RESENHA ARRIGHI, Giovanni O longo século XX São Paulo Editora UNESP, 1996

@import url(https://fonts.googleapis.com/css?family=Source+Sans+Pro:300,400,600,700); RESENHA: ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX. São Paulo: Editora UNESP, 1996.

Giovanni Arrighi, em sua memorável obra \u201cO longo século XX\u201d, separa o capítulo

\u201cAs três hegemonias do capitalismo histórico\u201d para tratar sobre temas relacionados ao poder

e liderança em nível mundial. Em primeiro momento, cabe perguntar-nos o que é hegemonia.

Para tal, Arrighi descreve hegemonia como a capacidade de um Estado possuir e praticar

liderança dentro de um grupo de Estados soberanos. Ou seja, é possuir o poder de comandar

países que também possuem poder. Além disso, a hegemonia pode ser conquistada

individualmente ou por um grupo de países, esse comando envolve o poder em nível de

riquezas em metais, tecnologia, forças armadas e intelectual.

Contudo, o objetivo do autor desde os primeiros parágrafos é entender a hegemonia

dentro do sistema capitalista. Para isso, o Arrighi afirma que o controle sobre os meios de

pagamento, mesmo que acompanhado por fraude, corrupção ou golpe é uma das formas de

exercer poder dentro do mundo do capital. Após a II Guerra Mundial as nações passaram a se

empenhar não mais na conquista por territórios, mas na luta pela construção de parques

industriais fortes e tecnologia avançada. Isto é, a produção capitalista acompanhada da

valorização cambial passa a ser um dos aspectos notórios dos países hegemônicos. Dessa

forma, as nações precisam se empenhar em construir uma base sólida tanto para acumulação

quanto para fortalecimento da moeda nacional.

Mas como uma nação conquista a hegemonia? Para Arrighi, as nações podem usar

diversos meios para tal conquista, meio corruptivos ou transparentes. Podem utilizar-se de

guerras diretas entre as nações ou guerras indiretas, como foi a Guerra Fria na década de

1960. Todavia, como afirma o autor, em geral, os países dominantes discursam que irão

atender ao interesse geral. Isto pode ser \u201cmais ou menos fraudulento\u201d como diz Arrighi. Isto

porque a nação ou grupo dominante pode respeitar as individualidades de cada nação ou

então pode utilizar a dominação para \u201catrair os demais para a sua via de desenvolvimento\u201d

(ARRIGHI, 1996). As duas alternativas relacionam-se com o próprio conceito de hegemonia,

a liderança. Um país pode liderar visando a maximização da sua própria satisfação, mesmo

que crie déficits para as outras nações.

Ademais, como salienta Arrighi, é incomum que um país se torne dominante sozinho.

Em linhas históricas, os países hegemônicos conquistaram tal pleito a partir de cooperações

interestatais. As cooperações interestatais são interessantes não apenas para o próprio Estado,

mas para a própria indústria capitalista inserida naquele país, as empresas transnacionais.

Além do mais, os conflitos armados impactam também os custos das empresas, acabando

com os seus lucros criando assim a competição interempresarial. Para Arrighi, tanto a

competição interestatal pelo poder quanto a competição interempresarial pela manutenção das

taxas de lucro, alteram as formas pelas quais a produção e o governo funcionam. Mas para

compreender essas modificações é preciso entender o que é Territorialismo e Capitalismo.

Os Estados territorialistas encaram a riqueza como um subproduto que é oriundo da

dominação territorial e populacional. Isto é, a dominação pode vir por meio de guerras para a

conquista de novos territórios. Já os Estados capitalistas expandem a sua dominação por meio

do controle de recursos naturais essenciais para o funcionamento geral, como o petróleo, e

esse controle é uma forma de aumentar o seu processo de acumulação. Além disso, os países

capitalistas buscam possuir a moeda de referência, para tanto travam guerras cambiais para

poderem ser o emissor do principal meio de pagamento.

Sob essa perspectiva, o autor apresenta o caso da Grã-Bretanha cujo Estado

territorialista formou o Estado capitalista. Isso em decorrência das guerras territoriais que

formaram caminhos para que o país dominasse territórios estratégicos. Estes territórios

forneciam justamente recursos que contribuem para a dominação e formação do Estado

capitalista. Portanto, o Estado imperialista britânico influenciava a formação do Estado

territorialista, este por sua vez formava o Estado capitalista

Por outro lado, é interessante reservar um espaço para debater a formação hegemônica

dos Estados Unidos. Arrighi ao falar sobre o Estado capitalista nos Estados Unidos, tomou a

passagem de Max Weber o qual diz que o capitalismo se fazia presente no território antes

mesmo que a ordem capitalista se materializasse. Inicialmente, os Estados Unidos

preconizaram o modelo de Estado britânico buscando dominar os mais diversos territórios.

Mas após a I Guerra Mundial, o modelo de Estado britânico mostrou-se pouco eficaz. O

resultado da guerra, fez com o Estado capitalista conquistasse espaços, uma vez que não

bastava controlar territórios, era preciso controlar o comércio e as finanças a nível nacional e

internacional.

O pós I Guerra Mundial mudou as políticas comerciais do país, que passou a adotar

medidas protecionistas quanto à entrada de bens estrangeiros em seu território, mas deixou

livre o fluxo de capital e mão de obra. Nesse sentido, vale reiterar ainda que o argumento

supracitado sustenta por quais razões os Estados Unidos conquistaram a supremacia mundial

pós 1945. Dessa forma, formava-se a hegemonia norte-americana com fortes bases militares,

domínio sobre recursos e territórios estratégicos.

Conforme se lê em Arrighi, a hegemonia britânica não julgava os povos não

ocidentais como nações. O que fazia que o sistema interestatal fosse apenas entre os países

europeus, enquanto as outras nações eram tratadas apenas como possíveis territórios para

dominação. E esta foi uma das grandes mudanças feitas pela hegemonia estadunidense. O

sistema interestatal foi modificado resgatando os princípios do Sistema de Vestfália1

.

Reconhecer os territórios como nações foi positivo para a relação interestatal do país como

também foi importante para que estes países acreditassem que os Estados Unidos iriam

considerar os interesses gerais, portanto, iria trazer soluções para os demais problemas

vivenciados por cada país. Todavia, os Estados Unidos estavam preocupados com as relações

comerciais, não à toa o país amedrontado pela efervescência da União Soviética, impulsionou

o livre comércio. Assim, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) ficou sob

responsabilidade dos Estados Unidos, deixando o país controlar a direção do comércio

exterior. Foi pontualmente o GATT um dos principais instrumentos para a consolidação da

hegemonia norte-americana sobre a Europa e todo o resto do mundo.

Dessa forma, a acumulação capitalista fornece os meios necessários para a conquista

da supremacia mundial principalmente após as grandes guerras por conta da financeirização

mundial cujo mercado de ações ganha maior importância. Além de que ter a moeda de

referência significa ter o controle do principal meio de pagamento. E isso significa possuir

controle sobre as transações e comércio internacional. Não obstante, o sistema interestatal

capitalista é configurado estreitamente nas linhas das relações comerciais internacionais. Isto

é, torna-se interessante estabelecer relações diversas principalmente no contexto das cadeias

globais de valor e dos investimentos diretos estrangeiros, pois atrai um fluxo contínuo de

investimentos para o território.

Assim, possuir recursos finitos como o petróleo, a água potável e alguns minerais se

torna muito mais valioso do que possuir apenas territórios, uma vez que ocupar territórios

inférteis e ociosos não contribui para com o desenvolvimento da nação. Já os fluxos de

1 O sistema encerrava a Guerra dos Trinta Anos e reconhecia as Províncias Unidas e a Confederação da Suíça.

produtos, serviços e finanças provocam a acumulação capitalista. Nesse contexto, de

financeirização ter o câmbio competitivo insere o país na ordem capitalista internacional,

bem como atrai investimentos e mão de obra.

RESENHA ARRIGHI, Giovanni O longo século XX São Paulo Editora UNESP, 1996

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