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TEORIA GERAL DO PROCESSO Rosana Antunes Formas consensuais de solução de conflitos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer a atual importância dada às formas consensuais de so- lução de conflitos. Diferenciar conciliação de mediação. Analisar a mediação e a conciliação judiciais e extrajudiciais. Introdução Neste capítulo, você estudará as formas consensuais de solução de con- flitos e aprenderá as diferenças entre a conciliação e a mediação para, ao final, analisar a mediação e a conciliação judiciais e extrajudiciais. A crise da justiça tem sido muito discutida nos últimos anos. Atual- mente, queixa-se da ausência de justiça ou da morosidade, bem como da ineficácia das decisões. Resolver essa crise é um desafio a ser vencido. No entanto, não há fórmulas mágicas para a solução desses problemas apontados, mas se reconhece a vocação dos meios consensuais como uma alternativa. Os meios consensuais, também chamados de meios autocompositi- vos, são métodos não adversariais de solucionar conflitos de interesses e estão intimamente ligados ao acesso à justiça material. O acesso à justiça é um direito humano fundamental que não vem sendo efetivado de forma satisfatória pelos órgãos tradicionais judiciais, por essa razão há a necessidade de buscar novos métodos ou formas de efetivar a justiça. A partir dessa constatação, políticas públicas começaram a ser implementadas no sentido de incentivar e valorizar os métodos não adversariais. Atualmente, a primeira política efetiva se deu com a Re- solução 125 do Conselho Nacional de Justiça (política judiciária de C14_Formas_consensuais_solucao.indd 1 20/06/2018 08:23:21 tratamento de conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade). No contexto de ampliação do acesso à justiça, duas leis importantes para a regulamentação de métodos consensuais merecem destaque: Código de Processo Civil (CPC) de 2015 (Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015) e a Lei nº. 13.140, de 26 de junho de 2015 (mediação). As duas leis citadas acima trazem a previsão de solução consensual de conflitos de interesses, quer seja judicial ou extrajudicial. Dessa forma, grande é a contribuição dos métodos consensuais para a solução de conflitos de interesse no nosso ordenamento atual, uma vez que eles buscam a concretização da ampliação do acesso à justiça de forma material e a pacificação social de forma mais efetiva. Importância das formas consensuais de conflitos A origem dos métodos autocompositivos remonta ao início da civilização, antes mesmo do Estado, quando os titulares do Direito resolviam os seus próprios confl itos por intermédio da autotutela ou da autodefesa. A justiça era feita pelas próprias mãos. Com o surgimento do Estado, foram desenvolvidos meios consensuais de conflitos, nos quais os titulares decidiam os desacordos por si mesmos ou poderiam se valer de um terceiro que gozasse da confiança das partes. Como exemplos desse tipo de solução, podemos citar a mediação e a conciliação. Com o passar do tempo, a autonomia de decidir os conflitos foi substituída por um terceiro, de escolha das partes, tendo como exemplo a arbitragem. Ressalta-se que a arbitragem inaugurou os métodos heterocompositivos. Com a ascensão da figura do Estado, transferiu-se, de forma gradativa, o poder de decidir conflitos a um terceiro, o qual era designado pelo Estado, compondo sua função jurisdicional, ou seja, pelo sistema jurisdicional que vigora até os dias de hoje. Um ponto que merece destaque é o estudo feito por Cappelletti e Garth (1988), que, na obra Acesso à Justiça, publicada no Brasil em 1980, revelou a investigação sobre o funcionamento do sistema judiciário de alguns países, como França, Itália, Portugal, Espanha, Estados Unidos, entre outros. Nessa Formas consensuais de solução de conflitos2 C14_Formas_consensuais_solucao.indd 2 20/06/2018 08:23:22 obra, os autores tratam da evolução do conceito de acesso à justiça, apresen- tando alguns obstáculos e as possíveis soluções para superá-los. O Brasil não estava no rol dos países analisados por Cappelletti e Garth (1988), apesar disso, as conclusões da pesquisa foram objeto de análise da dou- trina brasileira, muitas vezes citada nas decisões judiciais dos nossos tribunais. O novo conceito de acesso à justiça exposto por Cappelletti e Garth (1988, p. 23) apresenta um sistema de proteção de direitos de forma ampla, trans- formando o papel do Estado de intervencionista em incentivador do diálogo, o qual é capaz de promover não somente a assistência judiciária gratuita aos necessitados e os procedimentos para tutelar direitos transindividuais, mas também amplos mecanismos de resolução de conflitos, estando alinhado como escopo maior de pacificar a sociedade. Uma experiência importante, com relação aos métodos consensuais, reside no O Tribunal Multiportas, de Harvard Law School, que se constitui em uma forma de organização judiciária, na qual o Poder Judiciário atua como um centro de resolução de controvérsias, com diversos procedimentos e com van- tagens e desvantagens que devem ser levadas em consideração, no momento de sua escolha, em função das especificidades de cada conflito, bem como das pessoas nele envolvidas. Assim, o sistema de uma única porta, que é o do processo judicial, pode ser conjugado com vários tipos de procedimento, os quais integram um centro de resolução de disputas, direcionando ao procedimento mais adequado para o tipo de conflito apresentado. O perfil desse Tribunal inspira o ordenamento jurídico brasileiro na busca de novas portas de acesso à justiça de forma ma- terial. Segundo a doutrina brasileira, a abertura de portas no Brasil se inicia de forma mais clara com os Juizados Especiais. Dito isso, precisamos entender que os conflitos fazem parte do cotidiano das pessoas e são necessários para o aprimoramento das relações interpessoais e sociais. Diante de um conflito, é importante encontrarmos uma forma que favoreça a composição construtiva. Por isso, é importante que esses conflitos sejam resolvidos da forma mais adequada possível, permitindo um sentimento de satisfação das pessoas envolvidas. A adequação do meio de solução ao tipo de conflito aponta para uma diversidade de mecanismos de solução, bem como a uma percepção de que é preciso avaliar o tipo de conflito vivido para que se possa encontrar um mecanismo de solução que se encaixe na necessidade. 3Formas consensuais de solução de conflitos C14_Formas_consensuais_solucao.indd 3 20/06/2018 08:23:22 Nesse contexto, é importante se desapegar da visão de que só é possível resolver um conflito por um caminho exclusivo, ou seja, quando houver in- tervenção do Poder Judiciário. Assim, é possível que mecanismos eficientes, como os meios consensuais (conciliação e mediação, por exemplo), sejam, assim como a tradicional ju- risdição, uma opção que visa a vincular o tipo de conflito ao meio de solução apropriado. Os meios consensuais se apresentam como mecanismos de inclusão social, à medida que as partes se tornam corresponsáveis pela construção de uma resolução mais adequada para suas contendas, e, ainda, de pacificação social, já que um dos objetivos deles é que as partes aprendam a administrar seus conflitos por meio do diálogo. O objeto da autocomposição, ou seja, os direitos que podem ser objeto de autocomposição estão limitados aos bens disponíveis – direitos patrimoniais disponíveis ou relativamente indisponíveis (direitos indisponíveis que podem ter o seu valor convencionado). Nesse contexto, os métodos consensuais são meios de solução de conflitos que se adéquam ao moderno conceito de acesso à justiça, pois buscam ampliar técnicas para o acesso de forma mais eficaz e célere. Voltado para a ideia de justiça coexistencial e transformativa, o orde- namentojurídico brasileiro vem gradualmente, ainda que de forma tímida, demonstrando a preocupação estatal com o tratamento adequado dos conflitos de interesse e redimensionando o acesso à Justiça. Um dos grandes desafios da contemporaneidade é a afirmação de um sistema colaborativo e autocom- positivo que compõe um sistema de justiça e que é tanto ou mais valorizado que o modelo ordinário estatal. Na busca de um sistema colaborativo, destacam-se o CPC de 2015 e a Lei nº. 13.140/2015 (mediação). Essas leis preveem formas de solução de conflitos consensuais, judiciais e extrajudiciais, reconhecendo que a exclusividade estatal para a resolução de conflitos de interesses já não é mais capaz de responder aos litígios de forma célere, adequada e efetiva. A morosidade nas soluções das lides é apontada como obstáculo ao acesso à justiça de forma ampla. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, em 2016, a taxa de congestionamento no Poder Judiciário foi de 74,8% na Justiça Estadual e de 71,6% na Justiça Federal, percentuais que são considerados altíssimos (BRASIL, 2016). Formas consensuais de solução de conflitos4 C14_Formas_consensuais_solucao.indd 4 20/06/2018 08:23:22 Outro dado alarmante é trazido pelo relatório da pesquisa Justiça em Números: o tempo médio de tramitação de um processo. O tempo de baixa no processo de conhecimento é de 0,9 anos (11 meses), enquanto o tempo de baixa na execução gira em torno de 4,3 anos (quatro anos e três meses). O lapso temporal decorrido entre o protocolo e o primeiro movimento de baixa do processo revela a dificuldade que o Poder Judiciário vem enfrentando para fazer frente à realização dos direitos do cidadão. A doutrina entende que não basta termos uma pluralidade de direitos reconhecidos em leis, pois dificilmente o acesso ao sistema de justiça trará à realidade a prática desses direitos se não for compartilhada por todos de forma igualitária, com métodos mais eficazes, apontando os meios consensuais como uma das formas de se alcançar a plena satisfação dos interesses da sociedade de forma autônoma. Ressalta-se que a universalização da cidadania por intermédio da efeti- vação dos direitos só se concretiza quando a porta de entrada permite que se vislumbre, e se alcance, a porta de saída do sistema de justiça em tempo razoável e, sobretudo, com o conflito pacificado de forma adequada. A taxa de congestionamento é um indicador que mede o percentual de casos que permaneceram com as soluções pendentes ao final do ano-base, dentro do universo de processos em trâmite (soma dos pendentes e dos baixados). Por tudo que foi dito até o momento, percebe-se que as leis têm evoluído no sentido verdadeiro da civilidade. Com isso, tem-se buscado formas eficazes, céleres e menos dispendiosas de resolver os conflitos de interesse, haja vista que um processo judicial apresenta custos temporal e financeiro, os quais, muitas vezes, as partes não conseguem cobrir. É cada vez mais importante a utilização dos meios consensuais para resolução de conflitos. 5Formas consensuais de solução de conflitos C14_Formas_consensuais_solucao.indd 5 20/06/2018 08:23:22 O acesso à justiça deixou de ser sinônimo de acesso aos Tribunais, exigindo algo mais: o acesso ao Direito. Na nova concepção de acesso à justiça, o Estado deve se comprometer a resolver conflitos, aplicando diversos mecanismos de resolução, estimulando práticas coope- rativas e não mais exclusivamente pelos Tribunais de Justiça. Por fim, é importante saber que a conciliação, assim como a mediação, é regida por princípios chamados de independência, imparcialidade, confidencia- lidade, oralidade, informalidade e decisão informada e boa-fé. Independência, pois se deve agir com liberdade sem sofrer pressão; imparcialidade porque é preciso ser imparcial ao conflito que está sendo resolvido; confidencialidade devido à necessidade de haver sigilo; oralidade e informalidade fazem a me- diação e a conciliação se diferenciar da jurisdição, pois é preciso falar com uma linguagem mais acessível para garantir que as partes estejam informadas e possam participar e dissolver o conflito. Mediação e conciliação Inicialmente, vale ressaltar que o incentivo para solucionar os confl itos de interesse, de forma consensual, no Brasil tem assento Constitucional, come- çando pelo preâmbulo da Constituição Federal de 1988, o qual afi rma que estamos comprometidos com soluções de controvérsias de forma pacífi ca interna e externamente. Dessa forma, os métodos não adversariais, como a mediação e a conciliação, estão inseridos no comando constitucional, uma vez que estes resolvem as controvérsias de forma pacífica e cooperativa e com foco na harmonia e na paz. Diversos são os mecanismos que visam à obtenção da autocomposição. A mediação e a conciliação são exemplos de meios autocompositivos. Cada um dos mecanismos mencionados se apresenta e se desenvolve com métodos e técnicas diferentes, porém, com o mesmo objetivo, há a composição autônoma de conflitos pelo resgate do diálogo. Formas consensuais de solução de conflitos6 C14_Formas_consensuais_solucao.indd 6 20/06/2018 08:23:22 A lide ocorre quando um indivíduo possui interesse em um bem material, e para adquiri-lo exerce sua pretensão sobre esse bem, contudo encontra resistência por parte de outra pessoa. A doutrina aponta a importância da autocomposição como forma de solu- ção mais adequada para cada lide porque as pendências são igualitariamente pensadas pelas partes, as quais se comprometem a encerrar seus conflitos de forma pacífica. Por ter uma grande vocação para promover a paz social, esses métodos se apresentam como verdadeiros realizadores de justiça. Vamos agora estudar a mediação e a conciliação, que são métodos auto- compositivos separados. Mediação A mediação é caracterizada pela participação de um terceiro imparcial, o qual deve ser neutro, sem qualquer poder de decisão, que irá aproximar as partes envolvidas no confl ito, incentivando o diálogo para a realização de uma composição mutuamente aceitável. É um procedimento voluntário e confi dencial, com métodos próprios, e informal, mas também é coordenado. No que se refere às escolas de mediação, as doutrinas nacional e interna- cional apontam três escolas clássicas: a) modelo tradicional-linear de Harvard; b) modelo circular-narrativo de Sara Cobb; c) modelo transformativo de Bush e Folger. A mediação atua na desconstrução do conflito, estimulando a cooperação. A despolarização por intermédio do exercício de se colocar no lugar do outro, praticado ao longo das sessões de mediação, possibilita uma visão total do con- flito, o que faz com que os mediandos olhem a discórdia por um novo ângulo. O objetivo é explorar a ideia de que diferentes pensamentos podem se complementar, e não se excluir, proporcionando maiores possibilidades de solução para o problema apresentado. 7Formas consensuais de solução de conflitos C14_Formas_consensuais_solucao.indd 7 20/06/2018 08:23:22 É importante destacar que a mediação não está necessariamente ligada ao Poder Judiciário ou a qualquer ente estatal. O CPC de 2015 disciplinou a mediação como um mecanismo hábil para a pacificação social e regulamentou os mediadores judiciais, atribuindo-lhes a qualidade de auxiliar da justiça. Destinou-se a Seção V, do Capítulo III, para tratar das atividades dos mediadores, dos princípios da mediação, da criação de Centros Judiciários de Solução Consensual pelos Tribunais, dos impedimentos, da remuneração, da criação de Câmaras de Mediação e Conciliação para a solução de controvérsias no âmbito da administração pública e da possibilidade de mediação extrajudicial, entre outras coisas. Há previsão de utilização da mediação nas lides em que a Fazenda Pública for parte. Ainda no ano de 2015, a Lei nº. 13.140/2015 fixou o marco regulatório da mediação. Ela trouxe toda a regulamentação do instituto, os meios e os métodos da mediação, bem como os princípiosda mediação e uma vasta regulamentação em relação aos mediadores. Por tudo que foi dito, a mediação é uma forma de solução de conflito, na qual as próprias partes buscam as soluções dos conflitos vividos, de forma consensual, auxiliados por um terceiro imparcial que tem como função aproxi- mar as partes e estimular o diálogo, buscando o resgate das relações abaladas. Conciliação A conciliação é umas das formas mais conhecidas de resolução adequada de confl itos, a qual pode ser empregada quando há uma difi culdade de encontrar uma solução entre as partes. Ela é caracterizada pela existência de um terceiro conciliador, que é quem auxilia na resolução do impasse. A conciliação tem, no método, a participação mais efetiva desse terceiro na proposta da solução, tendo como objetivo a solução do confl ito que lhe é apresentado na petição das partes. Pode-se recorrer a ela na fase pré-processual, antes da propositura da ação, e na fase processual, quando já existe um processo. Nesse último, a conciliação se dá depois da citação, com a finalidade de extinguir o processo e resolver o litígio. O método de conciliação é muito aplicado pelo Poder Judiciário, pois já se trata de um meio tradicionalmente usado na fase de instrução e julgamento, em que as partes são chamadas a compor a audiência de conciliação, a fim de obter solução do litígio, conciliando os conflitantes. O conciliador, em regra, é o condutor da conciliação. Contudo, não é órgão jurisdicionado, ele é um auxiliar da justiça (BRASIL, 2015, arts. 165 a 175). Formas consensuais de solução de conflitos8 C14_Formas_consensuais_solucao.indd 8 20/06/2018 08:23:23 A arbitragem é entendida como um instrumento ou meio alternativo para a solução de conflitos, entretanto, assim como no método judicial tradicional, é considerado um instrumento de heterocomposição e não autocompositivo. Mediação e conciliação extrajudiciais A mediação extrajudicial é aquela que é espontaneamente buscada pelas partes que estão envolvidas no problema, quando não se chegou a uma composição, sendo necessária a ajuda de um terceiro nos casos que a lei assim permitir. Dessa forma, o mediador, com técnicas apropriadas, busca o diálogo para que as partes envolvidas no conflito se esforcem para encontrar a solução do impasse, preservando os relacionamentos que precisam ser mantidos. Nesses casos, o mediador será escolhido pelas partes. Eles estão sujeitos às mesmas hipóteses legais de impedimento ou suspeição que incidem sobre os magistrados, as quais estão previstas no art. 145 do CPC de 2015 (BRASIL, 2015). O art. 186 do CPC de 2015 prevê a possibilidade de as partes escolherem câmaras privadas de mediação e conciliação, ou seja, extrajudicial (BRASIL, 2015). As regras para a mediação podem ser contratualmente previstas pelas partes, contudo, existem prazos, mínimos e máximos, que são contados a partir da data do recebimento do convite, e local para a realização da primeira reunião de mediação. Além disso, há penalidades no caso de não comparecimento da parte convidada. Já no caso de não houver previsão contratual entre as partes, é necessário observar alguns critérios para que se realize a primeira reunião de mediação, tais como: prazo mínimo de 10 dias úteis e máximo de 3 meses, contados a partir do recebimento do convite para manifestação e local adequado para uma reunião que possa envolver informações confidenciais. Também será elaborada uma lista com cinco nomes de mediadores capacitados – assim, a parte convidada poderá escolher e, caso não se manifeste, será considerado o primeiro nome da lista. Vale ressaltar que se a parte convidada para a primeira reunião de mediação não comparecer e posteriormente entrar com um procedimento arbitral ou judicial que envolva o mesmo assunto da mediação para a qual foi convidada, 9Formas consensuais de solução de conflitos C14_Formas_consensuais_solucao.indd 9 20/06/2018 08:23:23 isso acarretará a aceitação de pagar 50% dos custos e honorários de sucum- bência – que é quando a parte perdedora no processo é obrigada a arcar com honorários do advogado da parte vencedora. A conciliação extrajudicial ocorre antes da instauração do processo resolver o litígio sem a intervenção judicial, quando a lei permitir. No art. 168 do CPC, há a possibilidade de as partes escolherem a conciliação ex- trajudicial. Assim, é possível que se obtenha a conciliação fora do ambiente judicial, ou seja, nesse caso, não há processo em curso tratando do conflito (BRASIL, 2015). Por fim, é importante citar que um dos importantes instrumentos nor- mativos sobre a mediação e a conciliação, que é a resolução, trata sobre os Centros Judiciários de Solução de Conflitos, o Código de Ética dos Profissio- nais (mediadores e conciliadores), a atribuição do CNJ, entre outros assuntos essenciais a essa atividade. Cabe lembrar que há órgãos que já se utilizam de mediação e conciliação extrajudiciais. Podemos citar a Defensoria Pública, por intermédio dos Centros de Conciliação e Mediação Extrajudiciais, bem como o Ministério Público, por meio do Núcleo de Solução Extrajudicial dos Conflitos. A União, os estados e os municípios, segundo o art. 174 do CPC de 2015, também podem criar Câmaras de Mediação e Conciliação Extrajudiciais para solucionar conflitos com seus administrados, sempre que estes se tratarem de direitos patrimoniais disponíveis (BRASIL, 2015). Na conciliação, o conciliador tem uma postura mais ativa para sugerir o acordo entre as partes e apresentar propostas e ideias de solução. A conciliação é recomendada nos casos em que você não tem a possibilidade de restaurar ou preservar algum vínculo que as partes tenham, como na batida de um carro. Na mediação, a atuação do mediador é de aproximar as partes para o início do diálogo. Quase sempre existe a necessidade de preservar um vínculo anterior ou um relacionamento, como as relações de família e consumo, por exemplo. Formas consensuais de solução de conflitos10 C14_Formas_consensuais_solucao.indd 10 20/06/2018 08:23:23 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Relatório da justiça em números: 2016 ano-base 2015. Brasília, DF: CNJ, 2016. Disponível em: <https://goo.gl/BKQSFo>. Acesso em: 06 jun. 2018. BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Brasília, DF, 2015. Disponível em: <http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 06 jun. 2018. CAPPELLETTI, M.; GARTH, B. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988. Leituras recomendadas ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS. AMB lança pesquisa inédita sobre o uso da Justiça e a concentração do litígio no Brasil. 2015. Disponível em: <https://goo. gl/Qq5mAv>. Acesso em: 06 jun. 2018. ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE DEFENSORES PÚBLICOS. Diferenças regionais no acesso à justiça chegam a 1.000% no Brasil, aponta PNUD. 2015. Disponível em: <https://goo. gl/5NLJqb>. Acesso em: 06 jun. 2018. BRASIL. Ministério da Justiça. Brasil ganha Atlas de Acesso à Justiça. [201-]. Disponível em: <https://goo.gl/HP2313>. Acesso em: 06 jun. 2018. CABRAL, M. M. Os meios alternativos de resolução de conflitos: instrumentos de am- pliação do acesso à justiça. Porto Alegre: TJRS, Departamento de Artes Gráficas, 2013. CALMON, P. Fundamentos da mediação e da conciliação. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2015. CAPPELLETTI, M. 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Conteúdo: SOLUÇÃO DE CONFLITOS JURÍDICOS Martha Luciana Scholze Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Comparar os métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento de conflitos. Definir mediação, conciliação e negociação. Diferenciar mediação, conciliação e negociação de arbitragem. Introdução Os métodos autocompositivos e heterocompositivos de solução de conflitos estão cada vez mais ganhando força, pois a crise da jurisdição estatal fez com que o número elevado de processos judiciais desenca- deasse uma morosidade e um custo financeiro alto para a solução dos litígios. As pessoas querem respostas rápidas para os seus conflitos, o que faz com que procurem meios mais rápidos e eficazes. Aí entram em cena a mediação, a arbitragem, a conciliação e a negociação, que são métodos de solução de conflitos, cada um com as suas particularidades, mas muito mais rápidos e tão eficazes na solução de um conflito quanto um processo judicial. Neste capítulo, você vai estudar a comparação entre os métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento de conflitos. Você também vai compreender a definição de mediação, conciliação e negociação, e as diferenças entre esses métodos. U N I D A D E 2 C03_Metodos_autocompositivos.indd 1 28/06/2018 08:16:24 lalves Retângulo lalves Retângulo Conceitos fundamentais Na autocomposição, o confl ito é solucionado pelas partes, sem a intervenção de outros agentes no processo de pacifi cação do confl ito. A autocomposição se verifi ca pelo despojamento unilateral em favor de outrem da vantagem por este almejada, pela aceitação ou resignação de uma das partes ao interesse da outra, ou, fi nalmente, pela concessão recíproca efetuada pelas partes. Não há, em tese, exercício de coerção pelos indivíduos envolvidos. As modalidades de autocomposição são renúncia, aceitação (resignação/ submissão) e transação. Ocorre a renúncia quando o titular de um direito dele se despoja, por ato unilateral seu, em favor de alguém. Já a aceitação (resignação/submissão) ocorre quando uma das partes reconhece o direito da outra, passando a se conduzir em consonância com esse reconhecimento. Por sua vez, a transação se verifica quando as partes que se consideram titulares do direito solucionam o conflito por meio da implementação de concessões recíprocas. É importante destacar que os casos acima podem ocorrer tanto no âmbito exclusivo da sociedade civil (classificando-se como extrapro- cessuais) quanto no interior de um processo judicial (enquadrando-se como endoprocessuais). A heterocomposição ocorre quando o conflito é solucionado por meio da intervenção de um agente exterior à relação conflituosa original. É que, em vez de isoladamente ajustarem a solução da sua controvérsia, as partes (ou até mesmo uma delas, unilateralmente, no caso da jurisdição) submetem a terceiro o seu conflito, em busca de solução a ser por ele firmada ou, pelo menos, por ele instigada ou favorecida. Considerando o fato de que se levam em conta os sujeitos envolvidos e a sistemática operacional do processo utilizado, temos as seguintes modalidades de heterocomposição: jurisdição, arbitragem, mediação e conciliação, mas essa divisão não é consensual na doutrina. Existem autores que consideram a conciliação e a mediação como meios autocompositivos, e como meios heterocompositivos a arbitragem e a jurisdição. Assim, na autocomposição, apenas os sujeitos originais em confronto se relacionam na busca da extinção do conflito, dando origem a uma sistemática de análise e solução da controvérsia autogerida pelas próprias partes. Já na heterocomposição, a intervenção é realizada por um agente exterior aos sujeitos originais na dinâmica de solução do conflito, transferindo-se em maior ou menor grau para esse agente exterior a direção dessa dinâmica. É importante salientar que a mediação é o método que confere menor destaque ao papel do agente exterior, uma vez que este apenas aproxima e instiga as partes à pacificação. Por isso, alguns autores classificam a mediação Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos2 C03_Metodos_autocompositivos.indd 2 28/06/2018 08:16:25 como um instrumento a serviço de um método de solução de controvérsias (por exemplo, a serviço da transação bilateral ou da negociação coletiva), não como um método específico. Muitas são as mudanças que vêm sendo apresentadas no cotidiano da nossa sociedade. Com o acesso à informação, a população tem cada vez mais acesso às mudanças nas leis e quer respostas mais rápidas para suas perguntas. Daí a importância dos métodos alternativos de solução de conflitos: sem ingressar no judiciário, evitando-se todo o trâmite processual, há rapidez na solução de um conflito, seja por meio da mediação, da conciliação, da negociação ou da arbitragem. Mediação, conciliação e negociação A mediação pode ser defi nida como a interferência de um terceiro, com poder de decisão limitado ou não autoritário, que ajudará as partes envolvidas a chegarem voluntariamente a um acordo mutuamente aceitável com relação às questões em disputa. Segundo Morais e Spengler (2018), a mediação é um modo de construção e de gestão da vida social graças à intermediação de um terceiro neutro, independente, sem outro poder que não a autoridade que lhe reconhecem as partes que o escolheram ou reconheceram livremente. Sua missão fundamental é (re)estabelecer a comunicação. Podemos trazer aqui o exemplo do relacionamento entre pessoas que residem em um mesmo condomínio (direito de vizinhança). Quando surge um litígio entre dois vizinhos, a tendênciaé que a restauração das relações seja muito mais importante para estes do que obter a satisfação de um prejuízo por algo que uma das partes possa ter cometido. Por meio da mediação, busca-se encontrar a essência do problema para solucioná-lo. Por meio da mediação, busca-se solucionar conflitos mediante a atuação de um terceiro desinteressado, chamado de mediador, que tem a função de conselheiro, pois pode apenas aconselhar e sugerir. Cabe às partes constituírem 3Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos C03_Metodos_autocompositivos.indd 3 28/06/2018 08:16:25 as suas respostas. Entre as principais características da mediação, podemos as seguintes: Privacidade — o processo de mediação é desenvolvido em ambiente secreto e somente será divulgado se for a vontade das partes. Economia financeira e de tempo — os litígios levados à discussão por meio da mediação tendem a ser resolvidos em tempo muito inferior ao que levaria se fossem debatidos na Justiça tradicional. Isso acarreta em uma diminuição do custo indireto, pois quanto mais se alonga a pendência, maiores serão os gastos com a sua resolução. Oralidade — a mediação é um processo informal, no qual as partes têm a oportunidade de debater os problemas que as envolvem, visando encontrar a melhor solução para eles. Reaproximação das partes — a mediação, ao contrário da jurisdição tradicional, busca aproximar as partes. Trabalha-se para resolver as pendências por meio do debate e do consenso, tendo como objetivo final a restauração das relações entre os envolvidos. Autonomia das decisões — as decisões tomadas não necessitarão ser alvo de futura homologação judicial. Cabe às partes optarem pelo melhor para si mesmas. Equilíbrio das relações entre as partes — não terá êxito a mediação na qual as partes estejam em desequilíbrio de atuação. É fundamental que todas as partes se manifestem e que haja a garantia da compreensão das ações que estão sendo desenvolvidas. A prioridade do processo de mediação é a restauração da harmonia. Deve-se buscar o favorecimento das trocas entre as partes, utilizando-se um método conciliatório. O tema da mediação pode ser visto em filmes. Uma suges- tão é o filme Sete Anos, de 2016, que nos traz um exemplo de situação muito interessante que envolve a mediação. Uma dica de leitura sobre mediação é o documento Me- diação Judicial, que apresenta todas as questões relativas à mediação de acordo com o Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Acesse-o no link abaixo ou código ao lado. https://goo.gl/61wQBB Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos4 C03_Metodos_autocompositivos.indd 4 28/06/2018 08:16:25 https://goo.gl/61wQBB A conciliação é uma conversa/negociação que conta com a participação de uma pessoa imparcial para favorecer o diálogo e, se necessário, apresentar ideias para a solução do conflito. Segundo o CPC de 2015 (Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015), o conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. No Brasil, conciliação e mediação são vistos como meios distintos de so- lução de conflitos. Essa visão decorre, em grande parte, da evolução histórica desses instrumentos na nossa sociedade. O CPC reafirmou essa diferenciação no art. 165. Na conciliação, o terceiro facilitador da conversa interfere de forma mais direta no litígio e pode chegar a sugerir opções de solução para o conflito (art. 165, § 2º). A negociação é um processo pelo qual duas ou mais partes, partindo de um suposto conflito, procuram obter, mediante decisão comum, um resultado melhor do que teriam obtido por outros meios. Trata-se de um acordo ou en- tendimento bi ou multilateral. A negociação pode ser dividida em negociação por princípios e negociação posicional. A negociação posicional é aquela cujos negociadores se tratam como oponentes, o que implica pensar na negociação em termos de um ganhar e outro perder. O negociador pressiona ao máximo e cede o mínimo possível. Tem um olhar para determinado foco, é polarizado em uma das partes e pro- porciona prejuízos na relação social dos envolvidos, pois uma parte se sente cedendo à intransigência da outra. Já a negociação por princípios induz que os negociadores busquem saídas que não dependam do outro lado para ficar numa situação mais confortável durante a negociação. A honestidade e a busca de um acordo que satisfaça aos dois lados são apontados como características desse princípio. A nego- ciação por princípios, ou negociação baseada em méritos, sugere a obtenção de resultados sensatos e justos, em que são abordados os interesses reais dos envolvidos, e não suas posições. Essa negociação deverá passar por 4 fases: 1. separação das pessoas dos problemas; 2. foco nos interesses, e não em posições; 3. geração de opções de ganhos mútuos; 4. utilização de critérios objetivos. 5Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos C03_Metodos_autocompositivos.indd 5 28/06/2018 08:16:25 Para Morais e Spengler (2018), a mediação pode ser considerada como um espaço democrático, pois aplica-se com a figura do mediador, que se encontra no meio das partes, não acima delas. Partilha-se de um espaço comum e participativo. O mediador não deve se preocupar em interferir no conflito, mas em possibilitar liberdade às partes. A medicação não é uma ciência, mas uma arte. Saiba mais sobre os métodos de solução de conflitos no livro Mediação e Arbitragem: Alternativas à Jurisdição, dos mesmos autores. Diferenças entre mediação, conciliação e negociação de arbitragem Já defi nimos mediação como parte da justiça consensual, na qual os desejos e satisfações das partes substituem a aplicação coercitiva de uma sanção legal. Segundo Warat (1998), a mediação consiste em um processo no qual o mediador auxilia os participantes na resolução de uma disputa. O acordo fi nal trata o problema com uma proposta mutuamente aceitável e será estruturado de modo a manter a continuidade das relações das pessoas envolvidas. A conciliação, por sua vez, é apresentada no CPC de 2015, no art. 165, § 2º, que nos diz que o conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Assim, a conciliação é mais indicada para conflitos objetivos e superficiais, nos quais não existe relacionamento duradouro entre os envolvidos. Já a negociação ocorre quando duas ou mais pessoas, a partir de um conflito, tentam chegar a uma solução, depois de já terem tentado resolver o conflito por outros meios. A arbitragem consiste em uma estratégia de tratamento de contro- vérsias evidenciada desde a Antiguidade e utilizada no Estado romano. A princípio, o Estado não interferia no tratamento de litígios, deixando que os particulares se incumbissem de solucionar as controvérsias surgidas na vida cotidiana. Depois, o Estado tratou de regular e controlar o método privado de tratamento de litígios, assumindo totalmente esse controle. Ainda percorrendo a história da arbitragem, daí em diante ela passou a assumir Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos6 C03_Metodos_autocompositivos.indd 6 28/06/2018 08:16:26 papel importante no tratamento de conflitos. Existem evidências do uso da arbitragem entre os povos gregos, tanto em conflitos particulares como entre cidades-estados. Com a aprovação do CPC de 2015, a arbitragem foi formalizada como uma jurisdição no Direito brasileiro, como se pode observar no art. 3º, § 1º, que nos diz que é permitida a arbitragem na forma da lei. Porém esse instituto já possuía lei própria desdea Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996. Nem por isso, ao Poder Judiciário, por meio dos seus membros, é autorizada a discussão quanto ao mérito das decisões arbitrais. Tratam-se de jurisdições paralelas, ambas reconhecidas constitucionalmente: a jurisdição estatal, que é regulada pelas normas processuais civis, e a jurisdição arbitral, que é regulada por lei extravagante. O art. 42 do CPC confirma esse instituto como jurisdicional, dispondo que “[...] as causas cíveis serão processadas e decididas pelo órgão jurisdicional nos limites de sua competência, ressalvado às partes o direito de instituir juízo arbitral, na forma da lei” (BRASIL, 2015, documento on-line). Dessa forma, a jurisdição permite às partes optarem pela arbitragem e coloca fim à teoria que afirmava que a sentença arbitral era inconstitucional. Conforme Alem (2009), após muita discussão entre os ministros do Supremo Tribunal Federal, já em 2001, na Sentença Estrangeira nº. 5.206, decidiu-se de forma definitiva que a Lei Brasileira de Arbitragem é constitucional, tanto é que aparece no CPC de 2015. Esse CPC também apresenta a Carta Arbitral, um instituto que foi inserido por meio do art. 237 e que promove uma harmonização entre os sistemas da Justiça arbitral e da Justiça estatal. É por meio da Carta Arbitral que se darão formalmente os pedidos de cooperação entre os juízes e árbitros. Com a Carta Arbitral, é possível o cumprimento de todas as tutelas men- cionadas na Lei nº. 9.307/96, art. 22, § 4º, pois haverá integração dos juízos arbitral e estatal. No CPC de 1973 não havia citação sobre a cooperação entre os juízos arbitrais e juízos estatais, o que impossibilitava a efetivação dessas tutelas. O CPC de 2015 apresenta a regulamentação da alegação pelo réu (art. 345). A convenção de arbitragem necessita de interpelação de uma das partes para que o juiz se manifeste. Já ao réu, cabe a alegação da existência de convenção de arbitragem. A alegação de existência de cláusula arbitral deve ser feita pela parte assim que possível, sob pena de preclusão. Caso não o faça, o seu silêncio será considerado como aceitação da jurisdição estatal e, consequentemente, como renúncia ao juízo arbitral. 7Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos C03_Metodos_autocompositivos.indd 7 28/06/2018 08:16:26 Se uma das partes desobedece à essa disposição contratual e ajuíza ação perante o Poder Judiciário, cabe à outra parte alegar esse descumprimento contratual, demonstrando ao juiz a existência da convenção de arbitragem. Essa alegação se trata inclusive de hipótese prevista no inciso VII do art. 485 do CPC de 2015, como causa em que o juiz não resolverá o mérito, inserida no Título III, do Livro VI da Parte Geral do CPC, que trata da extinção do processo. A criação dessa forma específica de alegação da existência de convenção de arbitragem também é uma grande alteração do CPC de 2015. Segundo esse instituto, é raro que exista um processo arbitral que não seja sigiloso. 1. Sobre o método autocompositivo de solução de conflitos, podemos afirmar que: a) apenas os sujeitos originais em confronto é que se relacionam na busca da extinção do conflito, conferindo origem a uma sistemática de análise e solução da controvérsia autogerida pelas próprias partes. b) a intervenção é realizada por um agente exterior aos sujeitos originais na dinâmica de solução do conflito. c) fazem parte do método autocompositivo de solução de conflitos apenas a mediação e a jurisdição. d) o agente solucionador do conflito é o juiz arbitral. e) é definida como a interferência de um terceiro em uma discussão, designado judicialmente para a solução do conflito. 2. Sobre a mediação e a conciliação, é correto afirmar que: a) na mediação, o terceiro interessado é o mediador, designado pelo juízo competente. b) na mediação dos conflitos, a publicidade dos fatos é uma característica do processo, visto que o mediador precisa estudar o conflito para dar a sua opinião na resolução do problema. c) na conciliação, o conciliador não pode interferir na decisão tomada pelas partes para a resolução do problema. d) na mediação, o processo tramita de forma rápida, porém o valor das custas é igual ao valor de um processo judicial. e) na conciliação, o conciliador poderá sugerir soluções para o litígio, porém é proibido qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. 3. Quando falamos da característica autonomia das decisões no processo de mediação, estamos falando: Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos8 C03_Metodos_autocompositivos.indd 8 28/06/2018 08:16:27 a) da capacidade de aproximar as partes, pois o debate se dá com a finalidade de aproximar as partes para a solução do litígio. b) que a decisão tomada não necessita de homologação pelo Poder Judiciário, visto que as partes optam pelo melhor para si mesmas. c) da autonomia que o mediador tem para decidir o conflito. d) da preocupação em equilibrar as relações entre as partes, para que cada uma tenha a autonomia de decidir o que for melhor para si. e) que a decisão tomada na resolução do conflito tem a autonomia do Poder Judiciário, pois foi homologada pelo juiz. 4. Quando as partes envolvidas em um conflito escolhem uma pessoa, física ou jurídica, para solucionar a lide, deixando de lado o processo judicial estatal, elas optam pela: a) conciliação. b) negociação. c) arbitragem. d) mediação. e) transação. 5. Analise as afirmativas abaixo e assinale a alternativa correta. I. A arbitragem é uma forma de solução de conflitos entre indivíduos. II. Mesmo tendo iniciado a ação judicial, as partes podem se socorrer da mediação. III. O mediador é um terceiro, cuja função é escutar as partes e formular a sentença para o litígio. a) Apenas a afirmativa I está correta. b) Apenas a afirmativa III está correta. c) Apenas as afirmativas I e II estão corretas. d) Apenas as afirmativas II e III estão corretas. e) Todas as afirmativas estão incorretas. ALEM, F. P. Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2009. BARBOSA, M.; VANDERLEI, M. A. Negociação, mediação e arbitragem. Jus Navigandi, ago. 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/41477/negociacao-mediacao- -e-arbitragem>. Acesso em: 17 jun. 2018. BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 17 mar. 2015. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 14 jun. 2018. MORAIS, J. B.; SPENGLER, F. M. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018. WARAT, L. A. (Org.). Em nome do acordo: a mediação no Direito. Florianópolis: Almed, 1998. 9Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos C03_Metodos_autocompositivos.indd 9 28/06/2018 08:16:28 https://jus.com.br/artigos/41477/negociacao-mediacao- http://planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm Leituras recomendadas BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Supremo Tribunal Federal julga constitucional a Lei de Arbitragem. Notícias STF, 12 dez. 2001. Disponível em: <http://www.stf.jus. br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=58198>. Acesso em: 17 jun. 2018. SENA, A. G. Formas de resolução de conflitos e acesso à justiça. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 46, n. 76, p. 93-114, jul./dez. 2007. Disponível em: <https:// www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Adriana_Sena.pdf>. Acesso em: 17 jun. 2018. SILVA, F. S. Y. A arbitragem no novo Código de Processo Civil. DireitoNet, 30 abr. 2017. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/10141/A-arbitragem- -no-Novo-Codigo-de-Processo-Civil>. Acesso em: 17 jun. 2018. Métodos autocompositivos e heterocompositivos de tratamento dos conflitos10 C03_Metodos_autocompositivos.indd 10 28/06/201808:16:28 http://www.stf.jus/ http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Adriana_Sena.pdf https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/10141/A-arbitragem- Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. SOLUÇÃO DE CONFLITOS JURÍDICOS Martha Luciana Scholze Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar as possibilidades autocompositivas de conflitos das heterocompositivas. Definir autotutela. Descrever as características da conciliação, negociação, mediação, arbitragem e jurisdição. Introdução Além da jurisdição, que é o poder do Estado para dirimir conflitos e tomar decisões sobre direitos buscados pelas partes, existem as possibilidades autocompositivas de solução de conflitos, como a mediação e a conci- liação, que são mais céleres e menos onerosas para as partes e para o Estado. Além disso, por meio delas, muitas vezes as partes conseguem realizar acordos em que ambas saem satisfeitas. Neste capítulo, você vai estudar as possibilidades autocompositivas e heterocompostivas de solução de conflitos, explorando as caracterís- ticas e os conceitos de conciliação, negociação, mediação, arbitragem e jurisdição. Você também vai aprender sobre a autotutela e ver que, apesar de constituir crime, conforme nosso ordenamento jurídico, em alguns casos esse recurso pode ser admitido, como na legítima defesa. C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 1 28/06/2018 08:20:27 Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas de conflitos Na autocomposição, o confl ito é solucionado pelas partes, sem a intervenção de outros agentes no processo de pacifi cação. É uma forma de solução de confl itos em que os próprios confl itantes resolvem a controvérsia de modo negocial, ou seja, entram em acordo. A principal vantagem da autocom- posição é a celeridade processual, visto que as próprias partes se ajustam para solucionar o confl ito. Existem algumas formas de autocomposição, e as principais são as seguintes: Conciliação — nesse caso, é eleito um conciliador, que é responsável por aproximar as partes na tentativa de que as mesmas cheguem a um acordo. Mediação — é semelhante à conciliação; é eleito um mediador que, além de aproximar as partes, também apresenta propostas para a solução do conflito. Nesse caso, é necessário que o mediador possua conhecimento técnico para induzir as partes a um acordo. Transação — essa forma de autocomposição possui um elemento es- sencial, a res dúbia, ou coisa duvidosa. É aplicável nos casos em que existe direito objetivo, como FGTS não pago, por exemplo: o interessado tem direito, mas alega que fazia horas-extras no trabalho (essa última alegação deve ser provada, caso exista dúvida). De um modo geral, a autocomposição é admitida quando o conflito não envolve direitos intimamente ligados ao próprio modo de ser da pessoa. Esses direitos íntimos são chamados direitos de personalidade (honra, liberdade, intimidade, vida). As modalidades de autocomposição são: a renúncia, quando o titular de um direito dele se despoja, por ato unilateral seu, em favor de alguém; a aceitação (resignação/submissão), quando uma das partes reconhece o direito da outra, passando a se conduzir em consonância com esse reconhecimento; a transação, quando as partes que se consideram titulares do direito solu- cionam o conflito por meio da implementação de concessões recíprocas. Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos2 C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 2 28/06/2018 08:20:27 Lembrando que as modalidades acima podem ocorrer tanto no âmbito exclusivo da sociedade civil, classificando-se como extraprocessuais, quanto no interior de um processo judicial, enquadrando-se como endoprocessuais. Já a heterocomposição ocorre quando o conflito é solucionado por meio da intervenção de um agente exterior à relação conflituosa original. Em vez de isoladamente ajustarem a solução de sua controvérsia, as partes submetem a terceiro seu conflito, em busca de solução a ser por ele firmada ou, pelo menos, por ele instigada ou favorecida. A heterocomposição é a técnica pela qual as partes elegem um terceiro para “julgar” a lide com as mesmas prerrogativas do poder judiciário. As duas formas principais são: arbitragem (conforme a Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996) e jurisdição. No que diz respeito à arbitragem, ao escolhê-la como opção para solução do conflito, fica excluída a jurisdição, exceto se as partes desistirem da arbi- tragem. Ou seja, se o conflito, sem vício, for transitado em julgado, não será mais apreciado pelo Poder Judiciário, e em caso de impetração de ação, o juiz emitirá sentença terminativa sem julgamento de mérito, por ter sido o conflito solucionado por arbitragem. Para a utilização da arbitragem, é necessário que o bem seja disponível e patrimonial, ou seja, de valor econômico, como contratos, bens móveis e imóveis, entre outros. Tanto a autocomposição quanto a heterocomposição são solução de conflitos válidas no nosso sistema vigente, devendo ser devidamente utilizadas de forma a dirimir os conflitos de interesses existentes. Autotutela Quando há um confl ito entre duas pessoas, criado por uma causa de insatis- fação, em princípio, o Direito impõe que seja chamado o Estado-juiz para dar fi m a essa situação, o qual dirá qual a vontade do ordenamento jurídico para o caso concreto e, se for o caso, fará com que as coisas se disponham, na realidade prática, conforme essa vontade (execução). 3Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 3 28/06/2018 08:20:27 Contudo, nem sempre foi assim. Nas fases primitivas da civilização, não existia um Estado suficientemente forte para superar os ímpetos individua- listas dos homens e impor o direito acima da vontade dos particulares. Com isso, inexistia um órgão estatal que, com soberania e autoridade, garantisse o cumprimento do Direito, nem sequer havia a lei. Assim, quem pretendesse alguma coisa que outrem o impedisse de obter, haveria de, com a sua própria força, tratar de conseguir a satisfação da sua pretensão. A própria repressão aos atos criminosos se fazia em regime de vingança, sem a interposição de órgãos ou pessoas imparciais ou independentes e desinteressadas ao fato. A esse regime, chama-se de autotutela. Hoje, encarando-a do ponto de vista cultural, é fácil ver como a autotutela era precária e aleatória, pois não garantia a justiça, mas a vitória do mais forte, mais astuto ou mais ousado sobre aquele que era mais fraco ou mais tímido. Para Cintra, Grinover e Dinamarco (2014), são fundamentalmente dois os traços característicos da autotutela: ausência de juiz distinto das partes e imposição da decisão por uma das partes à outra. Em regra, a autotutela é vedada pelos ordenamentos jurídicos dos povos civilizados. É uma conduta tipificada como crime, pois consiste no exercício arbitrário das próprias ra- zões, se for um particular, e no exercício arbitrário ou abuso de poder, se for o Estado, em sentido amplo. Como mecanismo de solução de conflitos, entretanto, a autotutela ainda é vigente em alguns pontos do ordenamento, como na legítima defesa, no direito de greve, no direito de retenção e no privilégio do poder público de executar os seus próprios atos, a que se dá o nome de autoexecutoriedade, a qual é um princípio da Administração Pública. Conforme Oliveira (2013), mesmo com todo o aparato legal regulador, ainda é muito comum que existam conflitos, e nem sempre a legislação é suficiente para dirimi-los. Isso gera a insatisfação de, no mínimo, uma das partes envolvidas. Dessa forma, a autocomposição pode seraplicada para a solução dos conflitos, nos casos em que o direito seja material e disponível, e que não esteja diretamente ligado à personalidade. Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos4 C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 4 28/06/2018 08:20:27 Conciliação, negociação, mediação, arbitragem e jurisdição A conciliação é uma conversa/negociação que conta com a participação de uma pessoa imparcial para favorecer o diálogo e, se necessário, apresentar ideias para a solução do confl ito. Segundo o Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015), o conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de cons- trangimento ou intimidação para que as partes conciliem. No Brasil, conciliação e mediação são vistos como meios distintos de so- lução de conflitos. Essa visão decorre, em grande parte, da evolução histórica desses instrumentos na sociedade. O CPC reafirmou essa diferenciação em seu art. 165. Na conciliação, o terceiro facilitador da conversa interfere de forma mais direta no litígio e pode chegar a sugerir opções de solução para o conflito (art. 165, § 2º). A negociação é rotineiramente utilizada para a contratação (formação da relação jurídica) e praticamente integra a natureza humana, mas também pode ser aproveitada para a solução de divergências. Para Cahali (2017), trata- -se de um processo pelo qual duas ou mais partes, partindo de um suposto conflito, procuram obter, mediante decisão comum, um resultado melhor do que teriam obtido por outros meios. Negociam com trocas de vantagens e diminuição de perdas, aproveitam oportunidades e situações de conforto e, com isso, esperam um resultado que deve propiciar ganhos recíprocos, em condições mutuamente aceitáveis; caso contrário, o acordo será rejeitado por uma das partes. A negociação pode ser dividida em negociação por princípios e negociação posicional. A negociação posicional é aquela cujos negociadores se tratam como oponentes, o que implica pensar na negociação em termos de um ganhar e outro perder. O negociador pressiona ao máximo e cede o mínimo possível. Tem um olhar para determinado foco, é polarizado em uma das partes e proporciona prejuízos na relação social dos envolvidos, pois uma parte se sente cedendo à intransigência da outra. Já a negociação por princípios induz que os negociadores busquem saídas que não dependam do outro lado para ficar numa situação mais confortável durante a negociação. A honestidade e a busca por um acordo que satisfaça aos dois lados são apontados como características desse método. 5Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 5 28/06/2018 08:20:27 A negociação por princípios, ou negociação baseada em méritos, sugere obtenção de resultados sensatos e justos, em que são abordados os interesses reais dos envolvidos, não as suas posições. Essa negociação deverá passar por quatro fases: separação das pessoas dos problemas; foco nos interesses, não em posições; geração de opções de ganhos mútuos; utilização de critérios objetivos. A mediação, por sua vez, costuma representar um procedimento mais longo, em que, às vezes, são necessárias diversas sessões para que as partes consigam restabelecer o diálogo perdido. A indicação da mediação pressupõe que as partes em conflito têm uma relação mais intensa e prolongada, podendo esse relacionamento consistir tanto em vínculos pessoais quanto jurídicos. O foco na mediação é o conflito, e não a solução. Na mediação, com o tratamento às partes, pretende-se o restabelecimento de uma convivência com equilíbrio de posições, independentemente de se chegar a um acordo, embora este seja naturalmente desejado. Utiliza-se a mediação para conflitos com elementos subjetivos marcantes, como nas relações familiares e na dissolução de empre- sas. É sugerida igualmente em outras relações continuadas, como relações de vizinhança, contratos de franquias, etc. Na arbitragem há, de fato, uma decisão proferida por um terceiro neu- tro, que terá natureza declaratória, constitutiva, condenatória ou até mesmo mandamental. A decisão arbitral se equipara, por determinação legal, a uma decisão judicial, e constitui título executivo judicial. Existem alguns princípios norteadores básicos da arbitragem que devem ser considerados por todos que têm interesse em entender o seu funcionamento e a sua aplicação: autonomia da vontade e autonomia privada; livre eleição da lei aplicável, desde que não haja violação dos bons costumes e da ordem pública; possibilidade de aplicação de jurisdição por equidade ou princípios gerais do Direito; Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos6 C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 6 28/06/2018 08:20:27 devido processo legal (princípio de igualdade, contraditório, de ampla defesa, de imparcialidade e independência jurídica dos árbitros, de livre convencimento motivado dos árbitros, dentre outros princípios constitucionais); efeito vinculante da cláusula arbitral – a arbitragem é obrigatória entre as partes que fazem parte do negócio jurídico; inevitabilidade dos efeitos da sentença arbitral, fazendo coisa julgada material e constituindo título executivo judicial; autonomia entre cláusula compromissória e contrato (eventual irre- gularidade ou invalidade do contrato não invalida a cláusula compro- missória); e competência-competência, que confere ao árbitro a autoridade para analisar a sua própria competência. A jurisdição se caracteriza como a capacidade que o Estado tem de decidir imperativamente e impor decisões. O poder estatal abrange a capacidade de dirimir os conflitos que envolvem as pessoas, inclusive o próprio Estado, decidindo sobre as pretensões apresentadas e impondo as decisões. Pela juris- dição, os juízes agem em substituição às partes, que não podem fazer justiça com as próprias mãos. A elas, que não podem mais agir, resta a possibilidade de fazer agir, provocando o exercício da função jurisdicional. Como a jurisdição se exerce por meio do processo, para Cintra, Grinover e Dinamarco (2014), pode-se provisoriamente conceituar a jurisdição como o instrumento por meio do qual os órgãos jurisdicionais atuam para paci- ficar as pessoas conflitantes, eliminando os conflitos e fazendo cumprir o preceito jurídico pertinente a cada caso que lhes é apresentado, em busca de solução. Em resumo, a jurisdição é a função típica do Poder Judiciário, que será exercida pela aplicação da lei ao caso concreto a fim de solucionar conflitos entre as partes. O que distingue a jurisdição das demais funções do Estado (legislação, administração) é, fundamentalmente, a finalidade pacificadora com que o Estado a exerce. A pacificação é o escopo máximo da jurisdição e, por con- sequência, de todo o sistema processual. É um escopo social, uma vez que se relaciona com o resultado do exercício da jurisdição perante a sociedade e sobre a vida de seus membros. 7Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 7 28/06/2018 08:20:28 Os temas da mediação, arbitragem, conciliação e negociação podem ser encontrados em diversos trabalhos científicos. A dica de leitura é o trabalho de conclusão de curso de Liliane Barbosa Barreto intitulado A problemática das comissões de conciliação prévia, disponível no link a seguir. https://goo.gl/sfBx8p A mediação, a conciliação e a arbitragem são meios céleres de resolução de conflitos. A mediação, por exemplo, é muito utilizada em situações de Direito de Família, nas quais a celeridade do processo interessa a todas as partes, como na guarda dos filhos, na decisão sobre pagamentos de alimentos, na regulamentação devisitas, etc. A celeridade desse tipo de processo interessa a todas as partes. 1. Sobre o método heterocompositivo de solução de conflitos, podemos afirmar que: a) o conflito é solucionado pelas partes, sem a intervenção de outros agentes no processo de pacificação. b) é uma forma de solução de conflitos em que os próprios conflitantes resolvem a controvérsia de modo negocial, ou seja, entram em acordo. c) é admitido sempre que não se trate de direitos intimamente ligados ao próprio modo de ser da pessoa. d) os principais exemplos são a mediação e a conciliação. e) ocorre quando o conflito é solucionado por meio da intervenção de um agente exterior à relação conflituosa original. 2. Sobre a autotutela, é correto afirmar que: a) é o mecanismo mais utilizado quando o Poder Judiciário não encontra meios de julgar um conflito. b) nos dias atuais, é a forma encontrada por aqueles que pretendem obter alguma coisa, para conseguir obtê-la. Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos8 C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 8 28/06/2018 08:20:29 https://goo.gl/sfBx8p c) é uma conduta, em regra, tipificada como crime, pois não se pode realizar o exercício arbitrário das próprias razões. d) não é aceita em hipótese alguma. e) do ponto de vista cultural, é a forma mais estável de resolução de conflitos. 3. Sobre a negociação, analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa correta. I. É um processo em que duas ou mais partes, partindo de um suposto conflito, procuram obter, mediante decisão comum, um resultado melhor do que teriam obtido por outros meios, além de negociar com trocas de vantagens e diminuição de perdas. II. Pode-se afirmar que a negociação integra a natureza humana, visto que sempre estamos em via de negociações. III. A negociação por princípios sugere obtenção de resultados sensatos e justos, em que são abordados os interesses reais dos envolvidos, e não as suas posições. a) Apenas a afirmativa II está correta. b) Apenas a afirmativa III está correta. c) Apenas as afirmativas I e III estão corretas. d) As afirmativas I, II e III estão corretas. e) Apenas as afirmativas I e II estão corretas. 4. Sobre a arbitragem, é correto afirmar que: a) utiliza-se para conflitos com marcantes elementos subjetivos, como nas relações familiares e em outras relações continuadas, como relações de vizinhança, contratos de franquias, etc. b) o árbitro atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, pois assim saberá qual lado do conflito merece melhor atenção e poderá sugerir soluções para o litígio. c) sua sentença se equipara a uma decisão judicial e constitui título executivo judicial. d) é princípio da arbitragem a livre eleição da lei aplicável, podendo violar a ordem pública. e) não há a possibilidade de aplicação de jurisdição por equidade ou princípios gerais do Direito. 5. No que diz respeito à jurisdição, é correto afirmar que: a) é o poder estatal que abrange a capacidade de dirimir os conflitos, decidindo sobre as pretensões apresentadas e impondo as decisões. b) o conflito é o propósito máximo da jurisdição. c) a função jurisdicional é, principalmente, avaliar as condições de conflito que as partes apresentam. d) é o poder da iniciativa privada para dirimir conflitos, decidindo por meio de árbitros as situações conflitantes que as partes apresentam. e) na jurisdição, os juízes avaliam as situações de conflitos que a justiça pelas próprias mãos e a autodefesa não conseguiram solucionar. 9Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 9 28/06/2018 08:20:29 BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 17 mar. 2015. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 14 jun. 2018. CAHALI, F. J. Curso de arbitragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. CINTRA, A. C. A.; GRINOVER, A. P.; DINAMARCO, C. R. Teoria geral do processo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2014. OLIVEIRA, G. C. Técnicas de solução de conflitos: autocomposição e heterocomposição. Conteúdo Jurídico, Brasília, 19 dez. 2013. Disponível em: <http://www.conteudojuridico. com.br/?artigos&ver=2.46327&seo=1>. Acesso em: 10 jun. 2018. Leituras recomendadas ALEM, F. P. Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2009. MORAIS, J. B.; SPENGLER, F. M. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018. Possibilidades autocompositivas e heterocompositivas para tratar os conflitos10 C05_Possibilidades_autocompositivas.indd 10 28/06/2018 08:20:29 http://planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm http://www.conteudojuridico/ http://com.br/?artigos&ver=2.46327&seo=1 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. INSTITUIÇÕES DO PROCESSO CIVIL Rafael Ribeiro Revisão técnica: Miguel do Nascimento Costa Advogado Mestre em Direito Público Especialista em Processo Civil Graduado em Ciências Sociais e Jurídicas Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin CRB – 10/2147 I59 Instituições do processo civil / Rafael Ribeiro Albuquerque Adrião... et al.; [revisão técnica: Miguel do Nascimento Costa]. – Porto Alegre: SAGAH, 2018. 374 p. : il. ; 22,5 cm. ISBN 978-85-9502-451-9 1. Direito processual civil. I. Adrião, Rafael Ribeiro Albuquerque. CDU 347.9 Audiência preliminar de conciliação ou mediação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Distinguir conciliação de mediação e arbitragem. Apontar a importância atual de estudo sobre as formas consensuais de solução de controvérsias. Analisar as normas processuais acerca da audiência de conciliação ou de mediação. Introdução Não é novidade que o Judiciário está lento e que essa lentidão, em maior parte, se deve à grande quantidade de processos que existem para julga- mento, fazendo com que as varas judiciais fiquem superlotadas. Tendo em vista esse problema, o Código de Processo Civil (CPC) de 2015 (BRASIL, 2015a) traz o pensamento sobre a importância dos meios extrajudiciais para solução dos conflitos. Com esse novo Código, o legislador resolveu fomentar os meios para possibilitar que as partes resolvam os conflitos. Foi percebido que grande parte das lides poderiam ser resolvidas se as partes tivessem uma oportunidade de conversar, sem que fosse necessária a direta intervenção do Judiciário, proferindo uma sentença. Com isso, foram promovidas as ideias das audiências de conciliação e mediação para o processo. Neste capítulo, você vai aprender a diferenciar a audiência de conci- liação, de mediação e de arbitragem; vai estudar a importância desses institutos e vai analisar como elas devem ocorrer dentro do processo civil. Diferença entre conciliação, mediação e arbitragem Para que se entenda como funcionam os meios de solução extrajudicial de confl itos trazidos no Código de Processo Civil de 2015, é de extrema impor- tância que se entenda as diferenças entre as audiências de conciliação, de mediação e de arbitragem, pois apenas dessa forma será possível se entender o procedimento processual de cada uma delas. Iniciaremos os estudos analisando, as diferenças existentes entre a audiência de conciliação e de mediação e posteriormente será analisada a arbitragem, por ser um procedimento que tem maiores peculiaridades. É importante salientar que essas audiências (conciliação e mediação) podem ocorrer tanto por meio extrajudicial como por meio judicial e que, nesse caso, apenas vai surgir no rito comum, não sendo sua utilização obrigatória nos ritos especiais. O que até 2014 era considerado exceçãonos trâmites processuais, a partir de 2015 passou a ser a regra e o caput do art. 334 do CPC diz que deve o juiz marcar uma audiência de conciliação ou mediação antes mesmo da apresen- tação de defesa do réu. Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência (BRASIL, 2015a, documento on-line). Entretanto, como saber se a audiência que vai ser marcada deve ser de conciliação ou de mediação? A resposta para essa pergunta está no art. 165 do CPC (BRASIL, 2015a), que fala sobre os conciliadores e mediadores judiciais. Pela leitura desse artigo, é possível separar quando deve ser utilizado cada tipo de audiência. A audiência deve ser de conciliação quando antes do processo não existia vínculo entre os envolvidos, podendo o conciliador sugerir soluções para o litígio, como determina o § 2º do referido artigo. Art. 165. [...] § 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem (BRASIL, 2015a, documento on-line). Audiência preliminar de conciliação ou mediação2 Nesse caso, as partes vão chegar a uma decisão, podendo o conciliador apontar possíveis soluções para o conflito, mas cabendo a elas a escolha. A conciliação deve ser utilizada, por exemplo, na hipótese de uma colisão entre dois veículos em que as pessoas não se conheciam antes do processo. O caso da mediação, por sua vez, está previsto no § 3º do artigo em ques- tão e deve ser utilizado quando existe um vínculo anterior entre as partes. O mediador, diferente do conciliador, não pode apresentar soluções para o conflito, deve ele propiciar um ambiente favorável à comunicação entre as partes, para que elas possam chegar à solução do conflito. Art. 165. [...] § 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos (BRASIL, 2015a, documento on-line). Verifica-se que, na mediação, também são as partes que decidem pela solução do conflito e o mediador apenas vai ajudá-las a conversar. Diante de tal explicação, fica fácil de se vislumbrar a mediação sendo utilizada para solucionar conflitos de família, conflitos entre locador e locatário, questões referentes a condomínio, ou seja, sempre que antes do processo já existia uma relação entre as partes, facilitando, assim, a comunicação. Resta claro, portanto, que a principal diferença entre esses dois tipos de audiência é a existência ou não de uma relação anterior entre as partes. A arbitragem, por sua vez, é um meio apenas de solução extrajudicial e normalmente é utilizada no âmbito empresarial. Nesse procedimento, caberá às partes escolherem um árbitro ou um tribunal arbitral, que vai ficar responsável por ouvir as partes e seguindo as regras estabelecidas no manual de procedimento arbitral das centrais de conciliação, mediação e arbitragem proferir uma decisão que terá força de decisão judicial. 3Audiência preliminar de conciliação ou mediação Diferente do que acontece na conciliação e na mediação, em que cabe às partes solucionar o conflito, na arbitragem será o árbitro quem vai fazê-lo, podendo, inclusive, utilizar-se da carta arbitral para garantir o cumprimento da decisão. Para facilitar a memorização desses três procedimentos, você vai ver, a seguir, as principais diferenças entre essas três audiências. Conciliação – art. 165, § 2º, do CPC (BRASIL, 2015a): não existe vínculo anterior entre as partes. ■ Exemplo: acidente de trânsito. Mediação: existe vínculo anterior entre as partes. ■ Exemplo: discussão de aluguel entre locador e locatário. Arbitragem: as partes previamente ajustaram que os conflitos seriam resolvidos por juiz arbitral. A importância das formas consensuais de solução de controvérsias Quando se fala na solução de confl itos, é normal se pensar em um juiz emitindo uma sentença de mérito, que vai solucionar a demanda que existe entre duas partes. Esse tipo de pensamento é justifi cável, posto que, historicamente, se vem de uma caminhada em que o Estado busca para si o poder de solução de confl itos. Ocorre, no entanto, que esse movimento em que o Estado puxou para si o direito exclusivo para a solução dos conflitos surgiu em decorrência do momento social que se vivia, no qual o costume era a solução por meio da força. Nesse momento, para garantir uma segurança social, não tinha o Estado outra alternativa, senão puxar para si a exclusividade desse poder. No momento atual, por sua vez, o problema enfrentado já é diferente. Vive-se um momento em que as pessoas perderam a capacidade de solucionar seus problemas sem a necessidade de uma intervenção judicial, criando, desse modo, um Judiciário sobrecarregado de processos. Segundo números do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (SOUZA, 2017), em 2016, apenas 27% dos processos em tramitação no Brasil foram solucio- nados, deixando um congestionamento de 73% ainda esperando para trami- tação. Como se não bastasse a baixa taxa de solução processual, o número de processos entre 2015 e 2016 passou de 76,9 milhões para 79,7 milhões, ou seja, um aumento de quase 2 milhões de processos (Figura 1). Audiência preliminar de conciliação ou mediação4 Figura 1. Raio-X do Judiciário. Fonte: Souza (2017). 5Audiência preliminar de conciliação ou mediação Como pode se observar, o crescente número de processos acarreta não ape- nas varas superlotadas e processos com tramitação demorada, mas também um gasto estratosférico que precisa ser arcado pelos cofres públicos. Diante desses números, muitos juristas vêm estudando e fomentando a ideia de utilização das chamadas ADRs (alternative dispute resolutions), ou meios alternativos de solução de conflitos, em que é conferida às partes a possibilidade de tentar solucionar os conflitos existentes, sem uma intervenção jurisdicional direta. Esse tipo de solução de conflitos vem sendo estudado nos Estados Unidos desde a década de 90 e vem ganhando forças no ordenamento jurídico brasileiro. O CPC de 2015 (BRASIL, 2015a) e a Lei nº 13.140/2015 (BRASIL, 2015b), vulgo Lei da Mediação, são exemplos da força que vem ganhando a busca por meios alternativos de solução de conflitos. É importante ressaltar que a busca por meios alternativos de resolução de conflitos não representa uma restrição do direito de acesso à Justiça, posto que esses meios não são condição para que se possa ingressar com ações judiciais. Esses meios são apenas tentativas de desafogar o Judiciário e, com isso, conseguir que as lides sejam resolvidas de modo mais célere. Mostra-se claro, portanto, que, diante do grande número de processos judiciais, a busca por meios alternativos que possibilitem às partes resolverem seus conflitos sem precisar de uma sentença judicial é não só indicada como necessária, uma vez que, da forma como as coisas estão caminhando, cada dia mais os processos demorarão para serem julgados, comprometendo, dessa forma, o cumprimento de princípios básicos, como a razoável duração do processo e a própria dignidade da pessoa humana, já que um processo que demora anos para ser julgado muitas vezes não consegue atingir seu objetivo principal, que é conseguir realizar o direito buscado pelas partes. As normas processuais da conciliação e da mediação Agora que você já entende qual a importância dos meios de solução alternativos para o processo civil, passaremos a estudar como esses institutos devem ser aplicados
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