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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 5 2 ESTRUTURA E FUNÇÃO DA CÉLULA .................................................................. 6 2.1 A célula e sua membrana plasmática ................................................................. 9 2.2 Organelas celulares e suas funções ................................................................. 12 2.2.1 Endossomos ..................................................................................................... 14 2.2.2 Aparelho de Golgi ............................................................................................. 14 2.2.3 Lisossomos.... ................................................................................................... 15 2.2.4 Peroxissomos ................................................................................................... 16 2.3 O núcleo e seus componentes.......................................................................... 16 3 ESTRUTURA DA MEMBRANA PLASMÁTICA ..................................................... 19 3.1 Estrutura das membranas plasmáticas ............................................................. 20 3.1.1 Lipídios.............................................................................................................. 21 3.1.2 Proteínas......... .................................................................................................. 22 3.2 Organização da membrana plasmática ............................................................ 26 4 MITOCÔNDRIA: CONVERSÃO ENERGÉTICA E RESPIRAÇÃO CELULAR ...... 27 4.1 Morfologia e funções da mitocôndria ................................................................ 27 4.2 Duas membranas, dois compartimentos mitocondriais ..................................... 28 4.3 DNA mitocondrial .............................................................................................. 29 4.4 Biogênese mitocondrial ..................................................................................... 30 4.5 Funções da mitocôndria .................................................................................... 31 4.6 Respiração celular ............................................................................................ 32 4.7 Glicólise ............................................................................................................ 33 4.8 Energia celular .................................................................................................. 35 5 DIVISÃO CELULAR: MITOSE E MEIOSE ............................................................ 37 5.1 O ciclo e a divisão celular ................................................................................. 37 5.2 Mitose, meiose e citocinese .............................................................................. 38 5.2.1 Mitose........... .................................................................................................... 38 5.2.2 Meiose.............. ................................................................................................ 39 5.2.3 Citocinese.......... ............................................................................................... 40 5.3 Etapas da mitose e da meiose .......................................................................... 41 5.3.1 Mitose........... .................................................................................................... 41 3 5.3.2 Meiose.......... ................................................................................................... 42 6 BIOLOGIA MOLECULAR: SEQUENCIAMENTO DE DNA ................................... 43 6.1 Métodos de sequenciamento de DNA .............................................................. 43 6.1.1 Método enzimático de Sanger .......................................................................... 44 6.1.2 Métodos de nova geração ................................................................................ 45 6.2 Estratégias para sequenciamento de genomas ................................................ 46 6.3 Genômica: análise de genomas ........................................................................ 49 6.3.1 Montagem de genomas .................................................................................... 49 6.4 Anotação de genomas ...................................................................................... 50 6.5 Bancos de dados de sequências de DNA ......................................................... 50 7 ORIGEM DA BIOTECNOLOGIA ........................................................................... 52 7.1 Biotecnologia e origens ..................................................................................... 52 7.2 O marco biotecnológico .................................................................................... 53 7.3 Fatos históricos e a biotecnologia ..................................................................... 53 7.4 Aplicabilidades da biotecnologia ....................................................................... 55 7.5 Benefícios da biotecnologia na saúde .............................................................. 56 8 ENGENHARIA GENÉTICA ................................................................................... 57 8.1 Tecnologia do DNA recombinante .................................................................... 58 8.2 Organismos geneticamente modificados (OGMs) ............................................ 61 8.3 Terapia gênica: princípios e aplicações ............................................................ 62 9 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA E DIFERENCIAÇÃO CELULAR ........... 64 9.1 Sítios de controle da transcrição gênica ........................................................... 64 9.2 Expressão gênica em procariotos e eucariotos ................................................ 65 9.2.1 Procariotos..... ................................................................................................... 65 9.2.2 Eucariotos....... .................................................................................................. 66 9.2.3 Transcrição..... .................................................................................................. 66 9.3 Diferenciação Celular ........................................................................................ 67 10 DIAGNÓSTICO MOLECULAR DE DOENÇAS GENÉTICAS E INFECCIOSAS ... 68 10.1 Principais técnicas de biologia molecular utilizadas para diagnósticos ............. 69 10.2 Técnicas diagnósticas associadas às patologias .............................................. 70 10.3 Contribuições da biologia molecular no diagnóstico de doenças ...................... 73 11 BIOLOGIA E EDUCAÇÃO .................................................................................... 77 11.1 A profissão de biólogo na área de ensino ......................................................... 80 4 11.2 O professor biólogo e a educação ambiental .................................................... 80 11.3 Projetos de conscientização ambiental nas escolas ......................................... 81 11.4 A docência no ensino básico ............................................................................ 82 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 86 5 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Emuma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 6 2 ESTRUTURA E FUNÇÃO DA CÉLULA Todos os seres vivos são constituídos por células (menos os vírus). As células são nossas menores unidades constituintes, no entanto, possuem funções capazes de determinar nossas vidas. Assim, lançar o olhar sobre essas unidades é de extrema importância para o reconhecimento de suas estruturas e funções que regulam todo nosso organismo, incluindo processos que se iniciam desde a concepção da vida (na fecundação do óvulo e espermatozoide) e determinam nossa saúde e características físicas e fisiológicas. (HERNANDEZ, 2018). Refletindo as células enquanto unidades constituintes de todos os seres vivos, ainda, como menor unidade anatomofisiológica do corpo humano e tendo em vista a importância das células segundo suas funções, vamos lançar um olhar microscópico sobre as células e aprofundar nosso conhecimento sobre suas estruturas. Inicialmente, vamos observar as células animal, vegetal e bacteriana do ponto de vista de suas estruturas. As células possuem componentes principais como membrana plasmática (que envolve toda a célula, isolando-a do meio externo), citoplasma (espaço entre a membrana plasmática e o núcleo, com exceção das células bacterianas) e organelas (estruturas com funções específicas para o metabolismo celular). Observando as Figuras abaixo, é possível identificar estruturas semelhantes entre as três células (membrana externa, citoplasma — exceção bactérias — e organelas), no entanto, as células vegetal e animal possuem mais estruturas em comum quando comparadas com a célula bacteriana, além disso, ambas são consideradas eucariontes (possuem núcleo definido) enquanto a célula bacteriana é procarionte (material genético disperso). Outra forma de analisar as células é por meio de seu ciclo de vida, seja para regeneração ou cicatrização. Assim, as células podem ser classificadas como lábeis, estáveis ou permanentes. As lábeis são aquelas que possuem um ciclo de vida curto, por exemplo, as hemácias (células do sangue), que são renovadas/destruídas a cada 120 dias. Já as células estáveis geralmente não se dividem, e sim se proliferam quando estimuladas, por exemplo, células das glândulas do fígado, pâncreas, salivares etc. Por fim, as células permanentes não se dividem e nem se proliferam, como as células do sistema nervoso central e músculos. (AMABIS; MARTHO, 2006; LOPES; ROSSO, 2013). 7 Célula animal; célula vegetal Fonte: https://www.queroadesivo.com.br/ Célula bacteriana Fonte: https://slideplayer.com.br/ Observados os tipos de células, vamos analisar suas principais estruturas e detalhar suas funções. As células são revestidas por uma camada externa, a membrana celular, denominada membrana celular na célula animal, parede celular na vegetal, e cápsula na bacteriana. (HERNANDEZ, 2018). 8 A função dessa membrana é realizar a troca de substâncias com o meio externo, isto é, essa membrana é semipermeável e por isso realiza a permeabilidade seletiva, pois permite a passagem de certas substâncias enquanto impede outras. Essa função é possível por causa de sua constituição lipoproteica (lipídeos e proteínas). Sua função específica é reconhecer substâncias no meio extracelular e sinalizar suas estruturas internas para possíveis ações internas da célula; além disso, é por meio da membrana que ocorre o transporte de substâncias de dentro e de fora da célula (ALBERTS et al., 2017b; AMABIS; MARTHO, 2006; COOPER; HAUSMAN, 2007; LOPES; ROSSO, 2013). Quanto ao transporte de substâncias por meio da membrana, podem ocorrer por transporte passivo, ativo ou por meio de vesículas. No transporte passivo, as moléculas e íons perpassam a membrana sem requerer energia da célula. Nesse tipo de transporte, a concentração da substância de dentro e de fora da célula é que determina a passagem. Assim, podem ocorrer por difusão simples (as moléculas de um soluto passam pela membrana permeável, do local mais concentrado para o menos concentrado, isto é, a favor do gradiente de concentração). Também podem ocorrer por osmose (mesmo mecanismo, mas agora contra o gradiente de concentração) ou por difusão facilitada (que ocorrem a favor do gradiente de concentração e por meio de proteínas de canal ou carregadoras). Já o transporte ativo ocorre quando a troca de moléculas e íons da célula para com o meio externo e vice-versa exigem energia celular. Esse transporte ocorre contra o gradiente de concentração e é promovido por proteínas transportadoras. Por fim, o transporte por meio de vesículas pode ocorrer por endocitose (processo para capturar partículas sólidas — fagocitose — ou líquidas — pinocitose) ou por exocitose (processo de eliminação de substâncias para fora da célula) (ALBERTS et al., 2017b; AMABIS; MARTHO, 2006; COOPER; HAUSMAN, 2007; LOPES; ROSSO, 2013). Diante disso, fica evidente a importância da membrana externa da célula, já que ela não somente protege a célula como é vital para a troca de substâncias promovendo algumas ações importantes para o bom funcionamento do organismo e consequentemente da vida. O núcleo não faz parte do citoplasma e abriga o material genético da célula, controlando a atividade celular; dentro do núcleo se inicia o processo de replicação do DNA, transcrição e processamento do RNA, porém o processo de tradução (parte final 9 da tradução gênica) ocorre no citoplasma. O núcleo é envolto pela carioteca, que possui constituição membranosa justapostas com um espaço interno. Nessa membrana, há poros circundados por estruturas proteicas que regulam a entrada e a saída de substâncias no núcleo, processo semelhante à membrana celular. As outras partes que formam o núcleo compreendem o nucléolo (uma região próxima da carioteca que é constituída por RNA ribossômicos e proteínas), o nucleoplasma (espaço onde se encontram mergulhados os filamentos de cromatina, proteínas ribossômicas, moléculas de ATP, nucleotídeos, íons etc.) e por fim o material genético (composto de longos filamentos de DNA condensados e associados a proteínas) (ALBERTS et al., 2017b; AMABIS; MARTHO, 2006; COOPER; HAUSMAN, 2007; LOPES; ROSSO, 2013). Assim, a membrana plasmática e o núcleo constituem estruturas muito importantes para a vida celular, pois a primeira, além de realizar a delimitação da célula, tem como principal função regular a entrada e a saída de substâncias dela, e a segunda possui o material genético da célula e, determinando, portanto, a vida celular. Agora vamos analisar as estruturas que se localizam dentro da membrana celular, mergulhadas no líquido gelatinoso (denominado hialoplasma) do citoplasma. 2.1 A célula e sua membrana plasmática As células são compostas por três estruturas básicas: membrana plasmática, citoplasma e núcleo. Existem dois grandes grupos de células: procariotos e eucariotos. As bactérias e algas pertencem ao grupo de procariotos, enquanto que os animais e os vegetais são formados por célulaseucariotas. Cada célula, procariota ou eucariota, contém pelo menos 10 mil diferentes tipos de moléculas, a maioria delas presente em múltiplas cópias. Essas moléculas se transformam em matéria e energia para interagir com o ambiente e se reproduzirem. É praticamente impossível conhecer todas essas moléculas, mas o conhecimento da biologia celular corresponde, em certo sentido, ao estudo da vida. Sabe-se que ela é contínua e que todas as células de um organismo vêm de uma única célula, um óvulo fertilizado, originado da fusão de duas células (espermatozoide e óvulo). 10 O tamanho pequeno de uma célula, é consequência da necessidade prática de se manter uma razão entre a área de superfície e o volume. Dessa forma, quando a célula ou objeto cresce, sua área de superfície também aumenta, porém não na mesma proporção. O volume da célula indica a quantidade de atividade possível de ser desempenhada por unidade de tempo. Já a área de superfície da célula determina a quantidade de moléculas que ela pode incorporar e/ou liberar para o ambiente externo. (HERNANDEZ, 2018). Com o aumento do volume celular, a atividade e necessidade de recursos aumenta de forma mais rápida do que a área de superfície. Além disso, as células precisam redistribuir substâncias com frequência para diferentes regiões em seu interior, logo, quanto menor a célula, maior facilidade na realização da tarefa. Este é o grande motivo do porquê de grandes organismos serem compostos por diversas células pequenas, o volume pequeno mantém uma razão eficiente entre área de superfície e volume e, também, possuir um volume interno ideal. As células são delimitadas pela membrana plasmática, que a separa do ambiente externo, criando um compartimento ao seu redor, um compartimento separado, mas não isolado. A membrana plasmática é formada por uma bicamada fosfolipídica, com as “cabeças” hidrofílicas dos lipídios direcionadas para o interior aquoso da célula, em uma das faces da membrana, e para o ambiente extracelular, no lado oposto, com as proteínas e outras moléculas inseridas entre os lipídios. Além de funções importantes, a membrana plasmática tem significância biológica por sua atuação como uma barreira seletiva, permitindo a entrada de nutrientes, retenção de produtos de síntese e excreção de resíduos. Para entender melhor, observe a Figura: Fonte: Lodish et al. (2013, p. 446). 11 Ambos os tipos celulares, procariotos e eucariotos apresentam a membrana plasmática provida de muitas proteínas que desempenham uma diversidade de funções semelhantes, entre elas: permite que a célula mantenha um ambiente interno relativamente autorregulável (homeostase), que é uma característica-chave da vida; atua como barreira permeável, mas seletiva, evitando que algumas substâncias a atravessem, e permitindo o trânsito de outras, tanto para dentro quanto para fora da célula; tem importância na comunicação com as células adjacentes e para a recepção de sinais provenientes do ambiente, por intermédio das especializações de membrana; apresenta proteínas que se projetam de seus limites e são responsáveis pela ligação e aderência a células adjacentes. Porém, as células eucarióticas, que normalmente são bem maiores do que as procarióticas, apresentam organelas internas ligadas por membranas. A membrana dessas organelas tem uma configuração própria de proteínas que promove o desempenho de funções celulares características, como a geração de ATP (nas mitocôndrias) e a síntese de DNA (no núcleo). Muitas proteínas da membrana plasmática também unem componentes do citoesqueleto, uma forte rede de filamentos proteicos que atravessa o citosol para propiciar suporte mecânico às membranas celulares e assumir a forma da célula. Apesar de muito resistentes, as membranas são estruturas maleáveis que podem curvar-se, dobrar-se em três dimensões e, ainda, conservar sua integridade, devido, principalmente, a abundantes interações não covalentes que mantêm unidos os lipídios e as proteínas. Assim, a grande mobilidade de lipídios e proteínas individuais é chamada de modelo do mosaico fluido de biomembranas, que foi proposto por cientistas na década de 70. A bicamada lipídica se comporta, em alguns aspectos, como um fluido bidimensional, com moléculas individuais capazes de se mover uma após a outra e girar no seu local. Essa fluidez e essa flexibilidade da membrana permitem às organelas, além de assumir suas formas típicas, propriedade dinâmica de brotamento e fusão de membranas, como ocorre quando são liberados os vírus de uma célula infectada, por exemplo. (ROSA, 2018). 12 As duas superfícies de uma membrana celular são chamadas de face citosólica e face exoplasmática. A face exoplasmática da membrana fica voltada para fora do citosol, para o espaço extracelular ou ambiente externo e define o limite externo da célula. Já a face citosólica da membrana plasmática volta-se para o citosol. Em todas as organelas e vesículas circundadas por uma membrana simples, a face citosólica está voltada para o citosol. Organelas essenciais para a sobrevivência a célula (núcleo, mitocôndria e cloroplasto) são circundadas por duas membranas. (ROSA, 2018). 2.2 Organelas celulares e suas funções A membrana plasmática delimita a célula e é uma estrutura vital, já que é a interface que a célula tem com seu ambiente, separando o meio externo do citoplasma interno. Embora as propriedades físicas da membrana plasmática sejam, em grande parte, determinadas por seu conteúdo lipídico, o complemento proteico de uma membrana é o principal responsável pelas propriedades funcionais da membrana. Moléculas maiores que íons e outros metabólitos podem ser captadas através da endocitose, a formação de uma invaginação da membrana plasmática. Durante a endocitose, são formados poços revestidos, em que os receptores coletam e trazem para a célula, moléculas ou partículas específicas, mediadas por receptor. Após a internalização, os materiais são classificados e podem retornar à membrana plasmática ou ser entregues a lisossomos para degradação. Os lisossomos contêm diversas enzimas digestivas que degradam qualquer molécula biológica em componentes menores. O lúmen dos lisossomos possui pH ácido e isso ajuda a desnaturar proteínas. Até agora não foram descritos lisossomos em células vegetais, mas o vacúolo central de uma célula vegetal pode apresentar uma capacidade de atuação semelhante, pois também apresentam diversas enzimas digestivas. A maior organela é chamada de retículo endoplasmático (RE), é uma extensa rede de vesículas e túbulos achatados ligados à membrana. O RE pode ser dividido em retículo endoplasmático liso (REL), pois sua membrana de superfície é lisa e retículo endoplasmático rugoso (RER), que é revestido por ribossomos. O REL é o local de síntese de ácidos graxos e fosfolipídios. Já o RER, com seus ribossomos 13 acoplados, é o sítio de síntese de proteínas da membrana e de proteínas que serão secretadas pela célula responsável. Após a síntese no RE, as proteínas são destinadas para a membrana plasmática ou para secreção, são transportadas para o complexo de Golgi, um conjunto de membranas achatadas chamadas de cisternas, onde as proteínas são modificadas antes de serem transportadas ao seu destino na membrana plasmática. As proteínas destinadas para secreção são sintetizadas no RE, transportadas pelo complexo de Golgi e liberadas pela célula, este processo todo é chamado de via secretora. Nos procariotos, os ribossomos flutuam livremente no citoplasma. Já nos eucariotos, podem ser encontrados no citoplasma, livres ou ligados à superfície do RE, no interior de mitocôndrias e cloroplastos. Em ambos locais, os ribossomos representam os sítios em que ocorre a síntese de proteínas direcionada pelos ácidos nucleicos. Os ribossomosdos procariotos e eucariotos assemelham-se em constituição e diversidade de tamanhos. Porém, os ribossomos eucarióticos são, relativamente, maiores, mas a estrutura dos ribossomos procarióticos é mais conhecida. Sabe-se que contêm um tipo especial de RNA denominado RNA ribossomal (rRNA), o qual mais de cinquenta tipos diferentes de moléculas de proteínas ligam-se não covalentemente. No peroxissomo, classe de organelas semiesféricas que contém oxidases de enzimas que utilizam oxigênio molecular para oxidar toxinas, transformá-las em produtos inofensivos e para a oxidação de ácidos graxos na produção de grupos acetila. Até aqui, todas as organelas comentadas são circundadas por uma única membrana formada por uma bicamada lipídica. Os vegetais e algas verdes apresentam cloroplastos que são organelas que usam o processo de fotossíntese para capturar a energia luminosa com pigmentos coloridos, incluindo o pigmento verde clorofila e, para assim, estocar a energia capturada em forma de ATP. As mitocôndrias de outros organismos, podem ocupar até 30% do volume do citoplasma. A membrana mitocondrial interna é bastante retorcida com dobras chamadas de cristas, que formam saliências no espaço central, chamadas de matriz. Uma das principais funções das mitocôndrias é completar os estágios finais da degradação da glicose, por meio da oxidação para gerar a maior parte do suprimento de ATP da célula. Desta forma, as mitocôndrias podem ser consideradas as “usinas” da célula. (ROSA, 2018). 14 Algumas teorias sugerem que as mitocôndrias e os cloroplastos tenham evoluído a partir de um acontecimento antigo, quando uma célula eucariótica fagocitou um tipo de bactéria, isso originou as mitocôndrias e um tipo diferente que deu origem aos cloroplastos, pois as membranas destas organelas servem como evidências para sustentar essa hipótese. A membrana interna teria, provavelmente, se originado a partir da membrana da bactéria original, enquanto a membrana externa seria um vestígio da membrana plasmática da fagositose. Outra evidência desta teoria é o fato de tanto as mitocôndrias quanto os cloroplastos terem o seu próprio DNA genômico e, que a síntese de proteínas nas organelas tem maior semelhança à síntese proteica em bactérias do que à síntese proteica em eucariotos. (ROSA, 2018). 2.2.1 Endossomos Os endossomos formam um compartimento que recebe as moléculas introduzidas no citoplasma das células pelas vesículas de pinocitose, que se originam da membrana plasmática. O compartimento endossomal é constituído de elementos separados; é um sistema extenso, que se vai desde a periferia do citoplasma até as proximidades do núcleo celular. (CARNEIRO; JUNQUEIRA, 2012) É formado por vesículas e túbulos, cujo interior apresenta pH ácido. Esse compartimento é responsável pela separação e pelo endereçamento do material que penetra no citoplasma pelas vesículas de pinocitose. Grande parte desse material é encaminhada para os lisossomos, porém, muitas moléculas passam dos endossomos para o citosol, e outras são desenvolvidas para a superfície celular. Os endossomos podem ser considerados como uma parte da via lisossomal, porque muitas moléculas que se dirigem para os lisossomos passam antes pelos endossomos. 2.2.2 Aparelho de Golgi Essa organela é também conhecida como zona ou complexo de Golgi, estando constituída por um número variável de vesículas circulares achatadas e por vesículas esféricas de diversos tamanhos, que parecem brotar das primeiras. Em muitas células, o aparelho de Golgi localiza-se em posição constante, quase sempre ao lado do núcleo; em outras células, ele se encontra disperso pelo citoplasma. (CARNEIRO; JUNQUEIRA, 2012). 15 Essa organela apresenta múltiplas funções; mas dentre elas, cabe destacar que é muito importante na separação e no endereçamento das moléculas sintetizadas nas células, encaminhando-as para as vesículas de secreção (o que serão expulsas da célula), os lisossomos, as vesículas que permanecem no citoplasma ou a membrana celular. Fonte: https://escolaeducacao.com.br/ 2.2.3 Lisossomos Os lisossomos são organelas de forma e tamanho muito variáveis (medem, frequentemente, 0,50 a 3,0 µ.m de diâmetro, cujo interior é ácido e contém diversas enzimas hidrolíticas (enzimas que rompem moléculas, adicionando os átomos das moléculas de água). As hidrolases dos lisossomos têm atividade máxima em Ph ácido. Essas enzimas são sintetizadas pelos Polirribossomos que se prendem ao retículo endoplasmático rugoso. Os lisossomos são depósitos de enzimas utilizadas pelas células para digerir moléculas introduzidas por pinocitose, por fagocitose, ou, então organelas da própria célula. A destruição de renovação de organelas é um processo fisiológico que permite à célula manter seus componentes em bom estado funcional e em quantidade adequada às suas necessidades do momento. As organelas desgastadas pelo uso são eliminadas e substituídas por organelas novas. As que não são mais necessárias são removidas. (CARNEIRO; JUNQUEIRA, 2012). 16 2.2.4 Peroxissomos Os peroxíssomos são organelas caracterizadas pela presença de enzimas oxidativas que transferem átomos de hidrogênio de diversos substratos para o oxigênio. Os peroxissomos contém a maior parte da catalase celular, enzima que converte peróxido de hidrogênio em agua e oxigênio. (CARNEIRO; JUNQUEIRA, 2012). 2.3 O núcleo e seus componentes O sucesso evolutivo de um organismo depende da sua capacidade de armazenar, obter e traduzir as informações genéticas necessárias para manter o organismo vivo. Esta informação é hereditária, ou seja, é passada de uma célula às células-filhas durante a divisão celular, e é no núcleo celular de todas as células eucarióticas, que estas instruções são armazenadas. O núcleo é a organela em que se encontra o DNA da célula e o local da transcrição do DNA em RNA mensageiro. O núcleo tem uma membrana interna e também membrana externa contínua à membrana do RE, de forma que o espaço entre as membranas nucleares interna e externa é contínuo. O acesso à face interna e externa do núcleo se dá através de conexões tubulares entre as membranas interna e externa estabilizadas por poros nucleares. Estes poros definem o local de transporte na membrana nuclear e atuam como barreiras, permitindo apenas o transporte de macromoléculas específicas para dentro e fora do núcleo. Os poros são compostos por mais de 100 diferentes proteínas, que interagem hidrofobicamente. Cada poro é circundado por um complexo de oito grandes agregados proteicos, organizados sob a forma de um octógono, no ponto de contato entre as membranas interna e externa. O poro nuclear funciona com uma catraca na entrada de um evento esportivo. Da mesma forma que crianças passam por baixo da catraca, pequenas substâncias, como íons e moléculas de tamanho inferior a 10.000 daltons, difundem através do poro. Moléculas maiores de até 50.000 daltons, também podem difundir por meio do poro, porém, necessitam de mais tempo para este procedimento. Moléculas maiores, como proteínas do citoplasma e que são importadas para o núcleo, comportam-se como adultos na catraca: não podem entrar se não possuírem o seu “ingresso”. No caso das proteínas, o ingresso é uma sequência curta de aminoácidos que faz parte 17 da proteína. Assim, proteína possui uma estrutura tridimensional que permite a sua ligação não covalente com a conformação tridimensional do receptor, de forma que ocorre o estiramento do poro, permitindo a entrada de grandes proteínas. (ROSA, 2018). Observe a Figura a seguir: O núcleo está delimitado por uma membrana dupla chamada de envelope nuclear. Nucléolo, lâmina nuclear e poros nucleares são características comuns a todos os núcleos celulares. Os poros são os portões através dos quais as proteínasdo citoplasma penetram no núcleo e o material genético (mRNA) sai do núcleo em direção ao citoplasma. Fonte: Sadava et al. (2009, p. 78). Nas regiões específicas do núcleo, a membrana externa do envelope nuclear cria reentrâncias em direção ao citoplasma e em continuidade com a membrana do RE (descrito anteriormente). No interior do núcleo, o DNA se associa a proteínas para formar um complexo fibroso denominado cromatina. A cromatina consiste em filamentos extremamente longos e finos. Antes da divisão da célula, a cromatina se agrega para formar os cromossomos. Na borda do núcleo, a cromatina encontra-se conectada a uma rede de proteínas, chamada de lâmina nuclear, formada por meio da polimerização de proteínas, designadas de lâminas em filamentos. A lâmina nuclear mantém o formato do núcleo por intermédio de sua ligação simultânea à cromatina e ao envelope nuclear. 18 Durante grande parte do ciclo de vida da célula, o envelope nuclear permanece como estrutura estável. No entanto, quando a célula sofre a divisão, o envelope celular é quebrado em pedaços de membrana, contendo os complexos do poro a eles ligados. O envelope é reconstruído quando a distribuição do DNA replicado para as células- filha está completa. Na molécula de DNA, existem trechos contendo as sequências específicas de determinados nucleotídeos que podem corresponder à sequência de um gene. As histonas são responsáveis pelo primeiro e mais básico nível de organização cromossômica, o nucleossomo. Os nucleossomos são compactados ainda mais para gerarem os cromossomos. O ácido desoxirribonucleico (DNA) é uma molécula de informação que contém, na sequência de seus nucleotídeos, a informação necessária para a formação de todas as proteínas de um organismo e, portanto, das células e dos tecidos daquele organismo. O DNA é quimicamente muito estável na maioria das condições terrestres, como em ossos e tecidos com de milhares de anos, por exemplo, e cumpre suas importantes funções com tanta maestria que é a fonte da informação genética em todas as formas de vida conhecidas, exceto os vírus de RNA, os quais são limitados a genomas muito pequenos devido à instabilidade do RNA comparado ao DNA. O fato de que todas as formas de vida utilizem DNA para codificar sua informação genética e a existência de um código genético quase igual, esclarece que todas as formas de vida descendem de um ancestral comum baseado no armazenamento da informação em sequências de ácido nucleico. A informação contida no DNA está disposta em unidades hereditárias, chamadas de genes, que controlam as características identificáveis de um organismo. Durante a transcrição, a informação armazenada no DNA é copiada para a forma de ácido ribonucleico (RNA), que possui três papéis distintos na síntese proteica. As sequências de nucleotídeos do DNA são copiadas em moléculas de RNA mensageiro (mRNA), que promove a síntese de uma proteína específica. A sequência de nucleotídeos do mRNA contém informação que especifica a ordem correta dos aminoácidos durante a síntese de uma proteína. O agrupamento de aminoácidos em proteínas é extremamente preciso e em etapas, ocorre pela tradução do mRNA. Durante esta etapa, os nucleotídeos da molécula de mRNA são lidos por um segundo tipo de RNA, conhecido como RNA de 19 transferência (tRNA), com o auxílio de um terceiro tipo, o RNA ribossomal (rRNA) e suas proteínas associadas. Conforme vão sendo lidos pelos tRNAs, os aminoácidos corretos são unidos por ligações peptídicas para formarem as proteínas. Assim, a síntese de RNA é chamada de transcrição, porque a “linguagem” da sequência nucleotídica do DNA é precisamente copiada ou transcrita na sequência nucleotídica de uma molécula de RNA. A síntese proteica é denominada tradução, pois a “linguagem” da sequência nucleotídica do DNA e do RNA é traduzida para a “linguagem” de sequência dos aminoácidos das proteínas. 3 ESTRUTURA DA MEMBRANA PLASMÁTICA A célula é a unidade básica de todos os seres vivos, podendo existir isoladamente (em organismos unicelulares) ou em conjunto (organismos pluricelulares ou multicelulares), podendo constituir, inclusive, tecidos complexos, órgãos e sistemas. Além disso, cabe à célula produzir material extracelular, de constituição química variável, e que também dá as características ao tecido — a matriz extracelular. A membrana plasmática (ou celular) tem numerosas funções celulares. Ela atua na manutenção de microambientes, formando uma barreira que impede o conteúdo celular de escapar e se misturar com o meio circundante, definindo os meios intra e extracelulares e as interações célula-célula e célula-matriz extracelular (inclusive na formação dos tecidos). Nesse sentido, a membrana celular, além de envolver o ambiente interno da célula, controla a troca entre os meios, nos processos de endocitose (processo de internalização de partículas) e exocitose (processo de externalização de produtos celulares) (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012). Assim, a membrana plasmática é o primeiro contato entre o que “está dentro ou fora da célula”, participando dos fenômenos de reconhecimento celular e transmitindo informações para o interior da célula, permitindo, assim, que ela responda a esses “estímulos” externos e participe de uma variedade de processos vitais, incluindo apresentação e reconhecimento de moléculas, catálise, detecção de sinal, citocinese, formação celular e motilidade (PONTES et al., 2013). 20 Dessa forma, a função de uma célula relaciona-se diretamente com a constituição e a estrutura da sua membrana plasmática. Nesse momento, é importante ressaltar que as células eucariotas, exceto os eritrócitos, têm o citoplasma compartimentalizado em organelas membranares, cuja constituição e estrutura, apesar das peculiaridades pertinentes a cada organela, são similares à membrana plasmática (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012). Veja a seguir as funções da membrana plasmática das células eucarióticas. Define os limites e a forma da célula. Separa o meio intracelular e extracelular. Controla a entrada e a saída de moléculas/partículas da célula — permeabilidade seletiva. É responsável pela manutenção da constância do meio intracelular. É responsável pelo reconhecimento célula-moléculas (por meio de receptores específicos localizados na membrana), célula-célula e célula- -matriz extracelular. Pode iniciar a sinalização de reações citoplasmáticas, aumentando a eficiência do sistema. Promove a comunicação celular por meio da presença de estruturas intercelulares específicas (as junções comunicantes), formadas por proteínas específicas associadas à membrana. Promove a adesão celular (entre células) e a adesão célula-matriz, garantindo a formação e a integridade dos tecidos. 3.1 Estrutura das membranas plasmáticas As membranas plasmáticas e das diferentes organelas celulares têm de espessura, aproximadamente, 7 a 10 µm e podem ser vistas apenas no microscópio eletrônico. Trata-se de uma estrutura trilaminar composta de duas camadas eletrodensas (escuras) e uma camada eletrolúcida (clara) central (Figura). Essa estrutura é chamada unidade de membrana (ALBERTS et al., 2017; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; 2013). 21 Figura 1. Estrutura trilaminar de uma unidade de membrana celular. (a) Imagens de microscopia eletrônica de transmissão mostram, à esquerda, a membrana plasmática de duas células vizinhas, separadas pelo espaço extracelular. À direita, está a unidade de membrana de cada célula. Observe que a estrutura da bicamada lipídica fica evidenciada pela presença de duas linhas densas (região hidrofílica dos fosfolipídios), separadas por uma linha clara (região hidrofóbica, constituída pelas cadeias de ácidos graxos dos fosfolipídios). (b) Esquema 3D ilustrativo da unidade de membrana — regiões hidrofílicae hidrofóbica. Fonte: Adaptada de (a) de Bioninja ([201-?]); (b) luminance studio/Shutterstock.com Esse aspecto ao microscópio eletrônico é explicado pela organização molecular das membranas, que estão organizadas em uma bicamada fluida de fosfolipídios (fosfoglicerídeos e esfingolipídios). Os lipídios das membranas são moléculas longas, com uma extremidade hidrofílica (polar e solúvel em água) e uma cadeia hidrofóbica (apolar e insolúvel em água) — portanto, uma molécula anfipática (MEZA et al., 2010; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; 2013). As moléculas da dupla camada de lipídios estão dispostas com suas cadeias hidrofóbicas direcionadas ao interior da membrana. Já as cadeias hidrofílicas (polares) ficam direcionadas aos meios intracelular e extracelular, que são ambientes aquosos. 3.1.1 Lipídios Os lipídios mais frequentes nas membranas plasmáticas são os fosfolipídios (Figura 2a), o colesterol (Figura 2b) e, além deles, existem também os glicolipídios (lipídios associados a carboidratos, associados ou não a radicais fosfato) (Figura 2c). Fosfolipídios: são os lipídios mais comuns da membrana. Têm uma cauda de ácido graxo ligada, por meio de uma molécula de glicerol, a uma “cabeça” de 22 fosfato ligado a um álcool (hidrofílica). Dentre os fosfolipídios, destacam-se a fosfatidilserina, a fosfatidiletanolamina, a fosfatidilcolina, o fosfatidilinositol e o fosfatidilglicerol. A esfingomielina, muito comum nas células do tecido nervoso, é um fosfolipídio no qual o glicerol é substituído por uma esfingosina (neste caso, o álcool associado é a colina) (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; PRESTON; WILSON, 2014). Colesterol: o colesterol é o segundo lipídio mais comum na membrana, constituindo cerca de 25% da membrana plasmática. É hidrofóbico, mas contém um grupo hidroxila polar que o puxa para a superfície externa da bicamada, na qual se aloja entre os fosfolipídios adjacentes. Entre o grupo hidroxila e a cauda de hidrocarboneto está um núcleo de esteroide, que o tornam relativamente inflexível (Figura 2b). Assim, a adição de colesterol à membrana interfere na sua viscosidade, reduzindo a sua fluidez e a tornando mais forte e mais rígida (MEZA et al., 2010; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; PRESTON; WILSON, 2014). Está também relacionado à sinalização celular (MEZA et al., 2010). Glicolipídios: presentes na monocamada externa, é um tipo de lipídio pequeno, mas fisiologicamente importante. É composto por uma cauda de ácido graxo associada, por meio da esfingosina, a uma cabeça hidrofílica de carboidrato. Assim, os glicolipídios criam uma capa de carboidrato celular envolvida nas interações célula- célula, inclusive apresentando antigenicidade (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; PRESTON; WILSON, 2014). 3.1.2 Proteínas A atividade metabólica das membranas plasmáticas é dependente das proteínas que participam da sua formação. Elas podem ser classificadas em dois grandes grupos: as proteínas integrais (ou intrínsecas) e as proteínas periféricas (ou extrínsecas) (Figuras 2c e 3). As primeiras estão firmemente aderidas à membrana plasmática, compondo parte de ambas monocamadas lipídicas, e correspondem a cerca de 70% das proteínas de membrana. Aquelas proteínas integrais que atravessam toda a unidade de membrana, fazendo contato do meio extracelular com o citoplasma, são chamadas de proteínas transmembrana, que podem atravessar a membrana uma única vez (unipasso) ou várias vezes. Nesse último caso, são chamadas de proteínas transmembrana de passagem múltipla (ou multipasso). 23 As proteínas periféricas, ao contrário, se prendem às superfícies externas da membrana, compondo apenas uma das monocamadas lipídicas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012). Figura 2. (a) Estrutura geral de um fosfolipídio. (b) Estrutura química de uma molécula de colesterol. (c) Bicamada lipídica da membrana plasmática, com suas proteínas e cadeias de carboidrato associadas a proteínas ou lipídios na monocamada externa da membrana. As faces hidrofílicas (círculos amarelos) interagem com o espaço extracelular e o citoplasma, ambos aquosos (caráter polar); as cadeias hidrofóbicas ficam voltadas para dentro da membrana. Fonte: Adaptada de (a) struna/Shutterstock.com; (b) Alila Medical Media/Shutterstock.com; (c) Jamilia Marini/Shutterstock.com. 24 Figura 3. Proteínas integral (unipasso e multipasso) e periférica de membrana. Observe que há a representação de uma proteína periférica que está ancorada em um lipídio da monocamada da membrana. Fonte: Adaptada de Designua/Shutterstock.com. A passagem de substâncias através da membrana celular não ocorre sempre da mesma forma e depende do tipo de substância (permeabilidade seletiva). Em alguns casos as substâncias podem atravessar a membrana sem a intervenção específica de moléculas transportadoras — transporte não mediado (osmose e difusão simples) —, enquanto em outros casos são as proteínas membranares que facilitam esse transporte — transporte mediado (transporte ativo e difusão facilitada). O termo geral proteínas de transporte engloba três categorias principais de proteínas: canais (agem como poros nas membranas e sua especificidade é determinada primeiramente pelas propriedades biofísicas no canal) (Figura 4a), carregadoras (ligam na molécula a ser transportada em um lado da membrana e depois a liberam do outro lado) (Figura 4b) e bombas (relacionadas ao transporte ativo primário, usam energia diretamente, usualmente da hidrólise do trifosfato de adenosina [ATP], para bombear os solutos contra o seu gradiente ou potencial eletroquímico) (Figura 4c). Essas proteínas exibem especificidade para solutos por elas transportados. Embora uma determinada proteína de transporte seja em geral altamente específica para os tipos de substâncias que transporta, sua especificidade comumente não é absoluta (COLODETE, 2013). 25 Figura 4. Três classes de proteínas transportadoras de membrana: (a) canais, (b) carreadoras e (c) bombas. Proteínas canais e carreadoras podem mediar o transporte passivo de soluto pela membrana (por difusão simples ou difusão facilitada) a favor do gradiente de soluto e potencial eletroquímico. Fonte: Colodete (2013, documento on-line) Existem três tipos de proteínas transportadoras (transporte secundário): simporte, antiporte e uniporte (Figura abaixo). Nas proteínas do tipo simporte, as duas substâncias se movem na mesma direção através da membrana. Nas do tipo antiporte, ocorre o movimento de um soluto a favor do gradiente de prótons, impulsionando o transporte ativo de outro soluto na direção oposta do gradiente (transporte acoplado). (COLODETE, 2013). Figura 5. Mecanismos para o transporte de moléculas mediado por proteínas através das membranas biológicas — simporte, uniporte e antiporte. Fonte: Adaptada de Gungner/Shutterstock.com. 26 Nas proteínas do tipo uniporte, apenas um soluto é transportado e ocorre a favor do gradiente eletroquímico. No transporte por meio de proteínas simporte e antiporte, o íon ou soluto transportado simultaneamente com os prótons move-se contra seu gradiente de potencial eletroquímico, de modo que se trata de transporte ativo. Nesses casos, a energia que governa esse transporte é proporcionada pela força-motriz de prótons, em vez de diretamente pela hidrólise de ATP. O transporte realizado por proteínas uniporte é mediado pelos canais e certos transportadores a favor do gradiente de potencial elétrico (SANDERS; BETHKE, 2000; RAMOS; MARTINS; FAÇANHA, 2005; COLODETE, 2013). 3.2 Organização da membrana plasmática Apesar de morfologicamente parecidas e com a mesma organização molecular básica, as unidades de membrana não são iguais, nem na morfologia nem nas funções. Assim, as membranas plasmáticas variam muito na composição química e nas propriedades biológicas. A proporçãoentre os tipos de lipídios varia de acordo com o tecido e o tipo celular, assim como a distribuição dos lipídios em cada camada é assimétrica (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; 2013). Isso significa dizer que as moléculas que compõem a bicamada têm natureza lipídica, mas que diferem entre si, na sua estrutura e propriedade química (mais polar ou menos polar, com cadeias cíclicas ou lineares, com cadeias de ácidos graxos maiores ou menores, por exemplo). Além disso, o tipo e a proporção de cada fosfolipídio/colesterol em cada monocamada lipídica da membrana são variáveis. (MEZA et al., 2010). Na organização da membrana, as proteínas periféricas estão concentradas na sua face citoplasmática, na qual podem ligar-se a componentes do citoesqueleto, definindo, inclusive, o formato da célula. Já as proteínas integrais estão presentes no lado externo da membrana e estão muito relacionadas aos fenômenos de sinalização celular. Parte dessas proteínas são glicoproteínas, cujos resíduos glicídicos são adicionados aos glicolipídios e a outras moléculas da face externa da membrana, constituindo o glicocálice (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012). 27 4 MITOCÔNDRIA: CONVERSÃO ENERGÉTICA E RESPIRAÇÃO CELULAR Apesar de a mitocôndria estar relacionada a uma série de funções celulares, a principal delas é a de prover energia à célula. Estima-se que mais de 90% do trifosfato de adenosina (ATP) necessário aos diversos propósitos biológicos seja produzido por essa organela. Para realizar suas atividades, as células utilizam a energia química armazenada nos nutrientes, transferindo-a para a molécula de ATP na mitocôndria, durante a fosforilação oxidativa. Para isso, a energia dos nutrientes é utilizada para gerar um fluxo de prótons H+ , que converte uma molécula de difosfato de adenosina (ADP) em ATP (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017; COOPER; HAUSMAN, 2018). Além disso, as mitocôndrias estão também envolvidas com a biossíntese de pirimidinas e do grupo heme da hemoglobina (por meio de enzimas específicas), bem como com o metabolismo de colesterol e neurotransmissores. Elas têm ainda funções na produção de radicais livres para propósitos específicos na célula (sinalização celular e processo inflamatório) e na detoxificação desses mesmos radicais em outras situações (NASSEH et al., 2001) 4.1 Morfologia e funções da mitocôndria As mitocôndrias têm uma forma cilíndrica rígida e alongada, com um diâmetro de 0,5 a 1 µm. Por meio de microfilmagens de células vivas, observa-se que elas são organelas móveis e plásticas que mudam de forma constantemente. (a) Imagem de microscopia confocal mostrando as mitocôndrias de células-tronco mesenquimais. Ilustra as mitocôndrias, os núcleos celulares e as proteínas citoplasmáticas. (b) Microscopia eletrônica de transmissão mostrando as mitocôndrias, lisossomos, grânulos de glicogênio, retículo endoplasmático rugoso e centríolo. Fonte: (a) Vshivkova/Shutterstock.com; (b) Jose Luis Calvo/Shutterstock.com 28 A maneira por meio da qual as mitocôndrias se movem no citosol demonstram que elas podem estar associadas a microtúbulos, os quais possivelmente determinam a orientação e a distribuição que elas têm nos diferentes tipos de células (Figura 1) (ALBERTS et al., 2017). 4.2 Duas membranas, dois compartimentos mitocondriais A mitocôndria é uma organela membranosa das células eucariotas que tem a peculiaridade de ter duas membranas, organizadas numa bicamada de fosfolipídios (sintetizados pelo retículo endoplasmático liso da célula) associada a proteínas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012): a) uma membrana externa lisa, rica em colesterol e muito permeável, graças às proteínas intercaladas na membrana, as porinas; b) a outra membrana, interna, tem constituição fosfolipídica (mas pobre em colesterol) e rica em cardiolipina — fundamental para a fosforilação do ADP e a geração de energia (contribui para manter a diferença de potencial elétrico entre as faces da membrana); tem invaginações, que formam prateleiras, denominadas cristas mitocondriais, que aumentam a superfície dessas membranas, responsável pela produção energética. Organização geral da mitocôndria. Fonte: Soleil Nordic/Shutterstock.com. As duas membranas delimitam um espaço denominado espaço intermembranar, no qual existem várias enzimas e proteínas relacionadas à morte celular por apoptose. Além disso, é o espaço para onde os prótons são conduzidos a 29 partir da matriz durante a produção de energia (SOUZA, 2005; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017). Neste sentido, a morfologia da estrutura mitocondrial varia de acordo com o tipo celular e o estado funcional da célula, mas, de maneira geral, a quantidade de cristas e a densidade eletrônica mitocondriais são proporcionais à atividade respiratória da célula (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017). A matriz mitocondrial contém filamentos de DNAmt, ribossomos mitocondriais (menores do que os citoplasmáticos e semelhantes aos de bactérias), os RNAs e várias enzimas necessárias para a expressão dos genes mitocondriais (ALBERTS et al., 2017). A matriz contém centenas de enzimas e nela ocorrem os principais eventos metabólicos da organela, tais como: ciclo do ácido cítrico, oxidação dos ácidos graxos, replicação, transcrição e tradução do DNAmt, além da síntese de ATP (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017). Componentes estruturais de uma mitocôndria, com destaque para as membranas e os compartimentos mitocondriais. Fonte: Daniela Barreto/Shutterstock.com 4.3 DNA mitocondrial A célula eucariótica apresenta dois genomas distintos, o nuclear (DNAn) e o mitocondrial (DNAmt), aquele se encontra no núcleo e este na organela citoplasmática, respectivamente. Cada mitocôndria pode conter de 5 a 10 genomas mitocondriais, e cada célula, dezenas a centenas de moléculas, dependendo do tecido 30 (NASSEH et al., 2001). Essa molécula é encontrada em grande número de cópias, podendo ser maior que 1.000 cópias por unidade celular (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012). São necessários cerca de 3.000 genes para fazer uma mitocôndria. Destes, somente 37 são codificados pelo DNAmt; o restante (a maioria) é codificado pelo núcleo, sintetizado no citoplasma e posteriormente transportado para dentro da mitocôndria. O DNAn é responsável pela síntese de proteínas que terão funções diversas na mitocôndria, desde a participação na estrutura da mitocôndria até o controle da replicação e da transcrição do DNAmt. Assim, o funcionamento perfeito da mitocôndria depende da interação adequada dos dois genomas (NASSEH et al., 2001). O conhecimento das características do genoma mitocondrial e sua genética são importantes para a compreensão da apresentação clínica e das variações dessas doenças. O DNAmt é uma molécula circular de 16.569 pb, 37 genes, os quais correspondem a 13 polipeptídios (subunidades proteicas da cadeia respiratória), 2 moléculas de RNA ribossomal e 22 tipos de RNA transportador (ANDERSON et al., 1981). O DNAmt é responsável por somente 15% da síntese de proteínas da cadeia respiratória, o restante é feito pelo DNAn (NASSEH et al., 2001). A herança materna é altamente sugestiva de um defeito no DNAmt. A pobre atividade reparadora da polimerase do DNAmt, a ausência de histonas, a maior sensibilidade ao dano oxidativo em razão do ambiente com grande número de radicais livres e a ausência do mecanismo de reparo por excisão de nucleotídeos são fatores que levam esse genoma a apresentar uma taxa de mutação de 5 a 10 vezes maior que o DNAn (BINNI et al., 2003; ALVAREZ, 2007). 4.4 Biogênese mitocondrial As mitocôndrias se formam a partir da reprodução de uma mitocôndria preexistente. Elas se reproduzem para substituir as mitocôndrias envelhecidas e para duplicar seu número antes de cada divisãocelular. Essa duplicação de material, seguida de divisão, é possível graças à existência do DNAmt e de RNA mensageiro, RNA transportador e ribossomos próprios de cada mitocôndria. Importante ressaltar que, conforme mencionado no item anterior, embora a mitocôndria tenha condições 31 de realizar processos de duplicação, tradução e transcrição e tenha seu genoma próprio, ele é incompleto: a mitocôndria só codifica por si só 13 proteínas – vários componentes necessários à completa expressão do DNAmt são provenientes do citoplasma, como proteínas ribossomais e a maioria das proteínas do ciclo de Krebs. No processo de sua replicação, novas proteínas são recrutadas e, posteriormente, adicionadas a compartimentos preexistentes ou complexos de proteínas. Esse processo promove crescimento da organela em volume que sofre divisão subsequente por fissão (GOMEZ-CABRERA et al., 2015; PEREIRA, 2015). A Figura a seguir ilustra os dois processos mitocondriais: a fissão e a fusão. Fusão e fissão mitocondrial controlam o número e o tamanho mitocondrial. Fonte: Lavich (2015). 4.5 Funções da mitocôndria A mitocôndria é uma organela intracelular que desempenha um importante papel na produção de ATP celular e está também envolvida na homeostasia celular e tecidual, na sinalização intracelular, na apoptose e no metabolismo de aminoácidos, lipídios, colesterol, esteroides e nucleotídeos (FERREIRA; AGUIAR; VILARINHO, 2008; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017). O Quadro a seguir sumariza essas funções mitocondriais: 32 FUNÇÕES DA MITOCÔNDRIA 1 Metabolismo de carboidratos, lipídios e aminoácidos – obtenção de energia (ATP) por meio do processo de respiração aeróbica 2 Armazenamento de cálcio celular 3 Síntese de lipídios e esteroides 4 Regulação da apoptose celular 5 Sinalização intracelular 6 Produção de energia (liberada por meio de processos bioquímicos sob a forma de calor) Fonte: Adaptado de Junqueira e Carneiro (2012) e Alberts et al. (2017) Dentre estes, importante ressaltar a apoptose, que é de fundamental importância na embriogênese em processos neurodegenerativos em diversas funções fisiológicas. Inúmeras proteínas regulatórias da apoptose exercem sua ação pela indução de megaporos nas membranas externa e interna da mitocôndria (SUSIN; ZAMZAMI; KROEMER, 1998). Essas recentes descobertas têm colocado a mitocôndria como uma via crítica para o desencadeamento da morte celular programada (SILVA; FERRARI, 2011). O envelhecimento também é outro foco de pesquisa, porque tem se relacionado à mitocôndria, pois alterações bioquímicas e rearranjos do DNAmt também são encontrados em tecidos de idosos (TANAKA et al., 1996; SILVA; FERRARI, 2011). Isso porque as mitocôndrias também são as principais geradoras de radicais livres no homem e diversos estudos demonstram que há uma relação entre envelhecimento celular, integridade funcional das mitocôndrias, produção de radicais livres e espécies reativas. Alguns autores da teoria mitocondrial do envelhecimento sugerem que mutações ocorridas no genoma mitocondrial alteram o metabolismo mitocondrial, reduzindo a produção de ATP e predispondo a célula ao envelhecimento e a diversas doenças associadas a este (VIÑA et al., 2006; SILVA; FERRARI, 2011). Ao contrário, a longevidade estaria associada à manutenção da estrutura e à função adequadas das mitocôndrias (SILVA; FERRARI, 2011; PEREIRA, 2015). 4.6 Respiração celular A energia utilizada pelas células eucariontes para realizar suas atividades provém da ruptura gradual de ligações covalentes de moléculas de compostos 33 orgânicos ricos em energia. As células, porém, não usam diretamente a energia liberada por hidratos de carbono e gorduras, mas utilizam de um composto intermediário, o ATP, produzido graças à energia contida nas moléculas de glicose e de ácidos graxos. O ATP se forma a partir do ADP e do fosfato inorgânico (Pi) existentes no citosol (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; ALBERTS et al., 2017). É no interior da célula que substâncias orgânicas, como oxigênio e glicose, são processadas e convertidas em energia na forma de ATP, no processo de respiração celular, por meio de dois mecanismos: a glicólise anaeróbia, que tem lugar no citosol, e a fosforilação oxidativa, que se realiza nas mitocôndrias (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; ALBERTS et al., 2017). Esquema geral da respiração aeróbica mostrando que a glicólise ocorre no citosol, enquanto a produção de acetilcoenzima A (acetil-CoA) e a fosforilação oxidação se processam nas mitocôndrias. Nesses eventos, ocorre o consumo de oxigênio e a formação de água e CO2 (respiração aeróbia) contrastando com a glicólise (respiração anaeróbia), que não consome oxigênio e produz pouco ATP. Fonte: Junqueira e Carneiro (2012, p. 70). 4.7 Glicólise A glicólise anaeróbia é uma etapa que ocorre no citoplasma e consiste na quebra parcial da glicose numa sequência de aproximadamente 11 reações, promovendo transformações graduais em uma molécula de glicose, sem consumo de 34 oxigênio, produzindo duas moléculas de piruvato e liberando energia que é armazenada em duas moléculas de ATP (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014). É uma etapa chamada de glicólise anaeróbia ou fermentação. No fungo levedo de cerveja, em condições anaeróbias, a glicólise prossegue, transformando o piruvato em etanol após uma série de reações enzimáticas. A fermentação alcoólica fornece ao levedo de cerveja a energia necessária para sua manutenção e reprodução, sendo chamada fermentação alcoólica, porque o produto final é o álcool etílico. Nas células eucariotas, a quebra da glicose em condições de anaerobiose promove a conversão do piruvato em ácido lático (lactato), que é tóxico à célula. Esse fenômeno é denominado fermentação lática (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014). A glicólise é um processo pouco eficiente, pois, das 690 kcal/mol presentes na glicose, apenas 20 kcal são aproveitadas e as células desenvolveram, ao longo da evolução, mecanismos mais eficazes para extração da energia dos nutrientes. Além dessa energia, são produzidas quatro moléculas de ATP e desidrogenação dessa glicose, formando NADH+H+ (um aceptor de elétrons). Considerando que duas moléculas foram gastas na ativação e no início da quebra da molécula de glicose, o saldo energético dessa etapa são duas moléculas de ATP (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014). A fosforilação oxidativa é via metabólica de maior rendimento energético do que a glicólise: de cada molécula-grama (mol) de glicose, além dos 2 mols de ATP obtidos pela via anaeróbia, a fosforilação oxidativa produz mais 36 mols de ATP. As etapas seguintes culminam na fosforilação oxidativa, o piruvato é oxidado até se formarem água e gás carbônico, com alto rendimento energético. Costuma-se distinguir, na oxidação fosforilativa, três mecanismos distintos, mas que se entrelaçam intimamente: a produção de acetil-CoA, o ciclo de Krebs (ácido cítrico) e o sistema transportador de elétrons. Enquanto a glicólise é anaeróbia e tem lugar no citosol, a fosforilação oxidativa é aeróbia e se processa nas mitocôndrias (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; ALBERTS et al., 2017). 35 4.8 Energia celular Para manter um metabolismo equilibrado, o organismo deve obter continuamente os nutrientes, provenientes dos alimentos, os quais precisam ser consumidos em quantidade e variedade adequadas. Uma vez digeridos os alimentos, os seus nutrientes são absorvidos e distribuídos para todos os tecidos. Alguns nutrientes são usados para a construção e a reparação dos tecidos vivos, enquanto outros promoverão a liberação da energia indispensável às atividades vitais (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; PEREIRA, 2015). Conforme dito ao longo deste capítulo, a energia utilizada pelas células pararealizar suas atividades provém da ruptura gradual de ligações covalentes de moléculas de compostos orgânicos ricos em energia (PEREIRA, 2015). Na fotossíntese, graças ao pigmento clorofila, principalmente, é processada a acumulação da imergia solar sob a forma de ligações químicas nos hidratos de carbono, principalmente hexoses, que se polimerizam para formar amido. As hexoses originadas na fotossíntese são fonte de energia e também de carbono em condições de ser utilizado para a síntese de diversas macromoléculas (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; PEREIRA, 2015; ALBERTS et al., 2017). Como já visto, as células animais não usam diretamente a energia liberada por hidratos de carbono e gorduras, elas utilizam o ATP, um composto intermediário comumente produzido graças à energia contida nas moléculas de glicose e de ácidos graxos. O ATP tem duas ligações ricas em energia, sendo que, quando uma delas se rompe, libera aproximadamente 10 kcal por mol. Geralmente, apenas uma ligação é rompida, segundo a equação ATP → ADP + Pi + energia. As substâncias orgânicas, de acordo com suas funções no organismo, são classificadas em plásticas, energéticas e reguladoras (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012) e, independentemente dessa classificação/função, todas as macromoléculas provenientes dos alimentos podem cumprir todas essas funções celulares mencionadas. A célula obtém energia de carboidratos, lipídios e proteínas, nessa ordem, e a partir de seus produtos, monossacarídeos, ácidos graxos e aminoácidos, respectivamente. Nos animais, os ácidos graxos são, do ponto de vista quantitativo, uma fonte energética muito mais importante do que carboidratos. Enquanto 1 mol de glicose gera 36 38 mols de ATP, uma de ácido palmítico gera 126 mols de ATP. Um homem adulto tem energia depositada em glicogênio suficiente apenas para um dia, mas gordura (ácidos graxos) suficiente para fornecer energia durante um mês. Quando o organismo está em repouso, as células usam mais glicose, proveniente do glicogênio, porém, durante o exercício físico, há mobilização dos ácidos graxos depositados nas gorduras (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; PEREIRA, 2015). O citoplasma contém energia acumulada nos depósitos de triacilglicerídios, de moléculas de glicogênio e, também, sob a forma de compostos intermediários ricos em energia (dos quais o mais importante é o ATP), principais combustíveis das células. Isso porque os triacilglicerídios e o glicogênio representam acúmulo de energia sob forma estável e concentrada, mas dificilmente acessível, ao passo que o ATP é um composto instável, que não contém energia tão concentrada, mas facilmente utilizável porque a enzima que rompe a molécula de ATP (ATPase) é muito abundante na célula (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012; BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014; PEREIRA, 2015). A decomposição da glicose em água e gás carbônico, que ocorre durante a respiração celular, rende 690 kcal/mol, enquanto a hidrólise das duas ligações ricas em energia do ATP rende somente 20 kcal/mol. A queima da glicose libera uma quantidade certa de energia e consome oxigênio. O resultado dessa operação, que pode ser realizada em um aparelho chamado calorímetro, produz calor (690 kcal/mol), água e gás carbônico, segundo a equação (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014): C6 H12O6 + 6 O2 → 6 CO2 + 6 H2 O + calor (energia) Essa combustão da glicose é, porém, um processo abrupto, que leva o calorímetro rapidamente a altas temperaturas. Se isso ocorresse dentro de uma célula, ela se queimaria instantaneamente. Contudo, as células desenvolveram um sistema que oxida lentamente os nutrientes, liberando energia gradualmente e produzindo água e CO2. Esse processo, que consome O2 e produz CO2, chama-se respiração celular (BERG; STRYER; TYMOCZKO, 2014). 37 5 DIVISÃO CELULAR: MITOSE E MEIOSE A única maneira de se obter novas células é pela divisão daquelas que já existem. Isso ocorre por intermédio da sequência de eventos, conhecida como ciclo celular, um mecanismo essencial para a reprodução dos seres vivos. (HERNANDEZ, 2018). Neste capítulo, você verá de que forma a célula produz dois novos organismos, a partir de um organismo unicelular, e os dois tipos de divisão celular e nuclear das células eucarióticas: mitose e meiose, além da sua relação com a reprodução nos organismos eucarióticos. 5.1 O ciclo e a divisão celular É por meio do ciclo celular que ocorre a duplicação do DNA nos cromossomos, para separar este material para as células-filha geneticamente idênticas, de forma que cada célula receba uma cópia íntegra de todo o genoma. Além de DNA, a célula também duplica suas organelas e o seu tamanho antes de dividir. Desta forma, durante toda a interfase – G1, S e G2, uma célula, em geral, continua a transcrever genes, sintetizar proteínas e aumentar a massa, fornecendo o tempo necessário para a célula crescer e duplicar as suas organelas citoplasmáticas, mantendo o seu tamanho. Acompanhe na Figura abaixo a representação do ciclo da interfase. . O ciclo celular eucariótico costuma ocorrer em quatro fases. Fonte: Alberts et al. (2017, p. 605). 38 5.2 Mitose, meiose e citocinese 5.2.1 Mitose A fase M, que inclui a mitose mais a citocinese, ocorre rapidamente. A célula reorganiza todos os seus componentes e os distribui de forma igual entre as duas células-filha. Embora nesta fase ocorra uma sequência contínua de eventos, ela é dividida em uma série de seis estágios. Os primeiros cinco da fase M são: prófase, prometáfase, metáfase, anáfase e telófase. Estas fases constituem a mitose, que é definida como o período em que os cromossomos estão visíveis (forma condensada), como pode ser observado na Figura a seguir: Fonte: Chandar e Viselli (2015, p. 191). De acordo com a figura anterior, a mitose ou divisão do núcleo é um processo contínuo que pode ser dividido em cinco fases. As células em divisão permanecem cerca de 1 hora na mitose e depois de completada, ocorre a citocinese, que envolve a divisão citoplasmática. Como resultado se tem a formação de duas células-filha separadas a partir de uma célula progenitora. (ROSA, 2018). 39 5.2.2 Meiose Diferente da mitose, em que uma única célula pode gerar um grande número de outras, a meiose resulta em apenas quatro células-filha, que podem não sofrer outras duplicações. Tanto a mitose quanto a meiose estão envolvidas na reprodução, mas possuem funções reprodutivas diferentes. A reprodução assexuada ou reprodução vegetativa, baseia-se na divisão mitótica do núcleo. Assim, uma célula que passa pela mitose pode ser um organismo inteiro unicelular se reproduzindo com cada ciclo celular ou pode ser uma célula em um organismo multicelular que quebra uma parte para produzir um novo organismo multicelular. (ROSA, 2018). Alguns multicelulares reproduzem-se através da liberação de células provenientes da mitose e da citocinese ou por terem perdido uma parte que se desenvolve por si mesma. Na reprodução assexuada, os descendentes são clones do organismo original, ou seja, os descendentes constituem-se geneticamente idênticos aos pais, como alguns cactos com caules frágeis que se quebram facilmente, seus fragmentos caem no chão e formam raízes, que desenvolvem mitoticamente uma nova planta geneticamente idêntica à planta de que ela se originou, por exemplo. Se existe alguma variação entre os descendentes, provavelmente é resultado de mutações ou alterações no material genético, a reprodução assexuada é uma maneira rápida e efetiva de produzir novos indivíduos. Diferente da reprodução assexuada, a reprodução sexuada é resultado de um organismo não idêntico ao original. Ela requer gametas criados por meiose, ou seja, dois pais, cada um contribuindo com um gameta para cada descendente. A meiose produz gametas, diferentes geneticamentenão apenas de cada pai e mãe, mas também, uns dos outros. Devido a essa variação genética, alguns descendentes podem estar melhor adaptados do que outros para sobreviver e reproduzir em determinado meio. Desta forma, a meiose gera a diversidade genética, que é a matéria-prima da seleção natural e da evolução. (ROSA, 2018). Em grande parte dos seres multicelulares, as células somáticas, células do corpo não especializadas para reprodução, contêm dois conjuntos de cromossomos cada, encontrados em pares. Um cromossomo de cada par, de cada um dos pais do organismo. Os pares homólogos assemelham-se em tamanho e aparência, eles carregam informações genéticas similares, porém, geralmente, não idênticas. Os gametas, por outro lado, contêm apenas um único grupo de cromossomos, um 40 homólogo a partir de cada par. O número de cromossomos em um gameta denomina- se n, e a célula é dita haploide. Dois gametas haploides fusionam, formando um novo organismo, o zigoto, em um processo chamado de fertilização. Assim, o zigoto possui dois grupos de cromossomos, como as células somáticas fazem. Seu número de cromossomos denomina-se 2n e o zigoto é dito diploide. Com isto, a reprodução sexuada consiste na seleção aleatória da metade do conjunto de cromossomos diploides dos pais, para formar um gameta haploide, seguido da fusão de dois destes gametas haploides, a fim de produzir uma célula diploide que contenha a informação genética de ambos os gametas. Todas as etapas contribuem para uma mistura da informação genética na população, em que não há dois indivíduos exatamente com a mesma constituição genética. A meiose é formada por duas divisões nucleares que reduzem o número de cromossomos para o número haploide em preparação para a reprodução sexuada. Apesar de o núcleo se dividir duas vezes durante a meiose, o DNA é replicado apenas uma vez. Distinto dos produtos da mitose, os produtos da meiose diferem tanto entre eles quanto da célula que os originou. Para facilitar, é necessário lembrar as funções gerais da meiose, que é reduzir o número de cromossomos, de diploides para haploides, assegurar que cada um dos produtos haploides possua um conjunto completo de cromossomos e promover a diversidade genética entre os produtos. (ROSA, 2018). 5.2.3 Citocinese Para que ocorra a formação de duas células-filha distintas, a divisão citoplasmática segue a divisão nuclear. Um microfilamento de actina se forma para criar a maquinaria necessária e a contração desta estrutura, com base na actina, forma uma fenda de clivagem que inicia na anáfase. A fenda se aprofunda até que os cantos opostos se juntem. As membranas plasmáticas se fusionam em cada lado da fenda de clivagem profunda, o resultado é a formação de duas células-filha separadas, idênticas entre si e à célula parental original, marcando o termino do ciclo celular. (ROSA, 2018). 41 5.3 Etapas da mitose e da meiose 5.3.1 Mitose Durante a mitose, ocorrem as etapas que serão descritas a seguir. Prófase: nesta etapa, o envelope nuclear permanece intacto, enquanto a cromatina é duplicada durante a fase S, que condensa em estruturas cromossomais definidas, que são as cromátides. Os cromossomos são a forma como as duas cromátides-irmãs, conectadas por um centrômero, estão. Os cinetocoros são complexos proteicos especializados que se formam e se associam a cada cromátide. Os microtúbulos do fuso mitótico vão se ligando a cada cinetocoro, à medida que os cromossomos são separados mais adiante, na mitose. Os microtúbulos do citoplasma desmontam e, então, se organizam na superfície do núcleo para formar o fuso mitótico. Os pares de centríolos se afastam pelo crescimento dos feixes de microtúbulos que formam o fuso mitótico, o nucléolo e a organela dentro do núcleo, onde os ribossomos são produzidos, se desmontando na prófase. (ROSA, 2018). Prometáfase: o início da prometáfase é marcado pela desmontagem do envelope nuclear. Os microtúbulos do fuso se ligam aos cinetocoros e os cromossomos são puxados pelos microtúbulos do fuso. Metáfase: na metáfase, há o alinhamento das cromátides na “linha equatorial” do fuso, entre os dois polos. As cromátides alinhadas formam a placa metafásica. Durante esta etapa, as células podem ser pausadas, quando os inibidores de microtúbulos são usados. Testes de cariótipos, utilizados para determinar o número e a estrutura cromossômica, normalmente, requerem células em metáfase, devido à facilidade de visualização. Anáfase: aqui, os polos mitóticos são separados mais ainda, como resultado do alongamento dos microtúbulos polares. Cada centrômero divide-se em dois e os cinetocoros pareados se separam. As cromátides-irmãs migram na direção dos polos opostos do fuso. Telófase: para finalizar a divisão nuclear, durante a telófase ocorre o desmonte dos microtúbulos do cinetocoro e a dissociação do fuso mitótico. Os envelopes nucleares se formam em torno de cada núcleo, contendo as cromátides. 42 As cromátides se descondensam em cromatina dispersada ou heterocromatina e os nucléolos se formam novamente no núcleo das células-filha. 5.3.2 Meiose A primeira divisão meiótica reduz o número de cromossomos, ou seja, durante a meiose I, os cromossomos homólogos estão reunidos para parear por toda sua extensão. Nenhum pareamento desses ocorre na mitose e, depois, da metáfase I, os cromossomos homólogos se separam. Os cromossomos individuais, em duas cromátides-irmãs, permanecem intactos até o final da metáfase II, na segunda divisão meiótica. (ROSA, 2018). Assim, como a mitose, a meiose I é precedida por uma interfase com uma fase S, em que cada cromossomo se replica. O resultado disto é que cada cromossomo representa duas cromátides-irmãs unidas por proteínas coesinas. A meiose I inicia com uma longa prófase I, durante a qual os cromossomos mudam. Os cromossomos homólogos se pareiam ao longo da sua extensão, no processo chamado de sinapse. Este processo de pareamento ocorre a partir da prófase I e irá até o final da metáfase I. No momento em que os cromossomos podem ser claramente visualizados sob o microscópio óptico, os dois homólogos já se encontram unidos fortemente. Quem faz essa união são os telômeros, por meio do reconhecimento de sequências homólogas de DNA nos cromossomos homólogos. Além disso, um grupo especial de proteínas pode formar uma armação chamada de complexo sinaptonemal, que ocorre longitudinalmente nos cromossomos homólogos e para mantê-los unidos. No momento em que os cromossomos podem ser claramente visualizados sob o microscópio óptico, os dois homólogos já se encontram unidos fortemente. Quem faz essa união são os telômeros, por meio do reconhecimento de sequências homólogas de DNA nos cromossomos homólogos. Além disso, um grupo especial de proteínas pode formar uma armação chamada de complexo sinaptonemal, que ocorre longitudinalmente nos cromossomos homólogos e para mantê-los unidos. 43 6 BIOLOGIA MOLECULAR: SEQUENCIAMENTO DE DNA A partir da década de 1970, com o desenvolvimento das primeiras técnicas de sequenciamento de DNA, uma série de paradigmas na Biologia Molecular foi quebrada e um volume enorme de novas informações e novas tecnologias pôde ser desenvolvido a partir da informação da sequência de pares de bases presente no DNA. O sequenciamento de genomas representa um desafio aos métodos de sequenciamento de DNA: genomas completos, mesmo os bacterianos, são extremamente longos. Assim, a determinação da sequência de bases de genomas completos exige estratégias experimentais específicas para contornar essa questão, e a análise desse enorme volume de sequências também exige ferramentas computacionais adequadas. Neste capítulo, você receberá as ferramentas necessárias para descrever os princípios dos principais métodosde sequenciamento de DNA, bem como para reconhecer as estratégias adotadas para sequenciar genomas completos e para analisá-los por meio de ferramentas de bioinformática. 6.1 Métodos de sequenciamento de DNA No final da década de 1970, começaram a surgir os primeiros métodos para a determinação de sequências de nucleotídeos em moléculas de DNA: o método de terminação de cadeia com didesoxirribonucleosídeos trifosfato (ddNTPs), mais conhecido como método de Sanger, e o método de degradação química de DNA de Maxam e Gilbert. Enquanto o último se mostrou apropriado para o sequenciamento de pequenos oligonucleotídeos, o sequenciamento de Sanger aparentou ser extremamente útil para moléculas de DNA maiores e, desde então, tem sido amplamente utilizado nesses casos (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Adaptações a essa técnica clássica foram realizadas e permitiram que ela fosse capaz de contribuir para o sequenciamento de genomas completos, mas outros métodos têm surgido nas últimas décadas — com princípios completamente distintos do método de Sanger. Esses métodos de nova geração e alto desempenho estão revolucionando a área e têm tornado a técnica de sequenciamento muito mais acessível. 44 6.1.1 Método enzimático de Sanger O método de Sanger, desenvolvido por Frederick Sanger em 1977, faz uso, de forma simples, do princípio de que a DNA polimerase necessita de uma extremidade 3’-OH livre em uma fita iniciadora para estender uma fita de DNA complementar a uma fita molde. No método, a sequência de um DNA-alvo em fita-simples pode ser estabelecida pela síntese de fitas complementares pela DNA polimerase na presença de ddNTPs: idênticos aos desoxirribonucleosídeos trifosfato (dNTPs), se não fosse a ausência da hidroxila no carbono 3’. Dessa forma, uma vez incorporados os ddNTPs à cadeia em extensão, esses nucleotídeos não disponibilizam a extremidade 3’-OH necessária ao alongamento da cadeia pela polimerase, encerrando a síntese nesse ponto. Estrutura química da desoxiadenosina trifosfato (dATP) em relação à didesoxiadenosina trifosfato (ddATP). Ambos podem ser incorporados à fita de DNA em extensão pela DNA polimerase e adicionam uma adenina à sequência da molécula. No entanto, a ausência da hidroxila no carbono 3’ do ddATP impede que a DNA polimerase catalise a formação de uma nova ligação fosfodiéster a partir desse nucleotídeo incorporado. Fonte: Zaha, Ferreira e Passaglia (2014 p. 349). Para a reação, são incubados em quatro tubos de ensaio distintos, usam-se os descritos a seguir. DNA-alvo: deve estar na forma de fita-simples ou ser desnaturado para servir como molde para a síntese de fitas complementares. Oligonucleotídeo iniciador: pequena sequência de cerca de 20 pb que fornecerá a extremidade 3’-OH para o início da síntese das fitas complementares pela DNA polimerase. O iniciador precisa ter sequência complementar à região flanqueadora da extremidade 3’ do DNA-alvo para anelar à mesma e permitir o início 45 da síntese. Assim, é necessária alguma informação de sequência do DNA-alvo, ou do fragmento de DNA fusionado ao DNA-alvo (como um vetor, por exemplo). dNTPs: dATP, dCTP, dGTP, dTTP. dNTPs marcados com radioisótopos: em geral, α-32P-dATP ou 35S- - dATP são adicionados para serem incorporados aleatoriamente às fitas em extensão e servirem como marcadores dos fragmentos formados com a síntese. DNA polimerase. 6.1.2 Métodos de nova geração A partir da década de 1990, métodos com princípios distintos têm surgido e revolucionado a área de sequenciamento de DNA. Esses métodos, denominados coletivamente como sequenciamento de nova geração ou alto desempenho, são também automáticos e apresentam algumas vantagens em relação ao sequenciamento de Sanger, devido a isso, esses métodos têm sido muito utilizados para sequenciamentos de larga escala, pois permitem o sequenciamento de moléculas de DNA presentes em baixíssimas concentrações. De forma geral, os métodos de nova geração acoplam uma etapa prévia de amplificação — por PCR (reação em cadeia de polimerase, do inglês polymerase chain reaction) em emulsão ou por PCR em fase sólida — do DNA molde à reação de sequenciamento —, melhorando a sensibilidade da técnica (METZKER, 2010). No método clássico de Sanger, o sequenciamento de moléculas de DNA em geral envolve etapas prévias de clonagem. Os métodos de sequenciamento de nova geração também apresentam uma maior capacidade de sequenciamento: milhões de moléculas de DNA podem ser analisadas simultaneamente, gerando milhões de bases de informações de sequências em uma só reação (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Os métodos de sequenciamento de nova geração se diferem entre si, principalmente na forma de preparação e amplificação da amostra, bem como na forma com que a sequência é detectada e analisada (METZKER, 2010). De forma geral, é possível dizer que a detecção da sequência é realizada durante a síntese da fita complementar ao DNA-molde. 46 Fonte: SAGAH; Soluções Educacionais Integradas, 2018. Em algumas das técnicas, o DNA-molde recebe, alternativa e consecutivamente, cada um dos dNTPs na presença da DNA polimerase. Quando é adicionado o dNTP correto para a incorporação na fita em extensão, essa incorporação é detectada pelo sequenciador. No método de pirossequenciamento, o sequenciador detecta a liberação de pirofosfato quando um dNTP é incorporado à cadeia de DNA. Nos métodos de semicondutores de íons, o sequenciador detecta a liberação de um próton que ocorre em decorrência da incorporação de um dNTP à cadeia, ou seja, esse sequenciador utiliza, para a detecção de sequências de DNA, nada mais que um pHmetro extremamente sensível. Um exemplo de método com base em semicondutores de íons é o Ion Torrent, o qual é bastante rápido para sequenciamento de genomas e relativamente acessível. No caso de métodos de terminação reversível cíclica, a adição dos diferentes dNTPs pode ocorrer simultaneamente, pelo fato de que a detecção da incorporação é realizada pela liberação de fluorescências distintas para cada dNTP. A tecnologia de sequenciamento da plataforma Illumina, muito utilizada na indústria, baseia-se nesse princípio (ILLUMINA, 2018). 6.2 Estratégias para sequenciamento de genomas O sequenciamento de genomas inteiros apresenta uma dificuldade: moléculas muito longas não são facilmente sequenciadas. Devido a isso, o sequenciamento de genomas utiliza a estratégia denominada shotgun: o DNA genômico é fragmentado 47 em pequenas moléculas e estas são então submetidas aos métodos de sequenciamento. Isso possibilita a determinação de sequências de genomas completos, mas envolve um novo desafio: juntar as sequências dos fragmentos umas com às outras novamente. O sequenciamento shotgun costuma empregar o uso de bibliotecas de DNA. Uma biblioteca de DNA consiste no conjunto de moléculas recombinantes obtidas por clonagem de DNA. O primeiro passo é a recombinação de DNA com a ligação dos fragmentos de DNA de interesse em vetores apropriados (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Os vetores são moléculas de DNA com capacidade de autorreplicação, como plasmídeos (moléculas de DNA bacterianas extracromossômicas) e fagos (vírus que infectam bactérias). Após a inserção dos fragmentos de interesse nos vetores, é realizada a transformação de uma bactéria hospedeira com o vetor recombinante. Depois da seleção das células transformadas, a proliferação das bactérias permite a clonagem do vetor recombinante, dando origem a uma biblioteca que contém o DNA de interesse in vivo. Fonte: Adaptada de Watson et al. (2015, p. 156). 48 Por definição, a biblioteca de DNA consiste em uma coleção de vetores idênticos contendo diferentes fragmentos. No entanto, o isolamento de vetores recombinantes contendo fragmentosespecíficos pode ser realizado por meio da identificação de colônias específicas de bactérias transformadas (por meio de hibridização, por exemplo), as quais podem ser isoladas e expandidas separadamente (WATSON et al., 2015). No caso de bibliotecas genômicas, é realizada uma biblioteca de DNA com a clonagem de todo um genoma de interesse. Para isso, o genoma é fragmentado, com o uso de digestão por enzima de restrição, e esses fragmentos resultantes são separados por eletroforese, purificados para a recombinação com um vetor apropriado e clivados com uma enzima de restrição compatível (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Para a construção de bibliotecas genômicas, são frequentemente empregados vetores que suportam a clonagem de grandes insertos (maiores que 100 kb), como cromossomos artificiais bacterianos (BACs) e cromossomos artificiais de leveduras (YACs), para que um número menor de clones seja requerido para obter uma amostra representativa do genoma. Com a biblioteca genômica, é possível extrair o DNA em cultura e sequenciar o conteúdo dos vetores recombinantes. O DNA de clones de um certo transformante, contendo um determinado fragmento aleatório do genoma de interesse, pode ser rapidamente isolado e sequenciado (WATSON et al., 2015). O emprego de bibliotecas genômicas, no entanto, é comum para o sequenciamento pelo método de Sanger. Com os métodos de alto desempenho, não há necessidade de clonagem in vivo dos fragmentos do genoma. Ao utilizar as novas plataformas de sequenciamento de DNA, milhões de fragmentos podem ser analisados de uma só vez, sem haver necessidade de etapas prévias de isolamento e amplificação de fragmentos (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Nos casos em que o interesse é a análise de genes, é realizada a construção de bibliotecas de cDNA (DNA complementar), contendo apenas as sequências transcritas em RNA que correspondem às sequências de DNA expressas pela célula. Para isso, o RNA total de interesse é isolado e é feita a síntese de cDNA a partir das moléculas de RNA mensageiro, em uma reação catalisada pela enzima transcriptase reversa. Essas moléculas de cDNA equivalentes às sequências do genoma que foram 49 transcritas em moléculas de DNA, em um determinado tipo celular, são então fusionadas a vetores apropriados e clonadas (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). 6.3 Genômica: análise de genomas Com o advento de sequenciadores automáticos, uma quantidade enorme de sequências de DNA pode ser obtida a partir de diferentes amostras biológicas e um número cada vez maior de organismos tem seu genoma completo sequenciado. Essa grande quantidade de dados de sequências, coletadas atualmente em ritmo surpreendente, representa um desafio para as ferramentas de bioinformática que tratam da montagem, da anotação e da comparação de genomas (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). A partir das pequenas sequências geradas pelas estratégias de sequenciamento de genomas, são necessárias diversas etapas de análise computacional para tornar esses dados informativos e úteis para possíveis aplicações práticas. 6.3.1 Montagem de genomas Tanto no método de Sanger a partir de bibliotecas genômicas quanto nos métodos de nova geração, o sequenciamento é feito a partir de fragmentos aleatórios e, em seguida, programas computacionais são utilizados no processo de montagem do genoma para fazer a sobreposição das leituras de sequências (reads), de forma a obter uma sequência consenso de bases contíguas (contig) (WATSON et al., 2015). Montagem do genoma. As reads fornecem as contigs. A união das diferentes contigs, em geral pelo sequenciamento das extremidades de grandes fragmentos de DNA, fornece a sequência de grandes estruturas genômicas. Fonte: Watson et al. (2015, p. 165). 50 Regiões com sequências repetitivas, com baixa cobertura e baixa qualidade de sequenciamento representam um desafio à montagem de genomas, mas podem ser resolvidas com adaptações no sequenciamento (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Em geral, são realizados sequenciamentos de fragmentos com diferentes faixas de tamanho (p.ex., fragmentos de 1, 5 e 100 mil bases em média) para solucionar regiões altamente repetitivas. Ao mesmo tempo, quanto maior for o número de sobreposições de uma mesma sequência, maior a confiabilidade da montagem: em média, a leitura de 10 a 20 vezes da quantidade média de DNA de um cromossomo permitirá a montagem da sua sequência (WATSON et al., 2015). 6.4 Anotação de genomas Os grandes blocos de contigs obtidos pela montagem de genomas são muito pouco informativos por si só, a não ser que sejam anotados. A anotação do genoma consiste na identificação dos trechos de DNA genômico que contém quaisquer informações úteis: desde genes e suas sequências codificadoras de proteínas até sequências não codificadoras que transcrevem RNAs regulatórios ou que atuam em si como agentes de regulação transcricional (WATSON et al., 2015). A anotação do genoma permite, portanto, a atribuição de funções potenciais ou conhecidas às sequências obtidas pelos métodos de sequenciamento. São exemplos de anotação genômica a busca por regiões gênicas, a definição de sequências de íntrons e de éxons, a identificação de genes ortólogos, a busca por sítios de clivagem por enzimas de restrição e a busca por sítios de ligação a proteínas específicas no DNA. Quanto maior e mais complexo é o genoma em questão, mais extenso é o trabalho de anotação genômica. 6.5 Bancos de dados de sequências de DNA Os bancos de dados têm papel fundamental na manutenção e no compartilhamento das informações obtidas a partir do sequenciamento de genes e genomas completos, sendo fundamentais para a montagem e anotação de novos genomas pela comparação de novas sequências com sequências pré-existentes. No sequenciamento de novo, no qual não há informação prévia alguma de sequências relacionadas, a montagem do genoma se baseia unicamente nas 51 informações geradas pelo sequenciamento do genoma em questão. Com o aumento da quantidade de sequências disponíveis nos bancos de dados, cada vez mais a montagem e a anotação de novos genomas têm sido auxiliadas pela comparação com sequências de genomas de organismos próximos, por exemplo, disponíveis em diferentes bancos de dados de sequências de DNA. Bancos de dados de bibliotecas genômicas apresentam as sequências de DNA do genoma como um todo, desde regiões gênicas até sequências intergênicas, dependente apenas do organismo do qual foi originada. Bancos de dados de bibliotecas de cDNA, por sua vez, contêm as regiões do genoma que foram transcritas em RNA mensageiro e, assim, permitem a comparação de diferentes perfis de expressão gênica em um mesmo organismo. Além disso, bibliotecas de sequências de cDNA disponibilizam as sequências gênicas na ausência de sequências intervenientes (íntrons) removidas por mecanismos de splicing em organismos eucarióticos, sendo muito úteis para o estudo dos genes desses organismos. O GenBank é um dos bancos primários mais utilizados mundialmente. Por ser mantido pelo órgão NCBI (National Center for Biotechnology Information) dos Estados Unidos, ele permite o depósito de sequências e disponibiliza uma série de ferramentas para análises comparativas (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Cada sequência registrada apresenta um número de acesso que a identifica no banco de dados. Fonte: https://www.news-medical.net/ 52 A genômica é uma das áreas das ciências biológicas que, por envolver a geração de uma quantidade altíssima de dados de sequências, teve a sua evolução condicionada ao desenvolvimento de ferramentas computacionais de análise eficientes. A bioinformática é a área do conhecimento que pode ser descrita como a aquisição, a análise e o armazenamento de informações biológicas — no caso, na forma de sequênciasnucleotídicas, por exemplo. A biologia computacional, por sua vez, cuida do desenvolvimento de algoritmos e programas computacionais para resolver esses problemas (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Um dos objetivos essenciais dessas áreas, quando aplicadas à genômica, é decifrar o código de sequências de nucleotídeos na forma de informação biológica funcional. 7 ORIGEM DA BIOTECNOLOGIA A biotecnologia é uma área muito abrangente e resulta da fusão entre ciência e tecnologia. Assim, pode ser considerada como uma área de inovação que permanece em crescimento e gera impacto no nosso cotidiano. A partir de seu surgimento, iniciou-se um ciclo de ampliação do conhecimento científico e observou- se um real progresso em diversos setores. Cabe salientar que esse campo não se limita à área da saúde: a biotecnologia envolve profissionais de distintas áreas, como biólogos, bioquímicos, agrônomos, veterinários, engenheiros, farmacêuticos, zootécnicos e afins. Neste capítulo, você vai compreender essa área do conhecimento denominada biotecnologia, vai conhecer o seu histórico, suas principais contribuições para a atualidade e sua aplicabilidade em nosso dia a dia. 7.1 Biotecnologia e origens Os primeiros indícios dessa área de conhecimento surgiram no Egito Antigo, quando os egípcios utilizavam o processo de fermentação para a fabricação de cervejas e pães. Entretanto, por muitos anos, os agentes que causavam essa fermentação não eram conhecidos (FERRO, 2010). 53 Milênios depois, o pesquisador Anton Van Leeuwenhoek, tendo desenvolvido e utilizado o microscópio, observou e descreveu seres invisíveis a olho nu. No ano de 1875, um biólogo chamado Louis Pasteur provou que o processo de fermentação era causado por esses microrganismos (BRUNO, 2015). A Segunda Guerra Mundial foi um dos fatores que motivou a produção em maior escala de produtos oriundos do processo de fermentação, pois utilizava esse processo na fabricação de explosivos. Nesse mesmo período, surgiu o ponto alto da medicina, o desenvolvimento e a produção da penicilina em grande escala, originada de um processo biotecnológico descoberto por Alexander Fleming e que permitiu que iniciássemos o uso de antibióticos (CARRER; BARBOSA; RAMIRO, 2010). 7.2 O marco biotecnológico No ano de 1953, foi publicado, na revista Nature, o artigo de James Watson e Francis Crick no qual foi descrita, pela primeira vez, a estrutura molecular do ácido desoxirribonucleico (DNA). Essa descoberta propiciou o início de inúmeras pesquisas, ampliando ainda mais o espaço da biotecnologia (CARRER; BARBOSA; RAMIRO, 2010). A partir de então, ocorreu um avanço crescente das denominadas “técnicas do DNA recombinante”, as quais permitem a transferência de material genético entre os organismos. Dessa forma, a manipulação genética popularizou-se e fez com que a biotecnologia se tornasse um importante agente interdisciplinar do conhecimento, envolvendo microbiologia, genética, bioquímica, biologia celular, fisiologia, farmacologia, química, dentre outras áreas (FERRO, 2010). A partir disso, surgiram dois conceitos de biotecnologia (BRUNO, 2015): Biotecnologia tradicional: utiliza organismos vivos na forma como são encontrados na natureza. Biotecnologia moderna: utiliza organismos vivos modificados geneticamente por meio da engenharia genética ou da tecnologia do DNA recombinante. 7.3 Fatos históricos e a biotecnologia Os seres humanos estão há tempos manipulando organismos vivos com a finalidade de melhorar a qualidade de vida do homem e solucionar problemas. Aqui, 54 vamos conhecer um pouco dos fatos históricos mais signifi cativos no contexto da biotecnologia (FERRO, 2010; CARRER; BARBOSA; RAMIRO, 2010; VOET; VOET, 2013; BRUNO, 2015). No ano de 1957, Francis Crick e George Gamov elaboraram o “dogma central da biologia molecular” sobre como as proteínas são produzidas a partir do DNA; em seguida, Matthew Stanley Meselson e Frank Sthal demonstraram o mecanismo da replicação do DNA. Em 1965, os cientistas revelaram que os genes que levam à resistência aos antibióticos em bactérias são denominados plasmídeos. Um ano depois, Marshall Nirenberg, Heinrich Matthaei e Severo Ochoa demonstraram que uma sequência de 3 nucleotídeos (códon) determina cada um dos 20 aminoácidos. Em 1970, foi isolada a transcriptase reversa, uma enzima que produz DNA a partir do RNA, descoberta feita por Howard Temin e David Baltimore. A transcriptase reversa tem sido uma ferramenta útil na engenharia genética por sua capacidade em transcrever mRNAs em fitas complementares de DNA (cDNA). No ano de 1977, Walter Gilbert e Allan Maxam desenvolveram o método de sequenciamento de DNA. No ano subsequente, 1978, a Genentech Inc. e o Centro de Medicina Nacional anunciaram a produção de insulina humana com a utilização da tecnologia do DNA recombinante. No ano de 1980, Kary Mullis e colaboradores desenvolveram a técnica de PCR (Polymerase Chain Reaction ou reação em cadeia da polimerase). Em 1982, a FDA deu aprovação para que essa insulina humana modificada geneticamente fosse comercializada. Chega ao mercado o primeiro produto derivado de um organismo transgênico, a insulina. Em 1994, a FDA aprovou o primeiro produto alimentício geneticamente modificado (GM), o tomate FlavrSavr. Em 1996, na Escócia, Instituto Roslin, surgiu o primeiro mamífero reproduzido de uma célula somática de uma ovelha adulta, a famosa ovelha Dolly. No ano de 2001, os EUA sofreram com atentados bioterroristas. Foram espalhadas cartas contendo Antraz, bactéria que tem a capacidade de causar uma doença letal denominada “carbúnculo”. Esse atentado impulsionou o desenvolvimento da biotecnologia e resultou em um maior investimento em biossegurança. Em 1998, foram descobertas as células-tronco embrionárias humanas. 55 No ano de 2003, a ovelha Dolly morreu por problemas pulmonares. Em 2004, foi clonado o primeiro animal de estimação, um gato. Em 2005, a FDA aprovou a primeira droga etnicamente específica: um medicamento para doenças cardíacas direcionado para pacientes negros. No ano de 2010, Craig C. Venter publicou seu trabalho na revista Science, descrevendo o desenvolvimento de uma “célula sintética”. 7.4 Aplicabilidades da biotecnologia A biotecnologia é considerada um ramo promissor e ainda encontra-se em crescimento no Brasil. Após a publicação do decreto nº. 6.041, de 8 de fevereiro de 2007, a biotecnologia, no nosso país, passou a ser fragmentada em quatro áreas setoriais (BRUNO, 2015): Saúde humana: voltada para a produção de anticorpos, medicamentos e vacinas. Agropecuária: voltada para o aumento da produção de alimentos e combate às pragas. Industrial: voltada para processos de fermentação e produção de combustíveis. Ambiental: voltada para a recuperação de ambientes danificados. Mundialmente, é visível que a biotecnologia tem movimentado a criação de novos produtos industriais, trazendo melhorias em termos de rendimento na produção agrícola (ALLEN JUNIOR, 2017). As mudanças trazidas pela biotecnologia já impactaram e seguem impactando diariamente nossa vida. Na agricultura, a possibilidade de manipular material genético reflete em produtividade sustentável e eficiente, o que beneficia os consumidores e propicia o desenvolvimento de produtos como culturas geneticamente modificadas voltadas para tolerância a herbicidas, resistência a doenças e pragas, além de aumentar propriedades nutricionais dos produtos que chegam à nossa mesa (BATISTA, 2018). 56 7.5 Benefícios da biotecnologia na saúde A biotecnologia tem papel central também no diagnóstico de doenças e tem propiciado o aumento de tratamentos contra as mais diversas doenças (ALLEN JUNIOR, 2017). A biotecnologia contribuiexponencialmente para a produção de fármacos. Atualmente, mais de 350 fármacos estão sendo aprovados para o tratamento de diversas doenças, dentre as quais podemos citar câncer, doenças autoimunes e infecciosas. Alguns biofármacos da atualidade desenvolvidos com o advento da biotecnologia (FERRO, 2010) são: Fator VIII e IX utilizados para a hemofilia tipos A e B. Agentes tromboembolíticos utilizados para condições como trombose e embolias. Interferons (α, β, γ) utilizados para tratar condições como esclerose múltipla, leucemias e hepatite C. Hormônios como a insulina (para o diabetes), o hormônio do crescimento e as gonadotrofinas. Produtos baseados em interleucinas utilizados para tratar a doença de Crohn. Ampla variedade de vacinas para a prevenção de diversas doenças. O uso da biotecnologia é a base para a engenharia genética. Portanto, concluímos que seu uso traz melhorias qualitativas e quantitativas para algumas características dos microrganismos — além disso, já nos trouxe muitas contribuições em diversos campos. Fonte: https://www.iberdrola.com/ 57 8 ENGENHARIA GENÉTICA Na atualidade, as novas tecnologias de DNA estão presentes em tudo — na agricultura, na área criminal, nas pesquisas médicas, na área farmacológica —, o que demonstra que a biotecnologia está cada dia mais presente em nosso cotidiano. Assim, a biotecnologia e a engenharia genética despontam de um potencial grandioso para oferecer soluções para problemas mundiais importantes. A biotecnologia é assim denominada devido ao uso de organismos vivos para desenvolver um produto ou processo que tenha como objetivo a melhoria da qualidade de vida dos humanos ou de outros organismos. A biotecnologia moderna necessita muito da engenharia genética (KLUG et al., 2012), ciência que trata da manipulação do material genético. Trata-se de um agrupamento de procedimentos que resultam em uma modificação predeterminada e remetida no genótipo de um organismo e conta com muitas aplicações em distintas áreas, como medicina, odontologia, agricultura, indústria (BORGES-OSÓRIO; ROBINSON, 2013, p. 591). Em suma, a engenharia genética está relacionada com a modificação genômica de um organismo e utiliza tecnologias para adicionar ou remover genes de um genoma. As novas variedades de plantas e organismos vivos com traços genéticos específicos foram geradas por cientistas graças à capacidade de manipular o DNA in vitro e de introduzir genes em células vivas (KLUG et al., 2012, p. 634). Como uma nova ciência, vem demonstrando resultados surpreendentes. Por exemplo, a partir dos resultados apontados pelo Projeto Genoma Humano e da discussão envolvendo os transgênicos, que impulsionaram essa área da engenharia, foi possível mapear o ser vivo geneticamente, gerar clones, desenvolver a terapia gênica e produzir transgênicos (BATISTA, 2018). O medicamento pioneiro que a engenharia genética utilizou foi a insulina humana, gerada a partir de bactérias modificadas de Escherichia coli, no ano de 1982. No decorrer das últimas três décadas, foram desenvolvidos inúmeros medicamentos que permitiram o tratamento para diversas alterações (SCHAEFER; THOMPSON JUNIOR, 2015). Outra aplicação da engenharia genética que pode ser citada é o seu uso para fortalecer a qualidade dos animais de pecuária, criando animais transgênicos com características melhoradas, como o crescimento e a resistência a doenças (KLUG et al., 2012). 58 8.1 Tecnologia do DNA recombinante A tecnologia do DNA recombinante é definida como um conjunto de técnicas moleculares que objetiva localizar, isolar, alterar e estudar segmentos de DNA. O termo recombinante é utilizado devido ao objetivo principal da tecnologia, que é combinar DNAs de origens diferentes. As moléculas de DNA recombinante assim geradas contêm combinações novas de sequências nucleotídicas que poderão ser introduzidas em uma nova célula hospedeira, na qual controlarão a síntese de um produto gênico que não é feito por essa célula ou modificarão a expressão de um gene ali já existente. Logo, a tecnologia do DNA recombinante é usualmente chamada de engenharia genética (BORGES-OSÓRIO; ROBINSON, 2013). A partir de 1970, foram desenvolvidas as tecnologias do DNA que têm auxiliado muito na percepção do genoma das células de eucariotos. Essas tecnologias permitem (BORGES-OSÓRIO; ROBINSON, 2013): conhecer a estrutura e a função dos genes dos eucariotos; viabilizar a ocorrência de recombinação gênica entre diferentes espécies e o alcance de organismos com características novas, não encontradas na natureza; viabilizar a transferência de genes de mamíferos para bactérias, tornando- as capazes de produzir em abundância proteínas de importância médica e também econômica, como hormônios, vacinas, fatores de coagulação, insulina, etc.; contribuir para a área das ciências forenses (análises de paternidade, identificação de suspeitos). Conforme mencionado, a tecnologia do DNA recombinante teve seu início em meados de 1970, quando os pesquisadores descobriram que as bactérias protegem- se de infecções virais por meio da produção de enzimas que cortam o DNA em sítios específicos; quando cortado, esse DNA não consegue comandar a síntese das partículas de fagos (que são vírus associados a procariotos, também denominados bacteriófagos). Instantaneamente, percebeu-se que essas enzimas, denominadas enzimas de restrição, poderiam ser extremamente úteis para cortar o DNA de qualquer organismo em sequências de nucleotídeos específicas, originando um agrupamento de fragmentos reproduzíveis. Esse feito estabeleceu a fase de desenvolvimento da clonagem do DNA, ou seja, a produção de múltiplas cópias das sequências de DNA (KLUG et al., 2012, p. 08). 59 Após a constatação de que as enzimas de restrição geram fragmentos específicos de DNA, foram estabelecidos os métodos para inserir esses fragmentos em moléculas portadoras de DNA, utilizando vetores chamados de plasmídeos (que são pequenas moléculas circulares de DNA que se replicam separadamente) (KLUG et al., 2012, p. 08). Para iniciar o processo de clonagem de um fragmento de DNA em plasmídeo, o DNA plasmideal purificado é linearizado por uma nuclease de restrição que o cliva em um único sítio; logo, o fragmento de DNA a ser clonado é, então, colocado nesse sítio, utilizando DNA-ligase (ALBERTS et al., 2017). Depois disso, essa molécula de DNA recombinante (uma molécula que contém DNA de duas fontes distintas, até mesmo de espécies diferentes) está apta para ser introduzida em uma bactéria. Então, o plasmídeo é introduzido na célula bacteriana, dando origem a uma bactéria recombinante. Por sua vez, essa célula isolada reproduz-se por meio de repetidas divisões celulares e gera um clone celular, uma população de células geneticamente iguais (REECE et al., 2015). Veja uma ilustração desse processo a seguir, na figura abaixo: Fonte: Klug et al. (2012, p. 329). 60 A maioria dos métodos de clonagem de segmentos de DNA laboratorial compartilha certas características gerais. Comumente, essa abordagem utiliza bactérias — com frequência, a Escherichia coli — que têm plasmídeos (REECE et al., 2015). No processo de introduzir o DNA recombinante em uma célula bacteriana, os pesquisadores se beneficiam do fato de que algumas bactérias naturalmente captam moléculas de DNA que estão presentes no seu meio, e o mecanismo que controla essa captação é denominado transformação. Fonte: WhiteDragon/Shutterstock.com. A tecnologia do DNA recombinante propicia novas e potentes ferramentas para alterar a constituição genética de organismos de relevância também na agricultura. Os cientistas identificam, isolam e clonam genes que conferem as características almejadas e, depois disso, de modo específico e eficiente, introduzemesses genes nos organismos. Com isso, é possível inserir rapidamente a resistência a herbicidas, insetos e até mesmo características nutricionais a esses organismos (KLUG et al., 2012, p. 638). 61 8.2 Organismos geneticamente modificados (OGMs) Organismo geneticamente modificado (OGM) é o termo usado para um organismo que adquiriu, por meios artificiais, um ou mais genes de outra espécie ou até mesmo de outra variedade da mesma espécie. Um OGM pode ser transgênico ou cisgênico: o transgênico é assim denominado devido à relação com a inserção de material genético em ser vivo de uma espécie distinta; o cisgênico, devido ao fato de um organismo vivo receber material genético de outro organismo de mesma espécie (BATISTA, 2018). Um exemplo são alguns salmões que foram modificados geneticamente pela adição de um hormônio de crescimento de salmão mais ativo (REECE et al., 2015). Essas alterações são possíveis devido a técnicas de engenharia que promovem a quebra da cadeia de DNA em locais estipulados para, posteriormente, inserir segmentos de genes de outros organismos, fazendo com que a sequência novamente se una (BATISTA, 2018, p. 202). É notório o crescimento populacional, o que exige um maior aumento na produção no que se refere à agricultura. A introdução de OGMs em maiores escalas se deve ao fato de que a produção agrícola necessita atender à demanda crescente (BATISTA, 2018). Nesse sentido, a biotecnologia utiliza algumas abordagens principais para a melhoria de lavouras, como, por exemplo, adicionar a uma variedade em cultivo uma característica específica denominada “característica de primeira geração”, que inclui proteção contra seca, tolerância a herbicidas, além de proteção contra insetos. Outras abordagens tratam da melhoria qualitativa, como óleos vegetais com maiores níveis de ácidos graxos ômega-3. Com o uso da engenharia genética, foram desenvolvidas plantas que crescem com menos uso de pesticidas, variedades novas de batata que, sem conservantes, podem ser armazenadas por mais tempo. Além disso, a biotecnologia proporciona que os cientistas desenvolvam frutos e grãos com maior teor de alguns nutrientes, como betacaroteno, vitaminas E e C (WARDLAW; SMITH, 2013). Assim, resumidamente, algumas razões para gerar culturas transgênicas, incluem (KLUG et al., 2012, p. 639): 62 melhoramento em características como crescimento e produtividade de culturas de valor na agricultura; complemento do valor nutricional das culturas; resistência das culturas contra insetos, pragas, secas e herbicidas. Um quesito promissor dos alimentos geneticamente modificados possivelmente esteja na criação de vegetais especialmente ricos em alguns micronutrientes que proveem aos países em desenvolvimento uma estratégia para tratar e precaver carências nutricionais específicas das populações. A biotecnologia provavelmente, visando o futuro, será uma estratégia benéfica para combater a subnutrição (WARDLAW; SMITH, 2013). 8.3 Terapia gênica: princípios e aplicações Uma das grandes esperanças para o progresso geral na terapêutica de doenças genéticas é a terapia gênica, que tem como base a existência de métodos laboratoriais bem estabelecidos para introduzir genes nas células (READ; DONNAI, 2018). A transferência de material genético novo para as células de um indivíduo, de modo que resulte em benefícios terapêuticos, está sob investigação clínica desde 1990, época em que French Anderson e Michael Blaese usaram essa tecnologia com o objetivo de aliviar a doença da imunodeficiência grave combinada. Na atualidade, já são conhecidas aproximadamente 4000 doenças genéticas, que são alvo em potencial para a terapia gênica. Inúmeros protocolos de transferência de genes estão, atualmente, em desenvolvimento para utilização (VOET; VOET, 2013). A introdução de genes nas células é a base da terapia gênica. Para tal, existe a necessidade de um carreador que facilite a entrada do DNA nessas células vivas — esse carreador é denominado “vetor”. Três classes de vetores estão atualmente em desenvolvimento: plasmídeos, vetores virais e vetores nanoestruturados (LINDEN, 2010). Existem três categorias de terapia gênica (VOET; VOET, 2013): Ex vivo (fora do corpo): as células são retiradas do corpo, incubadas com um vetor e, então, reintroduzidas no corpo. Esse procedimento, normalmente, é realizado com células da medula óssea. 63 In situ: o vetor é aplicado sobre os tecidos afetados, de forma direta. Esse procedimento pode, por exemplo, ser útil para tratamento tumoral por injeção no tumor de um vetor que porte o gene que tenha capacidade de tornar esse tumor suscetível a um agente quimioterápico. In vivo: o vetor é injetado diretamente na corrente sanguínea. Essa modalidade ainda não foi experimentada clinicamente. Aproximadamente dois terços de todos os protocolos clínicos aprovados de terapia gênica são voltados para o câncer e têm algumas funcionalidades (STRACHAN; READ, 2014): recuperar a função de um gene supressor de tumor a partir da adição gênica (exemplo: TP53 ou BRCA1); prevenir a expressão de um oncogene ativado a partir da inativação gênica (exemplo: ERBB2); desencadear a apoptose a partir da manipulação genética de células tumorais; modificar células tumorais visando torná-las mais antigênicas, permitindo que o sistema imune destrua o tumor; modificar células dendríticas de modo que aumente a reação imunológica específica contra o tumor. Uma utilização da modificação genética tem envolvido a produção de proteínas terapêuticas. A expressão de clones em microrganismos, culturas celulares ou estoques transgênicos vivos (nos quais a proteína de interesse é expressa em ovos, leite) reduz os riscos à saúde associados à obtenção dessas proteínas de fontes humanas ou animais (STRACHAN; READ, 2014). As terapias gênicas ainda se encontram em fase experimental, pois são procedimentos novos. Estudos nos laboratórios de pesquisa experimental, por meio de testes em modelos experimentais e ensaios pré-clínicos, analisam o potencial de eficácia de uma estratégia terapêutica e também possibilitam detectar potenciais riscos aos seres humanos. A principal barreira no desenvolvimento da terapia gênica para a prática médica é a segurança. Existem motivos que geram otimismo e expectativa de sucesso das tecnologias de terapia gênica, visto que, em futuro próximo, ela pode ser viável, considerando a esperança de investimento crescente vindo de empresas de biotecnologia (LINDEN, 2010). 64 9 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA E DIFERENCIAÇÃO CELULAR O processo de transcrição do ácido desoxirribonucleico (DNA) permite a formação das proteínas a partir da informação genética. As funções dos diferentes tipos de proteínas, por sua vez, caracterizarão a atividade e a morfologia das células. Em um organismo, nem todos os produtos gênicos são necessários simultaneamente e nos mesmos níveis. A regulação da síntese de macromoléculas é denominada controle da transcrição ou expressão gênica. Em um organismo procariótico, altamente dependente das condições de seu ambiente, a regulação deve permitir que ele responda rapidamente às mudanças ambientais, a fim de garantir sua sobrevivência. Usar uma parte ou outra da herança genética facilita esse processo, até que consiga adaptar-se adequadamente ao ambiente. A diferenciação celular que existe em organismos multicelulares é baseada no fato de que, embora todas as células tenham o mesmo DNA, elas se distinguem pelo fato de sintetizarem diferentes tipos de ácido ribonucleico (RNA) e, consequentemente, diferentes proteínas. Se você comparar um eritrócito e uma célula nervosa, por exemplo, as diferenças são tão grandes que é difícil pensar que ambas compartilham o mesmo DNA. Neste capítulo, você vai aprenderqual é o principal sítio de controle da transcrição gênica e de que forma ocorre o controle da expressão gênica em organismos procarióticos e eucarióticos. Além disso, compreenderá que todas as células do corpo humano têm o mesmo genoma e estão sob um controle de expressão gênica diferencial, o que leva à diversidade celular observada nos indivíduos. 9.1 Sítios de controle da transcrição gênica A transcrição gênica ocorre quando a sequência de DNA de um gene é copiada em uma molécula de RNA. Por meio da transcrição, é possível utilizar as informações contidas em um gene para fazer uma proteína. É importante compreender, contudo, que a expressão de um determinado gene só ocorre quando ele é “ativado” (STRACHAN; READ, 2016). A transcrição funciona como um ponto de controle para ligar e desligar determinadas funções nas células, e é assim que cada célula assume funções 65 específicas no organismo. Caso o gene não seja transcrito em uma célula, ele não poderá ser utilizado para fazer uma proteína naquela célula. Se o gene for transcrito, poderá ser utilizado para a elaboração de uma proteína. Assim, quanto mais transcrito for o gene, mais proteínas serão produzidas (KHAN ACADEMY, 2020). Esse processo é executado de modo monitorado e controlado, pois como as moléculas de DNA se encontram bastante enoveladas em torno das proteínas, a transcrição pode ser afetada (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Proteínas chamadas de fatores de transcrição conseguem desempenhar um papel importante na regulação da transcrição. Para isso, elas se conectam às sequências de DNA, demarcam os genes que serão ativados em cada célula do organismo vivo e os ativam ou desativam. Tais proteínas reconhecem as sequências de nucleotídeos as quais devem se ligar e, dessa forma, facilitam a regulação ou a inibição da transcrição genética. A ativação e desativação dos genes efetuada pelos fatores de transcrição é o principal ponto de regulação da transcrição gênica (KHAN ACADEMY, 2020). 9.2 Expressão gênica em procariotos e eucariotos 9.2.1 Procariotos Nas bactérias (procariotos), os genes são agrupados em óperons. Um óperon consiste em um conjunto de genes, regulado pelas mesmas sequências regulatórias, que codificam as proteínas necessárias para a sobrevivência desses organismos. O RNA transcrito a partir de óperons procarióticos é chamado de RNA policistrônico, no qual várias proteínas são codificadas em um único mRNA (ALBERTS et al, 2014). Nas bactérias, o controle da transcrição para a maioria dos genes procarióticos ocorre por sequências de DNA, que em geral localizam-se nas bases 35 e 10, respectivamente, do local de início da transcrição (regiões identificadas como –35 e – 10). Esses dois elementos são chamados de sequências promotoras, as quais são reconhecidas e entram em contato com a RNA-polimerase (ALBERTS, 2014). A ligação da RNA-polimerase em um determinado promotor procariótico é, por sua vez, regulada pela interação com proteínas acessórias, que podem atuar tanto positivamente (ativadoras) quanto negativamente (repressoras) na ligação da RNA- 66 polimerase ao promotor. Tais proteínas conectam-se em regiões chamadas de operadores, que são adjacentes ao promotor (ALBERTS, 2014). 9.2.2 Eucariotos Nas células eucarióticas, a capacidade de expressar proteínas biologicamente ativas ocorre por meio da influência e da regulação de diferentes fatores (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). A organização do DNA, em sua forma compactada, pode afetar a capacidade dos reguladores transcricionais (denominados fatores de transcrição) e das enzimas RNA-polimerases de acessar certos genes (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Modificações epigenéticas em histonas – proteínas responsáveis por compactar o DNA – e no próprio DNA afetam a acessibilidade da cromatina. A metilação e a acetilação são exemplos de modificações epigenéticas que afetam a compactação do DNA e, consequentemente, a expressão gênica (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). 9.2.3 Transcrição Trata-se de uma das maneiras mais importantes de controlar a expressão de genes eucarióticos. A ligação ou não de fatores de transcrição, bem como de coativadores e correpressores, em sequências promotoras, reforçadoras e silenciadoras exerce controle transcricional, aumentando ou diminuindo a atividade da RNA-polimerase. A interação entre múltiplos ativadores e inibidores também tem papel fundamental nesse processo (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Os mRNAs eucarióticos transcritos sofrem um processamento que inclui a adição de CAP (5’), poliadenilação (3’) e remoção de íntrons. Tal processamento é fundamental para a geração de proteínas de qualidade e em quantidades adequadas. Um mRNA totalmente processado deve deixar o núcleo para ser traduzido em proteína no citoplasma (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Entre as células de organismos procariontes e eucariontes existem diferenças importantes, tanto em relação à heterogeneidade morfológica quanto em relação às funções. Por isso, é preciso haver mecanismos de controle precisos para a expressão 67 gênica nas diferentes células dos organismos, a fim de que possam desempenhar suas funções adequadamente (ZAHA; FERREIRA; PASSAGLIA, 2014). Visto que a regulação da expressão nos eucariotos é muito mais complicada, ainda há muito a ser explorado e compreendido sobre o processo. Vários tipos de sequências regulatórias, por exemplo, vêm sendo descritas nesses organismos. 9.3 Diferenciação Celular O ser humano inicia a vida com apenas uma célula, um único óvulo fertilizado conhecido como zigoto. No decorrer do desenvolvimento, essa célula se divide, dando origem a outras células até que o corpo humano seja formado (STRACHAN; READ, 2016). No corpo humano, existem mais de duzentos tipos células, com diferentes formatos e funções. Como todas elas originam-se de apenas uma, o genoma é o mesmo para todas. As células desenvolvem diferentes funções porque expressam um conjunto diferente de genes entre si e esse processo de expressão gênica controla os diversos processos essenciais para as células (STRACHAN; READ, 2016; KHAN ACADEMY, 2020). Entre os processos essenciais controlados pela expressão gênica estão os seguintes (KHAN ACADEMY, 2020): proliferação celular; diferenciação celular, para que as células tenham características próprias e expressem funções diferentes dependendo da região do corpo em que estão; movimentos celulares no organismo. As células originadas das primeiras divisões celulares são conhecidas como células-tronco totipotentes, e podem originar células de qualquer região do corpo humano, compondo órgãos e tecidos diversificados até sofrerem diferenciação (KHAN ACADEMY, 2020). Entende-se por diferenciação celular o processo pelo qual uma célula altera suas características de maneira permanente (embora não necessariamente irreversível). Trata-se da manifestação externa (morfológica ou bioquímica) da expressão dos genes (KHAN ACADEMY, 2020). 68 As células têm uma “memória” celular que lhes diz de que maneira, quando e onde elas devem se diferenciar e, então, manter esse estado. A decisão de se diferenciar, portanto, ocorre antes da diferenciação. A determinação sobre qual tipo de célula formar deve atender algumas características, como posição no embrião, por exemplo (ALBERTS et al., 2017). Um destino celular é entendido como o tipo de célula que uma célula embrionária (ou grupo de células embrionárias) se tornará. Por exemplo, as células dos miótomos de vertebrados se tornam células musculares. A especificação é usada para se referir ao que uma célula embrionária isolada produz em um meio neutro, que pode ser diferente de seu destino normal (ALBERTS et al., 2017). 10 DIAGNÓSTICO MOLECULAR DE DOENÇAS GENÉTICAS E INFECCIOSASO diagnóstico molecular de doenças é um campo emergente das análises clínicas laboratoriais. A identificação e a caracterização das bases genéticas das doenças torna-se, com frequência, fundamental para o diagnóstico. A detecção de mutações patogênicas em uma amostra de DNA pode levar ao diagnóstico, ao possível prognóstico e a uma terapia prospectiva. Avançadas técnicas da biologia molecular permitem o diagnóstico de doenças infecciosas, como, por exemplo, o papiloma vírus humano (HPV), as hepatites virais e a Helycobacter pylori, bactéria associada à ocorrência de úlceras gástricas. A análise molecular ainda detecta alterações genéticas do próprio organismo e auxilia no prognóstico de doenças como a síndrome de Down, a doença de Alzheimer e a síndrome de Klinefelter. 69 Técnicas de biologia molecular também têm sido cada vez mais utilizadas para guiar tratamentos personalizados, uma vez que elas permitem a avaliação, desde a suscetibilidade ao desenvolvimento de determinada doença, até a identificação de mecanismos individuais de resistência a determinadas drogas. 10.1 Principais técnicas de biologia molecular utilizadas para diagnósticos A biologia molecular diagnóstica tem evoluído de forma rápida, nos últimos anos, gerando um grande impacto em diversos laboratórios clínicos e em centros médicos. Essa evolução iniciou a partir da descoberta do DNA, em 1953, por Watson e Crick, que deu início à era da biologia molecular, a qual veio a se tornar um instrumento útil para o diagnóstico de diversas doenças (MOLINA; TOBO, 2004; MELLO; FONSECA-COSTA, 2005). Mas para que essas metodologias que empregam a biologia molecular são importantes? Atualmente, as técnicas moleculares, baseadas nos ácidos nucleicos, são ferramentas valiosas para o estudo e o diagnóstico de uma ampla variedade de processos infecciosos, neoplásicos e genéticos, de doenças como o câncer, de doenças genéticas e infecciosas, no geral. Além disso, elas podem auxiliar nos transplantes de órgãos. Desde a grande revolução propiciada pelo desvendamento do DNA, as metodologias na área da biologia molecular vêm evoluindo de maneira rápida. Em 1975, enzimas de restrição possibilitaram a manipulação do DNA in vitro, com seu isolamento e amplificação de regiões específicas para sua clonagem. No mesmo ano, a técnica de Southern blot permitiu o estudo de doenças genéticas a partir da localização específica de genes. Dois anos mais tarde, a determinação das sequências de nucleotídeos no DNA pela técnica de sequenciamento abriu a possibilidade de identificação de doenças genéticas pela alteração de sequências no DNA. Em 1983, Kary Mullis desenvolveu a famosa técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR, do inglês polymerase chain reaction). A PCR é uma das principais metodologias utilizadas no diagnóstico de doenças. Por meio de um par de sequências complementares de nucleotídeos (primers iniciadores) que cercam uma região de interesse, junto com uma enzima polimerase, múltiplas cópias do DNA podem ser obtidas. Assim, essa metodologia possibilita a amplificação de diversas 70 vezes segmentos de DNA a partir de pouco material genético (MOLINA; TOBO, 2004; MELLO; FONSECA-COSTA, 2005). Os testes diagnósticos associados à biologia molecular utilizam inúmeras fontes de materiais biológicos para investigação clínica. Essas amostras podem ser coletadas a partir de biópsias, de autópsias, de esfregaços ou simplesmente de punção de sangue ou de outro fluido corporal. Por exemplo, a técnica de hibridização in situ (HIS) faz uso de células ou cortes histológicos com a finalidade de identificar sequências específicas de nucleotídeos. Além disso, essas sequências podem ser tanto de DNA quanto RNA, e assim detectam tanto moléculas endógenas quanto moléculas provenientes de organismos exógenos, como vírus, bactérias e parasitas. Além da HIS, podemos identificar outras técnicas de biologia molecular utilizadas no diagnóstico clínico que figuram entre as principais: a PCR, a técnica de Southern blot, o Northen blot, o Western blot, e o microarranjo. 10.2 Técnicas diagnósticas associadas às patologias O diagnóstico molecular das doenças infectocontagiosas vem adquirindo papel primordial na prática da saúde biomédica frente à necessidade de confirmar uma hipótese relacionada a um determinado patógeno. Entre as vastas possibilidades de testes diagnósticos dentro da área da biologia molecular está a PCR, que constitui uma das técnicas moleculares mais utilizadas em laboratórios clínicos na pesquisa de doenças infecciosas e do câncer. A PCR pode ser utilizada para detectar uma mutação, por exemplo, ou para identificar patógenos presentes em amostras, como o fungo Candida sp ou as bactérias Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrohoea. Modalidades mais avançadas da PCR, como a q-PCR, aliada à automatização total da extração de DNA/RNA, já permitem a realização de testes moleculares como a identificação dos subtipos de HPV relacionados com o câncer do colo do útero. A RT-PCR, que identifica RNA por meio da transcriptase reversa, permitiu o diagnóstico do HIV e das hepatites virais (HCV). Além dessas doenças, o diagnóstico de infecções parasitárias como a toxoplasmose e a leishmaniose, e infecções bacterianas com difícil diagnóstico etiológico (uretrites e cervicites), apresentou grande avanço, graças à inclusão das técnicas moleculares. 71 Além da infinidade de doenças que a PCR pode diagnosticar, consiste em um método fácil, barato e confiável. Outras aplicações desse teste incluem a clonagem de DNA para sequenciamento genético ou manipulação de genes, construção de filogenias baseadas em DNA, análise funcional de genes, diagnóstico e monitoramento de doenças hereditárias. Além da biologia molecular, a PCR é útil nas áreas forense criminal e arqueologia molecular, pois atua no reconhecimento de criminosos a antigos cadáveres e, ainda, permite a identificação de graus de parentesco. A HIS é outra técnica associada à biologia molecular que se baseia na identificação de sequências específicas de nucleotídeos oriundos de DNA ou de RNA, os quais podem ser endógenos, virais ou bacterianos. Para a análise, podem ser utilizadas células ou tecidos emblocados em parafina, e são utilizadas sondas (sequências de DNA conhecidas, geralmente obtidas de forma comercial). Essa técnica está sendo empregada, com frequência, com base em sequências curtas de nucleotídeos marcados com moléculas sinalizadoras, e que os sítios de ligação podem ser localizados posteriormente por reações histoquímicas ou imuno- histoquímicas. A aplicação da HIS na área de doenças infecciosas tem sido mais utilizada na identificação de infecções virais, com a tipagem do HPV ou a detecção do vírus de Epstein-Barr. Essa mesma técnica, por meio de sondas específicas, também pode ser útil para a detecção de aneuploidias e de alterações gênicas com importância prognóstica em alguns tumores, como a leucemia linfoide crônica e o sarcoma de Ewing. Um ramo dessa técnica é a hibridização in situ fluorescente (FISH , do inglês Fluorescence In Situ Hybridization), que constitui um dos mais modernos métodos de patologia molecular para detectar alterações genéticas em associação com a morfologia celular, tais como amplificações, fusões e translocações, as quais podem ser importantes para o diagnóstico, prognóstico e orientação terapêutica de um grande número de tumores. Essa técnica emprega sondas marcadas com moléculas fluorescentes (fluorocromos), o que a diferencia de uma HIS convencional. O interessante é que pode ser utilizado mais de um fluorocromo na mesma amostra, permitindo múltiplas identificações de alterações genéticas (MCNICOL; FRAQUHARSON, 1997). A técnica de FISH apresenta uma grande variedade de aplicações dentro de diferentes áreas de investigação, incluindomapeamento 72 genético, biologia evolutiva, ecologia microbiana e diagnóstico de doenças. No diagnóstico, ela pode ser empregada para detecção de microrganismos em ambientes complexos como microbiota intestinal, cavidade oral, infecções do trato respiratório, hemoculturas, simbioses e em estações de tratamento de água (NEVES; GUEDES, 2012). Outras técnicas da biologia molecular que também podem ser utilizadas para diagnóstico, embora com menor frequência, são as de Southern blot, Northern blot e Western blot. A primeira delas serve para verificar se uma determinada sequência de DNA está ou não presente em uma amostra de DNA analisada, e combina uma eletroforese em gel do DNA à transferência deste para uma membrana de hibridização com o auxílio de uma sonda marcada. Após a hibridização, a membrana é lavada para remover a sonda não ligada ao DNA e obtém-se uma imagem por autorradiografia ou autofluorescência. Já o Northern blot verifica se um determinado gene de um genoma é ou não transcrito em RNA e o quantifica. Há uma íntima relação de similaridade em relação ao Southern blot, porém, no segundo, em vez de DNA, a substância analisada por eletroforese com uma sonda hibridizadora é o RNA. Além disso, no Northern blot é usado formaldeído no gel de agarose, que funciona como um desnaturante. Apesar de essas técnicas poderem ser empregadas no diagnóstico de doenças infecciosas, elas são mais utilizadas em estudos genéticos para avaliação da expressão gênica (MOLINA; TOBO, 2004). O Western blot (por vezes chamado imunoblot de proteínas) é um método adicional que detecta proteínas em uma amostra. Essa amostra geralmente provém de um homogenato, produto da trituração de um tecido biológico para obtenção de células. Essa técnica também usa eletroforese em gel para separar as proteínas pela sua estrutura tridimensional ou proteínas desnaturadas pelo comprimento da sua cadeia polipeptídica, sendo posteriormente transferidas para membranas de nitrocelulose ou difluoreto de polivinilideno (PVDF). Uma vez na membrana, são usados anticorpos específicos para a proteína alvo como sonda. A técnica de Western blot propiciou uma redução significativa nas reações cruzadas que podiam ser encontradas em outras técnicas moleculares de diagnóstico. Esse método pode ser usado como teste de diagnóstico confirmatório de infecções virais pelo vírus T linfotrópico humano (HTLV), ou bacterianas, como a doença de Lyme. A denominação 73 dessa técnica é um trocadilho do nome Southern blot, que detecta DNA, enquanto o Northern blot detecta RNA (MOLINA; TOBO, 2004). Por último, os microarranjos (do inglês microarray) de DNA utilizam técnica mais similar ao processo de Northern blot, envolvendo o uso de pequenos suportes sólidos nos quais milhares de sondas estão imobilizadas ou ligadas de forma organizada em posições conhecidas. Essas sondas podem ser produtos de PCR ou oligonucletídeos e os alvos podem ser produtos de PCR, DNA genômico, RNA total, RNA amplificado, DNA complementar, DNA plasmidial ou, simplesmente, amostras clínicas. A vantagem dos microarranjos é que eles permitem a análise de uma grande quantidade de genes de forma simultânea. Os microarranjos de DNA podem ser aplicados na identificação de diversos microrganismos: vírus influenza e adenovírus, Entamoeba histolytica, E. dispar, Giardia lamblia e Cryptosporidium parvum. Além disso, essa tecnologia promete auxiliar de maneira significativa a detecção de genes de resistência antimicrobiana e resistência mutacional (CAVALCANTI; LORENA; GOMES, 2008). 10.3 Contribuições da biologia molecular no diagnóstico de doenças Os recentes avanços científicos e tecnológicos direcionados à identificação de diversas doenças promoveram um excepcional desenvolvimento no diagnóstico. Graças às técnicas de biologia molecular, esse progresso tem sido alcançado. As metodologias moleculares têm a vantagem de serem altamente sensíveis, específicas e confiáveis. Além disso, a concentração do agente não precisa ser alta, ou seja, a partir de quantidades extremamente baixas de DNA ou RNA, é possível quantificá-los, com a geração de resultados reprodutíveis. Ademais, é permitida uma versatilidade das amostras (sangue periférico, liquor, medula óssea, tecidos parafinados ou frescos). Em relação às doenças infecciosas, uma das grandes vantagens das técnicas moleculares de diagnóstico em comparação às demais utilizadas é a rapidez e a precisão dos resultados, que hoje podem ser obtidos em poucas horas e até em minutos. Comparado ao método tradicional de cultura de microrganismos, por exemplo, os testes moleculares permitiram um diagnóstico mais consistente em menor tempo, agilizando o plano de tratamento inicial e trazendo maiores 74 probabilidades de recuperação em tempo reduzido. Os testes moleculares também são muito mais acurados do que a antiga metodologia da microscopia óptica para detecção de parasitas, a qual pode ser muito subjetiva, uma vez que depende da capacitação adequada do microscopista. Porém, entre tantas vantagens, alguns dos problemas associados a esses testes diagnósticos estão a possibilidade de contaminação da amostra, presença de inibidores de reações, interferência na viabilidade da amostra (pela ação de RNAses, por exemplo), o alto custo e a padronização. Somado a esses fatores, essas técnicas requerem laboratórios especializados em biologia molecular com uma equipe técnica especializada (LANDSVERK; WONG, 2013; MOLINA; TOBO, 2004). A biologia molecular tem contribuído de forma substancial, nos últimos anos, na área de diagnóstico de doenças infecciosas. Essa evolução tem sido evidenciada nas análises de rotina laboratoriais, em que organismos difíceis de serem cultivados, por exemplo, se tornaram passíveis de análise. Para visualizar um exemplo prático vamos pensar em uma doença. A tuberculose, no Brasil, é um grave problema de saúde pública, que acomete milhares de indivíduos todos os anos, e coloca o país no ranking das maiores taxas dessa doença. A dificuldade de acesso ao diagnóstico rápido da tuberculose é um dos mais importantes obstáculos para controlar a doença. O diagnóstico e o tratamento geralmente se baseiam na baciloscopia, que oferece baixo custo e reduzido grau de infraestrutura, no entanto a acurácia do exame é baixa. Essa falta de sensibilidade no teste acaba por aumentar a mortalidade e a perpetuação da doença, pelo atraso no diagnóstico relacionado ao tempo de cultivo necessário para o crescimento do microrganismo em cultura. A biologia molecular tem possibilitado a utilização de novas tecnologias, como o Xpert MTB/RIF, teste molecular rápido realizado no sistema GeneXpert MTB/RIF, para a detecção do Mycobacterium tuberculosis (bacilo de Koch) e também da resistência à rifampicina (PINTO et al., 2017). Outro exemplo é o diagnóstico da doença de Chagas, que é um sério problema de saúde pública no País, e que utiliza métodos sorológicos de diagnóstico. Essas técnicas, que têm como base o uso de anticorpos específicos contra o Trypanosoma cruzi, apresentam resultados de baixa confiabilidade ou mesmo de falso positivos, por causa da reação cruzada com antígenos de outros microrganismos. O progresso da 75 biologia molecular vem proporcionando o aperfeiçoamento no diagnóstico dessa doença, por meio da utilização da q-PCR (MARQUES, 2016). Com os avanços da biologia molecular, também já existem testes que podem detectar o DNA do HPV em raspados ou em biópsias de lesões, além de definir com precisão quais os subtipos virais presentes em determinada paciente. Mais de 35 tipos de HPV infectam a região genital nos seres humanos e podem causar desde verrugas genitais ou condilomas até lesões displásicas de baixo e alto grau, das quais cerca de 20 estão associadas ao câncer de colo uterino. Os tipos de HPV podem ser separadosem vírus de baixo, intermediário ou alto risco, de acordo com o tipo de lesão a que estão mais associados. Cada tipo viral apresenta maior ou menor potencial oncogênico, e é encontrado com maior frequência em lesões benignas (vírus de baixo risco) ou em lesões neoplásicas (vírus de alto risco) (AYRES; SILVA, 2010). A genotipagem, assim como a tipagem das hepatites virais, são realizadas por meio da PCR. O PCR ainda constitui uma ferramenta alternativa crucial na resolução de diagnósticos difíceis, como por exemplo, na detecção da Chlamydia trachomatis. O cultivo dessa bactéria e seu diagnóstico sorológico não permite diferenciar a infecção aguda da infecção prévia, já solucionada. A clamídia está associada a casos de uretrites masculinas e femininas e cervicites nas mulheres. Uma potencial complicação dessa bactéria é a doença inflamatória pélvica, que pode levar à infertilidade. Outra contribuição significativa da biologia molecular é que ela tem possibilitado a maior compreensão do funcionamento normal de nossos genes e do processo de desenvolvimento de doenças, quando os genes sofrem alterações. Por meio de testes moleculares, é possível identificar a predisposição genética para doenças como a trombofilia, síndrome do X frágil (que leva a retardo mental) e a microdeleção do Y (associada à infertilidade) (MOLINA; TOBO, 2004). Outro exemplo interessante é o das distrofias musculares progressivas, grupo de doenças caracterizadas por uma degeneração progressiva e irreversível da musculatura esquelética, e que tem sido alvo de intensos estudos. Aumentar o nosso conhecimento nessa área pode ser extremamente importante para tratamentos futuros e têm se associado à nova vanguarda da farmacogenômica (ZATZ, 2002). 76 A farmacogenômica, também designada farmacogenética, é um ramo da farmacologia que estuda o efeito de variações genéticas sobre a resposta, a eficácia e o metabolismo de drogas. O diagnóstico molecular pode ajudar a guiar uma terapia apropriada por meio da identificação de alvos terapêuticos específicos de vários fármacos. A farmacogenômica tem se mostrado útil no tratamento de doenças oncológicas, hematológicas, cardiológicas, neurológicas e infecciosas. Provavelmente, exercerá um grande impacto sobre a prática da medicina clínica, ao determinar qual medicamento é mais eficaz e assim evitar efeitos colaterais graves. No caso da tuberculose, por exemplo, o antibiótico isoniazida pode causar sérios danos ao fígado e comprometer o tratamento em pacientes que têm variante lenta do gene NAT2 e metabolizam o medicamento de forma mais lenta. Portanto, o teste pode contribuir para melhorar a adesão ao tratamento e diminuir o risco da tuberculose resistente. Outros alvos atuais do estudo farmacogenético são pacientes em tratamento quimioterápico e pacientes com HIV, em uso de terapia antirretroviral (WÜNSCH FILHO; GATTÁS, 2001). Diversas doenças genéticas monogênicas também podem ser alvo de técnicas da biologia molecular que, inicialmente, identificam o gene afetado para depois determinar a mutação responsável pela doença. Seguem alguns genes já identificados e a doença e as funções associadas: gene CFTR (produção de muco e suco gástrico) — fibrose cística; gene fibrilina (formação de membranas elásticas —: síndrome de Marfan; gene destrona (permeabilidade celular das membranas da células musculares) — distrofia muscular de Duchenne. A tendência é que, cada vez mais, exames convencionais sejam substituídos pela ferramenta de diagnóstico molecular. Dadas as suas inúmeras vantagens em relação à rapidez, sensibilidade e especificidade; essa evolução deve ocorrer de maneira crescente em todos os ambientes clínicos. A biologia molecular revolucionou a ciência e a prática da medicina; porém a sua implementação em todos os contextos da rotina laboratorial, principalmente em relação a custo e a recursos humanos ainda constitui um desafio. No entanto, os diversos benefícios que essas técnicas proporcionam acabam por tornar o custo, ainda elevado, um viés de menor importância frente aos resultados relacionados à saúde humana. 77 Além disso, a demanda pela infraestrutura para instalação dessas técnicas tem sido cada vez menos exigente nos dias de hoje. A determinação de suscetibilidade genética para alguns tipos de câncer ou doenças cardiovasculares já tem se tornado realidade, além das doenças hereditárias. O aprimoramento constante de técnicas moleculares em doenças infecciosas tem permitido a redução da morbidade e da mortalidade e o melhor controle epidemiológico dessas doenças, sejam elas parasitárias, fúngicas, virais ou bacterianas (PIGNATARI, [201-?]) Fonte: https://www.cbnrecife.com/ 11 BIOLOGIA E EDUCAÇÃO O ensino de Biologia tem um importante papel no desenvolvimento das noções de ambiente, formações, relações existentes entre seres vivos e não vivos e, principalmente, no fomento às discussões que nos permitem entender o universo do ponto de vista das ciências que buscam sua validação no próprio objeto de estudo (BORBA, 2013). O profissional licenciado em Ciências Biológicas possui um amplo campo de trabalho. Diversas universidades mostram em seus currículos que esse profissional possui como foco principal à docência no ensino fundamental e médio, porém não descarta a possibilidade de atuar como pesquisador e autônomo. Como biólogo, você contará com diversas opções de trabalho: você pode trabalhar em instituições de ensino e pesquisa, com museus e coleções de animais e plantas, além de dar aula. Além disso, o profissional licenciado em Ciências Biológicas está habilitado a dar aula em cursos preparatórios para vestibular, cursos técnicos, 78 aulas particulares e aulas de ciências no ensino fundamental, que compreende as disciplinas de Biologia, Física e Química, unificadas, envolvendo uma gama de conteúdos a serem ministrados. O termo biologia deriva do grego bios, que significa vida, e logos, que significa estudo. Por isso, o biólogo é conhecido como aquele que estuda a vida, pois ele estuda e entende sobre toda a diversidade de seres vivos, em seus aspectos genéticos, evolucionistas, estruturais, fisiológicos, anatômicos, entre outros. Sendo a biologia a ciência que estuda os seres vivos, a relação entre eles e o meio ambiente, além dos processos e mecanismos que regulam a vida, tem-se nos profissionais formados nessa área o domínio do conhecimento nas questões que envolvem a natureza. O estudo das ciências biológicas deve possibilitar a compreensão de que a vida se organizou através do tempo, sob a ação de processos evolutivos, tendo como resultado uma diversidade de formas sobre as quais as pressões seletivas continuam atuando. Esses organismos, incluindo os seres humanos, não estão isolados; ao contrário, constituem sistemas que estabelecem complexas relações de interdependência. O entendimento dessas interações envolve a compreensão das condições físicas do meio, do modo de vida e da organização funcional interna próprios das diferentes espécies e sistemas biológicos. Além disso, devemos dedicar atenção especial às relações estabelecidas entre os seres humanos, dada a sua especificidade. Os conhecimentos biológicos não se dissociam dos sociais, políticos, econômicos e culturais. (BORBA, 2013). O biólogo licenciado é o profissional que é graduado em biologia na modalidade licenciatura, ou seja, é o profissional com formação voltada para o ensino da biologia. Apesar desse enfoque, o licenciado em biologia é um biólogo acima de tudo, e deve ser um profissional capaz de deter toda a informação a respeito dos seres vivos e suas relações. Mesmo não sendo preparado inicialmente para trabalhar em pesquisas ou no meio técnico, o licenciado é tão capaz quanto o bacharel de entender as áreas específicas da biologia, as quais são comuns em ambasas formações. A Figura abaixo ilustra algumas das diversas atividades do biólogo. O biólogo licenciado tem formação acadêmico-pedagógica para transmitir/ensinar a matéria de estudo da melhor forma possível aos alunos. É a arte da docência: ensinar e orientar. Além da transmissão do conteúdo (que, em ciências e biologia, tem temas bastante controversos), nos últimos anos, vem se agregando à 79 área a questão do meio ambiente e da sustentabilidade, reforçando o papel do professor de ciências e biologia na abordagem de temas sustentáveis, como o gerenciamento de resíduos, a otimização do uso da água, entre outros. O professor de ciências e biologia ganha, assim, mais espaço dentro das instituições de ensino na promoção de programas e projetos que visam um futuro mais sustentável para o planeta. Fonte: Macrovector/ShutterStock.com. A Biologia Celular ou Citologia, por exemplo, estudará os diferentes tipos de células e suas estruturas e funcionamento. Seguindo no estudo das células, a disciplina de Histologia trabalha com o conhecimento dos tecidos, ou seja, um conjunto de células iguais e com a mesma função. Assim, é possível aprender os diferentes tecidos que formam os diferentes órgãos do corpo. Há ainda a disciplina de Microbiologia, na qual estudam-se não apenas as células humanas, mas os demais microrganismos, como fungos, bactérias e vírus, por exemplo. É comum nessas disciplinas que as aulas aconteçam paralelamente a um laboratório e com o uso do microscópio, instrumento básico para a visualização de estruturas microscópicas. (BORBA, 2013) 80 11.1 A profissão de biólogo na área de ensino A caracterização da profissão de biólogo na área de ensino se dá pela atuação no magistério. Como já foi explicado na diferença entre bacharel e licenciado, esta opção de curso está voltada ao magistério e tem disciplinas de cunho pedagógico. Por isso, entre as opções da Biologia, o licenciado é o primeiro profissional que está apto a lecionar logo após a graduação. (BORBA, 2013). Com a graduação, o biólogo ganha licença para lecionar no ensino fundamental com o ensino de ciências. Essa disciplina inicia no fim dos anos iniciais e vai até o último ano dos anos finais. A área do ensino de ciências é muito abrangente, e o professor de ciências deve estar preparado para trabalhar com seus alunos todos os seres vivos de maneira mais superficial do que no ensino médio, assim como deve estender seus conhecimentos ao sistema solar, estrutura do planeta Terra e conceitos geográficos. O professor de ciências é um profissional exigido pelo grande conhecimento que deve apresentar sobre as mais diversas áreas das ciências naturais. A outra licença que o biólogo licenciado ganha logo após o término da graduação é para trabalhar no ensino médio. Nessa etapa dos estudos, a disciplina é chamada de Biologia, e o biólogo licenciado estará mais focado nos conteúdos específicos da área, como os seres vivos, suas estruturas e relações que permeiam a vida, e de maneira mais aprofundada e específica. Nessa etapa do ensino, as ciências da natureza já estão divididas com a Geografia, Física e Química, por exemplo, e o professor agora faz parte de uma equipe multidisciplinar das ciências da natureza. Nessas duas etapas do ensino, fundamental e médio, o professor biólogo também pode atuar em outras modalidades de ensino, como o ensino a distância (EAD), o ensino de jovens e adultos (EJA), além de outros cursos preparatórios para provas como o ENEM ou vestibulares. 11.2 O professor biólogo e a educação ambiental O biólogo licenciado é detentor do conhecimento biológico e dos processos naturais, atuando como professor nas escolas de todo o país. Esses profissionais têm importância ímpar e, atualmente, diante da necessidade de implementação urgente 81 da educação ambiental nas escolas, passaram a desempenhar um papel central nessas instituições. O biólogo licenciado passou a ser também um educador ambiental. Nesse sentido, temas transversais e muito discutidos dentro dos cursos de biologia hoje estão cada vez mais presentes nas escolas. Reciclagem e preservação da natureza, por exemplo, são conteúdos abordados já na Educação Infantil. Hoje já existem escolas infantis focadas na educação ambiental, assim como escolas de nível Fundamental e Médio com projetos e programas sustentáveis consolidados. Os exemplos são muitos, e certamente o biólogo licenciado, colocando em prática os conhecimentos técnicos adquiridos no curso de ciências biológicas, contribuirá primeiramente para a formação de cidadãos mais conscientes e, a seguir, para um desenvolvimento mais saudável da nossa sociedade. A educação ambiental, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (BRASIL, 2012, art. 2°): [...] é uma dimensão da educação, é atividade intencional da prática social, que deve imprimir ao desenvolvimento individual um caráter social em sua relação com a natureza e com os outros seres humanos, visando potencializar essa atividade humana com a finalidade de torná-la plena de prática social e de ética ambiental. A educação ambiental já é uma realidade. O estado do Paraná, por exemplo, tornou obrigatória a educação ambiental nos currículos de todas as escolas a partir de 2014. Em 2017, ocorreu a capacitação de professores e técnicos pedagógicos de Núcleos Regionais de Educação, com foco na preservação e proteção dos recursos hídricos. Acesse o link e descubra mais detalhes sobre o processo de capacitação e formação de educadores ambientais (AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DO PARANÁ, 2017). 11.3 Projetos de conscientização ambiental nas escolas Existem muitos grupos de biólogos que se dispõem a atuar fazendo projetos de educação ambiental nas escolas. Esses projetos têm o objetivo de contribuir ao ensino de ciências, trabalhando temas importantes como a sustentabilidade e outros que nem sempre são abordados de forma direta ou mais prática no conteúdo programático das escolas. Pela conscientização ambiental, alguns aspectos importantes podem ser trabalhados, como a questão dos resíduos, assim como é possível contribuir para uma sociedade ambientalmente mais saudável por meio de boas práticas que levem a uma 82 melhor qualidade de vida. Assim, biólogos autônomos podem entrar no mercado pela prestação desse tipo de serviços nas escolas ou fora delas, fazendo parcerias com instituições de ensino, para que o conhecimento não se resuma apenas à sala de aula, mas para que os alunos possam colocar em prática seu aprendizado. Muitas podem ser as abordagens, como a questão das hortas urbanas e permacultura, capacitando esses alunos ao plantio de alimentos orgânicos e mais saudáveis. Por meio de um projeto de reciclagem de materiais utilizados pelos próprios alunos em suas casas ou mesmo na escola, de compostagem dos resíduos da sua hortinha comunitária na escola ou dos resíduos na casa do aluno, faz-se com que ele seja, ainda, autor de conscientização, estimulando-o a agir na sensibilização da família. 11.4 A docência no ensino básico O ensino básico é composto pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, e o biólogo licenciado pode atuar em qualquer um desses níveis de ensino. Com os Parâmetros Curriculares Nacionais, o profissional dessa área deverá ter a competência de lecionar conteúdos de Biologia aliada a temas transversais importantes para o desenvolvimento do cidadão. Na educação contemporânea, o ensino de Ciências Naturais é uma das áreas em que se pode reconstruir a relação ser humano/natureza em outros termos, contribuindo para o desenvolvimento de uma consciência social e planetária (BRASIL, 1998). O professor de ciências deve estar habilitado para atuar nas áreas de Física, Química e Biologia e desenvolver os seguintes conteúdos ao longo do ensinofundamental, conforme o MEC: “Ambiente”; “Ser humano e saúde”; “Recursos tecnológicos”; “Terra e Universo”. As aulas de ciências devem ser participativas, e o profissional deve incentivar a problematização de assuntos envolvendo o ambiente e as relações do ser humano com esse ambiente. Existem várias modalidades didáticas, tais como: aulas expositivas, em que o professor se torna um transmissor de conhecimentos; discussões, em que a capacidade de debate e o conhecimento são ampliados; aulas práticas, que são para todas as idades e permitem ao aluno ver os mecanismos funcionando; excursões, simulações, instruções individualizadas e projetos, bem como variantes e complementos destes, como a utilização dos meios multissensoriais, das tecnologias educacionais e de recursos como os mapas conceituais (CONDE; 83 LIMA; BAY, 2014). As aulas também podem ser trabalhadas também por experimentos em laboratório que comprovem certos conceitos da Biologia, da Física e da Química. Na educação infantil, e nos primeiros ciclos do ensino fundamental, as crianças começam a desenvolver sua capacidade de entendimento sobre o ambiente e suas relações com a natureza, portanto é importante que as aulas possibilitem o contato com animais e plantas para que o aluno possa entender a importância de cada ser vivo (Figura 2). Nos últimos anos, a saída de campo foi uma das modalidades didáticas que começou a ganhar destaque nas aulas de ciências. Por ser realizada em ambientes naturais, essa atividade estimula a curiosidade dos alunos e proporciona uma aprendizagem mais significativa em virtude de o professor ter disponível diversos recursos naturais (OLIVEIRA; ANTUNES; SOARES, 2012). Essas saídas podem ser realizadas em todos os níveis do ensino, desde saídas com crianças para sítios eco pedagógicos até saídas com adolescentes para ambientes com trilhas extensas, cachoeiras, lugares de altitude etc. Fonte: Goodluz / Sutterstock.com Em educação, a utilização de um programa que estimula a atividade psicomotora, especialmente por meio do jogo, permite que o desempenho psicomotor da criança, enquanto joga, alcance níveis que só mesmo a motivação intrínseca consegue. Ao mesmo tempo, favorece a concentração, a atenção, o engajamento e a imaginação. Como consequência, a criança fica mais calma, relaxada e aprende a pensar, estimulando sua inteligência. Nesse contexto, precisamos elucidar os pontos 84 de contato com a realidade a fim de que o jogo seja significativo para a criança. Por meio da observação do desempenho das crianças com seus jogos, podemos avaliar o nível de seu desenvolvimento motor e cognitivo. No lúdico, manifestam-se suas potencialidades, e, ao observá-las, poderemos enriquecer sua aprendizagem, fornecendo, por meio dos jogos, os “nutrientes” para seu desenvolvimento, ou seja, brincando e jogando a criança terá oportunidade de desenvolver capacidades indispensáveis à sua futura formação e atuação profissional, tais como: atenção, afetividade, concentração e outras habilidades perceptuais psicomotoras (ALVES, 2010). Outro recurso muito poderoso é a utilização de filmes e documentários sobre Ciências e Biologia durante as aulas, pois existem no mercado diversos filmes didáticos que proporcionam material para discussões de conteúdos específicos. Existem filmes e documentários com assuntos diversos, tanto os didáticos quanto os filmes comerciais. Eles permitem tratar qualquer conteúdo por meio de um debate posterior. Essa metodologia de ensino possui muito impacto sobre os alunos, pois permite a reflexão sobre o ambiente, os problemas que o homem é capaz de gerar e de que forma ele pode ser afetado por todos esses problemas que ele mesmo causa. No ensino de ciências, os filmes apresentam um papel significativo na divulgação e disseminação de conceitos científicos sob os mais diversos enfoques, de forma multidisciplinar e contextualizada, pondo em circulação e aproximando conceitos sobre ciência ao cotidiano das pessoas (SOUZA; GUIMARÃES, 2013). As Orientações Curriculares para o ensino médio de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, em seu capítulo sobre Biologia, indicam o ensino por meio de projetos (CONDE; LIMA; BAY, 2014). Esses projetos, além de contribuir na aprendizagem dos conteúdos, também contribuem para a formação de hábitos, atitudes e pensamento crítico em relação a situações com as quais eles podem se deparar ao longo da vida. Os projetos são feitos em grupo, o que permite que os conceitos possam ser trocados entre o coletivo e discutidos, flexibilizando o pensamento e exercitando o trabalho em equipe e a autoconfiança. Ainda em relação ao ensino médio, o MEC destaca que, cotidianamente, a população — embora sujeita a toda sorte de propagandas e campanhas, e mesmo diante da variedade de informações e posicionamentos — sente-se pouco confiante para opinar sobre temas polêmicos e que podem interferir diretamente em suas condições de vida, como o uso 85 de transgênicos, a clonagem, a reprodução assistida, entre outros assuntos. A lista de exemplos é interminável, e vai desde problemas domésticos até aqueles que atingem toda a população. O ensino de Biologia deveria nortear o posicionamento do aluno frente a essas questões, além de outras, como as suas ações do dia a dia: os cuidados com corpo, com a alimentação, com a sexualidade etc. (BRASIL, 2006, p. 17). Além dos conteúdos de Biologia, Física e Química, o profissional deve estar preparado para trabalhar de forma intrínseca os temas transversais dispostos pelo MEC nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Os temas apresentados são: Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual e Temas Locais. A biologia celular é de fundamental importância para a compreensão dos processos biológicos básicos que participam da composição e do funcionamento dos seres vivos, mas seu ensino na escola costuma privilegiar a nomenclatura das estruturas e os fenômenos celulares no lugar dos seus significados e da contextualização deles. É necessária uma revisão no currículo nos cursos de licenciatura em Ciências Biológicas para que os conteúdos sejam abordados de forma mais integradora, associando teoria e prática, juntas e não com cargas horárias independentes. Também deve ser estimulada a busca por recursos e modalidades didáticas alternativas para que os futuros professores de Ciências e de Biologia pensem novas perspectivas de ensino de biologia celular, tornando sua prática pedagógica realmente mais efetiva. Fonte: https://www.labresearch.com.br/ 86 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA BÁSICA JUNQUEIRA, Luiz Carlos Uchoa. Biologia celular e molecular. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. 332p., il. (algumas col.), 28 cm. Inclui bibliografia e índice. DE ROBERTIS, E. M. F. Biologia celular e molecular. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. 14ed. KARP, G. Biologia celular e molecular.3ed. Barueri: Manole, 2005. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ALBERTS, B. et al. Biologia molecular da célula. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. CHANDAR, N.; VISELLI, S. Biologia celular e molecular ilustrada. Porto Alegre: Artmed, 2015. ILLUMINA. Introduction to SBS Technology. 2018. Disponível em: . Acesso em: 02 out. 2018. LODISH, H. et al. 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