Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Transtornos de ansiedade e transtornos de sintomas somáticos Prof.ª Lais Sette Galinari Descrição Descrição e critérios diagnósticos dos transtornos de ansiedade, transtornos de ansiedade induzidos por substância ou outra condição médica e transtornos somáticos. Propósito Os transtornos relacionados à ansiedade estão cada vez mais frequentes em nossa sociedade. Desse modo, é importante que o profissional conheça os critérios diagnósticos para avaliar os diferentes transtornos de modo a identificá-los em sua prática clínica. Objetivos Módulo 1 Ansiedade de separação, pânico e agorafobia Identificar os transtornos de ansiedade de separação, pânico e agorafobia. Módulo 2 Mutismo seletivo, fobia social, outras fobias e TAG Identificar os transtornos mutismo seletivo, fobia social, outras fobias e transtorno de ansiedade generalizada. Módulo 3 Outros transtornos de ansiedade Identificar as peculiaridades de transtornos de ansiedade induzidos por substâncias ou outra condição médica. Módulo 4 Transtornos de sintomas somáticos e seus subtipos Reconhecer as características principais dos transtornos somáticos. Introdução A queixa de ansiedade é uma demanda que recorrentemente aparece no cotidiano das pessoas e nos consultórios. Um ritmo acelerado de vida, uma alta pressão para performance e dificuldades para manejar adversidades, entre outros fatores, fazem as pessoas se sentirem apreensivas e frequentemente levam a queixas por se sentirem ansiosas. Devemos considerar que a resposta de ansiedade diante de eventos da vida é uma resposta natural e com uma importância evolutiva. Assim, devemos nos perguntar: a partir de que ponto a ansiedade pode ser considerada uma demanda clínica e se enquadrar dentro de uma psicopatologia? Neste conteúdo, discutiremos as principais características e critérios relacionados aos transtornos de ansiedade e transtornos somáticos. Tal compreensão é fundamental para a identificação de pessoas com demandas clínicas em relação à psicopatologia e para a definição de possibilidades interventivas que auxiliem os indivíduos dentro de suas necessidades. 1 - Ansiedade de separação, pânico e agorafobia Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car os transtornos de ansiedade de separação, pânico e agorafobia. O que são transtornos de ansiedade? Existem diferentes subtipos de transtornos de ansiedade, com características e sintomas distintos, mas esses diferentes subtipos também apresentam alguns pontos em comum. Podemos ver a seguir as características compartilhadas dos transtornos de ansiedade: Medo e ansiedade excessivos Perturbações comportamentais relacionadas O medo e a ansiedade são considerados adaptativos quando apresentados em certos níveis em determinadas situações. Por exemplo, é protetivo que experenciemos o medo em situações de risco iminente para nossa vida, assim como é protetivo sentir algum nível de ansiedade em situações nas quais precisamos nos preparar para algum momento importante das nossas vidas. Entretanto, o medo e a ansiedade que vivenciamos de forma adaptativa em nosso cotidiano são muito diferentes dos quadros que caracterizam os transtornos de ansiedade. Para ser considerado um transtorno, essas respostas ocorrem de maneira excessiva e/ou persistem para além de períodos apropriados, prejudicando a qualidade de vida do indivíduo. Assim, os transtornos de ansiedade se diferenciam dos sentimentos de medo e ansiedade provisórios, que fazem parte da vida e que são associados a eventos estressores pontuais, por serem persistentes (em geral durando cerca de seis meses ou mais no caso de adultos) e mais intensos. Atenção! Os transtornos de ansiedade que serão apresentados a seguir são diagnosticados somente em situações em que os sintomas identificados não são consequência de uso de substâncias, medicamentos, outra condição médica ou não podem ser melhor explicados por outro transtorno mental. Por causa disso, um diagnóstico diferencial que considere diferentes hipóteses a serem avaliadas é essencial! Vejamos agora uma diferença marcante. É muito importante identificar os termos “medo” e “ansiedade”. Medo É a resposta emocional perante uma ameaça real próxima ou identificada. Ansiedade É a antecipação de uma ameaça futura, que não se encontra presente no momento atual. Assim, apesar de medo e ansiedade muitas vezes aparecerem sobrepostos, o medo é associado a pensamentos de perigo imediato, comportamento de fuga e ativação de sistemas de luta ou fuga do organismo, enquanto a ansiedade se associa à tensão muscular e à vigilância, em preparação para perigos futuros, e também a comportamentos de cautela e esquiva. Dessa forma, existem diferentes subtipos de transtornos de ansiedade. Esses subtipos se diferenciam pelos motivos, objetos e situações que induzem a resposta de medo, ansiedade, ideação cognitiva associada ou comportamento de esquiva. Assim, para a diferenciação entre os diversos subtipos, é necessária uma investigação detalhada acerca das situações temidas ou evitadas, bem como o conteúdo dos pensamentos e das crenças associados às respostas de medo e ansiedade. Transtorno de ansiedade de separação O transtorno de ansiedade de separação é mais comum em crianças. A principal característica do transtorno de ansiedade de separação é o medo ou ansiedade envolvendo a ocorrência da separação de casa ou de figuras próximas à criança (figuras de apego), sendo uma ansiedade que excede o que seria esperado para a faixa etária do indivíduo. Períodos de maior intensidade de ansiedade de separação de figuras de apego são comuns e esperados em bebês pequenos, com cerca de 1 ano de idade. Já o transtorno de ansiedade de separação ocorre em crianças acima dessa idade, em qualquer momento da infância e de forma menos comum na adolescência. Raramente o transtorno de ansiedade de separação persiste para além da adolescência, ou seja, para a vida adulta. No caso de crianças, é comum a comorbidade do transtorno de ansiedade de separação com o transtorno de ansiedade generalizada e de fobia específica. As pessoas que apresentam transtorno de ansiedade de separação podem ter prejuízos, uma vez que podem limitar as atividades que realizam de forma independente, longe de sua casa e das figuras de apego. Exemplo Em casos de crianças, elas podem evitar ir à escola, passar tempo com os amigos, dormir sozinhas. Em casos de adolescentes, eles podem evitar viagens, trabalhos e saída de casa para morar longe dos pais e estudar em uma universidade. Critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade de separação Em termos de critérios diagnósticos, temos principalmente para esse transtorno a presença de medo ou de ansiedade que são considerados demasiados ou impróprios, tendo em vista a fase de vida em que a pessoa se encontra, envolvendo a separação daquelas pessoas pelas quais o indivíduo apresenta afeto e apego. Segundo o DSM-V, essa situação deve ser evidenciada em pelo menos um dos aspectos a seguir: Sofrimento demasiado e frequente quando o indivíduo se afasta de sua residência ou das pessoas a quem possui apego ou quando o indivíduo prevê que essa situação pode vir a ocorrer. Preocupação demasiada e frequente, que persiste ao longo do cotidiano, sobre possibilidades de perda ou de perigos daqueles indivíduos aos quais a pessoa é apegada, temendo catástrofes, situações de saúde, desastres ou morte. Resistência a sair de casa e ir a outros lugares, como escola e trabalho, por causa do medo de se separar das figuras de apego. Medo frequente e excessivo ou resistência em ficar sozinho ou sem as pessoas pelas quais o indivíduo tem apego. Resistência excessiva em passar a noite longe de casa ou sem estar próximo a uma figura importante de apego. Pesadelos repetidos envolvendo o tema da separação. Presença com frequência de queixas de sintomas físicos somáticos (p.ex., dores de cabeça, dores abdominais ou vômitos) quando acontece a separação de figuras de apego ouquando o indivíduo antecipa essa separação. SM-V Diagnostic and statistical manual of mental disorders. Em português, Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Deve-se considerar também que o medo, a ansiedade ou a esquiva precisa ser frequente e com uma duração importante, durando pelo menos quatro semanas em crianças e adolescentes e geralmente seis meses ou mais em adultos. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, acadêmico, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Além disso, o sofrimento e as dificuldades não são explicados por outro diagnóstico. Assim, devemos diferenciar pessoas com transtorno de ansiedade de separação de, por exemplo, indivíduos que se recusam a sair de casa devido à resistência excessiva comum em quadros de transtorno do espectro autista, delírios ou alucinações — sintomas comuns em casos de transtornos psicóticos —, agorafobia e transtorno de ansiedade generalizada (não restrito às figuras de apego). Transtorno de pânico O transtorno de pânico é o diagnóstico dado a pessoas que apresentam ataques de pânico inesperados de maneira recorrente. O ataque de pânico é um surto abrupto de medo ou de desconforto intenso no qual ocorrem quatro ou mais sintomas apresentados nos critérios diagnósticos. Devemos considerar que a gravidade e a frequência de ocorrência de ataques de pânico podem variar de maneira considerável para cada indivíduo. Algumas pessoas apresentam com maior frequência, por exemplo, diariamente ou semanalmente, enquanto outras apresentam com menor frequência, por exemplo, mensalmente ou em anos espaçados. É muito frequente a comorbidade do transtorno de pânico com outros transtornos de ansiedade. Muitas vezes o ataque de pânico é acompanhado de preocupações físicas, como a preocupação de que a presença de um determinado sintoma como a taquicardia pode representar uma ameaça à vida da pessoa, e não uma situação de ansiedade intensa. Critérios diagnósticos do transtorno de pânico Em termos dos principais critérios diagnósticos, temos para esse transtorno a ocorrência frequente e inesperada de ataques de pânico. De�nimos um ataque de pânico como um surto abrupto de medo intenso ou desconforto intenso. Esse ataque geralmente alcança um pico dentro de alguns minutos após o seu início e apresenta pelo menos quatro dos seguintes sintomas: Tremores Palpitações Taquicardia Sudorese Sensação de as�xia ou de falta de ar Dor ou desconforto intenso Sensações de náusea ou de tontura/vertigem Sensações de formigamento Ondas de calor ou calafrios Sensações de irrealidade ou de estar se distanciando de si Medo de morrer Devemos considerar que esses sintomas não podem ser causados por efeitos de substâncias psicoativas como drogas e medicamentos ou por outra condição de saúde. Além disso, esses sintomas não podem ser melhor explicados por outro transtorno mental. Por exemplo, os ataques de pânico não ocorrem apenas diante de situações sociais ou estímulos específicos, em resposta à lembrança de situações traumáticas, como no transtorno de estresse pós-traumático, ou em resposta à separação de figuras de apego, como no transtorno de ansiedade de separação. Agorafobia A agorafobia se caracteriza pelo medo ou ansiedade acentuados que são desencadeados pela exposição a determinadas situações. A exposição à situação que desencadeia a reação de medo/ansiedade pode ser real, quando o indivíduo está no local que funciona como gatilho, ou imaginária, quando o indivíduo imagina que está no local ou pensa sobre a situação que gera a resposta de ansiedade. O medo, a ansiedade e a esquiva da situação devem ser desproporcionais ao perigo real apresentado pela situação que desencadeia a reação. A intensidade da reação de medo/ansiedade pode variar, a depender da proximidade da situação que é temida. Por exemplo, a reação pode ser mais intensa em contextos em que a pessoa está concretamente na situação do que quando ela imagina estar na situação. O diagnóstico prevê que os sintomas ocorram em situações como uso de transporte público, permanência em locais abertos, em locais fechados, em meio a uma multidão ou sair de casa sozinho. Assim, a agorafobia associa-se a um prejuízo considerável em termos da funcionalidade e da capacidade de desempenhar tarefas, uma vez que o indivíduo busca se esquivar de situações potencialmente eliciadoras das respostas de medo e ansiedade. Critérios diagnósticos da agorafobia Medo de perder o controle Em termos de principais critérios diagnósticos para esse transtorno, temos a ocorrência da resposta de medo ou ansiedade intensos e que geram prejuízos clínicos na vida do indivíduo em pelo menos duas das seguintes situações: Utilização de meios de transporte público Ficar em locais abertos Manter-se em ambientes fechados Permanecer em meio a uma multidão Sair de casa sozinho O indivíduo com esse transtorno evita de maneira ativa essas situações devido a pensamentos catastróficos no sentido de não ter apoio disponível no caso de desenvolver sintomas do tipo pânico ou outros sintomas incapacitantes ou constrangedores. Tais situações quase sempre ou sempre vão provocar as respostas de medo ou ansiedade, não ocorrendo apenas ocasionalmente. Além disso, essas respostas de medo e de ansiedade são desproporcionais aos perigos iminentes apresentados e considerando o contexto sociocultural do indivíduo. As respostas são persistentes, durando mais de seis meses. Além disso, os sintomas não são melhor explicados por outros transtornos mentais, como sintomas que não são relacionados apenas à fobia específica e não estão relacionados exclusivamente a obsessões (como no transtorno obsessivo-compulsivo). Os incômodos não se relacionam à percepção que o indivíduo possa ter de falhas ou defeitos de sua aparência física e preocupação com isso (como no transtorno dismórfico corporal) ou medo de separação (como no transtorno de ansiedade de separação). A agorafobia: critérios diagnósticos, diagnóstico diferencial e limitações Confira os critérios diagnósticos, o diagnóstico diferencial e limitações da agorafobia e a comparação com o transtorno de pânico. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 Sobre os transtornos de ansiedade, analise as assertivas. I. Os transtornos de ansiedade diferem entre si nos tipos de objetos e situações que induzem medo, ansiedade ou comportamento de esquiva e na ideação cognitiva associada. II. Embora os transtornos de ansiedade tendam a ser altamente comórbidos entre si, podem ser diferenciados pelo exame detalhado dos tipos de situações que são temidos ou evitados e pelo conteúdo dos pensamentos ou crenças associadas. III. Os transtornos de ansiedade se distinguem do medo ou ansiedade adaptativa por serem excessivos ou persistirem além de períodos apropriados ao nível de desenvolvimento. IV. Cada transtorno de ansiedade é diagnosticado somente quando os sintomas não são consequência dos efeitos fisiológicos do uso de uma substância/medicamento ou de outra condição médica, ou quando não são melhor explicados por outro transtorno mental. Está correto o que se afirma em Parabéns! A alternativa E está correta. As alternativas descrevem as condições diagnósticas que são apresentadas no DSM-V. Os sintomas que caracterizam o medo e a ansiedade patológicos diferem das sensações que experimentamos diariamente na nossa vida, pois não são desencadeados pontualmente por eventos estressores. Nos casos diagnosticados de transtornos de ansiedade, todas as respostas e reações são excessivas e/ou persistem por muito tempo (cerca de seis meses ou mais), prejudicando a qualidade de vida do indivíduo. Questão 2 Observe a seguinte descrição: medo ou ansiedade acentuados ou intensos desencadeados pela exposição real ou prevista a diversas situações. O diagnóstico requer que os sintomas ocorram em pelo menos duasdas cinco situações seguintes: 1) usar transporte público, como automóveis, ônibus, trens, navios ou aviões; 2) permanecer em espaços abertos, como áreas de estacionamento, mercados ou pontes; 3) permanecer em locais fechados, como lojas, teatros ou cinemas; 4) permanecer em uma fila ou ficar em meio a uma multidão; ou 5) sair de casa sozinho (DSM-5). Qual é o transtorno que explica a descrição apresentada? A I, II e III. B I, III e IV. C II e IV. D I e III. E I, II, III e IV. Parabéns! A alternativa A está correta. A principal característica do transtorno de agorafobia é a resposta de medo ou de ansiedade diante de situação em que o indivíduo precisa se expor a determinados locais (que podem ser abertos, fechados, transportes públicos, entre outros). A Agorafobia B Transtorno de ansiedade social C Transtorno de pânico D Transtorno de ansiedade generalizada E Transtorno de ansiedade de separação 2 - Mutismo seletivo, fobia social, outras fobias e TAG Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car os transtornos mutismo seletivo, fobia social, outras fobias e transtorno de ansiedade generalizada. Mutismo seletivo Dando continuidade à discussão acerca dos transtornos de ansiedade, apresentaremos outros transtornos que se enquadram dentro da classe diagnóstica dos transtornos de ansiedade. Confira a seguir: A principal característica de pessoas com mutismo seletivo é a não iniciação de conversas ou a não resposta quando lhe dirigem a palavra, acompanhada de uma intensa ansiedade social. Esse fracasso na interação social pode acontecer tanto em crianças quanto em adultos. É importante destacar que pessoas com mutismo seletivo poderão falar na presença de pessoas específicas, como membros de sua família mais próxima. Mutismo seletivo Fobia social Outras fobias Ansiedade generalizada O mutismo seletivo resulta em um grande prejuízo e isolamento social, o que pode gerar também um prejuízo acadêmico, uma vez que crianças com mutismo seletivo não interagirão no ambiente escolar e deixarão de comunicar aos professores suas dúvidas e necessidades. Além disso, é comum a comorbidade com outros transtornos de ansiedade, em específico, com o transtorno de ansiedade social. Critérios diagnósticos do mutismo seletivo Temos como principal critério diagnóstico a falha frequente e persistente para falar em situações sociais específicas nas quais se espera que as pessoas se expressem, como apresentações escolares e no trabalho. Essas perturbações geram prejuízos para o indivíduo, inclusive de aquisições acadêmicas, na comunicação com pessoas próximas e na realização profissional. A duração mínima da perturbação é um mês (excetuando o primeiro mês de escola). Além disso, esses sintomas não podem ser melhor explicados por outras dificuldades na comunicação, como aquelas devidas aos seguintes transtornos: Transtorno de espectro autista. Transtorno psicótico. Esquizofrenia. Transtorno da fluência com início na infância. Fobia especí�ca A principal característica desse transtorno é que a resposta de medo e de ansiedade está restrita a uma situação ou objeto específico, denominado estímulo fóbico. Para realização do diagnóstico, a resposta apresentada deve ser diferente (em intensidade e frequência) dos medos normais que são transitórios e que comumente as pessoas experienciam, além de desproporcional ao perigo real. Em adição, a fobia deve causar sofrimento clinicamente significativo e/ou prejuízo no funcionamento social do indivíduo. Critérios diagnósticos da fobia especí�ca Como critérios diagnósticos principais para esse transtorno, temos a resposta intensa de medo ou ansiedade em relação a um objeto específico ou a uma situação, como voar, alturas, animais específicos como aranhas etc. Vejamos a seguir um pouco mais sobre o diagnóstico. Nessas situações, o foco do medo/ansiedade provoca uma resposta imediata, sendo ativamente evitado ou suportado com intensa ansiedade ou sofrimento e gerando um sofrimento clinicamente significativo. Deve-se considerar também que os sentimentos precisam ser desproporcionais à ameaça real que o objeto oferece e à realidade sociocultural do indivíduo, além de possuir duração mínima de seis meses. Ainda, o sintoma não é melhor explicado por sintomas de outros transtornos, como transtorno de pânico, agorafobia, obsessões e evocação de eventos traumáticos (como no transtorno de estresse pós- traumático). Transtorno de ansiedade social (fobia social) A principal característica do transtorno de ansiedade social é o medo ou a ansiedade intensa ou acentuada quando o indivíduo se encontra em uma situação social na qual ele identifica que pode ser avaliado pelos outros. A preocupação central da pessoa com transtorno de ansiedade social é de que será julgada pelas pessoas de forma negativa. O transtorno de ansiedade social pode gerar muitos prejuízos para o indivíduo, como as seguintes: Dificuldades no ambiente escolar e evasão escolar. Dificuldades no ambiente de trabalho. Prejuízos em seu bem-estar. Dificuldades em estabelecer relações significativas. Atenção! A timidez é um traço de personalidade e uma característica individual e, por causa disso, não pode ser confundida com ansiedade social! Deve ser avaliado se há um impacto importante no funcionamento do indivíduo, gerando sofrimento no âmbito social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo, bem como a atenção aos critérios diagnósticos. Critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade social Esse transtorno tem como critério diagnóstico medo ou ansiedade acentuada em relação a uma ou mais situações sociais em que o indivíduo é exposto a uma possível avaliação por outras pessoas. Confira a seguir alguns exemplos: Interações sociais Manter uma conversa, encontrar pessoas que não são familiares. Ser observado C d b b d Nesses casos, o indivíduo teme agir de forma a demonstrar sintomas de ansiedade que serão avaliados negativamente. Assim, o indivíduo se esquiva frequentemente dessas situações. Importante destacar que a resposta é incompatível com a ameaça real apresentada pela situação e seu contexto sociocultural. Além disso, as respostas de medo e ansiedade causam um sofrimento clinicamente significativo, com prejuízos nos âmbitos sociais, profissionais ou outras áreas importantes. Além disso, o medo, a ansiedade ou a esquiva não são melhor compreendidos pelos sintomas de outro transtorno mental, como transtorno de pânico, transtorno dismórfico corporal ou transtorno do espectro autista. Transtorno de ansiedade generalizada (TAG) O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) se caracteriza pela ocorrência de ansiedade e de preocupação excessiva perante diferentes atividades e acontecimentos. Nesse sentido, os indivíduos, de maneira geral, tendem a antecipar situações desastrosas e negativas em diferentes contextos. A preocupação e a reação de ansiedade devem ser desproporcionais à probabilidade real de ocorrência do evento que o indivíduo antecipa e/ou ao impacto negativo desse evento. Comendo ou bebendo. Situações de desempenho diante de outros Proferir palestras. É importante destacar que experenciar sentimentos de ansiedade é considerado normal e inclusive é algo esperado ao longo de nossas vidas. Porém, deve-se fazer a diferença entre a ansiedade não patológica e a ansiedade que configura o transtorno de ansiedade generalizada. As preocupações associadas ao transtorno de ansiedade generalizada são excessivas e interferem de forma significativa na vida do indivíduo, além de serem mais intensas, disseminadas, angustiantes e terem maior duração quando comparadas com um sentimento de ansiedade não patológico. Critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade generalizada Nesses casos, a ansiedade e a preocupação excessiva acontecem na maioria dos dias por pelo menos seis meses, com diversos eventos ou atividades (tais como interações sociais, relacionamentos, contextos acadêmicos ou profissional).De maneira geral, o indivíduo considera difícil controlar a preocupação, gerando sofrimento clínico importante e prejuízo em seu funcionamento. As perturbações não se devem a efeitos fisiológicos de medicamentos, substâncias ou a alguma condição médica específica Além disso, a ansiedade está associada a pelo menos três dos seguintes sintomas: 1. Inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele. 2. Fatigabilidade. 3. Dificuldade em se concentrar ou sensações de “branco” na mente. 4. Irritabilidade. 5. Tensão muscular. 6. Perturbação do sono (dificuldade em conciliar ou manter o sono, ou sono insatisfatório e inquieto). Além disso, os sintomas de ansiedade não podem ser melhor entendidos pelo diagnóstico de outro transtorno mental, como ansiedade ou preocupação devido à possibilidade de apresentar ataques de pânico, o que seria comum em casos de transtorno de pânico, e preocupação com a avaliação negativa de outros indivíduos, comum no caso de pessoas com transtorno de ansiedade social. Também não pode ser melhor explicado por diagnósticos de transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade de separação, transtorno de estresse pós-traumático ou por ganho de peso na anorexia nervosa. O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) Entenda os critérios diagnósticos, o diagnóstico diferencial e as consequências do transtorno de ansiedade generalizada. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 A fobia social é um transtorno que pode trazer muitos prejuízos para o indivíduo por causa de suas características sintomatológicas. No que diz respeito aos sentimentos e ao comportamento, entende- se como sintoma e sinal de fobia social A o medo de situações em que você pode ser julgado, bem como o medo de interagir com pessoas desconhecidas e de demonstrar sua ansiedade e apreensão em eventos sociais. B a despreocupação com o outro e com a possibilidade de passar por situações constrangedoras ou humilhantes ou, ainda, com a possibilidade de ofender alguém. C a evitação de contato com o objetivo fóbico específico, como transporte público, aranhas, lugares abertos. Parabéns! A alternativa A está correta. A fobia social se relaciona com o medo de situações de interação social e com a apreensão em eventos sociais. Questão 2 O transtorno de ansiedade generalizada deve ter sintomas primários de ansiedade na maioria dos dias por, pelo menos, várias semanas e usualmente por vários meses. Pacientes com esses transtornos apresentam os seguintes sinais e sintomas: D ter uma imagem corporal muito distorcida, assim como ser muito focada no peso ou na forma corporal e se recusar a admitir a gravidade da perda de peso. E a preocupação frequente com todos os aspectos de sua vida de maneira generalizada, com duração superior a seis meses. A Apreensão constante, tensão motora, pensamentos catastróficos e hiperatividade autonômica. B Ataques recorrentes de ansiedade grave (pânico), medo de morrer, perder o controle ou ficar louco. C Medo de espaços abertos e presença de multidões. D Pensamentos obsessivos ou atos compulsivos recorrentes. E Preocupação frequente com o seu peso corporal e com alimentação. Parabéns! A alternativa A está correta. O transtorno de ansiedade generalizada se relaciona com o sentimento de apreensão constante e tensão em diferentes contextos da vida do indivíduo. 3 - Outros transtornos de ansiedade Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car as peculiaridades de transtornos de ansiedade induzidos por substâncias ou outra condição médica. Transtorno induzido por substância ou condição médica Além dos transtornos de ansiedade como um quadro clínico primário, é possível a identificação de uma resposta de ansiedade por causa de um contexto e de características/condições do indivíduo que são anteriores à manifestação do transtorno de ansiedade. Em outras palavras, em algumas situações, certos fatores precedem (e causam) o transtorno de ansiedade. Por mais que os sintomas de ansiedade sejam similares em termos de diagnóstico e de tratamento, é importante a identificação cuidadosa das causas do transtorno de ansiedade, uma vez que, em casos de transtornos de ansiedade induzidos por outros fatores, a consideração desses fatores e seu tratamento no atendimento clínico é fundamental tendo em vista a diminuição dos sintomas. Assim, em termos do diagnóstico diferencial, é fundamental a contraposição e a avaliação de hipóteses diagnósticas que considerem tanto a possibilidade de um transtorno de ansiedade quanto um transtorno de ansiedade que é induzido por um quadro anterior. Existem dois tipos de transtornos de ansiedade que são induzidos, confira: Transtorno de ansiedade induzido por substância e/ou medicamento. Transtorno de ansiedade induzido por outra condição médica. Em ambos os casos, o fator que induz a ansiedade precede a aparição dos sintomas de ansiedade, e os sintomas de ansiedade tendem a diminuir após o tratamento do quadro clínico primário. Transtorno de ansiedade induzido por substância/medicamento A principal característica de um transtorno de ansiedade induzido por substância ou medicamento é que o quadro de ansiedade ou de pânico bem como as respostas decorrentes desse quadro são consequência dos efeitos de uma substância utilizada pelo indivíduo. Isso ocorre quando, por exemplo, a ansiedade é desencadeada por uso de alguma droga de abuso, medicamento ou exposição a alguma toxina. Certas substâncias que podem causar esse tipo de transtorno são as anfetaminas, cocaína, heroína, maconha, LSD, álcool, doses concentradas de cafeína e diferentes medicamentos. Para esse transtorno ser considerado, os sintomas devem ocorrer durante ou logo após a intoxicação da substância ou durante o período de abstinência. Ou seja, quando há a privação do uso de determinada substância que o indivíduo estava anteriormente acostumado a consumir. Atenção! Em casos em que o indivíduo já apresentava sintomas de ansiedade e de pânico em momentos anteriores à administração do medicamento ou do uso da droga ou naqueles em que mantém os sintomas mesmo após um longo período após a abstinência (em geral, por mais de um mês), o diagnóstico de transtorno de ansiedade induzido por substância ou medicamento não pode ser dado! Se os sintomas de ansiedade persistem por períodos maiores, outras causas para esses sintomas devem ser investigadas. Confira a seguir os tipos de substâncias que podem desencadear um transtorno: Álcool, cafeína, Cannabis, fenciclidina, outros alucinógenos, inalantes e estimulantes (incluindo cocaína). Álcool, opioides, sedativos, hipnóticos, ansiolíticos e estimulantes (incluindo cocaína). Substâncias cuja intoxicação pode desencadear pânico ou ansiedade Substâncias cuja abstinência pode desencadear pânico ou ansiedade Anestésicos e analgésicos, simpatomiméticos ou outros broncodilatadores, anticolinérgicos, insulina, compostos para tireoide, contraceptivos orais, anti-histamínicos, medicamentos antiparkinsonianos, corticosteroides, medicamentos anti-hipertensivos e cardiovasculares, anticonvulsivantes, carbonato de lítio, medicamentos antipsicóticos e medicamentos antidepressivos. Inseticidas organofosforados, gases asfixiantes, monóxido de carbono, dióxido de carbono e substâncias voláteis, como gasolina e tinta. Devido às características do transtorno, exames laboratoriais como exames toxicológicos podem auxiliar o processo de diagnóstico, uma vez que permitem a mensuração do nível de intoxicação por determinada substância. Os critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade induzido por substância ou medicamento são: A. Ataques de pânico ou ansiedade proeminente que predominam no quadro clínico. B. Evidências, a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais, de (1) ou (2): Medicamentos que podem evocar sintomas de ansiedade Metais pesados ou toxinas que podem causar sintomas de ansiedade 1. Os sintomasno critério A se desenvolveram durante ou logo após a intoxicação ou abstinência de substância ou após exposição a um medicamento. 2. A substância/medicamento envolvida é capaz de produzir os sintomas no critério A. Em termos de diagnóstico diferencial, deve-se estar atento para os sintomas de ansiedade não serem melhor explicados devido à presença de um transtorno de ansiedade que não foi induzido pela substância/medicamento. Isso é possível observar em casos nos quais os sintomas de ansiedade já existiam em períodos anteriores à utilização da substância/medicamento e a não diminuição dos sintomas mesmo após a ausência do consumo e passado um possível período de abstinência. Transtorno de ansiedade devido a outra condição médica O transtorno de ansiedade devido a outra condição médica é diagnosticado em situações em que são detectados sintomas de ansiedade que são clinicamente significativos e que não são mais explicados pelo efeito de um medicamento ou por outros aspectos da vida do indivíduo. Assim, a ansiedade devido a outra condição médica é diagnosticada quando a condição médica induz a ansiedade e é anterior à presença de sintomas de ansiedade. Por causa disso, sua duração está condicionada à duração da doença primária, que é subjacente. É necessária uma investigação aprofundada e cuidadosa para a realização de um diagnóstico diferencial, com o objetivo de avaliar os fatores que podem estar relacionados com os sintomas de ansiedade. Assim, o primeiro passo em uma investigação criteriosa e abrangente dos possíveis fatores seria identificar se existe uma condição médica que explicaria a ansiedade, para, a partir disso, avaliar se existe uma associação temporal entre o início da condição médica e os sintomas de ansiedade, se há presença de aspectos atípicos para os demais transtornos de ansiedade (idade de início/curso do transtorno), bem como indicações de que o transtorno é melhor explicado pela condição médica do que por fatores ambientais e individuais da pessoa. Veja a seguir as condições médicas que podem incluir a ansiedade como um dos sintomas. Doenças endócrinas Hipertireoidismo, hipoglicemia e hipercortisolismo. Distúrbios cardiovasculares Insuficiência cardíaca congestiva, embolia pulmonar e arritmias. Doenças respiratórias Doença pulmonar obstrutiva crônica, asma e pneumonia. Doenças neurológicas Neoplasias, disfunção vestibular, encefalite e transtornos convulsivos. Os critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade devido a outra condição médica são: Ataques de pânico ou ansiedade predominantes no quadro clínico. Evidências, a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais, de que a perturbação é a consequência fisiopatológica direta de outra condição médica. Transtorno induzido por substância ou condição médica Confira este vídeo sobre os transtornos induzidos por substâncias ou devido a uma condição médica, em que se identifica a diferença entre transtorno primário e secundário e outros conceitos como toxicidade e abstinência. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 Em relação ao transtorno de ansiedade induzido por substância ou medicamento, considere as afirmativas. I. É recorrente a presença de ataques de pânico ou ansiedade proeminente que predominam no quadro clínico. II. Os sintomas de ansiedade se desenvolveram durante ou logo após a intoxicação ou abstinência de substância ou após exposição a um medicamento. III. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Está correto o que se afirma em A I apenas. B I, II e III. C III apenas. D I e III. Parabéns! A alternativa B está correta. As asserções apresentadas configuram os principais critérios diagnósticos de um transtorno de ansiedade induzido por substância ou medicamento. O que se observa principalmente nesses pacientes é que o pânico ou a ansiedade é proveniente do consumo de alguma droga, medicamento ou exposição a alguma toxina. Os sintomas geralmente ocorrem durante o uso da substância, gerando uma condição de intoxicação ou no pós imediato, no período da abstinência. Questão 2 Em relação ao transtorno de ansiedade induzido por uma condição médica, analise as afirmativas: I. Doenças endócrinas (como hipertireoidismo) e distúrbios cardiovasculares (como arritmia) podem incluir a ansiedade como um dos seus sintomas. II. Para realização do diagnóstico, a perturbação não pode ser melhor explicada por outro transtorno mental. III. Para realização do diagnóstico, é necessário existir evidências, a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais, de que a perturbação é a consequência fisiopatológica direta de outra condição médica. Está correto o que se afirma em E II e III. A I apenas. B I, II e IIl. C III apenas. D I e III. Parabéns! A alternativa B está correta. As asserções apresentadas configuram os principais critérios diagnósticos de um transtorno de ansiedade induzido por condição médica. Normalmente, os pacientes apresentam sintomas de ansiedade ou ataques de pânico que aparecem por causa da descoberta (comprovada clinicamente) de uma condição médica, incluindo diferentes doenças e alterações físicas. 4 - Transtornos de sintomas somáticos e seus subtipos Ao �nal deste módulo, você será capaz de reconhecer as características principais dos transtornos somáticos. Os transtornos de sintomas somáticos E II e III. Os transtornos de sintomas somáticos representam uma classe diagnóstica que tem como centralidade a presença de sintomas somáticos ou sintomas físicos, como dores, palpitações, entre outros. Esses sintomas são perturbadores para o indivíduo e se associam a pensamentos, sentimentos e comportamentos anormais. Esse quadro pode ser acompanhado inclusive pela ausência de uma explicação médica para esses sintomas, mas não necessariamente. Desse modo, a ênfase principal é na relação que é estabelecida pelo indivíduo com os sintomas em questão. Assim, o que se apresenta como principal característica de indivíduos com algum transtorno somático não diz respeito aos sintomas somáticos em si, mas a relação que o indivíduo estabelece com esses sintomas e a forma como o indivíduo interpreta a sua ocorrência. Atenção! Segundo o DSM-V, embora seja frequente a associação entre os sintomas somáticos e o sofrimento psicológico e a psicopatologia, alguns transtornos de sintomas somáticos e transtornos relacionados podem surgir de forma espontânea, sem a identificação dos fatores que causam o transtorno! Com isso, temos a integração de aspectos afetivos, cognitivos e comportamentais aos critérios diagnósticos, que compõem o transtorno, em conjunto com os sintomas somáticos propriamente ditos. É possível também a ocorrência de comorbidades, como, por exemplo, de um transtorno depressivo maior que se manifesta também com sintomas somáticos. Não podemos descartar que o transtorno depressivo seja o responsável pelos sintomas somáticos, mas também é possível que os dois transtornos coexistam, ocorrendo paralelamente para um momento na vida do indivíduo. Por isso, uma avaliação criteriosa e o diagnóstico diferencial colocam todos esses aspectos como centrais no processo diagnóstico e de compreensão do indivíduo. Transtornos de ansiedade e transtornos depressivos podem acompanhar os transtornos de sintomas somáticos. Nesses casos, os transtornos somáticos, quando em conjunto com transtornos de ansiedade e de depressão, acrescentam um maior nível de gravidade e de complexidade aos casos, resultando em maior sofrimento para o indivíduo, prejuízo em sua funcionalidade cotidiana e até mesmo dificuldade de adesão aos tratamentos tradicionais. Muitos fatores podem contribuir para o desenvolvimento de um transtorno de sintoma somático, veja a seguir: Vulnerabilidade genética e biológica. Experiências traumáticas precoces.Aprendizagem (como a atenção obtida por causa da doença e ausência de reforço de expressões não somáticas de sofrimento). Além disso, aspectos culturais e sociais que não propiciam o compartilhamento do sofrimento psicológico e a validação de emoções difíceis, como a tristeza, e que dão mais importância ao sofrimento físico podem ser uma condição propícia para indivíduos relatarem o sofrimento psíquico de forma indireta, por meio da descrição de sintomas físicos. É comum que o indivíduo com transtorno somático não reconheça o seu sofrimento mental e que, ao invés de procurar um serviço de saúde mental, busque um contexto clínico geral, pensando tratar-se de um aspecto de saúde física. Importante: até no DSM-IV o termo hipocondria era utilizado para se referir a pessoas com transtornos somáticos. Entretanto, esse termo deixou de ser utilizado no DSM-V por ser preconceituoso, estigmatizante e não considerar todos os aspectos do indivíduo. Assim, não é correto compreender que um indivíduo com transtornos somáticos “inventa” uma doença física, de forma manipulatória e relata sintomas que não existem (ou não têm uma base biológica), uma vez que essa descrição desconsidera a complexidade dos quadros, conforme serão apresentados nas seções seguintes. Principais características A principal característica de indivíduos que possuem transtorno de sintomas somáticos é a identificação pelo indivíduo de sintomas físicos que provocam sofrimento e perturbação da vida diária. Os sintomas somáticos podem ser específicos, como uma dor localizada em determinada região e também mais generalizados, como uma sensação de mal-estar geral ou fadiga. O início desse transtorno pode ocorrer após uma doença médica concomitante. Por exemplo, um indivíduo pode ter a sua funcionalidade reduzida devido a um transtorno de sintomas somáticos após a ocorrência de um infarto do miocárdio sem complicações, mesmo que o infarto em si não resulte em alguma incapacidade específica. Indivíduos com esse transtorno tendem a apresentar muitas preocupações em relação a doenças, avaliando sintomas corporais como demasiadamente ameaçadores, perigosos, nocivos ou problemáticos. É comum também que esses indivíduos pensem o pior da própria saúde e que as preocupações com a saúde e o medo de doenças assumam uma posição central na vida da pessoa. É recorrente também a procura frequente de serviços médicos que não resultam em uma diminuição da angústia sentida pela pessoa. Frequentemente, os sintomas somáticos não possuem uma explicação médica evidente, porém é importante ressaltar que o sofrimento do indivíduo é autêntico e não pode ser minimizado. O que ocorre é que, em alguns casos, o sofrimento não pode ser explicado em termos médicos. Critérios diagnósticos do transtorno de sintomas somáticos Como critérios diagnósticos principais para esse transtorno, temos a presença de um ou mais sintomas somáticos que causam sofrimento, incômodo ou geram perturbação significativa da vida diária, provocando prejuízos e perdas funcionais para o indivíduo. Além disso, é comum a ocorrência de pensamentos, sentimentos ou comportamentos excessivos relacionados aos sintomas somáticos ou associados a preocupações com a saúde manifestados por pelo menos um dos seguintes: Pensamentos desproporcionais e persistentes acerca da gravidade dos próprios sintomas. Nível de ansiedade persistentemente elevado acerca da saúde e dos sintomas. Tempo e energia excessivos dedicados a esses sintomas ou a preocupações a respeito da saúde. Os transtornos de sintomas somáticos Entenda as características, o desenvolvimento, o curso e o diagnóstico diferencial dos transtornos de sintomas somáticos. Transtorno de ansiedade de doença A característica principal para o diagnóstico de um transtorno de ansiedade de doença é a preocupação excessiva, que gera prejuízos na vida do indivíduo, em ter ou contrair uma doença grave. É importante destacar que, nesse caso, os sintomas somáticos não estão presentes, ou seja, o indivíduo não identifica a existência de mal-estar físico, mas sim apresenta medo de contrair uma determinada condição médica. Assim, o sofrimento do indivíduo nesses casos não é causado pela identificação de uma queixa física, mas pela sua ansiedade a respeito do que poderia acontecer caso contraísse determinada doença. Informações sobre doenças de terceiros e notícias na televisão sobre quadros clínicos geralmente geram uma forte mobilização em indivíduos com transtorno de ansiedade de doença, sendo que as tentativas de tranquilizar o indivíduo normalmente não geram o efeito desejado. Para esses indivíduos, o tema da doença se torna um assunto central em sua vida, tanto em comportamentos exacerbados de evitação, quanto em suas conversas e também pensamentos. O indivíduo diagnosticado com esse transtorno tem perdas substanciais em sua funcionalidade, uma vez que suas preocupações e respostas de ansiedade acabam interferindo em suas interações sociais, no desempenho profissional e na vida familiar. Critérios diagnósticos do transtorno de ansiedade de doença O principal critério diagnóstico para esse transtorno é a preocupação com a possibilidade de contrair uma doença grave. Nesses casos, não há a presença de um sintoma somático, a não ser sintomas em intensidade leve. Há alto nível de preocupação e de ansiedade com relação à saúde, e o indivíduo é facilmente alarmado a respeito do estado de saúde pessoal. Além disso, o indivíduo tem comportamentos em excesso relativos ao cuidado com a saúde, como verificações frequentes do corpo em busca de doença ou exibe evitação mal-adaptativa, evitando consultas médicas. Além disso, os sintomas não são melhor explicados por outro transtorno mental, como: transtorno de sintomas somáticos; transtorno de pânico; transtorno de ansiedade generalizada; transtorno dismórfico corporal; transtorno obsessivo-compulsivo; transtorno delirante. Transtorno conversivo Uma das principais características do transtorno conversivo ou transtorno de sintomas neurológicos funcionais é a presença de sintomas motores e sensoriais sem explicação ou conexão com uma doença neurológica. Assim, faz-se necessária uma investigação clínica criteriosa que indique com segurança que a presença dos sintomas motores/sensoriais é incompatível com um determinado quadro neurológico ou médico. Confira a seguir os sintomas de cada um deles: Sintomas motores Fraqueza ou paralisia, tremores e outras anormalidades. Sintomas sensoriais Sensação tátil, visão ou audição alteradas. Também pode haver sintomas de tremores generalizados, que se assemelham a crises epiléticas (convulsões psicogênicas), além de episódios de ausência de resposta. Esse transtorno pode se manifestar em qualquer momento da vida, sendo que indivíduos com esse transtorno podem apresentar grande incapacidade para realização das atividades do cotidiano, já que a gravidade da incapacidade pode ser comparável à vivenciada por pessoas com doenças médicas comparáveis. Os critérios diagnósticos do transtorno conversivo são: 1. Um ou mais sintomas de função motora ou sensorial alterada. 2. Achados físicos que evidenciam incompatibilidade entre o sintoma e as condições médicas ou neurológicas encontradas. Fatores psicológicos que afetam outras condições médicas A principal característica diagnóstica dessa condição é a presença de fatores psicológicos ou comportamentais que são clinicamente significativos e que afetam de maneira adversa uma condição médica de maneira a prejudicar o seu tratamento ou agravar o seu curso. Ou seja, esses fatores, quando presentes, constituem um risco adicional à saúde ao influenciar a condição médica primária. Esses fatores psicológicos podem ser, por exemplo, a presença de: sofrimento psicológico; ansiedade; depressão; eventos estressantes da vida; traços de personalidade; padrões de interação social; estilos de enfrentamento e comportamentos de saúde mal-adaptativos, como negação doquadro da doença, má adesão às recomendações e minimização dos riscos. Uma pessoa que tem a presença de fatores psicológicos que afetam outras condições médicas poderia ser, por exemplo, uma pessoa que tem um quadro de asma que é intensificado por causa da ansiedade, a recusa a um tratamento necessário para hipertensão e a manipulação inadequada de insulina por um paciente diabético por questões de crenças que o paciente tem relativas ao tratamento. Atenção! Esse diagnóstico deve se restringir a situações em que o efeito do fator psicológico para a situação médica em questão de fato tenha um impacto clinicamente significativo, gerando prejuízos para a saúde do indivíduo e seu tratamento. Assim, em um processo diagnóstico, faz-se necessária uma investigação criteriosa que indique evidências consistentes com a sugestão de que há uma associação entre os fatores psicológicos e a condição médica. Os critérios diagnósticos são: 1. Um sintoma ou condição médica (que não um transtorno mental) está presente. 2. Fatores psicológicos ou comportamentais. É importante destacar que há uma associação temporal entre o agravamento, a manutenção, a ocorrência ou o impedimento de recuperação da condição médica e os fatores psicológicos. Os aspectos psicológicos interferem no tratamento da condição médica, como em caso de má adesão ao tratamento. Assim, os fatores psicológicos podem constituir um risco adicional à saúde do indivíduo, os fatores psicológicos aumentam a intensidade dos sintomas da condição médica. As crises de asma podem ser exacerbadas por ansiedade. Além disso, os fatores psicológicos e os comportamentais não são melhor explicados por outro transtorno mental, como transtorno de pânico, de estresse pós-traumático ou transtorno depressivo maior. Transtorno factício O transtorno factício tem como principal característica a falsificação intencional de sinais e sintomas médicos ou psicológicos em si ou em outras pessoas. Importante: quando o indivíduo falsifica uma doença em outra pessoa, o diagnóstico é de transtorno factício imposto a outro. Isso significa que quem recebe o diagnóstico é o agente (que falsifica a doença), e não a vítima. Esse é o caso que podemos observar da mãe que falsifica a doença de seu filho, levando a criança a receber, em alguns casos, tratamento sem necessidade. O processo diagnóstico implica na realização de uma avaliação que indique que o indivíduo intencionalmente busca falsear, simular ou até mesmo causar sinais ou sintomas de doença ou lesão mesmo que na ausência de recompensas externas óbvias. A pessoa para falsear o sintoma pode exagerar sintomas, simular, induzir e até mesmo fabricá-los. Segundo o DSM-V, “Transtornos factícios têm semelhanças com transtornos por uso de substância, transtornos alimentares, transtornos do controle de impulsos, transtorno pedofílico e alguns outros transtornos relacionados tanto à persistência do comportamento quanto aos esforços intencionais de ocultar o comportamento perturbado por meio de fraude” (APA, 2014, p. 326). Dessa forma, coloca-se como um transtorno de difícil diagnóstico, uma vez que a pessoa em questão busca, de maneira resistente, ocultar o comportamento de falsear uma determinada doença. Outro transtorno de sintomas somáticos Além dos transtornos apresentados, pode ser possível que um determinado indivíduo apresente um conjunto de sintomas característico de um transtorno de sintomas somáticos/transtorno relacionado e que causa um sofrimento significativo e/ou prejuízo em seu funcionamento, mas que, apesar disso, não há o atendimento para todos os critérios dos transtornos apresentados. Nesses casos, considera-se que o indivíduo pode apresentar um outro transtorno de sintomas somáticos e transtorno relacionado especificado. Confira a seguir alguns exemplos de casos em que esse diagnóstico pode ser aplicado: O indivíduo também pode ser diagnosticado com um transtorno de sintomas somáticos e transtorno relacionado não especificado em casos nos quais características de um transtorno de sintoma somático e transtorno relacionado causam sofrimento significativo e/ou prejuízo funcional para o indivíduo, mas, apesar disso, esses sintomas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica de transtorno de sintomas somáticos e transtorno relacionado não especificado. Atenção! A categoria transtorno de sintomas somáticos e transtorno relacionado não especificado não deverá ser usada a menos que haja situações definitivamente incomuns sem informação suficiente para se fazer um diagnóstico mais específico. Transtorno de sintomas somáticos breve Duração dos sintomas inferior a seis meses. Transtorno de ansiedade de doença breve Duração dos sintomas inferior a seis meses. Transtorno de ansiedade de doença sem comportamentos excessivos relacionados à saúde Critério D para transtorno de ansiedade de doença não é atendido. Pseudociese Falsa crença de estar grávida associada a sinais objetivos e sintomas relatados de gravidez. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 Os transtornos somáticos giram em torno de sintomas físicos para os quais não se consegue encontrar causas físicas. Assinale a alternativa que apresenta exemplos de transtornos somáticos. Parabéns! A alternativa C está correta. Sintomas recorrentes em indivíduos com transtorno somático são a ansiedade e o medo em relação a contrair determinada condição/doença e suas possíveis consequências, sendo muitas vezes desproporcionais à realidade. A Hipocondria e delirium tremens. B Doença psicogênica de massa e amnésia dissociativa. C Ansiedade e medo da doença. D Transtorno dismórfico corporal e hipocondria. E Somatização e despersonalização. Questão 2 Em relação aos transtornos somáticos, o indivíduo acometido por esse tipo de transtorno apresenta quadro emocional caracterizado por sintomas dolorosos sem necessariamente ter uma relação detectada com alterações orgânicas. Quanto a esses transtornos, assinale a alternativa correta. Parabéns! A alternativa A está correta. O transtorno de sintoma somático promove pensamentos desproporcionais e persistentes sobre a gravidade dos sintomas. O estado de ansiedade será persistentemente alto, gerando muita atenção com a saúde e preocupações com doenças. A O transtorno somático é diagnosticado quando a pessoa que se queixa de dor acredita estar sofrendo de problema orgânico e busca, persistentemente, diagnóstico e tratamento médico, não aceitando a negativa dos médicos quanto à possibilidade de haver doença física. B O transtorno dismórfico corporal abrange múltiplas queixas de sintomas físicos derivados de causas psicológicas que variam com o tempo e que são persistentes. C O transtorno hipocondríaco é um dos transtornos que se encaixa dentro dos transtornos somáticos e se caracteriza pelo fato de o paciente apresentar preocupação, medo ou crença persistente de estar acometido por transtorno somático grave e progressivo. D O paciente com transtorno somático não apresenta sensações reais de dor em seu corpo, sendo esses sintomas confabulações para ter ganhos secundários. E Não é possível que o indivíduo tenha de fato uma doença subjacente em conjunto com o transtorno somático. Considerações �nais A partir do que foi discutido sobre transtornos de ansiedade e transtornos somáticos, devemos considerar que um processo diagnóstico de uma psicopatologia deve ser feito com atenção a diferentes aspectos da vida do indivíduo, à forma como as suas queixas ocorrem ao longo do tempo e ao impacto que os sintomas têm em sua vida. Muitos dos transtornos podem, na prática, ter sintomas similares. Por causa disso, o conhecimento dos critérios diagnósticos dos diferentes transtornos é central para a realização de um diagnóstico diferencial que permita a confirmação de uma determinada hipótese diagnóstica em detrimento das demais. Além disso, é importante considerarmosque conhecer em profundidade o quadro diagnóstico do indivíduo é o primeiro passo para um processo interventivo especializado, que considere as necessidades e particularidades do sujeito. Podcast Para finalizar, ouça uma apresentação das comparações e diferenças entre os distintos transtornos de ansiedade e transtornos somáticos segundo critérios do DSM 5. Referências AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM – V). 5. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2005. BOMBANA, J. A. Sintomas somáticos inexplicados clinicamente: um campo impreciso entre a psiquiatria e a clínica médica. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 55, p. 308-312, 2006. CATANI, J. Histeria, transtornos somatoformes e sintomas somáticos: as múltiplas configurações do sofrimento psíquico no interior dos sistemas classificatórios. Jornal de Psicanálise, v. 47, n. 86, p. 115-134, 2014. ROLIM, J. A.; OLIVEIRA, A. R. de; BATISTA, E. C. Manejo da ansiedade no enfrentamento da covid-19. Revista Enfermagem e Saúde Coletiva, v. 5, n. 1, p. 64-74, 2020. VIANNA, R. R. A. B.; CAMPOS, A. A.; LANDEIRA-FERNANDEZ, J. Transtornos de ansiedade na infância e adolescência: uma revisão. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, v. 5, n. 1, p. 46-61, 2009. Explore + Confira as indicações que separamos especialmente para você! Assista ao vídeo Transtorno de Ansiedade Generalizada, você sabe o que é? | Sua Saúde na Rede, no YouTube, para entender mais sobre o transtorno de ansiedade generalizada. Leia o texto de Júlia Catani (2014) Histeria, transtornos somatoformes e sintomas somáticos: as múltiplas configurações do sofrimento psíquico no interior dos sistemas classificatórios, para entender mais sobre os transtornos somáticos. Assista ao vídeo Transtorno de sintomas somáticos ou doenças psicossomáticas, no YouTube, para entender mais sobre o tema.
Compartilhar