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DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Prof.ª Andréa Carla Machado CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Cristiane Lisandra Danna Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Bárbara Pricila Franz Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Bárbara Pricila Franz Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2018 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. M149d Machado, Andréa Carla Deficiência intelectual. / Andréa Carla Machado – Indaial: UNI- ASSELVI, 2018. 114 p.; il. ISBN 978-85-53158-60-7 1.Deficientes - Educação – Brasil. 2.Educação especial – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 371.9 Impresso por: Sumário APRESENTAÇÃO ..........................................................................05 CAPÍTULO 1 Contexto Histórico e Bases Legais nos Sistemas de Apoio e Classificação da Deficiência Intelectual ................................07 CAPÍTULO 2 A Importância do Desenvolvimento Padrão Infantil para o Entendimento dos seus Desvios e Atrasos .............................31 CAPÍTULO 3 Selecionando Abordagens e Ferramentas para o Ensino Inclusivo .......................................................................................53 APRESENTAÇÃO Desde a fundação, a American Association on Mental Retardation (AAMR) tem conduzido o campo da Deficiência Intelectual (DI) ao entendimento, definição e classificação. Da primeira à última versão foram lançados desafios que perpassam as questões avaliativas e os programas estruturados de intervenção, bem como a importância do monitoramento do processo de aprendizagem dos indivíduos com deficiência intelectual. Assim, o campo da DI está atualmente em um estágio de fluxo com relação não apenas a um entendimento mais pleno da condição desta deficiência, mas à linguagem e ao processo usados na nomeação, definição e classificação. Por exemplo, estamos no meio de discussões sobre a natureza da inteligência e o comportamento adaptativo; a implementação do paradigma dos apoios; a melhor maneira de conceituar as condições de efeitos da terminologia da vida dos indivíduos. Esse estágio de fluxo é, ao mesmo tempo, desafiador porque proporciona a oportunidade de incorporar o entendimento atual e em evolução da condição da deficiência intelectual e dos fatores que influenciam as vidas das pessoas acometidas por esta deficiência em suas sociedades. Nessa direção, a condição da deficiência intelectual está sendo pensada de maneira diferente no mundo todo. É nessa perspectiva padrão ouro, ou seja, baseada nas mais recentes pesquisas e programas educacionais, que essa disciplina tem o intuito de oferecer aos alunos um panorama da deficiência intelectual perpassando desde os conceitos históricos, bases legais brasileiras e serviços de apoio dentro das instituições educacionais. Para isso é necessário o conhecimento sobre os marcos biológicos do desenvolvimento padrão infantil, consequentemente, torna-se mister, neste contexto, direcionar a proposta para o entendimento das abordagens inclusivas vigentes e da importância da organização para o ensino individualizado desses indivíduos. Prof.ª Andréa Carla Machado CAPÍTULO 1 CONTEXTO HISTÓRICO E BASES LEGAIS NOS SISTEMAS DE APOIO E CLASSIFICAÇÃO DA DEFICIÊNCIA INTELECTUAL A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo, você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Entender as bases históricas e legais que fundamentam as defi nições e conceitos da defi ciência intelectual. Conscientizar-se da importância de protocolos e roteiros para o desenvolvimento de serviços de apoio. Visualizar e extrair dos casos apresentados as características da defi ciência intelectual apresentadas nas bases teóricas. Ter conhecimento de protocolos e roteiros baseados nos casos clínicos apresentados para a formulação de programas de intervenção futuros. 8 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL 9 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO A defi ciência intelectual é, na sua essência, uma alteração grave que se manifesta como uma defi ciência do desenvolvimento das funções abstrativas do conhecimento e da adaptação. Esse aspecto psicopatológico é básico e central, mas não único, porque a ele se podem associar transtornos de comportamento, da linguagem, das funções perceptivas e motoras, como também pequenas ou grandes malformações somáticas, sintomas tanto centrais do prejuízo adaptativo, quando concomitantes a ele, mas resultados de fatores distintos, genéticos, lesionais ou ambientais. Trata-se de um transtorno do desenvolvimento intelectual (APA, 2014) complexo, que compromete de modo duradouro, e, muitas vezes, permanente, a conquista das funções elevadas da espécie humana, funções essas que nos permitem como espécie um pensamento fundamentado na interiorização da experiência e, especialmente, na capacidade de abstrair dela as leis que ligam os acontecimentos, as relações de causa e efeito, as capacidades de formular hipóteses e deduções, as capacidades de distinguir os limites restritivos do mundo real. Na defi ciência intelectual, o pensamento fi ca intimamente dependente da experiência e da sua representação, as percepções não conseguem se generalizar, o movimento é imitativo, com difi culdade de originalidade expressiva e construtiva, a linguagem é defi citária ligada à representação imediata, ocasionando desvios do processo evolutivo, isto é, o que é esperado para a idade dentro dos padrões normais, deteriorando o ciclo de desenvolvimento do indivíduo acometido por essa defi ciência. Assim, este capítulo trata do entendimento das bases históricas e legais da defi ciência intelectual, sobre os conceitos e sua classifi cação atual e, por fi m, a importância dos sistemas de apoios para as instituições educacionais. 2 BASES HISTÓRICAS E LEGAIS DA DEFICIÊNCIA INTELECTUAL NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA A concepção ecológica social da defi ciência intelectual se refl ete nas publicações atuais da Organização Mundial da Saúde (OMS) e também da Classifi cação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), que é 10 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL descrita como tendo impedimentos das funções e estruturas do corpo, na limitação de atividades e participação restrita nos contextos pessoais e ambientais. Segundo Almeida (2012), a importância dessa mudança evolutiva na construção da defi ciência intelectual é deixar para trás a concepção de total incapacidade. A construção ecológica social da defi ciência intelectual acaba por exemplifi car a interação entre a pessoa e seu meio ambiente e concentra-se no papel do suporte individualizado muito importante para os sistemas de ensino, os quais veremos no terceiro capítulo desta disciplina. De acordo com Almeida (2012), a mudança do termo “defi ciência/retardo mental” para “defi ciência intelectual” fez com que o termo se tornasse menos ofensivo às pessoas com defi ciência, além de: estar mais consistente com a tecnologia utilizada internacionalmente e enfatizar o fato de que a defi ciência intelectual não é mais considerada um traço absoluto e invariável de uma pessoa. Diante disso, os profi ssionais devem se direcionar para a prestação de apoios adaptados. Mas antes de adentrar aos apoios, mesmo porque eles serão a temática do nosso terceiroitem deste capítulo, retornemos ao tempo dos primórdios (aos anos de 1930) da educação brasileira. No século XX, a medicina infl uiu em diferentes áreas do conhecimento fortemente até os anos de 1930, mas foi substituída pela psicologia, principalmente devido à infl uência de Helena Antipoff nos cursos de formação de professores. Com ela, veio todo o empenho em arregimentar interessados pela área por meio das sociedades Pestalozzi, a ampliação da refl exão atingindo também os mais dotados, a preocupação com a adequação ao mercado de trabalho das pessoas defi cientes (JANUZZI, 2006). A sociedade civil vai se organizando nessa direção, surgiram as APAEs nos anos de 1950. Ambulatórios congregando profi ssionais da saúde para reabilitação e também professores para o ensino são implementados. E, posteriormente, nos anos de 1960, são criadas as campanhas para educação de cegos, surdos e defi cientes intelectuais (na época dito “mentais”). Em 1973, em razão do crescimento de movimentos nacionais e internacionais, tivemos o primeiro órgão nacional para ditar a política de educação especial, o CENESP. Ele nasceu forte junto à Presidência da República e sempre permaneceu ligado ao MEC; sofreu transformações e em um determinado momento esteve subordinado ao SENEB, voltando logo como 11 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 Secretaria da Educação Especial, agora no momento se encontra com o mesmo nível de subordinação ao MEC, somente com o nome de Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Segundo Januzzi (2006), a organização da estrutura citada vem fi rmando a aceitação da especifi cidade e importância de órgãos federais, os quais, após a Declaração de Salamanca (1994), enfatizaram a inclusão desse alunado na rede regular de ensino. Ofi cialmente se reconhece o direito de apoio especializado, sala de recursos, serviços especializados, quando necessário (LDB nº 93/1996, capítulo V, artigo 58, parágrafo 1-2, Política da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, 2008; CNE, 2001 e 2009), suportes de saúde, previdência social que lhes segure a igualdade dentro da equidade, ou seja, o apoio especializado que lhe é assegurado pelos documentos normativos citados, visando possibilitar a apropriação de conceitos essenciais ao domínio do conteúdo escolar. Temos, atualmente, um número signifi cativo de dissertações, teses, artigos em revistas científi cas, livros e vídeos sobre as diversas defi ciências (BELLO, 2009), cuja designação ofi cialmente apresenta um respaldo signifi cativo para qualquer tomada de decisão, seja no ensino, seja na aprendizagem dessa população, especialmente, defi cientes intelectuais. Sob o ponto de vista de formação de professor, apesar de orientações legais nesse sentido, podemos conferir na prática difi culdades em gerenciar planejamentos que incluem o alunado, tanto os que precisam de simples ajustes e adaptações quanto os que precisam de fl exibilizações mais complexas. Pode- se inferir que a produção de conhecimento específi co nas diversas categorias venha facilitar essa procura do que é geral, necessitando então de diálogo entre pesquisadores e docentes da área da Educação Especial e regular. Nessa direção, estamos em um tempo de parcerias, as quais são indispensáveis e têm sido estimuladas e imprescindíveis para facilitar e promover indicadores, como: contratação e formação de pessoal docente; serviços externos de apoio; participação da comunidade e recursos necessários. Sob essas condições de direcionamento de parcerias e direitos adquiridos, lembremos o Decreto nº 6.571-2008, o Parecer CNE n° 13/2009 e a Resolução CNE nº 4/2009, que são marcos delineadores da implantação de uma política de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva consolidando propostas contempladas no documento elaborado pela SEESP/MEC em 2008, cujas adequações foram realizadas em 2011 pelo Decreto n° 7.611/2011 – Educação 12 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Especial. Foi publicado e divulgado para implantação das diretrizes e normas das medidas dispostas nesses documentos o Subsidiário para implementação de normas técnicas das políticas da educação na perspectiva da educação inclusiva (MEC, 2015), que esclarece os princípios, propostas e estratégias e recursos da ação em detrimento do aluno com necessidades educativas especiais. Lê-se alunos com necessidades educativas especiais (NEE) todos os alunos com difi culdades referentes a sua aprendizagem dentro da escola, seja ele público-alvo da educação especial ou não, ou seja, pertencentes à educação inclusiva. Consolidando essa parte, refl itamos: qual é a justifi cativa de planejar uma disciplina sobre um tema tão extensamente tratado, como tem sido a defi ciência intelectual? Para que serve acrescentar mais “conhecimento” ao já existente nos livros e artigos científi cos sobre esse tópico? Os dilemas apresentados por essas duas perguntas – e tantas outras que poderiam ser feitas – são resolvidas no momento em que podemos trazer luz à teoria pela prática, prática essa que poderemos construir à medida que vamos adentrando nesta temática por meio desta disciplina. Portanto, a questão não é somente “aumentar” um pouco o conhecimento, mas organizar ou sistematizar uma parte do que se conhece, selecionando aquilo que é considerado pela experiência e prática – tanto em nível teórico quanto prático. Isso signifi ca que este capítulo não pretende repetir o que tão obsessivamente já foi escrito ou dito sobre defi ciência intelectual, mas que esse texto seja útil para que todas aquelas pessoas que cursam essa disciplina possam movimentar outras formas de perceber e trabalhar com as pessoas com defi ciência intelectual. Na próxima seção deste capítulo, vamos fazer uma elucidação sobre os conceitos, classifi cação e os serviços que devem ser conhecidos e assegurados a todos os alunos com defi ciência intelectual. 13 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 3 DEFINIÇÃO, CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO ATUAL DA DEFICIÊNCIA INTELECTUAL A terminologia utilizada para designar o que hoje se conhece como transtorno do desenvolvimento intelectual – Defi ciência Intelectual, DI (APA, 2014), inicia-se na França com Binet (TEIVE et al., 2017), que avalia a inteligência das crianças francesas em idade escolar – de acordo com os resultados que obtêm no teste Binet-Simon – e classifi ca as diagnosticadas como “defi cientes mentais” em quatro categorias: idiota, imbecil, débil e retardada. Todo esse panorama se complica ainda mais quando, dentro desse transtorno gnosiológico, é preciso fazer divisões em termos e níveis de DI. Alguns se baseiam no quociente intelectual (QI) e/ou na idade mental (IM), outros se apoiam nos períodos piagetianos do desenvolvimento cognitivo, outros o enfocam no ponto de vista cognitivo do processamento da informação e outros, a partir das bases neurológicas. Tal disparidade de pontos de vista é justifi cada devido à complexidade dessa “incapacidade”, que requer tanto um diagnóstico quanto uma avaliação para uma intervenção ou tratamento multiprofi ssional. Então, a questão não é reduzir a expressão linguística para que não sejam utilizados sinônimos, mas que o termo verbal ou escrito de um conceito corresponda ao que ele rigorosamente signifi ca. Em psicologia e pedagogia nos interessam três paradigmas de avaliação, cuja temática trataremos no capítulo seguinte, que deveriam formar um conjunto de possibilidades que permitiriam estabelecer um diagnóstico, sempre realizado pelo médico. Outros profi ssionais contribuem para a construção do caso, enfatiza- se aqui, mais efi caz ou adequado para as necessidades dos DI. Esses três paradigmas giram em torno dos seguintes pontos: 1- O défi cit na inteligência e o nível de defi ciência – determinados basicamente peloQI ou pelos estágios piagetianos de desenvolvimento, como prejuízos no raciocínio, solução de problemas, planejamento, pensamento abstrato, juízo, aprendizagem acadêmica e aprendizagem, pela experiência confi rmados tanto pela avaliação clínica quanto por testes de inteligência padronizados e individualizados. 14 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL 2- A difi culdade na conduta adaptativa que resultam em fracasso para atingir padrões de desenvolvimento e socioculturais em relação à independência pessoal e responsabilidade social, como: atividades social e vida independente, e em múltiplos ambientes, como em casa, na escola, no local de trabalho e na comunidade. 3- Início dos défi cits intelectuais e adaptativos durante o período do desenvolvimento. Com fi nalidade de direcionar o aluno ao esclarecimento sobre a temática da defi ciência intelectual, é importante descrevermos os critérios de diagnóstico da defi ciência intelectual. Tais critérios são necessários para o planejamento do repertório de práticas que poderão ser desenvolvidos em um futuro Plano Educacional Individualizado (PEI), o qual veremos no último capítulo dessa disciplina. De acordo com o Manual Diagnóstico dos Transtornos mentais – DSM-V (APA, 2014), o termo diagnóstico defi ciência intelectual equivale ao diagnóstico do Código Internacional de Doenças (CID-11) de transtornos do desenvolvimento intelectual. Assim, a DI é o termo de uso comum por médicos, educadores e outros além de pelo público em geral e grupos de defesa dos direitos. CÓDIGO INTERNACIONAL DE DOENÇAS, CID 11 MANUAL DIAGNÓSTICOS DSM- V NÍVEL* 317 (F70) Leve 318.0 (F71) Moderada 318.1 (F72) Grave 318.2 (F73) Profunda QUADRO 1 – CÓDIGOS E NÍVEIS RELACIONADOS AO CID-11 E DSM-V FONTE: DSM-V (APA, 2014) Nota* Especifi car a gravidade atual, (ver Quadro 3 no fi nal dessa seção). Nesta perspectiva, também é importante compreender melhor a associação do desenvolvimento da espécie (fi logenia) e o do indivíduo (ontogenia). Vamos adentrar nesses elementos e entender melhor as condições prejudicadas no indivíduo com defi ciência intelectual no decorrer desse texto. A fi logenia permitiu ao ser humano moderno, mediante o desenvolvimento cerebral e dos genes, chegar a uma notável complexidade de adaptação ao ambiente por meio dos sinais de alarme e dos mecanismos de defesa, que constituem grande parte da vida mental. Mas, sobretudo, permitiu o desenvolvimento de sofi sticados aparatos de previsão, que permitem a programação do comportamento e certo grau de originalidade como resposta a 15 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 estímulos imprevistos. Essas capacidades constituem uma função superior da espécie, que chamamos inteligência, na ausência da qual o ser humano moderno não é mais moderno, mas assume caracteres arcaicos, inadequados à vida atual. O desenvolvimento individual das funções superiores (capacidades intelectuais que devem estar preservadas para um indivíduo poder aprender) é, portanto, certamente guiado pelos fatores genéticos, conquistados exatamente por fi logenia, mas atuado por uma série de condicionamentos sociais: os modelos humanos de identifi cação, os afetos como veículos de mensagens, as relações intersubjetivas primárias (descritas pela chamada “teoria da mente”, a qual enfatiza que nós, seres humanos, temos a capacidade de nos colocar no lugar do outro), as confi rmações sociais, as informações acadêmicas, a cultura do tempo e do lugar. Existe uma soma de fatores coessenciais que pode entrar em crise e agravar o quadro da DI: a manifestação pela genética alterada ou, então, com as causas e fatores de risco (pré “antes”, peri “durante” e pós-natal “depois”) de aparatos executivos (especialmente do sistema nervoso). De acordo com Pfanner e Marcheschi (2008), os primeiros processos mentais que emergem do nível biológico no desenvolvimento da criança são os de integração, interperceptivo, perceptivo-motor etc. Assim, toda defi ciência intelectual está ligada a um nível de défi cit dessas sínteses básicas, tanto as que dão origem às capacidades de abstração e à compreensão como as ligadas à identidade e à adaptação social. Naturalmente, uma defi ciência intelectual sempre induz uma compensação psicológica global: pelo desenvolvimento desarmônico de outras funções mentais não integradas e pelo grave impacto com o ambiente, que considera a pessoa com defi ciência intelectual desajustada no ambiente, esse sintoma é importante no diagnóstico clínico, cujos desdobramentos veremos mais adiante. O papel do ambiente é um aspecto que deve ser considerado atentamente, pois, como já vimos, o que se associa ao défi cit cognitivo é a difi culdade de adaptação. Um ambiente exigente pode encontrar uma resposta adequada em um cérebro sadio e maduro, mas também pode ser muito “difícil” determinar um quadro de desorganização, inércia ou regressão de certas condutas. Na defi ciência intelectual, as capacidades de elaboração são sempre inferiores às exigências do ambiente e, por isso, manifestam-se sintomas de desadaptação, como estereotipias, por exemplo. 16 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Lembre-se: défi cit cognitivo não é sinônimo de DI. É um dos elementos que está prejudicado na pessoa com DI e por sua vez difi culta a aprendizagem. Estudo de Caso: A história de Lúcio As exigências do ambiente e as primeiras difi culdades Lúcio nasceu em 26/03/2003, numa cidade do interior paulista. Foi uma gravidez inesperada, uma vez que a fi lha caçula do casal já estava com a idade de 7 anos e o mais velho com 11 anos. No entanto, após a surpresa da gravidez, o bebê foi esperado e os pais e familiares se prepararam com grande expectativa para o seu nascimento. O bebê nasceu bem e a mãe estava com 35 anos e o pai com 40 anos de idade. O pai possui ensino superior e exerce a função de técnico-administrativo em uma faculdade privada e, nas horas vagas, dedica-se à profi ssão de fotógrafo. A mãe, com ensino médio completo, dedica-se às tarefas da casa e não exerce função profi ssional. Lúcio nasceu a termo e de parto cesariana. No entanto, apresentou atrasos no decorrer de seu desenvolvimento neuropsicomotor, características de pouco interesse nas interações próprias aos meses iniciais de um bebê e aos oito meses começou a apresentar ocorrências de crises convulsivas, levando ao atraso no desenvolvimento motor, como controle cervical, manutenção da postura ereta para início de marcha, e apenas com dois anos e meio começou a andar. O desenvolvimento da linguagem apresentou-se bastante comprometido e com atraso considerável nas etapas de evolução infantil. Em relação ao comportamento, observaram-se características autísticas devido ao pouco interesse de interação, não sustentação do olhar, obsessões por movimento e objetos circulares. Também se tornaram notáveis alguns adenomas. A observação dos pais em relação aos aspectos apresentados impulsionou a busca de especialistas para um diagnóstico e encaminhamento para atender adequadamente às necessidades apresentadas por Lúcio. Os exames médicos e clínicos indicaram a presença da Síndrome de Bourneville- Pringle, também conhecida como Esclerose Tuberosa ou Epiloia. Trata-se de 17 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 uma síndrome rara e de difícil diagnóstico, o que compromete o tratamento de seus sintomas. É caracterizada por uma tríade clínica: crises convulsivas, adenoma sebáceo e defi ciência intelectual; embora o atraso mental esteja presente em aproximadamente 50% dos casos, portanto, é possível encontrar relatos de inteligência média e apenas convulsões ou lesões cutâneas. Algumas características são variáveis e não é incomum manifestações de comportamento autístico. Lúcio foi diagnosticado aos três anos de idade e imediatamente pôde contar com uma equipe multidisciplinar compostapor psicóloga, fonoaudióloga, fi sioterapeuta, terapeuta ocupacional e pedagoga. A equipe se dedicou ao atendimento à criança e a sua família, a qual recebeu atendimento terapêutico na psicologia e orientações sistemáticas das outras áreas. Por orientação da pedagoga e apoio de toda a equipe, a família foi orientada a matricular Lúcio em uma escola comum de Educação Infantil. Assim, de 2007 a 2009, frequentou uma escola de educação infantil e continuou a receber apoio da equipe multidisciplinar. Foi estabelecido um diálogo colaborativo e sistemático entre a equipe da escola e a multidisciplinar para estabelecer pautas de trabalhos conjuntos e nas adequações à proposta escolar que pudessem atender suas necessidades e, ao mesmo tempo, mantê- lo em companhia das demais crianças. Inicialmente o processo educacional foi bastante difícil, mas as equipes – escolar e multidisciplinar – puderam observar avanços signifi cativos em todas as áreas do desenvolvimento, em suas funções cognitivas (percepção, atenção, memória, raciocínio e linguagem), nas funções motoras e mesmo na área emocional e social. Em 2010, Lúcio é encaminhado ao 1º ano do Ensino Fundamental e sua escola e, especifi camente, sua professora, passam a receber orientações pedagógicas da equipe, com ênfase na questão escolar e curricular e apoio no Serviço de Apoio Pedagógico Especializado (SAPE) da própria escola e a articulação entre o SAPE e o professor da classe comum favorece notoriamente seu desenvolvimento escolar e a superação de muitas difi culdades escolares. Atualmente, na mesma escola, frequenta o 6º ano do Ensino Fundamental e, embora ainda apresente difi culdades signifi cativas em seu desenvolvimento curricular, a decisão foi a de que Lúcio deveria acompanhar seus colegas no processo de escolarização e os professores deveriam, nas disciplinas em que isto fosse necessário, realizar adequações curriculares. Não está plenamente alfabetizado, reconhece as sílabas, sabe construir algumas palavras, lida razoavelmente com frases pequenas (mais na leitura do que na escrita), o que traz uma difi culdade e uma exigência da realização 18 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL de adequações nas aulas de Língua Portuguesa. Gosta de ler, embora saiba fazê-lo em textos simples, de pequena extensão e ainda utilizando o recurso da fi gura como suporte interpretativo para a leitura e compreensão da história. Reconhece algumas tipologias textuais e sabe diferenciar folhetos variados, gibis, livros de histórias e reconhece a estrutura de poesias. Com ajuda, elabora textos orais, conta histórias e relata fatos. Em relação à matemática, compreende o sistema numérico decimal e reconhece números até 100. Faz operações simples de adição e subtração com uso de material concreto e opera apenas com duas casas decimais. Compreende inteiro e metade no concreto, medidas de comprimento e massa de forma funcional, para medir ou pesar no contexto de uma atividade prática. Reconhece formas geométricas planas. FONTE: A autora É importante salientar alguns sintomas que alteram e difi cultam a operacionalização das funções corticais superiores, e assim, os aspectos cognitivos, afetivos e adaptativos, esses sintomas que serão apresentados a seguir são frequentes, mas nem sempre constantes, e podem ter importância e gravidade diferentes. - Défi cit de assimilação das experiências, isto é, de informação e de elaboração perceptiva. O processo perceptivo é insufi ciente, vagaroso, incompleto e inexato (falta de percepção), não por anomalia dos órgãos periféricos de sentido (visão, audição e tato), mas por um défi cit das capacidades de análise, de comparação e de integração cerebrais. A pessoa com defi ciência intelectual não sabe colocar qualquer nova percepção no exato contexto espacial e temporal, não consegue separar a experiência anterior, fi xada na memória, da nova, e disso muitas vezes deriva uma percepção rígida, pouco móvel, estereotipada, muito modelada sobre os traços das lembranças. - Défi cits de organização motora ou insufi ciências psicomotoras, que comprometem a capacidade de programar o movimento no espaço e no tempo e tornam desajeitado e desarmônico. Na maioria das vezes, os comportamentos parasitários (tônicos e cinético) da motricidade infantil persistem até a idade avançada, tornando, frequentemente, lentos ou instáveis esses sujeitos. - Défi cits na linguagem, que podem ser transtornos de pronúncia, articulação e/ou ritmo, mas mais constantemente são défi cits de desenvolvimento das atitudes de base que orientam a formação da linguagem. Disso deriva uma falta de expressão: a frase é frequentemente 19 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 elementar, pouco articulada, estereotipada, com respostas inadequadas ou incoerentes em relação às perguntas. - Impossibilidade de ter acesso ao pensamento abstrato, défi cit essencial que separa uma criança normal de uma com defi ciência mental. Todos os conteúdos do pensamento permanecem, mesmo após a puberdade, ligados ao concreto, à experiência, às impressões sensoriais (próprios dos pré-operatório e então lógico-operatório). O sujeito não consegue estabelecer relações complexas entre os objetos, carente de toda forma de previsibilidade da ação. - Défi cit cognitivo, existem áreas de funcionamento mais ou menos desenvolvidas, mas é muito raro encontrar áreas de funcionamento totalmente normais. Portanto, pouco integrativas num comportamento cognitivo (ver os chamados Savants). Estão comprometidos especialmente os mecanismos cognitivos voluntários, enquanto o funcionamento dos processos automáticos é relativamente independente da inteligência geral, portanto, mais preservado. - Défi cit de autoconsciência, isto é, difi culdade especial na “gestão consciente” dos próprios conhecimentos, que leva a um défi cit na utilização da experiência e nos mecanismos de autocontrole. Grande parte das experiências de vida dos indivíduos com DI é marcada por falta de êxito, e sua relação com a realidade é dominada por uma expectativa de insucesso, preliminar a toda ação e, em parte, inevitável. Compromete- se, assim, a motivação, favorecendo até mesmo comportamentos sistemáticos de renúncia e de evitação. - Aprendizagem mais lenta pelos vários aspectos da inteligência, de que derivam desarmoniosas lacunas, e interpretações do mundo descompensadas e, às vezes, hipertrofi as do perfi l intelectual. A lentidão é geral progressiva até uma estagnação no momento da adolescência. Além disso, o pensamento da pessoa com DI é caracterizado com uma certa severidade de restrição, assim, as condições de aprendizagem são notadas com evoluções tardias. O sujeito com DI regride, mais fácil e frequentemente em relação ao normal, a modelos anteriores de pensamento e raciocínio, dos quais tem um costume mais consolidado (observações feitas todos dias no plano escolar, pelos professores), isto é, perde competências que pareciam adquiridas. - Retardos afetivos e desarmonias da personalidade, por emotividade superfi cial e incontrolada e por elaboração insufi ciente dos estímulos. O comportamento lembra o de fases anteriores do desenvolvimento. Muitas vezes está presente uma ansiedade profunda, ligada, ou não a sintomas depressivos, como apatia, cansaço fácil, inibição, sentimento de insegurança. Há difi culdade de identifi cações de objetos, de pessoas, a 20 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL rejeição das leis e das normas próprias do adulto podem adiar e difi cultar o desenvolvimento do juízo moral e das capacidades de controle diante dos impulsos instintivos. - Transtornos de conduta. As desarmonias do caráter e do comportamento aparecem ligadas ao jogo complexo de interações com o ambiente. O défi cit tem um sentido profundo para a família e isso tem uma infl uência determinante sobre a evolução e a adaptação. Na família, podemos observar uma rejeiçãoinconsciente, sentimentos de culpa, acusações muito projetivas em relação à escola ou então uma superproteção, com manutenção da criança no estado de manipulação. No Brasil, são também chamados de “Sábios defi cientes”, indivíduos prodigiosos como o personagem Funes, o Memorioso, do livro de Jorge Luis Borges, ou Forrest Gump, interpretado no cinema por Tom Hanks. Até aqui foram descritos os sintomas mais frequentes da defi ciência intelectual, que abrangem défi cits perceptivos, psicomotores e psicolinguísticos de abstração, de aprendizagem, de vida afetiva e de conduta. Esses desajustes não permitem o desenvolvimento do pensamento abstrato. Nessa perspectiva, a seguir, encontra-se um caso elucidativo dos prejuízos citados anteriormente e um roteiro (protocolo) de competência que pode auxiliar o profi ssional educacional a desenvolver um plano individualizado. Estudo de Caso: A história de Valter Uma defi ciência intelectual com maiores comprometimentos Valter nasceu em 30/09/2001, numa cidade do interior paulista. A mãe relata que foi uma gravidez planejada e muito desejada pelo casal. Ao nascer a criança, a mãe estava com 27 anos e o pai 31 e foi o 1º fi lho do casal. A mãe é professora e possui ensino superior e o pai, carteiro com ensino médio completo. O casal vivia em harmonia e ansiava pelo nascimento do bebê sem a preocupação com o gênero da criança. Valter nasceu no tempo certo e de parto cesariano. A mãe conta que não ocorreram problemas pré, peri ou pós- natais. 21 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 No entanto, o desenvolvimento do bebê não se deu de forma esperada, ele se apresentava como um bebê muito agitado e chorão. Apresentou difi culdades de amamentação, não se acalmava com facilidade e parecia não se tranquilizar nem mesmo no aconchego da mãe. Também foram observados atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor, não engatinhou, sentou-se com apoio aos oito meses, andou com dois anos. Em relação à linguagem, apresentou pouco balbucio e sua apresentou vocalização de fala foi bastante incipiente. Suas solicitações se davam por meio de gestos de apontamento, monossílabos e chorava quando não atendido ou compreendido. Ficava bastante nervoso nestas situações e o choro era tão intenso que chegava a perder o ar. Aos dois anos e seis meses foi matriculado na educação infantil e devido ao seu comportamento diferenciado, como balanceio, isolamento do mundo, difi culdades de interação e de brincar com outras crianças e fala monossilábica, a escola solicita que a família procure uma avaliação clínica da criança. Foram momentos muito difíceis para a família, que se viu peregrinando entre médicos e especialistas sem a prescrição de um diagnóstico e sem concordâncias entre as diferentes especialidades: médicos, neurologistas, psiquiatras, psicólogos. A primeira sugestão para um apoio na área da Educação Especial por causa dos problemas relatados, principalmente na linguagem e na interação, ocorreu quando a criança completou quatro anos de idade, ainda na educação infantil. A clínica especializada que frequentou emitiu um diagnóstico indicando atraso de linguagem como parte de um quadro de um possível autismo (TEA) e encaminhou Valter para a APAE, embora também permanecesse na escola de educação infantil. Outra consequência da hipótese diagnóstica é o abandono da família pelo pai, que diz não ter estrutura psicológica para cuidar de um fi lho autista. Os avós maternos acolhem a fi lha e neto e passam a ter uma relação muito intensa com o neto, principalmente com o avô, que o leva para passear, brincar, fazer natação e equoterapia. Torna-se mais calmo na presença do avô. A família continua em busca de um diagnóstico mais específi co, pois Valter mantém difi culdades na linguagem e comportamento agressivo e de pouca interação. Recebem as hipóteses diagnósticas de X-Frágil, e apenas mais tardiamente, com sete anos de idade, num Centro Avançado de Diagnóstico a família recebe a confi rmação de Transtorno do Espectro Autista. A família decide mantê-lo na APAE, no período inverso da escola e ele é matriculado no 1º ano do Ensino Fundamental, em 2008. No entanto, do 1º ao 3º ano vive um período escolar bastante conturbado, devido à difi culdade da escola em lidar com suas particularidades e uma das medidas foi, infelizmente, a redução de sua presença em sala de aula. 22 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Em 2010 a família decide desvinculá-lo da APAE e insistir no processo inclusivo na escola comum. Procura um centro de apoio e Valter passa a ter atendimento regular na fonoaudiologia e na pedagogia. Os profi ssionais iniciam um processo de orientação à família e à escola, com reuniões sistemáticas com a equipe escolar oferecendo suporte pedagógico para realização de adequações curriculares e um programa individual de trabalho com aumento gradativo de sua inserção em sala de aula até conseguir se manter na sala durante o período de aula integral. Em 2011, quando Valter frequentava o 4º ano escolar, seu avô faleceu em um acidente de carro. O menino fi cou muito revoltado, teve difi culdade em aceitar a morte do avô e conviver com sua ausência e tornou-se agressivo e desatento na escola, tendo uma queda em seu desempenho escolar. A mãe, a avó, a fonoaudióloga e a equipe escolar estabeleceram um acordo para que todos mantivessem uma postura carinhosa e compreensiva, mas ao mesmo tempo fi rme e sem ceder aos seus caprichos. Desde 2010, no 3º ano escolar, recebe apoio especializado, por meio do Serviço de Apoio Pedagógico Especializado (SAPE) da própria escola e a articulação entre o SAPE e o professor da classe comum favorece notoriamente seu desenvolvimento escolar e a superação de muitas difi culdades escolares. Atualmente, na mesma escola, frequenta o 7º ano do Ensino Fundamental e ainda apresenta especifi cidades em seu processo interacional e escolar. Seu desempenho em História e Geografi a é o esperado para este ano escolar, na matemática é um pouco mais fraco, mas com ajuda e orientações detalhadas consegue realizar ao menos o mínimo esperado para este nível de escolarização. Suas difi culdades maiores concentram-se na área da Língua Portuguesa, apresentando maiores difi culdades na escrita de textos autobiográfi cos e narrativos, preferindo os textos jornalísticos, pois lhe permite concentrar-se na realidade objetiva da notícia, uma vez que não lida bem com a subjetividade, não percebe as intenções de um texto, não faz inferências, não levanta hipóteses e não percebe as fi guras de linguagem. É melhor na leitura do que na escrita, embora prefi ra os textos jornalísticos, científi cos e descritivos do que os literários ou poéticos. Recusa-se a realizar leitura oral e em rodas de leitura mantêm-se quieto, sem participação em grupo, dirigindo-se diretamente a dois ou três colegas mais próximos. Não apresenta difi culdades interacionais com a professora da disciplina. 23 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 Em relação à escrita, embora esteja alfabetizado, possui um texto simples e direto, com poucos parágrafos e sempre utilizando uma linguagem direta, pouco expressiva ou interpretativa e sem se estender nas argumentações linguísticas. Do ponto de vista gramatical, usa os verbos sem distinção de tempo verbal, ausência do uso de pronomes, não apresenta variedade linguística, difi culdades no uso de conectivos e de continuidade textual. Ainda apresenta erros na escrita de palavras mais complexas ou desconhecidas e é resistente ao uso do dicionário para esclarecer o sentido ou a gramática de algumas palavras que surgem no texto escrito proposto pela professora. FONTE: A autora A seguir apresentamos um protocolo para direcionar o professor para levantamento de informações necessárias para desenvolver um plano educacional especializado como será explicado no Capítulo3 desta disciplina. Competência Realiza Não realiza Observa ao seu redor, como crianças brincando ou ao assistir a um desenho animado ou fi lme. Responde a estímulos auditivos, como atender a chamados e ouvir uma música. Imita gestos ou comportamentos, demonstrando aprender por imitação. Concentra-se intencionalmente em uma atividade que seja do seu interesse. Demonstra ter capacidade para aprender a ler. Demonstra ter capacidade para aprender a escrever. Demonstra ter capacidade para aprender a fazer cálculos simples. Comunica-se para pedir ajuda na resolução de um problema cotidiano. QUADRO 2 – ATIVIDADES BASEADAS NA LISTA DE HABILIDADES DO PROTOCOLO PARA AVALIAÇÃO DE ESCOLARES COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL 24 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Resolve simples problemas simples do seu cotidiano. Pede ajuda ao um adulto para resolver um problema do seu cotidiano. Inicia e termina uma única tarefa. Inicia e termina uma tarefa em grupo. Entende mensagem faladas. Identifi ca expressões faciais. Entende ordem simples: “pegue um lápis”. Entende ordens sequenciais: “pegue o lápis e traga aqui”. Compreende o signifi cado de gestos e sinais. Consegue descrever o contexto de um desenho ou de uma foto. Transmite uma mensagem. Nomeia objetos Faz perguntas. Produz mensagem oral com menos de dez palavras. Produz mensagem oral com mais de dez palavras. Produz signifi cado e atribui signifi cado. Produz desenho com detalhes e mais elaborados. Inicia conversa. Mantém uma conversa. Demonstra irritação ao se contrariado. 25 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 É capaz de permanecer sentado para a feitura de uma atividade. É capaz de segurar com os dedos e mãos um objeto grande, uma bola, por exemplo. É capaz de segurar com os dedos e mãos um objeto pequeno. É capaz de segurar com os dedos e mãos um objeto pequeno, um lápis (movimento pinça). Anda curtas distâncias desviando-se. Consegue se alimentar com quantidade e horários certos. Consegue promover conforto físico, como tirar uma blusa quando está calor. Relaciona-se socialmente com as outras crianças e o meio. Relaciona-se socialmente com as outras crianças, adultos e o meio. Estabelece contato com estranhos. Participa de jogos e brincadeiras com colegas. Demonstra entender e respeitar regras. Conclui tarefas sequenciais como escolher um brinquedo, usá-lo e guardá-lo. Sobe e desce escadas. Lava e seca as mãos. Escova os dentes. Veste e desveste as roupas 26 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Calça meias e sapatos. Come coordenando as várias ações: cortar, levar a boca e mastigar. Bebe coordenando as várias ações: abrir, sugar e tomar. FONTE: A autora Pode-se propor uma síntese dos vários critérios de classifi cação para uma previsão da evolução nas várias faixas etárias. Esse critério evolutivo nos parece útil para fi ns prognósticos e assistenciais. É importante recordar que a defi ciência intelectual se inicia precocemente, mas dura por toda a vida; por isso os profi ssionais envolvidos devem ter ideia de como um determinado caso vai proceder no tempo. A seguir encontra-se o quadro que contém um modelo da classifi cação evolutiva da defi ciência intelectual. Idade 0-6 anos Idade 6-18 anos Idade: idade adulta Nível I - Retardos sensório- motor e da linguagem leves. - Aprendizagem escolar discreta no ensino fundamental. - Difi culdade de aprendizagem no ensino médio. - Autonomia sufi ciente. - Permanência na fase da inteligência operatória concreta (9-11 anos). - Capacidade de adaptação social e profi ssional discretas com treinamento apropriado. - Necessidade de ajuda em situações difíceis e traumatizantes. Nível II - Desenvolvimento motor sufi ciente. - Linguagem e funções simbólicas pobres e com amadurecimento lento. - Aquisições escolares iniciais. - Persistência de imaturidade expressiva. - Autonomia sufi ciente. - Permanência na fase das operações concretas simples (7-9 anos). - Aprendizagem de um trabalho elementar. - Autonomia discreta. - Necessidade de ajuda em situações de vivência mais elaboradas. QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO EVOLUTIVA DO RETARDO MENTAL 27 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 Nível III - Desenvolvimento motor elementar com esquemas relacionais pobres. - Linguagem muito reduzida. - Aquisições de hábitos elementares, mas sem aprendizagem escolar - Comunicação verbal limitada; algum interesse afetivo e relacional - Pouca autonomia - Permanência da fase da inteligência representativa pré- operatória (2-6 anos) - Autonomia parcial, necessidade de ambiente monitorado. Nível IV - Retardo motor grave. - Nenhum desenvolvimento das funções simbólicas. - Nenhum desenvolvimento da linguagem. - Desenvolvimento sensório-motor limitado. - Ausência de linguagem relacional. - Nenhuma autonomia. - Permanência na fase da inteligência sensório- motor (0-2 anos). - Necessidade de assistência e monitoramento total. FONTE: AMAAR (2006) Nessa perspectiva é mister salientar sobre o conceito de defi ciência leve, deve-se observar que, se para o diagnóstico no baseamos somente em QI (Quociente intelectual) e não em uma avaliação multidimensional (que inclua também os parâmetros qualitativos da inteligência e os afetivos), podemos ser induzidos ao erro, pois, podemos, então, confundir sujeitos que na adolescência desenvolvem um pensamento lógico ou operatório concreto com outros que permanecem no nível representativo ou pré-operatório. Por isso, parece-nos necessário distinguir com avaliações aprofundadas os casos que adquiriram ou não a capacidade de realizar operações mentais (por exemplo, classifi car, ordenar e numerar). 4 SISTEMAS E SERVIÇOS DE APOIO DA DEFICIÊNCIA INTELECTUAL NOS CONTEXTO INSTITUCIONAIS Com o surgimento do movimento dos testes mentais, as defi nições de defi ciência intelectual passaram a dar ênfase à mensuração do funcionamento intelectual do indivíduo em testes de QI. Mais tarde, com os estudos de Grossman (1983 apud ALMEIDA, 2012) viu-se também a necessidade da avaliação do funcionamento intelectual relacionado à maturação, aprendizagem e ao ajustamento social, ou seja, comportamento adaptativo, e assim, a importância da indicação dos tipos de suportes e apoios para possíveis programas de intervenção (ALMEIDA, 2012). 28 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Assim, a prestação de suporte fi cou defi nida em quatro níveis: - Apoio intermitente: oferecido conforme as necessidades do indivíduo, em períodos curtos durantes transições, por exemplo, emprego. Esse tipo de apoio pode ser de alta ou baixa intensidade. - Apoio limitado: é caraterizado por consistência ao longo do tempo. O tempo é limitado, porém mais prolongado com mais de um profi ssional em atendimento. Exemplo desse apoio seria a transação da vida escolar para vida adulta. - Apoio amplo: é um apoio regular, por exemplo, apoio nas atividades de vida diária. - Apoio permanente: apoio de alta intensidade e constância. É oferecido nos ambientes onde a pessoa vive. No entanto, mostra-se também importante explicitar as oportunidades de prevenção existentes em muitos níveis. Em geral, podem ser identifi cados três tipos de prevenção: - Primária: envolve prevenção da condição que, do contrário, resultaria em defi ciência intelectual. Por exemplo, evitar o uso do álcool durante a gravidez. - Secundária: ações como evitar uma condição existente, exemplo, manejo da dieta de um indivíduo nascido com fenilcetonúria (FCU). - Terciária: ações para minimizar a gravidade de incapacidades funcionais associadas com etiologia ou para prevenir condições secundárias, por exemplo, a cirurgia corretiva precoce para défi cits cardíacos em crianças com síndrome de Down paraprevenir defi ciências funcionais posteriores. APOIOS À PREVENÇÃO: CATEGORIAS 1- Apoio nutricional Biomédico 2- Tratamento médico cirúrgico 3- Apoio familiar 4- Treinamento profi ssional dos pais Social 5- Desenvolvimento das habilidades dos pais 6- Tratamento para alcoolismo Comportamental 7- Prevenção da violência domestica 8- Envolvimento na intervenção precoce Educacional 29 C. H. E B. LEG. NOS SIST. DE APOIO E CLASSIFI. DA D. I. Capítulo 1 Diante do exposto, podemos realizar uma atividade que auxiliará na fi xação das informações apresentadas ao longo do capítulo. 1- Tendo como base a análise de trabalhos recentes no campo, parece haver consenso em relação às seguintes características da defi nição e da classifi cação da Defi ciência intelectual. Faça um quadro elucidando esses elementos. 2- De acordo com os dois casos expostos, escolha um deles e preencha o protocolo de avaliação dado. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Neste capítulo foram apresentados a natureza das defi nições, conceitos no processo histórico da Educação Especial e da Defi ciência intelectual, também a demonstração de um protocolo para o entendimento das funções prejudicadas nos indivíduos com DI. Foram apresentadas as classifi cações e, por fi m, os tipos de apoio e a diversidade de serviços preventivos diante desse transtorno. REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. A. Defi ciência Intelectual: realidade e ação. São Paulo: Núcleo de apoio pedagógico especializado, CAPE, 2012. AMERICAN ASSOCIATION ON MENTAL RETARDATION (AAMR). Retardo mental: defi nição, classifi cação e sistemas de apoio. Porto Alegre: Artmed, 2006. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition (DSM-V). Arlington, VA: American Psychiatric Association, 2014. BELLO, S. F. 2009. Interfaces educação especial e fonoaudiologia: um estudo bibliométrico baseado na produção científi ca de dissertações e teses. Dissertação (Mestrado). Programa de pós-graduação em Educação Especial. São Carlos, 2009. 30 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL BRASIL. Orientações para implementação da política de educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Brasília: Ministério da Educação, 2015. BRASIL. MEC/CNE. Proposta de diretrizes para a formação inicial de professores da educação básica, em cursos de nível superior. Última versão. Brasília, 2001. ______. LDBN, Lei de Diretrizes e Bases Nacional (9396/96). MEC – Ministério da Educação e Cultura: Brasília, 1996. JANNUZZI, G. de M. A educação do defi ciente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. 2. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2006. PFANNER, P; MARCHESCHI, M. Retardo mental: uma defi ciência a ser compreendida e tratada. São Paulo: Paulinas, 2008. SÃO PAULO (ESTADO), SECRETARIA DA EDUCAÇÃO. NÚCLEO DE APOIO PEDAGÓGICO ESPECIALIZADO – CAPE. Defi ciência intelectual: realidade e ação. Organização Maria Amelia Almeida, SE, 2012. TEIVE, H. A. G. et al. Alfred Binet: Charcot’s pupil, a neuropsychologist and a pioneer in intelligence testing. Arq. Neuro-Psiquiatr., São Paulo, v. 75, n. 9, p. 673-675, Sept. 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0004-282X2017000900673&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 30 ago. 2018. VALLE, J.W.; CONNOR, D. J. Ressignifi cando a defi ciência: da abordagem social às práticas inclusivas na escola. Porto Alegre: Penso, 2014. CAPÍTULO 2 A IMPORTÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO PADRÃO INFANTIL PARA O ENTENDIMENTO DOS SEUS DESVIOS E ATRASOS A partir da perspectiva do saber fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: Saber: Entender os marcos biológicos no desenvolvimento infantil. Ter conhecimento dos instrumentos de triagem para avaliação geral do desenvolvimento. Fazer: Determinar os marcos biológicos que são esperados para cada etapa do desenvolvimento (idade/escolaridade). 32 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL 33 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 1 CONTEXTUALIZAÇÃO O transtorno do desenvolvimento intelectual (APA, 2014) compromete de modo duradouro, e muitas vezes permanente, a conquista das funções que nos permitem como espécie um pensamento fundamentado na interiorização da experiência e, especialmente, na capacidade de abstrair dela as leis que ligam os acontecimentos, as relações de causa e efeito, as capacidades de formular hipóteses e deduções, as capacidades de distinguir os limites restritivos do mundo real, como foi apresentado no primeiro capítulo. Na defi ciência intelectual, o pensamento fi ca intimamente dependente da experiência e da sua representação, as percepções não conseguem se generalizar, o movimento é imitativo, com difi culdade de originalidade expressiva e construtiva, a linguagem é defi citária ligada à representação imediata, ocasionando desvios do processo evolutivo, isto é, o que é esperado para a idade dentro dos padrões normais, deteriorando o ciclo de desenvolvimento do indivíduo acometido por essa defi ciência. Dessa forma, a aquisição progressiva das habilidades é uma tarefa primordial no sistema nervoso central (SNC) e o refl exo do amadurecimento é denominado desenvolvimento. O desenvolvimento, neste caso, é considerado o resultado de ações simultâneas de fatores genéticos e ambientais que se modifi cam mutuamente. Segundo Olivier, Antoniuk e Bruck (2018), o desenvolvimento é a história de como cada criança atravessa momentos críticos de transformação, consolidando aquisições que a conduzem a níveis cada vez mais complexos de funcionamento. Assim, este capítulo trata da importância da compreensão que o professor e profi ssional devem ter sobre o desenvolvimento padrão para poder entender os desvios e atrasos que porventura possam ocorrer durante esse processo do indivíduo que está sob sua investigação ou intervenção. MARCOS BIOLÓGICOS NAS ÁREAS DOMÍNIOS DO DESENVOLVIMENTO O desenvolvimento signifi ca o processo de amadurecimento do ser humano desde o nascimento até a idade adulta. Este processo está dividido em crescimento físico e desenvolvimento funcional, e caracteriza-se por aquisições e aperfeiçoamento de funções e capacidades que a criança executa progressivamente. 34 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL O desenvolvimento infantil apresenta três aspectos importantes, são eles: padrões universais, diferenças individuais e infl uências ambientais e ocorre normalmente numa sequência, ou ritmos semelhantes, e que é previsível, o que justifi ca a utilização de instrumentos para sua avaliação devido aos padrões considerados normais do desenvolvimento infantil (BEAR, 2004). O instrumento de avaliação é valioso durante o processo de desenvolvimento e verifi cação na área de saúde e educação, e permite ao profi ssional orientar a família quanto à estimulação adequada para a fase específi ca da vida em que se encontra a criança, contribuindo para que o desenvolvimento se processe da melhor maneira possível (BELLO; MACHADO, 2018). O desenvolvimento biológico ocorre por meio de mudanças ordenadas nas estruturas físicas e orgânicas, e o desenvolvimento psicológico apresenta-se por mudanças progressivas no comportamento biológico resultante de eventos ambientais socioculturais. O desenvolvimento infantil é um processo de caraterísticas multifatoriais e para que ele ocorra adequadamente devem ser oferecidas as condições favoráveis acrescidas às condições biológicas inerentes ao ser humano. O desenvolvimento será o produto de fatores positivos e negativos atuantes durante a vida. Assim, os fatores de risco têm efeito cumulativo sobre o indivíduo, fator importante no estudo do desenvolvimento da criança.Nessa perspectiva, um indivíduo com defi ciência intelectual precisará de suportes de apoio já mencionados no capítulo anterior, bem como necessitará de estrutura educacional, que será explicitada no capítulo seguinte. DETERMINANTES BIOLÓGICOS E PSICOLÓGICOS NAS ÁREAS DOMÍNIOS LINGUAGEM SOCIOEMOCIONAL Os avanços dos estudos de genética molecular caminham para o conhecimento sob a infl uência genética no processo do desenvolvimento humano. Por conseguinte, os novos conhecimentos indicam que os fatores genéticos não obedecem a um modelo de herança monogenética, e que devem existir múltiplos genes agindo associados aos fatores ambientais determinando os processos O desenvolvimento infantil apresenta três aspectos importantes, são eles: padrões universais, diferenças individuais e infl uências ambientais. O desenvolvimento infantil é um processo de caraterísticas multifatoriais. 35 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 cognitivos humanos (LOPES-CENDES, 2006). Assim, segundo os autores referenciados anteriormente, a formação do SNC obedece a estágios sucessivos de desenvolvimento: formação do tubo neural, clivagem ou segmentação, proliferação neuronal, migração, diferenciação, formação de sinapses e circuitos neurais, morte celular programada e mielinização. Cada série de etapas críticas dentro deste processo deve ser cumprida corretamente para que o cérebro atinja sua estrutura normal. Os períodos de proliferação e migração celular são os mais vulneráveis às infl uências ocorridas no organismo materno. A formação de circuitos neurais se caracteriza pelo estabelecimento de conexões sinápticas com outros neurônios. Concomitantemente a este processo, é importante ter em mente que novas células do córtex cerebral continuam sendo geradas até por volta de 40 semanas e que as sinapses continuam se estabelecendo até a idade de cinco anos e, posteriormente, mesmo que em ritmo mais lento, até aos 18 anos. No entanto, a maior formação de sinapses ocorre mais intensamente após o nascimento. A plasticidade ocorrida durante o desenvolvimento compreende três estágios sobrepostos no curso do desenvolvimento sináptico e sua manutenção subsequente (GONÇALVES; MACHADO, 2012). • Formação das sinapses: ocorre nas etapas precoces do desenvolvimento e está sob controle dos processos genéticos. • Afi nação das sinapses recém-desenvolvidas: ocorre durante períodos críticos do desenvolvimento, em geral estabelecida por estímulos ambientais. • Regulação da efi cácia sináptica: pode ser a longo prazo ou transitória, ocorrendo diariamente durante toda a vida e é determinada pela experiência. Os momentos nos quais ocorrem mudanças muito rápidas no desenvolvimento humano são conhecidos como período crítico. Em tais períodos, efeitos deletérios podem interferir na sequência normal do desenvolvimento cerebral. A determinação do início e fi m de cada período crítico é de natureza complexa e dependente de eventos celulares e modulares delicados (FERRARI, 2006). No nascimento, o organismo traz consigo todo um repertório histórico ou de desenvolvimento que é essencialmente fi logenético, prevalecendo inicialmente a determinação genética do comportamento, seguida da infl uência ambiental e da interação do indivíduo com seu meio, ao qual responderá atuando sobre seu ambiente físico, social e cultural, constituindo esta a porção do conhecimento. Podemos dizer que a interação entre os fatores biológicos e ambientais 36 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL será expressa como comportamento. Esta interação entre as características genéticas próprias de cada ser humano e as mudanças no comportamento promovidas pelo meio ambiente resumem de maneira geral o que se compreende como aprendizagem, que se caracteriza como um processo de aquisição do conhecimento por meio da experiência, observação ou imitação, processo este pelo qual o ambiente, de natureza epigenética, agindo sobre a base genética, altera o comportamento. Como vimos no capítulo anterior, os indivíduos com defi ciência intelectual apresentam prejuízos em todos esses elementos citados. Como uma condição básica da necessidade de sobrevivência da espécie humana, a criança demanda os cuidados de um adulto para alimentar-se, dar proteção, conforto e segurança. Esta sobrevivência se desenvolve e é iniciada a partir da busca de proximidade e contato com uma fi gura específi ca com quem é feito um vínculo que permite a sensação de segurança (BEE, 2006). A forma de vinculação é denominada apego, explicado por Bee (2006) como sendo uma variação de vínculo afetivo quando existe a necessidade de presença do outro, e que se traduz por uma sensação de segurança quando este está presente. A criança vincula-se afetivamente aos pais e, quando sente segurança, torna-se apta a explorar o mundo e outros relacionamentos. Normalmente o vínculo inicial acontece entre a mãe e o bebê, e a qualidade desta relação vai resultar em apego seguro ou inseguro na criança, dependendo deste a sua saúde mental. Este vínculo é mais intenso com o cuidador primário. Além disso, a criança mantém relações de apego com fi guras subsidiárias, que não têm as mesmas características que aquelas exercidas pelo cuidador primário (BOWLBY, 1990). Com a capacidade de locomoção e fala, as crianças arriscam distanciar-se de suas mães, até o momento em que se sentem ameaçadas, quando procuram novamente a presença da mãe com a fi nalidade de que a tranquilidade volte a reinar. Este comportamento vai se tornando menos frequente à medida que a idade vai passando e a criança vai se tornando mais competente socialmente, uma consequência do desenvolvimento de autoconfi ança proveniente do apego seguro. A competência e a cognição social combinam as áreas perceptiva, cognitiva, social, emocional e do desenvolvimento da personalidade, o que inclui pensar sobre o que as pessoas deveriam fazer e como elas sentem. 37 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 Com aproximadamente nove meses as crianças já demonstram sinais específi cos de formação de apego social. E o vínculo com a mãe resulta em previsibilidade e o desenvolvimento da permanência dos objetos e especialmente da mãe, tornando-se um pré-requisito cognitivo para o apego. O aprendizado social ocorre na medida em que a sequência angústia-alívio se repete. Esta repetição é importante para a formação da cognição social e dos laços de apego, possibilitando o aprendizado por meio desta repetição da transição do estado de desprazer para o de prazer, associando a pessoa com o resultado prazeroso que ela produz (BEE, 2006). O desenvolvimento sociocognitivo se inicia com o processo da separação do indivíduo e conexão emocional com o outro, e no início do segundo ano as crianças já são capazes de reconhecer e categorizar as pessoas e dimensioná-las de forma diferente, de acordo com os modelos representacionais estabelecidos por meio de estruturas cognitivas baseadas em experiências vividas por elas. Estes modelos são dependentes da memória e da atenção, afetando o comportamento, implicando em cada novo relacionamento na reprodução do padrão com que a criança está familiarizada. A mudança sequencial e previsível nos padrões de comportamento de um organismo é o que serve de base para a construção do desenvolvimento neuropsicomotor. Assim, o desenvolvimento do SNC da criança é demonstrado por meio das várias etapas do desenvolvimento neuropsicomotor. Veremos mais sobre a importância das etapas no quadro de aquisições neuropsicomotoras que será apresentado no tópico a seguir, área muito importante para observamos o desenvolvimento de uma criança, ou seja, o que é esperado para cada idade. Nessa perspectiva, é um elemento relevante para os profi ssionais e professores que trabalham com crianças e, principalmente, um caminho com direção científi ca para suspeitasde atrasos e hipóteses para uma possível defi ciência intelectual. MODELOS DE AVALIAÇÃO NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL O desenvolvimento é uma transformação complexa, dinâmica e progressiva. Portanto, para o bom desenvolvimento da criança, as condições e o bem-estar físico, emocional e social se fazem necessários. A importância dos primeiros meses e anos de vida na constituição do sistema nervoso da criança é fundamental. 38 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL As aquisições no desenvolvimento neuropsicomotor de uma criança seguem uma determinada ordem, como no exemplo em que a sustentação do tronco se faz necessária para o caminhar. Sendo o desenvolvimento uma sucessão de avanços obtidos pela maturação e interação com o meio, os primeiros anos de vida são de conquistas e aperfeiçoamento de várias habilidades que se benefi ciam e partilham desse aprendizado, incluindo os campos do cognitivo, social, afetivo, motor e linguagem. O desenvolvimento ocorre de forma gradativa e rapidamente, a criança vai adquirindo habilidades que lhe permitirão oportunidades de aprendizagem e interação com o mundo que a cerca. Para que o desenvolvimento e o crescimento aconteçam de forma satisfatória, são necessárias condições básicas, sustentadas em três pilares: • saúde, proteção e segurança; • oportunidade de aprendizagem adequada; • interações positivas. A qualidade do desenvolvimento na primeira infância terá infl uência nos resultados e na saúde na vida adulta, assim, aos profi ssionais da saúde e educação cabem o empenho e a responsabilidade do conhecimento e entendimento aprofundado dos marcos/fases do desenvolvimento, conhecendo o comportamento e desempenho da criança, identifi cando e possibilitando a prevenção e a intervenção de possíveis atrasos ou riscos ao desenvolvimento. A seguir é apresentado um quadro com algumas aquisições neuropsicomotoras defi nindo o desenvolvimento por idade, o que pode auxiliar de modo signifi cativo os profi ssionais da área. Idade da criança Área Motora Área Linguística Área Comportamental Recém- nascido Hipertonia fl exora dos quatro membros Refl exo de preensão Refl exo palmar Reconhece as vozes da mãe e do pai Pode seguir objetos com olhos Explora com olhos e ouvidos Enxerga melhor de 20 cm a sua frente 3 meses Segura a cabeça com fi rmeza Refl exos primitivos ainda presentes: sucção, mão-boca Firma o pescoço Movimenta a cabeça Junta as duas mãos na linha média O olhar responsivo Sorri socialmente Reconhece sua voz Faz gorjeios Reconhece seu rosto Adquire a noção de profundidade Inicia gargalhadas QUADRO 1 – DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR 39 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 6 meses Rola nas duas direções quando deitada Estica o braço para pegar objetos e os põe na boca Senta com apoio Muda de decúbito Vira na direção de som e vozes Atende pelo nome Faz vocalizações Imita sons Pode puxar objetos em sua direção, inicia permanência de objeto Está pronta para alimentos Retira pano do rosto “cuti” 9 meses Fica de pé segurando em algo Anda segurando nos móveis Fica em pé sozinha por alguns segundos Diz “papa”, “mama” para pessoa certa Palavras de sílabas repetidas com signifi cado. Pega objetos em cada mão e bate um contra o outro Troca preensão manual de pinça superior em escada. 12 meses Dá alguns passos Anda bem Pinça superior individualizada Localiza a fonte sonora Usa palavras corretamente e produz jargão Participa de brincadeiras Entende instruções simples Bebe líquidos no copinho 18 meses Corre Chuta bola Aponta e nomeia partes do corpo nela e no outro Fala 50% compreensível Capaz de nomear quatro fi guras Controle vesical diurno iniciando 24 meses Equilíbrio estático Sobe escada com apoio Arremessa bola com mão acima da cabeça Enriquece o vocabulário com signifi cados diferentes Frases com duas palavras Pede o que quer comer, água, brinquedo Consegue comer usando colher Faz torre de quatro cubos Garatuja, faz garranchos Consegue pôr e tirar sapatos e meias Começa a ser sociável com outras crianças 36 a 48 meses Equilibra-se em cada pé por cinco segundos; Marcha com a ponta de um pé Consegue construir frases usando verbos Defi ne três objetos pelo seu uso Imita linha vertical Copia círculo Desenha boneco com três partes Sabe que há meninos e meninas e a qual grupo pertence Escova os dentes com supervisão 60 meses Controle motor adequado para as atividades motoras: andar, correr, subir pular, empurrar, escrever, recortar e realizar atividades funcionais Seu vocabulário já consta de qual mil palavras e usa com desenvoltura e fl uidez. Faz analogias: se o cavalo é grande, o rato é... Controle completo vesical e anal Descobrimento das letras, o aprimoramento da coordenação, o abstrato se faz presente, nomeia cores, copia quadrado, desenha uma pessoa com seis partes FONTE: A autora 40 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL O quadro apresentado servirá de base para possíveis observações, o que deve ocorrer principalmente em creches e instituições de saúde e educacionais que recebem e assistem crianças dessa faixa etária. É mister ressaltar que tais aquisições são marcos para o desenvolvimento, dessa forma, precisamos analisar cada caso dentro do padrão esperado. Salienta-se também que quando uma criança tem a condição de ser assistida pelos três pilares citados, com certeza seus prejuízos podem ser amenizados. Uma criança com diagnóstico de defi ciência intelectual se benefi ciará da observação apurada do profi ssional que com ela trabalhará. Nessa perspectiva, considerando que o desenvolvimento infantil é ameaçado por fatores de risco, sejam biológicos ou ambientais, a implantação de programa de intervenção precoce, com acompanhamento sistemático, deve ser reconhecida e considerada como ação de prioridade nas políticas públicas dos vários países, inclusive o Brasil. Diagnósticos e intervenções precoces são essenciais para minimizar os efeitos e consequências dos riscos aos quais algumas crianças, famílias e sociedade estão expostos. A prevenção dessas condições e suas possíveis consequências negativas na primeira infância constitui-se em ação prioritária para a educação e saúde infantil. Essa prevenção é chamada por Figueiras et al. (2005) como “vigilância do desenvolvimento”, caracteriza-se por todas as atividades relacionadas à promoção de desenvolvimento normal e à detecção de problemas no desenvolvimento durante a atenção primária à saúde da criança. Tal ação engloba a prevenção, a detecção de anormalidade e a promoção de atitudes que favoreçam o desenvolvimento, tendo como fi nalidade o encaminhamento adequado para avaliação detalhada, orientação das famílias em relação ao desenvolvimento infantil e o monitoramento do efeito das intervenções. Os programas de atendimento e vigilância às crianças devem ser sustentados por três pilares, como já mencionado. Essa vigilância do desenvolvimento infantil acontece nas visitas sistemáticas e programadas ao pediatra, recomendadas nos primeiros anos de vida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Uma das atividades centrais desses acompanhamentos é o monitoramento do crescimento e do desenvolvimento psicomotor das crianças, a fi m de realizar uma detecção correta e, se necessário, uma intervenção para todas as crianças que apresentem desvios. 41 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 Apesar da frequência das visitas, muitos problemas de desenvolvimento escapam, principalmente a detecção de fatores múltiplos de natureza sutil, como no caso do Transtorno do Desenvolvimento Intelectual (DI). A falta de tempo nas consultas, a carência de ferramentas validadas e adaptadas à nossa população, ou pela não utilização dos instrumentos detriagem recomendados e de fácil manuseio, confi ando os profi ssionais da saúde somente em seu exame clínico, podem ser fatores de não identifi cação precoce de riscos ao desenvolvimento (LOPES; LOPES, 1999). Com o objetivo de atender crianças em situação de risco para seu desenvolvimento, realizando o acompanhamento longitudinal do crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor, foram introduzidos no Brasil, na década de 80, os programas de follow-up. Junto com eles fez-se necessária a aplicação de instrumentos de triagem e avaliação para o acompanhamento e registro da evolução das crianças (FORMIGA; PEDRAZZANI; TUDELLA, 2004). O Ministério da Saúde (MS) instituiu, para utilização pelos pediatras no acompanhamento de qualquer criança, a fi cha de acompanhamento do desenvolvimento e o manual de vigilância do desenvolvimento infantil no contexto da Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI), para identifi cação precoce de alterações no desenvolvimento infantil (OMS, 2005; OPAS, 2005). A Academia Americana de Pediatria (APP) recomenda que todas as crianças, mesmo as sem fatores de risco, devem ser submetidas a testes de triagem padronizados com nove, 18, 24 e 30 meses. Eickman (2008) reforçou a importância desses programas, mostrando que esses devem ser um processo contínuo e fl exível de avaliação da criança, incluindo a observação direta, a valorização dos familiares, um exame neurológico sistematizado, assim como a avaliação dos marcos de desenvolvimento neuromotor com a realização de testes de triagem. Diferentes testes e escalas de avaliação e triagem podem ser aplicados em crianças de zero a cinco anos, permitindo comprovar o desenvolvimento das áreas cognitivas, motora, da linguagem e social de forma segura e rápida. As primeiras publicações que se tem sobre avaliação e escalas do desenvolvimento psicomotor foram encontradas com data de 1877, mas somente em 1920 é que o tema despertou interesse do meio científi co. Muitos estudos e instrumentos de avaliação foram desenvolvidos deste então, alguns dos quais são utilizados até hoje, como o método de avaliação do desenvolvimento de Gesell e o Teste de triagem de desenvolvimento de Denver (DDST), por exemplo (BAYLEY, 2017). 42 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL A avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor pode ser entendida como a aplicação de um método com critérios explícitos de análise com vistas a conhecer, medir, determinar e julgar o contexto ou o estado em que se encontra uma criança, a fi m de estimular e facilitar processos de aprendizagem e de desenvolvimento. A avaliação tem um objetivo de identifi car transtornos específi cos do desenvolvimento que afetam a criança, possibilitando estabelecer quocientes de desenvolvimento (EICKMAN, 2008). Segundo a mesma autora, o monitoramento do desenvolvimento passa pelo processo fl exível, contínuo e cumulativo, por meio do qual profi ssionais de saúde e educação podem, utilizando várias fontes, reconhecer crianças em risco para transtornos do desenvolvimento. O conceito de avaliar o desenvolvimento neuropsicomotor foi incorporado à promoção do desenvolvimento infantil pelo setor público tanto na saúde como na educação, com ações de vigilância do desenvolvimento, englobando a prevenção e detecção de possíveis alterações, bem como a promoção e antecipação de questões relacionadas a esse processo. De uma forma ou de outra, todas as avaliações infantis envolvem a busca de informações na tentativa de melhor compreender e apoiar a aprendizagem e o desenvolvimento da criança. Os resultados esperados de uma avaliação podem descrever alguns detalhes informativos do que essas crianças sabem e podem fazer, mas nunca totalmente retratar quem são ou serão como indivíduos. Ao avaliar o desenvolvimento neuropsicomotor, é importante distinguir entre as crianças que apresentam desenvolvimento típico e as que apresentam desenvolvimento atípico. Basear-se apenas na impressão clínica pode ser inefi ciente. Diante do exposto, a realização de testes de triagem para detecção de alterações do desenvolvimento deve ser concebida como complementar às ações de vigilância mencionadas. Para a realização de uma avaliação signifi cativa, o profi ssional deve ater-se no planejamento e na escolha do instrumento entre os disponíveis. É necessário conhecer e discutir as várias fi nalidades, tipos e métodos que o instrumento dispõe para que seja realizada a avaliação. É importante considerar algumas implicações, como: a) a realização de uma avaliação completa e signifi cativa requer compreensão familiar e a obtenção de informações dos pais sobre o desenvolvimento da criança, a história pregressa e atual, a rotina da família, sua situação socioeconômica e cultural, seguida do exame físico da criança, englobando o neurológico e clínico e, se possível e com permissão, realizar visitas domiciliares; 43 A IMP. DO DESEN. P. I. PARA O ENT. DOS SEUS D. E A. Capítulo 2 b) ao realizar a avaliação em crianças pequenas, é preciso ser fl exível, devendo fazer parte do planejamento as variáveis como fadiga, sono, doença e o próprio temperamento da criança, horário, material, entre outros fatores situacionais que podem facilmente ofuscar as habilidades e o desempenho da criança; c) as crianças aprendem fazendo e demonstram suas habilidades por meio de ações lúdicas e atividades orientadas. Assim, aplicar a avaliação nessas atividades, rotinas e interações do dia a dia pode produzir um resultado mais fi dedigno; d) planejar o objetivo que deve ser alcançado com os resultados da avaliação, devendo-se coletar somente as informações que realmente são úteis para a intervenção. Os instrumentos formais de avaliação são ferramentas para a coleta de informações fi dedignas, mensuráveis e quantifi cáveis, padronizadas para determinada população. Portanto, o profi ssional deve conhecer bem o instrumento e manejá-lo com destreza, confi ança e de acordo com as regras e normas estabelecidas. Deve saber selecionar os instrumentos, optando pelo que é mais indicado conforme a sua realidade e fi nalidade, levando em consideração: • a confi abilidade do teste; • a validade; • a sensibilidade, que é a habilidade do teste em identifi car corretamente os indivíduos que apresentam disfunções; • a efi ciência, o custo e tempo para a aplicação. O profi ssional deve considerar, ainda, se o instrumento escolhido está correlacionado com o outro teste ou instrumento “padrão-ouro”. No Brasil, entretanto, são poucos os instrumentos traduzidos, validados e padronizados para sua realidade. A maioria dos testes e escalas utilizados na prática clínica, nos programas de follow-up em pesquisas são protocolos publicados em língua inglesa (SANTOS; ARAÚJO; PORTO, 2008). Padrão-ouro é um teste padrão que serve de comparação por parte de outros testes, com a fi nalidade de avaliar a exatidão dos mesmos, em resultados que assegurem o máximo de acertos de forma a estabelecer o diagnóstico real. 44 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL Os instrumentos de avaliação são classifi cados conforme suas fi nalidades em triagem, diagnóstico, avaliação instrucional e de programas de acompanhamento: a) Instrumento de triagem: identifi car problemas potenciais no desenvolvimento e assegurar se o desenvolvimento está de acordo com o esperado; b) instrumentos de diagnóstico: efi cazes para diagnosticar os pontos fortes e áreas de necessidade de apoio à instrução, desenvolvimento e/ou comportamento, para diagnosticar a gravidade e a natureza das necessidades especiais e para estabelecer a elegibilidade do programa; c) avaliação instrucional: informar, apoiar e monitorar a aprendizagem. Utilizados na maioria das vezes em escolas e centros de capacitação; d) avaliação para programas de acompanhamento: fornecer dados para prestação de contas e resultados, visando o aperfeiçoamento e a melhoria de um programa. É
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