jornada Enunciado nº 95, 11 - 45 - BENS - 46 - BENS 10. Referências AZEVEDO, Álvaro Villaça. BARBOZA, Heloísa Helena. DINIZ, Maria Helena. FARIAS, Cristiano Chaves de. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA Filho, Rodolfo. Novo curso de Direito Civil: Parte Geral. vol. 1. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021. HAICAL, Gustavo MORAES, Maria Celina Bodin de. PEREIRA, Caio Mário da Silva. RODRIGUES, Silvio. ROSENVALD, Nelson. TARTUCE, Flávio. Direito Civil: lei de introdução e parte geral. vol. 1. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. TEPEDINO, Gustavo. - 47 - BENS