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24 Aspectos práticos da avaliação psicológica nas organizações Daniela Forgiarini Pereira 1 Contextualização do capítulo A utilização da avaliação psicológica – primeiro método de trabalho do “psicólogo industrial” – difundiu-se efetivamente a partir dos resultados da testagem de grandes grupos na primeira e na segunda grandes guerras mundiais (Cruz, 2002). Desde então, a Psicologia Organizacional e do Trabalho (PO&T) tem se dedicado a estudar eventos comportamentais, ambientais e organizacionais através de instrumentos e procedimentos necessários à compreensão dos fenômenos ou processos psicológicos relacionados ao trabalho. As primeiras ideias que marcaram a relação “psicologia e trabalho” são oriundas de estudos dos discípulos de Wundt, fundador do primeiro laboratório de Psicologia Experimental, em 1879. De acordo com Cruz (2002), Wundt foi um dos grandes estudiosos dos problemas humanos no trabalho, influenciando efetivamente seus alunos, entre os quais destacam-se Muensterberg, Cattell e Galton. Hugo Muensterberg destacou- se por impulsionar a realidade da Psicologia de Laboratório para a Psicologia Industrial, criando uma disciplina que pode ser identificada como organizadora dos fundamentos básicos da Psicotécnica, principal método de trabalho da Psicologia Industrial. Outra grande influência no desenvolvimento da área, especialmente em relação à seleção de pessoas, segundo Paulon (1990), foi o estudo das diferenças individuais realizado por Cattell, Galton e Binet. Vale salientar a importância de tais estudos, pois, segundo a autora, os mesmos justificaram a opinião de que não é possível submeter seres humanos diferentes a sistemas de trabalho idênticos, ou seja, deviam-se selecionar as oportunidades de acordo com as aptidões individuais. Paralelamente, no âmbito das organizações, o princípio do século XX foi dominado pelas visões analítica, empiricista e mecanicista de Taylor, posteriormente intensificada pelo fordismo. Conforme Tractenberg (1999), a organização era encarada como um sistema fechado com tarefas segmentadas, uniformizadas e otimizadas ao máximo, além de apresentar planejamento e controle rígidos. Daí a necessidade de os trabalhadores serem “cientificamente” selecionados e treinados para conseguirem alcançar suas potencialidades máximas. Nesta linha, para Malvezzi (1994), os instrumentos criados pela Psicometria permitiram a aferição científica das condições apresentadas pelo trabalhador. Tudo poderia ser quantificado de uma maneira simplificadora, desde o perfil de traços até os resultados da aprendizagem, buscando materializar o controle conforme as diferentes teorias da inteligência e de habilidades específicas, como as de Spearman, Thorndike e Thurstone. Posteriormente, nas décadas de 1960 e 1970, a incorporação da Teoria dos Sistemas representou um grande avanço ao paradigma simplificador, o qual foi ampliado a partir dos anos de 1980 e 1990, trazendo novas formas de entendimentos à área de Recursos Humanos. Tractenberg (1999) evidencia que os novos paradigmas trazem consigo uma atuação ampliada da Psicologia em todos os níveis da organização, além de uma visão pluralista e multidisciplinar. Bastos e Gondim (2010) corroboram a ideia da crescente ampliação das funções da Psicologia Organizacional vinculada com a evolução histórica, enfatizando o seu caráter interdisciplinar e articulado com os estudos econômicos, organizacionais e sociológicos. Todas essas mudanças, somadas ao ambiente externo altamente competitivo, demandam agilidade e geração de novas tecnologias nos processos de Recursos Humanos. Na utilização de testes psicológicos para selecionar candidatos, por exemplo, Capelli (2003) aponta a ampliação gradual da utilização de tais instrumentos, relacionando-os com a cada vez mais evidente eficácia dos processos. Tal autor pontua que, numa pesquisa, realizada em 1998, pela American Management Association, 45% das 1.085 empresas- membro declararam utilizar um ou mais testes com candidatos a empregos, contra 35% do ano anterior. Apesar da vasta utilização da testagem psicológica na Avaliação Psicológica nas Organizações (APO), existe grande concordância entre os teóricos de que a eficácia do uso de testes nesta área, assim como em qualquer outro campo, está relacionada à utilização de forma contextualizada dos instrumentos (Capelli, 2003; Chiavenatto, 2000; Corradi, 2000; Milkovich & Boudreau, 2000; Pereira & Bandeira, 2009). Assim, é necessária uma análise minuciosa da tarefa, das responsabilidades, das condições de trabalho, das relações sociais e da cultura organizacional, além de profundo domínio, por parte do psicólogo, da variedade de testes que existem na área. De acordo com Bastos e Gondim (2010), uma recente edição da pesquisa nacional do psicólogo brasileiro identificou que o campo de atuação da PO&T é ocupado por aproximadamente 1/4 dos profissionais de psicologia. Somado a este aspecto, estudos demonstram que esta área é a terceira da psicologia que mais utiliza testes psicológicos em sua prática profissional (Pereira & Bandeira, 2009). Tais estatísticas sugerem amplos estudos que embasem estas práticas. Entretanto, a comunidade científica de PO&T possui proporções reduzidas, o que acentua a distância entre o volume de questões implicadas na prática profissional do psicólogo organizacional e do trabalho e a produção de conhecimento científico que lhe dê suporte (Gondim, Borges-Andrade & Bastos, 2010), aspecto também justificado pelo pequeno número de mestrados e doutorados no Brasil com este foco (Borges-Andrade & Zanelli, 2004). Sabe-se que a avaliação psicológica tem o compromisso de ser uma ferramenta facilitadora nos processos decisórios nas organizações (Pereira & Bandeira, 2009). Neste cenário, as demandas organizacionais apresentadas aos psicólogos diferem de acordo com o contexto, mas geralmente abrangem processos como os de recrutamento e seleção (R&S), análise de potencial e promoções, avaliação de desempenho (AD) e treinamento e desenvolvimento (T&D). Recentemente, outros cenários organizacionais têm-se mostrado como oportunidades para psicólogos que escolham por atuar com competência, seriedade e ética: a) as avaliações psicossociais (espaço confinado – p. ex., Guia Técnico da Norma Regulamentadora [NR] 33, Ministério do Trabalho e Emprego [MTE], 2013) e b) as avaliações psicológicas em psicologia aplicada à aviação. De acordo com a resolução da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC – www.anac.gov.br), nos atestados psicológicos é necessário conter resultados de avaliação de personalidade, atenção, memória e raciocínio. As demandas de avaliações psicológicas para porte de arma e trânsito também requerem formações específicas e são conhecimentos interessantes para o âmbito da PO&T. Redigir um capítulo que consiga abarcar toda a complexidade da Avaliação Psicológica nas Organizações (APO) é uma tarefa desafiadora e, por si mesma, inconclusa. Com isso, a opção não foi aprofundar os paradigmas metodológicos, os conceitos de avaliação psicológica aplicada às organizações, ou mesmo as implicações éticas da atuação na área, temas bastante debatidos em oportunidades recentes (Pereira & Bandeira, 2009) e também nos capítulos anteriores deste livro. A partir da experiência de mais de quinze anos da autora deste capítulo, ministrando aulas focadas em APO em cursos de graduações e pós- graduações, algumas dúvidas de estudantes de psicologia e psicólogos têm sido particularmente frequentes. Consequentemente, este capítulo está dedicado ao debate e à reflexão de alguns destes constantes questionamentos. 2 Questionamentos frequentes relacionados à Avaliação Psicológica nas Organizações (APO) Optar por escrever um capítulo com questões paradoxais exige humildade e renúncia. Sabe-se que muitos destes questionamentos são controversos e não possuem respostas certas ou erradas, sendo que o objetivo não é fechar o debate do assunto, mas ampliar a reflexão. Com isso, o intuito deste texto é compartilhar com o leitor o que a prática do ensinoe da realização de avaliações psicológicas em contextos organizacionais, aliada à experiência acadêmica de mestrado e doutorado, têm sugerido para a autora. Para tanto, foi utilizada a técnica didática de perguntas e respostas para facilitar o entendimento do leitor. 2.1 O mais frequente questionamento: Quais são os testes que constam na lista do Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) que podem ser utilizados em APO? A primeira lista do Sistema de Avaliação dos Testes Psicológicos (SATEPSI), do Conselho Federal de Psicologia (CFP), foi disponibilizada em 2003. O SATEPSI consiste em uma norma de certificação de instrumentos de avaliação psicológica que avalia e qualifica os instrumentos em aptos ou inaptos para uso profissional com a meta de elevar a qualidade dos testes psicológicos (Primi, 2010). A lista do SATEPSI não tem como objetivo indicar o contexto de utilização dos testes psicológicos. Com isso, cabe ao psicólogo escolher, dentro dos instrumentos aprovados, aqueles que mais adequadamente atendem à demanda da avaliação, além de considerar, obviamente, o conhecimento técnico deste profissional sobre o mesmo e todas as implicações éticas relacionadas a este papel. Embora pareça simplista, entende-se essencial, da lista aprovada em dezembro de 2015 (158: número total de testes psicológicos aprovados nesta data), citar alguns dos testes psicológicos que têm trazido bons resultados ao contexto da APO (desta lista, nesta data, 50 testes psicológicos usualmente utilizados na área e comercializados para psicólogos com CRP ativo). Trata-se de um grande avanço para a PO&T ter mais de 30% de instrumentos aptos e contextualizados à APO. A primeira lista, em 2003, tinha menos de 10% de instrumentos com tal finalidade. Por questões didáticas, optou-se por separar nos seguintes constructos a fim de facilitar a elaboração das baterias: personalidade, personalidade com aplicação online, habilidades cognitivas específicas (memória, atenção e raciocínio/inteligência), estresse e criatividade. Estudos aprofundados dos manuais e de pesquisas atuais são necessários para o aprofundamento destas escolhas. Cabe salientar que todas as informações citadas a seguir constam no site www.satepsi.cfp.org.br em 29/12/2015 da forma que estão descritas. A lista elaborada pela autora não tem a intenção de ser exaustiva, sendo que alguns instrumentos podem ter a recomendação para utilização em APO e não constam neste texto. Tabela 1 Personalidade Tabela 2 Personalidade – Informatizados na aplicação (online) – Exigem certificação para a utilização Tabela 3 Habilidades cognitivas específicas – Memória Tabela 4 Habilidades cognitivas específicas – Atenção Tabela 5 Raciocínio / inteligência Tabela 6 Estresse Tabela 7 Criatividade 2.2 Questão recente: Como elaborar uma bateria de avaliação psicológica para Espaço Confinado e altura? Trata-se de um debate bastante atual e importante. Profissionais designados para executar atividades em Espaço Confinado podem estar inseridos em diferentes segmentos laborais, como as indústrias de papel e celulose, gráfica, alimentícia, borracha, couro e têxtil, química e petroquímica, beneficiamento de minérios, siderurgia e metalurgia, nas operações marítimas e também em serviços básicos como eletricidade, gás, água e esgoto e telefonia (Kulcsar Neto, Possebom & Amaral, 2009). O MTE (2006), ao visar a segurança dos profissionais designados ao trabalho em ambientes confinados, tem como diretriz a NR-33 (2006) de Gestão de Segurança e Saúde nos Trabalhos em Espaços Confinados, publicada em dezembro de 2006 com última atualização pela Portaria MTE 1.409 de 29/08/2012. Para definir o que é um espaço confinado é fundamental mensurar três variáveis: geometria, acessos e atmosfera. A NR-33 (Brasil, 2006, p. 4) estabelece Espaço Confinado como: Qualquer área ou ambiente não projetado para ocupação humana contínua, que possua meios limitados de entrada e saída, cuja ventilação existente é insuficiente para remover contaminantes ou onde possa existir a deficiência ou enriquecimento de oxigênio. Espaços confinados são ambientes potencialmente mortais, sendo fundamental o planejamento, a programação, a implementação e avaliação da gestão de segurança e saúde, através de medidas técnicas, administrativas, pessoais e capacitação. Um espaço confinado não é determinado apenas pelo fato do trabalho ser realizado em um local fisicamente restritivo. Mais do que isso, ele pode ser potencialmente perigoso porque, geralmente, não é projetado para ser uma área onde as pessoas exerçam uma atividade laboral. É consenso que trabalhar em um espaço confinado impõe riscos físicos e psicológicos e se torna necessário certificar que a segurança e a saúde física e mental do trabalhador sejam monitoradas e preservadas. O estudo de Marques e Lopes (2008) com uma amostra de funcionários em uma plataforma marítima ilustrou de que forma os diversos fatores, entre eles ruídos, alta temperatura e o próprio risco da atividade, além de estressar o trabalhador, podem prejudicar o desempenho na execução de suas tarefas. Mais do que isso, os autores assinalam a influência dessas variáveis no prejuízo da qualidade de vida de cada indivíduo inserido naquele contexto. Já, para que um profissional seja considerado capacitado para trabalho em altura (NR- 35), ele deve participar constantemente de treinamentos teóricos e práticos. Seu estado de saúde deve ser avaliado constantemente para garantir sua integridade. O trabalho em altura deve sempre ser precedido de uma análise de risco para avaliação, identificação e antecipação de eventos indesejados ou possibilidade de ocorrência de acidentes. A NR-35 não estabelece uma metodologia específica, porém exige a documentação desta etapa. Dentro do contexto da Segurança do Trabalho é necessário assegurar-se de que o indivíduo que pretende trabalhar nesse ambiente esteja devidamente qualificado para tal atividade. Isso posto, é imprescindível estabelecer um protocolo de avaliação para todo profissional envolvido direta ou indiretamente com atividades em espaço confinado que abarque tanto exames clínicos quanto variáveis psicossociais de risco. Indubitavelmente, o exame psicológico faz parte do processo avaliativo e devem ser utilizados métodos adequados, tais como testes psicométricos e entrevistas. A avaliação psicossocial no âmbito do espaço confinado engloba, inicialmente, a análise da história ocupacional e clínica do candidato. Mais do que isso, segundo a NR-33 (2006) é necessário lançar mão de uma avaliação psicossocial com o objetivo de averiguar o perfil psicológico, bem como de identificar prováveis comportamentos que poderiam afetar a capacidade e a segurança do futuro trabalhador. Como ressaltam Guimarães, Martins e Botelho (2013), a avaliação psicossocial abrange aspectos relacionados a: (a) saúde geral; (b) nível de satisfação com o trabalho; (c) necessidades e motivações; (d) tolerância para lidar com o estresse inerente à função; (e) forma como organiza a atividade a ser executada e, finalmente, (f) capacidade da rede social e familiar para apoiá-lo. É importante ressaltar que, por envolver um ambiente necessariamente de risco e exercer uma tarefa muito específica, avaliar a atenção do trabalhador é condição sine qua non. É através dessa avaliação global que o psicólogo poderá emitir um parecer que auxilie o médico do trabalho quanto à aptidão do trabalhador para exercer tal função. Uma proposta de protocolo para avaliação psicossocial de trabalhadores que atuam em espaço confinado é o adotado pelo Serviço Social da Indústria do Paraná (SESI/PR, 2012). Essa metodologia contempla os itens a seguir: (1) a qualidade de vida; (2) os relacionamentos interpessoais (vida social e trabalho); (3) o uso de álcool e outras drogas; (4) a trajetória profissional (breve histórico das experiências profissionais anteriores); (5) a aplicação do Self Reporting Questionaire (SRQ-20); (6) os sintomas de Depressão e Ansiedade; (7) a investigação pelos critériosdo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV) da presença de Transtorno Afetivo Bipolar, Fobia Específica, Agorafobia, Transtorno Obsessivo-compulsivo, Psicose e, por último, (8) as funções do ego. O psicólogo que atua na área de avaliação psicológica em espaço confinado e altura necessita ter treinamento em técnicas de entrevista além de definir uma bateria de testes condizentes com a demanda. Usualmente, utilizam-se os instrumentos Sintomas de Estresse para Adulto de Lipp (ISSL – Lipp, 2000) e a Escala de Vulnerabilidade ao Estresse no Trabalho (EVENT – Sisto et al., 2007) para avaliar o nível de estresse e vulnerabilidade. A avaliação da inteligência geral costuma ser observada através do Teste Não Verbal de Inteligência Geral BETA III (Kelogg & Morton, 2011) ou TIG-NV (Tosi, 2008) que também oportuniza a análise neuropsicológica. Quando o foco é a Atenção Concentrada, Difusa, Dividida, Distribuída e Alternada estão bem-indicados os instrumentos Teste de Atenção Concentrada D2 (Brickenkamp, 2000), Teste de Atenção Concentrada-TEACO- FF (Rueda & Sisto, 2009), Teste de Atenção Difusa-TEDIF (Tonglet, 2002), Teste de Atenção Dividida-TEADI (Rueda, 2010), Teste de Atenção Alternada-TEALT (Rueda, 2010). Muitos psicólogos utilizam o Teste Palográfico (Minicucci, 2002), a Técnica de Zulliger (Vaz, 1998) e a Bateria Fatorial de Personalidade (BFP – Nunes, Hutz & Nunes, 2010) para avaliar os diferentes fatores da personalidade com especial foco nos aspectos que indicam instabilidade emocional, perda de controle de impulso, desajuste social e vulnerabilidade. Quanto à forma de manifestação específica da raiva, o Inventário de Expressão de Raiva como Traço e Estado (STAXI – Biaggio, 2003) também tem sido utilizado. A fim de realizar a mensuração da memória, o recurso possível é o Teste Psicológico TEPIC-M – Teste Pictórico de Memória, instrumento que avalia a memória visual por meio de estímulos figurais em um curto período de tempo (Rueda & Sisto, 2007). Finalmente, para verificar a presença de sintomatologia ansiosa e/ou depressão, em avaliações mais completas, os Inventários de Ansiedade e Depressão de Beck (Cunha, 2001) são considerados padrão-ouro. Embora a prática deste tipo de avaliação esteja bem intensa, pesquisas na área da avaliação psicossocial para trabalhadores em espaço confinado e altura no Brasil ainda são limitadas. Um exemplo recente da metodologia utilizada para avaliação psicossocial foi apresentado, através do relato de caso, por Ueda e Silva (2013). As autoras acreditam ser necessário tanto o reconhecimento do contexto psicossocial quanto a detecção das variáveis individuais e sociais que possam comprometer a dinâmica da personalidade do entrevistado. Para caracterizar as relações interpessoais e a trajetória profissional, utilizaram entrevista e observação. Sintomas psiquiátricos foram avaliados através do Self Reporting Questionaire (ISRQ-20; Santos, Araújo & Oliveira, 2009), do Inventário de Ansiedade de Beck (BAI; Cunha, 2001) e do Inventário de Depressão de Beck (BDI; Cunha, 2001). Atenção e raciocínio foram verificados através do Teste de Inteligência Não Verbal (Teste R1; Alves, 2002) e do TEACO-FF (Rueda & Sisto, 2009). Já a pesquisa de Oliveira, Perez, Mastrogiacomo e Lima (2012) com trabalhadores das usinas hidrelétricas da Companhia Energética de São Paulo (CESP) buscou avaliar a capacidade cognitiva e emocional dos participantes utilizando testes de atenção concentrada, dividida e alternada, além de testes de personalidade e entrevista psicológica. Aprimorar a seleção dos candidatos que pretendem executar tarefas em espaço confinado é uma meta a ser atingida e deveria incluir a análise do perfil de liderança e das habilidades interpessoais que podem ser elementos importantes na prevenção da diminuição no desempenho laboral. Dessa forma, procurar identificar no candidato traços de personalidade que possam prever a capacidade de trabalhar sob estresse e interagir de forma produtiva como os demais membros da equipe parece ser um ponto-chave. Os psicólogos responsáveis pela avaliação dos trabalhadores em espaço confinado devem levar em consideração as variáveis psicossociais de comportamento e desempenho que podem ter um impacto significativo sobre o resultado do trabalho executado em cada contexto. O impacto dessas variáveis sobre o funcionário pode acarretar desde uma leve diminuição no desempenho na execução da tarefa, passando pelo decréscimo da qualidade de vida e bem- estar, até uma falha catastrófica que pode levar, inclusive, à morte. Para tanto, além de aferir quais as características de personalidade que podem predizer o desempenho na tarefa, a avaliação deve levar em conta o estilo de enfrentamento adotado frente a situações de risco e também a maneira como o estresse provocado pelo isolamento e confinamento atua nas emoções e desempenho cognitivo específicos de cada indivíduo. 2.3 Em qual etapa dos processos seletivos deve-se utilizar a entrevista comportamental por competências? A prática da autora tem revelado que o ideal é planejar a entrevista comportamental por competência já tendo aplicado e levantado os testes psicológicos. Existe evidência de décadas de estudo sugerindo que as entrevistas podem ser um bom previsor desde que utilizadas apropriada e cuidadosamente (Milkovich & Boudreau, 2006). A entrevista comportamental diferencia-se dos outros tipos de entrevistas por ser uma entrevista estruturada, com questões embasadas no perfil de competências do cargo, com perguntas abertas e específicas, com verbos de ação no passado e perguntas planejadas para identificar a presença ou ausência de capacidade para resolver determinada situação (Almeida, 2004; Campion, Palmer & Campion, 1997; Harris, 1989; Rabaglio, 2005). Os objetivos que direcionam a entrevista comportamental referem-se à investigação da experiência passada do candidato em situações vivenciadas e quais as soluções praticadas por ele. Pretende-se, na entrevista, acessar informações sobre os comportamentos passados do candidato no trabalho e verificar se estes comportamentos compreendem o repertório requisitado no perfil de competências do cargo ao qual ele está se candidatando (Almeida, 2004; Rabaglio, 2005). Na entrevista comportamental espera-se que a pessoa em avaliação consiga relatar seus comportamentos de forma focada e específica, demonstrando que, em determinada situação ou contexto, agiu de uma maneira tal que proporcionou a obtenção dos resultados almejados. Rabaglio (2005) sugere que o entrevistador, na entrevista comportamental, tenha em mente que um exemplo de comportamento adequado deve ser aquele que contenha o contexto (C) definido, a ação (A) implementada e o resultado (R) obtido, ou seja, o candidato em avaliação deve completar o ciclo de resposta Contexto- Ação-Resultado (CAR) para cada questão formulada. Caso isto não ocorra, o entrevistador deve utilizar estratégias de sondagem e exploração para compreender o que levou o candidato a não completar o ciclo. A fim de tornar mais didático o capítulo, relacionando o tema deste item com a questão 2.2, sugere-se incluir na avaliação psicológica para espaço confinado e altura algumas perguntas comportamentais por competências similares a estas, utilizadas apenas como exemplos: • Fale-me sobre uma situação em que você precisou passar por cima de algumas normas da empresa para solucionar um problema e como foi. • Conte-me sobre uma situação na qual você insistiu em defender suas crenças sobre segurança do trabalho frente a uma visão contrária da sua liderança. • Conte-me sobre alguma situação inesperada relacionada à segurança que tenha lhe acontecido no seu último trabalho e como você reagiu. • Relate-me uma situação na qual você percebeu que um de seus colegas ia cometer um grave erro. Como você procedeu? • Descreva uma situação que você trabalhava com algum colega que tinha alguma atitude contrária às melhores práticas de segurança no trabalho. O que você fez para influenciar essa pessoa a alteraresta atitude? • Você já presenciou um acidente de trabalho? Relate-me como foi. • Qual foi a situação de maior sucesso que você vivenciou em relação a um momento de grande estresse no trabalho (ou sobrecarga de trabalho)? E, pelo contrário, quando você reagiu de uma forma diferente do que faria hoje (fracasso)? 2.4 Questão bastante polêmica: Qual é a forma mais adequada para tratar o documento derivado da APO? No corpo da Resolução n. 007/2003 do CFP, salientam-se os diferentes formatos de documentos gerados pelos psicólogos e orienta-se sobre a elaboração de quatro diferentes tipos de documentos: Declaração, Atestado Psicológico, Relatório/Laudo Psicológico e Parecer Psicológico. A declaração é um documento que, como o próprio nome traduz, declara sobre o comparecimento e atendimento da pessoa atendida, bem como informa as condições desta relação tais como dia e/ou horário do atendimento. Assim, é um documento que não informa especificidades da relação estabelecida com a pessoa atendida, tais como sintomas ou estado psicológico. O atestado, por sua vez, é um documento no qual se registram sintomas e estados psicológicos com o intuito de incluir ou excluir momentaneamente a pessoa atendida. O atestado de exclusão é aquele que comumente decorre das situações pontuais de incapacidade circunstancial para o trabalho, constatada pelo profissional a partir do acompanhamento de seu paciente. Menos comum, mas em crescente uso, tem sido a produção do atestado de inclusão, no qual o psicólogo atesta a capacidade laboral da pessoa que acompanha em atendimento e que possui alguma deficiência, mas não está incapacitada para o trabalho. O laudo ou relatório é um documento descritivo sobre as determinações históricas, sociais, políticas e culturais da pessoa avaliada e pesquisada no processo de avaliação psicológica. Segundo Lima e Werlang (2011), “explicita informações pessoais do sujeito em avaliação, portanto os dados explanados são da responsabilidade exclusiva do profissional psicólogo” (p. 13). Assim, dada a sua especificidade, é um documento bastante detalhado, amplo e que analisa as condições psicológicas da pessoa avaliada em profundidade. Já os pareceres, embora sejam documentos resumidos que se propõem a responder uma questão pontual e que, portanto, têm caráter indicativo ou conclusivo, não deveriam ser, segundo Lima e Werlang (2011), “documentos decorrentes de avaliações psicológicas, ou seja, não são elaborados com base no uso de estratégias, métodos e técnicas específicas da Psicologia, como os testes psicológicos” (p. 13). A autora deste capítulo acredita que o mais adequado é que os Psicólogos atuantes na área de Psicologia Organizacional e do Trabalho unam forças para propor, junto ao CFP, a utilização dos termos síntese, resumo, laudo resumido ou informe de avaliação psicológica como resultantes da APO. Sabe-se que a Resolução n. 007/2003 está sendo revisada e espera-se que este fato seja considerado. 3 Desafio: repensar possibilidades de qualificar a prática profissional na APO Neste capítulo, a proposta não foi esgotar a discussão sobre o tema APO, mas sim apontar algumas reflexões que devem ser aprofundadas a fim de qualificar a prática profissional na área. A todos os profissionais que atuam nas organizações com avaliações psicológicas ressalta-se a necessidade de maior divulgação de suas práticas, para que a ciência psicológica obtenha dados que possibilitem e impulsionem cada vez mais o seu desenvolvimento. Com isso, a autora deste capítulo convida a todos os psicólogos organizacionais que desejam atuar com APO ou que já atuem nesta área que compartilhem suas práticas em congressos e eventos científicos possibilitando, com isso, o desenvolvimento da área e dos programas de pós-graduação específicos. Referências Almeida, W. (2004). Captação e seleção de talentos: repensando a teoria e a prática. São Paulo: Atlas. Alves, I.C.B. (2002). R-1 – Teste não verbal de inteligência de Rynaldo de Oliveira: manual. São Paulo: Vetor. Bastos, A.V.B. & Gondim, S.M.G. (2010). O trabalho do psicólogo no Brasil. Porto Alegre: Artmed. Biaggio, A.M.B. (2003). Inventário de expressão de raiva como estado e traço (S.T.A.X.I.) – Manual técnico. São Paulo: Vetor. Borges-Andrade, J.E. & Zanelli, J.C. (2004). Psicologia e produção do conhecimento em organizações de trabalho. In: J.C. Zanelli, J.E. Borges-Andrade & A.V.B. Bastos (orgs.). Psicologia, organizações e trabalho no Brasil (p. 492-517). Porto Alegre: Artmed. Brasil (2006). Ministério do Trabalho e Emprego. Norma Regulamentadora n. 33: segurança e saúde nos trabalhos em espaços confinados. Diário Oficial da União [Disponível em http://ow.ly/n9aa30aYYuc]. Brickenkamp, R. (2000). Teste D2 de atenção concentrada – Manual, instruções, avaliação e interpretação. São Paulo: CETEPP. Campion, M., Palmer, D. & Campion, J. (1997). A review of structure in the selection interview. Personnel Psychology, 50, 655-702. Capelli, P. (2003). Contratando e mantendo as melhores pessoas (Trad. de N. Montingelli). Rio de Janeiro: Record. CFP (2003). Resolução n. 007/2003 – Institui o Manual de Elaboração de Documentos
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