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1 AUTOCONHECIMENTO NA PRÁTICA DO CUIDAR 1 SUMÁRIO NOSSA HISTÓRIA ...................................................................................................... 2 A PSICOLOGIA HOSPITALAR E AS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES (ADAPTADO) .............................................................................................................. 3 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3 METODOLOGIA ......................................................................................................... 4 O início das atividades da psicologia hospitalar ............................................................. 4 A psicologia hospitalar e a equipe multidisciplinar ........................................................ 5 Relações de poder e os profissionais de saúde ............................................................... 7 Considerações finais: o conceito de saúde e o trabalho da psicologia hospitalar........... 10 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 11 UMA ABORDAGEM HERMENÊUTICA DA RELAÇÃO SAÚDE-DOENÇA ( Adaptado) ................................................................................................................... 12 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12 A TERCEIRA MARGEM DA SAÚDE: A ANGÚSTIA EM KIERKEGAARD E HEIDEGGER ............................................................................................................. 15 OS CONCEITOS DE SAÚDE E DOENÇA NA OBRA DE GADAMER E SUAS INFLUÊNCIAS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS EM SAÚDE .......................................... 18 TEORIA INTERPRETATIVA E TEORIA CRÍTICA NO CAMPO DA SAÚDE: RUMO PARA UMA NOVA ABORDAGEM TEÓRICA? ...................................................... 19 AS IMPLICAÇÕES DA TEORIA INTERPRETATIVA NA FORMAÇÃO E PRÁTICA CLÍNICA .................................................................................................................... 21 Referências ................................................................................................................. 24 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 A PSICOLOGIA HOSPITALAR E AS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES (ADAPTADO) Luciana Barcellos Fossi1; Neuza Maria de Fátima GuareschiI, 2 I Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul INTRODUÇÃO A psicologia hospitalar tem construído sua história, passo a passo, considerando que há menos de duas décadas, a atuação do psicólogo em instituições hospitalares não estava regulamentada como uma ampla e necessária práxis psicológica. Os profissionais aventuraram-se por este caminho, mas muitos já o trilhavam, delineando os rumos desta área como a conhecemos hoje. Assim, as atividades desempenhadas pelos psicólogos organizacionais e clínicos necessitam se moldar às demandas institucionais. Nos hospitais gerais, faz-se, então, necessário a escuta terapêutica com usuários, e, consequentemente, a escuta de seus familiares. Médicos e enfermeiros observam que diversos usuários acabam voltando ao hospital novamente “ doentes” , solicitando atendimento e cuidados. As equipes médicas (e também outros funcionários do hospital) relatam que, em alguns casos, somente a ajuda médica não basta para o tratamento ser bem sucedido: o ser humano é muito mais que um corpo físico, e assim, o atendimento integral à saúde é indiscutível. Portanto, a integração da equipe de saúde é imprescindível para que o atendimento e o cuidado alcance a amplitude do ser humano, considerando as diversas necessidades do paciente e assim, transcendendo a noção de conceito de saúde, de que a ausência de enfermidade significa ser saudável. Dessa forma, o trabalho em equipe mostra-se fundamental para o atendimento hospitalar, na medida em que médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais e os demais profissionais envolvidos nesse atendimento estabeleçam uma integração, para que a pessoa seja tomada como um todo, para que ela possa ter um atendimento humanizado, contemplando assim, outras necessidades dos usuários. A contribuição da psicologia hospitalar não se limita ao usuário ou à instituição, mas a especificidades que auxiliam todo o trabalho da equipe médica. A experiência da multidisciplinariedade proporcionou a continuidade da construção da identidade do psicólogo, enquanto um profissional do campo da saúde. Este estudo pretende mostrar alguns aspectos da trajetória do psicólogo em instituições hospitalares não psiquiátricas, a inserção deste profissional, bem como sua práxis profissional nas equipes multidisciplinares no Rio Grande do Sul, mais http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582004000100004#1b http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582004000100004#2b 4 especificamente em hospitais gerais de Porto Alegre. Para tanto, questões teóricas, históricas e atuais, vinculadas à psicologia hospitalar, serão contempladas e discutidas tendo como base alguns estudos teóricos e as falas de psicólogas entrevistadas. METODOLOGIA Este estudo foi realizado em seis hospitais gerais públicos e particulares, da cidade de Porto Alegre. Foram entrevistadas3 seis psicólogas, cada uma de um hospital. Através de uma entrevista semi-estruturada, procuramos buscar informações sobre o início do trabalho da psicologia nos hospitais, o desenvolvimento das primeiras atividades, bem como as atuais, e o contexto atual de trabalho nos hospitais gerais. As psicólogas destacaram diversos aspectos de sua atuação profissional que permearam a construção deste estudo. Através da emergência de determinados enunciados na fala das psicólogas, foram situados algumas questões como: a inserção do trabalho da psicologia no hospital, a psicologia hospitalar e as relações da equipe multidisciplinar de saúde. Os enunciados desses discursos foram organizados pelos tópicos dessas questões da pesquisa e sobre os quais se fez a discussão dos resultados. Os resultados dessa pesquisa estão organizados da seguinte forma: primeiro serão contextualizados, brevemente, alguns aspectos relacionados ao início da psicologia hospitalar4, para, em um segundo momento, se discutir a participação do trabalho da psicologia nas equipes multidisciplinares, abordando principalmente as relações de poder. Nas considerações finais, questionamos a concepção do conceito de saúde implicada no modo de trabalho das equipes de saúde e apontamos para aspectos deste conceito que consideramos fazer parte da prática da psicologia nos hospitaisgerais. O início das atividades da psicologia hospitalar Na década de 1980, a instabilidade econômica do país gerou um mercado de trabalho saturado de profissionais liberais e uma baixa nas ofertas de emprego. Essa situação econômica se fez presente no início da trajetória profissional de psicólogas que iniciaram sua atividade profissional no hospital: “ Eu ia me formar e obviamente não tinha emprego e ela perguntou se eu queria trabalhar lá (no hospital) e eu adorei.” No entanto, pouco se sabia sobre o psicólogo hospitalar, suas funções não haviam sido preestabelecidas, e ainda não existiam muitos estudos teóricos sobre o tema. A motivação para o desenvolvimento de um trabalho comprometido com a demanda também decorre do âmbito do conhecimento e da formação específica do profissional, o que sugere um http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582004000100004#3b http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582004000100004#4b 5 despreparo por parte dos profissionais recém formados, sendo necessária a ampliação dos conhecimentos adquiridos na graduação. As psicólogas inseriram-se nesse contexto considerando as necessidades da instituição relacionadas à psicologia. As primeiras atividades estavam relacionadas com o funcionamento da instituição, buscando criar novos serviços e qualificá-la, investigando as necessidades e estabelecendo objetivos: "Então nós fizemos um levantamento das necessidades e toda uma pesquisa para o levantamento das necessidades, estabelecendo prioridades, daí fizemos um projeto de trabalho daquelas necessidades [...] apresentamos para a direção. A direção aceitou a nossa proposta e nós estamos desde 1979...” . No entanto, a demanda hospitalar não era unicamente clínica, mesmo considerando que esta prática tenha sido o marco da afirmação profissional do psicólogo. Portanto, questões relativas ao funcionamento institucional mereceram a atenção do profissional da psicologia, proporcionando uma escuta que transcende a clínica, ressaltando a necessidade de se dedicar "a instituição como um todo, no seu funcionamento para que ela desempenhe da melhor forma possível a tarefa saúde, no cuidado com a saúde", que pode também ser contemplada nas seguintes atividades: "Então eu fazia seleção do pessoal, treinamento de funcionários, fazia avaliação do trabalho junto com as chefias...". A implementação de uma área nova dentro da psicologia suscitou a utilização de recursos técnicos e metodológicos de diversas áreas do saber psicológico, não se restringindo apenas a clínica, mas também a organizacional, social e educacional (Fongaro e Sebastiani,1996). Assim, foram criando um conhecimento mais específico sobre a área, possibilitando uma maior união entre o psíquico e o biológico, dentro do contexto hospitalar. Nesse sentido, faz-se necessário comentar a importância de estar instrumentalizado para realizar um bom trabalho. "Então foi aí que eu comecei, fui buscar supervisão, fui trabalhar e aí a coisa começou.". Estas falas ilustram a necessidade de se desenvolver materiais que expliquem e contextualizem o trabalho do psicólogo nesta área e a dinâmica da instituição hospitalar ( Fongaro e Sebastiani, 1996). A psicologia hospitalar e a equipe multidisciplinar A Psicologia Hospitalar não pertence unicamente a área clinica, pois ela também abrange áreas como a organizacional, social e educacional, utilizando-se de recursos técnicos, metodológicos e teóricos de diversos saberes psicológicos. A Psicologia Hospitalar busca comprometer-se com questões ligadas à qualidade de vida dos usuários bem como dos profissionais da saúde, portanto, não se restringindo ao atendimento 6 clínico, mesmo este sendo uma prática universal dos psicólogos hospitalares. O pressuposto que permeia as atividades do psicólogo no hospital geral mostra outra visão de indivíduo, não fragmentada, mas como um todo, como um ser biopsicossocioespiritual com o direito inalienável à dignidade e respeito. (Fongaro e Sebastiani, 1996) A equipe hospitalar é composta por diversos profissionais, incluindo aqueles que não assistem as pessoas hospitalizadas diretamente, tais como equipe de higienização, radiologista, anestesista, dentre outros. No entanto, consideraremos aqui a equipe multidisciplinar formada pelos profissionais que assistem diretamente os indivíduos: médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionista, assistente social, fisioterapeuta. Cabe salientar que a equipe multidisciplinar tem sua formação centrada nas necessidades da pessoa, portanto, ela não é pré-organizada. A demanda do enfermo é que fará com que os profissionais da saúde se integrem, com o propósito de satisfazer as necessidades globais da pessoa, proporcionando seu bem-estar. No entanto, serão os médicos os protagonistas do manejo hospitalar, pois são eles que decidem sobre técnicas, medicações, cura, internações e altas (Angerami-Camon, 1987). Portanto, os demais profissionais se adequam, primeiramente, a demanda orgânica do indivíduo e às definições do médico, para posteriormente, integrar sua prática ao atendimento hospitalar. Porém, o aparecimento de inúmeras especialidades da área da saúde impossibilita que um único profissional englobe todos os conhecimentos produzidos em sua área de atuação. As múltiplas situações difíceis e inesperadas que fazem parte da realidade dos usuários dos hospitais gerais refletem no trabalho da equipe multidisciplinar, o que mostra que uma única especificidade profissional não consegue dar conta dessa gama de fatores intrínsecos a doença e a hospitalização (Chiattone, 1996). Em relação aos valores pessoais permeiam as relações profissionais, assim, acredita-se que a neutralidade médica exemplificada pelo relacionamento padrão estereotipado, estabelecido com os demais profissionais da saúde, bem como com os beneficiários dos serviços de saúde, implicam alguns questionamentos, principalmente por parte da equipe, tendo em vista que o saber médico é pouco compartilhado. A neutralidade médica pode ser explicada, mas não justificada, pela necessidade de esvaziamento dos conteúdos e representações de vida e morte, já que a relação entre os médicos e a pessoa em sofrimento é repleta de ansiedades e fantasias (Zaidhaft, 1990). A postura médica é consequência da formação profissional, que pouco enfoca as relações humanas e que tem uma visão de ser humano como objeto de estudo, não considerando as emoções subjacentes ao manejo médico (Kubler-Ross, 1999). Os membros da equipe, especialmente os médicos, que 7 tiverem sua auto-estima atrelada ao seu desempenho profissional, podem perder a noção realista das condições de recuperação de determinados casos, sendo a recuperação completa a única alternativa possível (Leão, 1998). A inserção dos serviços de psicologia é privilegiada em instituições onde há espaço para reuniões entre os diversos profissionais da equipe multidisciplinar, pois nestas ocasiões, o psicólogo evidenciará a importância da valorização do conjunto dos aspectos emocionais do indivíduo. A equipe médica de saúde, então, busca humanizar as condições do indivíduo no seu período de hospitalização. O vínculo entre o indivíduo e a equipe multidisciplinar tem de ser considerado no manejo psicológico. É indispensável que o psicólogo saiba detalhadamente das atividades desenvolvidas pelos demais profissionais, bem como os limites de cada um, possibilitando uma atuação integrada, com manejo único. A multidisciplinariedade corre o risco de fragmentação entre os setores, e consequentemente, a fragmentação do paciente. O relacionamento precário entre a pessoa e a equipe de saúde pode acarretar mais sofrimento do que o esperado para determinados quadros. Entretanto, é a trajetória hospitalar do indivíduo que definirá o enfoque de seu atendimento psicológico, que poderá ser préou pós-operatório, ambulatorial, ou de enfermaria. É através desta consideração que o trabalho do psicólogo será delineado e implementado, considerando as necessidades individuais da pessoa (Angerami-Camon, 1987). De acordo com Santos e Sebastiani (1996), a discussão sobre as equipes multidisciplinares é de suma importância, pois mesmo a proposta do atendimento integral ao usuário sendo óbvia, na prática, tal obviedade não é efetivamente posta em ação. Ainda percebe-se dificuldades de interação entre os profissionais, disputas de poder (tanto objetivas quanto subliminares), falta de conhecimento sobre a ajuda que outras especialidades podem dar à equipe e ao indivíduo. Relações de poder e os profissionais de saúde É impossível pensar em qualquer relação humana sem pensar nas relações de poder que permeiam, induzem, formam saberes e produzem discursos. É o que Foucalt nos ensina em microfísica do poder (1979/1984). Cabe ressaltar que poder não é um objeto e sim uma relação, e que também não é sempre negativo, ele é mais que uma instância repressiva, ou seja, o poder pode ser também positivado pelos sujeitos. Um aspecto importante do poder é sua tendência a ocultar-se, inclusive negativisar-se, apresentando-se como uma exigência natural ou razão social, de acordo com Martins 8 (2003). Para que haja a manutenção de um discurso dominante em uma instituição, são necessárias práticas que o legitimem e operem no sentido de reprimir manifestações contrárias. Desta forma, os profissionais da área da saúde tornam-se (re)produtores de uma postura médica que não é imposta, mas sim “ indicada” como um padrão a ser seguido, sem crítica alguma. É neste momento que fica claro o exemplo das relações de poder nas relações estabelecidas nas equipes multidisciplinares. Tal poder se estabelece no cotidiano através do exercício da medicina, ou de outra disciplina da área da saúde, ele controla o saber e o fazer médico, normatizando os profissionais. (Martins, 2003) Um exemplo disso pode ser o fato de o médico versar sobre o seu trabalho com uma linguagem específica e técnica, pouco acessível aos leigos (inclusive ao psicólogo), demonstrando uma relação de poder, já que principalmente os usuários ficam inibidos frente à autoridade de um saber médico. Na prática do psicólogo, as relações de poder são estabelecidas através de seu campo de saber ou conhecimento. O psicólogo no hospital escuta o usuário, a família do usuário, os outros membros da equipe e a opinião médica, portanto, é viável que ocorra através da apropriação de um modelo da psicologia, enquanto uma área de saber científico, o exercício das relações de poder, que de acordo com Martins (2003) é vivenciado no âmbito mais amplo de trabalho nos hospitais. O poder pode ser produzido nas instâncias imediatas e cotidianas, como, por exemplo, na relação com a equipe de saúde. Entretanto, a inserção do psicólogo nos hospitais gerais pode, assim, também contradizer a ordem estabelecida de normatividade da medicina que vê a cura somente pelo aspecto orgânico, físico ou biológico. As vezes, os profissionais da saúde, conforme Guedes (2003), posicionam-se frente ao usuário de maneira indisponível. A escuta médica, às vezes, por exemplo pode estar unicamente interessada nos dados específicos da doença, portanto, a atitude de rejeição do médico perante a pessoa faz com que ela se remeta a outras relações insatisfatórias que foram estabelecidas em sua vida. O restabelecimento do enfermo pode, desta forma, ser prejudicado pela hostilidade, muitas vezes inconscientes, que perpassam as relações médico-paciente. As atitudes da equipe de saúde podem ser terapêuticas ou não, podendo produzir configurações maléficas ou benéficas no curso do adoecer (Guedes, 2003). No dia-a-dia do hospital os psicólogos muitas vezes ocupam o lugar de tradutores entre os médicos e os usuários, podendo tomar-se o entendimento de que as questões subjetivas são exclusivas do psicólogo e as orgânicas do médico. Entretanto, o ser humano 9 não é só somático ou psíquico, ou seja, a fragmentação do atendimento à saúde pode não contemplar a complexidade do ser humano, devido aos diferentes campos de saberes e poderes envolvidos no atendimento ao usuário. Contudo, a linguagem técnica da equipe de saúde pode não ser o único empecilho no atendimento. Qualquer orientação dos profissionais do campo da saúde pode, muitas vezes, ser incompreensível ou inadequada às condições de vida da pessoa. Por exemplo, uma pessoa que necessita de diversos medicamentos, em diversos horários e que não é alfabetizada necessitará de uma orientação diferente de uma pessoa alfabetizada. A própria cura precisa ser contextualizada, pois no momento em que o médico diz que a pessoa pode levar uma vida “ normal” , ele precisa conhecer o dia-a-dia dela. Um pedreiro, por exemplo, nem sempre poderá carregar peso imediatamente após sua alta. Assim, a equipe de saúde, pode, nem sempre se mostrar aberta, pelo menos, em um primeiro momento, ao trabalho do psicólogo: "As equipes aceitam muito bem o trabalho, solicitam bastante, agora a gente já tem um espaço aqui dentro, não precisa mais pedir "há tem uma criança?” . Devido a isso, pode-se pensar que, em algumas situações, o atendimento psicológico pode ser visto como algo desnecessário àqueles usuários que não apresentam comportamentos considerados não prioritários para o atendimento à saúde, ou ser considerado secundário por se tratar de uma demanda subjetiva. Porém, a inserção do trabalho do psicólogo no contexto hospitalar pode mudar a dinâmica de atividades de toda equipe de saúde, uma vez que a dinâmica das relações de poder entre os diferentes saberes do que é saúde passam a ser estabelecidas de outras formas, alterando o entendimento sobre atenção à saúde, tanto por parte da equipe médica, como por parte dos usuários. Isto, leva a uma maior preocupação por parte da equipe multidisciplinar, na clareza e eficácia da comunicação entre os profissionais da saúde e os usuários, buscando evitar discórdias e desentendimentos entre esses. Um exemplo do processo de comunicação entre os profissionais da equipe de saúde é o prontuário: "...cada um tem que falar o que observou para tentar fazer um manejo único com o paciente, evitando uma dupla mensagem. Eu constatei uma coisa, o médico outra. Isso mesmo em uma linguagem não verbal, vai causar muita confusão e dúvida". O discurso por parte das profissionais da saúde de psicologia sobre o prontuário é de que este é o processo comunicacional mais importante entre os profissionais das diferentes áreas disciplinares da saúde. Em alguns casos, posterior a esta forma de relação, através deste mecanismo de comunicação, podem ocorrer discussões sobre o manejo e o entendimento da demanda dos usuários sobre o tratamento e questões relacionadas a sua 10 internação. Entretanto, é possível pensar que a discussão dos casos dos usuários, que envolvem uma área disciplinar do profissional no desenvolvimento do trabalho, nem sempre está livre da necessidade de proteger o saber de sua área como superior. Isto mostra-se contrário a preocupação de alguns profissionais das equipes de saúde que se propõem em manter uma unidade de informações aos usuários, procurando transmitir uma imagem homogênea do entendimento que a equipe multidisciplinar possui sobre o seu estado de saúde. Do ponto de vista da psicologia, o trabalho das equipes multidisciplinares só se tornarão válidos e enriquecedores para os usuários, se cada profissional se responsabilizar por sua área de cuidados em relação à saúde: "...o dentista, o psicólogo, médico, nutricionista, [...], tem que haver esta troca. E a gente sempre tentou e eu acho que deu certo, é não ocupar o lugar do outro, respeitar o espaço do outro para que ele também respeite o teu. Se isso é trabalho do médico, entãonão explica, chama o médico que ele vai explicar [...] Então eu acho que este é o melhor sistema de trabalhar, é integrar, respeitando o outro e também sendo respeitado” . No entanto, responsabilizar-se por sua área de saber, segundo as profissionais da psicologia, não significa evitar a troca entre os diversos profissionais integrantes da equipe, mas sim manter a clareza nas informações sobre os usuários: "A troca é necessária para que haja uma melhora nos atendimentos, para que a saúde do ser humano possa ser contemplada no seu todo, ou em pelo menos, algumas partes dela". Considerações finais: o conceito de saúde e o trabalho da psicologia hospitalar Ao analisarmos os temas propostos neste artigo, sentimos emergir, dessas discussões o entendimento do conceito de saúde pelos profissionais dessa área. Ao inserir o trabalho da psicologia nas equipes multidisciplinares de saúde, propomos que a psicologia passe a pensar a saúde como um conceito complexo, que possa se situar em modelos que venham a promover formas de vida e de ser que englobem a dimensão do sujeito como cidadão na esfera pública e na esfera privada. Ao voltar a preocupação com o usuário para o autoconhecimento, para o indivíduo, corremos o risco de situar o trabalho da psicologia dentro de um enfoque individual, como as atividades dessa área no espaço privado. A psicologia deve diminuir essa dicotomização entre o público e o privado, a fim de entender e atender o sofrimento psíquico do ser humano como um todo, e não na sua individualidade, integrando tal entendimento ao atendimento e às preocupações da equipe multidisciplinar de saúde. (Guareschi, 2003) 11 Os sentidos que a palavra saúde pode adquirir são muitos, dentre eles, uma face normativa, prescritiva, que faz referência à uma espécie de conjunto de atributos para uma pessoa ser considerada saudável. Esse sentido de saúde, o trabalho da psicologia deve evitar. Pensamos que a psicologia nas suas práticas em hospitais, encarando a saúde como uma perspectiva que o conceito de saúde interpele, passa contemplar os direitos básicos do cidadão: o direito à moradia, ao trabalho, à segurança e à saúde, ou seja, o conceito de saúde do SUS. Desta forma, precisamos desnaturalizar a perspectiva medicalizada que frequentemente é utilizada pelos profissionais da saúde, como se essa só contemplasse ausência de doenças. A psicologia tem como desafio para articular a questão da saúde em suas práticas junto às equipes multidisciplinares de forma incisiva, perguntar-se, principalmente, que concepção de sujeito e de sociedade está como pano de fundo para as práticas psicológicas nos hospitais gerais. O trabalho da psicologia nas equipes multidisciplinares deve ser tomado como algo mais complexo, merecendo uma discussão também complexa que, no mínimo, consiga ser problematizadora de questões contemporâneas que envolvem essas práticas psicológicas sobre doença e saúde. Não há exercício profissional que dispense uma perspectiva de sujeito e de realidade. Em toda prática psicológica existe a necessidade dessa discussão, e ações que constituam o trabalho da psicologia. Assim, para o profissional da psicologia, não estão restritas somente as atividades concernentes à saúde mental; todo o trabalho que seja exercido no campo de trato da coletividade com a finalidade da promoção do bem-estar e da saúde e que seja possível o trabalho da psicologia serão de interesse, ou seja, o profissional da saúde também deve estar presente na formulação, organização e desenvolvimento das políticas públicas e sociais de saúde. BIBLIOGRAFIA CHIATONNE, Heloísa B. (1996). A criança e a morte. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira, FONGARO, Maria Lúcia. SEBASTIANI, Ricardo W. (1996). Roteiro de avaliação psicológica aplicada ao hospital geral. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira, GUARESCHI, Neuza. (2003). Interfaces entre psicologia e direitos humanos. In: GUERRA, A. , KIND, L., AFONSO, L., PRADO, M. (Orgs.). Psicologia social e direitos humanos. Belo Horizonte: Edições do campo social KLUBLER-ROSS, E. (1999). Sobre o morte e o morrer. Martins Fontes 12 LEÃO, Nilza. O paciente terminal e a equipe interdisciplinar. In: ROMANO, Belkiss W. (1998). A prática da psicologia nos hospitais. (2 ed.) São Paulo: Pioneira. MARTINS, Sueli. (2003, janeiro/junho.) Processo Grupal e a questão do poder em Martín-Baró. Psicologia & sociedade. Vol. 15 nº1 SANTOS, Cláudia T. SEBASTIANI, Ricardo W. (1996). Acompanhamento psicológico à pessoa portadora de doença crônica. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira ZAIDHAFT, S. (1990). Morte e formação médica. Rio de Janeiro: Francisco Alves. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516- 08582004000100004 UMA ABORDAGEM HERMENÊUTICA DA RELAÇÃO SAÚDE-DOENÇA ( Adaptado) Andrea Caprara Departamento de Saúde Pública, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Estadual do Ceará. INTRODUÇÃO Em muitos países ocidentais e da América Latina, apesar de um processo de crescimento econômico, estamos assistindo a situações em que as desigualdades sociais e em saúde persistem, até aumentam, mostrando uma real incapacidade da sociedade ocidental em eliminar a pobreza. A crise do modelo econômico ocidental foi, nos anos 70 e 80, objeto de análise de diferentes estudos: para Ricoeur (1994), por exemplo, a crise é uma condição permanente e estrutural de nossa sociedade que se reflete nos estudos humanísticos, na filosofia, na história, nas ciências sociais, na antropologia. Na saúde pública, desde a metade do século XX, diferentes autores como McKeown (1979), demostraram que, se a pobreza não é causa direta da doença é o principal determinante. Esta abordagem que mostra que as condições de saúde estão ligadas a fatores macroeconômicos e sociais não é ideia do século XX. Rudolph Virchow, na metade do século XIX, afirmava a necessidade de lutar contra as desigualdades sociais, origem principal das doenças, assim como Villermé na França demonstrava em 1820- 1830 as diferenças das taxas de mortalidade entre as classes ricas e pobres (Virchow, 1985). A influência dos fatores macrossociais e do contexto político-econômico sobre as condições de saúde da população e da própria prática médica, foi objeto nos anos 60-70, 13 das abordagens marxistas da medicina social (Navarro, 1983). Nos mesmos anos e com uma perspectiva similar desenvolveram-se a epidemiologia crítica, chamada também epidemiologia social (Breilh & Granda, 1989), os estudos sobre o impacto da estrutura de classe na organização dos serviços de saúde (Laurell, 1989), a antropologia médica crítica (Frankenberg, 1988). Essas perspectivas críticas da ideologia médica, tiveram a influência dos pensadores marxistas, assim como de autores como Foucault (1977), e da própria Escola de Frankfurt (Benjamin et al., 1983), colocando uma atenção particular a conceitos relativos ao poder, à hegemonia, à resistência, à prática da medicina moderna e ao desenvolvimento de tecnologias. Sem negar a importância desta abordagem, a saúde nas ciências sociais e na antropologia em particular, não é vista somente como consequência de fatores sociais e econômicos. Uma tradição importante interpreta a doença como um produto culturalmente determinado. Nesta perspectiva, a cultura, entendida como conjunto de ideias, conceitos regras, comportamentos compartilhados em um determinado grupo cultural, organiza a experiência da doença e do comportamento de maneira diversa nas diferentes sociedades (Bibeau, 1981; Good, 1994; Kleinman, 1988). A cultura produz estruturas simbólicas, metáforas e outras figuras ligadas à doença. Assim como colocado por Birman (1991), em todasas sociedades o real é transformado em uma rede simbólica de significados, base fundamental de todo processo experiencial. Tal abordagem interpretativa procura entender o significado dos comportamentos, das ações dos indivíduos influenciados por autores pertencentes à tradição hermenêutica como Gadamer (1997) e Paul Ricoeur (1994). A experiência do indivíduo coloca-se no primeiro plano da produção dos discursos científicos, dentro de uma perspectiva que procura o significado das ações na relação entre interpretante e interpretado, tentando superar a distinção entre sujeito e objeto na pesquisa científica (Geanellos, 2000). Este trabalho pretende contribuir para a discussão presente sobre a relação entre a saúde e a doença (Almeida Filho, 2001), abordando a problemática por meio da perspectiva hermenêutica. Com essa finalidade, propõe-se explorar o conceito de saúde segundo três sucessivos desdobramentos: (1) na primeira parte, retomando a discussão que foi se desenvolvendo dentro das linhas filosóficas hermenêutica, fenomenológica e existencial, será analisada a obra de dois filósofos, Kierkegaard e Heidegger, que influenciaram profundamente a hermenêutica contemporânea. No campo da saúde, a obra destes autores é importante pela diferente forma de abordar os problemas em comparação com a perspectiva biomédica. Por exemplo será apresentado o conceito de angústia que, 14 ao contrário da abordagem biomédica, para Kierkegaard (1952, 1991), é um componente constitutivo dos seres humanos: para este autor, assim como sucessivamente para Heidegger (1976), a ansiedade não é um sintoma patológico mas um estado que permite um acesso privilegiado de autoconhecimento. Na perspectiva hermenêutica contemporânea, o estado de ansiedade revela a procura de um novo significado de vida; trata-se de um problema existencial, não somente de um problema biológico ou comportamental, e permite abordar a relação saúde-doença por meio de um novo olhar. Nesse sentido, acreditamos que o conceito de ansiedade, angst, merece hoje um renovado interesse, seja de um ponto de vista médico ou filosófico. Acaba-se colocando, na interseção entre saúde e doença, nos limites das definições, constituindo um espaço de reflexão filosófica com importantes implicações no campo da prática médica. (2) Na segunda parte, tentaremos abordar como, na hermenêutica, e principalmente na obra de Gadamer, foram sendo desenvolvidos os conceitos de saúde, doença, sofrimento; o trabalho de Gadamer, filósofo alemão, considerado hoje pai da hermenêutica contemporânea, foi influenciado por Kierkegaard e por Heidegger (Schleibel, 2000). A saúde, segundo Gadamer (1994), fica escondida por boa parte do tempo, revelando-se através do bem-estar. Nesse estado, esquecemos de nós e somente nos momentos de cansaço, de esforço, de fadiga, lembramos de novo do nosso estado. Nesse sentido, para Gadamer (1994), a saúde coincide com o ser no mundo, com a satisfação de ter uma vida ativa. A perspectiva hermenêutica permite uma nova construção de modelos de saúde- doença, que recuperam a dimensão experiencial, assim como aquela psicossocial. (3) Na terceira e última parte, apresentaremos as implicações da teoria interpretativa na formação e prática clínica, mostrando a aplicabilidade do pensamento de Heidegger e Gadamer no trabalho de médicos e enfermeiros (Dreyfus & Zimmerman, 1991; Svenaeus, 1999; Wiklund et al., 2002). A abordagem hermenêutica da medicina nos permite explorar a experiência humana da doença, entender como os pacientes lidam com suas experiências específicas frente aos médicos, em relação à saúde, à doença e ao sofrimento (Robertson- Malt, 1999). Os pacientes, tradicionais "objetos" da prática médica, são na verdade indivíduos que vivem, refletem e que, juntos com o médico, transformam o encontro clínico (Evans & Sweeney, 1999). Nos últimos anos foi se desenvolvendo uma grande área de reflexão e pensamento denominada "humanidades médicas", que pretende explorar como a experiência humana lida com outras experiências de pacientes, médicos, saúde, doença e sofrimento. Na formação em medicina, a abordagem das humanidades médicas prevê a incorporação de elementos das ciências humanas (filosofia, psicologia, 15 antropologia, literatura) nos cursos de graduação e de especialização. Nesta concepção integrada das humanidades médicas, a medicina é entendida como forma de auto- exploração, reconhecendo que os componentes material e experiencial são fundidos entre eles (Evans & Sweeney, 1999). As humanidades médicas pretendem não somente melhorar a relação médico-paciente, as capacidades comunicacionais dos médicos, mas também aprofundar a narrativa do paciente e procurar novas formas de promoção do bem- estar, reduzindo o impacto da doença e do sofrimento (More, 1976; Widdershoven, 1999). Enfim, temos de considerar a utilização da abordagem hermenêutica na pesquisa qualitativa na área da saúde. Apesar da presença de numerosos métodos existentes, as premissas filosóficas comuns de Ricoeur e Gadamer constituem a base de diferentes abordagens na análise das narrativas (Geanellos, 2000; Robertson-Malt, 1999; Todres & Wheeler, 2001). A TERCEIRA MARGEM DA SAÚDE: A ANGÚSTIA EM KIERKEGAARD E HEIDEGGER O termo hermenêutica na filosofia grega expressa a arte de interpretar. Com o passar do tempo adquiriu um significado mais amplo, indicando, no âmbito filosófico, diversas formas de teoria da interpretação, entre as quais o existencialismo, a fenomenologia e a própria hermenêutica, que constituem diversas formas de expressão da filosofia continental. Os filósofos que pertencem a esta linha de pensamento se ocupam da existência humana, não do ponto de vista da observação, mas da reflexão filosófica. Nessa perspectiva, o homem é considerado não somente enquanto organismo biológico, mas algo mais, assim como a medicina é considerada algo mais do que a ciência natural. Para esclarecer melhor a abordagem hermenêutica em relação à saúde e à doença, começaremos com um exemplo que se refere ao conceito de angústia (angst), tal como desenvolvido por Kierkegaard (1813-1855) e Heidegger (1889-1976). Para estes autores, a angústia deve ser considerada como elemento constitutivo dos seres humanos; em particular, para Kierkegaard (1952), a angústia constitui um estado fundamental da existência humana. Os seres humanos que não conhecem a melancolia têm um espírito que não conhece a metamorfose (Kierkegaard, 1952, 1972). Ao mesmo tempo, para Heidegger, a ansiedade não é um sintoma patológico, mas um estado que permite um acesso privilegiado de autoconhecimento (Heidegger, 1976). Um caso clínico, citado por Wulff et al. (1995:152), ilustra com clareza este tema: "Uma mulher de 45 anos, aproximadamente, procura um especialista por problemas 16 nervosos. Trata-se de uma dona de casa, divorciada, que não consegue dar finalidade à sua própria existência. Os filhos são adultos, deixaram a casa, ela perdeu os amigos e não consegue sair de casa sozinha. Na maior parte do tempo encontra-se em um estado de ansiedade permanente. O psiquiatra escuta a história e em função de sua concepção de doença mental, caso ele siga a perspectiva biologista, poderá seguir uma terapia comportamental ou prescrever um ansiolítico". Para a perspectiva hermenêutica, ao contrário da abordagem biomédica, o estado de ansiedade da paciente revela a procura de um novo significado de vida; trata-se de um problema existencial, não somente de um problema biológico ou comportamental. Para os filósofos existencialistas, fenomenológicos e hermenêuticos o interesse se dirige aos problemas existenciais, interpretando as ações humanas. Colocaremos a questão principalmente em referência às angústias persistentes e que estimulam a procurar uma nova finalidade da existência. As concepções de Kierkegaard sobre o homem são constitutivaspara o desenvolvimento das ideias de filósofos existencialistas como Heidegger e Jean Paul Sartre. Heidegger (1977), afirma na obra Sein und Zeit, que Kierkegaard foi muito importante no desenvolvimento do conceito de angústia, angst Para Kierkegaard (1991), a angústia é um componente constitutivo dos seres humanos; quem não conhece a angústia não é um ser humano. Como afirma o mesmo Heidegger (1976), Kierkegaard aborda o conceito de uma perspectiva cristã enquanto que Heidegger faz isso desde uma perspectiva secular (Dreyfus, 1991). Para Heidegger a angústia serve como um transtorno que revela a natureza do Dasein, que poderíamos traduzir como: "existência humana cotidiana", de ser no mundo (Dreyfus, 1991). Somente por meio de uma processo de reflexão filosófica é possível, para os filósofos da tradição hermenêutica, aprofundar nossos conhecimentos sobre as características constitutivas dos seres humanos. Também os estudos empíricos sobre os seres humanos permitem descrever o funcionamento e as ações humanas, mas estes dados têm de ser interpretados sucessivamente por meio da abordagem hermenêutica. No livro A Doença Mortal, Kierkegaard (1952) enfatiza como os seres humanos se relacionam com si mesmos e se percebem como seres que atuam livremente. Nesse sentido, os seres humanos podem ser considerados como uma conjunção entre dimensão biológica e psicossocial, em um processo de autoreflexão, de liberdade. Por isso, para Kierkegaard a angústia é a realidade da liberdade (Dreyfus, 1991). Nessa concepção, a angústia humana constitui um estado fundamental vinculado estritamente à capacidade de autoreflexão, de atuar livremente, identificando as possibilidades da liberdade (Dreyfus, 1991). Esta 17 dimensão deve ser separada da esfera mental em que se manifestam os sentimentos como o medo, que são reações comuns e presentes também nos seres animais. Heidegger (1976), em Ser e Tempo, aborda o problema da angústia, concordando com Kierkegaard de que se trata de um estado fundamental, mas afirma também que está vinculada à nossa compreensão e interpretação do universo. Para Heidegger a compreensão não é um fenômeno psicológico, mas um estado constitutivo dos seres humanos como a angústia. O homem, para Heidegger, continuamente procura compreender/interpretar o significado de mundo. Quem não se coloca no mundo como ser interpretante perde a própria subjetividade (Wulff et al., 1995). A angústia nos indica que os significados do mundo mudaram e que os contatos com os outros seres humanos perderam seu próprio significado (Wulff et al., 1995). É neste sentido que para Heidegger a angústia permite o acesso à autoreflexão. Para a perspectiva hermenêutica, as pessoas que vivem um estado de ansiedade não somente têm de ser diagnosticadas de um ponto de vista clínico, mas é necessário que comecem um processo de reflexão sobre sua própria existência. Essa pessoa é livre para escolher, mesmo se decide não enfrentar esses problemas e utilizar somente ansiolíticos, mas nesse caso dificilmente poderá dar uma solução a seus problemas existenciais. Uma abordagem biomédica permite controlar a depressão, ou a ansiedade, ou a angústia por meio da utilização de psicofármacos eliminando ou reduzindo a sintomatologia, mas a perspectiva hermenêutica coloca-se de forma crítica frente a este modo de abordar os problemas. A utilização dos psicofármacos é aceita somente naquelas formas, tais como as psicoses maníaco-depressivas ou a esquizofrenia, em que a utilização de medicamentos é indiscutivelmente necessária. Para os empiristas as conclusões da abordagem hermenêutica não podem ser demonstradas cientificamente, e não sendo consideradas nem verdadeiras nem falsas, são simplesmente sem sentido. Por outro lado, os hermeneutas afirmam que os empiristas colocam mal a questão porque também os resultados científicos têm de ser interpretados e que a maneira com a qual se aborda um problema tem uma influência sobre o método que será escolhido. É impossível utilizar sempre o mesmo método científico em diferentes áreas. Segundo Wulff et al. (1995:162-163): "a análise hermenêutica é um processo inicial indispensável porque não tem sentido um estudo empírico das propriedades de uma pessoa sem se ter analisado o conceito de pessoa. Por esta razão, a ciência natural é subordinada à reflexão hermenêutica". 18 OS CONCEITOS DE SAÚDE E DOENÇA NA OBRA DE GADAMER E SUAS INFLUÊNCIAS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS EM SAÚDE Estudos recentes mostram que não existe consenso entre os diferentes campos de saber sobre o conceito de saúde, doença, "normal" e patológico (Almeida Filho, 2001; Czeresnia, 1999). A incapacidade da epidemiologia, por exemplo, de tratar a categoria saúde, seria, segundo Almeida Filho (2001), indicador desta crise. Uma reflexão teórica importante sobre os conceitos de saúde e doença, e que gostaríamos de resgatar neste trabalho, tem sido desenvolvida dentro das linhas filosóficas da hermenêutica, do existencialismo e da fenomenologia. Em particular, Gadamer (1994), na coletânea de ensaios Uber die Verborgenheit der Gesundheit(na tradução em italiano: Dove si Nasconde la Salute), indica que, enquanto a doença chama nossa atenção pela sua presença, a saúde não desperta nosso interesse, ficando escondida. Nessa situação, para o grande pensador alemão, a ciência médica teria de ser reposta como ciência da doença, porque é o estado de doença que, aparecendo, produz um sentimento de perigo e estimula uma resposta terapêutica. A prática médica, nesse sentido, tentando modificar o percurso da natureza, dominando suas manifestações patológicas, ao mesmo tempo deixa de lado um interesse sobre a concepção de saúde e, em parte, a prevenção das doenças (Gadamer, 1994). A medicina tentou estabelecer normas, valores que teriam de ser utilizados de forma universal, parâmetros que constituem uma convenção por meio da qual procura-se aproximar a realidade. A medicina ocidental é considerada como área pertencente às ciências naturais e, nesse sentido, os seres humanos são analisados de um ponto de vista biológico; para a perspectiva hermenêutica (arte da interpretação), ao contrário, os indivíduos, além de seres biológicos, têm de ser considerados como sujeitos que refletem e vivenciam uma experiência subjetiva da doença. Para abordar esta questão, Gadamer (1994) coloca o problema de como um indivíduo tem de se orientar na vida em relação à saúde e à doença. Este autor coloca a diferença entre ciência médica e arte da cura, que corresponde à relação entre conhecimento e sua aplicabilidade. Por exemplo, para cada caso de patologia, como a esclerose múltipla, existem conhecimentos científicos baseados na evidência que sugerem esquemas de tratamento e de conduta; mas cada paciente é único e o médico tem de levar em conta isso, porque cada paciente vive a doença de forma diferente. Nesse sentido, a medicina baseada em evidências não é suficiente. Para Gadamer (1994), a diferença entre conhecimentos gerais e sua aplicabilidade é objeto de discussão e de estudo na hermenêutica. Os conhecimentos são adquiridos por meio do 19 estudo, enquanto que sua aplicabilidade pode ser adquirida somente por intermédio de um longo processo experiencial. Na concepção gadameriana, a saúde tem de ser entendida como equilíbrio; esta visão se aproxima da saúde entendida pelos utilizadores das diferentes formas de medicinas alternativas, medicinas das quais Gadamer mesmo é grande utilizador e seguidor. Ele valoriza conceitos típicos dessas formas de medicina como equilíbrio, harmonia, diálogo, globalidade. Ter cuidado com a própria saúde significa evitar os excessos, prevenindo o uso de medicamentos ou de exames de laboratório desnecessários. Para Gadamer, a saúde constitui o ritmo da vida, o processo pelo qual se produz o equilíbrio da respiração, do sono, do estaracordado etc. Nessa visão, Gadamer afirma que nós somos natureza e a natureza que está em nós ajuda a conservar esse equilíbrio. A saúde para Gadamer não pode ser mensurada porque está ligada ao estado de ser de cada indivíduo; é por isso que tem sentido perguntar às pessoas se elas se sentem doentes (Gadamer, 1994). Procurando estabelecer uma comunicação entre medicina e filosofia ocidental, Gadamer (1994) afirma que a arte da cura tem aspectos que vão além da dimensão biológica, característica da abordagem médica, aspectos que não podem ser reduzidos à posição da ciência médica. Nessa abordagem ele não critica a medicina científica, mas tenta uma aprofundada análise dos conceitos chave que fundamentam o discurso médico: doença, cura, morte, relação médico-paciente. Ele propõe uma nova medicina "humanista" que utiliza os instrumentos técnicos e diagnósticos mas que ao mesmo tempo analisa o ser humano na sua totalidade, o seu ser no mundo. Estas ideias influenciaram a dimensão socioantropológica, principalmente em autores como Clifford Geertz (1983), Arthur Kleinman (1988) e Byron Good (1994), nos Estados Unidos; Gilles Bibeau (1992) e Ellen Corin (1992), no Canadá e diferentes autores da antropologia médica européia: lembramos por exemplo Angel Martínez- Hernáez (1998), na Espanha e Mariella Pandolfi, na Itália (1990). TEORIA INTERPRETATIVA E TEORIA CRÍTICA NO CAMPO DA SAÚDE: RUMO PARA UMA NOVA ABORDAGEM TEÓRICA? Para os autores críticos, as culturas não são somente sistemas de significados, mas ideologias que mascaram iniquidades políticas e econômicas. Para Mishler (1984), por exemplo, que aplica a Teoria da Ação Comunicativa de Habermas (Habermas, 1984), no estudo da relação médico-paciente, a abordagem médica fragmenta e dificulta a expressão 20 da voz dos pacientes (Barry et al., 2001). As influências da Escola de Frankfurt e de Jurgen Habermas são evidentes e refletem discussões similares desenvolvidas no campo filosófico (Habermas, 1976). Habermas afirma que as descrições do processo hermenêutico de Gadamer não oferecem garantias suficientes e que há uma compreensão distorcida devido às pré-compreensões falsas. A sociedade está caracterizada por estruturas de poder, interesses que influenciam a compreensão de nós mesmos e dos outros. A consciência histórica não é suficiente para prevenir distorções ideológicas. A ideologia é vista como uma teoria a serviço de interesses de grupos particulares, que contribui na consolidação dos equilíbrios existentes. As ideologias fornecem, portanto, uma visão distorcida da realidade (Habermas, 1976). Como afirma Corin (1995), poucos são os estudos no campo da saúde que hoje tentam combinar a perspectiva interpretativa, influenciada pela tradição hermenêutica, com a teoria crítica e, apesar das diferenças existentes, elas têm uma série de elementos em comum: ambas analisam a cultura como uma realidade "pervading", uma dimensão dinâmica, que não pode ser expressada como simples variável a ser estudada com variáveis estatísticas. O segundo elemento em comum entre essas perspectivas é a abordagem transcultural; segundo Corin as perspectivas transculturais são as únicas que nos permitem descobrir a relatividade de nossos conceitos e teorias, e ajudam a "ampliar" nosso conceito de realidade (Corin, 1995). Gilles Bibeau (1992), no seu ensaio Entre Sens et Sens Commun, nos convida a refletir, como ponto de partida, sobre os elementos metafóricos e empíricos do pensamento humano. Este autor enfatiza que é necessário articular o saber e o significado: "A procura do significado e a atribuição do sentido constituem o percurso fundamental que carateriza as culturas humanas, percurso que inscreve o sentido até o centro das classificações e do estabelecimento da ordem empírica do mundo operada pelo senso comum" (Bibeau, 1992:89). Com a referência de três autores, Bourdieu (1980), Geertz (1983) e Tambiah (1985), que analisaram o papel da prática cotidiana nos processos de conhecimento, Bibeau (1992) enfatiza o papel chave que a experiência comum tem na construção dos saberes: o sentido comum apresenta um caráter prático e coincide largamente com o que poderíamos chamar de sabedoria popular. Para Geertz (1983), é a análise das ações cotidianas que vai permitir definir os códigos que estruturam o pensamento e conferem um significado ao mundo: para Geertz, as ações cotidianas formam aqui o que ele define como o senso comum que permite uma leitura direta da realidade. 21 Com base nessas considerações, Corin et al. (1993) desenvolveram um modelo semântico-pragmático que objetiva conjugar as perspectivas hermenêutica e crítica (Bibeau, 1994). Esta abordagem tenta analisar a problemática por meio de três níveis de análise: (a) um estudo do saber, focalizando a atenção sobre os discursos, as narrativas dos membros da comunidade este primeiro nível procura identificar a semiologia, os signos, os sinais, os indicadores com base nos quais os diferentes aspectos de saúde e doença são percebidos na comunidade; (b) uma análise do sistema de interpretação; (c) um terceiro nível de análise, chamado sistema de ação, visa a entender as respostas, as reações para procurar respostas aos problemas. Mas para superar os perigos de uma análise do sujeito, da microrealidade, é necessário, segundo Bibeau (1994), considerar também os fatores macrossociais, situando-nos em uma dimensão do coletivo; a reconstrução de casos individuais terá de ser complementada por uma análise do espaço social, em uma análise da interação entre histórias e casos individuais e processos coletivos. Bibeau sugere nesse sentido uma abordagem em dois níveis: (a) uma primeira análise das "condições estruturantes" que se referem ao desenvolvimento econômico, político e social e das condições cotidianas de vida; (b) uma segunda que explora as experiências organizadoras coletivas, os elementos sociosimbólicos de um grupo, seu próprio sistema de valores. Este processo tem como objetivo identificar os fatores negativos que fragilizam um grupo, assim como os fatores protetores: precisa identificar as estratégias coletivas de proteção, paralelamente a uma análise dos fatores de risco e de fragilização. Uma perspectiva teórica similar, que tenta combinar as duas perspectivas, foi desenvolvida por Good (1994), no seu livro Medicine Rationality and Experience. Good enfrenta uma série de problemas cruciais de antropologia médica por meio de uma abordagem interpretativa que, como ele mesmo afirma: "mantém uma conversa aberta com a teoria crítica" (Good, 1994:63). AS IMPLICAÇÕES DA TEORIA INTERPRETATIVA NA FORMAÇÃO E PRÁTICA CLÍNICA Esta perspectiva nos convida a repensar não somente a prática médica mas também a formação em medicina, quase sempre ancorada a uma visão biomédica e tecnicista da doença; cada encontro com o paciente tem uma dimensão técnica mas também experiencial e ética. A hermenêutica abre novos caminhos na formação e na prática médica, modificando seus objetivos e suas finalidades, colocando a necessidade 22 de uma nova compreensão da dimensão experiencial e do sofrimento do paciente. Este segundo caminho incorpora a dimensão subjetiva do paciente, assim como a dimensão social, elementos importantes em diferentes aspectos da prática clínica como no encontro médico-paciente (Skultans, 1998). Como apresentamos em um artigo publicado: "Gadamer conduz a reflexão sobre a humanização da medicina, em particular da relação do médico com o paciente, para o reconhecimento da necessidade de uma maior sensibilidade diante do sofrimento do paciente. Esta proposta, em relação a qual várias outras convergem, aspira pelo nascimento de uma nova imagem profissional, responsável pela efetiva promoção da saúde, ao considerar o paciente em sua integridade física, psíquica e social, e não somente de um ponto devista biológico" (Caprara & Franco, 1999:648). Um primeiro aspecto se refere à ética da profissão, à atitude de respeito frente aos colegas e aos pacientes, às qualidades morais que o médico precisa ter. Segundo Dawnie et al. (2000), essas qualidades podem ser aprendidas em um processo de formação por meio de quatro formas diferentes: (1) A leitura e discussão de textos de filosofia moral; (2) A discussão de casos que introduzem na discussão aspectos éticos; (3) A utilização de um diário de campo, por parte dos médicos, para registrar casos "particulares" que enfrentam na atividade de consultório; (4) A utilização da arte, principalmente da literatura e de peças teatrais. As obras literárias permitem abordar aspectos da vida humana, como o fato de saber lidar com as emoções, que são elementos constitutivos importantes especialmente na relação médico-paciente. Como afirma Scliar (1996), a relação médico-paciente é inevitavelmente colorida pela emoção, pela angústia muitas vezes. Mas o problema está ligado ao fato de que o texto médico se expressa por meio de uma linguagem simples, neutra, que pretende evitar as emoções. As frases dos artigos científicos são constituídas por sujeitos impessoais, sem incredulidade, sem dor, sem paixão. É por isso que a ansiedade médica frente ao sofrimento, à morte, à doença, procura o texto literário, a ficção, a poesia como formas de expressão. A comunicação médico-paciente pode ser aprendida como técnica, mas certamente a obra literária permite construir um contexto ético no qual a relação vai se desenvolvendo. O médico tem de entender o paciente de um ponto de vista científico, utilizando os instrumentos e os conhecimentos da literatura de maneira que ele possa tomar as melhores decisões no processo diagnóstico e terapêutico. Estas ações, tomadas valendo-se da medicina baseada nas evidências, são necessárias mas não suficientes. O médico tem de adequar sua intervenção clínica considerando o paciente 23 enquanto sujeito, tomando em conta a experiência da doença, as percepções do paciente, adquirindo uma sensibilidade e uma capacidade de escuta que vão além da dimensão biológica. Estes aspectos podem ser desenvolvidos somente por intermédio de um processo de formação mais abrangente, que incorpore elementos das ciências humanas no desenvolvimento educacional (Simpson et al., 1991). Nas doenças crônicas (nas quais a biomedicina oferece somente respostas parciais), a medicina clínica pode responder melhor aos pacientes, incorporando no tratamento uma análise da experiência do sujeito. Isso poderia ajudar a evitar prescrições inadequadas e excessivas de medicamentos. Uma visão restrita dos fatores causais, focalizada exclusivamente nos aspectos biológicos, é inadequada para compreender o papel dos fatores psicossociais na etiologia e como estes se integram às causas físicas. Uma compreensão mais integrada pode produzir benefícios na parte diagnóstica também. Mesmos se estes benefícios são plausíveis, têm de ser demostrados e neste campo ainda muito tem de ser feito. As evidências também têm de ser adequadas a uma nova e mais rica concepção de que tipo de evidências são pertinentes na avaliação clínica. Trata-se de um campo que precisa de investigações e elaborações conceituais e empíricas. A medicina tem de saber lidar com personalidades, com expectativas, medos, ansiedades além da dimensão biológica do funcionamento do corpo humano. 24 Referências ALMEIDA FILHO, N., 2001. For a general theory of health: Preliminary epistemological and anthropological notes. Cadernos de Saúde Pública, 17: 753-799. BARRY, C. A.; STEVENSON, F.; BRITTEN, N.; BARBER, N. & BRADLEY, C., 2001. Giving voice to the lifeworld. More humane, more effective medical care? A qualitative study of doctor-patient communication in general practice. Social Science and Medicine, 4:487-505. 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