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Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS TEORIA E PRÁTICA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA Autora: Anelise Donaduzzi 370.15 D674t Donaduzzi; Anelise Teoria e prática da psicopedagogia clínica/ Anelise Donaduzzi : UNIASSELVI, 2016. 137 p. : il. ISBN 978-85-69910-13-8 1.Psicopedagogia. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Bárbara Pricila Franz Profa. Cláudia Regina Pinto Michelli Prof. Ivan Tesck Profa. Kelly Luana Molinari Corrêa Revisão de Conteúdo: Profa. Fernanda Germani de Oliveira Chiaratti Revisão Gramatical: Profa. Sandra Pottmeier Revisão Pedagógica: Bárbara Pricila Franz Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci Copyright © Editora Grupo Uniasselvi 2016 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. UNIASSELVI – Indaial. Possui graduação em Educação Especial pela Universidade Federal de Santa Maria (1990), Pós Graduação em Psicopedagogia (1999), Pós Graduação em Alfabetização (1995) e mestrado em Educação pela Universidade do Vale do Itajaí (2003). Atualmente é psicopedagoga clínica em Blumenau, professor autor da Fundação Universidade Regional de Blumenau, professor do Instituto de Pós Graduação e Extensão e professor do Instituto Catarinense de Pós- Graduação. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Especial e Psicopedagogia, atuando principalmente nos seguintes temas: psicopedagogia clínica, difi culdade de aprendizagem, educação especial, inclusão, alfabetização. Anelise Donaduzzi Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................ 7 CAPÍTULO 1 A História da Psicopedagogia Clínica: uma prática em construção ........................................................ 9 CAPÍTULO 2 O Processo de Investigação Clínica: o diagnóstico psicopedagógico ............................................... 27 CAPÍTULO 3 A Intervenção Psicopedagógica Clínica: Ressignificando o Aprender ..................................................... 89 CAPÍTULO 4 Perfil, Competências e Habilidades do Psicopedagogo Clínico ...................................................... 123 APRESENTAÇÃO Caro(a) pós-graduando(a): Bem-vindo à disciplina de Teoria e Prática da Psicopedagogia Clínica. Este é o nosso caderno de estudos, material elaborado com muito carinho, com o objetivo de contribuir para a realização dos seus estudos e para a ampliação de seus conhecimentos sobre a Psicopedagogia Clínica. Os capítulos foram organizados de forma didática e complementar. Eles apresentam as informações básicas, com algumas questões para sua reflexão e indicam outras referências que irão complementar seus estudos. O primeiro capítulo trata da história da psicopedagogia clínica, abordando os conceitos fundamentais para a prática psicopedagógica. Em seguida, no segundo capítulo, abordaremos as questões pertinentes ao diagnóstico avaliativo psicopedagógico: em quê consiste este diagnóstico, quais as abordagens que fundamentam essa prática e quais os instrumentos que a área da psicopedagogia dispõe para a realização de uma avaliação psicopedagógica. Fecharemos este capítulo com a apresentação de um caso para ilustrar o que foi discutido anteriormente. No terceiro capítulo, discutiremos sobre a intervenção psicopedagógica na perspectiva preventiva e terapêutica. Analisaremos as principais metodologias e os principais instrumentos disponíveis para a realização da prática psicopedagógica na proposta interventiva. Novamente, encerraremos o capítulo com a apresentação de um caso clínico a fim de relacionar a teoria com a prática psicopedagógica. Finalmente, no último capítulo, fecharemos o nosso caderno com a discussão sobre o perfil, as competências e as habilidades que o psicopedagogo clínico deve desenvolver para o exercício pleno do seu trabalho. Levaremos você, caro (a) aluno (a), à reflexão (ou a refletir) sobre a postura e habilidades pessoais inerentes à prática da psicopedagogia. Espero que esse caderno corresponda às suas expectativas. Desejo a você um bom trabalho e que aproveite ao máximo o estudo dos temas abordados nesta disciplina! A autora. CAPÍTULO 1 A História da Psicopedagogia Clínica: uma prática em construção A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Conhecer a história da psicopedagogia clínica; Compreender os principais conceitos que fundamentam a prática da psicopedagogia clínica; Relacionar os conceitos da psicopedagogia clínica com a sua prática. 10 Teoria e prática da psicopedagogia clínica 11 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 ConteXtualiZação Atualmente, a psicopedagogia é um campo do saber amplamente conhecido e divulgado. No contexto escolar, hoje em dia, é muito comum haver uma parceria entre a escola e o profi ssional da psicopedagogia, principalmente no trabalho com alunos com difi culdades de aprendizagem. Acredito que você, aluno, já deva ter ouvido diversas pessoas se referirem à psicopedagogia, não é mesmo? Mas, nem sempre foi assim... Podemos dizer que esta área do conhecimento ainda é relativamente nova e seu corpo teórico encontra-se em permanente construção. Esse saber não está pronto e acabado, uma vez que dialoga constantemente com as outras áreas do conhecimento e recebe infl uência direta delas. Afi rmamos então, que a psicopedagogia é uma área do conhecimento multidisciplinar por receber infl uência e infl uenciar outras áreas, tais como a psicologia, a psicanálise, a linguística, a sociologia, a pedagogia, a neurologia, entre outras. Por esta razão, a psicopedagogia, desde os seus primórdios no Brasil, passou por várias fases na sua atuação, marcada pelas diferentes concepções que embasaram sua prática. Então, neste capítulo, aprofundaremos o nosso conhecimento sobre a trajetória da psicopedagogia no Brasil, até chegarmos ao momento atual. Discutiremos, também, os principais conceitos que se encontram presentes no fazer psicopedagógico. Com certeza, teremos um importante caminho de refl exões e discussões pela frente. Prontos para darmos início a essa jornada? A Psicopedagogia Clínica e sua História A maioria das produções científi cas que discutem as ações da psicopedagogia, seja no âmbito educacional ou clínico, foca a sua análise no processo de aprendizagem ou, mais especifi camente, na análise dos problemas de aprendizagem. Tal fato está intimamente relacionado às próprias origens da psicopedagogia enquanto área do conhecimento. De acordo com Bossa (2011, p. 20), “a psicopedagogia nasceu de uma necessidade: contribuir na busca de soluções para a difícil questão do problema de aprendizagem.” Portanto, seu surgimento respondeu, em primeira instância, a necessidade de melhor compreender as Necessidade de melhor compreender as difi culdades decorrentes do processo de aprendizagem. 12 Teoria e prática da psicopedagogia clínica difi culdades decorrentes do processo de aprendizagem, para evitar ou tratar os problemas que por ventura pudessem surgir. Num primeiro momento, as ações da psicopedagogia priorizavam, geralmente, a dimensão individual e cognitiva no processo de aprendizagem, pois a aprendizagem era concebida como um fenômeno que ocorria no interior do sujeito. O papel social, da família e das interações entre sujeitos e seu processo de aprendizagem, acabavam não sendo levados em consideração ou eram deixados para um segundo plano. Para compreendermos melhor, vamos buscar as origens destadiscussão... A preocupação com o fracasso escolar e, consequentemente, com as difi culdades de aprendizagem é relativamente recente. Somente com a chegada da Revolução Industrial, houve preocupação com a produtividade e com tudo o que pudesse atrapalhar o desempenho dos funcionários e o ritmo de produção. Segundo Cordié (1996, p.17), “o fracasso escolar é uma patologia recente. Só pôde surgir com a instauração da escolaridade obrigatória no fi m do século XIX e tomou um lugar considerável nas preocupações de nossos contemporâneos em conseqüência de uma mudança radical na sociedade”. Desde então, a escola passa a ser valorizada como um instrumento de ascensão e de prestígio social. Entre algumas famílias, a possibilidade de uma escolarização com sucesso passou a ser a única forma de vislumbrar um futuro promissor. A partir daí e cada vez mais, os alunos com algum tipo de difi culdade na escola passaram a ser vistos como os que possivelmente poderiam também, fracassar na vida. Neste contexto, as difi culdades de aprendizagem se tornam o foco de atenção de várias áreas, principalmente da Medicina, que começa a estudar a causa dos problemas e suas possíveis correções. A Oftalmologia, a Neurologia, a Psiquiatria eram algumas das áreas da Medicina que se ocupavam com esses estudos. Já no início do século XX, com a primeira guerra mundial em andamento na época, existia a oportunidade de se descobrir, no cérebro dos guerrilheiros atingidos, a relação das áreas cerebrais danifi cadas com as funções que apareciam prejudicadas. Tais descobertas acabaram por alavancar maiores pesquisas e publicações na área, chamando atenção de vários profi ssionais, entre eles educadores. Neste sentido, podemos destacar os trabalhos de Janine Mery (1985), psicopedagoga francesa que apresenta algumas considerações sobre o termo psicopedagogia e sobre a origem dessas ideias na Europa. De acordo com a 13 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 autora, os primeiros Centros Psicopedagógicos foram fundados na Europa, a partir da segunda metade do século XX, e objetivavam, a partir da integração de conhecimentos pedagógicos, psicanalíticos e da medicina, encontrar soluções para os problemas de comportamento e de aprendizagem. Desde a sua fundação, estes centros apoiavam-se nas áreas médica e pedagógica. Mery (1985) adotou o termo “Pedagogia Curativa” para caracterizar uma ação terapêutica que considerava aspectos pedagógicos e psicológicos no tratamento de crianças com problemas de aprendizagem. Método este, que favorecia a readaptação pedagógica do aluno. Segundo ela, tais crianças “experimentam difi culdades ou demonstram lentidão em relação aos seus colegas no que diz respeito às aquisições escolares” (MERY, 1985, p. 16). O nascimento da Psicopedagogia A Psicopedagogia nasceu na Europa, ainda no século XIX. Inicialmente, pensaram sobre o problema de aprendizagem: os fi lósofos, os médicos e os educadores. Na literatura francesa – encontra-se, entre outros, os trabalhos de Janine Mery, psicopedagoga francesa, que apresenta algumas considerações sobre o termo Psicopedagogia e sobre a origem dessas idéias na Europa, e os trabalhos de George Mauco, fundador do primeiro centro médico-psicopedagógico na França onde se percebe as primeiras tentativas de articulação entre Medicina, Psicologia, Psicanálise e Pedagogia, na solução dos problemas de comportamento e de aprendizagem. Janine Mery (1985) aponta o século XIX como aquele em que teve início o interesse por compreender e atender portadores de defi ciências sensoriais, debilidade mental e outros problemas que comprometessem a aprendizagem. Segundo essa autora, no fi nal do século XIX, educadores como Itard, Pereire, Pestalozzi e Seguin começaram a se dedicar às crianças que apresentavam problemas de aprendizagem em razão de vários tipos de distúrbios. Jean Itard mobilizou-se com o caso da reeducação de um enfant sauvage, Victor, uma história exemplar sob vários aspectos, entre outros pelo choque que esse ser real representava aos olhos do ideal romântico rousseauniano. Pestalozzi, inspirado nas idéias de Rousseau, fundou na Suíça um centro de educação através do trabalho, onde usou o método intuitivo e natural, estimulando, em especial, a percepção. Educadores como Pereire, Itard e Seguin também se preocuparam, principalmente, com a percepção. Mery aponta esses educadores como pioneiros no tratamento dos problemas de aprendizagem, 14 Teoria e prática da psicopedagogia clínica observando porém, que eles se preocupavam mais pelas defi ciências sensoriais e pela debilidade mental do que propriamente pela desadaptação infantil. Fonte: extraído de Revista de Psicologia: Interface Educação – “Análise Histórica do surgimento da Psicopedagogia no Brasil”. Fonte: Disponível em: <http://idonline.emnuvens.com.br/id/ article/download/234/258>. Acesso em: 10 abr. 2016. Enfant sauvage, termo francês, que signifi ca criança selvagem. São crianças que desde os primeiros anos de vida passaram a viver isoladas da humanidade. Por algum motivo, foram privadas do convívio sócio-cultural apropriado para o desenvolvimento intelectual e afetivo. Nessa mesma época, nos Estados Unidos, o mesmo movimento acontecia, porém enfatizava mais os conhecimentos médicos, dando um caráter organicista à preocupação com as difi culdades de aprendizagem. O movimento europeu acabou por originar a Psicopedagogia, enquanto que o movimento americano proliferou a crença de que os problemas de aprendizagem possuíam causas orgânicas e precisavam de atendimento especializado, infl uenciando parte do movimento da Psicologia Escolar que, até bem pouco tempo, determinou a forma de tratamento dada ao fracasso escolar (BOSSA, 2011). A corrente europeia infl uenciou a Argentina, que passou a tratar das pessoas com difi culdade de aprendizagem, há mais de 30 anos, realizando um trabalho na perspectiva reeducativa. “Trabalhavam-se as funções egoicas, como memória, percepção, atenção, motricidade e pensamento, medindo-se os défi cits e elaborando-se planos de tratamento que objetivavam vencer essas faltas” (BOSSA, 2011, p. 62-63). Nesta mesma época (1956), surge em Buenos Aires, a primeira graduação em Psicopedagogia, que também passou por diversas transformações ao longo dos anos. Na década de 1970, houve a criação dos primeiros Centros de Saúde Mental, na cidade de Buenos Aires, na Argentina. Juntamente com outros profi ssionais, O movimento europeu acabou por originar a Psicopedagogia. 15 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 os psicopedagogos atuavam fazendo o diagnóstico e o tratamento nos casos de problemas de aprendizagem. Neste período, houve uma grande mudança na práxis psicopedagógica: os psicopedagogos começaram a incluir o olhar e a escuta clínica da psicanálise no seu trabalho, por perceberem que somente um olhar médico e pedagógico não dava conta da diversidade de situações envolvidas no trabalho. Com isso, então, o perfi l do psicopedagogo muda de uma postura reeducativa para adquirir um olhar mais abrangente sobre o sujeito e o sintoma do não-aprender (BOSSA, 2011). No Brasil, a ideia vigente por muito tempo era de que os problemas de aprendizagem seriam consequências de fatores orgânicos, tendo como causa principal “[...] uma disfunção neurológica não detectável em exame clínico, [...] chamada de disfunção cerebral mínima (DCM)” (BOSSA, 2011, p. 76). Tal concepção, organicista e patologizante, foi amplamente difundida e utilizada na intenção de rotular todo e qualquer aluno que não conseguisse aprender dentro do esperado. Foi no fi nal da década de 1970, impulsionado por essa concepção de problemas de aprendizagem na escola, que surgiram os primeiros cursos de especialização em Psicopedagogia no Brasil. Eles foram pensados e idealizados para complementar a formação de psicólogos e educadores interessados em pensarnas alternativas e soluções para estes problemas. O primeiro curso surgiu na Clínica Médico-Pedagógica de Porto Alegre e tinha a duração de dois anos. Podemos dizer que, assim como a literatura francesa infl uenciou as ideias sobre psicopedagogia na Argentina, as ideias presentes neste país, infl uenciaram o surgimento e a construção da psicopedagogia no nosso país. Portanto, o movimento da psicopedagogia no Brasil, remete as concepções e práticas trazidas da Argentina. Alguns autores e psicopedagogos argentinos marcaram fortemente os ideais teóricos e constituíram os primeiros esforços para a divulgação e difusão da psicopedagogia no Brasil. Dentre estes autores, podemos citar: Sara Paín, Alícia Fernandez, Jorge Visca, entre outros. Sugiro a leitura do livro da Nádia Bossa (2011), “A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática”, para que você possa conhecer mais profundamente a história do surgimento da psicopedagogia. Este livro aborda várias questões importantes para todos os que estão inseridos nesta área. O movimento da psicopedagogia no Brasil, remete as concepções e práticas trazidas da Argentina. 16 Teoria e prática da psicopedagogia clínica A seguir veremos uma breve evolução histórica da Psicopedagogia no Brasil: Quadro 1 – Psicopedagogia no Brasil 1979 Em 1979, foi criado o primeiro curso de psicopedagogia no Instituto Sedes Sapien- tiae, em São Paulo, pela pedagoga e psicodramatista Maria Alice e pela diretora do Instituto Madre Cristina Sodré. O objetivo desse curso era valorizar a ação do educador. Ele começou abordando o tema da reeducação em psicopedagogia, de- pois assumiu um caráter terapêutico com aprofundamento nos aspectos afetivos da aprendizagem (BOSSA, 2011). 1979/1980 No Rio Grande do Sul, a PUC realizou cursos de especialização relacionados a re- educação em linguagem em 1979/80 e curso de psicoeducação em 1982/83. Ela mantém, ainda, desde 1972 a área de concentração em aconselhamento psicopeda- gógico dentro do curso de pós-graduação em Educação. 1980 A Associação Brasileira de Psicopedagogia, com sede em São Paulo, foi fundada no final de 1980, com a finalidade de promover o aperfeiçoamento de seus associados e a qualidade da prática psicopedagógica mediante a realização de cursos e de en- contros científicos. Além disto, começou a publicação de um periódico especializado na área, com o objetivo de trocar experiências e conhecimentos teóricos entre os associados. Devemos enfatizar aqui os estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul como os grandes pioneiros em formação e qualificação de profissionais em psicopedagogia. A partir destes estados é que houve a divulgação da profissão e de cursos para os outros estados do Brasil. 1984 Em novembro de 1984, aconteceu o primeiro encontro de psicopedagogia em São Paulo, inaugurando uma nova etapa no nosso país. Neste encontro, as psicopeda- gogas Clarissa Golbert e Sonia Kiguel apresentaram trabalhos demonstrando e dis- cutindo as atividades dos psicopedagogos de Porto Alegre. A partir deste evento foi fundado um Grupo de Estudos em Psicopedagogia que se reunia mensalmente, com o objetivo de discutir as questões pertinentes ao fazer psicopedagógico. A partir des- tes encontros criou-se a Associação Brasileira de Psicopedagogia – capítulo gaúcho. Década de 1990 Somente na década de 1990, os cursos de especialização Lato Sensu se multiplica- ram, surgindo cursos por mais estados brasileiros. Hoje, podemos dizer que a psico- pedagogia está presente em todo o território nacional, seja através da sua atuação em vários campos ou de cursos de especialização e aperfeiçoamento. Fonte: Elaborado pela autora. 17 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 Ao longo destes anos todos, desde que se começou a falar em psicopedagogia no Brasil, até os dias de hoje, a forma de conceber o fracasso escolar e os problemas de aprendizagem mudaram signifi cativamente: passaram de uma concepção organicista, que explicava tais problemas como resultado de condições orgânicas para uma abordagem que concebe a aprendizagem como resultado de múltiplos fatores, dentre eles, emocional, social, relacional. Neste sentido, o “não aprender” assume um novo sentido e deixa de ser compreendido como uma falta. Para você pesquisar e se aprofundar sobre o exercício da psicopedagogia no Brasil, sobre a luta da classe dos psicopedagogos para regularizar a profi ssão, além de ter acesso a vários textos e publicações científi cas da área, acesse o site da Associação Brasileira de Psicopedagogia: <http://www.abpp.com.br/>. Lá você terá informa- ções muito importantes sobre a psicopedagogia. A partir do que foi apresentado até agora, podemos concluir que a psicopedagogia nasce e se constitui na área clínica. Somente nos últimos 20 anos é que a atuação do psicopedagogo se expandiu para outras áreas, como a institucional, empresarial e hospitalar. Na próxima seção aprofundaremos os conceitos atrelados a psicopedagogia clínica, relacionando-os com a sua prática. Com todas essas informações, encerramos a primeira parte deste capítulo. Que tal organizarmos todas essas informações em uma linha do tempo? Atividade de Estudos: 1) Elabore uma linha do tempo, marcando os principais aconteci- mentos que contribuíram para o surgimento e o fortalecimento da psicopedagogia, bem como os respectivos anos de tais acontecimentos. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Os estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul como os grandes pioneiros em formação e qualifi cação de profi ssionais em psicopedagogia. 18 Teoria e prática da psicopedagogia clínica Psicopedagogia Clínica ou Clínica Psicopedagógica? - Compreendendo Alguns Conceitos. Conforme vimos na seção anterior, a psicopedagogia é um campo do conhecimento relativamente recente no Brasil, apesar de já estar bastante difundida e sua prática já ser reconhecida e solicitada. Porém, em função de ser uma ciência “jovem”, ainda existem muitas confusões sobre o conceito e o objeto de estudo da psicopedagogia, bem como das atribuições do psicopedagogo. Inicialmente, apresentaremos alguns conceitos da psicopedagogia como um todo para, em seguida, nos aprofundarmos nos aspectos clínicos. Entendemos a psicopedagogia como área do conhecimento que investiga e intervém na relação do sujeito que aprende e o conhecimento a ser apreendido. Esta relação pode confi gurar- se como problemática em razão de seus aspectos pedagógicos, cognitivos e/ou afetivos, no âmbito individual e/ ou social/relacional. Conceituando a Psicopedagogia De acordo com o que o professor Antonio Joaquim Severino escreveu na introdução do livro de Bossa (2011, p. 19): A Psicopedagogia é tomada como um corpo de conhecimentos, construído com vistas a encontrar soluções para os problemas da aprendizagem, em uma aplicação que, além da clínica, se quer também preventiva. Área recente, multidisciplinar, é eminentemente prática, sem deixar de ser simultaneamente, campo de investigação e, ainda, saber científi co. Para aprofundarmos nossa discussão, vamos desmembrar este conceito em itens menores e refl etirmos sobre seu signifi cado. a) Corpo de conhecimentos: este termo nos remete a pensar que a psicopedagogia é uma área de caráter multidisciplinar, constituída pelo saber de várias outras áreas e não só da psicologia e da pedagogia, como o seu nome sugere. As principais teorias que constituem o corpo de conhecimentos 19 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 da psicopedagogia são: a psicanálise, a psicologia social, a epistemologia, a psicologia genética, a linguística, a pedagogia e a neuropsicologia.b) Aprendizagem: atualmente, a psicopedagogia trabalha com a concepção de aprendizagem segundo a qual participam deste processo o sujeito individual, através do seu equipamento biológico, afetivo e intelectual, e a relação deste sujeito com o seu meio. As trocas entre o sujeito e o seu meio são infl uenciadas pelas condições socioculturais, e pelas relações familiares, grupais e institucionais. c) Problemas de aprendizagem: podemos dizer que os problemas de aprendizagem são todos os entraves que difi cultam signifi cativamente o processo de aprender, determinando um desempenho abaixo do esperado, levando-se em consideração a idade e série do aprendente, embora o sujeito tenha a necessária capacidade intelectual para tal aprendizado. d) Aplicação clínica: o sentido deste termo no contexto da defi nição de psico- pedagogia signifi ca o trabalho de resgate da possibilidade da aprendizagem quando já existe um problema instalado. Envolve todas as ações que o psicopedagogo faz para diagnosticar e intervir com o objetivo de buscar soluções e reverter um quadro de difi culdade. Esse termo não signifi ca que o trabalho deva acontecer em um espaço clínico, pois a aplicação do trabalho psicopedagógico clínico pode acontecer em diversos espaços. e) Aplicação preventiva: para a psicopedagogia, o termo prevenção refere- se ao trabalho no sentido de adequar as condições de aprendizagem de forma a evitar possíveis comprometimentos nesse processo. Portanto, o trabalho com caráter preventivo acontece quando não existe um problema de aprendizagem instalado. A intervenção do psicopedagogo tem o objetivo de facilitar o processo de aprendizagem. f) Área prática, sem deixar de ser um campo de investigação e um saber científi co: a psicopedagogia já nasce como uma necessidade prática, uma vez que existe uma demanda para isso. Porém, essa prática jamais pode ser desvinculada de um saber teórico que a embase e a sustente. Quando falamos em “práxis psicopedagógica” é justamente a isso que nos referimos: a inter-relação entre teoria e prática, capaz de gerar novos conhecimentos, abrindo um vasto campo para a investigação. Agora que o conceito de psicopedagogia já foi aprofundado, vamos continuar discutindo os aspectos pertinentes à psicopedagogia clínica. 20 Teoria e prática da psicopedagogia clínica ObJeto de Estudo da Psicopedagogia Como sabemos o objeto de estudo da psicopedagogia é a aprendizagem humana e, consequentemente, os problemas de aprendizagem. Tanto no trabalho psicopedagógico clínico, quanto no trabalho preventivo, a compreensão de como se dá a aprendizagem nas diversas idades e quais habilidades são necessárias para que ela aconteça, é de fundamental importância para ambos os trabalhos. Por isso é equivocada a ideia de que o psicopedagogo deve estudar e se aprofundar somente nos transtornos e problemas de aprendizagem. Em primeiro lugar, ele deve compreender sobre a aprendizagem como um todo. De acordo com Bossa (2011, p.33): [...] a Psicopedagogia estuda as características da aprendizagem humana: como se aprende, como essa aprendizagem varia evolutivamente e está condicionada por vários fatores, como se produzem as alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las. Conforme foi visto na seção anterior, na sua origem, o trabalho psicopedagógico priorizava a reeducação, objetivando vencer as defasagens, pois as difi culdades de aprendizagem eram sempre avaliadas em função dos seus défi cits. Atualmente, a psicopedagogia vê o “não-aprender” como uma resposta a alguns fatores que podem não estar bem por estarem em desacordo com o esperado e estes são sempre carregados de signifi cados. Tais fatores podem ser de ordem emocional, social, afetivo, pedagógico, cognitivo, relacional, entre outros. Portanto, num trabalho de investigação psicopedagógica, deve-se priorizar a busca pelas causas da difi culdade e não somente voltar o seu olhar para os défi cits. A Revista Ciência & Vida Psique (Editora Escala, ano 1, n. 2) lançou uma edição especial intitulada PSICOPEDAGOGIA: para quê? Esta publicação é formada por diversos artigos escritos por psicopedagogos renomados que tratam desde o nascimento da psicopedagogia até as contribuições mais recentes da neurociência para auxiliar na compreensão de como se processa a aprendizagem humana. Vale à pena a leitura! Agora que já temos claro o conceito de psicopedagogia, bem como o seu objeto de estudo, vamos nos aprofundar nos conceitos que constituem a psicopedagogia clínica. O objeto de estudo da psicopedagogia é a aprendizagem humana e, consequentemente, os problemas de aprendizagem. 21 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 Você já deve ter ouvido os termos “psicopedagogia clínica” e “clínica psicopedagógica”, não é mesmo? E será que estes termos são sinônimos um do outro e querem dizer a mesma coisa? Ou será que são expressões com sentido diferente e que, por falta de conhecimento, são utilizadas erroneamente? A Psicopedagogia Clínica e a Clínica Psicopedagógica O primeiro ponto importante para deixarmos claro nestas refl exões é que a psicopedagogia é uma área única do conhecimento e que abrange algumas ramifi cações, relacionadas aos campos de atuação do psicopedagogo. No Brasil, a partir da década de 1990, com a proliferação dos cursos de especialização por todo o país, tais cursos começaram a ser oferecidos com a nomenclatura de “psicopedagogia clínica”, “psicopedagogia institucional” e, mais recentemente, “psicopedagogia hospitalar” e “psicopedagogia empresarial”. Estes termos acabaram sendo divulgados e bastante falados, mas, muitas vezes, não se tem a verdadeira conotação do que eles querem dizer. Podemos afi rmar que todos os campos pertencem a uma só psicopedagogia, que compartilham dos mesmos conceitos, dos mesmos referenciais teóricos e a mesma conduta ética do psicopedagogo. A psicopedagogia clínica refere-se a um dos campos de atuação da psicopedagogia. Refere-se também a um saber, a postura clínica que o psicopedagogo deve assumir frente ao seu paciente, que envolve o olhar e a escuta psicopedagógica clínica. Essa postura deve ser assumida pelo psicopedagogo com o seu cliente nos diversos campos de atuação e nos diversos espaços que ocupa e não somente no espaço clínico. Portanto, podemos dizer que o método utilizado pelo psicopedagogo é o método clínico, por ser um método investigativo e de observação da realidade. O psicopedagogo o utiliza como instrumento de investigação na coleta de dados para o diagnóstico e intervenção nas difi culdades de aprendizagem apresentadas por seus clientes. A psicopedagogia é uma área única do conhecimento e que abrange algumas ramifi cações, relacionadas aos campos de atuação do psicopedagogo. 22 Teoria e prática da psicopedagogia clínica O olhar clínico em psicopedagogia é o olhar que tem por objetivo compreender como o sujeito aprende, na sua relação com os outros sujeitos, com a cultura, com sua história e com os objetos de aprendizagem. Este olhar envolve o sujeito como um todo e tenta perceber como faz para evitar ou superar suas difi culdades em relação à aprendizagem. De acordo com Fernández (2001a), o termo “psicopedagogia clínica” foi utilizado pela primeira vez na década de 1970, pela psicopedagoga argentina Blanca Tarnopolsky. Esse enfoque passou a reconhecer a existência de fenômenos inconscientes e da transferência, ambos os conceitos utilizados pela teoria da psicanálise. Para ela, “[...] isso signifi cou um giro de grande importância sobre o questionamento de reeducação psicopedagógica que, em geral, está só a serviço da exigência de uma adaptação mecanicista” (FERNÁNDEZ, 2001a, p. 49). • Inconsciente: área do psiquismo que não é acessível à consciência do indivíduo. De acordo com a concepção da psicanálise, no inconsciente se encontram conteúdos que foram reprimidos. O acesso ao inconsciente se abrede preferência através de sonhos, atos falhos e sintomas neuróticos. • Transferência: conceito da psicanálise: processo em grande parte inconsciente pelo qual se revivem, nas relações atuais, afetos e desejos referentes a relações anteriores (sobretudo experiências infantis) dirigidas a objetos (sobretudo pessoas). A transferência representa, no âmbito da relação paciente- terapeuta, um dos meios mais importantes para tornar conscientes confl itos inconscientes. Fonte: Extraído de Brunner e Zeltner (1994). A postura clínica deve fazer parte do psicopedagogo e de suas ferramentas teóricas e deve ser utilizada independente de onde ele estiver trabalhando: seja numa escola, num consultório, num hospital ou numa faculdade. Entendemos então que, o adjetivo “clínica” faz referência a uma postura, a uma ética e a um modo de investigar as situações e de intervir. Para encerrar esta seção, vamos retomar o questionamento feito anteriormente: seria a “psicopedagogia clínica” e a “clínica psicopedagógica” a O olhar clínico em psicopedagogia é o olhar que tem por objetivo compreender como o sujeito aprende, na sua relação com os outros sujeitos, com a cultura, com sua história e com os objetos de aprendizagem. 23 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 mesma coisa? A resposta é NÃO. Na maioria das vezes, estes dois termos são utilizados como sinônimos, mas você já compreendeu que a “psicopedagogia clínica” refere-se a uma postura ética, a uma forma de conduzir o trabalho psicopedagógico, independente do local de atuação. A “clínica psicopedagógica” refere-se a atuação psicopedagógica no espaço clínico, no consultório, sendo portanto, o espaço de trabalho do psicopedagogo. O que entendemos por intervenção psicopedagógica clínica A intervenção psicopedagógica clínica é muito diferente da reeducação, já que esta última tende a corrigir e remediar. Assim, muitas crianças são submetidas a métodos reeducativos que tentam uma “ortopedia mental” como se fosse possível colocar “próteses cognitivas”. O fracasso escolar ou problema de aprendizagem deve ser sempre um enigma a ser decifrado que não deve ser calado, mas escutado. Desse modo, quando o “não sei” aparece como principal resposta, podemos perguntar-nos o que é que não está permitido saber. Nossa escuta não se dirige aos conteúdos não-aprendidos, nem aos aprendidos, nem às operações cognitivas não-logradas ou logradas, nem aos condicionantes orgânicos, nem aos inconscientes, mas às articulações entre essas diferentes instâncias. Não se situa no aluno, nem no professor, nem na sociedade, nem nos meios de comunicação como ensinantes, mas nas múltiplas relações entre eles. Fonte: Fernández (2001b, p. 38). Atividade de Estudos: 1) Neste capítulo, apresentamos vários conceitos importantes para o trabalho psicopedagógico. Volte ao texto, leia novamente estes conceitos, elabore-os e reescreva-os utilizando-se das suas palavras: 24 Teoria e prática da psicopedagogia clínica ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Algumas ConsideraçÕes Este primeiro capítulo tem um caráter um pouco mais teórico, mas é de fundamental importância para que você possa compreender a prática da psicopedagogia clínica. Todos os conceitos que aqui foram apresentados e discutidos estarão presentes ao longo desta disciplina e você, aluno, deve ter clareza desse referencial. Ressalto a importância da compreensão de determinadas teorias, pois serão elas que orientarão a nossa prática futura. Como estudante da psicopedagogia, futuro profi ssional psicopedagogo que trabalhará com a aprendizagem, você precisa estar sempre atento e refl etir sobre como se dá a sua própria aprendizagem. Como foi o seu processo de aprender ao longo deste capítulo? Com quais sentimentos você se deparou: angústia, medo, insegurança, gratifi cação, prazer? Quais as estratégias você utilizou para melhor fi xar tantas informações? Durante o nosso trabalho, é importante que estes questionamentos estejam presentes para que você possa se conhecer melhor. Não podemos mediar a aprendizagem de outras pessoas se não conseguimos compreender a nossa própria. Portanto, fi que atento e se observe... No próximo capítulo abordaremos o processo do diagnóstico psicopedagógico clínico, suas características, as etapas para a realização deste, os instrumentos utilizados durante esse processo, bem como as diferentes abordagens que fundamentam a investigação psicopedagógica. 25 A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃOCapítulo 1 Referências BOSSA, Nádia A. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2011. BRUNNER e ZELTNER. Dicionário de psicopedagogia e psicologia educacional. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. CORDIÉ, Anny. Os atrasados na existem: psicanálise de crianças com fracasso escolar. Porto Alegre: Artmed, 1996. FERNÁNDEZ, Alicia. O saber em jogo: a psicopedagogia propiciando autorias de pensamento. Porto Alegre: Artmed, 2001a. ______. Os idiomas do aprendente: análise das modalidades ensinantes com famílias, escolas e meios de comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2001b. MERY, Janine. Pedagogia curativa escolar e psicanálise. Porto Alegre: Artmed, 1985. 26 Teoria e prática da psicopedagogia clínica CAPÍTULO 2 O Processo de Investigação Clínica: O Diagnóstico Psicopedagógico A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Conhecer as diversas abordagens que fundamentam o diagnóstico psicopedagógico. Caracterizar as etapas do diagnóstico psicopedagógico clínico. Identifi car os principais instrumentos utilizados no diagnóstico psicopedagógico. Relacionar as etapas do diagnóstico psicopedagógico, bem como os instrumentos utilizados neste processo com o caso apresentado. Elaborar o relatório do diagnóstico psicopedagógico a partir da análise dos dados apresentados. 28 Teoria e prática da psicopedagogia clínica 29 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 ConteXtualiZação Você deve estar lembrado, conforme vimos no capítulo anterior, que a psicopedagogia busca encontrar soluções para os problemas de aprendizagem. E você já parou para pensar como se dá essa busca? Que instrumentos o psicopedagogo utiliza para tal fi m? É justamente este o objetivo principal deste capítulo: demonstrar e aprofundar os conhecimentos acerca de todo o processo do diagnóstico psicopedagógico. Num primeiro momento, iremos discutir sobre as diferentes abordagens teóricas que embasam os procedimentos do diagnóstico psicopedagógico. Em seguida, abordaremos todas as etapas para a realização desse diagnóstico, desde o primeiro contato telefônico até a elaboração do relatório fi nal. Posteriormente, apresentaremos todos os instrumentos que poderão ser utilizados em cada uma das etapas do diagnóstico. Dando continuidade, iremos conhecer como se elabora o relatório do diagnóstico psicopedagógico a partir da análise de todos os dados coletados durante esse processo. E, fi nalmente, apresentaremos um caso, onde o passo-a-passo de diagnóstico psicopedagógico estará presente, com objetivo de tornar mais concreto todo o conhecimento apresentado até então. Acharam muito conteúdo? Com toda certeza... Porém, todo este conteúdo éfundamental para a prática psicopedagógica clínica. Nenhuma intervenção psicopedagógica pode surtir o resultado desejado, sem que se tenha realizado um bom diagnóstico, com uma correta interpretação dos resultados obtidos. Portanto, temos sim, muito estudo pela frente. E espero, que quando você, aluno, chegar ao fi nal desse capítulo, possa sentir-se seguro para realizar um diagnóstico psicopedagógico. Vamos começar? As Diferentes Abordagens UtiliZadas no Processo do Diagnóstico Psicopedagógico Para introduzir este capítulo, antes de partimos para as diversas abordagens que embasam o processo do diagnóstico psicopedagógico, é muito importante que tenhamos clareza sobre alguns conceitos. Em primeiro lugar, o que queremos dizer quando falamos em diagnóstico? E diagnóstico psicopedagógico? O que signifi cam estes termos? 30 Teoria e prática da psicopedagogia clínica De acordo com o “Dicionário de psicopedagogia e psicologia educacional”, de Brunner e Zeltner (2000, p. 77 e 78), diagnóstico é o resultado de exames psicológicos e médicos. Após aplicação de métodos diagnósticos, por exemplo, questionários e testes, torna-se possível fazer uma avaliação sobre a existência e a extensão de um comportamento desviante ou de uma enfermidade. Além disso, deve ser descoberta, enquanto possível, a causa da perturbação ou da enfermidade. Um diagnóstico pode ser expresso, por exemplo, da seguinte forma: “Estado depressivo ocasionado pela morte do parceiro”. O diagnóstico é a base principal para o subsequente aconselhamento ou tratamento. Diagnóstico designa também o exame de questões circunscritas na área da medicina, psicologia ou pedagogia por meio de métodos diagnósticos. Ao mesmo tempo, o diagnóstico abrange uma área especial da psicologia que se ocupa com a teoria e a prática da aplicação de métodos diagnósticos. Na psicologia se empregam, sobretudo, questionário, observação e aplicação de testes, como o de pessoalidade, de desempenho e de desenvolvimento. O diagnóstico se propõe o seguinte, entre outras coisas: 1. identifi cação do distúrbio; 2. explicação das causas (nosologia); 3. verifi cação das reações das pessoas frente ao distúrbio; 4. diferenciações entre distúrbios orgânicos e funcionais; 5. elaboração de um prognóstico sobre possibilidades de tratamento e; 6. estabelecimento de bases para o aconselhamento ou tratamento. Diagnóstico Psicopedagógico A partir do conceito de diagnóstico, será que você consegue inferir o conceito de diagnóstico psicopedagógico? Vamos tentar? Em primeiro lugar, é importante que você, aluno, tenha muito claro que o termo diagnóstico, para a psicopedagogia, não signifi ca que o psicopedagogo está habilitado para emitir laudos com diagnósticos fechados. Para nós, da psicopedagogia, o diagnóstico refere-se a avaliação diagnóstica que compreenderá o levantamento de dados ou hipóteses avaliativas. A partir destas hipóteses, Diagnóstico é o resultado de exames psicológicos e médicos. 31 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 caso haja necessidade, o psicopedagogo pode estabelecer parcerias com outros profi ssionais, como neurologistas ou psicólogos, que nos amparam na busca de um melhor diagnóstico avaliativo. O diagnóstico psicopedagógico pode ser entendido como um processo contínuo, no qual é analisada a situação do aprendente dentro do contexto escolar, familiar e social. Esta análise deverá estar embasada nos funda-mentos teóricos, e na utilização de atividades e instrumentos específi cos e terapêuticos. Através do olhar e da escuta psicopedagógica, numa postura clínica, o profi ssional deverá envolver o aprendiz, os pais e a escola, e levantar dados sobre como os fatos ocorreram. De acordo com Sampaio (2012, p. 17), O diagnóstico psicopedagógico clínico tem como objetivo identifi car as causas dos bloqueios que se apresentam nos sujeitos com difi culdades de aprendizagem. Estes bloqueios apresentam-se por meio de sintomas que podem se manifestar de diferentes maneiras: baixo rendimento escolar, agressividade, falta de concentração, agitação, etc. O sintoma é o que pode ser percebido pelo próprio indivíduo ou pelos outros (familiares, professores, colegas). Todo o sintoma está relacionado ao signifi cado que a problemática da difi culdade de aprendizagem tem para o sujeito. Um sintoma é um sinal, um indício de que algo não vai bem com aquele sujeito, por isso, para compreendermos, precisamos recorrer à sua história pessoal. Muitas vezes, um sintoma pode ser da ordem do inconsciente. Para que você compreenda melhor o que representa um diagnóstico psicopedagógico, podemos fazer uma analogia com um trabalho de investigação. O psicopedagogo seria um detetive a procura de pistas que o auxiliem na descoberta do que está por trás das queixas e dos sintomas presentes no caso. Para Weiss (1994) todo o diagnóstico psicopedagógico é uma investigação, uma pesquisa sobre o que não vai bem com o sujeito em relação ao que é esperado na sua aprendizagem. Ainda para esta autora, a investigação não pretende rotular o sujeito, mas sim obter uma compreensão global da sua forma de aprender e do que está difi cultando este processo. Todo o diagnóstico psicopedagógico é uma investigação, uma pesquisa sobre o que não vai bem com o sujeito em relação ao que é esperado na sua aprendizagem. Diagnóstico psicopedagógico é analisada a situação do aprendente dentro do contexto escolar, familiar e social. O profi ssional deverá envolver o aprendiz, os pais e a escola, e levantar dados sobre como os fatos ocorreram. 32 Teoria e prática da psicopedagogia clínica Realizar um diagnóstico é como montar um grande quebra- cabeças, pois, à medida que se encaixam as peças, vai se descobrindo o que está por trás destes sintomas. As peças serão oferecidas pela família, pela escola e pelo próprio sujeito, entretanto a maneira de montá-las só depende do psicopedagogo e, para que este tenha um bom resultado, precisa levar em conta os aspectos objetivos e subjetivos observados nos diversos âmbitos: cognitivo, familiar, pedagógico e social (SAMPAIO, 2012, p. 17). Fernández (1991), afi rma que o diagnóstico deve ter a função de dar suporte ao psicopedagogo, para que este faça todos os encaminhamentos necessários, assim como uma rede dá o suporte para um equilibrista. Destaca ainda, ser um processo que permite ao profi ssional investigar, levantar hipóteses provisórias que serão ou não confi rmadas ao longo do processo. Para ela, o diagnóstico está relacionado a conhecimentos práticos e teóricos. Atividade de Estudos: 1) A partir do que foi estudado até agora, elabore, com as suas palavras, o conceito de: Diagnóstico e Diagnóstico Psicopedagogo. _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ Cabe aqui ressaltar que “o sucesso de um diagnóstico não reside no grande número de instrumentos utilizados, mas na competência e sensibilidade do terapeuta em explorar a multiplicidade de aspectos revelados em cada situação” (WEISS, 1994, p.16). Gostaria de lembrá-los que muitos profi ssionais também utilizam o termo avaliação psicopedagógica para referir-se ao diagnóstico psicopedagógico, por considerarem que o termo diagnóstico tem uma forte conotação médica, centrado na classifi cação de doenças e que o termo avaliação estaria mais ligado à área educacional. Porém, na nossa disciplina, considero que ambos os termos estão corretos e podem ser utilizados como sinônimos. 33 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃOCLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 Abordagens Que Embasam o Diagnóstico Psicopedagógico Retomando ao que já vimos no primeiro capítulo deste caderno de estudo, a psicopedagogia é uma área de caráter multidisciplinar, constituída pelo saber de várias outras áreas. Este corpo teórico que embasa o fazer psicopedagógico, acabou constituindo os diferentes caminhos que possibilitam a realização do diagnóstico psicopedagógico. Dito de outra maneira, o profi ssional psicopedagogo irá optar por uma abordagem que indicará o caminho a ser seguido. Tal abordagem está fundamentada em uma ou outra abordagem teórica que servirá como pano de fundo para o seu fazer (BOSSA, 2011). No quadro a seguir, apresentarei todas as teorias que fundamentam o fazer psicopedagógico: Quadro 2 – As teorias que fundamentam a psicopedagogia TEORIA CONTRIBUIÇÃO Psicanálise A Psicanálise encarrega-se do mundo inconsciente, das representações profundas, operantes através da dinâmica psíquica que se expressa por sintomas e símbolos, permitindo-nos levar em conta a face desejante do homem. Psicologia Social A Psicologia Social encarrega-se da constituição dos sujeitos, que res- pondem a relações familiares, grupais e institucionais, em condições socioculturais e econômicas específicas e que contextualizam toda a aprendizagem. Epistemologia e Psicologia Genética A Epistemologia e a Psicologia Genética se encarregam de analisar e descrever o processo construtivo do sujeito cognoscente em interações com os outros e com objetos. Linguística A Linguística traz a compreensão da linguagem como um dos meios que caracterizam o sujeito como tipicamente humano e cultural: a língua enquanto código disponível a todos os membros da sociedade e a fala como fenômeno subjetivo, evolutivo e de acesso a toda estrutura simbólica. Pedagogia A Pedagogia contribui com as diversas abordagens do processo ensino- -aprendizagem, da didática e das diversas metodologias, analisando-as do ponto de vista de quem ensina e de quem aprende. Neuropsicologia Os fundamentos na Neuropsicologia possibilitam a compreensão dos mecanismos cerebrais que subjazem ao aprimoramento das atividades mentais, indicando-nos a que correspondem, do ponto de vista orgânico, todas as alterações ocorridas. Fonte: Bossa (2011). Este corpo teórico que embasa o fazer psicopedagógico, acabou constituindo os diferentes caminhos que possibilitam a realização do diagnóstico psicopedagógico. 34 Teoria e prática da psicopedagogia clínica Decorrentes dessa diversidade de campos teóricos, surgiram diferentes possibilidades de atuação e “caminhos” a serem trilhados, que embasam a ação psicopedagógica, durante o processo diagnóstico ou de avaliação. Os caminhos mais conhecidos e utilizados entre os psicopedagogos são propostos por: • Maria Lúcia Weiss; • Transtorno da clínica psicológica – segue o modelo médico; • Epistemologia Convergente - Jorge Visca; • Edith Rubinstein; • Sara Pain / Alícia Fernandez. Vamos conhecer, a seguir, cada um desses modelos? a) Sequência diagnóstica proposta por Weiss (1994): Este primeiro modelo, proposto por Maria Lúcia Weiss, é apresentado no livro “Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica”. Nele, a autora faz um recorte de como os aspectos que levam um sujeito ao histórico de fracasso escolar, podem ser detectados através do diagnóstico psicopedagógico. Apresentaremos, a seguir, a sequência proposta por ela. 1º Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S.) (WEISS, 1994) Nessa entrevista o psicopedagogo reúne-se com os pais e com a criança ou adolescente para uma sessão conjunta, com duração de 50 minutos aproximadamente. A E.F.E.S. tem como objetivos a compreensão da queixa nas dimensões familiar e escolar, a captação das relações e expectativas familiares centradas na aprendizagem escolar, a expectativa em relação à atuação do terapeuta, a aceitação e o engajamento do paciente e seus pais no processo diagnóstico e o esclarecimento do que é um diagnóstico psicopedagógico (WEISS, 1994, p. 36). Para esta entrevista, é necessário que exista um clima de confi ança para que haja liberdade de informações e sentimentos. O foco principal é o momento presente. O registro fi el do que foi falado também é muito importante, para que o terapeuta, em outro momento, possa analisar tudo o que foi dito. É necessário que exista um clima de confi ança para que haja liberdade de informações e sentimentos. Diferentes possibilidades de atuação e “caminhos” a serem trilhados. 35 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 2º Anamnese (WEISS, 1994) Essa entrevista tem o objetivo de colher os dados importantes e signifi cativos sobre a história de vida do sujeito. Ela possibilita a integração das dimensões de passado, presente e futuro do paciente. Normalmente é realizada com os pais, mas quando outra pessoa (avó, babá, madrinha etc) também acompanhou e participou do desenvolvimento da criança, é importante que ela se faça presente, sempre que possível. 3º Sessões Lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças) (WEISS, 1994) Essa sessão tem o objetivo de obter dados sobre os aspectos afetivos para a aprendizagem, tais como: exploração do novo, criatividade, vinculação com os objetos, modalidade de aprendizagem. Além disso, também favorece a interação e a vinculação paciente/ terapeuta. 4º Complementação com provas e testes (WEISS, 1994) Este momento compreende várias sessões (de 3 a 4 sessões) que serão destinadas a realização de provas e testes específi cos para o diagnóstico psicopedagógico. Eles serão selecionados de acordo com a necessidade e com as hipóteses levantadas nas sessões anteriores. 5º Síntese Diagnóstica – Prognóstico (WEISS, 1994) Este é o momento em que o profi ssional deve debruçar-se sobre todo o material colhido durante as sessões com o paciente e com as entrevistas e analisá-los criteriosamente. É o momento em que faz a análise de toda a problemática para, em seguida, se chegar às conclusões pertinentes ao caso. 6º Devolução - Encaminhamentos (WEISS, 1994) A devolução é uma comunicação verbal feita ao fi nal de toda a avaliação em que o psicopedagogo relata aos pais e ao paciente os resultados obtidos ao longo de todo o processo. Esse encontro pode ser realizado em conjunto (pais e paciente) ou em momentos separados, de acordo com cada caso em específi co. Neste encontro também são dadas as orientações necessárias e são feitos os encaminhamentos para outros profi ssionais, quando houver necessidade. Objetivo de colher os dados importantes e signifi cativos sobre a história de vida do sujeito. Objetivo de obter dados sobre os aspectos afetivos para a aprendizagem. Serão selecionados de acordo com a necessidade e com as hipóteses levantadas nas sessões anteriores. Faz a análise de toda a problemática para, em seguida, se chegar às conclusões pertinentes ao caso. Relata aos pais e ao paciente os resultados obtidos ao longo de todo o processo. 36 Teoria e prática da psicopedagogia clínica Para você conhecer melhor a sequência diagnóstica proposta por Weiss, leia o livro: WEISS, Maria Lucia L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. Lá a autora descreve detalhadamente e com vários exemplos, cada uma das etapas do diagnóstico. Vale a pena ler! b) Sequência Diagnóstica Tradicional – Modelo Médico O modelo diagnóstico tradicional, segue o modelo médico, com a sequência de passos propostos pela medicina. Este foi um dos primeiros modelos utilizados na psicologia clínica e também na psicopedagogia. 1º Anamnese É o momento em que o profi ssional vai entrar em contato com a situação e conhecer a história do sujeito. Participam desta entrevista, os pais e/ou algum responsável que conheça a história do paciente e possa repassar as informações importantes. 2º Testagem e provas pedagógicasEste momento acontece em várias sessões com o paciente, individualmente. Tem por objetivo conhecer a situação e tentar identifi car que áreas estão comprometidas, difi cultando o aprender. Busca compreender a causa da difi -culdade de aprendizagem. 3º Laudo O momento do laudo é o momento em que o profi ssional elabora a síntese das suas conclusões, reunindo todas as informações importantes sobre o caso, para ser repassado à família. Esta etapa também abrange o momento do prognóstico, isto é, o momento em que o psicopedagogo traça o provável desenvolvimento futuro, baseando- se no desempenho verifi cado a partir dos testes e das provas que foram aplicadas durante as sessões de diagnóstico. Vai entrar em contato com a situação e conhecer a história do sujeito. Tentar identifi car que áreas estão comprometidas, difi cultando o aprender. O profi ssional elabora a síntese das suas conclusões, reunindo todas as informações importantes sobre o caso, para ser repassado à família. 37 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 4º Devolução A devolução é o momento da verbalização do laudo ao paciente e/ ou aos pais. Neste momento, são esclarecidas as dúvidas e discutido o prognóstico do caso em questão. c) Sequeência Diagnóstica proposta pela Epistemologia Convergente O modelo proposto pela Epistemologia Convergente foi, originalmente, pensado por Jorge Visca e difundido no Brasil, pelo próprio autor. Hoje, é um dos modelos mais utilizados pelos psicopedagogos brasileiros, pois possui uma fundamentação teórica bastante consistente. Visca baseou-se nas teorias psicanalítica, piagetiana e da psicologia social. 1º Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem - E.O.C.A. (VISCA, 1987) Esta entrevista é utilizada como um instrumento que possibilita a sondagem da problemática da aprendizagem e auxilia o profi ssional a delinear o que mais necessita ser investigado. Normalmente se dá em uma única sessão. A partir deste momento, o profi ssional elabora o seu 1º sistema de hipóteses, defi ne as linhas de investigação e escolhe os instrumentos que irá utilizar para confi rmar, ou não, o seu 1º sistema de hipóteses. 2º Testes (VISCA, 1987) Neste momento, o psicopedagogo aplica os testes defi nidos na etapa anterior, da E.O.C.A. Não existe uma bateria de testes pré-defi nidos e fi xos, pois estes são defi nidos a partir de cada caso. O profi ssional pode levar várias sessões para concluir esta etapa. Elabora-se, então, o 2º sistema de hipóteses a partir do que foi levantado na testagem realizada e defi nem-se novas linhas de investigação sobre o caso. 3º Anamnese (VISCA, 1987) Este modelo propõe que a anamnese seja uma entrevista aberta, ou seja, não dirigida; e situacional, isto é, que leve em consideração os fenômenos do passado e do presente. Neste modelo, a anamnese acontece ao fi nal das sessões com o paciente para que o profi ssional não se “contamine” com a história apresentada pelos pais e possa ser o mais neutro possível frente ao caso. Neste momento, o psicopedagogo irá verifi car o 2º sistema de hipóteses e formular o 3º sistema com as hipóteses que se mantiveram. Momento da verbalização do laudo. Que possibilita a sondagem da problemática da aprendizagem e auxilia o profi ssional a delinear o que mais necessita ser investigado. Aplica os testes defi nidos na etapa anterior. Anamnese seja uma entrevista aberta, ou seja, não dirigida; e situacional, isto é, que leve em consideração os fenômenos do passado e do presente. 38 Teoria e prática da psicopedagogia clínica 4º Elaboração do Informe Psicopedagógico (VISCA, 1987) É o momento em que se elabora a imagem do sujeito que articula os aspectos da aprendizagem com os aspectos estruturais e emocionais que a condicionam. Essa imagem é repassada aos pais e a escola e é a partir dela que se inicia o processo corretor. Para você conhecer mais sobre a Epistemologia Convergente, teoria proposta por Jorge Visca, poderá consultar o livro: VISCA, Jorge. Clínica Psicopedagógica: epistemologia conver- gente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987. Neste livro você encontrará a fundamentação teórica e a explicação detalhada de cada um dos momentos propostos acima. d) Sequência Diagnóstica proposta por Rubinstein Edith Rubinstein, uma das precursoras da psicopedagogia no Brasil e uma grande mestra, também trouxe a sua contribuição sobre o diagnóstico psicopedagógico. Para ela, “[...] no diagnóstico psicopedagógico pretende- se diagnosticar as condições de aprendizagem do aprendiz.” (RUBINSTEIN, 1999, p. 130). 1º Entrevista com a Família (RUBINSTEIN, 1999) Este modelo propõe que a entrevista com a família se dê em três momentos distintos. Estes momentos são: • Contatos anteriores a consulta – são os primeiros contatos realizados pela família e podem ser via telefone, internet ou mensagem. • Escuta do motivo da consulta – primeiro contato presencial com a família na qual o profi ssional vai escutar o motivo pelo qual estão buscando o trabalho psicopedagógico. • História vital ou anamnese – seria o momento da anamnese propriamente dita, onde o profi ssional irá escutar a história do sujeito. Contatos anteriores a consulta, Escuta do motivo da consulta e História vital ou anamnese. Elabora a imagem do sujeito que articula os aspectos da aprendizagem com os aspectos estruturais e emocionais que a condicionam. 39 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 2º Entrevista com o sujeito (RUBINSTEIN, 1999) Esta segunda etapa é quando acontecem todos os encontros com o paciente, normalmente de 6 a 8 encontros. Este modelo propõe que as sessões sejam divididas em três fases: • Escuta do motivo da consulta – acontece quando o psicopedagogo vai escutar do próprio paciente o motivo da procura pelo atendimento psicopedagógico. • Instrumentos escolhidos pelo psicopedagogo com base nas necessidades do sujeito – é o momento da aplicação das provas e testes selecionados. • Devolutiva ao sujeito – momento em que o psicopedagogo irá conversar individualmente com o sujeito e apontar suas potencialidades, seu estilo de aprendizagem e suas habilidades. 3º Contato com a escola (RUBINSTEIN, 1999) Este é um momento prévio ao fi nalizar, em que o psicopedagogo entra em contato com a escola e escuta os professores do aluno em questão, sobre as suas queixas escolares. 4º Contato com outros profi ssionais (RUBINSTEIN, 1999) Posterior e logo em seguida ao contato com a escola, o psicopedagogo também entra em contato, para trocar informações, com os outros profi ssionais envolvidos no caso (psicólogo, fonoaudiólogo, psiquiatra, médico pediatra ou neuropediatra etc). 5º Devolutiva e encaminhamentos à família (RUBINSTEIN, 1999) No último momento, após ter conversado e escutado todos os outros profi ssionais e professores envolvidos no caso, o psicopedagogo conversa com a família para dar a devolutiva do que foi avaliado e fazer os encaminhamentos necessários. e) Sequência Diagnóstica proposta por Pain / Fernández (1992) A sequência diagnóstica proposta, originalmente, por Sara Pain e, mais tarde, complementada por Alícia Fernández, baseou-se nos pressupostos da psicanálise e da psicologia genética de Piaget. Para esta proposta, a aprendizagem é o resultado da utilização dos aspectos orgânicos, cognitivos, afetivos e culturais (PAIN, 1992). Escuta do motivo da consulta. Instrumentos escolhidos pelo psicopedagogo com base nas necessidades do sujeito. Devolutiva ao sujeito. O psicopedagogo entra em contato com a escola e escuta os professores. Trocar informações, com os outros profi ssionais envolvidos no caso. Conversa com a família para dar a devolutiva do que foi avaliado e fazer os encaminhamentos necessários. 40 Teoria e prática da psicopedagogia clínica 1º Entrevista de “motivo da consulta” (PAIN, 1992) Este primeiro momentoé quando o psicopedagogo recebe a queixa que a família traz sobre o paciente e explora o que esta queixa signifi ca. O profi ssional pode pedir que a família descreva alguma situação que fi que evidenciado o que está sendo exposto. Esta entrevista “motivo da consulta” também é feita com o paciente. 2º Entrevista “História Vital” (PAIN, 1992) É o momento em que o psicopedagogo escuta toda a família, inclusive os irmãos, sobre a situação “problema de aprendizagem” e investiga a história do paciente. Tenta também compreender o lugar do sintoma do não-aprender para este grupo familiar. 3º Sessão “Hora do Jogo” (PAIN, 1992) A “hora do jogo” é utilizada para compreender alguns processos que podem ter levado ao surgimento de patologias no aprender. Este modelo vê o espaço de aprendizagem e o espaço de jogar como coincidentes. Normalmente esse momento é realizado em um encontro com o paciente individualmente. 4º Provas Psicométricas (PAIN, 1992) É o momento em que o psicopedagogo irá fazer uso de alguns testes e provas para avaliar as questões intelectuais como, por exemplo, a utilização do Diagnóstico Operatório de Piaget (D.O.P.). Essas provas oferecem uma visão do sujeito em função do rendimento apresentado e do comportamento apresentado. 5º Provas Projetivas (PAIN, 1992) É o momento em que utilizamos o desenho como um instrumento para o diagnóstico psicopedagógico com o objetivo de verifi car quais as situações que o sujeito projeta no seu desenho e quais os conteúdos estão presentes aí. Estas provas tentam desvendar como o sujeito se vê enquanto aprendente e qual a relação que estabelece com a aprendizagem. 6º Provas Específi cas (PAIN, 1992) O momento da utilização das provas específi cas tem como objetivo identifi car o nível de conhecimento que o sujeito possui. O psicopedagogo recebe a queixa que a família traz sobre o paciente e explora o que esta queixa signifi ca. É o momento em que o psicopedagogo escuta toda a família. Sobre a situação “problema de aprendizagem” e investiga a história do paciente. Compreender alguns processos que podem ter levado ao surgimento de patologias no aprender. Uso de alguns testes e provas para avaliar as questões intelectuais. Desenho como um instrumento para o diagnóstico psicopedagógico com o objetivo de verifi car quais as situações que o sujeito projeta no seu desenho e quais os conteúdos estão presentes aí. Tem como objetivo identifi car o nível de conhecimento que o sujeito possui. 41 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 Normalmente, são avaliadas as áreas de leitura, escrita, cálculo e, quando necessário, algumas provas psicomotoras. 7º Hipótese Diagnóstica (PAIN, 1992) É o momento em que o psicopedagogo reúne todo o material produzido pelo paciente e o analisa, bem como realiza a análise das entrevistas e da “hora do jogo”. Desta análise, o psicopedagogo levanta hipóteses sobre os motivos da difi culdade e busca compreender o sintoma do não-aprender. 8º Devolução Diagnóstica (PAIN, 1992) É o momento em que o psicopedagogo “devolve” à família o que vem a ser a difi culdade de aprendizagem do paciente e resgata a queixa inicial trazida na primeira entrevista. Para que você possa se aprofundar neste modelo diagnóstico, sugiro a leitura de dois livros básicos e de leitura obrigatória para todo psicopedagogo. São eles: PAIN, Sara. Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. FERNÁNDEZ, Alicia. A Inteligência Aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. Quanta informação, não é mesmo? Que tal organizarmos estes novos conhecimentos? Então, mãos à obra... Atividade de Estudos: 1) Proponho que você complete a tabela abaixo com cada um dos momentos propostos pelos modelos de diagnóstico psicopedagógico estudados anteriormente. O psicopedagogo levanta hipóteses sobre os motivos da difi culdade e busca compreender o sintoma do não- aprender. O psicopedagogo “devolve” à família o que vem a ser a difi culdade de aprendizagem do paciente e resgata a queixa inicial trazida na primeira entrevista. 42 Teoria e prática da psicopedagogia clínica SEQUÊNCIA DIAGNÓSTICA MOMENTOS Proposta de Weiss Modelo Médico Tradicional Proposta da Epistemologia Convergente Proposta de Rubinstein Proposta de Pain e Fernández 1º momento 2º momento 3º momento 4° momento 5º momento 6º momento 7º momento 8º momento De acordo com o que estudamos até agora, você pôde conferir que o profi ssional da área da psicopedagogia dispõe de diferentes possibilidades que nortearão a realização do diagnóstico. Mas, vale lembrar que, independente da sua futura escolha, aluno, é importante que o seu “fazer psicopedagógico” seja sempre pautado numa postura ética para com o sujeito aprendente. Na próxima sessão deste capítulo, vamos conhecer e estudar cada uma das etapas que compõe a realização do diagnóstico avaliativo. Espero que esse estudo seja muito proveitoso! Etapas do Diagnóstico Avaliativo Você já sabe que a realização de um bom diagnóstico é de grande relevância para todo o processo de intervenção psicopedagógica, não é mesmo? Já estudou também que existem vários caminhos possíveis para a realização deste diagnóstico, e que essa escolha depende da postura teórica adotada e da concepção que o profi ssional mais se identifi ca. É importante aqui ressaltar que as diferenças existentes entre uma ou outra abordagem e o modelo de diagnóstico escolhido, não devem alterar o resultado da avaliação, porém é preciso que o profi ssional acredite na linha que escolheu e se aprofunde nesta abordagem. A partir de agora, detalharemos cada uma das etapas do diagnóstico psicopedagógico, para que você, aluno, consiga compreender e aplicar cada uma delas. Queixa fundamental a difi culdade de um de seus membros diante da sua aprendizagem. 43 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 a) A queixa Como já visto anteriormente, a procura pelo trabalho psicopedagógico acontece quando uma família tem como queixa fundamental a difi culdade de um de seus membros diante da sua aprendizagem, sendo, portanto, a aprendizagem e suas relações a porta de entrada para a compreensão do caso que se apresenta. Durante a entrevista, na qual o profi ssional está explorando a queixa, é importante que ele fi que atento as diferentes formulações feitas pelos pais, pela escola e pelo próprio paciente em sua autovisão, para que sejam analisadas nos seus diferentes signifi cados. Nessas frases há diversas pistas que contribuem para o diagnóstico, trazendo à tona o signifi cado do sintoma da difi culdade no aprender. É importante que você perceba, aluno, que a “queixa” não é apenas uma frase falada no primeiro contato, ela precisa ser escutada ao longo das diferentes sessões, sendo fundamental refl etir sobre o seu signifi cado (WEISS, 1994). Durante a conversa para explorar a queixa, o psicopedagogo deve manter o foco no paciente e na sua problemática. Uma queixa nunca é isolada, existem todos os desdobramentos desta queixa e que devem ser apurados no momento do diagnóstico. Exemplos de queixas trazidas pelas famílias: • Ele não faz nada na sala, não fi xa em nada, não presta atenção na aula. • Lê bem, mas não consegue escrever. É ótimo na matemática, mas sempre foi mal em português. • Vai sempre mal na escola, mas eu também era assim e hoje estou muito bem. Estou aqui porque a escola mandou. Exemplos de queixas trazidas pelo próprio paciente: • Erro na escrita porque faço muito rápido, não sei fazer devagar. Não gosto de ler livro. O que eu gosto mais é da aula de música. Não gosto de dividir, não sei conta de dividir. • Estudo, na hora da prova dá nervoso e eu esqueço. Estou me esforçando. Nas matérias não vou nada bem. Não sei se vou conseguir resultadomelhor. Não gostei da professora, gritava muito. • Eu não queria aprender a ler e a escrever. Tenho medo de tirar nota baixa, repetir ano e perder os amigos. Tive difi culdade no colégio A, não era bom o ensino; aí, minha mãe me tirou e pôs em outra escola; aí, o segundo colégio não era bom e minha mãe botou em outro; aí, ela não gostou e eu voltei para o primeiro. 44 Teoria e prática da psicopedagogia clínica Atividade de Estudos: 1) Escolha uma das queixas dos exemplos dados acima e elabore três hipóteses que possam justifi car tal queixa. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Devemos receber a queixa trazida pelos pais e pedir que estes desenvolvam uma descrição sobre o que querem dizer essas palavras, quem as diz, por que o dizem, que pensam eles do por quê disto e o que essa difi culdade signifi ca para eles. Podemos solicitar que descrevam alguma cena familiar em que fi que em evidência a queixa, para que o profi ssional consiga perceber no concreto as situações que causam incômodo para a família e para o paciente. Para fi nalizar esse primeiro contato, o psicopedagogo deve investigar com os pais e com o próprio paciente o que eles esperam do atendimento psicopedagógico e quais as suas fantasias sobre o trabalho pois, é fundamental que o profi ssional saiba quais são as expectativas da família/paciente sobre o seu trabalho. b) Anamnese A realização de uma anamnese completa é um dos pontos cruciais de um bom diagnóstico. Ela objetiva colher dados signifi cativos sobre a história de vida do paciente. Da análise do seu conteúdo obtemos dados para o levantamento de hipóteses sobre a possível origem do caso, bem como sobre os seus desdobramentos. É necessário que a mesma seja bem conduzida e registrada. Porém, seu registro não deve inibir ou interferir no momento da conversa por isso, orienta-se que durante a sessão, seja registrado somente o mais importante para, logo após o término, a conversa ser transcrita na íntegra. O psicopedagogo deve investigar com os pais e com o próprio paciente o que eles esperam do atendimento psicopedagógico. Da análise do seu conteúdo obtemos dados para o levantamento de hipóteses sobre a possível origem do caso. 45 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 É ela que possibilita a integração das dimensões de passado, presente e futuro do paciente, permitindo perceber a construção ou não de sua própria continuidade e das diferentes gerações [...]. A visão familiar da história de vida do paciente traz em seu bojo seus preconceitos, normas, expectativas, a circulação dos afetos e do conhecimento, além do peso das gerações anteriores que é depositado sobre o paciente (WEISS, 1994, p.48). Para Weiss (1994), durante a realização dos encontros com a família, é importante que o psicopedagogo tenha em mente dois grandes eixos que nortearão as conversas e possibilitarão uma posterior análise. Em primeiro lugar, deve estar presente o eixo horizontal, onde se explora basicamente o momento presente. Este eixo permite que se realize a contextualização do problema existente no “aqui e agora”. O eixo vertical é o eixo histórico e onde se busca a construção geral do sujeito e do seu problema. • 1º Horizontal – A-Histórico – Visão do Presente; “AQUI, AGORA, COMIGO”. • 2º Vertical – Histórico – Visão do Passado, Visão da Construção do Sujeito (WEISS, 1994, p. 15). Figura 1 – Eixo Horizontal e Eixo Vertical Fonte: WEISS (1994, p. 16). Devemos ter claro que os dados obtidos na anamnese estarão contaminados pela percepção que os pais têm dos fatos e o entrevistador estará construindo uma imagem do sujeito sob a ótica dos pais, se este momento acontecer nos primeiros encontros. Em função de não se “contaminar” pelo que é dito sobre o sujeito que a proposta da Epistemologia Convergente opta por realizar a anamnese depois de todos os encontros com o sujeito. Visão do Presente. Visão do Passado 46 Teoria e prática da psicopedagogia clínica A entrevista deve ser conduzida pelo psicopedagogo, de forma que possa deixar a família a vontade, para que não se sintam como se estivessem respondendo a um questionário rígido e formal. O modelo de anamnese que deve ser seguido é o modelo de entrevista semi-aberta, onde o entrevistado tem maior liberdade para falar. Sob hipótese alguma a anamnese, em atendimento clínico, pode ser feito por meio de perguntas e respostas. É importante que o psicopedagogo tenha um roteiro em mãos em que possa se basear enquanto realiza a entrevista e onde possa ir anotando, à medida que a família vai expondo. De acordo com Sampaio (2012, p. 143) “deixá-los falar espontaneamente permite ao psicopedagogo avaliar o que eles recordam para falar, qual a sequência e a importância dos fatos”. ROTEIRO DA ANAMNESE Gravidez / Parto; Alimentação; Primeiras aprendizagens informais; Desenvolvimento geral da criança; Sono; História clínica; História escolar; Comportamento; Independência; Rotina; Aspectos social/afetivo. Fonte: A autora. A partir deste roteiro, o psicopedagogo deverá fi car atento ao que é dito e por quem é dito, e investigar os seguintes pontos, conforme Sampaio (2012, p. 145): • Há consciência da família em relação às difi culdades da criança? • A família auxilia o desenvolvimento da autonomia? • Os pais são muito autoritários e causam medo na criança? • A família participa e incentiva descobertas pela criança? • Há estímulos em casa relacionados a aprendizagem? • Nesta família circula a afetividade, ou só há cobranças? • Os limites são impostos e como são colocados? • Qual a forma de punição dada por esta família? O modelo de anamnese que deve ser seguido é o modelo de entrevista semi- aberta, onde o entrevistado tem maior liberdade para falar. 47 O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO CLÍNICA: O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICOCapítulo 2 Neste site, você encontra um roteiro bastante completo e detalhado de uma anamnese psicopedagógica. Segue o link: <http://loanycosta. blogspot.com.br/2011/08/historia-de-vida-ou-anamnese.html>. c) Sessão Lúdica Centrada na Aprendizagem ou “A Hora do Jogo” Com toda a certeza, podemos afi rmar que observar uma criança brincando é uma grande oportunidade para conhecer e compreender seu modo de agir e de pensar. Quando uma criança interage com brinquedos, ela expressa a realidade do seu mundo interno e a sua relação com o mundo externo através do brincar. Brincar é uma forma de expressão, pois através do jogo a criança defi ne seus papéis, seu espaço, mostrando suas relações interpessoais. Concordo com Fernández (1991), quando afi rma que o espaço de aprendizagem e o espaço de jogar/brincar são coincidentes, já que a criança utiliza as mesmas estruturas mentais em ambos os casos. De acordo com Caierão (2013, p. 49): A Psicopedagogia, cuja função é mediar o processo de aprendizagem de quem se encontra impossibilitado de fazê- lo e resgatar o prazer de aprender, fazendo-se autor do seu próprio aprender, encontra na ação do brincar os principais fundamentos para a sua prática emancipatória com crianças, pois não há como fazer Psicopedagogia fora da perspectiva lúdica, já que a ludicidade implica construção, autoria e prazer. A observação lúdica é uma técnica de coleta de dados que auxilia o psicopedagogo a investigar os aspectos mais signifi cativos do brincar para a formulação das suas hipóteses sobre o quadro de difi culdade de aprendizagem que a criança vem enfrentando. Contudo, o profi ssional precisa saber “ler”
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