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APOSTILA PSICODIAGNOSTICO

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APOSTILA 
PSICO
DIAGN
ÓSTIC
O 
LEITURAS 
OBRIGATÓRIAS 
SUMÁRIO DE PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO 2023-1 
Professores Orientadores: Guilherme, Inês, Janaina, Júlia, Mara, Simone 
 
Leituras Obrigatórias: 
 
1- ANCONA-LOPEZ, M. Contexto geral do diagnóstico psicológico. In: TRINCA, W. (Org.) 
Diagnóstico Psicológico – a prática clínica. São Paulo: EPU, 1984. ....................................... p. 1 
 
2- OCAMPO, M. L. S.; ARZENO, M. E. G. O processo psicodiagnóstico. In: OCAMPO, M. L. 
S.; ARZENO, M. E. G.; PICCOLO, E. G. de. O processo psicodiagnóstico e as técnicas 
projetivas. São Paulo: Martins Fontes, 1990, 6. ed.. ..............................................................p. 14 
 
3- ANCONA-LOPEZ, M. Prática psicológica e as estratégias inovadoras. In: RAMOS, C.; 
SILVA, G. G.; SOUZA, S. (Org.) Práticas psicológicas em instituições: uma reflexão sobre os 
serviços-escola. São Paulo: Vetor Editora, 2006. .....................................................................p. 25 
 
4- ANCONA-LOPEZ, S., TCHIRICHIAN, R. F. M. Desafios no Psicodiagnóstico Infantil. In: 
ANCONA-LOPEZ, S. (Org.) Psicodiagnóstico Interventivo: Evolução de Uma Prática. São 
Paulo: Cortez Ed., 2013. ...........................................................................................................p. 33 
 
5- DONATELLI, M. F. Psicodiagnóstico Interventivo Fenomenológico Existencial. In: 
ANCONA-LOPEZ, S. (Org.) Psicodiagnóstico Interventivo: Evolução de Uma Prática. São 
Paulo, Cortez Ed., 2013, p. 45-64. ............................................................................................p. 43 
 
6- YEHIA, G. Y. Psicodiagnóstico Fenomenológico Existencial: Focalizando os Aspectos 
Saudáveis. In: ANCONA-LOPEZ, S. (Org.) Psicodiagnóstico Interventivo: Evolução de Uma 
Prática. São Paulo: Cortez Ed., 2013. ......................................................................................p. 58 
 
7- YEHIA, G. Y. Reformulação do papel do psicólogo no psicodiagnóstico fenomenológico-
existencial e sua repercussão sobre os pais. In: ANCONA-LOPEZ, M. (Org.) Psicodiagnóstico: 
Processo de Intervenção. São Paulo: Cortez, 1995. ..................................................................p. 73 
 
8- SANTIAGO, M. D. E. Entrevistas Clínicas. In: TRINCA, W. (Org.) Diagnóstico Psicológico 
– a prática clínica. São Paulo: EPU, 1984. ...............................................................................p. 93 
 
9- TAVARES, M. A entrevista clínica. In: CUNHA, J. A. e colaboradores Psicodiagnóstico V. 
Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 5. ed., 2000. ........................................................................p. 108 
 
10- ABERASTURY, A. A entrevista inicial com os pais. In: ____ Psicanálise da Criança – Teoria 
e Técnica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982. .......................................................................p. 120 
 
11- SPANOUSDIS, S. Conhecer o Outro na Entrevista. In: Revista da Associação Brasileira de 
Deseinsanalyse nº 4. São Paulo. ............................................................................................p. 136 
 
12- CUNHA, J. A. A história do examinando. In: CUNHA, J. A. e colaboradores. 
Psicodiagnóstico V. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 5. ed., 2000. .....................................p. 139 
 
13- SILVA, M. A.; BANDEIRA, D. R. A Entrevista de Anamnese. In: HUTZ, C. S.; BANDEIRA, D. R.; 
TRENTINI, C. M.; KRUG, J. S. (Org.) Psicodiagnóstico. Porto Alegre: Artmed, 2016. ..................p. 149 
 
14- EFRON, A. M.; FAINBERG, E.; KLEINER, Y.; SIGAL, A. M. e Woscoboink. A hora de jogo 
diagnóstica. In: OCAMPO, M. L. S.; ARZENO, M. E. G.; PICCOLO, E. G. de. O processo 
psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. São Paulo: Martins Fontes, 1990, 6. ed...............p. 177 
 
15- MUNHÓZ, M. L. P. A criança participante do psicodiagnóstico infantil grupal. In: ANCONA-
LOPEZ, M. (Org.) Psicodiagnóstico: Processo de Intervenção. São Paulo: Cortez, 1995, p. 179-
195. .........................................................................................................................................p. 208 
 
16- ALBORNOZ, A. C. G. Devolução das Informações do Psicodiagnóstico. In: HUTZ, C. S.; 
BANDEIRA, D. R.; TRENTINI, C. M.; KRUG, J. S. (Org.) Psicodiagnóstico. Porto Alegre: 
Artmed, 2016. .........................................................................................................................p. 225 
 
17- FANTINI, M. N. A. O enquadre das entrevistas devolutivas na prática do psicodiagnóstico 
interventivo. In: __ Esperança e hospitalidade: a entrevista devolutiva em grupo no contexto da 
clínica-escola. Tese de Doutorado. São Paulo: Universidade de São Paulo (USP), 2022........p. 246 
 
18- FANTINI, M. N. A. Parâmetros técnicos da entrevista devolutiva em grupo. In: _____ 
Esperança e hospitalidade: a entrevista devolutiva em grupo no contexto da clínica-escola. 
Tese de Doutorado. São Paulo: Universidade de São Paulo (USP), 2022...............................p.270 
 
19- MOREIRA, L. M. A. G. Consultas Terapêuticas com Pais e Filhos: Resgatando o Espaço 
Potencial na Experiência Compartilhada do Brincar. In: Moreira, L. M. A. G. Consultas 
Terapêuticas com Pais e Filhos- Resgatando a Experiência Compartilhada do Brincar. 
Curitiba: Juruá Editora, 2019. .................................................................................................p. 272 
 
20- PATUTI, C. A. O. B.; SAEDELLI, L. R.; MELO, M. P. R. A.; CIRIANO, R.C. A Elaboração 
de Relatos de Atendimento em Psicodiagnóstico Interventivo: Sua Importância na Formação do 
Aluno-Estagiário. In: ANCONA-LOPEZ, S. (Org.) Psicodiagnóstico Interventivo: Evolução de 
Uma Prática. São Paulo, Cortez Ed., 2013. .............................................................................p. 292 
 
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................................p.314 
 
1
Contexto geral do diagnóstico psicológico
Marília Ancona-Lopez
1.1. O termo “diagnóstico”
1 . 1 . 1 . Sentido amplo e restrito
A palavra diagnóstico origina-se do grego diagnõstikós e signi­
fica discernim ento, faculdade de conhecer, de_ver através de. C om ­
preendido dessa form a, o diagnóstico c inevitável, pois, sempre que: 
explicitamos nossa compreensão sobre um fenômeno, realizamos um 
de seus possíveis diagnósticos, isto é, discernimos nele aspectos, carac­
terísticas e relações que compõem um todo, o qual chamamos de 
conhecimento do fenômeno. Para chegarmos a esse conhecimento, 
utilizamos processos de observações, de avaliações e de in terpreta­
ções que se baseiam em nossas percepções, experiências, informações 
adquiridas e form as de pensamento. É nesse sentido am plo que a 
compreensão de um fenômeno confunde-se com o diagnóstico do 
mesmo. Em sentido mais restrito, utiliza-se o term o diagnóstico para 
referir-se à possibilidade de conhecimento que vai além daquela que 
o senso comum pode dar, ou seja, à possibilidade de significar a rea­
lidade que faz uso de conceitos, noções e teorias científicas.
Q uando procuram os ler determ inado fato a partir de conheci­
mentos específicos, estamos realizando um diagnóstico no campo da 
ciência ao qual esses conhecimentos se referem. Uma folha de papel 
pode ser com preendida através de um estudo do m aterial que a 
compõe, de seu custo, da sua utilidade social ou de seu surgimento
1
1
histórico, dependendo dos conhecimentos colocados a serviço da 
busca de compreensão. Evidentem ente, nem todos os conhecimentos 
podem ser aplicados a todos os fatos. Conhecimentos de Álgebra di­
ficilmente nos serão úteis para a compreensão da H istória do Brasil 
e vice-versa. Se, porém, o objeto de estudo de diversas ciências for 
o mesmo, será possível aplicar a esse objeto os conhecimentos de 
todas essas ciências. Por exemplo, ao estudar um animal utilizando 
conhecimentos da Zoologia,enriqueceremos esse estudo recorrendo 
à Biologia.
1 . 1 . 2 . O diagnóstico psicológico
A Psicologia se insere no conjunto das Ciências Hum anas. U ti­
lizamos seus conhecimentos para a compreensão de qualquer fenô­
meno hum ano. Esse mesmo fenômeno poderá também ser objeto de 
estudo de outras ciências, o que perm itirá integrar conhecimentos, 
enriquecendo nossa compreensão. Porém, ainda que empreguemos 
dados de outras ciências, ao tratarm os das funções do psicólogo, esta­
remos sempre nos referindo ao conjunto de fenômenos possíveis de 
serem estudados pela Psicologia e ao conjunto de conhecimentos psi­
cológicos que se desenvolveram a partir do estudo desses fenômenos. 
De fato, o objeto de estudo, os conhecimentos e métodos utilizados 
caracterizam nosso trabalho, delimitam nosso campo de competência 
e perm item que se desenvolva nossa identidade profissional.
Os conhecimentos dentro do campo da Psicologia, como de qual­
quer outra ciência, não se agrupam indiscrim inadam ente. Constituem 
e estão constituídos em teorias das quais decorrem os procedimentos 
e as técnicas.
Na história da Psicologia encontramos inúm eras teorias que defi­
nem de form a diferente seu objeto de estudo e o método a utilizar. 
Algumas tomaram métodos emprestados das ciências naturais, defi­
nindo em função dos mesmos o fenômeno a estudar, e algumas bus­
caram criar métodos próprios. Mesmo a classificação da Psicologia 
como ciência hum ana, ou como ciência natural, e o reconhecimento 
da existência de teorias psicológicas foram e são m uitas vezes ques­
tionados pelos estudiosos do conhecimento. Porém, estas são as o r­
ganizações do conhecimento que encontram os no atual estágio do 
desenvolvimento da Psicologia. São as que estudamos, frente às quais 
nos posicionamos e com as quais trabalham os.
Neste livro tratarem os do diagnóstico psicológico. 0_ diagnóstico 
psicológico busca um a form a.de. compreer.são situada no âmbito 3ã 
Psicologia. Em nosso País, é um a das funções exclusivas do psicó­
logo garantidas por lei (Lei n.° 4119 de 27-8-1962, que dispõe sobre
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2
a formação em Psicologia e regulamenta a profissão de psicólogo). 
O utras funções exclusivas são a orientação e seleção profissional, 
orientação psicopedagógica, solução de problemas de ajustam ento, 
direção de serviços de Psicologia, ensino e supervisão profissional, 
assessoria e perícias sobre assuntos de Psicologia.
Q uando nos dispomos a realizar um psicodiagnóstico, presum i­
mos possuir conhecimentos teóricos, dom inar procedimentos e téc­
nicas psicológicas. Como são m uitas as teorias existentes, e nem sem­
pre convergentes, a atuação do psicólogo em diagnóstico, assim como 
nas outras funções privativas da profissão, varia consideravelm ente. 
Em outras palavras, é porque a atuação profissional depende de uma 
forma de conhecimento, método de estudo e procedimentos utiliza­
dos — considerando que na Psicologia estes são muitas vezes inci­
pientes — , que se encontram muitas concepções e estruturações dife­
rentes do diagnóstico psicológico. O próprio uso do termo varia, de 
acordo com essas concepções. Encontra-se, muitas vezes, ao invés de 
“ diagnóstico psicológico” , a utilização dos termos “ psicodiagnóstico” , 
“ diagnóstico da personalidade” , “ estudo de caso” ou “ avaliação 
psicológica” . Cada um desses termos é utilizado preferencialm ente 
por grupos de profissionais posicionados de formas diferentes diante 
da Psicologia.
Assim, antes de nos propormos a atuar profissionalm ente, será 
interessante explicitarmos sobre que fenômenos pretendemos atuar, 
quais serão os referenciais teóricos, os métodos e procedim entos a 
utilizar.
1.2. A Psicologia Clinica e as abordagens 
psicodi agnósticas
O termo Psicologia Clínica foi utilizado, pela prim eira vez, em 
1896, referindo-se a procedimentos diagnósticos utilizados junto à 
clínica médica, com crianças deficientes físicas e mentais. O inte­
resse por esse diagnóstico surgiu a partir do momento em que as 
doenças mentais foram consideradas semelhantes às doenças físicas. 
Passaram, então, a fazer parte do universo de estudo da ciência, e 
não mais da religião, como anteriorm ente, quando eram consideradas 
castigos divinos ou possessões.
Pareadas com as doenças físicas foi necessário observar as 
doenças mentais, verificar sua existência como entidades específicas, 
descrevê-las e classificá-las. Dessa forma, a par da Psiquiatria, ativi­
dade médica destinada a com bater a doença mental, desenvolveu-se 
a Psicopatologia. ou seja, o ramo da ciência voltado ao estudo do
3
3
comportamento anorm al, definindo-o, com preendendo seus aspectos 
subjacentes, sua etiologia, classificação e aspectos sociais. Do mesmo 
modo, a p ar do desenvolvimento da Psicologia, isto é, do estudo sis­
temático da vida psíquica em geral, desenvolveu-se a Psicologia Clí­
nica, como atividade voltada à prevenção e ao alívio do sofrimento 
psíquico.
1 . 2 . 1 . A busca de um conhecimento objetivo
A form a de atuação inicial em psicodiagnóstico refletiu a pos­
tura predom inante, na época, entre os cientistas. Estes consideravam 
possível chegar-se ao conhecimento objetivo de um fenômeno, u tili­
zando um a metodologia baseada em observação im parcial e experi­
m entação. Esta postura, na qual a confirm ação de hipóteses se ba­
seia em marcos referenciais externos, conhecida em sentido amplo 
como postura positivista, predom inou principalm ente no continente 
americano. D entro dessa orientação, desenvolveram-se o modelo mé­
dico de psicodiagnóstico, o m odele psicométrico e o modelo beha- 
viorista.
a) O modelo médico
O trabalho em diagnóstico psicológico junto aos médicos m arcou 
o início da atuação profissional. Houve um a transposição do modelo 
médico para o modelo psicológico. Este adquiriu algumas caracte­
rísticas: enfatizou os aspectos patológicos do indivíduo, usando como 
quadros referenciais as nosologias psicopatológicas e enfatizou o uso 
de instrum entos de m edidas de determ inadas características do in­
divíduo.
No campo da Psicopatologia, multiplicaram-se as tentativas de 
estabelecer diferenças entre desordens orgânicas, endógenas, e desor­
dens funcionais, exógenas, procurando-se estabelecer relações entre 
as mesmas e os distúrbios de com portam ento. Estabeleceram-se, tam ­
bém, relações de causalidade entre os distúrbios orgânicos e os dis­
túrbios psicológicos, principalm ente nas áreas da Neurologia e da 
Bioquímica. Na procura do estabelecim ento de quadros classifica- 
tórios das doenças mentais, precisos e m utuam ente exclusivos, bus­
cou-se organizar síndrom es sintomáticas que caracterizassem esses 
quadros e pudessem ser observadas.
Os comportamentos considerados patológicos passaram a ser des­
critos detalhadam ente. Elaboraram-se testes para determ inar e detec­
tar os processos psíquicos subjacentes, inclusive detectar tendências 
patológicas. O objetivo desses testes, na prática, era fornecer infor­
mações aos médicos que as utilizavam , como subsídios para deter­
4
4
m inar os diagnósticos psicopatológicos. Procuravam-se tam bém , nos 
testes, sinais de distúrbios orgânicos que, pareados aos dados sinto­
máticos, justificassem pesquisas médicas mais aprofundadas.
As dificuldades encontradas nessa abordagem ligavam-se ao fato 
de que os quadros sintomáticos nem sempre se adequam ao quadro 
apresentado pelo sujeito. Além disto, os mesmos sintomas podiam 
ter m uitas vezes causas diversas e, vice-versa, as mesmas causas 
podiam provocar diferentes sintomas.
Do ponto de vista do psicólogo, a grande ênfase nos aspectos 
psicopatológicos deixava em segundo plano características não-pato- 
lógicas do com portam ento das pessoas, lim itando o estudo e o co­
nhecimento sobre o indivíduo.
Apesar dessas dificuldades, utilizam-se até hoje classificações 
psicopatológicas, principalm ente no que se refere aos grandes grupos 
nosológicos. Convém lem brar que, dentro da Psicopatologia, há dife­
rentes classificações, e estas obedecema diferentes critérios. A uti­
lização de critérios classificatórios justifica-se, porém, pela busca de 
um a linguagem comum.
b) O modelo psicométrico
O desenvolvimento dos testes foi, aos poucos, estabelecendo um 
campo de atuação exclusivo para o psicólogo e garantindo sua iden­
tidade profissional, em bora precária, já que condicionada à autori­
dade do médico a quem cabia solicitar esses testes e receber os 
resultados dos mesmos.
N a atuação, foi com o uso de testes, principalm ente junto a 
crianças, que os psicólogos ganharam m aior autonom ia. Nesse tra ­
balho, esforçavam-se por determ inar, através dos testes, a capacidade 
intelectual das crianças, suas aptidões e dificuldades, assim como 
sua capacidade escolar. Esses resultados, com o tempo, deixaram 
de set obrigatoriam ente entregues a outros profissionais. Utilizados 
pelos próprios psicólogos, serviam agora para orientar pais, profes­
sores ou os próprios médicos. Na utilização dos resultados dos tes­
tes, tornou-se menos im portante detectar distúrbios e classificá-los 
psicopatologicamente, mas sim estabelecer diferenças individuais e 
orientações específicas.
A visão de homem subjacente ao modelo psicométrico implicava 
a existência de características genéricas do com portam ento humano. 
Essas características, de ordem genética e constitucional, eram con­
sideradas relativam ente imutáveis. Os testes visavam a identificá-las, 
classificá-las e medi-las. Entre as teorias da Psicologia que procura­
ram explicitar essa visão, encontram-se a Tipologia, a Psicologia das
5
5
Faculdades e a Psicologia do Traço, cada um a delas definindo um 
conceito de homem e indicando um a forma de diagnosticá-lo.
O desenvolvimento da Psicologia nessas direções foi bastante 
influenciado por acontecimentos históricos, principalm ente nos Es­
tados Unidos. Neste país, durante a Segunda G uerra M undial atri­
buiu-se à Psicologia a função de selecionar indivíduos, aptos ou não 
para o exército, e avaliar os efeitos da guerra sobre os que dela 
retornavam . Foi destinada m aior verba às pesquisas psicológicas e 
proliferaram os testes. Estes foram amplam ente difundidos no Brasil.
c) O modelo behaviorista
Enfatizando a postura positivista, desenvolveram-se as teorias 
behavioristas. Estas, partindo do princípio de que o homem pode ser 
estudado como qualquer outro fenômeno da natureza, incluíram a 
Psicologia entre as ciências naturais e transportaram seus métodos 
para o estudo do homem. A fim de poder aplicar o método das ciên­
cias naturais, necessitavam de um objeto de estudo observável e 
mensurável, e declararam o com portam ento observável como o único 
objeto possível de ser estudado pela Psicologia.
Consideraram que o com portam ento hum ano não decorre de 
características inatas e imutáveis, mas é aprendido, podendo ser mo­
dificado. Passaram a estudá-lo, preocupando-se em alcançar as leis 
que o regem e as variáveis que nele influem, a fim de se poder agir 
sobre ele, mantendo-o, substituindo-o, modelando-o ou modificando-o.
Os behavioristas criaram formas próprias de avaliação do com­
portam ento a ser estudado. Não utilizaram o term o "psicodiagnós- 
tico” , valendo-se dos termos “ levantamentos de repertório” ou “ aná­
lises de com portam ento” .
1 . 2 . 2 . A importância da subjetividade
Paralelam ente a essas tendências, desenvolveu-se um a nova for­
ma de conhecimento que repercutiu consideravelmente na Psicologia. 
Desde o início do século, alguns filósofos insurgiram-se contra a 
visão de ciência q u e considerava possível um a total separação entre 
o sujeito e o objeto de estudo. Para esses filósofos, todo o conhe­
cimento é estabelecido pelo homem, não se podendo negar a parti­
cipação de sua subjetividade. Dessa form a, não é possível adm itir 
como válida um a psicologia positivista, objetiva e experim ental. O 
homem não pode ser estudado como um m ero objeto, fazendo parte 
do m undo, pois o próprio m undo não passa de um objeto intencional 
para o sujeito que o pensa. Desse modo, os métodos das ciências
6
6
naturais não poderiam ser transpostos para as ciências hum anas, já 
que estas possuem características específicas.
Esta form a de pensar foi m arcante para a Psicopatologia e para 
a Psicologia. N o campo desta últim a, deu origem à Psicologia Feno­
menológico-existencial e à Psicologia H um anista. Todas essas corren­
tes afirm am que a consciência, a vida intencional, determ ina e é 
determ inada pelo m undo, sendo fonte de significação e valor. Sa­
lientam o caráter holístico do homem e sua capacidade de escolha e 
autodeterm inação.
Partindo dessa posição frente ao homem e â ciência, inúmeras 
escolas surgiram e encararam de formas diversas a questão do psi- 
codiagnóstico.
a) O Hum anism o
As correntes hum anistas, evitando posições reducionistas ao 
lidar com o homem, procuraram m anter um a visão global do mesmo 
e com preender seu m undo e seu significado, sem as referências teó­
ricas anteriores. Insurgiram-se contra o diagnóstico psicológico, cri­
ticando seu aspecto classificatório e o uso do indivíduo através dos 
testes. Procuraram restituir ao ser hum ano sua liberdade e condições 
de desenvolvimento, repudiando o psicodiagnóstico e considerando-o 
um verdadeiro leito de Procusto . 1 Para os hum anistas, os procedi­
mentos diagnósticos são artificiais. Constituem-se em racionalizações, 
acom panhadas de julgamentos baseados em constructos teóricos que 
descaracterizam o ser humano. Esses psicólogos não se utilizam de 
diagnósticos e de testes, considerando que, através do relacionam ento 
estabelecido com o cliente, durante a psicoterapia ou aconselha­
m ento, alcançam um a compreensão do mesmo.
b) A Psicologia Fenomenológico-existencial
Algumas correntes da Psicologia Fenomenológico-existencial re 
form ularam a visão do psicodiagnóstico. Para estes psicólogos, os 
dados obtidos em entrevistas e /o u em testes podem ser úteis e tra­
zer informações a respeito das pessoas, ajudando-as no cam inho do 
autoconhecim ento. Esses dados devem ser discutidos diretam ente com 
os clientes, estabelecendo-se com os mesmos as possíveis conclusões. 
Apesar de empregarem testes e informações derivadas de diferentes 
correntes do conhecimento psicológico, utilizam-nas apenas como re­
1 Procusto, na Mitologia Grega, era um salteador, Atacava os viajantes e 
os matava, forçando-os a se deitarem num leito que nunca se ajustava ao 
seu tamanho. Cortava as pernas dos que excediam a medida e esticava os 
que não a atingiam.
7
7
cursos ou estratégias a serem trabalhadas com os clientes. O psico­
diagnóstico é considerado mais do que um estudo e avaliação. Sa­
lienta-se o seu aspecto de intervenção, diluindo-se os lim ites que se­
param o psicodiagnóstico da intervenção terapêutica.
c) A Psicanálise
Decorrente da mesma postura que não considera possível a 
com pleta objetividade, assim como não aceita a com pleta subjetivi­
dade e atribui significação particular a todo com portam ento hum ano, 
desenvolveu-se a Psicanálise. Sua influência, sentida inicialmente na 
Europa, fez-se notar no continente am ericano, principalm ente no pe­
ríodo da Segunda G uerra M undial, quando houve uma grande imi­
gração de psicánalistas europeus.
A Psicanálise provê uma revolução na Psicologia, explicitando o 
conceito de inconsciente e explicando, através de processos intrapsí- 
quicos, os diferentes comportamentos que procura com preender. 
Através da ótica psicanalítica, rediscutem-se a determ inação psíquica, 
a dinâm ica da personalidade, revêem-se os com portam entos psicopa- 
tológicos, suâ origem e prognóstico.
Em bora, desde o início, os estudos psicológicos tenham se preo­
cupado em definir e conhecer a personalidade, foi a Psicanálise que 
propôs o complexo mais completo de formulações sobre sua form a­
ção, estrutura e funcionam ento. Entre os psicanalistas, desenvolve­
ram-se várias escolas, que se diferenciam pela ênfase colocada em 
diferentes aspectosda personalidade, e pelas explicações sobre o 
desenvolvimento das mesmas. Todas concordam quanto aos con­
ceitos psicanalíticos fundam entais.
A pesar das diferenças entre as correntes psicanalíticas, sua 
influência na prática do psicodiagnóstico foi a mesma. Acentuou-se 
o valor das entrevistas como instrumento de trabalho, o estudo da 
personalidade através da utilização de observações e técnicas proje­
tivas e se desenvolveu um a m aior consideração da relação do psi­
cólogo e do cliente com a instrum entalização dos aspectos transfe­
renciais e contratransferenciais. Enfim , a Psicanálise desenvolveu ins­
trum entos diagnósticos sutis, que perm item verificar o que se passa 
com o indivíduo por detrás de seu com portam ento aparente.
1 . 2 . 3 . A procura de integração
Todas as abordagens em Psicologia, que surgiram e foram se 
desenvolvendo ao longo do tempo, têm seus equivalentes atuais. Isto 
quer dizer que. hoje, entre os psicólogos, encontram os aqueles que 
atuam a partir de conceitos do homem e da ciência positivistas, feno-
8
8
menológico-existenciais, hum anistas e psicanalíticos. Estas seriam as 
grandes tendências encontradas em Psicologia. Podemos dizer que, 
apesar de apresentarem diferenças fundam entais, m uitas vezes se 
interseccionam, não sendo sempre possível detectar as fronteiras entre 
as mesmas. Apesar dos diferentes marcos referenciais, a conceituação 
de cada uma dessas tendências é m uito am pla e cada um a delas aprè- 
senta inúmeros desdobram entos, de tal forma que, na prática da Psi­
cologia e, portanto , na prática do psicodiagnóstico, temos, como já 
foi dito, várias formas de atuação, m uitas das quais não podem ser 
consideradas decorrentes exclusivamente de um a ou de ou tra dessas 
abordagens. Em outras palavras, quando olhamos concretam ente para 
a Psicologia Clínica, verificamos grandes variações de conhecimentos 
e atuações. Alguns podem ser agrupados em blocos razoavelmente 
organizados, outros são ainda m uito empíricos e com desenvolvi­
m ento bastante incipiente.
N a transcorrer da história da Psicologia, algumas teorias psi­
cológicas provocaram grande entusiasmo por parte dos profissionais. 
Parecia que sanariam as dificuldades internas desta ciência e preen­
cheriam as lacunas de conhecimento, além de proverem-na de instru­
mentos efetivos de atuação. Em alguns m omentos, isto aconteceu com 
mais de um a teoria. Estas teorias, desenvolvendo-se às vezes em di­
reções diferentes, criaram em certos períodos verdadeiras disputas 
entre profissionais, que procuravam provar a m aior ou m enor quali­
dade de suas propostas. O fato é que nenhum a teoria, até agora, 
mostrou-se suficiente para responder a todas as questões colocadas 
pela Psicologia.
O que se nota hoje, na m aioria dos psicólogos, já não é um a 
acirrada batalha no sentido de fazer prevalecer sua posição, mas sim 
um a postura crítica diante do conhecimento psicológico, e a procura 
de um a integração entre as diversas conquistas até agora realizadas 
em seu campo. Este processo de integração reflete-se também no tra­
balho de psicodiagnóstico.
A tualm ente, todas as correntes em Psicologia concordam , em bora 
partindo de pressupostos e métodos diferentes, que, para se com­
preender o homem, é necessário organizar conhecimentos que digam 
respeito à sua vida biológica, intrapsíquica e social, não sendo pos­
sível excluir nenhum desses horizontes. Em relação aos aspectos 
biológicos do sujeito, ao realizarem o psicodiagnóstico, os psicólogos 
se preocupam com os fatores de desenvolvimento e m aturação, com 
especial atenção à organização neurológica refletida no exercício das 
funções m otoras. A avaliação dessas funções ocupa um local de im­
portância no psicodiagnóstico infantil (ao lado da avaliação cogni­
tiva) pois está diretam ente ligada ao pragm atism o e ao sucesso es­
colar. Ainda, nesta avaliação, cabe ao psicólogo perguntar-se sobre
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9
possíveis causas orgânicas subjacentes à queixa apresentada. Caso 
suspeite da existência de distúrbios físicos, deve rem eter o cliente ao 
médico. Evitará, deste m odo, os riscos da ' ‘psicologização” , isto é, 
fornecer explicações psicológicas a distúrbios de ou tra origem. A ava­
liação dos processos intrapsíquicos, principalm ente da estru tura e 
dinâm ica da personalidade, constitui-se no cerne do psicodiagnós- 
tico. É ao redor dela que se organizam os demais dados. A relação 
do cliente com o psicólogo, assim como os papéis fam iliares e 
sociais, valores e expectativas, não deixam de ser considerados. A 
maior responsabilidade do psicólogo, porém , reside no trabalho de 
integração desses dados, já que a divisão dos mesmos não passa de 
um artifício para perm itir um trabalho mais sistemático.
Apesar da busca de integração, sabemos que um psicodiagnós- 
tico, por mais completo que seja, refere-se a um determ inado mo­
mento de vida do indivíduo, e constitui sempre um a hipótese diag­
nostica. Isto porque a Psicologia, como qualquer outra ciência, não 
pode ser considerada um corpo de conhecimentos acabado, com­
pleto e fechado.
1.3. Teoria e prática
É m uito im portante conhecermos a situação na qual se encontra 
a Psicologia, por dois motivos. Primeiro, porque sabendo dos pro­
blemas de conhecimento com os quais nossa profissão se depara, não 
podemos deixar de lado questões de Filosofia e de Epistemologia, 
que nos im pedirão de cair num a atuação acrílica e alienada, isto é, 
um a atuação na qual se utilizem , indiscrim inadam ente, diferentes con­
ceitos, noções e práticas, sem explicitá-los e sem definir nossa po­
sição frente aos mesmos. Em segundo lugar porque conhecendo as 
dificuldades que a Psicologia encontra, podemos com preender com 
m aior facilidade como estas se refletem na prática, e encontrar for­
mas de atuação, junto aos clientes, que nos perm itam agir com segu­
rança e tranqüilidade.
A relação entre a prática e a teoria em diferentes ciências e, 
portanto, também em Psicologia, é um a das questões que ocupa os 
estudiosos. Para alguns, a prática deve decorrer estritam ente de uma 
postura e métodos teóricos. Para outros, o im portante é a explici­
tação do cinturão de conceitos e noções no qual o sujeito se apóia, 
sem que, obrigatoriam ente, esse cinturão esteja organizado anterior­
m ente em um a teoria. O fato é que a prática e a teoria se alimentam 
m utuam ente. Uma não se desenvolve sem a outra, não podendo haver 
desvinculação e nem subordinação total entre elas. A incompreensão 
dos aspectos implicados nessa relação pode levar a um a desqualifi-
1 0
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Bib l io t e c a - f a c u l o a d e p it á g o r a s
caçãci do trabalho prático do profissional, por parte daqueles que se 
consideram produtores do conhecimento, ou a uma atuação desvin­
culada da teoria e que se. descaracterizaria como prática profissional. 
Por outro lado, a total subordinação da prática à teoria é restritiva 
e im produtiva para ambas.
1 3 1 . A prática do psicodiagnóstico
Na prática da Psicologia Clínica visa-se, basicamente, a aliviar o 
sofrim ento psíquico do cliente. N a prática do p sicodiagnóstico, o ob­
jetivo é organizar os elementos presentes no estudo psicológico. de 
fo rn u f l í obter uma compreensão do cliente a fim de ajudá-lo. Na 
concretização dessa prática, m uitas atuações baseiam-se em soluções 
pragmáticas, mais do que em soluções decorrentes de um a aborda­
gem teórica. Isto porque, na prática, entram em jogo novas di­
mensões.
Ao a tuar em psicodiagnóstico, o psicólogo está atendendo a ob­
jetivos definidos teoricamente. Está aplicando conhecimentos teó­
ricos, validando-os ou modificando-os. As observações decorrentes 
dessa aplicação, se pesquisadas e inform adas, trarão subsídios úteis 
a revisões e reform ulações teóricas. Está tam bém cum prindo sua fun­
ção profissional de ajudar o cliente, D esem penhando essa função, 
afirm a o papel do psicólogo, preserva o espaço da profissão e atende 
à necessidade da mesma. Além desses objetivos,inerentes à profissão, 
o psicólogo estará servindo a outros desígnios que decorrem das con­
dições sociais e organizacionais onde atua. Estas condições determ i­
nam o contexto no qual vai se desenvolver a atuação. Assim, ao rea­
lizarmos um psicodiagnóstico, tendo definido para nós mesmos as 
questões ligadas ao conhecim ento psicológico e à prática profissio­
nal, devemos considerar o contexto no qual essa atuação está in­
serida.
1 . 3 . 2 . O contexto da atuação
O m aior desenvolvimento dos modelos de psicodiagnóstico 
atuais deu-se em consultórios privados, no atendim ento a um a clien­
tela socialmente privilegiada. A valorização do psicólogo como pro­
fissional liberal contribuiu para a preferência pela atuação autônom a, 
em detrim ento da atuação em instituições. Nestas, a m era transpo­
sição dos modelos de psicodiagnóstico utilizados em consultórios, 
mostrou-se ineficiente. A situação passou a incluir, além do psicólogo 
e do cliente, um terceiro elemento, a instituição, que modificou a
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estruturação do trabalho. Nem sempre a instituição, os psicólogos e 
os clientes apresentam necessidades e objetivos coincidentes.
A atuação em psicodiagnóstico prevê o conhecimento das ne­
cessidades do cliente. Questões éticas propõem ao psicólogo o co­
nhecimento e a elaboração de suas próprias necessidades e desejos, 
a fim de que os mesmos não interfiram no trabalho profissional, pre­
judicando-o. Consideramos necessário que as influências institucio­
nais sejam reconhecidas também. O psicólogo, ao atuar em creches, 
hospitais, presídios e outras organizações, encontra-se freqüentem ente 
sob orientação estranha aos interesses de sua profissão. Apesar da 
regulam entação prever, como função exclusiva do psicólogo, a dire­
ção de serviços de Psicologia, essa regulam entação nem sempre é 
respeitada. O psicólogo é m uitas vezes pressionado a servir primor­
dialm ente aos interesses da instituição. Esta, através de regulamentos 
internos ou de poder burocrático, determ ina a quantidade de tra­
balho a produzir, local, tem po e recursos a serem usados. A pró­
pria utilização dos resultados do trabalho, por parte da instituição, 
pode ser contrária aos interesses do psicólogo e do cliente. Pres­
sões de mercado e questões trabalhistas lim itam a autonom ia do 
profissional.
Além da influência das condições organizacionais, a demanda 
da atuação profissional é claram ente influenciada por condições 
sociais. Essa dem anda pode ser verificada mais facilm ente em ser­
viços institucionais, dado o grande afluxo de pessoas aos mesmos. 
Ao examinarmos as características gerais da população que procura 
esses serviços, podemos reconhecer alguns determ inantes sociais. A 
m aioria pertence a segmentos populacionais desvalorizados social­
mente, por não constituírem força produtiva. A procura do serviço 
psicológico decorre de encam inham entos de terceiros, verificando-se 
raram ente a busca espontânea. A expectativa, nesses casos, é de 
adequação rápida às exigências exteriores. O profissional nem 
sempre encontra a seu dispor as técnicas mais adequadas ao caso 
em atendim ento. A m aioria das técnicas à disposição foi desen­
volvida em outros países, e o acesso às mesmas depende de sua di­
vulgação e comercialização. A obtenção de certos m ateriais implica 
em alto custo financeiro. Nessa situação, com poucos instrum entos 
disponíveis, o psicodiagnóstico pode transformar-se na repetição es­
tereotipada de um a seqüência fixa de testes, que nem sempre seriam 
os escolhidos pelo profissional, ou os que m elhor serviriam ao cliente.
O reconhecimento das influências organizacionais e sociais às 
quais o psicólogo está subm etido é im portante, na m edida em que 
lhe perm ite com preender m elhor a função social que a profissão está 
desem penhando e com a qual o profissional está sendo conivente. 
Permite também que este colabore, efetivam ente, na produção e di-
1 2
12
vulgação de técnicas e formas de trabalho voltadas à nossa reali­
dade sócio-econômica e cultural.
Como vemos, não é fácil trabalhar em psicodiagnóstico. Pode­
mos, porém, utilizar todos os conhecimentos e recursos a nosso dis­
por, de forma criativa e coerente, se lem brarm os que o conheci­
mento é contingente, as técnicas não são regras imutáveis, e toda sis­
tem atização é provisória e passível de reestruturação.
1.4. Bibliografia
Coelho, A. M. F. Gomes. Psicodiagnóstico: uma conveniência ou uma ne­
cessidade? Monografia. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1982.
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Jaspers, Karl. Psicopatologia General. Buenos Aires, Ed. Beta, 1971.
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Sonenreich, Carol. Notas sobre a atividade científica do Psiquiatra. Temas,
2 (3-4), 1972.
Trinca, Walter. O Pensamento Clínico em Diagnóstico da Personalidade. 
Petrópolis, Vozes, 1983.
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Capítulo XII
Desafios no psicodiagnóstico infantil
Rosana F. Tchirichian de Moura
Silvia Ancona-Lopez
Durante os 25 anos de nossa atuação com o psicodiagnóstico interventivo, confrontamo-nos com
diversos desafios que colocaram em xeque a nossa prática, obrigando-nos a retomar conceitos, rever
técnicas e refletir sobre as contingências e características do mundo moderno, contexto no qual estão
inseridas as crianças e as famílias às quais atendemos.
Por desempenharmos nossa profissão principalmente em clínicas-escola de Psicologia que oferecem
atendimento gratuito, grande parte dos clientes tem dificuldades socioeconômicas, acarretando carências
em diversos aspectos, o que induz a atuações que escapam do campo tradicional da psicologia clínica.
Como lembra o Conselho Federal de Psicologia (2007, p. 8), frequentemente “o trabalho profissional
requer inventividade, inteligência e talento para criar, inovar, de modo a responder dinamicamente ao
movimento da realidade”.
Embora considerando as questões sociais e as condições do mundo atual, não é nosso objetivo
fazer uma análise sócio-histórica do nosso tempo, mas levantar questões e organizar alguns elementos
que contribuam para uma reflexão práticasobre o psicodiagnóstico, levando em conta o contexto no
qual ele se dá. São questões que passam pelas demandas da nossa época, pelas novas formas de
linguagem e comunicação, pelas novas configurações familiares e por aspectos especificamente ligados à
realidade brasileira, como nossas características socioeconômicas, a crise de valores políticos e morais, a
situação da educação e a cruel realidade da violência com as quais nossas crianças convivem, seja no
âmbito familiar, seja no âmbito social.
Frequentemente, nas clínicas-escola de psicologia as crianças comparecem para atendimento
psicológico trazendo como queixa dificuldades na escolarização. Na sua maioria, são encaminhadas por
escolas públicas, que esperam obter dos psicólogos clínicos explicações acerca dos motivos que as
impedem de se desenvolver pedagogicamente. Atendendo a essa demanda, comumente o profissional,
33
restringindo-se à singularidade da criança, realiza o psicodiagnóstico privilegiando os aspectos da
personalidade, “que resultam em uma predisposição para a formação desse sintoma” (Bossa, 2002, p. 13),
desconsideram, assim, os aspectos institucionais que contribuem para o chamado fracasso escolar.
Embora haja exceções e esforços governamentais e de alguns educadores no Brasil, é fato que a escola
tem se tornado
cada vez mais o palco de fracassos e de formação precária, impedindo os jovens de se apossarem da
herança cultural, dos conhecimentos acumulados pela humanidade e, consequentemente, de
compreenderem melhor o mundo que os rodeia. A escola, que deveria formar jovens capazes de
analisar criticamente a realidade, a fim de perceber como agir no sentido de transformá-la e, ao
mesmo tempo, preservar as conquistas sociais, contribui para perpetuar injustiças sociais que
sempre fizeram parte da história do povo brasileiro (Bossa, 2002, p. 19).
Embora a situação descrita seja a mais comum, é preciso lembrar que estão sendo feitos esforços
governamentais e de alguns educadores visando mudar essa condição.
Rafael, 8 anos de idade, faz parte desse contingente injustiçado. Como inúmeras crianças, foi
encaminhado pela escola para atendimento psicológico porque apresentava dificuldade de aprendizagem
e não estava alfabetizado. A mãe, muito preocupada, temia que seu filho fosse portador de deficiência
mental. Durante o processo de psicodiagnóstico interventivo, a mãe relatou que, em um mesmo
semestre, o filho enfrentou quatro mudanças de professoras de alfabetização. Essa criança confrontou-
se, como denuncia Souza (2007, p. 6), com:
[…] uma escola pública cuja má-fé institucional permite incutir, nos próprios pobres, vítimas de
abandono secular, que seu fracasso escolar é culpa da própria vítima. A criança pobre, sem
estímulos em casa para apreender, passa a se ver como burra, incompetente e preguiçosa,
cumprindo a promessa que a sociedade lhe legou […]
Concordamos com Bossa (2002), quando afirma ser comum que as escolas e os psicólogos
compreendam o fracasso escolar de uma criança considerando os aspectos intrassubjetivos e relacionais,
as primeiras possivelmente por uma dificuldade de se confrontar com suas próprias deficiências e os
segundos apoiados na tradição da sua formação profissional que tende a privilegiar o indivíduo. Uma
visão ampliada da clínica psicológica permitiria levar em conta esses dois aspectos, de tal forma que a
compreensão da dificuldade de aprendizagem se construísse a partir da avaliação do contexto escolar no
qual a criança está inserida. Assim, no caso de Rafael, antes de pensarmos em uma possível deficiência
cognitiva, deveríamos atentar para a deficiência da instituição escolar, que, além de não oferecer a
estabilidade necessária para o bom desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, culpabilizou
34
a criança pelo seu insucesso.
No Psicodiagnóstico Interventivo, cientes da limitação do fazer clínico, procuramos engajar a
família e a escola num processo que visa não apenas à compreensão das dificuldades da criança, mas
também encontrar formas de auxiliá-la no seu desenvolvimento. Nesse sentido, a visita escolar, que é um
procedimento nesse processo e tema deste livro (ver capítulo VII), tem uma importância significativa,
principalmente por possibilitar uma reflexão conjunta com as equipes das escolas sobre o seu papel na
dificuldade dos alunos. Associado a isso, discriminar para os pais quais são as dificuldades de seus filhos
e o que é responsabilidade das instituições escolares pode levá-los a se colocar mais criticamente em
relação ao problema e se posicionarem como cidadãos ativos que podem fazer suas reivindicações junto
às escolas. A participação no psicodiagnóstico interventivo pode propiciar aos pais uma mudança de
atitude em relação aos seus filhos, reconhecendo e favorecendo seus aspectos positivos e ajudando-os a
encontrar a melhor maneira de auxiliar a criança a superar os aspectos negativos.
Entendemos que ainda temos como desafio no psicodiagnóstico interventivo ampliar nosso olhar,
de modo a ir além da criança como foco da investigação e integrar outros aspectos, como os efeitos do
mundo moderno sobre ela e sua família.
Como é o caso do acesso aos computadores, um avanço tecnológico que já faz parte da vida escolar
de muitas crianças da rede pública, e se de um lado propicia a inclusão em um mundo globalizado de
informações, de outro não garante aquilo que lhes seria de direito, ou seja, aprender. Um número
expressivo de crianças que chegam às clínicas de psicologia está prestes a finalizar o primeiro grau
praticamente sem alfabetização. Para essas crianças, qual sentido terá o uso dos computadores e a
navegação na internet? O uso dos aparelhos eletrônicos, nesses casos, não é uma forma de adquirir ou
armazenar conhecimentos, mas uma ferramenta de consumo que cria para elas a ilusão de fazerem parte
da modernidade e do mundo virtual, o que, de algum modo, compensaria o sentimento de exclusão no
contexto escolar.
Uma visão sociológica nos parece oportuna para caracterizar o mundo atual. De acordo com
Baumann (1998, p. 32):
O sentimento dominante, agora, é a sensação de um novo tipo de incerteza, não limitada à própria
sorte e aos dons de uma pessoa, mas igualmente a respeito da futura configuração do mundo, a
maneira correta de viver nele e os critérios pelos quais julgar os acertos e erros de viver. O que
também é novo em torno da interpretação pós-moderna da incerteza (em si mesma, não exatamente
uma recém-chegada num mundo de passado moderno) é que ela já não é vista como um mero
inconveniente temporário, que com o esforço devido possa ser abandonado ou inteiramente
transposto. O mundo pós-moderno está se preparando para a vida sob uma condição de incerteza
que é permanente e irredutível.
35
Esse mesmo autor aponta que a época em que vivemos tem por característica privilegiar o
consumo, o imediatismo e o individualismo competitivo. Como consequência, também os laços afetivos
(familiares, amorosos, de amizade etc.) adquirem os atributos de volatilidade e superficialidade,
assumindo um caráter que Bauman (2004) chama de “amor líquido”. São relações facilmente
substituíveis que se pautam pelo compromisso provisório e, frequentemente, são de curta duração.
Na verdade, são vários os fatores que têm contribuído para novos formatos das famílias, o que tem
redesenhado a constituição dos laços afetivos que tem no âmbito familiar a principal matriz das
formações vinculares.
Na nossa prática clínica, esse quadro se reflete em algumas das configurações familiares das crianças
que vêm para o psicodiagnóstico. Grande parte é de famílias monoparentais femininas (mães solteiras ou
abandonadas por seus parceiros); crianças que têm irmãos de pais diferentes; avós que criam seus netos;
casais que trazem filhos de relacionamentos anteriores e que geram outros filhos. Enfim, são novos
modos de organização familiar, como se observa a seguir.
Marcelo, um menino muito inteligente, de 9 anos, alegre e conversador, começa a relatar como é a
composição de sua família:
Eu tenhomuitos irmãos. Tenho um de 22 anos que trabalha em uma oficina, com o irmão dele de
18. Quer dizer, meu irmão de 18 anos, é que eles têm outra mãe. Não é a minha… mas eu tenho um
irmão de 12 que é da minha mãe, e não é do meu pai… é assim… às vezes eu me confundo, sabe?
Porque eu tenho uma irmã que… é fácil… é assim… vou começar de novo… (sic)
Paulo, de 11 anos, é criado pelos avós desde bebê. Sua mãe engravidou solteira e não assumiu a
criança, assim como o pai, que já tinha um filho. Sua mãe teve mais dois relacionamentos, e de cada um
deles teve mais dois filhos, sendo que um vive com ela e o outro com o pai, em outro estado. A avó
procura ajuda psicológica para o neto, preocupada com os efeitos que essa experiência de vida possa
trazer ao garoto. Ela e a mãe participam do psicodiagnóstico interventivo do menino, que, de modo
confuso, se refere a ambas como mãe.
A história de Paulo não é única. Segundo Dias, Hora e Aguiar (2003), na última década, aumentou a
quantidade de netos e bisnetos criados por avós e bisavós. O número foi de um milhão e setecentos mil,
o que significa 55,1% mais do que foi apurado em 1991, correspondente a um milhão e cem mil. Muitos
destes casos chegam às clínicas de psicologia, pois, como Silva e Salomão (2003, p. 192) constatam, com
frequência há conflitos de papéis entre ser mãe e avó, no caso das avós guardiãs, conflitos estes que, sem
dúvida, se refletirão nas crianças a seus cuidados. Dias, Hora e Aguiar (idem) corroboram esta ideia ao
afirmar que foram identificadas vantagens, dificuldades e necessidades nos lares em que os avós
desempenham o papel de pais para seus netos na ausência (permanente ou de longo prazo) dos
36
genitores. Já no que se refere à situação de corresidência, ainda pouco se sabe sobre as repercussões que
tal condição acarreta na vida e nas relações estabelecidas entre avós, pais e netos.
Uma nova configuração familiar que está se consolidando, inclusive com o amparo legal, é a das
famílias homoparentais. Em alguns anos não se ouvirão mais depoimentos como o de Joaquim (12 anos)
durante uma sessão de psicodiagnóstico:
Eu gosto muito da Cleuza. Se minha mãe se separar dela eu prefiro morar com ela. Minha mãe é
legal, mas a Cleuza me leva no futebol, gosta de assistir luta livre, conta piada… é bom. Só que tem
uma coisa… eu não convido ninguém para ir na minha casa. Não convido meus amigos. Minha mãe
fala: vamos fazer uma festa de aniversário? Eu não quero, não gosto. Eu acho a Cleuza legal, mas…
é que… é que… acho esquisito minha mãe ser casada com uma mulher. Meus amigos vão zoar…
(sic)
A esse respeito, Passos (2005, p. 6) comenta:
[…] as condições por meio das quais os homossexuais constroem seus laços afetivos, no Brasil,
estão longe de obter uma legitimidade social e jurídica e, enquanto esse quadro não se reverte,
teremos famílias e pais envergonhados. Resta explorarmos os sentimentos desta vergonha nas
produções de subjetividade que decorrem daí.
Os progressos nessa área vêm se desenvolvendo rapidamente do ponto de vista jurídico, como a
legalização do casamento entre homossexuais, mas, do ponto de vista pessoal, a aceitação se dá mais
lentamente, mantendo ainda a situação descrita pela autora. Cabe ao psicólogo questionar de que forma
essas metamorfoses nas famílias repercutem na constituição das crianças, e o psicodiagnóstico inter-
ventivo é um momento privilegiado para esse questionamento por ter como objetivo conhecer os
sentidos e os significados que as crianças e seus pais dão às suas vidas e a seus mundos.
Ainda para a mesma autora, as novas formatações familiares, de famílias homoparentais ou não,
colocam em xeque os apoios teóricos dos psicólogos.
Cabe-nos também o enfrentamento rigoroso das teorias, que são insuficientes para dar conta das
profundas transformações processadas nas famílias, sobretudo em seus enredamentos afetivos
(ibidem, p. 5).
Marcelo, Paulo e Joaquim são crianças que vivem a necessidade de se adaptar a configurações
familiares não tradicionais. Assim, também o psicólogo, diante de situações novas e inusitadas para ele,
sente-se desamparado sem um balizamento para suas intervenções. Naturalmente escudado pelas teorias
37
psicológicas que conhece, procura, durante o processo diagnóstico, situar-se no mundo do cliente,
qualquer que seja ele, para compreendê-lo. Entretanto, na contemporaneidade, é preciso despir-se das
amarras teóricas com o objetivo de acolher o cliente e sua família, sem cair na armadilha de considerar
que a criança ficará, obrigatoriamente, prejudicada no seu desenvolvimento psicológico. Como lembra
Passos (2005, p. 14): “[…] é necessária a criação de abordagens que apontem para as distintas facetas da
grupalidade familiar e que permitam a compreensão de diferentes formas de ser família hoje”. O que
fazer enquanto essas abordagens não surgem? A inventividade, o bom-senso e, principalmente, a
reflexão poderão auxiliar o psicólogo na sua atuação, sempre tendo em mente que, enquanto
profissional, deve acompanhar essas transformações e os estudos que sobre elas são realizados.
É possível observar, no entanto, que apesar das questões teóricas que o psicólogo venha a enfrentar,
o psicodiagnóstico interventivo, ao oferecer a oportunidade de uma reflexão conjunta, permite enfrentar
as lacunas teóricas através de uma compreensão co-constituída que se pauta pelo mundo vivido do
cliente. Além disso, quando o atendimento a pais e crianças acontece em grupo (modelo usualmente
utilizado em clínicas-escola e outras instituições), o psicodiagnóstico interventivo se enriquece ao
facilitar a identificação e a troca entre os componentes do grupo, auxiliando na compreensão da própria
família, contribuindo, em muitos casos, para diminuir a sensação de isolamento e eliminando a
impressão de que seu caso é diferente, único e que talvez não tenha solução.
Não poderíamos deixar de incluir nessa discussão nossas inquietações frente à cruel realidade de
crianças que, em circunstâncias mais adversas, são obrigadas a conviver diretamente com a violência
social e familiar.
A violência doméstica, incluindo o abuso sexual e psicológico, não é fato dos tempos atuais, haja
vista ser tema que faz parte dos estudo no campo da Psicologia (Azevedo e Guerra, 2000),
ocupando sempre, dada a sua complexidade, lugar importante nas discussões a respeito do trabalho
clínico com crianças (Azambuja, 2005; Gay e Costa Júnior, 2005) e impondo dilemas éticos que
exigiriam um capítulo especial.
O CFP (2010, p. 38) lembra que
a violência sexual é um problema complexo e delicado. Suas múltiplas causas, interfaces e,
principalmente, o sofrimento psíquico de todas as pessoas envolvidas, exigem extremo cuidado dos
profissionais responsáveis pelo atendimento e de todos os integrantes da rede de proteção.
A ocorrência de situações de violência contra crianças e adolescentes não é fenômeno exclusivo da
atualidade, como também não pode ser analisada de forma descontextualizada da cultura e das
condições impostas pela vulnerabilidade social.
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Como vemos com frequência em nossa rotina de trabalho, o abuso sexual, em muitos casos, é um
episódio intrafamiliar marcado pela existência de vinculação afetiva entre seus integrantes, dependência
econômica entre os cuidadores, negligências, conivências e vulnerabilidades. O manejo desse assunto no
psicodiagnóstico é bastante difícil, porque nem sempre essa questão é trazida prontamente pelos pais ou
responsáveis ou pela própria criança. Temos como compromisso profissional zelar pelo bem-estar da
criança ou adolescente, mas com o cuidado de não cometer imprudências, considerando tratar-se de um
tema que deve ser “contextualizado e tratado conforme as vicissitudes de cada caso e jamais analisado
isoladamente” (CFP, 2007).
Julgamos, ainda, oportuno abordar neste espaço de reflexão outra forma de violência, a violência
social que, apesar de todos os avanços que vivemos, tem tomado forma e dimensão assustadoras.
Segundo Campos (2004, p. 157), a competitividade e desigualdade têm provocadoconsequências sociais
perversas que se traduzem “[…] pelo aumento de: violência; uso de drogas; conflitos e rupturas
familiares; alienação social e política; xenofobia; conflitos étnicos e religiosos; doenças psicossomáticas”.
A convivência com episódios violentos vem, dia a dia, se incorporando à realidade brasileira,
especialmente no cotidiano de crianças e famílias que vivem em regiões com alto índice de
criminalidade.
Na sala de espera de um Centro de Psicologia Aplicada, Luiza, com cerca de 10 anos, está
desenhando enquanto aguarda sua mãe. Uma psicóloga se aproxima e vê o desenho de uma casa
com uma criança ao lado e no alto um grande coração onde está escrito PAZ. Ao perguntar o que
ela queria dizer com aquele desenho, a menina responde que o lugar onde mora é muito violento e
que ela queria que houvesse paz.
Ana, 5 anos de idade, estava com seu pai quando ele foi assassinado a tiros por um assaltante. Os
irmãos de 9 e 7 anos de idade, Otávio e Márcia, presenciaram o pai matar sua mãe a facadas. Pedro,
de 11 anos, assistiu a seu irmão mais velho, usuário de drogas, ser espancado por traficantes…
Esses são apenas alguns dos casos atendidos no psicodiagnóstico.
Do ponto de vista prático, o que fazer diante dos problemas que aqui apresentamos? A proposta do
psicodiagnóstico interventivo é de que o psicólogo não atue apenas como um examinador ou avaliador,
mantendo a neutralidade, mas que, durante esse processo, ataque frontalmente esses temas,
considerando-os não apenas fontes de desestabilização emocional das crianças, compreendidas através
do seu psiquismo, mas também questões sociais que devem ser discutidas com os pais e, eventualmente,
também com as crianças (como nos casos de abuso e violência, ajudando-as a encontrar formas de se
defender).
Acreditamos que faz parte do papel do psicólogo sugerir, apoiar e incentivar os pais ou
39
responsáveis a atitudes ativas, como a de organizar grupos nas comunidades para enfrentar o problema
das drogas de seus filhos, procurar formas de reagir ao banditismo, exigir uma melhor atuação das
escolas ou um atendimento adequado no que se refere à saúde. Enfim, auxiliá-los a conhecer, reconhecer
e batalhar por seus direitos como cidadãos.
Como profissionais da psicologia, cabe-nos, ainda, desenvolver pesquisas sobre esses temas que nos
desafiam e criar grupos de discussão e estudos sobre eles.
Finalmente, embora alguns dos dilemas discutidos neste capítulo pareçam sem solução e em muitos
momentos, como profissionais, sejamos tomados por um sentimento de impotência que quase nos leva a
um estado de paralisação, podemos dizer que ainda há um espaço para nossa atuação, que é o espaço da
crítica, da reflexão, criação e, especialmente, do acolhimento e do respeito. Se as teorias psicológicas
parecem ter chegado aos seus limites, possivelmente não encontraremos uma saída para essas questões
pelo “saber” único da psicologia, mas pela interlocução com outros saberes, pela ética pessoal, pelo
respeito ao outro e suas diferenças. Como “profissionais do encontro” (Figueiredo, 1993),
lidar com o outro (indivíduo, grupo ou instituição) na sua alteridade faz parte da nossa atividade
cotidiana. Mesmo que cheguemos a este encontro com a relativa e muito precária segurança de
nossas teorias e técnicas, o que sempre importa é a nossa disponibilidade para a alteridade nas suas
dimensões de algo desconhecido, desafiante e diferente; algo que no outro nos obriga a um trabalho
afetivo e intelectual; algo que no outro nos propulsiona e nos alcança; algo que no outro se impõe a
nós e nos contesta, fazendo-nos efetivamente outros que nós mesmos.
No que se refere ao psicodiagnóstico interventivo, cabe-nos tentar, conforme dissemos,
compreender e respeitar o mundo do cliente, o que implica contemplar as questões políticas, sociais e
econômicas que estão imbricadas na sua vida e que se não consideradas nos tornarão incapazes de
atingir nosso objetivo. Isso significa que o psicólogo não deve ater-se apenas ao espaço clínico, mas
conhecer o ambiente escolar da criança, suas condições de moradia e seu meio social. Contudo, entrar
nesse mundo implica o confronto com as nossas inquietações e limitações, pois frequentemente nos
perguntamos o que é possível fazer.
Após todos estes anos de prática, entendemos que o enfrentamento dos desafios aqui apresentados
é o caminho que nos levará a manter o psicodiagnóstico interventivo como um procedimento útil para a
compreensão dos que vêm em busca de auxílio psicológico e para a criação de um espaço diferenciado
que permita àqueles que estão envolvidos no processo compartilhar seu sofrimento e encontrar um
novo modo de lidar com sua realidade. Desse modo, por ser uma prática compartilhada e uma
construção conjunta, a resposta para a pergunta feita anteriormente só poderá ser encontrada junto com
os clientes.
40
O ser humano é o ser do desamparo, da falta e a Psicologia, de alguma forma, pode atender a essa
necessidade, não com a ilusão de preencher esse vazio, mas
comprometendo-se a uma constante atualização de seus conhecimentos, sendo para isso necessário
estar atento à realidade que se apresenta e na qual os clientes estão inseridos (Gelernter et al., 2012,
p. 19).
Acreditamos que o psicodiagnóstico interventivo, pelas suas características de valorização do
sujeito como indivíduo e cidadão, vem ao encontro do CFP (2007, p. 20) quando propõe que:
Atuar na valorização da experiência subjetiva do sujeito contribui para fazê-lo reconhecer sua
identidade. Operar no campo simbólico da expressividade e da interpretação com vistas ao
fortalecimento pessoal pode propiciar o desenvolvimento das condições subjetivas de inserção
social. Assim, a oferta de apoio psicológico de forma a interferir no movimento dos sujeitos e no
desenvolvimento de sua capacidade de intervenção e transformação do meio social é uma
possibilidade importante.
Em artigo intitulado Pós-evolucionismo, publicado no caderno Aliás de O Estado de S. Paulo (10 fev.
2013), Paul Kendall refere-se a um robô chamado “Rex — sigla de robotic exoskeleton, que foi montado
pela companhia de robótica Shadow usando membros e órgão artificiais”. Esse robô, exibido no Museu
da Ciência de Londres, mostra que já é possível reconstruir de 60% a 70% do corpo humano e
“prenuncia um futuro no qual órgãos artificiais serão melhores do que aqueles com os quais nascemos”
(OESP, caderno Aliás, p. 2). O artigo termina com a afirmação de um psicólogo suíço, Bertold Meyer, de
que “estamos indo além das fronteiras da evolução”, e de que daqui há alguns anos ter um corpo
natural, normal “será considerado maçante” (ibidem).
Esse será o novo mundo dos psicólogos que se formarão dentro de alguns anos, os quais, como
permite antecipar o exemplo acima, encontrarão desafios ainda inimagináveis para lidar com a
humanidade.
Referências bibliográficas
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Profissão, ano 25, n. 1.
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______. O mal-estar da pós modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
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SOUZA, J. Maniqueísmo de novela. O Estado de S. Paulo, 21 out. 2007.
42
Capítulo II
Psicodiagnóstico interventivo fenomenológico-
existencial
Marizilda Fleury Donatelli
Este capítulo tem por objetivo apresentar o psicodiagnóstico interventivo, destacando seus
pressupostos. Essa prática postulou diferenças significativas, tanto no que se refere à postura do
psicólogo quanto à postura do cliente. Acrescentou-se ao processo, que se caracterizava somente pela
investigação, um caráter interventivo. Descrevo a seguir os principais aspectos deste modelo de
atendimento psicológico.
1. Psicodiagnóstico como processo de intervenção
Durante muito tempo, o psicodiagnóstico foi entendido como um processo que se desenvolvia a
partir de um levantamento de dados do cliente (queixa, história de vida pregressa e atual, funcionamento
psíquico etc.), cabendo ao psicólogo analisar esses dados com base na nosologia psicopatológica e dar o
encaminhamento possível para o caso. Evitavam-se, nesse processo, estabelecer vínculo com o paciente e
fazer intervenção, sendo esses procedimentos delegados aos processos psicoterápicos.
Ocampo e Arzeno (1981, p. 13) comentam:
O psicólogo tradicionalmente sentia sua tarefa como o cumprimento de uma solicitação com as
características de uma demanda a ser satisfeita, seguindo os passos e utilizando instrumentos
indicados por outros (psiquiatra, psicanalista, pediatra, neurologista etc.). O objetivo fundamental
de seu contato com o paciente era, então, a investigação do que este faz frente aos estímulos
apresentados.
43
Fischer, nos Estados Unidos, nos anos 1970, e M. Ancona-Lopez, no Brasil, na década de 1980,
foram as precursoras na introdução do psicodiagnóstico interventivo, o qual, como indica o próprio
nome, rompe com o modelo anterior, fazendo do atendimento um processo ativo e cooperativo. Não se
trata apenas de um processo investigativo; ao contrário, o que fundamentalmente o caracteriza é a
possibili-dade de intervenção. No psicodiagnóstico interventivo fenomenológico-existencial, as questões
trazidas pelos clientes são ao mesmo tempo investigadas e trabalhadas, a fim de que se possam construir,
em conjunto, possíveis modos de compreendê-las.
As intervenções no Psicodiagnóstico Interventivo se caracterizam por propostas devolutivas ao
longo do processo, acerca do mundo interno do cliente. São assinalamentos, pontuações, clarificações,
que permitem ao cliente buscar novos significados para suas experiências, apropriar-se de algo sobre si
mesmo e ressignificar suas experiências anteriores.
A esse respeito, Santiago (1995, p. 17) informa que os profissionais
[…] reconhecem a necessidade de fazer certos apontamentos ao paciente durante o processo
Psicodiagnóstico por considerarem que o trabalho alcança uma dimensão mais ampla e
compreensiva. Também argumentam a favor de devoluções parciais e de realizar um trabalho em
conjunto com o paciente.
No caso do psicodiagnóstico infantil, esse processo pressupõe a implicação da família na
problemática, atribuída à criança, na queixa. Parte da ideia de que, se a criança apresenta um
comportamento que atinge os pais, mobilizando-os a procurar por um psicólogo, a família está, de
algum modo, envolvida no problema. Além disso, como diz Yehia (1995, p. 118):
[…] mesmo sendo a criança a precisar de atendimento psicológico, são os pais que arcam com
muitos dos custos do atendimento infantil; o tempo para levar e buscar a criança, o pagamento das
sessões (quando estas são gratuitas, o pagamento das conduções) e os possíveis efeitos
transformadores do atendimento infantil na dinâmica da família.
Esse modo de compreender o psicodiagnóstico decorre, como já mencionado, da concepção de
homem e de mundo postulada pela fenomenologia existencial, isto é, considera o ser humano como um
ser sempre em relação, cuja subjetividade se constitui pelas relações que o indivíduo estabelece no
decorrer de sua existência. Dessa forma, os pais ou responsáveis também são clientes e têm participação
ativa no referido processo.
2. Psicodiagnóstico como prática colaborativa
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O psicodiagnóstico é visto como uma prática conjuntamente realizada pelo psicólogo, pelos pais e
pela criança. Os pais e a criança têm uma participação ativa nesse tipo de diagnóstico; atribui-se grande
valor às informações trazidas pelos pais, à forma de compreensão do problema do filho, às explicações
prévias, às fantasias e expectativas construídas antes e no momento da procura do psicólogo. Nessa
medida, não há uma relação verticalizada, pois o psicólogo não se põe no lugar de quem “detém o
saber”; ao contrário, dialoga com os clientes no sentido de construírem, juntos, possíveis modos de
compreensão acerca do que está acontecendo com a criança.
3. Psicodiagnóstico como prática compartilhada
Em tal modalidade de atendimento, o psicólogo compartilha com os clientes suas impressões,
permitindo que estes as legitimem ou ainda as transformem. Entende-se que é no compartilhar de
experiências e percepções que pode emergir uma nova compreensão, um novo sentido, que possibilite
diminuir ou eliminar o sofrimento psíquico da criança e da família.
Essa é uma posição derivada da Psicologia Fenomenológica, na medida em que entende o indivíduo,
em seu “estar no mundo”, como uma pessoa consciente, capaz de fazer escolhas e de responsabilizar-se
por elas, diante de quem se abre um leque de possibilidades. As intervenções do psicólogo, obtidas por
meio de suas percepções, se oferecem como possibilidades para ampliar o campo de consciência da
pessoa, permitindo novas experimentações.
Para S. Ancona-Lopez (1991, p. 87), o processo de psicodiagnóstico interventivo, quando efetuado
numa abordagem fenomenológico-existencial, “é uma prática colaborativa, contextual e
intervencionista”.
Yehia (1995, p. 120) complementa: “A situação do psicodiagnóstico torna-se então uma situação de
cooperação, em que a capacidade de ambas as partes observarem, apreenderem, compreenderem
constitui a base indispensável para o trabalho.
4. Psicodiagnóstico como prática de compreensão das vivências
O registro das experiências que as pessoas vão tendo ao longo da vida e às quais atribuem sentido
constitui seu campo fenomenal.
No psicodiagóstico interventivo fenomenológico-existencial, o psicólogo busca compreender esse
campo fenomenal e evita que as explicações teóricas se anteponham ao sentido dado pelo cliente.
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M. Ancona-Lopez (1995) comenta que, quando do desenvolvimento do processo de
psicodiagnóstico interventivo, ocorreu na equipe que o desenvolvia uma mudança no modo de
compreender a relação entre teoria e prática. A prática, embora planejada a partir de indicações teóricas,
ultrapassa a teoria de referência, expondo o psicólogo a experiências que não são abarcadas pelos
conceitos teóricos. Desse modo, torna-se local privilegiado paraapontar lacunas do conhecimento
teórico e produzir questionamentos. Segundo Ancona-Lopez, M. (1995, p. 93),
No Psicodiagnóstico essa posição trouxe como consequência a valorização do conhecimento
pessoal do cliente e de seus pais, assim como a necessidade de se trabalhar desde o início de modo
conjunto e participativo, evitando guiar-se perante o caso apenas a partir de referências teóricas.
A fim de que possa compreender o campo fenomenal, o psicólogo deve, com os clientes,
desconstruir a situação apresentada e buscar seu significado principal. Ancona-Lopez (1995, p. 94)
discorre:
A queixa deixou de ser vista de modo isolado para tornar-se via de acesso ao mundo do sujeito, a
seus objetos intencionais, e aos conflitos nele instalados, considerando-se o esclarecimento dos
significados ali presentes como processo necessário para uma possível re-significação e consequente
modificação do modo de estar consigo e com o outro.
A identificação da experiência do outro, bem como seu significado, é uma tarefa que exige, de
alguma maneira, que o psicólogo se reconheça nesse outro. Portanto, é preciso que haja um
envolvimento existencial; é preciso mergulhar no mundo do cliente, compartilhar seus códigos, deixar-se
enredar por sua trama de sentidos e, ao mesmo tempo, conseguir uma distância suficiente que permita
refletir sobre a situação.
M. Ancona-Lopez (1995, p. 94), referindo-se a esse aspecto, observa que ele se apoia no conceito de
intersubjetividade, o qual afirma a possibilidade de “reconhecer o outro como um outro eu, que,
possuindo um corpo inserido em um mundo, portador de comportamentos e construtor de significados,
constitui a si e ao mundo”.
5. O psicodiagnóstico interventivo como prática descritiva
O Psicodiagnóstico, conforme concebido tradicionalmente, busca obter um diagnóstico do
indivíduo, classificando-o quanto às patologias, a partir das definições das características de
personalidade e fatores específicos, como nível mental e outros.
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O psicodiagnóstico interventivo evita classificações. Não pretende montar um quadro estático
sobre o sujeito. É um modelo descritivo na medida em que faz um recorte na vida da pessoa, em dado
momento e em determinado espaço, focalizando seu modo de estar no mundo, com os significados nele
implícitos.
6. O psicodiagnóstico interventivo e o papel do psicólogo e dos clientes
Convém reiterar que os clientes, nesse atendimento, têm um papel ativo, participam da construção
de uma compreensão sobre o que acontece com eles. O psicólogo solicita e valoriza a sua colaboração
na intenção de que o esforço conjunto possa produzir novo entendimento para as questões por eles
trazidas.
Desse modo, tanto as experiências do cliente quanto as impressões do psicólogo sobre elas são
compartilhadas, caindo por terra a ideia de que existem aspectos que não devem ser mencionados pelo
psicólogo ao cliente: o importante é como dizer, e não o que dizer.
Nesse sentido, diz M. Ancona-Lopez (1995, p. 98):
Pais e psicólogo engajam-se no processo de criação de sentido e, diminuída a assimetria na relação,
o conhecimento profissional perde seu caráter de verdade, mostrando-se como uma forma possível
de significação.
DESCRIÇÃO DO ATENDIMENTO EM PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO
NA ABORDAGEM FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL
Essa modalidade de atendimento pode ser realizada individualmente, ou com mais frequência, nas
instituições. As etapas do processo são as mesmas, em ambos os casos. Nesta descrição, apresento minha
forma de trabalhar, individualmente, em psicodiagnóstico interventivo fenomenológico-existencial.
1. Entrevista inicial
Para a entrevista inicial convoco somente os pais. Inicio com os cumprimentos e apresentações
habituais e deixo-os falar sobre como vieram até mim, por que e o que esperam. Em seguida, converso
sobre minha forma de trabalhar, ou seja, compartilho com eles o fato de o psicodiagnóstico ser um
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processo cujo objetivo é compreender aquilo que ocorre com a criança e com eles, pais, na relação com
o filho, dos motivos que levam a criança a apresentar determinados comportamentos, bem como o que é
possível fazer para ajudá-la. Explico que parto da ideia de que se a criança tem uma dificuldade, os pais
estão implicados nela, e que, por essa razão, a participação deles no processo é fundamental. Enfatizo
que não se trata de um diagnóstico feito somente por mim, mas que buscaremos juntos compreender o
que se passa, que eles são parte ativa do atendimento, e que tanto as informações por eles fornecidas
como seu modo de entender a criança são essenciais para a efetivação do processo. Explico ainda as
visitas domiciliar e escolar que fazem parte do atendimento e que serão realizadas durante seu curso.
Combino dia, horário, falo a respeito do sigilo. Certifico-me de que os pais compreenderam minha fala e
pergunto-lhes se concordam com o que apresentei. Procuro, por meio de seu discurso, entender as
expectativas em relação ao processo. Busco entender os aspectos manifestos e latentes da demanda.
Deixo que eles falem sem interrupções. As eventuais dúvidas ou perguntas que tenha a fazer deixo para
depois que os pais derem sinal de que concluíram o que tinham para comunicar. Procuro observar os
temores, as fantasias, as angústias que eles demonstram ao se referir à criança, a si mesmos e à vida de
modo geral. Começo a notar quais são as explicações que constroem para dar conta de sua queixa, dos
sintomas apresentados pela criança. A esse respeito, M. Ancona-Lopez (1995, p. 98) relata:
O valor atribuído à escolha, responsabilidade e autonomia do cliente para imprimir direções à sua
existência leva os psicólogos a privilegiar na relação clínica a participação dos pais, a valorização do
esforço pessoal e a abrir espaço para as crenças e construções explicativas que criaram para dar
conta das angústias levantadas pelos conflitos gerados pelos papéis, funções e jogos familiares.
No caso de comparecer o casal, tento compreender se ambos têm as mesmas demandas e se
atribuem a elas os mesmos significados. Desse modo, vou sendo transportada para outro universo que
não é o meu, mas no qual, de algum modo, também me reconheço. Assim Yehia (1995, p. 120) diz:
Compreender é participar de um significado comum, do projeto do cliente, de sua abertura e
limitações para o mundo. É importante identificar os acontecimentos e a forma como se
desenvolveram em relação a seu contexto, gerando a pergunta, precipitando a crise e levando ao
pedido de atendimento.
Após essa primeira imersão na teia de significados construídos pelos clientes, procuro fazer
eventuais intervenções de esclarecimento e pontuações, de tal forma que possa compartilhar com eles
minhas impressões e eles possam ou não legitimá-las. É nessa interação entre o que eles me falam e o
que eu apreendo do que me dizem que vamos estabelecendo um modo de trabalho que permite emergir
de nós possibilidades de compreensão.
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Geralmente, verifico se a sessão atendeu ao objetivo, que é a contextualização da queixa e o
esclarecimento da forma de trabalho e, caso ainda existam dúvidas, conversamos sobre o
prosseguimento da entrevista no próximo encontro, no qual pretendo também aclarar determinados
pontos. Informo aos pais que o atendimento posterior será destinado a conhecer a história de vida da
criança e que, provavelmente, dedicaremos a esse tema um ou dois encontros.
2. História de vida da criança
O segundo encontro destina-se à anamnese, que pode ser feita de duas formas. Segundo M.
Ancona-Lopez (1995), é possível entregar o questionário de anamnese aos pais, que o levam para casa e
lá o respondem. Quando retornam ao atendimento, conversam com o profissional sobre suas respostas e
sobre como responderam ao questionário: se apenas o pai ou a mãe o fez ou se a família se reuniu em
torno dos temas, revivendo sua história, se consultaram outros membros da família em relação às
informações etc. Outra forma de encaminhamento da questão é entrevistar os pais ou responsáveis
durante o atendimento. Essa é a maneira que

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