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História da África Pré-Colonização Aula 3: A África tradicional: Uma análise das matrizes africanas Apresentação Nesta aula, analisaremos as matrizes socioculturais da África Subsaariana, examinando as consequências da expansão bantu durante o processo de ocupação do continente africano e aprendendo a importância que a família, a noção de ancestralidade e o poder da palavra falada tinham para as sociedades da África Tradicional. Objetivos Identi�car as matrizes da chamada África tradicional; Reconhecer os aspectos semelhantes existentes nos diferentes povos da África localizada ao sul do Saara; Analisar as origens das semelhanças socioculturais que compõem a África Tradicional. Video Assista o vídeo Baba Alapalá - Gilberto Gil. javascript:void(0); Percepção sobre a África Antes de começar o estudo, faça a seguinte re�exão: Anote em um papel as palavras que lhe vem à cabeça quando você pensa na ÁFRICA. Depois de ter feito a aula, procure analisar o porquê da sua escolha. Em seguida, elenque as palavras-chave da aula 03 e justi�que sua resposta. Essa atividade também pode ser estendida para outras pessoas. Se possível, formem um grupo de discussão para tentar analisar as palavras elencadas. Fonte: Shutterstock. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Um dos grandes equívocos cometidos ao se estudar a história da África Subsaariana é imaginar que todos os povos que habitaram essa região eram iguais. Existiram comunidades tradicionais africanas que sobreviviam da atividade pesqueira; outras que dependiam da criação de gado e muitas que viviam da produção agrícola. Além disso, nem todas essas sociedades se organizavam da mesma forma: existiram aldeias, clãs de aldeias e até mesmo cidades-estados e reinos. Fonte: Atelie Mariella. javascript:void(0); O convívio entre essas comunidades também não era sempre pací�co e harmonioso. Por diferentes razões esses grupos travavam guerras entre si e muitas vezes escravizavam grupos vizinhos. Todavia, embora os pequenos grupos que habitavam não se enxergassem como iguais, havia semelhanças signi�cativas entre eles que devem ser entendidas. Muitas das características em comum encontradas em diversas sociedades africanas, sobretudo na África Subsaariana, são decorrentes de um movimento migratório ocorrido entre três e quatro mil anos atrás, denominado Expansão Bantu. A Expansão Bantu O bantu era umas das subdivisões da família linguística Níger-congo, que era falado por populações que habitavam as proximidades do rio Níger. ... graças ao aumento populacional e ao desmatamento decorrentes da pesca farta e do cultivo de gêneros alimentícios como o arroz, o inhame e as palmeiras oleaginosas (como a do dendê), os grupos humanos que ocupavam essa região iniciaram dois grandes processos de migração em busca de novas terras. O primeiro processo migratório partiu da região central de Camarões e rumou para o norte da atual República Democrática do Congo e para a África oriental. Esse movimento migratório ainda desenvolveu a atividade pastoril e adquiriu os conhecimentos necessários para o manejo do ferro com sociedades que habitavam o norte do continente. Já o segundo movimento de migração das línguas bantu saiu da região da �oresta do sudeste na Nigéria e expandiu- se para a bacia do rio Congo e seus a�uentes, chegando ao sul da África. Essas regiões só aprenderam o manuseio do ferro anos depois. Os grupos de caçadores coletores que entraram em contato com essa “onda de migração” adotaram as línguas bantas para se aproximarem e negociarem com os grupos recém- chegados. Desse encontro de culturas surgiriam inúmeras sociedades que, embora fossem diferentes e muitas vezes inimigas, guardavam traços socioculturais semelhantes. As Famílias de Linhagem O bantu era umas das subdivisões da família linguística Níger-congo, que era falado por populações que habitavam as proximidades do rio Níger. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Uma das principais instituições das chamadas sociedades tradicionais africanas era a família, pois era ela que primeiro de�nia o pertencimento dos indivíduos no grupo. No entanto, na África subsaariana, a noção de família é diferente do modelo europeu. As famílias africanas eram extensas, formadas não só pela mãe, pai e seus �lhos, mas também pelos avós, tios, sobrinhos, netos e primos que tinham um ancestral em comum. A família extensa, também chamada de linhagem, era a organização que assegurava a existência física e a perpetuação dos indivíduos, permitia a socialização no grupo e proporcionava o sentimento de pertencer a um coletivo, na medida em que possibilitava a conexão de cada membro à sua ancestralidade, ou seja, à sua história. Comentário Conforme dito anteriormente, as condições naturais de muitas regiões africanas nem sempre eram as mais favoráveis para a sobrevivência humana. Desse modo, por meio de uma rede de direitos e deveres que, estabelecidos hierarquicamente, as famílias extensas conseguiram garantir a vida da comunidade. Cada geração de uma determinada linhagem tinha obrigações a cumprir e direitos a gozar. Geralmente, os adultos eram responsáveis pelo sustento da linhagem e deveriam produzir o su�ciente para alimentar os idosos e as crianças. Os mais velhos, grupo mais respeitado de cada família, ocupavam os cargos de che�a das comunidades e eram responsáveis pelos rituais de iniciação dos mais jovens e cultos aos ancestrais familiares. Sendo assim, quanto maior fosse o tamanho de uma linhagem, principalmente no que diz respeito ao número de adultos, maiores eram as chances desta família sobreviver. Não por acaso, a poligamia era prática comum nessas sociedades, pois permitia o crescimento constante das linhagens e a manutenção da ampla rede de parentesco. Fonte: Pixabay. Mulheres africanas trabalhando na colheita de milho. De forma geral, todas as atividades que estivessem relacionadas com o espaço doméstico eram realizadas pelas mulheres adultas (entre 15 e 40 anos). Eram elas que tratavam de todos os afazeres da casa, criavam os �lhos, cortavam lenha para o fogo, buscavam água, confeccionavam utensílios de cerâmica e, principalmente, cuidavam da produção dos gêneros agrícolas. Já aos homens da mesma idade cabia a criação de animais, a atividade pesqueira, a caça (quando essa atividade era realizada), a segurança da comunidade, as diferentes atividades artesanais, sobretudo o manuseio do ferro e as produções artísticas. Saiba mais Por meio de vias �uviais ou terrestres, o excedente daquilo que era produzido nas comunidades tradicionais era comercializado nos mercados locais próximos. Tais mercados viabilizavam não só a troca de produtos oriundos de diferentes localidades, mas também possibilitavam a circulação de informação e a formação de redes sociais entre duas ou mais sociedades. Religiosidade: O Culto Ancestral e as Divindades da Natureza Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Fonte: Pixabay. Junto com a noção de família extensa, a religiosidade era uma das características de�nidoras das sociedades da África Subsaariana. Embora cada comunidade acreditasse em um Deus ou em deuses próprios, as formas por meio das quais os membros desses grupos entravam em contato com o divino era muito semelhante. Isso porque em praticamente toda a África abaixo do Saara a religião era vivenciada no cotidiano. Toda ação humana era uma ação religiosa. O cultivo da terra era geralmente antecedido por cerimônias que visavam a fertilidade. Quando meninos e meninas entravam na fase adulta, era comum que fossem feitos rituais de iniciação secretos, nos quais os jovens �cavam reclusos por algum tempo aprendendo os ensinamentos da idade adulta e da pro�ssão que deveriam seguir. Em algumas comunidades, o processo de iniciação dos meninos que se transformariam em ferreiros chegava a durar anos. Até a família extensa era compreendidapor meio da religião. Praticamente todas as sociedades da África subsaariana acreditavam na coexistência do mundo dos mortos e por isso realizavam o culto aos antepassados acreditando que eles eram uma espécie de semideuses que serviam como intermediários na comunicação com forças maiores. De forma parecida com o que aconteceu com o império romano antes da conversão ao cristianismo, quase todas as casas africanas tinham pequenos altares particulares, no qual cultuavam seus ancestrais familiares. Baobá - árvore considerada sagrada por boa parte das sociedades africanas. Fonte: Pixabay. Junto o culto aos antepassados, as comunidades africanas também cultuavam deuses especí�cos que estavam diretamente relacionados com elementos da natureza. Esses cultos geralmente eram acompanhados de muita música e dança e, em alguns casos, envolvia o transe de pessoas que estavam iniciadas para incorporar os deuses ancestrais. Em diversos casos, esses deuses tinham sido os chefes fundadores da sociedade que após a morte tinham se transformado em deuses do trovão, deuses da chuva, deuses da Lua e do Sol. Muitos povos acreditavam em entidades que viviam nas águas dos rios e dos lagos, ou então na força de uma determinada árvore e de animais especí�cos. Mas é importante lembrar que as aldeias africanas não acreditavam nos mesmos deuses. Cada comunidade, cidade ou reino tinha seus deuses e entidades próprios e formas especí�cas de realizar seus cultos e cerimônias religiosas. Embora a religião fosse praticada por toda comunidade, pois era ela que dava o sentido de coletividade aos diferentes povos, existiam �guras que tinham relação ainda mais intensa com o mundo do divino, como os sacerdotes e os feiticeiros. Os sacerdotes eram as pessoas (homens ou mulheres) responsáveis por boa parte das cerimônias religiosas, comandavam os rituais de iniciação e eram as pessoas mais capazes para ler os possíveis sinais dos deuses, bem como os jogos de adivinhação. Saiba mais Os feiticeiros tinham atributos semelhantes ao dos sacerdotes, mas o fato de saberem alterar as características físicas de alguns elementos da natureza fazia com que fossem �guras ao mesmo tempo temidas e respeitadas pelo grupo. Não por acaso, muitos dos feiticeiros também eram ferreiros, pois ambos detinham o poderoso conhecimento de como alterar a natureza. O Poder da Palavra Falada Fonte: Pixabay. De maneira geral, era por meio da palavra falada que o conhecimento era transmitido de geração para geração. Isso porque a palavra era uma das formas que o homem tinha de se conectar com o mundo divino e sobrenatural, era o elo entre o passado, o presente e o futuro. Saiba mais Dessa feita, era por meio da tradição oral que o conhecimento, os costumes, as histórias e os mitos eram contados. Embora a palavra fosse respeitada por todo o grupo, assim como ocorria com a religião, cada sociedade tinha um sacerdote da palavra, ou seja, uma pessoa responsável por guardar a palavra. Baixe o PDF e leia mais sobre o assunto. Para ajudar a ampliar o conhecimento sobre as muitas Áfricas que existiram, as próximas aulas irão tratar de parte da história de algumas sociedades do continente africano, para que não só as semelhanças, como as diferenças existentes entre elas possam ser compreendidas. Até a próxima e bons estudos! Referências M'BOKOLO, Elikia. África Negra: história e civilizações. Lisboa: Vulgata, 2003. SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo. A África e a escravidão de 1500 a 1700, Rio de Janeiro, Nova Fronteira: Fundação Biblioteca Nacional, 2002. SILVA,A.C. A enxada e a lança. A África antes dos portugueses. Nova Fronteira/EDUSP. São Paulo, 1992. Próxima aula Os preceitos básicos do islamismo; As razões que levaram à chegada do islamismo na África Subsaariana; As mudanças que o islamismo empregou na África Subsaariana, examinando o caso do reino de Gana. javascript:void(0); Explore mais Texto