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FENÔMENO RELIGIOSO NA CONTEMPORANEIDADE E EDUCAÇÃO (UNIFCV)

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Prévia do material em texto

Fenômeno Religioso na 
Contemporaneidade
e Educação
Professora Ma. Laís Azevedo Fialho
Professor Me. Giovane Marrafon Gonzaga
AUTORES
Professora Ma. Laís Azevedo Fialho
●	 Mestra	em	História,	Cultura	e	Narrativas	(PPH-Universidade	Estadual	de
	 Maringá).
●	 Especialista	em	História	da	África	e	Cultura	Afro-brasileira	(DCS-
	 Universidade	Estadual	de	Maringá).
●	 Licenciada	em	História	(DHI-Universidade	Estadual	de	Maringá).
●	 Tutora	Educacional	no	Centro	Universitário	Cidade	Verde	(UniFCV).
●	 Professora	Conteudista	na	UniFatecie.
●	 Experiência	como	professora	de	História	da	Rede	básica	de	Educação	em	2016.
●	 Atuou	como	Pesquisadora	Bolsista	Capes	em	2018	e	2019.
●	 Coordenou	e	organizou	diversos	Projetos	de	Extensão	abordando	as	Religiões		
	 e	Religiosidades	Afro-brasileiras,	na	Universidade	Estadual	de	Maringá,	
	 entre	2015	e	2019.
●	 É	integrante	do	Laboratório	de	Religiões	e	Religiosidades	da	Universidade	Esta	
	 dual	de	Maringá	(LERR/UEM).
Áreas	de	concentração:	História	das	Religiões	e	Religiosidades	com	ênfase
nas	Práticas	Afro-brasileira;	História	Cultural,	Epistemologias	decoloniais.
Endereço	para	acessar	este	CV:	http://lattes.cnpq.br/8724898233397030
Professor Me. Giovane Marrafon Gonzaga
●	 Doutorando	em	História,	Cultura	e	Narrativas	(PPH	–	Universidade	Estadual	de		
	 Maringá)
●	 Mestre	em	História,	Cultura	e	Narrativas	(PPH-Universidade	Estadual	de		Maringá).
●	 Licenciado	em	História	(DHI-Universidade	Estadual	de	Maringá).
●	 Experiência	como	professor	de	História	da	Rede	básica	de	Educação	de	2018		
	 a	2020.
●	 Pesquisador/discente	no	Laboratório	de	Estudos	em	Religiões	e	Religiosidades		
	 (UEM)	e	Laboratório	de	Estudos	em	Religiosidades	e	Cultura	(UEM).
Áreas	de	concentração:	História	das	Religiões	e	Religiosidades	com	ênfase
nas	Práticas	Afro-brasileira;	História	Cultural.
Endereço	para	acessar	este	CV:	http://lattes.cnpq.br/2869647069753158
APRESENTAÇÃO DO MATERIAL
Caros	 (as)	estudantes,	produzimos	esse	material	 com	dedicação	e	comprometi-
mento	a	fim	de	proporcionar	para	você	uma	oportunidade	de	aprendizado	sobre	fenômenos	
religiosos,	a	religião	na	contemporaneidade,	as	diversas	manifestações	religiosas	e	suas	
particularidades,	além		de	pontuar	as	relações	entre	tais	assuntos,	a	educação	e	o	Ensino	
Religioso.
A	religião	pode	ser	analisada	a	priori	como	um	conjunto	de	crenças	e	ritos.	Por	outro	
lado,	pode-se	pensar	que	o	essencial	na	religião	só	é	compreendido	como	algo	que	emana	
do	alto,	de	Deus.	O	ponto	de	vista	analítico	adotado	importa	pois	o	tema	é	complexo,	não	
podemos	perder	 isso	de	vista.	Desse	modo,	o	que	priorizamos	neste	estudo	são	modos	
de	enquadrar	 teoricamente	as	representações	das	religiões	como	experiências	vividas	e	
passíveis	de	observação,	ou	seja,	os	fenômenos	religiosos.	
Iniciaremos	nossa	discussão	com	uma	incursão	teórica	sobre	fenômenos	religio-
sos	e	sociedade.	Abordaremos	diversos	conceitos,	definições	e	disputas	analíticas	para	
compreender	nossa	temática.	Apresentaremos	estudos	inaugurais	que	influenciaram	con-
sideravelmente	a	Ciência	das	Religiões	e	alguns	debates	sobre	modos	de	se	perceber	os	
fenômenos	religiosos	a	partir	de	diferentes	áreas	do	conhecimento.	Destacaremos,	também,	
algumas	características	dos	fenômenos	religiosos	na	contemporaneidade.
Na	segunda	unidade,	nos	dedicaremos	a	pensar	sobre	como	as	pessoas	se	com-
portam	em	relação	à	religião	em	nossa	sociedade.	Abordaremos	o	contato	cultural	como	
catalisador	para	formação	e	adaptação	das	religiões	em	diferentes	sociedades	no	mundo	
e	no	tempo,	bem	como	nos	deteremos	sobre	as	imbricações	desse	processo	na	história	
das	religiões	no	Brasil	com	o	poder	e	com	o	cotidiano.	Posto	isso,	refletiremos	sobre	como	
o	indivíduo	contemporâneo	se	orienta	em	relação	a	multiplicidade	de	religiões,	crenças	e	
práticas	presentes	no	mundo.
Já	em	nossa	terceira	unidade,	apresentaremos	um	debate	teórico	sobre	fundamen-
talismos	religiosos.	Analisaremos	algumas	manifestações	desse	fenômeno	em	diferentes	
tempos	históricos	e	culturas	religiosas,	bem	como	a	própria	historicidade	do	termo.	Apresen-
taremos	algumas	características	típicas	desse	fenômeno	e	contextualizamos	o	crescimento	
de	fundamentalismos	religiosos	no	Brasil	contemporâneo.
	Por	fim,	veremos	na	última	unidade	qual	pode	ser	o	papel	do	Estado	em	relação	à	
religião.	Lançaremos	luz	sobre	o	conceito	de	Estado	laico	e	seu	desenvolvimento	histórico	
no	Brasil.	Em	diálogo	com	tais	discussões,	pensaremos	também	sobre	alguns	tabus	religio-
sos.	Esperamos	que	você	possa	se	interessar	pelas	discussões	aqui	iniciadas!
Bons Estudos!
SUMÁRIO
UNIDADE	I	...................................................................................................... 6
Fenômenos Religiosos e Sociedade
UNIDADE	II	................................................................................................... 24
As Religiões Contemporâneas
UNIDADE	III	.................................................................................................. 49
Fundamentalismo Religioso
UNIDADE	IV	.................................................................................................. 69
Religião e Políticas
Plano de Estudo:
●	 Homem	como	um	ser	religioso	e	social.
Objetivos da Aprendizagem:
●	 Definir	o	fenômeno	religioso.
●	 Estabelecer	as	múltiplas	vertentes	conceituais	em	torno	dos	fenômenos	religiosos.
●	 Apresentar	algumas	características	dos	fenômenos	religiosos	na	contemporaneidade.
5
UNIDADE I
Fenômenos Religiosos e Sociedade
Professora Me. Laís Azevedo Fialho
Professor Me. Giovane Marrafon Gonzaga
6UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
1. HOMEM COMO UM SER RELIGIOSO E SOCIAL 
1.1 A religião e o fenômeno religioso
A	palavra	“religião”	vem	do	latim,	significa	“religare”	e	refere-se	etimológicamente	à	
uma	confluência	de	pessoas	em	torno	de	algo	que	as	conecta	com	o	sobrenatural.	Histori-
camente,	o	termo	se	relaciona	às	crenças	e	práticas	de	um	grupo.	Esse	aspecto	da	vida	é	
essencial	e	permanente	na	humanidade,	um	fenômeno	coletivo	que	gera	a	criação	de	laços	
solidários	entre	pares	e	consolida	padrões	éticos	baseados	na	crença	de	um	determinado	
grupo.
Sobre	a	tentativa	de	indicar	o	que	seria	religião	e	porque	é	relevante	enquadrá-la	
como	um	aspecto	importante	da	vida	humana,	mesmo	com	todas	as	problemáticas	envoltas	
em	conflitos	religiosos,	Beter	Berger	(2003,	p.	112)	diz	o	seguinte:
Pode-se	dizer	que	a	religião	aparece	na	história	quer	como	força	que	sus-
tenta,	quer	como	força	que	abala	o	mundo.	Nestas	duas	manifestações,	ela	
tem	sido	tanto	alienante	quanto	desalienante.	É	mais	comum	verificar-se	o	
primeiro	caso,	devido	a	características	intrínsecas	da	religião	como	tal,	mas	
há	exemplos	importantes	do	segundo.	
Trouxemos	esse	 texto,	 porque	é	 importante	 problematizar	 o	modo	 como	alguns	
discursos	 buscam	 atribuir	 à	 religião	 a	 origem	 dos	 problemas	 sociais.	 Será	mesmo	 que	
ela	não	é	só	mais	um	modo	por	onde	a	existência	humana	se	manifesta?	A	religião	está	
atrelada	aos	princípios	de	moralidade	e	ética	que	circundam	os	indivíduos.	É	essa	ética	que	
determina	o	que	é	certo	fazer	e	o	que	deve	ou	não	ser	feito.	
7UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
Figura	1	-	Tirinha	sobre	religião	e	ética.	Fonte:	https://www.satirinhas.com/wp-content/
uploads/2013/03/satirinhas-religi%C3%A3o-n%C3%A3o-define-car%C3%A1ter.jpg
O	autor	Schiavo	(s/d)	diz	que	a	religião	é	também	cultura,	pois	atribui	significados	
a	questionamentos	e	respostas	sobre	a	existência	humana	e	o	sentido	da	vida.	Para	ele,	a	
religião	não	é	patrimônio	exclusivo	das	igrejas,	mas	dos	povos	que	a	construíram	e	cons-
troem	como	aspecto	importante	de	suas	culturas.		O	autor	postula	que	a	religião	“antes	de	
ser	a	estruturação	de	certa	experiência	religiosa	é,	e	representa,	o	anseio	humano	de	se	
transcender	e	de	se	encontrar	com	aquele	Ser,	no	qual	a	humanidade	encontra	respostas	
às	suas	perguntas	profundas”	(SCHIAVO.	s/d,	p.	77).	
Desse	 modo,	 prezado(a)	 estudante,	 o	 estudodas	 religiões	 é	 importante	 para	
compreendermos	a	condição	humana	em	seus	aspectos	mais	profundos	e	misteriosos.	A	
religião	contribui	para	a	formação	de	estruturas	imaginativas	elementares	sobre	como	nos	
orientamos	ou	deveríamos	nos	orientar	no	cosmos.	
A	religião	dá	forma	e	ensaia	no	ritual	nossos	mais	importantes	laços,	uns	com	
os	outros	e	com	a	natureza,	e	provê	a	lógica	tanto	ao	porque	destes	laços	
serem	 importantes	 como	 ao	 o	 que	 significa	 estar	 comprometido	 com	 eles	
(NEVILLE;	WILDMAN,	apud	NEVILLE,	2005,		p.	37)
Compreendemos	que	a	religião	está	para	além	das	instituições,	mesmo	que	seja	
organizada	 por	 ela.	 É	 um	aspecto	 da	 cultura	 e	 que	 organiza	 pessoas	 com	as	mesmas	
crenças.	Mas	então	o	que	difere	o	fenômeno	religioso	do	fenômeno	social?	O	pesquisador	
8UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
Zilles	(2004)	nos	auxilia	a	pensar	sobre	a	questão	apontando	que	a	estrutura	especial	do	
homem	é	definida	por	sistema	de	relações	com	os	outros	homens:
No	fundo	de	toda	a	situação	verdadeiramente	religiosa	encontra-se	a	refe-
rência	aos	fundamentos	últimos	do	homem:	quanto	à	origem,	quanto	ao	fim	
e	quanto	à	profundidade.	O	problema	religioso	 toca	o	homem	em	sua	raiz	
ontológica.	Não	se	trata	de	fenômeno	superficial,	mas	implica	a	pessoa	como	
um	todo.	Pode	caracterizar-se	o	religioso	como	zona	do	sentido	da	pessoa.	
Em	outras	palavras,	a	religião	tem	a	ver	com	o	sentido	último	da	pessoa,	da	
história	e	do	mundo	(ZILLES,	2004,	p.	5-6).
Assim,	caro(a)	estudante,	a	religião	pode	ser	compreendida	como	uma	dimensão	
pela	qual	as	pessoas	se	unem	e	organizam	um	modelo	de	diversos	aspectos	sociais.	A	re-
ligiosidade	se	mantém	em	nosso	horizonte	como	um	aspecto	da	cultura	que	funciona	como	
lentes	pelas	quais	os	sujeitos	religiosos	veem	o	mundo.	Muitos	aspectos	da	vida	social	são	
diretamente	orientados	pelo	filtro	da	religião,	como	o	modo	de	vestir,	se	alimentar,	cuidar	
do	corpo,	etc.	
A	prática	do	Candomblé,	por	exemplo,	é	toda	baseada	em	comidas.	Os	alimentos	
fazem	parte	dos	rituais	ligados	às	divindades	africanas.	Nos	cultos,	come-se	para	transmitir	
o	axé	às	entidades	às	quais	se	reza	–	orixás	e	espíritos	ancestrais.	Logo,	o	alimento	passa	
a	figurar	cotidianamente	a	mesa	do	adepto	da	religiosidade	Afro-brasileira.	É	o	caso	do	aca-
rajé,	historicamente	relacionado	à	cozinha	baiana,		já	que	o	estado	figura	o	maior	estado	
negro	fora	da	África	e	possui	uma	grande	população	Afro-religiosa.
Figura	2	-	Baiana	de	Acarajé
Fonte:	https://veja.abril.com.br/gastronomia/acaraje-da-cira-e-eleito-o-
melhor-de-salvador-pelo-juri-veja-comer-beber/
9UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
Pensando	na	vestimenta,	nós	podemos	citar	uma	série	de	elementos	relacionados	
à	 indumentária	necessária	para	o	serviço	religioso	no	Judaísmo.	Quipá,	 talit,	pejot,	 teflin	
são	os	nomes	de	alguns	deles,	todos	com	algum	significado	imaterial.	As	roupas	para	esse	
adepto,	portanto,	deixam	de	ter	somente	uma	finalidade	prática	e	passam	a	ter	também	um	
aspecto	simbólico,	que	se	relaciona	intimamente	ao	rito.
Figura	3	-	Indumentária	utilizada	por	alguns	grupos	de	judeus
Fonte:	http://2.bp.blogspot.com/-4gqxH_9zJCs/ThkIzgZDm_
I/AAAAAAAAAvE/XcJzjqEUYD0/s1600/Roupas+de+Judeu.jpg
Já	sobre	a	relação	que	o	homem	religioso	possui	com	o	corpo,	podemos	citar	o	
caso	de	alguns	grupos	indígenas	em	que	tatuagens	e	marcações	na	pele	são	realizadas,	
como	modo	de	comunicar	e	identificar	um	rito	iniciático.	Sobre	o	assunto,	Vidal	(1992,	p.	
13)	diz	o	seguinte:
Apenas	 recentemente	 a	 pintura,	 a	 arte	 gráfica	 e	 os	 ornamentos	 do	 corpo	
passaram	a	ser		considerados		como		material		visual		que		exprime		a		con-
cepção		tribal		de		uma	pessoa	humana,	a	categorização	social	e	material	e	
outras	mensagens	referentes	à	ordem		cósmica.		Em		resumo,		manifestações		
simbólicas		e		estéticas		centrais		para		a	compreensão	da	vida	em	sociedade
Agora	que	nós	já	vimos	alguns	exemplos	práticos	de	como	essa	dimensão	da	vida	
social	comunica	as	práticas	e	modos	com	que	o	homem	religioso	significa	o	mundo,	passa-
10UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
remos	a	apresentar	alguns	estudos	que	organizam	de	modo	teórico	a	análise	do	fenômeno	
religioso.	Para	isso,	apresentaremos	alguns	conceitos	e	autores	que	balizam	as	análises	
sobre	o	tema.	Inicialmente,	apresentamos	um	breve	panorama	sobre	o	estudo	científico	que	
apresenta	o	espaço	delimitado	para	a	Religião	no	Ocidente	e	organiza	as	bases	utilizadas	
pela	Antropologia,	para	pensar	fenômeno	religioso	e	sociedade.	
1.2 Estudos inaugurais sobre o fenômeno religioso
Max-Muller	é	reconhecido	por	ter	criado	a	metodologia	de	religião	comparada	e	por	
ter	traduzido	os	Upanishads,	textos	sagrados	da	cultura	hindu,	em	meados	do	século	XIX	
(SILVA,	2009).
Figura	4	-	Friedrich	Max-Müller,	Junho	de	1857
Fonte:	National	Portrait	Gallery,	London.
Já	o	antropólogo	britânico	Edward	Burnett	Tylor	 influenciou	consideravelmente	a	
Ciência	das	Religiões,	por	ser	o	responsável	pela	criação	da	teoria	animista.	O	intelectual	
utilizou-se	de	princípios	próprios	do	evolucionismo	de	Darwin,	para	o	estudo	das	culturas	
e	 das	 religiões.	Tylor	 (1920)	 postulava	 que	 todos	 os	 seres	 humanos	 tinham	uma	 única	
origem,	portanto	assumia	uma	postura	“monogenista”,	em	confronto	à	teoria	de	que	o	ser	
humano	não	tem	uma	única	origem,	chamado	portanto	plurigenismo.	Outro	posicionamento	
que	o	coloca	como	importante	intelectual	do	período	é	que	ele	negou	a	perspectiva	degra-
11UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
dacionista.	Esta	corroborou	uma	sentença	bíblica	de	que	o	homem	foi	criado	perfeito,	e	ao	
longo	da	história	foi	se	encaminhando	para	a	degradação	(SILVA,	2009).	
Desse	modo,	o	 intelectual	defendia	que	o	homem,	ao	 longo	da	história,	 foi	evo-
luindo	e	se	desenvolvendo.	Ou	seja,	baseava-se	na	crença	no	progresso	e	universalidade	
do	ser	humano.	Por	outro	lado,	o	fundador	da	antropologia	britânica	classificou	todas	as	
diferenças	em	uma	escala	evolutiva.	Foi	o	primeiro	pesquisador	a	publicar	uma	definição	
formal	de	cultura:			
Cultura	 ou	 civilização,	 tomada	 em	 seu	 mais	 amplo	 sentido	 etnográfico,	 é	
aquele	 todo	complexo	que	 inclui	conhecimento,	arte,	moral,	 lei,	costume	e	
quaisquer	outras	capacidades	e	hábitos	adquiridos	pelo	homem	na	condição	
de	membro	da	sociedade”	(TYLOR,	[1871]	2005,	p.	69).
Figura	5	-	Edward	Burnett	Tylor,	Londres,	Outubro	de	1832
Fonte:	Encicolpédia	Britannica.	
Historicamente,	não	podemos	perder	de	vista	que	o	 século	XIX	no	Ocidente	 foi	
marcado	pela	 consolidação	do	 cientificismo.	Um	dos	marcos	principais	 desse	momento	
foi	a	divulgação	do	estudo	de	Charles	Darwin	(1859),	intitulado	“A	origem	das	espécies”.	
Desse	modo,	temos	um	grande	distanciamento	entre	o	sistema	de	pensamento	religioso	
(judaico-cristão)	e	o	sistema	de	explicação	científico	da	época.	Diversos	fatores	corrobora-
ram	esse	afastamento,	tais	como	a	Reforma	Protestante	e	o	Iluminismo	(BELLOTTI,	2011).
O	historiador		Michel	de	Certeau	(2002)	indica	que	a	Reforma	Protestante	enfra-
queceu	consideravelmente	o	poder	do	cristianismo	como	único	sistema	explicativo	admitido	
12UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
pela	 sociedade	 europeia.	 Ela	 instituiu	 a	 concorrência	 religiosa	 com	 a	 Igreja	 Católica,	 o	
que	culminou	nas	guerras	religiosas	do	século	XVII.	Sobre	o	assunto,	a	historiadora	das	
Religiões	Karina	Kosicki	Bellotti	(2011,	p.	16),	diz	o	seguinte:
Se	até	então	religião	e	política	formavam	uma	só	instância	de	poder,	a	partir	
desse	período	a	instância	religiosa	rivalizará	com	outras	instâncias	sociais	e	
políticas,	além	da	ciência,	que	surge	cada	vez	mais	distanciada	de	elemen-
tos	religiosos	em	suas	explicações.	Se	na	chamada	revolução	científica	do	
século	XVII	muitos	estudiosos	buscavam	aliar	observações	e	experimentos	a	
conceitos	religiosos/filosóficos,	explicando	os	mecanismos	de	funcionamento	
da	“criação”,	no	Iluminismo	houve	um	antagonismo	ferrenho	entrefilósofos	e	
cientistas	e	a	religião,	seja	a	encarnada	pelas	instituições	religiosas,	seja	a	
religião	popular.	
Novos	distanciamentos	em	relação	à	religião	organizada	também	marcam	o	fim	do	
século	XIX,	tais	como:
●	 Deísmo,	crença	em	uma	inteligência	divina	que	não	se	vincula	a	ritualismo	ou	dogma.
●	 Ateísmo,	a	negação	de	Deus.	
Todos	esses	acontecimentos	contribuíram	para	demarcar	um	lugar	limitado	para	a	
religião	no	Ocidente.	Ou	seja,	esses	acontecimentos	corroboram	a	transformação	da	reli-
gião	em	um	objeto	de	pesquisa,	enquadrável	e	analisável,	como	qualquer	outro	fenômeno	
humano.	Sobre	o	assunto	Bellotti	(2011,	p.	17)	diz	o	seguinte:	“para	que	o	estudo	científico	
da	religião	surgisse,	foi	necessário	dessacralizá-la”.
No	 entanto,	 não	 podemos	 assumir	 que	 houve	 um	 completo	 distanciamento	 en-
tre	os	princípios	religiosos	ocidentais	e	a	linguagem	científica	no	campo	da	antropologia.	
Assim,	assinalamos	que	o	período	 foi	marcado,	 também,	por	 um	enorme	 interesse	dos	
pesquisadores	para	com	as	culturas	consideradas	“exóticas”	ou	“primitivas”.	Influenciados	
por	ideias	de	Darwin	quanto	ao	mundo	natural,	cientistas	europeus,	como	o	próprio	Tylor,	
já	citado,	preocuparam-se	em	classificar	a	espécie	humana,	a	partir	dos	seus	costumes	e	
especificidades	culturais	e	raciais.	
Precisamos,	portanto,	considerar	que	o	estudo	acadêmico	das	religiões	 foi	 inau-
gurado	por	evolucionistas	que,	na	segunda	metade	do	século	XIX,	se	empenharam	em	
qualificar	o	desenvolvimento	humano	a	partir	de	uma	perspectiva	a-histórica	e	atemporal.
Da	 mesma	 forma	 que	 antropólogos	 criminais,	 frenologistas	 e	 eugenistas	
quiseram	 provar	 as	 diferenças	 “raciais”,	 hierarquizando	 diversos	 grupos	
étnicos	que	se	tornaram	conhecidos	pela	empresa	imperialista	antropólogos	
e	etnólogos	como	Müller,	Tylor	e	James	Frazer	(O	Ramo	de	Ouro,	1890),	par-
tiram	de	premissas	evolucionistas	para	hierarquizar	os	povos	e	suas	crenças	
religiosas:	 comumente	 encontram-se	 nesses	 trabalhos	 classificações	 que	
atribuem	aos	povos	“primitivos”	o	domínio	da	magia	e	aos	povos	“civilizados”	
a	presença	da	religião	institucionalizada.	Povos	que	se	atrasaram	na	escala	
evolutiva	 jamais	 poderiam	 alcançar	 o	 nível	 de	 organização	 religiosa	 dos	
povos	ocidentais	europeus,	por	estarem	desprovidos	de	uma	“verdadeira”	e	
complexa	cultura	(BELLOTTI,	2011,	p.	18).
13UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
No	século	XIX,	diversas	nações	europeias	conheceram	povos	não	europeus.	Es-
ses	foram	tidos	como	o	“Outro”,	considerando	que	o	homem	branco	olhava	para	si	mesmo	
como	a	norma.	Não	estavam	em	jogo	as	perspectivas	relacionais	ou	de	alteridade,	e	sim	de	
classificação	hierárquica	em	que	a	cultura	europeia	era	superior	às	demais.	Isso	gera	um	
grande	debate	científico	sobre	o	conceito	de	cultura.	Os	grupos	não	europeus	eram	classifi-
cados	como	primitivos	já	que,	sob	o	olhar	do	homem	branco,	eles	não	teriam	desenvolvido,	
ainda,	instrumentos	suficientes	para	dominar	a	natureza	(BELLOTTI,	2011).
De	acordo	com	Belotti	(2011),	o	pensamento	inglês	da	época	solidificou	a	noção	de		
“cultura	civilizada”	relacionada	ao	cultivo	das	faculdades	humanas	“superiores”,	manifes-
tada	por	meio	da	arte	ou	ciência.	Essa	seria	a	“alta	cultura”,	que	se	diferenciaria	da	“baixa	
cultura”,	predominante	nas	esferas	populares.	Isso	significa	que,	para	os	antropólogos	que	
balizaram	os	estudos	sobre	fenômenos	religiosos	na	época,	não	ter	ciência	significava	não	
ter	cultura,	e	ter	religião	significava	ser	inferior	culturalmente	à	quem	tem	ciência.	
Se	formos	adiante	no	debate	entenderemos	como,	além	disso,	na	escala	de	evo-
lução	cultural,	quem	tinha	religião,	mas	não	tinha	ciência,	ainda	era	considerado	superior	à	
quem	cultivava	elementos	“mágicos”.	Assim,	houve	também	uma	tentativa	de	classificação	
e	hierarquização	entre	religião	e	magia.	
Religião	compreenderia	uma	organização	social	e	hierárquica	complexa	de	
rituais	e	crenças,	espelhando-se	na	experiência	cristã	europeia	e	norte-ame-
ricana	e	na	tradição	judaico-cristã,	monoteísta	e	patriarcal.	Magia	seria	uma	
forma	infantil	e	simplória	de	se	acessar	a(s)	divindade(s),	identificadas	com	
elementos	da	natureza,	sem	grandes	hierarquizações,	dependentes	da	figura	
de	um	líder	que	dominaria	o	contato	com	as	entidades	naturais	(BELLOTTI,	
2011,	p.	18).	
A	 definição	 apontava	 para	 uma	 perspectiva	 atemporal	 da	 evolução	 religiosa,	 e	
inferiorizava	o	homem	religioso	não	europeu,	desconsiderando	as	construções	relacionais	
entre	 crenças	e	práticas	 religiosas,	e	 suas	sobreposições	para	usos	sociais.	Cabe	des-
tacar	também,	que	a	significação	histórica	da	categoria	“magia”	relaciona-se	ao	contexto	
religioso	ocidental	 cristão.	A	palavra	era	utilizada	para	designar	algo	negativo	perante	a	
Igreja	Católica	durante	a	Idade	Média	e	a	Idade	Moderna,	em	especial	durante	o	período	
da	Inquisição.	Desse	modo,	o	termo	foi	empregado	pelos	antropólogos	do	século	XIX	com	
sentidos	que	inferiorizavam	os	outros	não	ocidentais.	
Pesquisadores	do	início	do	século	XX	que	marcaram	a	relação	entre	antropologia	
e	o	estudo	do	fenômeno	religioso,	e	se	distanciaram	da	teoria	evolucionista,	foram	B.	Ma-
linowski	e	Émile	Durkheim.	Os	autores	consideravam	outros	elementos	da	sociedade	em	
que		religião	e	magia	seriam	pesquisados.	
14UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
Malinoswki	(1884-1942)	se	difere	pela	teoria	do	“funcionalismo”,	que	admitia	todos	
os	 elementos	 de	 uma	 cultura	 como	 funcionais.	Conforme	 o	 autor,	 todas	 as	 sociedades	
desenvolvem	conhecimentos	científicos	para	transformar	a	natureza.	Assim,	ciência,	magia	
e	religião	estariam	presentes	no	início	do	desenvolvimento	da	cultura.	
Já	Durkheim	(2001)	postulou	que	os	primeiros	sistemas	de	representação	do	mundo	
pertenciam	a	uma	ordem	religiosa,	pois	determinavam	noções	de	tempo,	espaço,	número,	
causalidade,	estabelecendo	o	que	ele	denomina	como	“ossatura	da	inteligência	humana”.	
O	autor	considerava	que	sociedades	primitivas	e	civilizadas	pertenciam	a	etapas	diferen-
tes	da	mesma	história.	Ele	distanciou-se	do	evolucionismo	porque	buscou	compreender	
a	religião	como	âmbito	real,	a	qual	expressa	sentimentos,	urgências,	angústias,	anseios	
e	 pensamentos	 reais.	 Partindo	 desse	 pressuposto,	 toda	 religião	 seria	 verdadeira	 à	 sua	
maneira	e	responderia	a	condições	particulares	de	sociedades	específicas.	
Agora	que	nós	já	temos	conhecimento	sobre	os	estudos	que	inauguraram	e	deli-
mitaram	a	religião	como	objeto	de	estudos	acadêmicos,	podemos	passar	para	um	debate	
mais	específico	sobre	o	campo	definido	para	o	nosso	capítulo.	Vamos	então	apresentar	
algumas	noções	sobre	o	fenômeno	religioso,	presentes	em	diferentes	linhas	teóricas.
1.3 Debates teóricos sobre o fenônemo religioso
O	historiador	Gerardus	van	der	Leeuw	 [1933]	 (2009),	nos	 traz	contribuições	 im-
portantes	para	pensar	o	 fenômeno	 religioso,	pois	admite	a	 importância	do	sentimento	e	
do	irracional	como	parte	explicativa	da	religião.	Para	ele,	essa	seria	uma	das	dimensões	
primordiais	da	experiência	religiosa.	Contudo,	tal	perspectiva	se	apresenta	como	um	grande	
desafio	para	os	estudiosos,	já	que	a	dimensão	subjetiva,	não	é	facilmente	capturável	em	
explicações	racionais.
O	 psicanalista	 Sigmund	 Freud	 (2006)	 também	 participou	 do	 debate	 acerca	 do	
fenômeno	religioso,	ao	utilizar	a	psicologia	para	examinar	as	origens	das	religiões	e	sua	
relação	com	a	consciência	humana.	“O	futuro	de	uma	ilusão”	é	a	obra	escrita	em	1927	que	
demonstra	como	o	pesquisador	classificou	a	religião	como	um	sistema	de	crenças	falsas	
e	infantilizadas.	Para	ele,	o	ser	humano,	impotente	diante	da	natureza	e	das	angústias	da	
vida,	cria	a	imagem	de	um	deus	onipotente,	do	mesmo	modo	que	uma	criança	indefesa	vê	
seu	pai	como	o	protetor.	
O	desamparo	do	homem,	porém,	permanece	e,	 junto	com	ele,	seu	anseio	
pelo	 pai	 e	 pelos	 deuses.	 Estes	 mantêm	 sua	 tríplice	 missão:	 exorcizar	 os	
terrores	 da	 natureza,reconciliar	 os	 homens	 com	 a	 crueldade	 do	 Destino,	
particularmente	a	que	é	demonstrada	na	morte,	e	compensá-los	pelos	sofri-
mentos	e	privações	que	uma	vida	civilizada	em	comum	lhes	impôs	(FREUD,	
[1927]	2006,	p.	26).
15UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
Para	o	psicanalista,	a	ideia	de	um	deus	humanizado	é	consequência	da	neurose	psí-
quica	humana	e	do	complexo	paterno	produzido	pelo		homem	religioso.	Isso	seria	negativo,	
pois	seria	fruto	de	delírios,	imaginações	e	desejos	de	acreditar	em	algo	transcendente	além	
do	que,	resultaria	na	criação	de	dogmas,	duelos	e	efeitos	psicológicos	e	sociológicos	ruins	
para	a	humanidade.	Quando	Freud	(2005)	indica	que	o	fenômeno	religioso	é	constituído	
por	uma		ilusão,	não	determina	necessariamente	que	é	falso,	mas	que	existiria	unicamente	
para	contentar	os	desejos	e	as	neuroses	dos	que	creem	.
Desse	modo,	o	pensador	busca	representar	o	homem	moderno	extinguindo	a	no-
ção	de	transcendência	e	focando	na	ideia	de	imanência.	Com	isso,	ele	torna	a	religião	um	
produto	dispensável	e	coloca	em	dúvida	a	consciência	religiosa	transcendente	e	elaborando	
uma	nova	consciência	vazia.
Mircea	Eliade	(1989),	por	sua	vez,	busca	compreender	e	explicar	o	fenômeno	reli-
gioso	a	partir	das	categorias	sagrado/profano.	Analisando	a	religião	de	diferentes	culturas	
religiosas,	o	autor	chega	a	conclusão	de	que	em	sociedades	arcaicas	e	tradicionais	existiria	
uma	 busca	 pela	 experiência	 sagrada,	 que	 acarretaria	 na	 sacralização	 de	 momentos	 e	
ocasiões	do	cotidiano.	Somente	a	partir	dessa	consagração	e	portanto,	dessa	experiência	
religiosa,	seria	possível	a	existência	do	que	ele	chama	de	“homem	total”,	um	sujeito	que	
não	é	definido	somente	pela	sua	dimensão	racional.	
[...]	a	experiência	religiosa	enquadra	o	homem	na	sua	totalidade	e,	por	conse-
guinte,	também	afecta	as	zonas	profundas	do	seu	ser.	Isto	não	quer	dizer	que	
se	 reduza	a	 religião	aos	seus	componentes	 irracionais	mais	simplesmente	
do	que	se	reconheça	a	experiência	religiosa	tal	como	ela	é:	a	experiência	da	
existência	 total,	que	revela	ao	homem	a	sua	modalidade	de	ser	no	Mundo	
(ELIADE,	1989,	p.	12).
Eliade	(2008)	buscou	demonstrar	como	nas	sociedades	modernas,	o	homem	reli-
gioso	vivencia	um	conflito	entre	resistir	e	renunciar	ao	sagrado.	Desse	modo,	o	pesquisador	
buscou	analisar	o	lugar	das	religiões	tanto	nas	sociedades	antigas,	como	nas	contemporâ-
neas,	a	partir	do	método	comparativo.		O	autor	defende	que:
[...]	um	fenômeno	religioso	somente	se	revelará	como	tal	com	a	condição	de	
ser	apreendido	dentro	da	sua	própria	modalidade,	isto	é,	de	ser	estudado	à	
escala	religiosa.	Querer	delimitar	este	fenômeno	pela	fisiologia,	pela	psico-
logia,	pela	sociologia	e	pela	ciência	econômica,	pela	linguística	e	pela	arte,	
etc...	é	traí-lo,	é	deixar	escapar	precisamente	aquilo	que	nele	existe	de	único	
e	de	irredutível,	ou	seja,	seu	caráter	sagrado	(ELIADE,	2008,	p.	1).
Não	seria	possível	nos	estender	mais	nesse	 levantamento,	nosso	esforço	 foi	de	
selecionar	alguns	estudos	e	pesquisadores	para	demonstrar	para	você,	caro(a)	estudante,	
que	o	nosso	 tema	de	debate	é	muito	complexo	e	pode	ser	visto	de	diferentes	ângulos.	
É	possível	abarcar	o	discurso	historiográfico,	sociológico,	antropológico,	geográfico,	psi-
16UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
canalítico	e	outros,	e	mesmo	dentro	de	cada	disciplina,	 teremos	diferentes	abordagens,	
que	privilegiam	uma	ou	outra	dimensão	do	fenômeno	religioso.	Todos	esses	estudos	são	
ferramentas	que	nos	possibilitam	olhar	com	maior	criticidade	para	a	complexidade	desse	
objeto.	Agora	que	temos	uma	compreensão	teórica	e	analítica	mais	ampla	sobre	o	assunto,	
passaremos	a	algumas	características	do	fenômeno	religioso	na	contemporaneidade.
1.4 Características do fenômeno religioso na contemporaneidade
Para	 refletir	 sobre	os	 fenômenos	 religiosos	na	 contemporaneidade	é	 importante	
que	a	gente	considere	a	abordagem	interdisciplinar.	Não	é	possível	admitir	a	ciência	a	partir	
de	um	método	unicamente	empírico,	 limitando	o	conhecimento	ao	nível	da	aparência.	A	
complexidade	da	realidade	social	contemporânea	exige	uma	reflexão	sistemática	e	crítica.	
Filoramo	e	Prandi	(2003,	p.25)	postulam:	
O	interesse	crescente	pelas	religiões	vivas,	por	exemplo,	obrigou	sociólogos	
e	psicólogos	da	 religião	a	 sair	 dos	 confins	de	uma	sociologia	e	psicologia	
cristianocêntrica	para	confrontar-se	com	a	globalidade	do	fenômeno	religioso.
Ou	seja,	estamos	buscando	elucidar	que	o	nosso	objeto	de	estudo	exige	um	olhar	
crítico,	científico,	interdisciplinar	ou	transdisciplinar,	que	convoque	várias	ciências	(filosofia,	
história,	sociologia,	psicologia,	lingüística,	física	etc.)	para	a	análise	do	fenômeno	religioso	
na	sua	pluralidade.	
É	importante	situar	historicamente	a	questão	do	desencantamento	ocidental	para	
compreender	a	difusão	de	um	certo	agnosticismo	e	 rejeição	da	 religião	nos	dias	atuais.	
Essa	passa	a	ser	uma	das	estruturas	básicas	do	que	conhecemos	como	a	modernidade.	
Os	movimentos	e	modificações	na	esfera	religiosa	demandaram,	a	partir	desse	marco,	um	
tipo	de	crítica,	de	distanciamento,	de	 repulsa	ou	de	 reavaliação	da	 religião	 fundante	da	
civilização	ocidental.	
As	reformulações	do	campo	religioso	ou	filosófico	exigem	uma	compreensão	das	
alterações	que	se	dá	também	no	campo	cristão.	Visto	que	a	solução	que	apresentou-se	
por	meio	da	elite	 constituída	por	 céticos	e	agnósticos	 foi	 reformular	 radicalmente	o	que	
compreendia-se	por	cristianismo,	sobretudo	enquanto	postura	filosófica.	
Surgiram	assim,	no	século	XIX,	vários	cristianismos	-	heterodoxos,	hereges,	e	
por	isso	mesmo,	modernos	-,	como	os	formulados	por	Schopenhauer,	Kierke-
gaard	e	Nietzsche.	Além	disso,	outras	tradições	religiosas	foram	-	talvez	pela	
primeira	vez	na	história	do	Ocidente	-	trazidas	à	discussão	sem	que	fossem	
a	priori	consideradas	inferiores;	não	necessariamente	para	ocupar	o	espaço	
do	cristianismo,	mas	para	qualificá-lo,	se	assim	se	pode	dizer	(CARVALHO,	
1992,	p.	138).
17UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
É	importante	também	pensar	em	outro	viés	da	religiosidade	contemporânea,	o	mo-
vimento	esotérico.	Reatualizado	no	século	XIX	em	um	contexto	marcado	pela	crise	histórica	
e	 cultural	 que	 convencionou-se	 chamar	 de	 desencantamento	 do	 mundo,	 o	 esoterismo	
esteve	fundamentalmente	ligado	à	elite	intelectual	européia.	Contudo,	paulatinamente,	por	
meio	de	diversas	mediações,	influenciou	uma	parcela	significativa	de	indivíduos	e	trouxe	à	
tona	questões	relevantes	sobre	a	religiosidade	na	era	moderna	como	um	todo.
O	 esoterismo	 moderno	 pode	 ser	 compreendido	 como	 um	 grande	 movimento,	
intelectual	 e	 espiritual,	 que	 constitui	 a	 religiosidade	 contemporânea,	 e	 que	 trava	 com	 o	
cristianismo	 uma	 posição	 conflituosa.	 O	 esoterismo	 cresceu	 com	 base	 em	 uma	 crítica	
ao	catolicismo,	indicando	que	esse	havia	perdido	o	seu	caráter	iniciático,	a	dimensão	do	
auto-conhecimento,	além	do	seu	aspecto	político,	que	se	distanciou	da	vida	comunitária	e	
legitimou	o	controle	do	Estado	sobre	o	indivíduo.	Sobre	o	assunto	José	Jorge	de	Carvalho	
(1992,	p.	143)		diz	o	seguinte:
Talvez	a	maior	consequência,	para	o	cristianismo,	dessa	presença	cada	vez	
maior	das	tradições	esotéricas	e	orientais,	reside	no	fato	de	que	começa	a	
surgir	um	deslocamento	da	figura	de	Jesus	Cristo,	na	medida	em	que	crescem	
as	propostas	de	diálogo	inter-religioso:	o	Cristo	passa	a	ser	entendido	como	
um	princípio	divino	(como	a	natureza	búdica,	o	Ishwara)	e	Jesus	como	uma	
encarnação,	um	avatar,	uma	manifestação	histórica	da	divindade,	equivalente	
ao	Budha	Shakya	Muni,	a	Krishna,	a	Zoroastro,	a	Maomé,	etc.
Cabe	salientar	que	esse	processo	de	hibridização,	sincretismos	e	deslocamento	
foi	iniciado	pelas	tradições	religiosas	africanas	no	Brasil.	Existem	diversos	pesquisadores	
que	estudam	sobre	essas	disputas	no	mercado	religioso	contemporâneo,	como	Reginaldo	
Prandi	(2004).	O	autor	indica	que	existemmanejos	distintos	de	cada	elemento	simbólico,	
por	parte	de	diferentes	organizações	religiosas,	e	por	isso	haveria	enormes	confrontos	e	
tentativas	de	deslegitimar	as	práticas	religiosas	e	crenças	umas	das	outras.	
Esse	 campo	de	disputas	 não	é	 recente.	A	partir	 do	 século	XX,	 quando	a	 Igreja	
Católica	 começa	a	 perder	 sua	posição	hegemônica,	 inaugura	 uma	abertura	 diplomática	
em	 relação	 aos	 “povos	 não-crentes”	 e	 passa	 a	 admitir	 o	 esforço	 pelo	 reconhecimento	
das	religiões	não	ocidentais	e	de	outros	ramos	do	cristianismo.	Desse	modo,	abandona	a	
prática	convencional	de	combate	direto	a	outros	cultos,	o	que	já	não	tinha	muita	eficácia,	
criando	aberturas	para	que	outros	cultos	disputassem	a	legitimidade	de	sua	presença	no	
espaço	social.	Autores	como	Almeida	e	Monteiro	(2000)	postulam	que	o	enfraquecimento	
da	hegemonia	católica	possibilitou	que	a	liberdade	religiosa	viesse	a	ser	uma	experiência	
social	de	mais	amplo	espectro.
Outro	elemento	relevante	para	o	estudo	dos	fenômenos	religiosos	na	contempora-
neidade	é	perceber	o	enfraquecimento	dos	papéis	das	instituições.	Por	mais	que	elas	ainda	
18UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
sejam	expressivas,	não	podemos	perder	do	horizonte	a	experiência	de	religiosidade	não	
comportada	em	modelos	tradicionais.	
O	homem	de	hoje,	que	não	se	destina	intimamente	a	uma	religião	[...]	encon-
tra-se	diante	deste	fato	em	uma	situação	de	indescritível	inquietude.	[...]	No	
entanto,	estas	diferenças	afetam	unicamente	os	conteúdos	da	 fé	 religiosa,	
mas	não	a	posição	da	fé	a	respeito	da	realidade	(SIMMEL,	2005,	p.13).	
Simmel,	(2005)	identifica	que	a	deterioração	dos	grandes	sistemas	religiosos	está	
diretamente	relacionada	às	instituições	tradicionais.	Nas	palavras	de	Simmel,	o	que	sub-
sistiria	“não	seria	a	forma	vazia	da	transcendência,	que	busca	novo	conteúdo	com	que	se	
encher,	mas	algo	muito	mais	profundo”	(SIMMEL,	2005,	p.	15).	Simmel	julgou	possível	pos-
tular	isso	evocando	a	mudança	de	postura	inaugurada	por	Kant	(à	qual	se	filiou),	segundo	
a	qual	a	religiosidade	seria	“uma	íntima	maneira	de	se	conduzir	a	alma”.	
Avaliando	as	modificações	recentes	no	campo	religioso,	Steil	(2003)	referencia	os	
tipos	 ideais	 construídos	 por	Troeltsch:	 igreja,	 seita	 e	mística.	O	 autor	 postula	 que	 para	
compreender	a	reconfiguração	do	fenômeno	religioso	na	contemporaneidade,	é	 imprete-
rível	olhar	para	um	movimento	histórico	mais	amplo	da	Igreja	e	da	comunidade	voltadas	à	
mística.	A	mística	indicaria	formulações	bastante	variáveis,	rápidas,	congregando	muitos,	
mas	de	 forma	 instável,	caracterizando-se	por	seus	aspectos	entusiastas	e	vibrantes	em	
torno	de	uma	figura	carismática	ou	de	um	santo	(	STEIL,	2003,	p.148).	
Dessa	forma,	a	secularização	contribui	para	uma	tendência	de	afastamento	cada	
vez	maior	entre	muitos	indivíduos	e	as	instituições	religiosas,	na	contemporaneidade.	Não	
significa	 necessariamente	 um	 esfriamento	 das	 religiões,	mas	 sim	 um	 fortalecimento	 da	
autonomia	individual	sobre	as	escolhas	religiosas.	Podemos	observar	que	no	Brasil	existe	
uma	porcentagem	crescente	de	pessoas	que	se	declaram	sem	religião,	mas	que	possuem	
crenças	religiosas.	Por	 isso,	ao	nos	debruçarmos	sobre	o	estudo	das	religiões	enquanto	
conjunto	de	crenças	e	práticas,	devemos	manter	em	perspectiva	tanto	as	crenças	coletivas	
e	individuais,	quanto	as	práticas	como	definidoras	de	identidade.	
Conforme	 discussão	 sobre	 autonomia	 religiosa,	 as	 crenças	 religiosas	 são	
mantidas	 tanto	pelas	 instituições	 religiosas,	que	assumem	papel	de	autori-
dade	e	de	guardiãs	de	dogmas,	doutrinas,	 teologias;	quanto	pelos	sujeitos	
que	se	apropriam	de	tais	crenças	em	seu	cotidiano,	podendo	tanto	reforçar	
o	sentido	recebido	por	meio	da	tradição	familiar	ou	institucional	como	retra-
balhá-lo	e	questioná-lo,	especialmente	em	momentos	de	crise	e	de	decisão	
pessoal	(BELLOTTI,	2011,	p.	300).
Para	concluir	esse	debate,	que	pretendemos	nos	aprofundar	nas	próximas	unida-
des,	indicamos	que	a	história	do	campo	religioso	brasileiro	deve	ser	analisada	como	a	do	
embate	de	dois	vetores:	a	persistência	do	tradicional	habitus	flexibilizador,	que	pode	levar	
a	 formas	 de	 sincretismo,	 e	 sua	 resistência	 às	 investidas	 das	 sucessivas	 racionalidades	
“modernas”	(SANCHIS,	2003).
19UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
SAIBA MAIS
Na	história	brasileira,	e	não	só	no	campo	religioso	do	Brasil,		pesa	a	presença	de	uma	
predisposição	estrutural	à	porosidade,	mas	não	à	confusão	das	identidades.	Já	que	se	
trata	de	um	habitus	ancorado	em	sociogênese,	o	meio	religioso,	sobretudo	o	popular,	
mas	não	exclusivamente,	vive	e	continua	vivendo	certo	clima	“espiritualista”	que	parece	
compartilhado	–	e	modulado	–	por	várias	mentalidades	segmentárias	no	Brasil.	Orixás	
para	alguns,	mortos,	santos	ou	entidades	para	outros,	Nossas	Senhoras	que	aparecem	
e	vêm	com	homens,	anjos,	espíritos,	forças	cósmicas,	demônios,	ou	tudo	isso	ao	mes-
mo	tempo,	espírito,	enfim	[...]	A	presença	desta	terceira	dimensão	do	mundo	está	em	
toda	a	parte	detectada	(SANCHIS,	2003,	p.	30).
Fonte:	SANCHIS,	Pierre.	A	religião	dos	brasileiros.	In:	PEREZ,	Léa	Freitas;	QUEIROZ,	Rubem	Caixeta	
de	&	VARGAS,	Eduardo	Viana	(Orgs.).	Teoria	e	Sociedade,	Belo	Horizonte,	número	especial:	Passagem	
de	milênio	e	pluralismo	religioso	na	sociedade	brasileira,	p.	16-5,	2003.	
REFLITA 
Caro(a)	estudante,	você	já	havia	parado	para	refletir	sobre	a	relação	da	religiosidade	
com	a	pertença	e	notoriedade	pública	proporcionada	por	ela?	Esse	também	é	um	as-
pecto	 que	 constitui	 capital	 cultural	 individual	 e	 coletivo,	 pois	 possibilita	 a	 construção		
identitária	e	pertencimento	a	um	grupo.
Fonte:	A	autora.
20UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caro(a)	 estudante,	 concluímos	 aqui	 a	 incursão	 sobre	 Fenômenos	 religiosos	 e	
sociedade,	 proposto	 para	 a	 primeira	 Unidade.	 No	 corpo	 deste	 texto	 buscamos	 abordar	
diversos	conceitos,	definições	e	disputas	analíticas	para	compreender	nossa	temática.
Compreendemos	que	a	religião	representa	o	anseio	do	indivíduo	de	transcendência,	
no	qual	a	humanidade	encontra	respostas	às	suas	perguntas	profunda.	Postulamos	que	a	
religião	contribui	para	a	formação	de	estruturas	imaginativas	elementares	sobre	como	nos	
orientamos	ou	deveríamos	nos	orientar	no	cosmos.	Destacamos	a	importância	desse	estu-
do	porque	ele	revela	a	condição	humana	em	seus	aspectos	mais	profundos	e	misteriosos.
Indicamos	que	o	fenômeno	religioso	está	para	além	das	instituições,	mesmo	que	
por	vezes	seja	organizada	por	elas.	Abordamos	a	religiosidade	como	um	aspecto	da	cultura	
que	organiza	pessoas	com	as	mesmas	crenças.	Consideramos	que	muitos	aspectos	da	
vida	social	são	diretamente	orientados	pelo	filtro	da	 religião,	como	o	modo	de	vestir,	se	
alimentar,	cuidar	do	corpo,	etc.	
Apresentamos	estudos	inaugurais	que	influenciaram	consideravelmente	a	Ciência	
das	Religiões,	desde	Max	Müller,	passando	Tylor	até	Durkheim.	Demonstramos	também	a	
existência	de	um	debate	teórico	sobre	modos	de	se	perceber	os	fenômenos	religiosos	por	
parte	de	pesquisadores	de	diferentes	áreas	do	conhecimento,	como	o	historiador	Gerardus	
van	der	Leeuw,	o	psicanalista	Sigmund	Freud	e	o	mitólogo	Mircea	Eliade.
Por	 fim,	 destacamos	 algumas	 características	 dos	 fenômenos	 religiosos	 na	 con-
temporaneidade,	como	a	perda	de	centralidade	da	Igreja	Católica,	a	abertura	para	outras	
filosofias	 que	 influenciaram	o	 campo	 religioso,	 as	 disputas	 de	 diferentes	 religiões	 pelos	
elementos	simbólicos	e	a	diminuição	da	força	das	instituições.
Com	isso	concluímos	nossa	proposta	inicial	e	esperamos	que	o	tema	suscite	seu	
interesse	para	buscar	outras	obras	e	autores	que	possibilitem	o	seu	desenvolvimento	inte-
lectual	e	uma	formação	sólida	e	singular.		
Bons estudos!
21UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
LEITURA COMPLEMENTAR
●	 BERKENBROCK,	Volnei	J.	A	experiência	dos	Orixás.	Um	estudosobre	a	expe-
riência	religiosa	no	Candomblé.	Petrópolis:	Vozes,	1998.	
Frei	Volney	faz	aqui	um	amplo	e	profundo	estudo	sobre	o	Candomblé:	como	é	a	
cosmovisão	que	lhe	está	subjacente;	a	idéia	da	divindade;	o	que	é	orixá;	o	que	significa	o	
axé...	Em	seguida,	procura	esboçar	uma	resposta	à	pergunta:	qual	deverá	ser	a	atitude	de	
um	cristão	diante	da	experiência	religiosa	do	Candomblé?	Será	possível	um	encontro	fra-
ternal	e	um	diálogo	frutuoso	entre	os	seguidores	de	caminhos	aparentemente	tão	díspares?
●	 MOREIRA,	Alberto	da	Silva.	O	futuro	da	religião	no	mundo	globalizado:	painel	
de	um	debate.	In:	MOREIRA,	Alberto	da	Silva;	OLIVEIRA,	Irene	Dias	(Organizadores).	O	
futuro	da	Religião	na	sociedade	global.	Uma	perspectiva	multicultural.	São	Paulo	–	Goiânia:	
Paulinas	–	UCG,	2008,	pp.	17-35.
O	tema	gerador	deste	livro	é	a	necessidade	de	um	olhar	multicultural	para	o	futuro	
que	a	sociedade	global	reservada	à	religião.	O	debate	sobre	o	presente	e	as	tendências	
que	se	prospectam	para	o	fenômeno	religioso,	no	acelerado	processo	de	globalização	em	
que	vivemos,	envolve	pesquisadores	do	mundo	inteiro	que,	desde	as	especificidades	de	
cada	ciência	e	de	cada	país	ou	região,	procuram	compreender	um	fenômeno	de	alcance	
global.	
●	 Jungblut,	A.	L.	 (2014).	Globalização	e	religião:	Efeitos	do	pluralismo	global	no	
campo	 religioso	 contemporâneo.	Civitas - Revista De Ciências Sociais,	14(3),	 419-436.	
https://doi.org/10.15448/1984-7289.2014.3.16483
Neste	artigo	discute-se	alguns	dos	efeitos	da	globalização	sobre	a	 religião.	São	
abordados	as	relações	entre	globalização	e	tradição	e	o	efeito	destradicionalizante	deste	
processo	ao	favorecer	a	pluralização	religiosa	e,	consequentemente,	uma	grande	autono-
mia	identitária	dos	indivíduos	em	busca	de	bens	religiosos.	Para	tanto,	são	analisados	dois	
casos	reveladores	de	dinâmicas	distintas	frente	a	esses	processos	todos.
22UNIDADE I Fenômenos Religiosos e Sociedade
MATERIAL COMPLEMENTAR
LIVRO
Título: Expressões	 do	 Sagrado:	 Reflexões	 sobre	 o	 Fenômeno	
religioso
Autor:	Antonio	Magalhães	e	Rodrigo	Portella
Editora:	Santuário
Sinopse:	Embarcar	no	conhecimento	das	religiões	pode	tornar-se	
uma	 aventura	 prazerosa.	 Nessa	 obra,	 os	 autores	 perpassam,	
por	meio	de	ensaios	e	reflexões,	elementos	básicos	do	universo	
religioso,	descrevendo	o	caráter	simbólico,	antropológico	e	social	
da	 religião,	 além	 de	 tecerem	 considerações	 sobre	 identidades	
religiosas	do	povo	brasileiro.
FILME/VÍDEO
Título:	Uma	Amizade	Sem	Fronteiras
Ano: 2003
Sinopse:	O	dono	de	uma	mercearia	em	Paris	fica	amigo	de	um	
garoto	de	13	anos.	O	homem	é	muçulmano.	O	menino,	judeu.	Com	
o	tempo,	desenvolvem	uma	amizade	transformadora	para	a	vida	
dos	dois.
23
UNIDADE II
As Religiões Contemporâneas
Professora Ma. Laís Azevedo Fialho
Professor Me. Giovane Marrafon Gonzaga
Plano de Estudo:
●	 A	disseminação	das	religiões	pelo	mundo.
●	 As	religiões	no	Brasil	–	do	Catolicismo	ao	Islamismo
Objetivos da Aprendizagem:
●	 Compreender	 o	 contato	 cultural	 como	 catalisador	 para	 formação	 e	 adaptação	 das	
religiões	em	diferentes	sociedades	no	mundo	e	no	tempo.
●	 Refletir	como	tal	processo	se	deu	na	história	das	religiões	no	Brasil,	suas	 ligações	
com	o	poder	e	com	o	cotidiano.
●	 Discutir	como	o	indivíduo	contemporâneo	se	orienta	em	relação	a	multiplicidade	de	
religiões,	crenças	e	práticas	presentes	no	mundo.
Plano de Estudo:
●	 A	disseminação	das	religiões	pelo	mundo.
●	 As	religiões	no	Brasil	–	do	Catolicismo	ao	Islamismo
Objetivos da Aprendizagem:
●	 Compreender	 o	 contato	 cultural	 como	 catalisador	 para	 formação	 e	 adaptação	 das	
religiões	em	diferentes	sociedades	no	mundo	e	no	tempo.
●	 Refletir	como	tal	processo	se	deu	na	história	das	religiões	no	Brasil,	suas	 ligações	
com	o	poder	e	com	o	cotidiano.
●	 Discutir	como	o	indivíduo	contemporâneo	se	orienta	em	relação	a	multiplicidade	de	
religiões,	crenças	e	práticas	presentes	no	mundo.
24UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
INTRODUÇÃO
Olá	estudante	da	disciplina	“Fenômeno	Religioso	na	contemporaneidade	e	educa-
ção”,	na	unidade	a	seguir,	iremos	conversar	como	as	pessoas	se	comportam	em	relação	à	
religião	em	nossa	sociedade.	Para	retomarmos	a	unidade	anterior,	o	debate	começa	com	
uma	reflexão	a	partir	de	uma	cena	idílica,	como	a	humanidade	a	milhares	de	anos	atrás	
sentia	 a	manifestação	 do	 sagrado	 e	 como	esse	 sentimento	 se	 tornou	 	 as	 religiões	 que	
conhecemos	hoje?
Caso	convivêssemos	com	determinada	prática	todos	os	dias,	uma	religião	comple-
tamente	estranha	aos	nossos	padrões,	por	quanto	 tempo	permaneceria	assim?	Por	que	
os	conflitos	religiosos,	em	pleno	século	XXI,	ainda	são	um	problema	sério	para	vivermos	
melhor	em	sociedade?	Como	a	história	do	Brasil	pode	nos	ensinar	a	compreender	a	im-
portância	 do	 poder,	 do	 tempo	 e	 do	 convívio	 nas	 transformações	 observadas	 em	 nossa	
sociedade?	Perguntas	difíceis	que,	de	coração,	espero	contribuir	para	o	aperfeiçoamento	
de	sua	interpretação	sobre	o	assunto.
Bons estudos!
25UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
1. A DISSEMINAÇÃO DAS RELIGIÕES PELO MUNDO 
1.1 Indivíduo, religião e poder.
Você	já	se	perguntou	como	foi	a	primeira	vez	que	uma	pessoa	sentiu	o	que	depois	
iríamos	denominar	de	sagrado,	a	manifestação	da	presença	divina	na	Terra?	
Imagine	homens	e	mulheres	na	beira	de	uma	caverna	esculpida	entre	montanhas.	
Na	 sua	 	 frente,	 uma	 planície	 é	 ocupada	 por	 árvores	 espaçadas	 no	meio	 da	 vegetação	
gramínea,	paisagem	que	se	estende	ao	horizonte,	onde	o	céu	anuncia	a	transição	do	dia	
para	a	noite	em	um	espetáculo	de	cores	quentes	e	frias	de	uma	forma	que	nós,	modernos		
e	com	a	natureza	bastante	modificada	por	essa	modernidade,	talvez	apenas	em	sonhos	
muito	bons	podemos	imaginar.
Um	ambiente	bastante	seguro	também,	a	caverna	nas	montanhas,	além	da	vista	
maravilhosa,	fornece	proteção	a	predadores,	abafa	a	conversa	e		a	luz	das	fogueiras,	dá	
visão	para	estrangeiros	que	se	aproximarem.	Depois	de	um	dia	de	atividade	intensa,	cansa-
das	e	seguras	na	caverna,	poderia	essas	pessoas	acalmar	seus	instintos	de	sobrevivência,	
e	assim	contemplassem	um	pôr-do-sol?	Sem	tantas	preocupações,	não	que	isso	aconte-
cesse	sempre,	mas	basta	uma	ocasião	pra	começar,	é	possível	que	ali	a	humanidade,	na	
forma	de	seus	indivíduos,	tenha	se	dado	o	espaço	de	se	perguntar:	quem	sou	eu?	Qual	a	
minha	função	nisso	tudo?	Quem	me	criou?		
Como	 indica	Mircea	Eliade	(1992),	em	O Sagrado e o profano,	o	firmamento	éo	
principal	símbolo	de	diferentes	culturas	para	se	referir	à	morada	dos	deuses.	Sioux,	aborí-
26UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
genes,	vikings,	tupis	ou	fulanis,	em	cada	canto	do	mundo	a	principal	relação	religiosa	com	
o	céu	é	que,	além	da	abóbada,	se	encontra	a	divindade	suprema	e	criadora	do	universo.	
Outro	ponto	em	comum	entre	esses	povos	é	que	suas	crenças	datam	de	datas	milenares	
em	distância,	sendo	improvável	estabelecer	um	ponto	de	início.	
A	 relação	com	o	sagrado	se	perde	no	 tempo	e	é	possível	que	 já	 tenha	nascido	
com	nós,	uma	genética	de	buscar	enxergar	o	invisível.	No	entanto,	quando	passamos	do	
possível	para	o	provável,	o	tempo	ainda	tem	mostrado	a	religião	intrinsecamente	ligada	ao	
poder.
Na	unidade	anterior	já	pudemos	perceber	tal	configuração.	Com	o	racionalismo	do	
século	XIX,	a	sociedade	europeia	buscou	explicar	cientificamente	a	superioridade	cultural	
de	certos	povos	sobre	os	outros.	Para	 retomarmos,	Edward	Tylor,	em	Primitive Culture,	
publicado	em	1871,	compreende	que	as	religiões	evoluem	em	hierarquia,	da	mais	simples	
e	instintiva	às	mais	complexas	e	racionais.	Em	linhas	gerais,	temos	o	animismo	na	base,	
a	crença	de	que	o	mundo	está	repleto	de	deuses	que	se	manifestam	em	todo	tempo,	até	
o	 topo	onde	se	concentra	o	protestantismo	monoteísta,	que	compreende	que	as	 formas	
da	natureza	não	são	deuses	com	vontade	própria	e	por	isso	não	deveriam	adorá-los,	pois	
o	que	 vem	adiante	é	o	pensamento	abstrato	 deum	único	deus,	 complexo,	 que	não	 se	
encontra	em	lugar	nenhum,	mas	está	em	todos	os	lugares.	
No	Brasil,	a	visão	de	Tylor		foi	compartilhada	em	escritos	de	Raimundo	Nina	Ro-
drigues	ao	final	do	século	XIX	no	Brasil.	Os	dois	cientistas	concordavam	em	praticamente	
tudo,	a	não	ser	por	uma	diferença.	Para	Nina	Rodrigues,	o	catolicismo	com	seus	santos	é	
que	representavam	a	máxima	evolução	dos	pensamentos	religiosos	na	humanidade	de	seu	
tempo.	
Curiosamente,	 ambos	os	 cientistas	adotaram	como	superior	 algo	muito	próximo	
da	religião	que	praticavam.	Outra	coincidência	importante,	é	o	fato	de	que	no	período	que	
escrevem,	elites	da	Europa	e	América	 	crescem	com	a	exploração	de	suas	colônias	ou	
ex-colônias.	Ao	mesmo	tempo,	nos	países	colonizadores	aumenta	em	adeptos	as	ideias	de	
que	todo	indivíduo	tem	o	mesmo	valor	e	portanto	os	mesmo	direitos,	como	na	Constituição	
Americana	e	no	lema	da	Revolução	Francesa.	
Como	submeter	a	condições	que	você	não	gostaria,	alguém	que	é	igual	a	você?	
Para	contornar	este	dilema,	foi	incentivado	a	crença	na	existência	de	indivíduos	biológica	
e	culturalmente	superiores	a		outros.	E	isso	poderia	se	medir	por	meio	de	avanços	tecno-
lógicos,	 nos	 costumes,	 na	 língua,	 entre	outros.	A	 religião	 foi	 um	 importante	 instrumento	
de	classificação	nessa	análise,	e	era	comum	ser	considerada	superior	a	mesma	religião	
27UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
praticada	pelo	grupo	de	cientistas	que	a	qualificou	assim.	Na	II	Guerra	Mundial,	a	ideia	de	
pureza	racial	e	cultural	culminou	no	extermínio	de	milhares	de	judeus,	antes	submetidos	a	
condições	de	subnutrição,	frio,	tortura	e	trabalhos	forçados.	Foi	mais	do	que	suficiente	para	
qualquer	ideia	como	essa	ser	veemente	combatida	e	considerada	crime	em	muitos	lugares.	
O	pensamento	de	superioridade	racial/cultural	perde	o	sentido	se	seu	grupo	está	para	ser	
qualificado	assim.
1.2 O espanto, o encanto e a distância..	
Quando	nos	deparamos	com	a	realidade	de	uma	religião	diferente,	automaticamente	
comparamos	com	a	nossa	cultura.	O	fato	do	diferente	existir,	significa	que	existem	pessoas	
indo	para	outras	direções,	o	que	coloca	em	cheque		nossas	visões	de	mundo	e	a	coesão	do	
grupo	do	qual	pertencemos.	Uma	cultura	diferente	costumava	causar	mais	estranheza	a	al-
guns	séculos	atrás,	quando	os	meios	de	comunicação	quase	não	eram	acessíveis.	Quando	
alguém	viajava	para	um	lugar	desconhecido	não	fazia	ideia	do	que	esperar. Algumas	coisas		
espantavam,	outras		encantavam,	mas	dificilmente	os	primeiros	registros	de	um	viajante	do	
período	medieval,	por	exemplo,	consideram	uma	cultura	estrangeira	superior	à	sua	cultura	
de	origem.	O	relato	a	seguir	quase	foge	a	essa	regra.
Jean	de	Léry,	missionário	calvinista	francês,	se	estabelece	no	Brasil	por	dez	meses,	
onde	escreveria	os	relatos	reunidos	em	História de uma viagem à terra do Brasil,	publicada	
pela	primeira	vez	em	1578.	Sua	narrativa	tem	as	terras	brasileiras	como	lindas	e	produti-
vas,	vastas	e	ricas	em	recursos	naturais.	Respeitoso,	considerando	os	padrões	da	época,	
descreve	os	costumes	dos	 tupinambás	com	bastante	detalhes,	constituindo-se	uma	das	
principais	para	o	estudo	das	práticas	religiosas	indígenas	no	início	da	exploração	europeia.	
No	entanto	a	nudez	dos	tupinambás	é	tida	como	estranha	e	sedutora
coisa	não	menos	estranha	e	difícil	de	crer	para	os	que	não	os	viram,	é	que	
andam	todos,	homens,	mulheres	e	crianças,	nus	como	ao	saírem	do	ventre	
materno.	Não	só	não	ocultam	nenhuma	parte	do	corpo,	mas	ainda	não	dão	
nenhum	sinal	de	pudor	ou	vergonha	(LÉRY,	1960,	p.	112).
quero	responder	aos	que	dizem	que	a	convivência	com	esses	selvagens	nus,	
principalmente	entre	as	mulheres,	incita	à	lascívia	e	à	luxúria.	(…)	Os	atavios,	
arrebiques	 postiços,	 cabelos	 encrespados,	 golas	 de	 rendas,	 anquinhas,	
sobre-saias	e	outras	bagatelas	com	que	as	mulheres	de	França	se	enfeitam	
e	de	que	jamais	se	fartam,	são	causas	de	males	incomparavelmente	maiores	
do	 que	 a	 nudez	 habitual	 das	 índias,	 as	 quais,	 entretanto,	 nada	 devem	às	
outras	quanto	à	formosura	(LÉRY,	1960,	p.	171-172).
Esta	dinâmica	de	encanto	e	repulsa	é	percebida	por	François	Hartog	(1999),	em	O 
Espelho de Heródoto.	Ao	trabalhar	com	os	relatos	de	Heródoto	em	suas	viagens	a	povos	
vizinhos	de	sua	nação,	Hartog	nota	que	o	grego	só	consegue	descrever	aquilo	que	enxerga	
28UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
por	meio	de	uma	tradução,	ou	seja	comparando	o	que	vê	com	palavras	e	objetos	de	sua	
cultura	com	o	que	conhecia	nas	 jornadas.	Por	exemplo,	na	narrativa	de	uma	viagem	ao	
Egito,	a	tradução	denominaria	um		deus		do		Olimpo	para	cada	deus	egípcio.		
Ao		escrever	para		sua		sociedade		politeísta,		o		grego		consideraria		os	povos	que	
cultuavam	um		menor	número		de		deuses,		como		menos		desenvolvidos.		O	que	nos	lembra	
o	caso	de	Tylor	e	Nina	Rodrigues,	pois	partiram	do	cristianismo	e	considerando	ignorantes	
aqueles	politeístas,		menos		complexos		conforme	a	maior		quantidade		de		divindades	de	
culto.	
Hartog	também	defende	que	a	distância	entre	observador	e	observado	é	essencial	
para	que	se	produza	ou	encanto	ou	espanto	no	processo	de	tradução	para	a	própria	rea-
lidade.	É	uma	distância	material,	geográfica,	entre	duas	cidades,	por	exemplo.	E	trata-se	
de	quão	distante	o	observador	se	coloca	diante	da	cultura	e	pessoas	que	ele	observa.	Se	
alguém	é	visto	como	inferior,	tem	ressaltada	apenas	características	ruins.	O	pensamento	
de	uma	cultura	superior,	uma	religião	superior	ou	uma	raça	impedem	um	diálogo	produtivo	
entre	as	partes.	Visto	que	 tudo	que	é	produzido	por	quem	é	 inferior,	 logo	suas	 ideias	e	
cultura,	também	é	inferior.	
Com	o	distanciamento	se	 justificam	massacres	 religiosos	como	o	 imposto	pelos	
romanos	aos	cristãos	e,	depois,	o	que	os	cristãos	impuseram	aos	hereges.	Nos	dois	casos	
aquilo	que	era	diferente	foi	considerado	inferior	e	perigoso.	Principalmente	para	as	autori-
dades	religiosas	da	época	que		lidavam	com	uma	crença	concorrente.	Admitir	a	possibili-
dade	do	outro	crer	em	algo	diferente,	e	conduzir	uma	vida	comum,	coloca	em	questão	as	
estruturas	e	práticas	de	sua	sociedade,	lentamente	podendo	modificá-las.	
Uma	mudança	 que	 põe	 em	 cheque	 não	 a	 vida	 do	 indivíduo,	mas	 a	 saúde	 das	
instituições	cujas	normas	são	contraditas	por	uma	nova	visão	de	mundo.		O	cidadão	ro-
mano	comum	teria	uma	religião	a	mais	para	escolher	com	o	cristianismo,	nada	mais,	nem	
menos.	O	mesmo	pode	se	dizer	do	camponês	na	 Idade	Média	em	relação	aos	conflitos	
entre	protestantes	e	católicos.	
Depois	de	muita	perseguição,	nos	dois	casos	foi	o	que	aconteceu,	uma	ou	várias	
religiões	foram	criadas.	Mas	como	uma	instituição	que	controla,	como	a	Igreja	ou	o	Império	
Romano	podem	ter	falhado	em	combater	crenças	formadas	nos	calabouços	e	outros	locais	
secretos,	com	cultos	realizados	quase	em	silêncio	não	por	uma	opção	de	prática	religiosa,	
mas	por	sobrevivência?
29UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
1.3 O contato e a fronteira.
A	partir	de	Hartog	(1999),	podemos	compreender	que	a	resposta	é:	o	contato.	Se	o	
distanciamento	provoca	estranheza,	medo,	preconceito,	a	aproximação	com	o	tempo	tende	
a	atenuar	as	diferenças	e	inclusive	unir	elementos	que	antes	aparentavam	irreconciliáveis.	
Para	tanto,	é	necessário	perceber	o	outro	como	um	igual.
Voltemos	ao	caso	de	Jean	de	Léry	para	ilustrar	essa	situação.	Ele	estava	entre	os	
colonos	e	dois	ministros	anglicanos	enviados	para	abrir	um	braço	da	Igreja	Reformada	de	
Genebra	na	Baía	de	Guanabara,	considerando	igreja	um	pequeno	grupo	de	fiéis	reunidos,	
sem	a	necessidade	de	um	templo	ou	local	fixo,	a	primeira	igreja	protestante	no	Brasil	fun-
cionou	por	meio	de	Léry	e	seu	grupo.	
Essas	pessoas	atendiam	a	um	pedido	de	Nicolas	Durand	de	Villegaignon,	expe-
dicionário	 francês	que	 tentava	 conquistar	 parte	 do	 território	 da	América	Portuguesa.	No	
entanto,	Villegaignon	que	se	dizia	simpático	ao	protestantismo,	não	gostou	das	ideias	dos	
missionáriose	passou	a	acusá-los	de	heresia.	
O	 grupo	 de	 Léry	 viveu	 oito	meses	 bem	desconfortáveis	 na	 colônia	 e	mais	 dois	
meses	junto	a	índios	tupinambás	porque	a	convivência	com	o	expedicionário-chefe	tornou-	
se	arriscada.	Dez	meses	depois	da	chegada	dos	reformados	franceses	ao	Brasil,	o	navio	
que	os	 levaria	de	volta	à	França	estava	pronto,	mas	por	 falta	de	espaço,	cinco	homens	
precisariam	aguardar	a	próxima	embarcação.	Dentro	de	algumas	semanas	foram	presos,	
condenados	na	inquisição	francesa	e	executados	na	fogueira	após	uma	carta	de	confissão	
onde	assinavam	negando	a	fé	católica.	
No	período	em	que	 foi	acolhido	por	 tupinambás,	os	missionários	e	os	 índios	se	
tornaram	iguais.	O	francês	descreve	que	todos	foram	o	tempo	todo	muito	bem	tratados.	
Ou	 seja,	 na	 companhia	 dos	 nativos,	 de	maneira	 geral	 considerados	 incultos,	 pagãos	 e	
transformados	em	escravos	pela	maioria	que	chegava	ao	Brasil,	os	franceses	protestantes	
receberam	mais	respeito	do	que	os		franceses	católicos.	
Não	por	acaso,	em	suas	últimas	páginas,	Léry	mostra	sinais	de	que	as	diferenças	
culturais	e	de	contato	o	fazem	refletir.	O	missionário	relativiza	a	violência	dos	ritos	canibais	
dos	tupinambás	com	os	povos	considerados	inimigos,	o	trecho	a	seguir	sucede	a	descrição	
dos	preparos	para	o	banquete	do	inimigo	capturado
Poderia	aduzir	outros	exemplos	de	crueldade	dos	selvagens	para	com	seus	
inimigos,	mas	 creio	 que	 o	 que	 disse	 já	 basta	 para	 arrepiar	 os	 cabelos	 de	
horror.	É	útil,	entretanto,	que	ao	 ler	semelhantes	barbaridades,	não	esque-
çam	os	 leitores	do	que	se	pratica	entre	nós	[...]	Não	abominemos	portanto	
demasiado	 a	 crueldade	 dos	 selvagens	 antropófagos.	 Existem	 entre	 nós	
criaturas	tão	abomináveis,	se	não	mais,	e	mais	detestáveis	do	que	aqueles	
que	só	investem	contra	nações	inimigas	de	quem	tem	vingança	a	tomar.	Não	
é	preciso	ir	à	América,	nem	mesmo	sair	de	nosso	país,	para	ver	coisas	tão	
monstruosas	(LÉRY,	1960,	p.	203-204).
30UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
Se,	 em	dez	meses,	 Jean	de	 Léry	 chegou	a	 comentar	 que	 os	 tupinambás	 eram	
melhores	 companhias	 que	 seus	 compatriotas	 franceses,	 imaginem	 como	 um	 contato	
prolongado,	de	décadas,	modificaria	sua	opinião.	No	mundo	contemporâneo,	cercado	de	
informações,	o	indivíduo	tem	contato		frequente	com	o	diferente.	Mas	o	que	diz	se	ele	vai	
olhar	para	aquela	cultura	como	um	igual	ou	sentir	medos	e	preconceitos	é	a	hierarquia,	a	
distância	com	que	enxerga	o	outro.
Em	Hibridismo Cultural,	Peter	Burke	(2003)	entende	que	é	na	fronteira	que	as	tro-
cas	culturais	acontecem.	Essa	região	de	fronteira	pode	ser	pensada	no	seu	sentido	físico,	
quando	 o	 território	 de	 uma	 nação	 se	 encontra	 com	o	 de	 outra.	Mas	 também	 zonas	 de	
intensa	movimentação	de	pessoas	e	mercadorias,	como	os	portos	e	cidades	turísticas.
É	em	locais	fronteiriços	que	os	principais	conflitos	do	mundo	contemporâneo	acon-
tecem:	a	faixa	de	Gaza	entre	Israel	e	a	Palestina,	a	divisa	entre	Norte	e	Sul	nas	Coreias,	
os	muçulmanos	que	moram	entre	a	China	e	o	Afeganistão	e	Cazaquistão,	 	os	 latinos	e	
estadunidenses	na	América	do	Norte,	a	linha	vermelha	que	separa	favela	e	cidade	no	Rio	
de	Janeiro.	
O	encontro	de	dois	governos,	dois	modos	de	vida,	duas	realidades.	Se	prolongado,	
no	contato	com	o	diferente	todos	os	dias,	a	depender	das	circunstâncias,	a	violência	dá	
lugar	ao	convívio	de	tolerância	e,	naturalmente,	conforme	relações	de	amizade,	comércio,	
trabalho	e	amor	são	construídas,	uma	identidade	nova	surge	que	não	é	exatamente	igual	a	
nenhum	dos	lados	do	conflito.	Mas	o	que	dizer	dos	embates	e	preconceitos	que	se	arrastam	
por	décadas	ou	séculos?	Nesses	casos,	é	difícil	não	existir	um	interesse	político	que	de	
alguma	forma	obtém	vantagens	dessa	polarização.	É	o	que	podemos	refletir	ao	olhar	mais	
detidamente	para	a	disseminação	das	religiões	no	Brasil.
31UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
2. AS RELIGIÕES NO BRASIL DO CATOLICISMO AO ISLAMISMO.
2.1 Poder e fragmentação religiosa em Portugal e no Brasil.
Durante	o	período	europeu	das	Grandes	Navegações,	a	 Igreja	Católica	exerceu	
papel	fundamental,	visto	que	representava	a	postura	diplomática	interna	e	externa	de	um	
continente.	Aqui	destacamos	algumas	das	funções	que	a	instituição	eclesiástica	dispunha	
aos	europeus:
●	 firmava	tratados	de	exploração	sobre	as	terras	que	recém-conheciam;	
●	 atestava	sua	presença	em	determinado	território	(com	a	construção	de	templos	
destinados	a	santos	ou	ordens	religiosas	comuns	àquela	nação);	
●	 registrava	empréstimos	e	relações	comerciais,	condições	de	juros	e	consequên-
cias	de	não	pagamento	de	dívida.
Por	funções	tão	importantes,	a	Igreja	Católica	é	personagem	das	narrativas	primor-
diais	sobre	o	Brasil.	Como	na	missa	realizada	em	1500	por	frei	Henrique	de	Coimbra,	assim	
que	os	portugueses	pisaram	no	solo	que	se	 tornaria	nosso	país.	Logo	que	uma	colônia	
apresentava	sinais	de	crescimento,	determinada	ordem	religiosa	poderia	ser	 requisitada	
para	prestar	serviços	básicos	de	saúde,	alimentação	ou	comunicação,	por	exemplo,	algo	
que	expressamente	 fazia	parte	da	missão	de	angariar	novos	fiéis.	Quando	a	escravidão	
passa	ser	adotada	como	principal	mão-de-obra,	o	discurso	católico	define	as	diferenças	
entre	a	alma	 indígena,	africana	e	europeia	e	os	motivos	de	cada	uma	ocupar	um	papel	
desigual	na	hieraquia	daquela	sociedade	(OLIVEIRA,	2007).	
32UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
O	catolicismo	era	a	religião	oficial,	a	única	permitida	de	construir	templos	e	reali-
zar	cerimônias	públicas.		Nas	vilas	e	cidades	que	se	formavam,	o	padre	ou	o	bispo	eram	
autoridades	de	grande	poder	e	 representavam	a	conexão	entre	os	 interesses	das	elites	
(membros	da	Coroa,	grandes	fazendeiros)	e	todo	restante	da	população.	Conforme,	Lísias	
Nogueira	Negrão	(2008),	no	Brasil	Colonial	ser	católico	não	era	uma	questão	de	escolha
O	catolicismo	foi,	no	passado	colonial	brasileiro,	uma	religião	obrigatória:		os		
que		aqui		nasciam		o		aceitavam		por		pressuposto		de	cidadania,		exceto		
os		indígenas,		aos		quais		se		exterminava		ou		se	convertia.		Os		que		aqui		
não		nasciam		tinham		que		adotá-lo,		mesmo	que	não	o	compreendessem:	
os	negros	escravizados	eram	batizados	no		porto		de		procedência		ou		de		
desembarque.		Já		os		judeus,		sob		a	pressão	de	serem	perseguidos	pelos	
inquisidores,	de	perderem	seus	bens	ou	mesmo	suas	vidas,	preferiram,	em	
geral,	tornar-se	“cristãos	novos’’.	(NEGRÃO,	2008,	p.	263).
Para	que	uma	coisa	seja	proibida	é	por	que	ela	é	usualmente	praticada,	certo?	Não	
tem	sentido	proibir	algo	que	ninguém	faz.	A	prática	de	outras	religiões	em	Portugal	já	era	
considerada	um	problema	muito	antes	do	descobrimento	do	Brasil.	
A	península	ibérica	entre	os	séculos	VIII	e	XI	era	território	muçulmano,	e	não	ca-
tólico.	 Sob	 regime	 islâmico,	 os	 portugueses	 experimentaram	 algo	 próximo	 da	 liberdade	
religiosa,	havendo	relatos	da	presença	das	crenças	católica,	muçulmana,	judia	e	dos	povos	
chamados	bárbaros	que	ali	viviam,	como	godos	e	visigodos.	Os	muçulmanos	fundaram	as	
primeiras	universidades	da	Europa,	como	a	Universidade	de	Salamanca,	em	1134.	Sem	
o	conhecimento	produzido	e	compartilhado	nesses	 locais,	Portugal,	Espanha	não	teriam	
sido	os	primeiros	estrangeiros	a	colonizar	a	América,	visto	que	tal	feito	apenas	foi	possível	
com	a	herança	árabe	das	habilidades	matemáticas	de	engenharia,	 tecnologia	náutica	e	
construção.
Figura	1	–	Mesquita	de	Córdoba,	Espanha,	construída
	entre	os	séculos	X	e	XI	sob	domínio	muçulmano
Fonte:	https://umpouquinhodecadalugar.com/europa/espanha/a-grande-mesquita-de-cordoba/
33UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
Figura	2	-	Catedral	Sé	de	Lisboa,	Portugal,	fundada	no	século	XII	e	construída	a	partir	da	
antiga	Mesquita	de	Lisboa.	A	arquitetura	gótica	de	influência	árabe	foi	adotada	em	templos	
católicos	de	todo	o	mundo.	
Fonte:	https://www.cidadeecultura.com/se-de-lisboa/
Os	judeus	formaram	grupos	de	habitantesna	Europa,	ao	menos	desde	o	século	
IX,	e	 foram	mais	ou	menos	perseguidos,	conforme	a	atmosfera	política	e	religiosa.	Com	
as	Cruzadas,	o	contato	entre	católicos	e	judeus	se	tornou	comum,	sobretudo	na	atividade	
financeira.	Da	Europa	Oriental,	o	povo	israelita	se	desloca	para	diferentes	regiões,	confor-
me	oportunidades	de	comércio,	 trabalho	e	ambiente	de	 tolerância	 religiosa.	A	Península	
Ibérica,	mesmo	conquistada	pelos	católicos,	foi	adotada	como	destino	de	judeus,	pois	além	
de	serem	mercados	efervescentes,	Portugal	e	Espanha	conservaram	certo	nível	de	convi-
vência	entre	religiões,	até	as	Inquisições	dos	séculos	XVI	e	XVIII.	
As	rotas	católicas	estabelecidas	com	as	Cruzadas	e	os	caminhos	islâmicos	sobre	a	
África	do	Norte	foram	também	meios	de	acesso	dos	povos	romani	e	tingi,	depois	a	ambos	se	
denominaria	ciganos.	Não	sendo	famosos	por	seu	poder	político	ou	econômico,	tais	povos	
formavam	comunidades	em	diferentes	regiões	da	Europa,	seguindo	critérios	semelhantes	
aos	dos	 judeus	sobre	onde	se	estabelecer.	Não	eram	um	grupo	 isolado	e	em	Portugal,	
após	o	Descobrimento,	muitas	famílias	ciganas	se	mesclaram	à	população	local.	Possuem	
até	hoje	práticas	 religiosas	características	onde,	além	de	divindades	próprias,	adotaram	
preceitos	e	ideias	cristãs,	hinduísmo,	zoroastrismo	e	islamismo.	
34UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
No	Brasil	do	final	do	século	XIX,	indícios	apontam	ciganos	e	africanos	realizando	
juntos	um	culto	de	dimensão	pública	para	Oxumaré,	divindade	símbolo	da	mudança	e	dos	
ciclos,	representada	pelo	arco-íris	e	pelas	serpentes.	
A	sacerdotisa	é	uma	portuguesa	reforçada,	que	se	chama	Maria	Matos	da	Sil-
va.Só	são	permitidos	pescadores	na	festa,	e	os	pescadores	vão	de	toda	parte	
ao	culto	singular.	A	casa	de	Maria	Silva	fica	mesmo	no	ponto	dos	bondes,	
e	nos	dias	de	festa	está	toda	adornada	de	folhagens	e	galhardetes.	Todos,	
lavados	e	de	roupas	claras,		a		dona		da		devoção		manda		buscar		os		negros		
feiticeiros		para		preparar		os	ebós	e	fazer	a	matança	dos	animais.	Ela	própria	
deita	as	cartas	para	saber	quem	deve	ir	levar	os	sacrifícios	e	os	desejos	sutis	
do	Arco-íris.	(RIO,	1906,	p.	70).
É	possível	que	Maria	Matos	da	Silva,	a	portuguesa	sacerdotisa	do	mar,	seja	de	
descendência	cigana.	De	bagagem	cultural	muito	diferente	do	almejado	pelos	 reinos	de	
Espanha	e	Portugal,	os	ciganos	possuíam	práticas	religiosas,	roupas	e	inclusive	um	idioma	
próprio,	tornando-os	alvo	de	tentativas	de	normatização	por	meio	de	medidas	integradoras.	
Logo,	os	ciganos	não	poderiam	se	comportar	como	tal.
Entre		as		punições		aos	desvios		estava		o		exílio		nas		colônias		portuguesas,		como		
o	Brasil	dos	séculos	XVI	ao	XVIII,	fato	que	não	impedia	migrações	voluntárias.	Dado	esse	
quadro,	não	é	difícil	imaginar	um	contexto	social	no	Brasil	Império	e	República	Velha,	no		
qual		as		duas		culturas,		afro-brasileira		e		cigana,		partilham		de		ambientes		comuns.
Voltando	a	Portugal	pré-descobrimento,	os	reinados	oficialmente	católicos	escon-
diam	uma	sociedade	de	 identidade	religiosa	 fragmentada.	Onde	hábitos	e	crenças	cató-
licas,	muçulmanas,	 judias,	 ciganas	e	pagãs	 (o	período	dos	godos	e	visigodos	deixaram	
marcas	na	cultura	religiosa,	ainda	que	o	cristianismo	tenha	sido	adotado	pelos	reis	góticos	
a	partir	de	240,	a	crença	politeísta	e	suas	práticas	se	embrenharam	no	cotidiano	popular).e	
contrastavam	com	a	pressão	do	Estado	por	uma	religião	e	oficial.
A	partir	do	século	XVI,	com	a	exploração	das	Américas	e	com	Estados	que	cami-
nham	para	o	Absolutismo,	onde	a	Reforma	Protestante	não	conseguiu	chegar	de	maneira	
a	desestruturar	a	instituição	católica	(caso	de	Portugal,	Espanha	e	França,	por	exemplo),	a	
Igreja	se	consolida	como	a	grande	representante	da	cultura.	Para	isso,	contou	com	o	apoio	
da	nobreza	e	ao	mesmo	tempo	a	fortaleceu.	
35UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
1.2 A cultura nunca para, religiões proibidas e praticadas.
Nas	 colônias,	 o	 catolicismo	 fazia	 parte	 irrestrita	 do	 dia-a-dia.	 Conforme	Negrão	
(2008),	a	obrigação	de	ser	católico	fazia	com	que	uma	pessoa	praticasse	a	mesma	religião	
com	diferenças	marcantes	conforme	o	setor	da	sociedade	em	que	estava	inserido.		
A	Igreja	trabalhava	junto	aos	senhores	de	engenho	e	altos	funcionários	da	Corte,	
o	 padre	 realizava	 cultos	 públicos	 nas	 residências	 e	muitas	 vezes	 era	 responsável	 pela	
educação	das	crianças.	Comportava-se	como	a	voz	calma	e	benevolente	do	patrão	para	
seus	 funcionários,	escravos	e	filhos,	 já	que	o	patriarca	deveria	ser	austero,	o	padre	era	
quem	negociava	com	palavras	dóceis	a	tranquilidade	do	local.	Este	era	o	catolicismo	dos	
portugueses.	
Indígenas,	africanos	e	seus	descendentes	embora	fossem	católicos,	ou	forçados	
a	assim	dizerem,	não	abandonaram	suas	 religiões	de	origem.	Ao	contrário,	sempre	que	
houve	uma	brecha	no	catolicismo,	ela	 foi	ocupada	por	uma	prática	 religiosa	africana	ou	
indígena	quando	se	relacionava	com	a	cultura	da	grande	população.
Mais	do	que	isso,	muitos	preceitos	religiosos	oriundos	de	culturas	não-monoteístas	
foram	absorvidos	no	comportamento	brasileiro,	independente	de	uma	religião.	Por	exemplo
●	 a	crença	em	espíritos;
●	 a	crença	em	mal-olhado	ou	‘olho	gordo’;	
●	 os	rituais	de	fim	de	ano,	como	vestir-se	de	branco	e	pular	sete	ondas;	
●	 o	recurso	de	práticas	divinatórias,	como	as	cartas	de	tarô	e	os	búzios;
●	 a	 presença	 das	 benzedeiras	 como	 autoridades	 religiosas	 que	 identificam	 e	
tratam	problemas	do	dia-a-dia,	doenças	e	partos.
Neste	universo	religioso	brasileiro,	que	Negrão	(2008)	identifica	como	catolicismo	
popular,	as	crenças	se	misturam	e		ganham	particularidades	conforme	o	povo	que	ali	habita.	
Em	Salvador,	os	africanos	em	sua	maioria	do	povo	iorubá,	manteve	certas	caracte-
rísticas	tradicionais	de	sua	terra	natal,	como	os	orixás,	os	ritos	de	iniciação	e	cânticos	em	
língua	iorubana,	são	os	primeiros	anos	do	que	se	chamaria	depois	de	Candomblé.	
No	Rio	de	Janeiro,	o	povo	banto	consistia	na	maior	nação	de	pessoas	escraviza-
das,	de	seu	culto	aos	ancestrais,	onde	os	mortos	estão	sempre	participando	da	vida	dos	
vivos,	se	popularizaram	os	exus,	caboclos,	pombagiras,	 	divindades	que	 representavam	
personagens	 do	 cotidiano	 daquela	 época,	 o	 homem	 violento	 ou	 o	malandro	 habilidoso,	
que	sobreviviam	no	contexto	urbano	insalubre	e	perigoso,	o	indígena	que	lutava	contra	o	
36UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
pretenso	processo	civilizatório,	a	mulher	que	por	alguma	razão	foi	posta	à	margem	e	pra	
existir	precisava	assumir	uma	postura	impositiva,	sem	medo	de	se	mostrar	como	ser	dotado	
sexualidade	ou	de	usá-la	como	bem	entendesse.	Em	um	processo	de	embranquecimento,	
como	estudado	por	Ortiz	(1978),	os	cultos	cariocas	serviriam	de	base	para	a	Umbanda.	
Apesar	 de	 observarmos	 nuances	 regionais,	 o	 contato	 entre	 diferentes	 culturas	
africanas,	indígenas	e	europeias	produziu	semelhanças.	Por	exemplo,	a	adoção	de	santos	
católicos	para	representar	também	os	orixás	é	algo	presente	em	religiões	afro-brasileiras	
de	todo	país.	A	crença	na	reencarnação	e	na	atividade	dos	espíritos	na	terra,	bem	como	
a	elaboração	de	ritos	que	visam	controlá-los	(acalmar,	ordenar,	expulsar,	proteger,	entre	
outros).	E	a	crença	em	Jesus	Cristo	e	em	um	deus	onipotente	e	onisciente	é	praticamente	
unanimidade.	Diferente	do	que	pode	ser	apontado	na	tradição	africana,	onde	não	existe	um	
culto	a	Zambi	ou	Orunmilá,	o	Criador.	Pois	parte	do	pressuposto	de	que	o	culto	é	uma	forma	
de	ajudar	a	si	mesmo	e	outras	pessoas	mas	também	de	ajudar	as	divindades,	Deus-Criador	
não	precisaria	dessa	ajuda.	
Figura	3	–	Altar	identificado	à	Tenda	Mãe	Maria	de	Camargo,	de	Umbanda	e	Candomblé
Fonte:	https://maemariadecamargo.blogspot.com.	Na	foto	podemos	identificar	entre	outras	representações,	a	de	
São	Sebastião	(à	esquerda,	dorso	nu)	que	também	é	Oxóssi,	Jesus	(acima,	em	posição	central),	que	é	Oxalá,	
São	Jorge	(lateral	inferior	direita,	montado	em	um	cavalo),	queé	Ogum,	os	gêmeos	São	Cosme	e	São	Damião	
(lado	inferior	esquerdo,	não	conseguimos	identificar	a	figura	entre	os	dois,	mas	por	ser	de	tamanho	menor,	pode	
ser	a	representação	de	uma	criança,	um	símbolo	de	Ibeji	e	da	qual	eles	são	protetores)	também	são	Ibeji.
37UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
Essa	atmosfera	multipolarizada	e	a	relação	com	a	Igreja	Católica,	pode	ser	com-
preendida	 também	por	meio	de	H.	Bhabha	(2005),	onde	constatamos	 	a	 	existência	 	de		
duas		realidades		diferentes:		a		primeira,	fundada	na	presença		de	uma	tradição	católica,	
na	memória		e		nos		escritos		do	país		com	uma	abrangência,	que	teria	como	consequência	
“produzir	autoridade	sem	a	necessidade	de	uma	ação	imperativa”	(BHABHA,	2005,	p.182).	
Ou	seja,	chega	um	momento,	depois	de	gerações	de	conversão	compulsória,	que	
um	indivíduo	nascido	nessa	sociedade	simplesmente	acredita	naquilo	que	as	instituições	
predominantes	engenharam.	
Dessa	 forma,	a	 relação	entre	 Igreja	e	elite	social,	devido	a	presença	maciça	do	
catolicismo	no	dia-a-dia	do	Brasil	Colônia	e	Império,	produziu	o	efeito	de	realidade	mencio-
nado.	Como	consequência,	o	passado	torna-se	uma	reprodução	das	intervenções		dessas		
instituições.	
O	mesmo	efeito	corrobora		para		que	outras	manifestações	religiosas	passem	des-
percebidas.	Por	exemplo,	podemos	concordar	que	há	algum	tempo	atrás	a	cultura	religiosa	
africana	ou	 indígena	não	era	nem	mesmo	mencionada	em	 livros	didáticos.	Algo	que	só	
mudaria	com	a	 lei	10.639,	que	 institui	o	ensino	da	história	e	cultura	africana	e	 indígena	
obrigatório	nas	escolas.
Não	se	trata	necessariamente	de	uma	conversão,	muito	menos	a	vitória	de	uma	
crença	sobre	outra.	Na	verdade,	é	prudente		questionar	como	diversas	religiões/culturas	
religiosas	 que	 demoraram	 milênios	 para	 se	 desenvolverem,	 praticadas	 por	 milhões	 de	
indivíduos,	desapareceram,	em	alguns	casos	por	completo,	em	menos	de	300	anos.	No	
meio	acadêmico,	as	respostas	têm	passado	pela	violência	do	Estado	e	perseguição	social.	
Mas	e	as	outras	religiões,	como	islamismo,	judaísmo	e	as	próprias	religiões	protes-
tantes,	por	exemplo,	não	adotaram	os	santos	católicos	ou	algo	do	tipo?	Esta	é	uma	questão	
de	difícil	resposta.	Ao	pensarmos	o	Brasil	Colônia	e	Império,	comparado	a	africanos	e	indí-
genas,	o	contingente	de	árabes	e	judeus	que	se	estabeleceram	aqui	é	bastante	reduzido.	
A	respeito	dos	protestantes,	o	período	da	Reforma	coincide	com	os	Descobrimen-
tos,	o	que	faria	esperar	um	número	considerável	de	fiéis	chegando	ao	Brasil.	No	entanto,	
em	Portugal,	os	questionamentos		à	Igreja	Católica	não	surtiram	as	mesmas	consequências	
como	na	Holanda,	Alemanha	e	Inglaterra.	Sendo	assim,	não	há	registros	de	portugueses	
protestantes	no	período	colonial.	Entretanto,	havia	franceses	e	holandeses	calvinistas.	
A	respeito	do	primeiro	grupo	relatamos	seus	desdobramentos	no				tópico	1,	para	
pensar	a	importância	do	contato	na	disseminação	de	religiões	pelo	mundo.	No	caso	holan-
dês,	o	anglicanismo	havia	sido	adotado	como	religião	oficial	dos	Países	Baixos.	A	Igreja	
38UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
Reformada	Potiguara,	foi	fundada	entre	1624-1625	com	o	trabalho	de	europeus	e	indígenas.	
Inclusive,	dois	brasileiros	nativos	foram	enviados	para	Holanda,	a	fim	de	que	recebessem	
instrução	teológica,	assim	que	ajudaram	a	concluir	as	obras	do	templo.	
Fixados	principalmente	na	região	de	Pernambuco,	os	holandeses	permaneceram	
no	Brasil	até	1654,	chefiados	por	Maurício	de	Nassau,	quando	o	exército	da	corte	portugue-
sa	pressionou	ao	ponto	de	rendição.	Na	colônia	holandesa,	a	liberdade	religiosa	e	política	
era	garantida	por	lei.	Assim	foi	possível	criticar	qualquer	rei	sem	o	risco	da	pena	de	traição,	
ou	construir	um	templo	para	sua	religião,	agendar	cultos	sem	a	necessidade	de	aprovação	
prévia	ou	professar	uma	fé	específica.	
Neste	ponto	a	história	do	judaísmo	se	cruza	no	Brasil		com	o	anglicanismo	em	ter-
ras	brasileiras.	No	contexto	de	tolerância	religiosa,	instituído	nas	colônias	da	Holanda,	que	
a	primeira	sinagoga	do	Brasil	foi	fundada,	a	Sinagoga	Kahal	Zur	Israel	(‘Rocha	de	Israel’).	
Formada	por	judeus	que	vieram	para	América	com	a	promessa	de	liberdade	religiosa,	logo	
que	os	portugueses	reconquistaram	Recife,	os	israelitas	migraram	de	lá,	desembarcando	
em	Nova	Amsterdã,	colônia	inglesa	que	depois	se	tornaria	a	cidade	de	Nova	Iorque.
Figura	4	–	Fachada	da	Sinagoga	Kahal	Zur	Israel,	a	primeira	do	continente	americano	
Fonte:	http://senhorahistoria.blogspot.com/2010/07/
Porém	essas	não	foram	as	únicas	e	nem	as	primeiras	pessoas	judias	a	se	esta-
belecerem	no	Brasil.	Os	chamados	cristãos	novos	são	os	judeus	portugueses	e	espanhóis	
que	tiveram	seus	rituais	e	práticas	proibidos,	e	imposta	a	obrigação	de	cultuar	a	fé	cristã.	
39UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
É	provável	que	muitos	continuaram	com	seus	ritos	em	espaço	íntimo,	fora	dos	olhos	
da	sociedade.	Aqueles	que	eram	vistos	em	práticas	consideradas	 judaicas,	como	nunca	
comer	carne	de	porco,	jejuar	em	determinados	períodos	ou	não	frequentar	as	missas,		seria	
denunciado	e	condenado	na	Inquisição.	Deste	contexto,	não	existem	relatos	de	qualquer	
organização	judia	na	América	portuguesa	antes	do	século	XIX.
	As	transformações	ocorridas	no	mundo	durante	o	século	XIX	(Rev.	Francesa/	Rev.	
Industrial/	Independência	dos	Estados	Unidos)	afetam	radicalmente	a	forma	como	a	Igreja	
Católica	tratam	os	praticantes	de	outras	religiões.	Entretanto,	a	Coroa	Portuguesa	embora	
cedesse	em	alguns	aspectos,	não	reagiu	com	grandes	mudanças.	
Somente	com	a	passagem	do	Brasil	para	República,	entre	as	décadas	de	1870	e	
1890	é	que	os	primeiros	templos	não-católicos	foram	permitidos	por	lei.	De	início,	vemos	
surgir	 as	 primeiras	 organizações	 religiosas,	 como	 os	 protestantes	 do	Rio	 de	 Janeiro,	 à	
época	capital	do	 Império.	Na	cidade	de	Belém,	a	segunda	sinagoga	do	Brasil,	e	a	mais	
antiga	ainda	em	funcionamento,	é	construída	por	judeus	marroquinos,	em	1824.
Os	muçulmanos	organizaram	em	1835	a	Revolta	dos	Malês,	um	movimento	de	re-
sistência	liderado	por	africanos	de	regiões	onde	o	Islã	constituía	uma	das	crenças	principais.	
A	devassa	finda	com	com	seus	participantes	mortos	em	batalha	ou	presos	e	deportados.	
No	período,	acompanhamos	um	desenvolvimento	econômico	mais	acentuado	no	
país,	além	de	uma	notável	expansão	das	metrópoles.	O	aumento	da	população	urbana	
e	a	concentração	de	pessoas	na	cidade	fez	com	que	a	diversidade	religiosa	se	tornasse	
impossível	de	disfarçar.	
1.4 Brasil, entre as crenças plurais e a conversão. 
Logo	no	início	do	século	XX,	em	1906,	As religiões no Rio,	do	escritor	e	jornalista	
João	do	Rio,	descreve	uma	cidade	com	a	presença	de	pelo	menos	quinze	diferentes	cultos	
bastante	organizados.	
Com	a	imigração	de	europeus,	japoneses	e	sírio-libaneses,	a	diversidade	religiosa	
se	torna	uma	característica	brasileira.	Templos	budistas	são	erguidos	no	interior	e	na	capital	
paulista.	Variadas	 religiões	cristãs,	como	a	Congregação,	surgem	e	 formam	suas	sedes	
brasileiras	nas	duas	primeiras	décadas	dos	anos	de	1900,	quando	percebem	que	a	perse-
guição	do	Estado	brasileiro	realmente	foi	amainada.	No	Sul,	o	luteranismo	alemão	surge,	
assim	como	o	catolicismo	ortoxo	dos	ucranianos,	por	exemplo.
Mesmo	em	um	Estado	 laico,	de	 tolerância	 religiosa,	aconteceram	conflitos	entre	
católicos	e	membros	de	outras	crenças,	muitas	vezes	apoiada	pela	própria	instituição	cató-
40UNIDADE II As Religiões Contemporâneas
lica	e	autoridades	públicas.	Embora	legalmente,	todas	religiões	estivessem	protegidas,	leis	
específicas	para	ritos	africanos	ou	tornavam	seus	praticantes	criminosos	ou	os	obrigavam	a	
se	adaptarem	a	um	modelo	melhor	visto	pela	cultura	cristã-ocidental.	Por	exemplo,	o	artigo	
284	do	código	penal	brasileiro	delimita	o	seguinte:
Exercer	o	curandeirismo:
I	–	prescrevendo,	ministrando	ou	aplicando,	habitualmente,	qualquer	substância;
II	–	usando	gestos,	palavras	ou	qualquer	outro	meio;

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