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Copyright © Rafaela Perver, 2022 Todos os direitos reservados A Conselheira do CEO 1ª Edição Capa: HB Design Editorial Diagramação: HB Design Editorial Revisão: Lidiane Mastello Todos os direitos reservados a Rafaela Perver. É proibida a reprodução de parte ou totalidade da obra sem a autorização prévia da autora. A violação dos direitos autorais é crime, estabelecido na lei nº 9.610/98, punido pelo artigo 184 do código penal. Todos os personagens desta obra são fictícios e qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Texto revisado conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. (Decreto Legislativo nº 54, de 1995). Dedico a todas aquelas e aqueles que adoram um romance clichezinho de CEO, com hot de perder o fôlego. E para assim que finalizar a leitura, entrar em desalento, porque nunca terá um chefe gostosão, rico e que foda bem. Triste, eu sei, mas vamos fingir que é real... Carter Bastos, tem seus próprios dramas particulares e um coração quebrado. Mas, agora, está de volta ao Brasil para tentar salvar a ELW, empresa da família, que se encontra envolta a um escândalo de racismo e prestes a entrar em falência. O CEO, então contrata uma conselheira obstinada, para ajudá-lo. Mas ele não esperava que ela fosse linda e Irresistível. Noely Sartori é uma mulher inteligente, determinada, que não se deixa abater. Ela se vê diante do seu maior desafio profissional quando é contratada como conselheira na ELW e tem três meses para ajudar a salvar a empresa. Mas, será que ela conseguirá fazer o seu trabalho, resistir as investidas do CEO sexy e temperamental e sair com seu coração inteiro? ALERTA DE GATILHOS PARA DEPRESSÃO E SUICÍDIO! Assim que eu atravesso a porta giratória da Elektra Web, eu sorrio, o mais puro e delicioso sorriso de triunfo. — Acabei de sair do RH. Consegui o emprego! — grito pelo telefone, chamando a atenção de duas mulheres que passavam na rua. — Meu Deus! AAAAA! — minha prima também berra do outro lado, feliz pela minha conquista. — Não posso acreditar! Puta merda, eu sabia, você é a melhor do mundo! — Darla, não exagera. — Noely, você se formou em Harvard, é a melhor do mundo sim! Eu não consegui nem passar no cursinho técnico de cabeleireira do Senac. Mas falando sério, como a nova conselheira particular da Elektra Web se sente? — Confiante, corajosa e ansiosa para tornar a ELW a maior do Brasil, novamente. — Adoro isso em você, sabe que é a melhor. Porém, no seu lugar, eu estaria morrendo de medo, essa empresa está quase em falência, ainda mais depois das últimas polêmicas do dono. Você leu as notícias dos últimos dois meses, né? — Eu li, terei muito trabalho pela frente. Pelo menos mudou o CEO, parece que é o filho do dono da empresa, já que seu pai pediu demissão do executivo, e ainda vendeu a empresa para ele. — Isso eu não li nos portais de notícias, conte-me mais, adoro fofoca. Entro no meu carro, para continuarmos fofocando. — Foi a mulher do RH que me contou, pensa que língua solta. Ela disse que o novo CEO foi anunciado há uma semana, e que ele chegou demitindo todo mundo, para contratar novos profissionais competentes. Logo, vai sair tudo nos jornais, já que a empresa agora está nos holofotes da mídia, por conta de toda a polêmica de racismo e do desvio de dinheiro. — Por isso você conseguiu a vaga de conselheira. Nossa, que barra. Tem certeza de que está pronta para entrar embaixo desse telhado quase desabando? — Estou, sem dúvidas. Sabe que não é a primeira empresa que pego para reerguer. No meu último emprego, entre cinco conselheiros, eu me destacava em tudo. — Por isso foi demitida, aquele bando de invejosos incompetentes, armaram para te mandar embora. Sua inteligência e habilidades incomodavam. — Relaxa, sabe que eu já queria a demissão mesmo. O salário era muito pouco e não queriam aumentar um tostão, pois teriam que aumentar igualmente o de todos. — Agora você vai ganhar mais, sendo só UMA conselheira, de uma empresa de cinco andares. Já te vejo sobrecarregada, é muita coisa para um ser humano só. — E qual a diferença do meu último emprego? Eu fazia quase tudo sozinha naquela droga, e tendo que dividir meu mérito com cinco pessoas. Eu, hein, estou mais do que confiante, poderei mostrar todo o meu potencial, sem medo de estar diminuindo os outros por ser... boa no que faço. — A MELHOR! — ela grita. — A MELHOR! Sorrio de orelha a orelha. — Precisamos comemorar, se arrume bem gostosa esta noite, pois vamos para um barzinho com nossos amigos. Já vou avisar aqui no grupo. — Adorei, mais tarde eu passo na sua casa para te pegar. Agora estou perto do serviço da minha mãe, vou passar lá para dar um beijo nela e contar da novidade. — Nossa, a tia vai pular de alegria. Você é o maior orgulho dela. Beijão. Logo nos vemos. — Beijão. Desligo o telefone e respiro fundo, sem parar de sorrir. Adoro desafios novos, adoro testar os limites do que sou capaz. Olho para o prédio luxuoso da ELW. Não vejo a hora de começar na segunda-feira, vou tentar ser o mais normal possível, para não pensarem que eu sou metida e melhor do que ninguém. Ganhei tanto esse julgamento no último serviço, só por fazer o que era para ser feito. Mas tudo bem, eu aprendi a lição. É isso... — Senhora? — Ai meu Deus! — solto um grito dentro do carro, devido ao rapaz que apareceu de repente, batendo no meu vidro. — A senhora tem alguma moeda para me dar? — ele pede do outro lado. — Só um minuto... — respondo, após abrir uma greta do vidro. Pego a bolsa, à procura de qualquer moeda, só para o rapaz ir embora. Mas acabo dando falta da minha carteira. Não é possível que não esteja aqui! Entro em desespero, viro a bolsa no banco dos passageiros, fazendo a maior bagunça para encontrá-la, mas não a encontro. Só posso ter esquecido no RH. Acho umas moedas, dou para o rapaz e desço do carro, correndo para dentro da empresa. Lembro-me de ter tirado os documentos para a Flávia. Deve estar na sua sala, não tem outro lugar que eu tenha tirado. Informo na recepção o que aconteceu e a recepcionista me libera para subir. Eu pego o elevador e chego até o andar da sala dela, bato à porta e espero abrir. Não demora e em vez de ser ela, sou surpreendida por um homem que puxa a maçaneta e me deixa de olhos arregalados, sem acreditar que pode existir uma coisa tão perfeita dessa. Ele é muito alto, porte médio, barba rente, cabelo de playboyzinho e olhar acinzentado bem escuro. Meu Jesus! — Olá — ele fala, fechando o seu paletó e se afastando para que eu entre. Que “olá” mais grave e sexy. — Olá... — Ah, Noely! Imaginei que voltaria para pegar a sua carteira. Estávamos falando de você agora há pouco. Eu entro educada, pedindo licença a eles. — Já me deixe apresentá-los. Sr. Carter, essa é a Srta. Noely Sartori é a sua conselheira de administração. E Srta. Noely, esse é o nosso novo CEO, o Sr. Carter Bastos. Ele me observa, analítico. — Prazer, Srta. Noely. — O prazer é todo meu em conhecê-lo. Obrigada pela oportunidade, espero alcançar todas as expectativas que a empresa espera de mim. Darei o meu melhor — falo, sem segurar a maldita língua. — Veremos na prática, gostei muito do seu currículo. Uma diplomada de Harvard é valiosa. — Obrigada, é gratificante ouvir isso. — Para ser mais gratificante, preciso urgente que comece a ocupar a sua vaga amanhã. — Amanhã?! — exclamo tão de repente, que não percebi o meu tom de voz alto. — Sr. Carter, eu já disse para ela começar na segunda. — Pois eu quero que a Srta. Noely comece o quanto antes. Caso não tenha visto nos jornais, o que é improvável, deve saber que essa empresa se encontra prestes a falir. E isso muda o fato de eu ser obrigada a começar a trabalhar no sábado? Reprimo os lábios, segurando-me para não responder. — Tudo bem, começarei amanhã. — Acaba de alcançar uma expectativa da empresa — ele diz, com as mãos nos bolsos. Não sei se o seu tom foi debochado ou ele é assim mesmo, mas sorrio fraco, tentando não fuzilar o meu novo chefe para nãoser despedida em menos de uma hora de contratação. O que tem de beleza, tem de exigência. O que custava me deixar começar na segunda? Tudo bem, entendo que a empresa esteja praticamente no fundo do poço e que ele possa estar desesperado, querendo soluções o quanto antes, por isso, eu vou relevar e ser profissional. O sr. Carter se despede de nós e vai embora com o seu perfume marcante, de homem poderoso. Eu faço o mesmo ao pegar a minha carteira e ir embora da sala da Flávia. Antes de ir, ela me pediu milhares de desculpas, só que está tudo certo. Isso não é o fim do mundo. Preciso também de emprego, tenho um carro e uma casa financiada para pagar. E por mais que eu seja formada em Harvard, isso ainda não muda a realidade que eu e minha mãe vivemos. Quero dar o melhor para ela. É a minha prioridade. Quando chego em casa, aviso a minha prima que não vou mais ao barzinho com ela e os nossos amigos, pois amanhã vou precisar acordar cedo para trabalhar. Também, explico o motivo, que é o Sr. Carter. Ela fica puta da vida, sem acreditar que vou começar a “escravidão” em pleno sábado, vou nem detalhar os nomes que ela chamou meu novo chefe. Só torço para que ele não seja o pior do mundo. — Filha? Minha mãe chega em casa e me encontra sentada no sofá, com o notebook no colo. Estava lendo mais notícias sobre a ELW, principalmente sobre o Sr. Carter Bastos. Ele tem 36 anos, já foi casado e morou por vinte anos nos Estados Unidos. Faz dois meses que voltou para o Brasil, e para ficar e assumir a empresa ao lado do irmão mais novo, o Sr. Breno Bastos. Agora, sobre o seu pai, o Barreto Bastos, é um desgraçado com D maiúsculo. Além de desviar dinheiro da própria empresa e atrasar salários por meses, ele foi acusado de racismo pela secretária. Ela relata e prova, por áudios gravados, que ele a chamava de preta incompetente, também exigia que a moça alisasse os cabelos e usasse bases mais claras no rosto. Que absurdo! Que esse homem não apareça na minha frente, pois sou capaz de matar esse racista nojento na base do salto. E pior, acha que ele está preso? Merda nenhuma. Esses ricos privilegiados se safam com facilidade, só basta ter dinheiro. Eu conto para a minha mãe que consegui o emprego na ELW e relato desse histórico do ex-dono da empresa. Ela também fica chocada e revoltada por esse cara não estar preso, pagando pelos seus crimes. Brasil, né? Por outro lado, ela fica feliz por mim. — Sei que adora um desafio, e esse é um desafio dos grandes. Estou orgulhosa de você, filha — ela me abraça —, mas tenho uma dúvida, será que esse filho dele não é igual ao pai? Já fico receosa e preocupada por você. — Não sei dizer, se for, não temerei pedir demissão, não se preocupe. — Quero só o seu bem, isso inclui a saúde mental no ambiente de trabalho. Sorrio e pulo no seu colo. — Mãe, relaxa. Precisamos desse serviço, vou dar o melhor de mim. Ela assente e permanece quieta, alisando o meu cabelo. É tão gostoso o carinho que fecho os olhos. — Filha... preciso te dizer uma coisa. — O que, mãe? — É sobre o seu irmão. Então abro os olhos e me emburro. — Não quero saber de nada relacionado a eles, ao meu pai e ao meu irmão, já te disse mãe! — Noely, fica calma e me escuta. — Escutar o quê? Eu odeio esses dois, sabe o quão mal foram conosco? — Nicolas é o meu filho, o meu menino... eu sofro. — Ah, e imagino que seu “menino” veio te procurar? O que foi? Lembrou agora que tem uma mãe, a qual abandonou ao lado do nosso pai milionário, para viver igual playboy, enquanto eu e a senhora passávamos necessidades, sem um alimento sequer em casa? Vivemos um inferno, mãe, como pode esquecer de todo esse sofrimento? — Eu não esqueci, filha. Eu só... — Ótimo, pois eu vou lembrá-la toda vez que vier falar do Nicolas e do meu pai. Eles nos deixaram passando fome! E só não fomos viver igual mendigas na rua, porque a tia Ana e tio Tales permitiram que morássemos de favor com eles. Principalmente a senhora, enquanto eu estudava igual a uma condenada em Massachusetts, para manter a minha bolsa em Harvard, que conquistei com muito estudo e dedicação, sem a ajuda do papai rico. — É o meu orgulho, filha. Também fiz meus sacrifícios para você sempre estar estudando, nunca deixei que abandonasse o seu futuro. Eu faria tudo de novo, sairia mil vezes naquele sol quente para vender salgado e te ajudar a ser diferente da sua mãe. — Nunca quis ser diferente de você, só queria nos dar o melhor. A senhora é o meu orgulho, sempre farei de tudo para recompensar os sacrifícios que fez por mim. Essa casa ainda não é o bastante, quero você longe de serviços braçais. Entendeu, mãe? E por esses motivos, por tudo que passamos e construímos sozinhas, não aceitarei qualquer aproximação do Nicolas, nem do meu pai. Não volte a falar desses infelizes comigo. Não são mais a nossa família. — Tudo bem, querida... tem razão, desculpe-me. Tento não chorar e beijo a sua testa, chamando-a para jantarmos, pois quero dormir cedo. Amanhã começa o início da minha nova vida profissional, preciso estar descansada e focada. Olho para a minha maquiagem concluída, a roupa justa, os saltos scarpin da Prada e respiro meu perfume caríssimo da Dior, que quase custou um rim. Para trabalhar nessas empresas de milionários preciso sempre estar vestida à altura. Aprendi isso da pior forma possível, depois de ser humilhada por mulheres metidas, que te olham dos pés à cabeça, e com aquela cara de nojo insuportável. Depois de pronta e após tomar o meu maravilhoso café da manhã, despeço-me da minha mãe com a sua bênção e vou para o meu primeiro dia na ELW. Minha sala fica no mesmo andar que a sala do CEO e do Co-CEO, provavelmente é o irmão do Sr. Carter. — Olá, bom dia, deve ser a Srta. Noely — a secretária bonita e vulgar me cumprimenta. Fico meio chocada. Como ela pode se vestir desse jeito, com uma saia tão curta e uma blusa tão decotada num ambiente de trabalho? — Olá, como é o seu nome? — Sou a Beatriz, a secretária do Sr. Carter e do Sr. Breno, acho que também da senhorita. — Ah, sim... está há quanto tempo na empresa? — Desde o primeiro dia que o Sr. Carter assumiu o cargo de CEO. — Hum... — Analiso-a e ela é bem sorridente. — Ok. Pode me passar todos os documentos, planilhas, contratos, etc? Quero impressos. — Não é mais fácil analisar pelo computador? Te mando pelo e- mail. — Eu quero impresso, gosto de sentir o papel nas mãos. — Tudo bem, srta. Noely, vou imprimir tudo e em meia hora levo na sua sala. Assinto, agradecendo-a e voltando para o meu cubículo de sala. Pelo menos eu tenho uma sacada com vista bonita para o centro. Aguardo a Beatriz, que em meia hora me traz uma penca de papéis, ainda diz que tem mais. Já vi que levarei uma semana e meia para entender a logística da empresa. Bom, que então comece o desafio. Passo umas três horas lendo os documentos da administração, ou melhor, da má administração. Estou sem acreditar no tanto de dinheiro que a Elektra Web ganhou no ano passado. E como não pagavam os seus funcionários? O criminoso sem escrúpulos desviava sem pena. Não era para a ELW estar desse jeito hoje em dia, na verdade, se tivesse uma boa gestão, seria a empresa número um de desenvolvimento de softwares no Brasil. Vou escrevendo tudo no computador, organizando as finanças desde o primeiro ano de inauguração da empresa... até ser interrompida por alguém, que entra na sala e para na frente da minha mesa. Ergo a cabeça e quase perco o ar com o homem alto e forte na minha frente. Ele é sufocante, sem dúvidas. — Posso saber o que está fazendo? — Bom dia, Sr. Carter... eu... — Um pouco tonta, olho para os milhares de papéis sobre a minha mesa, tem outros milhares caídos no chão. — Estou lendo e entendendo o passado da ELW. — Não foi para isso que contratei a senhorita. — Mas esse é o meu trabalho, devo analisar vírgula por vírgula, antes de ajudá-lo em qualquer decisão administrativa. — E analisou? Como o olhar desse homem é intimidador, arrepiante. — Estou analisando, como pode ver. — É, estou vendo, tem até a plantada empresa. — Ele pega o papel que estava bem próximo do meu braço. — Agora, quero saber, no que isso me ajuda? — No caso, me ajuda... — murmuro, erguendo-me da cadeira e olhando-o, sorridente, como uma boa funcionária. — Mas então, no que eu posso ajudar o senhor, pelo menos nesse momento? — Venha até a minha sala, tenho algumas estratégias que preciso discutir. — Sim, senhor... Pego o meu tablet e o acompanho para o outro lado. Ao entrar na sala, fico admirada com o ambiente enorme e luxuoso, muito melhor do que o meu cubículo. — Eu dei um prazo de três meses para reerguermos a ELW. — Eu vi que muitas empresas importantes desfizeram contratos e processaram a ELW. Há muitas dívidas... ainda não somei tudo, mas... — Eu não quero discutir o óbvio, Noely. Necessito de planos que deem certo. — Desculpe-me, senhor, mas eu preciso fazer isso, afinal, cheguei hoje, tenho que pesquisar as coisas, buscar informações detalhadas. Não sou Jesus para fazer milagres. — Quando eu vejo, já soltei. Merda! Coro de vergonha. Ele se encosta na mesa, com a sua beleza insuportável. Ele sim tem pose de salvador da pátria. Pigarreio, recompondo-me. — O que eu quis dizer, é que acabei de chegar, deixe-me primeiro entender os passos administrativos da última gestão, para em seguida, instruí-lo no futuro, juntamente com os seus funcionários, afinal, a intenção de ambos aqui é reerguer a Elektra Web, torná-la respeitosa e de confiança para o mercado, novamente. — Eu te darei um prazo até segunda para estudar tudo o que precisa sobre a empresa. Quero soluções, Srta. Noely, a começar pelas dívidas que meu... o último gestor deixou. Não há um investidor sequer no nosso quadro, todos foram embora. Ele suspira, preocupado, e, aparentemente, até desesperado. — Eu tenho uma única estratégia no momento, até analisar tudo e pensar com cuidado. — Qual? — Ela é óbvia e acho que o senhor já está fazendo isso, mas tem o meu ponto a analisar. Vi que a empresa tem cerca de cento e quarenta funcionários. Reduza o salário de alguns, pelo menos por esses três meses que deu. Todos sabem da situação da ELW, não será uma redução permanente, isso, também garante que não se revoltem e peçam demissão. Ele se ergue, pensativo, vindo até mim com as mãos nos bolsos. Aquela sensação de estar sufocada volta, ele é terrivelmente másculo. Parece que saiu da capa de uma revista com o título “os homens mais bonitos do mundo”. — Vamos apostar nessa estratégia. — Assim? — Arregalo os olhos. — Não vai fazer nenhuma reunião para discutir com seus... — Eu decido as coisas sozinho, não será necessário discutir com nenhum outro grupo, apenas informarei aos responsáveis dos setores. Se forem contra, despeço e coloco outro no lugar. Calo a boca e engulo em seco, assentindo. — Ok... — Desvio dos seus olhos. — Acho que nos daremos muito bem, Srta. Noely. — Ele sorri, e eu volto a fitá-lo. — Talvez sim, o senhor é bem objetivo com as coisas. — Eu tenho um prazo de três meses, preciso ser. — E posso perguntar o motivo? Já perguntando... — Pretendo me aposentar e curtir a vida, isso responde? — A-Aposentar com trinta anos? — Olha, andou pesquisando sobre mim? Mordo o lábio, envergonhada. Que droga, ele foi rápido nessa. — Eu li a sua idade em algum daqueles papéis. — Hum..., mas não tem uma semana que estou na empresa. — Ah, eu... enfim, o senhor vai se aposentar. Ele volta a sorrir, bem diferente do chefe que invadiu a minha sala agora há pouco. — Eu tenho uma outra vida fora do Brasil, só estou aqui para evitar a falência dos negócios da minha família, por mais que eu não ligue se isso acontecer. — Então, não está nem aí para a empresa? — Eu estou, esse prazo foi o que dei para mim. — Entendi, tenho três meses para também garantir o meu emprego, assim como o de outras cento e quarenta pessoas. Adoro desafios difíceis, Sr. Carter. — Adora? — Sim... — Dou dois passos para trás, desviando pela segunda vez dos seus olhos. — Vou voltar ao meu trabalho, tenho muito o que analisar. Com licença, senhor. — Até segunda-feira, Srta. Noely. Ele me observa, até eu fechar a porta e paralisar atrás dela. Deus do céu, qual foi a última vez que um ser humano me deixou tão desconcertada? No fim, até que ele não é um chefe ruim. Só preciso me acostumar com esse jeito intimidante dele, principalmente, me acostumar com a sua beleza. Creio que daqui a pouco ficará tudo normal. Depois de sair da sala do meu chefe, não o vi mais. Continuei trabalhando no meu cubículo, até dar a hora de ir embora. Já desço no térreo, juntamente com umas cinquenta pessoas, doidas para chegarem em suas casas. Eu vou direto para o barzinho que combinei com a Darla. Ela já estava à minha espera, tomando uma cerveja gelada. — Até que enfim, prima! — exclamo e sento-me na cadeira, jogando a bolsa do outro lado. — Eu que tenho que dizer até que enfim. Que tipo de empresa é essa que te contrata em um dia e no outro já exige que você comece a trabalhar igual condenada? — Nem me diga. Mas tudo bem, foi importante eu ir hoje, tive uma boa introdução sobre o passado administrativo deles. — Em pleno sábado? Sacanagem, viu. — Fiquei irritada com isso também. — Mas e aí, disse por mensagem que o seu chefe era um gato. Ela vira metade da cerveja no meu copo. Está toda sorridente. — Eu não disse que ele era um gato, só bonito e bem exigente. — Pesquisei a rede social dele, é um gostoso com G maiúsculo. Não sei como vai aguentar trabalhar com um homem desse. — No meu último emprego também tinha homens bonitos, de terno e gravata. Já estou acostumada. — Não me acostumaria nunca. Você é sortuda. — Sortuda? Tenho três meses para reerguer aquela empresa do fundo do poço, junto com o Sr. Carter. — E por que desse prazo? — Nem eu entendi direito, só sei que existe esse prazo. — Nossa, é muito trabalho, não quero te desanimar, mas é difícil apagar todas essas polêmicas da empresa em menos de três meses, ainda a reerguer. — Espero que consiga, já botei esse objetivo na minha mente. Bebo da minha cerveja, extasiada com o sabor geladinho, delicioso. — Acho que esse Carter, o novo CEO, não está ligando muito se a empresa feche as portas ou não. — Não, ele está se importando sim, pois foi bem exigente comigo... ou talvez esteja certa, não sei. — Pelo que me contou agorinha, ele pode ter assumido a empresa por pressão da família. — É difícil dizer, eu comecei hoje e não conheço a vida pessoal desse homem. Espero descobrir algumas coisas enquanto trabalho lá. — E se descobrir, vai contar para a sua querida prima, pois eu sou curiosa. — E pra quem mais eu contaria? — Pisco e sorrimos. Aproveitamos mais um pouco da noite no bar, eu nem tanto, só bebo um copinho de cerveja mesmo, em seguida, deixo a Darla na sua casa e vou para a minha, para voltar a trabalhar em cima daqueles papéis. No domingo, também fico debruçada no computador, estudando estratégias para apresentar ao Sr. Carter. Contudo, vou esperá-lo colocar em prática o que propus ontem. Darei três semanas para analisar se a empresa terá algum retorno significativo. — Bom dia, filha, vai sair sem tomar o café? — Acordei mais cedo e já tomei, já vou. Te amo. — Beijo o rosto da minha mãe, despedindo-me com rapidez. Estou ansiosa. Hoje quero andar pelos setores e conhecer mais dos funcionários, isso, depois de ver o meu chefe. Entro no carro e dirijo até ELW. Chego, passo o crachá e subo para o último andar. Não encontro ninguém, nem mesmo a secretária. Fico no meu escritório, estudando um pouco do financeiro. Quando ouço vozes, saio da sala e dou de cara com um homem alto, moreno e de olhos claros. Ele está vindo na minha direção. — Olá, bom dia. — Ele sorri, observando-me atentamente. — Bom dia... — Deve ser a nova conselheira da empresa. Eu sou o Breno, irmão do Carter. — Eu sou a Noely. Prazer, Sr. Breno. — O prazer é todo meu em conhecê-la, seja bem-vinda, espero que nos ajude muito com os seus conhecimentos, principalmente, para aconselhar o meu irmão. — Eu farei o possível para fazer o meu trabalho.— Não tenho dúvidas disso... O sr. Breno continua me olhando atentamente, como se eu fosse um bicho diferente, que ele nunca viu na vida. Fico incomodada, pois ele tem o mesmo grau de beleza do Sr. Carter. A diferença é só na altura e no corpo menos musculoso, de resto, são gêmeos, saíram da mesma capa de revista. — Srta. Noely, na minha sala. Falando nele, eu olho por cima dos ombros do Sr. Breno e o vejo entrando na sua sala, após me chamar em voz alta. — Com licença, senhor. — Afasto-me e vou rapidamente para a sala do CEO. — Bom dia, Sr. Carter — digo, ao fechar a porta do escritório. — Bom dia, estudou tudo o que precisava estudar? Ele se afasta da mesa e vai até o aparador do canto, servindo-se de álcool logo cedo. Parece bem nervoso. Respiro fundo, sentindo o cheiro do seu perfume e do condicionador que passou nos cabelos. — Sim, o senhor vai colocar em ação o primeiro plano, de reduzir o salário dos funcionários por três meses? — Meu irmão fará o serviço de comunicar essa informação a eles. — Ok... Está tudo bem com o senhor? — pergunto de repente, surpreendida por ele estar virando o terceiro copo de bebida. — O que mais tem para mim, Noely? — Muda de assunto, indo até a sua mesa e sentando-se. — Estava pensando no senhor fazer parceria com desenvolvedores de jogos, que estão começando e tem algum servidor na boca do povo, pode dar certo. — Não podemos fazer isso, já viu a planilha do financeiro? Precisamos de clientes fixos. — Desculpa, mas acho bem difícil uma grande empresa querer os serviços da ELW no momento, pois não vão querer se vincular a... — Então fecho a boca, vendo que falei demais. — Vincular ao quê? Ele faz questão de olhar bem no fundo dos meus olhos. É melhor ser realista. — Às polêmicas que aconteceram. A Elektra Web foi "cancelada" pela internet. O caso ganhou muita repercussão. E ganhou mesmo, pela ex-secretária que sofreu um racismo horrível, em pleno século 21. Ela jogou na internet as gravações do Sr. Barreto — o ex CEO racista — e teve milhares de acessos, comentários de pessoas indignadas, pedindo justiça, para que esse criminoso fosse preso para sempre. É tudo muito grave, sem falar no desvio de dinheiro que ele fez, usando laranjas. A polícia está investigando, enquanto o desgraçado segue em liberdade, após pagar uma quantia para ser solto. Eu olho para o Sr. Carter, caindo em si, que o ex CEO é o seu pai, que ele e a sua família podem estar sofrendo com tudo isso. Ou não. E se eles estiverem do mesmo lado, dando assistência ao pai? Meu Deus, como eu pude tocar logo nesse assunto? — É por isso dos três meses! — Ele se ergue, ainda mais nervoso. — Eu sei que a falência será inevitável, está sendo. As pessoas, principalmente os nossos clientes, não foram capazes de separar o que aconteceu. — Eu tenho outra estratégia. — Diga? — Que tal abaixar drasticamente os valores dos serviços da ELW e fechar com clientes pequenos? — Eu pensei nisso há alguns dias, vamos arriscar tudo, até alguma coisa dar certo. Assinto, desviando dos seus olhos. — Vou voltar para a minha sala, se precisar de mim, pode me chamar. Na verdade, eu vou respirar um ar livre pelos setores. Ele não diz nada, nem um “tudo bem”. Não estendo mais nenhum assunto e saio ligeira da presença desse homem. Ele está bem estranho, comparado a sábado. Alguma coisa deve ter acontecido. Eu é que não me arrisco a saber, prefiro ficar na minha, fazendo o meu trabalho. E que trabalho, viu?! Um dos mais difíceis que já enfrentei. Espero que as duas estratégias deem certo. Durante a primeira semana, vou analisando o desempenho da empresa. Boa parte dos funcionários não aceitaram bem a redução salarial, mas foi explicado os motivos e o prazo de três meses. Foi o Sr. Breno, irmão do Sr. Carter, que fez o discurso no refeitório. Ele foi incrível, deixou claro as dificuldades que a ELW está passando, desde as últimas polêmicas graves. Por mais que a empresa, nem os funcionários tenham culpa do que aconteceu, infelizmente, isso afetou a todos e agora, correm risco de falência. O Sr. Breno é cirúrgico nas palavras, pude sentir a sua sensibilidade, assim como a boa maioria presente. Desde esse dia, desde que o parabenizei pelo discurso e desde que ele me chamou para almoçarmos juntos, ISSO TODOS OS DIAS, nos aproximamos mais. Viramos bons colegas de trabalho. Diferente do Sr. Carter, que só fala o necessário do trabalho comigo, assim como eu. E isso é o certo, é melhor eu não ter intimidade com o CEO, sendo eu a conselheira dele. Quero que tudo dê certo, que a empresa se recupere e que comece a ter um saldo positivo no mercado, por mais que isso possa demorar alguns anos. Infelizmente, não há solução imediata em alguns meses, ou há, o que é uma raridade, ainda mais para o grau de polêmica que a Elektra Web se encontra. — Posso saber o que a Srta. Noely está pensando? Levo um susto ao ouvir a voz do Sr. Breno tão próxima a mim. Estou em pé, na varanda da sacada, que divide o hall da secretária e das salas. Vim tomar um cafezinho. A vista daqui é linda, se tornou um dos meus lugares preferidos. — Só estou tomando um café. Fito-o e, ele sorri fraco, observando-me com as mãos nos bolsos. — Estou te vendo todas as tardes aqui. — Eu terminei de deliberar alguns investimentos, para apresentar ao Sr. Carter. Aí vim tomar um café e aguardá-lo chegar. — Hum... acho que o nosso CEO não volta hoje. — Sério? Aconteceu alguma coisa? — Algo a ver com a ex-mulher dele, não sei direito, meu irmão é bem misterioso com a sua vida pessoal. — Entendi, o senhor também é. Acho que todos somos. — Minha vida pessoal não tem muito segredo, nem mistérios. Eu sou bem normal. Incluindo a rotina. — Parando para analisar, a minha é bem normal também. Eu acordo, vou trabalhar, chego em casa, durmo e no outro dia vou trabalhar de novo. É assim todos os dias. — Dou de ombros. — Temos muitas coisas em comum, incluindo gostos alimentares. — Não mesmo, você gosta de frutos do mar, e eu detesto. Não gosta de doces e eu amo. Ele começa a rir. — Pensa pelo lado bom, eu te dou todas as minhas sobremesas quando vamos almoçar juntos. É a minha vez de rir. — Isso é maravilhoso! O Sr. Breno desvia de mim e olha as horas no relógio de pulso. — Tenho um plano. Que tal sair mais cedo, se arrumar e eu passar às 20h na sua casa, para aproveitarmos a noite juntos? Arregalo os olhos. Ele está me chamando para sair? Tipo um encontro? M-MEU DEUS! — Senhor... eu... — Hoje é sexta-feira, Noely, duvido que tenha outro bom plano. — Não tenho. — Então perfeito, passo às 20h na sua casa. — Ele pisca. E após se retirar, seguro-me na barra da sacada. Céus, ele está a fim de mim? Será? Ele é o nível de homem que nunca dá nem bola para uma mulher como eu. Sei disso, porque tenho 29 anos e jamais fiquei com um cara como esse. Arrumo as minhas coisas e saio rápido da empresa. Chego em casa já pedindo socorro para a minha prima. Ligo a videochamada para ela ver as condições do meu closet. — Não tenho o que vestir! — É claro que tem! Ficou louca? Veste aquele seu vestido vermelho, que é bem tubinho e decotado. Nunca usou. — Não, esse é vulgar demais. O que o Sr. Breno vai pensar de mim? Que estou igual a uma oferecida! Darla revira os olhos do outro lado. — Não revira os olhos ou furo eles com os dedos. Ajude-me, sua vaca! — Veste o vermelho e fim de história, você fica elegante e uma puta gostosa com ele. — Não dá, é muito desconfortável, não estou acostumada a usar essas coisas. — E você comprou esse vestido pra quê? Larga de cu doce e veste logo. Não vai ficar vulgar coisa nenhuma. Por si só você é uma mulher muito elegante. Também, escolhe uma calcinha bem fio-dental, vai que rola um clima gostosinho e vocês transam. Respiro fundo, olhando para a peça estendida na cama. — Não sou de transar no primeiro encontro. — Afinal, você só teve três em toda a sua vida, pois não demonstra interesse em nenhum homem. — Será que estou demonstrando muito interesse no Sr. Breno? — Esbugalho os olhos. — É natural e importantedemonstrarmos interesse, ainda mais quando se é solteira e está na seca há anos. — Vai ver se estou na esquina, Darla. E não gosto de ser fácil demais. — Noely, eu vou te matar se você não for com o vestido vermelho no encontro e no fim da noite, não sentar na rola grossa desse homem! Veste logo o vestido, vagabunda! — Vagabunda é você, sua piranha sem amor. — Piranha não ama, querida, a gente fode. Vou te ligar daqui vinte minutos, e se você não estiver maquiada e dentro desse vestido, apareço aí para te meter um murro na cara. Darla desliga a chamada. Que cadela sem piedade. Mesmo nervosa e insegura, eu termino a maquiagem, visto o bendito vestido, os saltos e de frente para o espelho, eu solto os meus cabelos loiros — devido ao babyliss, eles caem em cascata, deixando tudo ainda mais sexy. Minha nossa, como fiquei bonita. Minha pele ganhou destaque, minhas curvas ficaram mais empinadas e meus peitos ficaram lá em cima. Estou muito gostosa, muito mesmo. Fiquei até com tesão do Sr. Breno me olhar assim... ou o Sr. Carter. Arregalo os olhos. Não! Meu pai santo, não! O Sr. Carter? Só posso estar louca. Aquele homem nem nunca olhou para mim de outro jeito, não como o Sr. Breno olha. Sem falar, que o Sr. Carter é bonito demais. Ele me lembra até o Superman de óculos. E sei que eu não faço o tipo do Superman. Estou naquela empresa para ser o seu conselho administrativo. Tirando-me dos meus pensamentos, Darla volta a ligar pelo vídeo e quando me vê com a roupa que queria, fica toda satisfeita, chega a dar pulinhos. Já a minha mãe, fica chocada, diz que estou muito sexy e que vou roubar a atenção de todos os homens esta noite. Estou nervosa, mas disposta a ser meio “fácil” para o Sr. Breno. Quero descomplicar as minhas inseguranças e deixar rolar o encontro. Afinal, pela semana que o conheci, vi que é um cara bacana. Assim que recebo a sua mensagem, de que chegou, despeço-me da minha mãe e saio de casa, abrindo o portão e dando de cara com o carro luxuoso dele. — Uau, Srta. Noely... — Ele para no meio da calçada, olhando-me dos pés à cabeça. — É a mulher mais bonita que já vi na vida. Ruboresço. — Não vale mentir. — Eu não minto. Ele chega perto de mim, tirando-me o fôlego com a sua beleza alta e forte. Sem falar nesse perfume masculino, que aflora toda a minha libido. Esse é quente demais. — Sempre é muito cheirosa, mas esta noite, seu cheiro é ainda mais de enlouquecer. Sorrio, aceitando a mão que me estende, cavalheiro. — O seu perfume também é... não sei. — Não sabe? — Cheiroso demais, deixa-me confusa. Ele ri e me leva até a porta do carro, fecha e dá a volta para igualmente entrar. — Que interessante, o meu perfume lhe deixar confusa. — É embaraçoso, meu Deus, você está me fazendo ficar com vergonha. — Acho que gosto de te deixar com vergonha. — Ele dá sua piscadinha costumeira e pisa com calma no acelerador. Em meia hora chegamos ao local, uma balada bem "gourmetizada", onde só tem ricos da elite. Nós nos acomodamos em uma mesa bem privada do segundo andar. — Eu estava precisando espairecer a mente um pouco — Breno confessa, após o garçom recolher os nossos pedidos. — Mas vai ser difícil fazer isso com você, dona Noely. — Por quê? — Porque desde que pisou os pés na porta dessa boate, nem um cara deixou de te olhar. Isso me fez ficar um pouco nervoso. — Nervoso? Sinto muito por isso, é porque eles são inconvenientes, né? — Não, o problema sou eu, é que às vezes eu posso ser possessivo com o que ainda não é meu. Perco a voz e toda a autonomia do meu corpo. Se eu estivesse tomando algo, com certeza teria cuspido a um metro de distância. Vou fingir que não entendi, pois não é possível que eu tenha entendido o que o Sr. Breno disse. Nossos drinks chegam rápidos, o que me faz ter algo para não engolir em seco. Bebemos e conversamos sobre muitas coisas divertidas. Na verdade, ele que torna tudo uma piada, tirou-me milhares de risadas. Doeu até o estômago. — É muito bom rir, eu estava precisando. Já estamos no nosso terceiro drink, soltos, íntimos e engraçados. — Eu nunca ri tanto na minha vida, fico feliz pelo senhor também estar se divertindo. — Noely, chame-me só de Breno, não estamos no escritório. Assinto, dando de ombros. Obviamente vou chamá-lo de Sr. Breno de novo, é impossível parar, já me acostumei. — E eu precisava mesmo dessa noite, não anda fácil as coisas na minha família. Noto que ele está tentando desabafar. — Devo imaginar, devido às polêmicas. Não deve ter afetado só a empresa. — Éramos uma família normal, até tudo vir à tona e desmoronar sobre as nossas cabeças. — Se refere ao seu pai? — É claro que me refiro a ele, não sabíamos de nada, principalmente, a minha mãe. Achávamos que a empresa estava falindo devido a qualquer outro motivo do mercado, menos por desvio de dinheiro. Já que o meu pai era o diretor executivo. Ele e a minha mãe têm 50% da ELW. Ela ficou arrasada com a traição e está até hoje, mesmo depois de um mês desse acontecimento. “Não anda sendo fácil para mim, nem para o Carter. Ele teve que deixar a sua vida às pressas nos Estados Unidos, para tentar recuperar o nosso patrimônio. E isso é só o resumo.” — Não sei nem o que dizer, me coloco no lugar de vocês. A pior dor deve estar sendo a da traição. Eu tenho um caso quase igual, mas é com o meu pai abandonando a minha mãe e eu, depois de ficar milionário com criptomoedas. — Ele abandonou vocês? — Sim, meu irmão fez o mesmo ao completar 18 anos. Foi atrás do nosso pai. Agora vivem pela Europa, esbanjando, com carros, mansões e lanchas. Já a gente, sofreu as minguas, passando fome e quase sendo despejadas, pois não tínhamos dinheiro para sequer comer, imagina pagar um aluguel? Se não fosse o meu tio e a minha tia, não sei o que seria de nós. — Que história chocante. Sério, mas que cara filho da mãe. Abandonou a mulher e a filha depois de ficar rico — ele murmura revoltado. Porém, antes que dissesse mais alguma coisa, seu telefone toca e ele verifica quem é. — É a minha mãe, preciso atender. Balanço a cabeça e beberico da minha bebida. O Sr. Breno se ergue, afastando-se para conversar a sós. Em dois minutos retorna, estranho, e me chama para acompanhá-lo. — Está tudo bem? Por que estamos saindo correndo da balada? — Desculpe-me, Noely. Droga! Ele para do lado de fora, passando a mão pelos cabelos e na barba, enquanto aguardamos o seu carro. O Sr. Breno está nervoso, tremendo. — Sr. Breno? Está me deixando assustada. — Foi a cuidadora que me ligou pelo celular da minha mãe, avisando que ela passou mal, seu coração acelerou e ela desmaiou sozinha no banheiro. Coloco a mão na boca, assustada pela notícia. — Meu Deus, espero que esteja tudo bem. — Preciso saber agora. Vou ter que te levar para o condomínio, não vou conseguir te deixar na sua casa. — Eu posso ir embora de Uber. — Não! Eu quem te peguei na sua porta e eu quem vou te deixar no mesmo lugar! — Tudo bem, fique calmo. O carro chega e entramos rápido, a caminho da casa da mãe dele. Até que eu penso no Sr. Carter. — Seu irmão já sabe? — A cuidadora também o avisou. — Certo. Volto a ficar em silêncio, apenas acompanhando o seu desespero para chegar o quanto antes ao destino. Até furou os sinais de trânsito. Seguro-me no cinto de segurança, rezando para que nada de ruim aconteça conosco. E graças a Deus, para o meu alívio, chegamos intactos ao tal condomínio de luxo. Ele dirige até a casa certa, ao parar, joga o carro na calçada e desce, correndo para dentro. Eu paro no degrau da entrada, sem fôlego para tantas emoções. Respiro fundo e entro, caminhando devagar para a sala. Estou sozinha no lugar, provavelmente, a mãe deles deve estar no quarto lá em cima. Uma empregada aparece perguntando quem eu sou e explico que estou acompanhando o Sr. Breno. Ela verifica a veracidade, depois volta, pedindo-me para ficar à vontade, enquanto aguardo-o. Espero por uns vinte minutos, até ouvir duas vozes conhecidas e exaltadas. Olho para cima e o Sr. Breno e o Sr. Carter descem os degraus da escada, discutindo superalto. — Não tem a porra do direito de tomar essa decisão, Carter! — Ela é a minha mãe também! Precisamos tirá-la desse país, fechar aquela droga de empresa e viver as nossas vidas! — Essa é a SUA vontade! E a da nossa mãe? Ela deu a vida pela ELW. Sabe o quanto aquela empresa é importante e se não soubesse, não teria atendido o seu pedido de voltar para o Brasil e tomar a frente do cargo executivo! — Eu vim e atendi o pedido pelo bem da saúde dela! E pra quê? Para no final vê-la se afundando em uma depressão por causa do nosso pai? — Ela não vai morar à força nos EUA! Não insista! Eu não vou deixar! Eles se encaram, com os punhos fechados. Ergo-me, chocada com a situação em que me meti, e com os meus dois chefes! — Vou convencê-la em três meses a desistir e vir comigo, será a decisão da nossa mãe, assim não terá como questioná-la. — Ela jamais aceitaria ser sustentada por nenhum de nós, ainda mais desistir dos seus negócios. Isso vai passar, Carter, ela vai superar essa merda toda que está acontecendo. — Como se você estivesse superando? — Não superei, assim como você, só estamos fingindo ser fortes para não desabarmos com a realidade. Irritado, o Sr. Carter vira a cabeça e então me vê, interrompendo a discussão. Engulo em seco, constrangida. — O que a Noely faz aqui? — ele solta a pergunta de repente, fazendo o Sr. Breno também me olhar. — Estávamos jantando, antes de eu receber a notícia. — Você e a Noely? — Como colegas de trabalho? — O Sr. Breno sorri, e o Sr. Carter o empurra, vindo nervoso na minha direção. Eu arregalo os olhos, pois ele me analisa dos pés à cabeça, quase me fazendo cair para trás. — Você vem comigo agora mesmo! — O Sr. Breno, ele... — Agora mesmo, dona Noely! O Sr. Breno assente, sem dizer nada. Eu fico sem entender o que está acontecendo, mas pego a minha bolsa e sigo o Sr. Carter para fora da mansão. — O que está acontecendo? — Eu estou te salvando, tem muito que beijar os meus pés. — O quê? — Paro no mesmo instante. — O que, o quê, Noely? Ele também para, no quarto degrau da escada de chão e me olha, não evitando percorrer as íris de cima para baixo no meu corpo. Eu coro as bochechas. Puta merda, que vergonha. — Você não costuma ir vestida assim para o escritório, ou sou eu que não presto muita atenção em você? — Claro que não! Isso não é roupa de se trabalhar... — Gostei muito, sinta-se à vontade para ir todos os dias vestida assim. — O quê? Está lou... — Fecho a boca, lembrando que estou de frente para o meu novo chefe. Ele sorri maldoso, sem disfarçar que está adorando o entretenimento. — Ia me chamar de louco? — Jamais, eu sou muito educada. Desço a escada e passo por ele, contando os segundos para ir embora e esquecer esse fracasso de noite. — O senhor vai me levar para casa? — pergunto, mudando de assunto. — É claro, estou te livrando de cair numa armadilha. — Se refere ao Sr. Breno? — Sim, você não merece tanto desgosto. Ele chega perto de mim e para na minha frente, causando-me arrepios com os seus olhos misteriosos e esse aroma de perfume forte. — Por que diz isso, referente ao seu irmão? — Não o quero iludindo mais uma, ainda mais você, minha conselheira. Não aceito distrações, Noely. — Pode me detalhar os motivos? — Chego a cruzar os braços. — Quem sabe ele mesmo não poderia te detalhar os motivos? Não me meto na vida dele, assim como ele não se mete na minha. A regra é básica e a respeitamos. — Acabou de se meter — falo tão no automático que a minha ficha cai só depois que eu fecho a bendita boca. — Eu me meti porque a senhorita é a minha conselheira. Eu a contratei para estar ao meu lado, e temos muito trabalho. Por isso, sem distrações na empresa — ele repete, depois vira as costas e começa a caminhar para o seu carro chique, do outro lado da rua. Rolos os olhos e sigo-o a passos ligeiros. — Como se a secretária e as suas roupas vulgares não fossem uma distração. — Eu ouvi algo? — O Sr. Carter vira tão inesperado, que eu bato sem querer nas suas costas e tropeço nos meus próprios saltos. Por pouco não caio no chão, se ele não tivesse me segurado e me salvado com as suas mãos grossas. — Meu Deus! — Aperto a camisa dele, com os meus batimentos acelerados. — Tudo bem, você se machucou? Olho para esse homem e perco o fôlego com a aproximação do nosso rosto, tão perto que sinto a sua respiração quente. — Não, o senhor que parou de repente. — Agora a culpa é minha? — Eu não disse isso... Desvio dos seus olhos e tento me afastar, mas ele não solta a minha cintura. — Realmente, ficou muito bem nesse vestido, Noely. — Ele escorrega as mãos da minha cintura e me solta devagar. Ele está analisando muito o meu vestido. Céus, eu preciso de um buraco para me enfiar dentro. — A minha prima, que me obrigou a vesti-lo, não faz parte do meu estilo. Mas, obrigada, Sr. Carter. — Faço questão que torne esse o seu novo estilo. Que descarado, não acredito nisso. Ele dá a volta e entra no carro. Eu também entro, fecho a porta e coloco o cinto de segurança. — Já está tudo bem com a sua mãe? — pergunto. — Ela está de repouso, foi apenas uma queda de pressão. A cuidadora achou que era outro ataque cardíaco, pois ano passado aconteceu uma situação parecida — explica, enquanto dirige. — Sinto muito, espero que fique tudo bem com ela, de verdade. — Vai ficar. Vou aguentar tudo isso enquanto posso. Fico alguns minutos quieta, mas não aguento. — E se em três meses der tudo certo? — Eu nomeio outro chefe executivo e vou embora com a mente totalmente limpa, mas se não der, fecho aquela empresa e levo a minha mãe comigo para os Estados Unidos, ela querendo isso ou não, será para o seu próprio bem. Abaixo a cabeça, apertando os meus dedos. — Eu cheguei “ontem” e já me meti na vida pessoal do meu chefe, peço desculpas por qualquer coisa. — Realmente, se a minha conselheira não tivesse tentado se envolver com o meu irmão, não teria se metido em toda essa situação e eu não estaria levando-a para a sua casa. Sério que esse homem foi tão grosso desse jeito? Quer saber, nesse momento, ele não está sendo o meu chefe, pois não estou no trabalho. — Incrível como é um ser delicado. — Eu não fui? — É claro que não foi, não o obriguei a me levar embora, afinal, eu estava com o seu irmão, e estava tudo ótimo. Ele é sempre muito bem- educado e um cavalheiro. Olho de canto e noto-o segurando-se para não revirar os olhos — Ainda vai me agradecer por essa noite, pode anotar na sua agenda. — Não me arrependi de nada até agora, está enganado. — Eu não disse que seria um arrependimento imediato. — Não vai ser. — Quer apostar? — Não. — Disse não, é porque está começando a perceber a verdade. — Sr. Carter, com todo o respeito, o senhor é irritante! — Oras, é um prazer receber tal título. — Sinta-se consagrado e benzido — resmungo, olhando para a janela. — Sabe, Noely, gostei muito de você — ele confessa tão inesperado que perco a fala. — É profissional, centrada, inteligente e adoravelmente divertida de se irritar. Contratei a conselheira perfeita. — Isso só pode ser deboche. — Não, é sério, sinto-a como a minha dupla para reerguer ou afundar a ELW. Somos Jack e Rose dirigindo o Titanic. Sem aguentar, começo a rir. — Só espero que o Titanic não afunde, farei o possível para isso não acontecer. Quero que dê tudo certo, Sr. Carter. Veremos até o final desse mês se as nossas estratégias ajudaram ou pioraram a situação da empresa. — Estou contando com o melhor... — ele fala baixinho, mas no fundo, acho que não conta muito com isso. Mas eu conto, eu confio no meu potencial. Esse Titanic não vai bater em nenhum iceberg. Em alguns minutos o Sr. Carter chega à minha casa. Acabo percebendo que nunca disse o meu endereço para ele. Como sabia? — Como sabia o meu endereço? — A secretária deixa tudo salvo no Google Maps. — Ah, entendi... agora faz sentido. Obrigada, Sr. Carter e também, sinto muito pelo transtorno. — Está perdoada. Arqueio a sobrancelha, para não revirar os olhos. Eu, perdoada? Eu só disse um sinto muito. Desço do carrodizendo “até amanhã" e caminho rápido para dentro de casa. É quando consigo voltar a respirar normal, graças a Deus. Que noite! Preciso ligar imediatamente para a minha prima e desabafar sobre tudo que aconteceu. Nem ela vai acreditar. Sem esperar por um temporal açoitando a minha janela pela madrugada, eu durmo muito mal. Não consegui pregar os olhos direito, morrendo de medo daquele barulhão, parecia o fim do mundo. E olha que nem estava com cara de que ia chover. Curitiba é uma caixinha de surpresas. — Hummm, não te vi chegando ontem, filha, mas ouvi você conversando no telefone. — Eu cheguei cedo, estava conversando com a Darla, fui desligar o telefone meia-noite — explico, sentando-me à mesa para tomar meu café antes de ir trabalhar. — E como foi o encontro? — Não foi bem um encontro, saímos como bons colegas de trabalho, só isso. — Dou de ombros. — Mas gostou dele? Penso no Sr. Breno, sem saber se gostei ou não. Mas é um cara bacana, não me arrependi de termos saído, como o Sr. Carter espera que eu me arrependa. — Não sei dizer, faz uma semana que comecei na empresa, o conheci há poucos dias. Vamos ver o que vai rolar daqui para frente. — Vai que você desencalha, já está na hora. — Mãe! Dona Ana ri, dando um beijo no topo da minha cabeça. Nem respondo esta senhora, minha mãe, pois sou muito educada. Termino o café e vou igual um zumbi para a ELW. Daria tudo para estar na minha deliciosa caminha. — Srta. Noely, que cara é essa? — Beatriz, a secretária, questiona, depois de eu tirar os óculos escuros. — Sono, minha querida, é uma tortura trabalhar no sábado. Mas se depender do nosso chefe, trabalharíamos até no domingo. — Já colocou isso na caixinha de reclamações da recepção? Arregalo os olhos para a voz que entoou atrás das minhas costas. Puta merda. Respiro fundo e então viro para o Sr. Carter, com um sorriso contagioso no rosto. Tento não corar, pois esse homem intimida qualquer alma penada com essa beleza de galã turco. Não acredito que ele me ouviu. — Bom dia, Sr. Carter. — Bom dia, minha adorável conselheira, por mais que não esteja tendo um “bom dia”, já que é uma tortura trabalhar no sábado. — É uma opinião pessoal que o senhor não devia ter ouvido, mas somos profissionais e para mudar de assunto, gostaria de lhe mostrar a minha análise semanal... A secretária fica nos olhando, com cara de chocada, pois parece que estamos sendo um debochado com o outro. Eu não estou sendo por acaso, foi ele quem começou. — É claro, na minha sala imediatamente, Srta. Noely. Ele abre espaço e deixa-me ir na frente. — Sente-se, por favor — pede, após fechar a porta. — Não. Serei rápida, pois quero descer para o setor dos desenvolvedores. Estou observando o comportamento dos superiores. — Mas eu mandei a senhorita sentar, por isso, sente-se. Nossa, ele é sempre tão dócil e gentil, né? Não sei como, mas isso me deixa com vontade de tacar o grampeador na cabeça dele. Merda, que pensamento é esse Noely? O Sr. Carter é seu chefe! — Nunca fique de pé quando for me informar de algo, isso irrita os meus nervos. E a terapia anda sendo cara demais para eu retroceder. — Desculpe-me, isso não vai mais acontecer. — Ótimo. Ele dá a volta na mesa, puxa a gaveta de baixo e serve-se de uma bebida alcoólica, ainda me oferece. Esse homem só vive à base de álcool? — Aceita? — Claro que não, já tomei o meu café. — É um remédio ótimo para suportar a vida. Fico quieta, esperando que ele finalmente foque a sua atenção em mim, para me ouvir. Ao fazer isso, eu vou direto no meu Excel e mostro para ele o progresso de uma semana. — Não vejo nada de diferente, Noely. — Como não, Sr. Carter? Comparado ao mês passado, nenhum cliente pediu para cancelar qualquer contrato. — Isso é bom? Pois comparado há dois meses, tínhamos o dobro que esses míseros clientes. Molho os lábios, segurando-me para manter a postura. — Não estou fazendo comparativos de dois meses, pois se fosse, eu teria colocado na tabela. Ele arqueia a sobrancelha, afrontado pela minha resposta curta e grossa. — O que importa é os pontos positivos depois de toda a polêmica, que aconteceu há um mês e duas semanas. É a partir daí que progressos e retrocessos devem ser aferidos. E desde que entrei na ELW, as coisas se mantiveram estabilizadas, afinal, o senhor também ajudou a permanecer nesse estado, despedindo alguns funcionários e contratando outros dispostos a fazerem bem-feito o seu trabalho. O Sr. Carter se ergue, observando-me atentamente. — Precisamos de mais progressos, Noely, ou milagres rápidos. Mas é bom estarmos estáveis. — Estáveis e abertos a novas estratégias para salvar a empresa. Ele dá a volta e para bem perto de mim, é necessário eu erguer a cabeça para encontrar os seus olhos em meio a quase 1,90 de altura. Mas não faço isso, pois sei que vou olhar para um lugar onde é muito inapropriado de olhar. E acabo de pensar nesse lugar... — Me dê mais uns dias, vou pensar no seu conselho de patrocinarmos projetos de desenvolvedores independentes. — Acho melhor focar nos de jogos, isso está fluindo igual nascente no mercado de games. É um nicho a se considerar o investimento. — Primeiro, devemos levar em consideração, que além do desenvolvimento, o nosso departamento é de administração, com equipes de marketing, mídia, vendas e de suporte técnico. — Eu sei disso, por esse motivo, recomendo fechar alguns departamentos por enquanto, já que muitos dos clientes que dependiam desses serviços, desvincularam-se. Devemos rever outro plano de negócio para a ELW, como investir nos desenvolvedores de games, contudo, podemos discutir isso no final do mês. Apenas pense, pesquise e estude a ideia. — Estudarei, com mais tempo. Ergo-me da cadeira, quase colada a ele. — Eu... também queria te perguntar uma coisa, Sr. Carter. — Sim? — Ele se escora na mesa, sem desviar dos meus olhos. — Por que o Sr. Breno não se envolve com a direção da empresa? Digo, o senhor não o convoca para fazermos reuniões em grupo. — É da preferência dele não se envolver com a direção, Breno cuida mais dos projetos finais. Por isso mesmo, quando eu sair da empresa, caso ela não vá à falência, devemos contratar um novo executivo. — Certo, mas o senhor o deixa por dentro de tudo? — Claro que sim. E qual motivo da pergunta, Noely? — Curiosidade, nas últimas empresas em que trabalhei, havia muitas reuniões em grupo, conselho de até dez pessoas. Era um sac... — pigarreio — enfim, estou gostando de poder tratar diretamente as coisas com o senhor. — A empresa é 100% nossa, o que significa que só minhas decisões importam. Ele chega mais perto de mim, fico até tonta com o seu perfume e o seu peitoral largo, coberto pela camisa social branca. — Mas está bem curiosa sobre o meu irmão, esqueceu do que conversamos ontem? — Sem distrações, só que ele não é uma distração, é o meu chefe também. Foi genuína a minha pergunta. — Eu sou o seu único chefe, Noely, e espero ter tirado todas as suas dúvidas genuínas. Agora, está dispensada. Ajeito a minha saia, jogo o cabelo para trás, abraço o meu tablet e viro as costas, mas antes de eu abrir a porta, ele me para. — Assim que sair, peça para a secretária entrar. Assinto, retirando-me e passando o recado para a Beatriz logo em seguida. Ela segura um sorrisinho no rosto e arruma o seu decote, também os cabelos. Franzo o cenho, em seguida, esbugalho os olhos ao entrar no elevador. Não, eles não... ah, que nojo! Eu não posso acreditar nisso, que merda de clichê repugnante! Não posso pensar, prefiro nem acreditar que meu chefe e a secretária fazem o que não devem no seu escritório. Isso é um filme? Um livro? Cadê a merda do profissionalismo desse homem? Desço para o setor escolhido e todos me olham, calando-se em meio aos seus cochichos, como se eu fosse a chefe. Fico até com vergonha. Converso um pouco com eles, também com o supervisor e volto horas depois para a minha sala. Passo, sorrindo forçada para a secretária, que já está sentada atrás da sua mesa. Não sei, mas o meu santo não bateu com o dela dejeito nenhum. — Noely? — Ouço a voz do Sr. Breno, e olho para a sala de reuniões. Ele está sentado do outro lado da mesa, com o seu notebook aberto e com alguns papéis do lado. — Olá, Sr. Breno... não te vi hoje. — Cheguei mais tarde na empresa. Tudo bem? Queria te pedir desculpas por ontem. Ele se levanta e vem até mim, extremamente bonito, com os seus olhos verdes e porte atlético. — Não peça, não foi culpa do senhor. — Mesmo assim, sinto muito. Espero que possamos marcar outra ocasião juntos, claro, se o Carter não tiver feito a minha caveira para você. — E por que ele faria a sua caveira? — Nada... — Sorri estranho. — Somos irmãos, é normal um implicar com o outro. Sinto muito, de verdade. — Está tudo bem, eu quem sinto muito pelo que aconteceu, espero que a sua mãe esteja melhor. — Ela ficará, depressão é uma doença complicada. — Mas, tenha fé. Ela vai passar por tudo isso e se recuperar com sucesso. — Obrigado, Noely, você é uma mulher incrível. Sorrio sem graça. — Também é um bom homem. Vou voltar para o meu serviço, com licença, Sr. Breno. — Toda, depois nos vemos. Eu piso para fora da sala e de repente, dou de cara com o Sr. Carter, passando no corredor e me olhando. Ele para e vem até o meio do hall, onde vê o Sr. Breno. — Precisa de algo, Sr. Carter? — Sim, pegue a sua bolsa para descermos. — O-oi? — Pegue, Noely! — simplesmente manda, todo autoritário. Eu não tive nem como refutá-lo, pois ele só deu a sua ordem e virou as costas. Esse homem é muito bipolar, meu Deus. Acertar o seu humor é como ganhar na megasena. Ainda bem que o Sr. Breno não viu essa cena, ele voltou todo concentrado para a mesa. Sem escolha, suspiro e imediatamente vou pegar a minha bolsa, para em seguida, descer o elevador com ele. Na garagem do subsolo, o Sr. Carter me faz segui-lo até o seu veículo chique. — Aonde vamos? — Almoçar — responde e entra no carro. Para não ficar igual uma idiota, com cara de tacho, eu também entro. — Assim, de repente, vamos almoçar? O senhor não me convidou. — E eu tenho que convidar a minha conselheira para almoçar comigo? — Mas é claro, não consta no meu contrato de trabalho ser conselheira submissa, que tem que obedecer ao seu “Sr. Grey” quando ele ordena. Ele me olha e noto que falei demais, acho que o “submissa” não era necessário, nem o “Sr. Grey”. Merda! Desvio do seu olhar, castigando-me mentalmente por falar igual uma vitrola velha. — Adorei saber que anda me fantasiado igual a 50 tons. Se quiser, posso fazê-la assinar um contrato bem peculiar e depois lhe mostrar o meu quarto vermelho. Tento não arregalar os olhos. E sorrio forçada. — É, e o senhor tem um quarto vermelho? — Não, mas se desejar, posso fazer um especialmente para a senhorita. — Sr. Carter! — repreendo-o, enojada. — Não acredito que o meu chefe está falando uma coisa dessa comigo. — Você quem me revelou a sua fantasia — ele refuta, enquanto dirige. — Eu não tenho fantasias! — Não tem? — Não mesmo, nem em sonhos. — Difícil de acreditar, é meio impossível. Noto que ele está se deliciando com o meu constrangimento. Que tipo de chefe é esse que eu consegui? — O senhor devia estar falando comigo sobre a empresa. — E o que temos mais para falar? Só nos resta colocar tudo em ação e esperar. Além de que é proibido falar de trabalho fora do trabalho. — É sério? Eu não sabia. — Sim, criei essa regra agora mesmo, só para você. Rolo os olhos, pedindo paciência ao bom Jesus. — Sinto que o senhor deseja que eu peça demissão. — De jeito nenhum, você é a única que está me deixando de bom humor para suportar aquele Titanic. — Bufa, virando na rua onde tem um restaurante de esquina. E é onde ele para. — Vai dar tudo certo, já disse que estou na ELW para fazer o meu trabalho. E farei o impossível para o Titanic não afundar. — Seu otimismo me surpreende. — Ele desce do carro, para desta vez abrir a porta e agir como um cavalheiro, que espera a sua dama sair do seu assento. Eu não disse que era um bipolar? Lá no estacionamento entrou igual um cavalo, nem sequer abriu a porta para mim. — Como é “cavaleiro”... — murmuro debochada ao descer, crendo também que ele não ouviria. E ele ouve! Maldição. — Disse algo, Srta. Sartori? — Que estou faminta... Ele analisa o meu rosto, deixando-me sufocada com a sua beleza turca. Será que ele tem ideia de como é bonito? E de como essa beleza intimida as pobres e meras mulheres sem chances? — Mataremos a sua fome. — Pisca e aponta, para eu ir na frente. Eu vou e escolho a mesa mais próxima do ar-condicionado quente. Hoje o dia continua frio e chuvoso. — Está com frio? — Um pouco. — Vou pedir um vinho para aquecer. Ele faz sinal para o garçom bonito, que se aproxima da nossa mesa, olhando-me. Depois que o Sr. Carter faz o nosso pedido, eu fico seguindo o garçom com os olhos, só de curiosidade por ele ter me olhado tanto. — A Globo está perdendo uma ótima atriz. — O quê? — Fito-o. — A senhorita estava comendo o garçom pelos olhos, sem nem sequer disfarçar. — Eu não seria tão deselegante, só estava curiosa por ele estar me olhando tanto. Tem algo de errado com o meu cabelo? O Sr. Carter chega mais perto de mim, fazendo questão de me escanear. Até fiquei tonta com a aproximação. — Sim, eles... — Ah, que horror, é essa chuva, dá tanto frizz! Passo desesperada as mãos nos fios. — Eles são muito bonitos. Paro no mesmo instante. — O que o senhor disse? — Se tivesse me deixado terminar de falar, talvez eu repetisse. Nossa, como ele é “cativante”. Nem respondo mais. Permaneço quieta e saboreando o vinho que o garçom veio nos servir. Ele ficou me olhando de novo. — Você realmente é tão bobinha para não perceber os olhares do garçom? — Eu não tenho tempo para ficar reparando nas intenções do garçom, Sr. Carter, isso não significa que eu seja bobinha, significa que não tive interesse. Àquela hora só olhei por curiosidade, pois convenhamos, é um rapaz muito bonito — respondo, alisando a taça e dando outro gole na bebida. Noto-o quase me fuzilando. — Direta e com muita sinceridade. — Para chegar aonde cheguei, realmente, tive que ser muito sincera e verdadeira. Às vezes, interpretada como nariz empinado. Mas não ligo, se você não for direta, obstinada, fica para trás. São poucos os que desejam o seu sucesso. Agora, para criticar e te fazer desistir, são milhares. — Incrível como somos tão iguais, é o mesmo pensamento que eu tenho. Se continuar assim, pode chegar ainda mais longe. Sorrio, agradecendo-o. Assim que chega o nosso almoço, tento comer igual um ser humano normal, por mais que eu queira devorar o prato inteiro, de tão bom que está. — Estou muito curioso com você, por não ter fantasias. — Não comece, Sr. Carter. — Isso é bem incomum, não posso ficar curioso? — Pode, mas isso é comum, pelo menos para mim. — Dou de ombros. — Não sei se acredito, prefiro tirar a prova — sussurra rouco e por fim chama o garçom para fechar a conta. Molho os lábios, sem querer levar as coisas para segundas intenções. Ele não seria capaz de levar, não é? Espero que não, pois eu teria um desmaio súbito aqui. Depois que saímos do restaurante e entramos no carro, o Sr. Carter voltou para a empresa. — Espero que não tenha odiado a minha companhia, logo que, odeia acordar cedo para trabalhar no sábado. Lá vem ele me provocar... — De forma alguma, uma coisa pode anular a outra. E por mais que o senhor tenha criado um prazer interno em implicar comigo, até que não é um chefe ruim. — É claro que eu não sou, espero que nem tenha pensado nessa possibilidade. — Ele pisca e descemos no estacionamento. Como é humilde também, esqueci de citar isso. — Enfim, obrigada pelo almoço, foi divertido. — Por nada, já disse que adoro a sua pessoa. Sorrio fraco e subimos juntos para o nosso andar, onde nos separamos novamente, cada um para a sua sala. No instante em que abro a porta do meu escritório, eu dou de cara com a Valentina, sentada bem em cima da mesa, com as pernas cruzadas. — Oi, amor, saudades da sua esposa? Eu trinco o maxilar e bato a porta. — O que fazno Brasil? — Eu vim cobrar o que você me deve. — Estou resolvendo as coisas com o seu pai. Valentina desce da mesa. — Eu quero os meus quatro milhões, chega de me enganar! — Eu já disse que não tenho essa quantia no momento, já leu as notícias do Brasil sobre a ELW? O que o meu pai fez com a empresa e com a nossa família? Estamos quase falidos! Ela respira fundo, vindo calma até mim. — Se não tivesse pedido o divórcio, você, o seu irmão e nem a sua mãe estariam nessa situação sozinhos. — Acabou, Valentina! Não envolva o nosso divórcio nisso. Sempre arruma um pretexto. — Só quero recuperar o nosso casamento feliz. Volte para mim, Carter, eu perdoo esse dinheiro que me deve e ajudo a sua família, essa empresa. — Não quero que se meta mais na minha vida. Eu vou te pagar essa merda, seu pai me deu um prazo! E se a empresa não se reerguer, vou vendê-la para te pagar tudo o que devo. Valentina puxa o meu braço e mesmo sob a minha negação, ela segura o meu rosto. — Larga de ser um teimoso, está falido e em desgraça também. E tudo que precisa fazer para voltar a ser o poderoso de antes, é reatar o nosso casamento. Eu posso te dar tudo o que quiser. — Menos o meu filho! Empurro-a para longe de mim. — Eu já disse que foi um acidente! — Nunca vou acreditar em você! — Carter, não diga isso, perdoe-me, já faz seis meses, podemos recomeçar de novo. O que preciso fazer para reconquistá-lo? — Nada, eu já estou com outra pessoa — respondo e vou até a porta, abri-la. — Agora vai embora, Valentina, o que tivermos para resolver, será intermediado pelo seu pai. Ela arregala os olhos e avança como louca até mim. — Está mentindo, você jamais viveria sem mim. Ficamos sete anos juntos! — E acabou, por sua causa! — Eu já te pedi perdão centenas de vezes! E não acredito que possa estar com outra mulher, você me ama! Do outro lado, a secretária nos assiste, juntamente com a Noely, que chega a virar de costas, fingindo que não está vendo ou ouvindo nada. Ela deve ter se atentado ao escândalo da Valentina e saído para conferir o que estava acontecendo. — Chega de me perseguir, volte para Nova York e viva a sua vida. — Não, minha vida é você! — Chega! Eu mesmo saio da sala, irritado com toda a situação infernal. — Quem é ela?! Não acredito em você, seu mentiroso! — Beatriz, retire-se por um minuto — ordeno para a minha secretária. Noely também tenta sair pelo elevador, mas paro-a. — Menos você, Noely. Ela engole em seco e paralisa no mesmo lugar. — Quero lhe apresentar, alguém, Valentina — chego perto da minha conselheira —, essa é Noely. — Quem? — Valentina começa a tremer e olha a Noely de cima a baixo. — É verdade? Como pode, Carter? — Sr. Carter? — Noely sussurra, sem entender nada. Não tenho tempo de explicar, apenas de agir para me livrar da Valentina. — Eu pude e você também pode, siga a sua vida com alguém que te mereça de verdade, pois eu, você não merece mais. — Você sofreu, chorou por mim, dizia que me amava! Só foi eu perder um bendito filho para me abandonar! — Você não perdeu, você o tirou à força, pois ele destruiria o seu corpo. Não foi o que falou? É uma egoísta, que só pensa em si própria! Vai embora daqui. — Essa desgraçada também vai perder qualquer filho que venha de você! — Ela encara a Noely. — E podia ter me trocado por algo melhor, não por essa loira burra. — O quê? — Noely não aguenta e dá um passo feroz. — Quem você pensa que é para me chamar de burra? Eu seguro o braço da Noely, puto comigo mesmo por tê-la colocado nessa posição constrangedora. — Eu sou alguém melhor que você, sua pobretona. — Já mandei você ir embora, Valentina, ou chamo os seguranças para expulsá-la à força. — Vai pagar por isso, Carter! Eu vou destruir a sua vida! — ela esbraveja alucinada e vira as costas, indo finalmente embora, para me dar paz, ou me deixar com outro problema, pois a Noely vira a cabeça e fita os meus olhos, brava comigo. Acho que nem “brava” é a palavra correta. — Desculpe-me por isso. — Solto o seu braço, passando a mão atrás da nuca. — Olha, Sr. Carter, eu não sei nem o que dizer! Será que é difícil eu ter uma ótima relação de chefe e funcionária, sem o senhor me colocar na sua vida pessoal? — Está brava? — O senhor ainda pergunta?! — exclama, de um jeito que eu nunca imaginei vê-la, já que é sempre tão prestativa, dócil e calminha. — E burra é a cretina da sua ex! Ou o senhor, por ter se relacionado com uma criatura tão doida como essa! — Noely... — pigarreio, mas vejo que ela já perdeu as estribeiras de tudo. — E eu sou a conselheira do senhor, não se esqueça de que estou aqui para fazer o meu trabalho! Por isso, também faça o seu papel de ser o meu chefe! — É claro. Eu posso falar? — Se for pedir desculpas, eu o desculpo e decreto que essa situação nunca aconteceu, agora, com licença. Sem me deixar me pronunciar, ela passa do meu lado, trombando de propósito no meu braço e afastando-se firmemente, com seus saltos fazendo um barulho forte no piso. Puta que pariu, meus olhos não desviam das suas curvas e a minha boca não se fecha, chocado e boquiaberto com essa mulher. Eu mereci? Eu mereci! Que droga, sinto muito pela Noely, foi muito errado o que eu fiz, ainda mais como o seu chefe. Eu vou para a minha sala, mas fico andando de um lado para o outro, pensando na desgraça que está a minha vida. E isso é tudo culpa do meu pai! Eu juro que se o visse na minha frente, eu... eu não sei nem o que faria! Penso na Noely, em comprar flores e chocolates para me desculpar, mas ela não parece ser uma mulher comum, que se encanta por esses gestos clichês. Bem diferente da Valentina, que ficaria feliz com qualquer mimo que recebesse. Do que será que ela gosta? Mal a conheço direito, só tem duas semanas na empresa. Duas semanas e já mostrou ser uma pessoa bem cativante e profissional, por mais que no início, pensasse que ela apenas me daria uma foda maravilhosa, para me desestressar da vida e dessa empresa à beira do precipício, logo que, para mim, conselheira nunca foi uma profissão com tanta credibilidade, que pudesse mudar as minhas opiniões do executivo. Talvez tenha me enganado bonito. Vivendo e aprendendo. — Senhor, mandou me chamar? — Beatriz aparece rapidamente. — Sim, você tem vinte minutos para descobrir do que a Srta. Noely gosta. — C-como? — Você entendeu, Beatriz. Ela assente e retira-se. Volto ao trabalho, com planos de sair mais cedo para encher a cara. Beber sempre é a solução, está no meu dicionário pessoal. Enquanto eu termino de averiguar dois relatórios, Beatriz volta. — Então? — indago. — Ela não sabe. — Como assim? — Bom, eu perguntei e a Srta. Noely deu de ombros, disse que não sabia... e que... — Sim? — Que tudo que ela gostaria no momento era só de ir embora. Isso foi bem em sussurro, parecia estressada. Pedi licença e a deixei sozinha. — Ela é sempre transparente — resmungo. — Pensarei em algo... obrigado, pode se retirar, Beatriz. Minha secretária sai. Eu arrumo as minhas coisas e só passo na sala da Noely para dizer que está liberada para ir embora, mas não aguento vê-la tão séria e estendo o assunto, após pigarrear. — Gostaria de recompensá-la por aquele constrangimento. — Já conversamos, Sr. Carter — diz, erguendo-se da cadeira e pegando a sua bolsa. — Estou ansiosa para semana que vem, para saber dos rendimentos ou retrocessos da ELW. Será importante, ando monitorando semanalmente todos os relatórios do financeiro. — Eu não estava falando da empresa, já está dispensada do trabalho. — Chego perto dela, após ela quase parar na minha frente. — Gostaria de recompensá-la por aquele constrangimento com a minha ex-esposa, dê alguma resposta, Noely. Não agi certo com você. Ela molha os lábios, lendo a minha alma com os seus grandes olhos castanhos. Seus traços são tão delicados e rejuvenescidos, qualquer um dá uns vinte anos para essa mulher. — Está tudo bem, o senhor não precisa se preocupar com isso, acho que tem problemas mais importantes para se martirizar. — Eu estava com planos de sair e beber, que tal ir comigo?Logo que já confessei que gosto muito da companhia da minha conselheira. — Se eu for, o senhor para de implicar comigo? — Não, e vou passar às 19h na sua casa. — Sr. Carter! — Já não combinamos tudo? — Eu levarei a minha prima, pois tinha planos de ir num barzinho com ela. — É claro, levarei o Breno também, para fazer a sua alegria, já que o adora tanto. Noely rola os olhos. — O senhor poderia ser um chefe normal — fala e vem até mim. — Igual um velho rabugento que maltrata os seus funcionários? — Nem tanto, não exagera. Desta vez seguro a porta para sairmos juntos. Também entramos no elevador. — Não me imagino um CEO fixo da Elektra Web, talvez seja isso que me torne o melhor chefe, sinto-me provisório até a hora certa. — Está fazendo muitos planos, quem sabe nem seja isso que o destino tenha preparado para o senhor? Ele gosta de pregar peças em nós. — Tomara que não, espero que esse destino esteja bem de acordo com os meus planos. Ela não fala mais nada. E no estacionamento, despedi-me, confirmando o horário que vou passar para pegá-la. Entro no carro e saio da empresa ligando imediatamente para a Darla e avisando que os nossos planos mudaram. Quando conto, ela se mostra perplexa. — Eu não acredito nisso, o seu chefe gostosão chamou a gente para sair? Ai, socorro, eu não tenho roupa à altura dessa noite. — Não estou nada contente. — E posso saber por quê? — Porque não estou gostando de ter tanta intimidade com o meu chefe. Acho que já me meti muito na vida do Sr. Carter, sendo que entrei há pouco tempo na empresa. — Você mesma disse que ele só vai ficar três meses como CEO, acho que não tem nada a ver ser amiga dele e ter uma boa relação nesse meio tempo. Isso é ótimo. — Eu nunca tive isso com nenhum outro chefe! Eles sempre deixaram claro o meu lugar e... não sei. Na verdade, eu não te contei o que aconteceu hoje. — Pois me conte, eu sou curiosa e preciso de todos os fatos para julgar certo o babado. — Acho melhor te contar pessoalmente, que tal arrumar suas coisas e eu passar aí para te pegar? Podemos ir para a minha casa, nos arrumamos lá. — Perfeito, dá tempo de colocarmos a fofoca em dia. Vou te esperar, gatinha. — Ok, já estou perto. Desligo o telefone e respiro fundo, pensando sem parar naquela cena e nas palavras daquele idiota. Como assim, o Sr. Carter devia ter arrumado “coisa” melhor do que ela? E como essa cara de cascavel pode me chamar de burra? Queria ter esfregado o meu diploma de burra na cara dela. Olha, estou tão estressada! Que ódio! Bufo, dirigindo o mais rápido possível para pegar a minha prima. Chego e ainda fico aguardando-a. Assim que ela sai de casa com a sua mochila e entra no carro, eu começo a desabafar. E graças a Deus, estava precisando fazer isso. — Que perua, vagabunda, cara de dragão atingida por soda! Como você pode ouvir isso e não fazer nada? — Darla questiona contra mim. — Você entendeu a parte onde o Sr. Carter fez tudo isso no improviso? Eu não conseguia nem me mexer direito, tentando entender o que estava acontecendo. Depois, compreendi que essa tal de Valentina era a ex-esposa dele. — Entendo e também fico com dó do seu pobre chefe, pelo que disse, ele teve um bom motivo para fingir que você era a atual dele, pelo menos, para se livrar dessa vaca. Ela teve coragem de tirar o próprio filho para não estragar o corpinho de naja! — Quando parei para raciocinar isso, também fiquei com mais raiva dela. Só que é difícil julgar, prefiro ficar na minha. É a vida pessoal do meu chefe, não tenho nada a ver, só quero trabalhar como uma funcionária normal. — Está certa, o que não tira o mérito dele ter se doído na consciência e ter te convidado para sair. Mostra que é um homem que se importa. Por isso, fica tranquila, Noely, o interessante é ficar bem gostosa esta noite. Afinal, o tal Breno, irmão dele, também vai, né? Tem que focar em sentar nesse homem. Rolo os olhos, rindo e não querendo estender as malícias da minha prima. Antes que ela comece a dizer que preciso transar, que estou encalhada e que vou morrer cheia de teias de aranha entre as pernas. Ela é desse nível para pior. Ao entardecer, eu e Darla começamos a nos arrumar juntas. Até a minha mãe vem nos ajudar. Tomamos banho, passamos cremes, fazemos o cabelo, a maquiagem, e por último, fica só a minha roupa. Darla berra comigo que eu vou com o vestido que ELA quer, enquanto eu quero ir com o vestido que EU quero. No fim da discussão, onde almofadas voaram para todos os cantos, a vagabunda conseguiu me fazer entrar no vestido que ela queria. É super curto e decotado. Como ela pode ter esse bendito poder de me controlar? — Tem que parar de cobrir esses peitos enormes e bonitos. Tem mulheres que pagam vinte mil para ter o que Deus te deu de graça. Tipo eu, com as minhas azeitonas, e estou me referindo só ao caroço — ela lamenta, enquanto esperamos pelo Sr. Carter na sala. Eu insisti que poderia ir com o meu carro, só que ele apenas repetiu que estava a caminho e encerrou a chamada. Como sempre, um perfeito cavalheiro com bipolaridade. Aguardamos e ele chega vinte minutos depois. Despedimo-nos da minha mãe, saímos de casa e entramos no seu carro, cumprimentando-o. Vamos no banco de trás, num silêncio constrangedor, até chegar no barzinho luxuoso e dar de cara com o Sr. Breno. Ele estava nos aguardando. — Olá, bem-vindas ao meu humilde estabelecimento — brinca, super receptivo. — Esse lugar é do senhor? — Senhor não, dona Noely, e sim, esse é um dos barzinhos que tenho pela cidade. — Nossa, que incrível. — Não mais incrível que a presença de vossas damas. — Ele olha para Darla, e lembro-me de apresentá-la. — Essa é Darla, minha prima. — Prazer, Srta. Darla... sou Breno — diz e beija a sua mão. — O prazer é todo meu... Olho de relance para o Sr. Carter e pego-o observando o meu vestido. Chego a engolir em seco, quase tendo um AVC. Ele estava me olhando! O Sr. Carter sobe a visão para os meus olhos e sorri. Minhas bochechas ardem, fico desfalecida de vergonha, ao mesmo tempo que curiosa para ler os pensamentos do meu chefe. O que será que ele pensou? — Como sempre, deslumbrante, Noely... — Breno sussurra, ao fazer a mesma inspeção em mim, como o seu irmão. — Por favor, sentem-se e fiquem à vontade. — Obrigada. Sento-me quase ao lado do Sr. Carter. Ele se acomodou na ponta da mesa, Darla também ficou ao meu lado e o Sr. Breno na nossa frente. O espaço não é tão pequeno, mas deixa todos bem próximos. — Aqui é tão agradável — comento, admirando a decoração rústica do barzinho. — Vocês têm que provar os drinks da casa. — Eu só quero um whisky — Sr. Carter informa. Já eu e a minha prima aceitamos qualquer drink sugestionado pelo Sr. Breno. A bebida ajuda a nos soltar, principalmente a Darla, que puxa assunto do nada com eles. E adivinha o tema? Eu. — Temos muito orgulho dela, é aquela prima que deu certo e que a minha mãe usava de exemplo nos sermões. Eles sorriem. — Não é qualquer um que consegue entrar em uma Havard da vida — Sr. Breno brinca. — Ou uma Oxford. — Ele pisca para o irmão. — Temos algo bem em comum, Darla, meus pais também usavam o meu irmão de exemplo. — Não foi culpa sua não querer entrar numa faculdade. — Sr. Carter dá de ombros. — Nem a minha — Darla completa. — Alguns pais têm muito isso de idealizar o futuro do filho, o que ele vai fazer, qual faculdade vai entrar e em qual curso brilhante vai se formar. — Por isso eu fui o filho rebelde. — Eu também fui, ou sou. — Darla ri para o Sr. Breno. Eles parecem até iguais mesmo, inclusive na energia e no jeito. — Por que está tão quieta? — Um sussurro próximo a mim faz o meu corpo se arrepiar. Olho para ele. — Não sei... não estou normal? — Nem um pouco, você costuma falar mais. — Talvez eu esteja na minha, pensativa. — Pensando em fantasias? — Sr. Carter! — Não aguento e sorrio. — Nem comece. — Pelo menos tirei um sorriso de você. Está gostando do seu drink? — Sim, é bem docinho. Sem ter mais o que conversarmos, observamos a minha prima e o Sr. Breno, que ainda conversam divertidos
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