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Neopaganismoterraspiagas-Sousa-2021

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O NEOPAGANISMO EM TERRAS DE PIAGAS: EXPERIÊNCIAS 
NEOPAGÃS, ASPECTOS FORMADORES DO PIAGANISMO E A 
CONSTRUÇÃO DA VILA PAGÃ NO PIAUÍ (2007-2021) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ANTONIO EMANUEL BATISTA DE SOUSA 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA 
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: HISTÓRIA E ESPAÇOS 
LINHA DE PESQUISA: LINGUAGUENS, IDENTIDADES E ESPACIALIDADES 
 
 
 
 
 
 
O NEOPAGANISMO EM TERRAS DE PIAGAS: EXPERIÊNCIAS 
NEOPAGÃS, ASPECTOS FORMADORES DO PIAGANISMO E A 
CONSTRUÇÃO DA VILA PAGÃ NO PIAUÍ (2007-2021) 
 
 
 
 
 
 
 
 
ANTONIO EMANUEL BATISTA DE SOUSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL-RN 
2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN 
Sistema de Bibliotecas - SISBI 
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA 
 
 Sousa, Antonio Emanuel Batista de. 
 O neopaganismo em terras de piagas: experiências neopagãs, 
aspectos formadores do Piaganismo e a construção da Vila Pagã no 
Piauí (2007-2021) / Antonio Emanuel Batista de Sousa. - 2021. 
 188f.: il. 
 
 Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e 
Artes, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, 2022. 
 Orientador: Prof. Dr. Sebastião Leal Ferreira Vargas Netto. 
 
 
 1. Neopaganismo - Dissertação. 2. Paganismo Piaga - 
Dissertação. 3. Ciberespaço - Dissertação. 4. Espaço Sagrado - 
Dissertação. 5. Vila Pagã - Dissertação. I. Vargas Netto, 
Sebastião Leal Ferreira. II. Título. 
 
RN/UF/BS-CCHLA CDU 94 
 
 
 
 
 
 
Elaborado por Ana Luísa Lincka de Sousa - CRB-15/748 
 
ANTONIO EMANUEL BATISTA DE SOUSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O NEOPAGANISMO EM TERRAS DE PIAGAS: EXPERIÊNCIAS 
NEOPAGÃS, ASPECTOS FORMADORES DO PIAGANISMO E A 
CONSTRUÇÃO DA VILA PAGÃ NO PIAUÍ (2007-2021) 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada como requisito parcial para 
obtenção do título de Mestre em História no Programa de 
Pós-Graduação em História; Área de Concentração em 
História e Espaços; Linha de Pesquisa: Linguagens, 
Identidades e Espacialidades; Centro de Ciências 
Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Rio 
Grande do Norte, sob a orientação do Prof. Dr. Sebastiao 
Leal Ferreira Vargas Netto. 
 
 
 
 
 
 
NATAL-RN 
2021 
ANTONIO EMANUEL BATISTA DE SOUSA 
 
 
 
O NEOPAGANISMO EM TERRAS DE PIAGAS: EXPERIÊNCIAS 
NEOPAGÃS, ASPECTOS FORMADORES DO PIAGANISMO E A 
CONSTRUÇÃO DA VILA PAGÃ NO PIAUÍ (2007-2021) 
 
 
Dissertação considerada aprovada para obtenção do título de Mestre em História no Programa 
de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
_______________________________________________________ 
Prof. Dr. Sebastião Leal Ferreira Vargas Netto – UFRN 
(Orientador) 
 
_______________________________________________________ 
Prof. Dr. Magno Francisco de Jesus Santos – UFRN 
 (Avaliador Interno) 
 
 
_______________________________________________________ 
Profa. Dra. Beatriz de Miranda Brusantin – UNICAMP 
 (Avaliadora Externa) 
 
 
Natal, 02 de dezembro de 2021 
DEDICATÓRIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A todos os contadores de “histórias de trancoso”. 
 
AGRADECIMENTOS 
A um Deus que estou cultivando, pelas oportunidades, por me conceder serenidade e 
discernimento para reconhecer situações e superar adversidades. 
A meu orientador que foi mais que um mestre, mas um amigo, sempre com muita 
paciência, cumplicidade e compreensão. 
A meu grande amigo Jardel, por todo apoio e motivação que me passou na condução 
desta pesquisa e, sobretudo, pela amizade, pelas conversas sobre as incertezas da vida, pelos 
filmes compartilhados, pelas cervejas bebidas, pelos jogos de cartas e dominó, noite adentro. 
Obrigado por tudo, meu amigo. 
A meu amigo Rafael Nolêto, que através desta pesquisa pude construir uma grande 
amizade. Por sempre ter andando lado a lado comigo na construção deste trabalho, por todo 
apoio, por toda ajuda e disponibilidade de sempre. Um exemplo de coragem e determinação 
para fazer acontecer o que acredita, foi uma honra construir uma pequena história sobre um 
pouco de sua trajetória de vida. 
As amizades que fiz em Natal. Em primeiro lugar, à Tamires, menina alegre e gentil, 
que já conhecia desde a graduação, mas só no mestrado tivemos a oportunidade de conceber 
uma singela relação de amizade. À Aressa, pela boa companhia, sempre com irreverência e 
leveza em um mundo acadêmico sisudo e cinza. À Kallyne, parceira de orientador e de tema 
de pesquisa, além de um grande ser humano, sempre solicita nas ocasiões que necessitei de 
ajuda. 
A meus amigos de moradia. A Douglas, um amigo, que, assim como eu, chegou em 
Natal com a coragem de encarar um curso de mestrado mesmo com tantos desafios. À Ingrid, 
pela pessoa maravilhosa que tive a oportunidade de conhecer melhor com a convivência, 
sempre com boas conversas e sorrisos. 
A minha família, a razão pelo qual eu batalho todos os dias, e por isso tive que encarar 
as distâncias físicas para seguir no sonho. Em especial, a minha mãe Lucia, meus irmãos 
Paulo e Mikaely, meu pai Luís Manoel, meu cunhado Júnior e meu sobrinho amado, José 
Davi. Como também a meu pai Manoel Filho pela ajuda financeira que me deu por todo este 
período. 
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e, em especial, ao Programa de Pós-
Graduação em História por promover a oportunidade de curso de mestrado nesta instituição 
renomada, assim como a todos os excelentes professores do curso que lançaram suas 
contribuições para esta pesquisa. 
A todos, meus agradecimentos e reconhecimento de que sem cada um de vocês esta 
imensa tarefa teria sido muito mais difícil. Vocês foram a certeza de que a pesquisa é 
individual, mas nunca sozinha. Obrigado! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Todos os meus livros são simples tentativas de 
rodear e devassar um pouquinho o mistério 
cósmico, esta coisa movente, impossível, 
perturbante, rebelde a qualquer lógica, que é 
chamada realidade, que é a gente mesmo, o 
mundo, a vida. Antes o obscuro que é o óbvio, 
que o frouxo. Toda obra contém inevitável dose 
de mistificação. Toda mistificação contém boa 
dose de inevitável verdade. Precisamos também 
do obscuro. 
Guimarães Rosa 
RESUMO 
Este estudo analisa como foram construídas e instituídas determinadas relações espaciais 
oriundas de experiências socioreligiosas e históricas de neopagãos, em especial, os ―novos 
piagas‖, entre os anos de 2007 e 2021. Primeiramente, foi realizada uma breve abordagem 
historiográfica acerca da constituição da noção de neopaganismo, bem como discutiu-se a 
polissemia deste conceito, destacando suas temporalidades e relações de neopagãos com 
algumas espacialidades ao longo dos séculos XIX e XX. Situado o debate, sobretudo a partir 
de práticas provenientes do neopaganismo no Brasil, foram analisados aspectos relacionados 
às experiências e sociabilidades de neopagãos piauienses, tanto as que ocorreram 
presencialmente, quanto as que foram forjadas por meio dos ciberespaços. Utilizando diversos 
suportes documentais, produzidos principalmente pelo jornalista Rafael Nolêto, busquei 
compreender, também, como neopagãos piauienses fundamentaram e sistematizaram a 
vertente religiosa politeísta denominada de ―Paganismo Piaga‖ ou, simplesmente, 
―Piaganismo‖, e, por seguinte, construíram uma Vila Pagã (localizada na zona rural do 
município de José de Freitas-PI),no qual foi instituída como um espaço sagrado. Para o 
desenvolvimento destas discussões, partiu-se, em cada capítulo, de algumas antinomias que 
atravessam o conceito de neopaganismo e questões a cerca das fundamentações e 
sistematizações do Paganismo Piaga, com o intuito de identificar aspectos que envolvem suas 
devidas temporalidades e as relações espaciais decorrentes. 
Palavras-chave: Neopaganismo; Paganismo Piaga; Ciberespaço; Espaço sagrado; Vila Pagã. 
 
 
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
This study analyzes how certain spatial relationships arising from socio-religious and 
historical experiences of neopagans were built and instituted, in particular, the "new piagas", 
between the years 2007 and 2021. Firstly, a brief historiographical approach was carried out 
on the constitution of the notion of neopaganism, as well as the polysemy of this concept was 
discussed, highlighting its temporalities and neopagan relations with some spatialities 
throughout the 19th and 20th centuries. Based on the debate, especially from practices 
originating from neopaganism in Brazil, aspects related to the experiences and sociability of 
Piauí neopagans were analyzed, both those that occurred in person and those that were forged 
through cyberspaces. Using various documental supports, produced mainly by the journalist 
Rafael Nolêto, I also sought to understand how Piauí neopagans founded and systematized the 
polytheistic religious strand called ―Piagan Paganism‖ or simply ―Piaganism‖, and, 
subsequently, built a Pagã Village. (located in the rural area of the municipality of José de 
Freitas-PI), in which it was established as a sacred space. For the development of these 
discussions, in each chapter, we started with some antinomies that cross the concept of 
neopaganism and questions about the foundations and systematization of Piaga Paganism, in 
order to identify aspects that involve its due temporalities and spatial relationships arising. 
Keywords: Neopaganism; Piaga Paganism; Cyberspace; Sacred space; Pagan Village. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
EMPI - Encontro Místico do Piauí............................................................................................17 
ESPPI - Encontro Social de Pagãos do Piauí............................................................................66 
 
 
 
13 
 
LISTA DE IMAGENS 
Imagem 1: Vista Panorâmica da Vila Pagã, novembro de 2017..............................................18 
Imagem 2: Primeira edição do então folhetim ―O Bruxo‖ lançada em março de 
2007...........................................................................................................................................66 
Imagem 3: Trigésima segunda edição do jornal ―O Bruxo‖, lançada em julho de 
2009...........................................................................................................................................72 
Imagem 4: Encontro ―Magia na ilha‖, com os bruxos Arnold e Rafael Nolêto, as bruxas 
Nelma, Naiane e Bianca............................................................................................................73 
Imagem 5: Registro rupestre localizado no Parque Nacional de Sete Cidades – Piauí.........100 
Imagem 6: Capa de livreto informativo acerca do Paganismo Piaga.....................................105 
Imagem 7: Representação da Roda do Ano Piaga.................................................................114 
Imagem 8: Estrutura detalhada (e mais atualizada) com as áreas construídas e projetadas na 
Vila Pagã.................................................................................................................................121 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 
 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................15 
CAPÍTULO I - “A busca de raízes no passado”: historicidades e espacialidades do 
neopaganismo............................................................................................................................30 
1.1. Neopaganismo: uma breve abordagem sobre a polissemia do termo................................32 
1.2. Gerald Brosseau Gardner: ―um bruxo de seu tempo‖ ....................................................40 
1.3. A Wicca nas Américas: uma breve abordagem voltada para a sua circulação nos Estados 
Unidos e no Brasil.....................................................................................................................49 
CAPÍTULO II - “Em pleno século XXI, no auge da civilização tecnológica, a magia 
continua em alta”: experiências neopagãs no Piauí................................................................60 
2.1. “Levando conhecimento e magia aos seus leitores”: Jornal O Bruxo...........................63 
2.2. ―Rádio Grito de Bruxa”: um podcast neopagão.............................................................78 
2.3. “Bruxaria e neopaganismo na rede virtual”: a TV Mística..........................................85 
CAPÍTULO III “Entusiastas do movimento de resgate”: fundamentos do Paganismo 
Piaga e a construção da Vila Pagã............................................................................................92 
3.1. A invenção de uma tradição: o Piaganismo....................................................................96 
3.2. A sistematização do Paganismo Piaga: mitologia, cultura popular e deuses ..............104 
3.3. “Um tesouro místico no interior do Piauí”: a Vila Pagã.............................................119 
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................128 
FONTES.................................................................................................................................133 
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................134 
ANEXOS................................................................................................................................140 
15 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
“[...]o paganismo é um movimento cultural e 
religioso, composto por diversas formas de 
espiritualidades pagãs. Essas espiritualidades 
têm em comum 3 elementos: politeísmo, culto à 
natureza e aos ciclos naturais e culto à 
ancestralidade sagrada.
1
 
Rafael Nolêto 
 
1
 Entrevista com Rafael Noleto: bruxo piauiense, sacerdote pagão e idealizador do círculo piaga e da vila pagã. 
Disponível em: https://causosassustadoresdopiaui.wordpress.com/2017/03/26/entrevista-com-rafael-noleto-
bruxo-piauiense-sacerdote-pagao-e-idealizador-do-circulo-piaga-e-da-vila-paga/. Acessado em: 28 de outubro de 
2021. 
16 
 
O sistema religioso denominado de neopaganismo é uma tendência atribuída por 
estudiosos e adeptos para se referirem a uma variedade de vertentes religiosas politeístas 
contemporâneas, que, por sua vez, têm crescido bastante na Europa e nas Américas desde a 
segunda metade do século XX. A vertente mais influente e predominante é a Wicca,
2
 também 
chamada de moderna bruxaria pagã, sistematizada a partir das concepções teóricas do inglês 
Gerald Brosseau Gardner.
3
 Nesse contexto, o neopaganismo de vertente Wiccana foi pensado 
por Gerald Gardner como uma continuação de um eventual paganismo antigo europeu, 
adaptado às inquietações do mundo contemporâneo. Todavia, esse entendimento é alvo de 
questionamento sob duas hipóteses, principalmente no campo historiográfico, tanto no que diz 
respeito à possibilidade de existência de um paganismo definido e organizado em um período 
pré-cristão, como se realmente seria possível reconstruírem, ressignificarem ou mesmo 
resgatarem costumes e práticas religiosas que teriam sobrevivido na obscuridade porcentenas 
de anos na Europa. 
Em termos metodológicos específicos, os trabalhos antropológicos que aqui foram 
dialogados costumam tomar a primeira hipótese citada no parágrafo anterior não somente 
como possível, mas fundamental para o entendimento do conceito de neopaganismo. Isto 
posto, segundo a antropóloga Danieli Soares (2007) ―[...] a contemporaneidade possui novas 
formas de lidar com as manifestações em geral, sobretudo a partir da década de 1950, quando 
a bruxaria é adaptada para os ‗tempos modernos‘ e acaba ressurgindo com novas 
características e, desta forma, a Antiga Religião é ressignificada‖.
4
 Neste seguimento, na 
historiografia, independentemente do questionamento se de fato existiu ou não uma ―Antiga 
Religião‖ a ser ressiginifacada, analisei a produção deste conceito dentro dos debates e visões 
de época em que o mesmo foi elaborado. 
O discurso comum entre adeptos das mais variadas vertentes que compõe o 
neopaganismo é fincado na ideia de que suas crenças estão promovendo ―[...] o ressurgimento 
na sociedade contemporânea de uma espiritualidade centrada na percepção da Terra como 
sagrada‖.
5
 Portanto, como o neopaganismo é utilizado para designar diversas vertentes 
 
2
 BEZERRA, Karina Oliveira. Paganismo contemporâneo no Brasil: a magia da realidade. Tese (Doutorado) - 
Universidade Católica de Pernambuco. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião. Doutorado em 
Ciências da Religião, 2019. 
3
 A Bruxaria contemporânea surge em 1950, na Inglaterra, fundada pelo funcionário público inglês Gerald 
Brosseau Gardner, que mais tarde veio se tornar o Pai da Bruxaria Moderna. Ver: ARAÚJO, Kallyne Fabiane 
Pequeno de. Wicca, religião e natureza: Bruxaria e espaços sagrados no Brasil. Dissertação de Mestrado - 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Programa de Pós-Graduação em História e Espaços, 2020, p. 48. 
4
 SOARES, Danieli Siqueira. Rituais contemporâneos e o neopaganismo brasileiro: o caso da Wicca. 
Dissertação de mestrado. Recife: UFPE, 2007, p. 52. 
5
 OLIVEIRA, Rosalira. Ouvindo uma Terra que fala: o renascimento do Paganismo e a Ecologia. São Paulo: 
Revista Nures, 2009, p. 02. 
17 
 
religiosas, algumas vivenciariam espiritualidades completamente atuais, enquanto outras 
vertentes buscariam, pretensamente, reconstruir, resgatar ou reviver aspectos e costumes 
religiosos como encontrados em fontes históricas, arqueológicas, folclóricas e literárias. Dessa 
forma, mesmo nos dias atuais, muitos grupos ainda se veem como uma espécie de herdeiros 
históricos de um suposto paganismo antigo.
6
 
É importante ressaltar que compreendo os aspectos decorrentes de experiências 
neopagãs contemporâneas como formas de construção de vertente religiosa e não de um 
possível resgate de tradições pagãs. Segundo a antropóloga Rosalira Soares (2009), ―[...] trata-
se, portanto, de uma reconstrução baseada em diversas fontes (históricas, mitológicas, 
artísticas, etc.) associada a uma tentativa de adaptar uma religiosidade antiga às inquietações 
presentes na sociedade contemporânea‖
7
, porém, não acredito na hipótese de que, de fato, seja 
possível até mesmo reconstruir tradições alegadamente milenares pela própria limitação que o 
tempo impõe sobre o acúmulo de experiências humanas. O que nos chega atualmente de 
conhecimento sobre culturas e sociedades pré-cristãs são, em sua maioria, características 
gerais de práticas e costumes, e não um detalhamento específico sobre determinada prática 
religiosa ou espiritual. 
Considerando o crescimento do número de adeptos do neopaganismo e o surgimento 
de novas vertentes religiosas politeístas em determinados países ocidentais e partindo do 
interesse particular nas discussões sobre história dos conceitos
8
, tradições inventadas
9
, 
ciberespaço
10
, cibercultura
11
, e espaço sagrado
12
, este estudo tem como problemática discutir 
sobre relações espaciais resultantes de experiências que envolvem o neopaganismo, sobretudo 
no Piauí, entre os anos de 2007 e 2021, com enfoque, em especial, para o Paganismo Piaga e a 
Vila Pagã, localizada no município de José de Freitas-PI. No entanto, antes de adentramos 
 
6
 Ressalta-se que não afirmo e nem defendo, aqui, que existiu de fato um ―Paganismo Antigo‖ organizado, 
definido e consolidado entre as mais diferentes culturas dos povos antigos onde hoje é a Europa Ocidental atual. 
Entendemos, portanto, que existiram diversas e variadas formas de crenças nas mais diferentes épocas, povos e 
localidades. O conceito de paganismo neste estudo é entendido como uma categoria geral que a Igreja Católica, 
desde a sua consolidação ainda no Império Romano, nomeou toda manifestação espiritual que não fosse cristã e 
logo mais foi retomado por intelectuais do século XIX e estudiosos do século XX como uma categoria para se 
pensar e definir um suposto passado religioso pré-cristão europeu. 
7
 OLIVEIRA, Rosalira. Ouvindo uma Terra que fala: o renascimento do Paganismo e a Ecologia. São Paulo: 
Revista Nures, 2009, p. 03. 
8
 KOSELLECK, R. Futuro Passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: 
Contraponto (PUC-Rio), 2006. 
9
 HOBSBAWN, Eric e RANGER, Terence. A Invenção das Tradições. – Tradução de Celina Cavalcante – Rio 
de Janeiro: Paz e Terra, 1997. 
10
 FRONZA, Cristiane Guse. O ciberespaço como lugar de contracultura. Dissertação (mestrado). 
Universidade Federal de Mato Grosso. Instituto de linguagens. Programa de Pós-graduação em estudos de 
cultura contemporânea. 2014, p. 45. 
11
 LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999. 
12
 ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano. Trad. Rogério Fernandes. São Paulo: Martins Fontes, 1992 
18 
 
mais especificamente sobre o que seja o Paganismo Piaga ou Piaganismo e quais foram os 
seus desdobramentos, é importante destacar que os debates e experiências decorrentes do 
neopaganismo no Piauí ocorreram em um período em que a internet possibilitou muitos 
contatos entre iniciantes e simpatizantes.
13
 
De acordo com Rafael Nolêto (2020), jornalista, sacerdote Piaga e um dos fundadores 
da Vila Pagã, a internet foi e ainda é um espaço fértil para a sociabilidade entre neopagãos, 
pois foi ―[...] através de uma comunidade no Orkut, chamada ―Bruxaria/Wicca Teresina‖, que 
estabeleci contato com outros adeptos de diferentes caminhos da bruxaria‖.
14
 Nesse sentido, 
através desse grupo foram promovidos os primeiros encontros públicos de neopagãos e 
simpatizantes em Teresina, em março de 2007, quando Rafael Nolêto participou pela primeira 
vez de um encontro neopagão, conhecido como ESP (Encontro Social Pagão). 
No primeiro encontro, Rafael Nolêto destaca que cerca de 13 pessoas estiveram 
presentes e que, ao longo de outros eventos, que geralmente aconteciam mensalmente ou a 
cada dois meses, a média de participantes era de 5 a 15 pessoas, ―[...] sendo que o maior 
número de pessoas foi na 10ª edição do Encontro Místico do Piauí (EMPI), em Teresina, 
realizado em 26 de outubro de 2008, contando com uma média de 40 pessoas‖.
15
 O número de 
pessoas nos eventos variava bastante, pois a maioria das pessoas era apenas simpatizante ou 
curiosa. O período entre os anos de 2007 e 2012 foi marcado por diversas reuniões, produções 
de conteúdos e, mais especificamente, entre 2011 e 2012, por ―[...] reflexões pessoais sobre 
crenças e práticas minhas e de outros neopagãos de Teresina, vivenciamos juntos um processo 
de busca por uma identidade enquanto grupo‖.
16
 
Justamente pela falta de uma identidade ou de um eixo pelo qual pudessem ser 
reconhecidos, aquele grupo de jovens, paralelamente com a idealização da Vila Pagã, 
iniciaram um propósito de fortalecer vínculos e identidades, o qual desencadeou na formação 
do Círculo Piaga – grupo de estudos e práticas do que consideram ser uma ―herança pagã 
ancestral‖.17
 Com isso, o Paganismo Piaga passou a se caracterizar como uma vertente 
neopagã baseada em estudos bibliográficos sobre neopaganismo, além de produções literárias 
e tradições tidas como folclóricas da região. Dessa forma, embora seja caracterizado também 
como um sistema religioso, o Paganismo Piaga é fundamentado em princípios filosóficos e 
 
13
 OSÓRIO, Andréa. Bruxas modernas na rede virtual: a internet como espaço de sociabilidade e disputas 
entre praticantes de Wicca no Brasil. In: Sociedade e Cultura. V.8, N.1, Jan/Jun, 2005. 
14
 NOLÊTO, Rafael. Entrevista concedida a Antônio Emanuel Batista de Sousa. Piauí, 27 de outubro de 
2020. 
15
 Idem. 
16
 NOLÊTO, Rafael. Entrevista concedida a Antônio Emanuel Batista de Sousa. Piauí, 27 de outubro de 
2020. 
17
 Idem. 
19 
 
culturais do neopaganismo em sua concepção mais geral por considerar a influência de 
diferentes panteões religiosos em sua estrutura. Desse modo, os adeptos desta crença se 
denominam ―Piagas‖, ―Pagãos Piagas‖ ou simplesmente ―Pagãos‖. 
A partir do envolvimento de Rafael Nolêto com outros neopagãos, como destacamos 
anteriormente, surgiu a oportunidade de se construir um espaço na zona rural do município de 
José de Freitas-PI, a partir de 2013, sendo mais adiante denominado de Vila Pagã, que, 
segundo seus membros, se tornaria um espaço de espiritualidade e conexão com a magia 
natural, configurando-se, atualmente, como uma colônia formada por adeptos dessa vertente 
religiosa, onde a consideram como um espaço sagrado. Em relação ao espaço da Vila Pagã, 
observemos a seguir a imagem 1: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Possuindo templos, uma cantina, uma loja de livros, totens, artefatos, a Vila Pagã 
também dispõe de alguns outros lugares, como bosques temáticos, trilhas e montanhas. No 
entanto, o espaço nem sempre foi assim. De acordo com Rafael Nolêto, ―[...] para concretizar 
o projeto da Vila Pagã, por questões de logística, comecei a buscar uma área na zona rural, 
por ser possível encontrar locais mais amplos e mais próximos da natureza‖.
18
 No processo de 
busca, o idealizador da Vila Pagã destaca que a meta estabelecida foi de achar um terreno de, 
no mínimo, 2 hectares, a, no máximo, 40 quilômetros de Teresina. Inicialmente, entre agosto 
 
18
 NOLÊTO, Rafael. Entrevista concedida a Antônio Emanuel Batista de Sousa. Piauí, 27 de outubro de 
2020. 
Imagem 1: Vista Panorâmica da Vila Pagã, novembro de 2017 
Fonte: instagram/vilapaga. Acessado em outubro de 2020. 
20 
 
e setembro de 2013, Rafael Nolêto adquiriu três hectares da propriedade em José de Freitas. A 
partir de então, foi comprando áreas vizinhas e ampliando a propriedade, até atingir uma área 
de 70.000 m² (7 hectares). Ainda em expansão, no ano de 2018, foi realizada a última 
modificação da Vila, com a aquisição de mais 2 hectares feitos por Eulália Rodrigues, 
integrante do Piaganismo. 
Atualmente, a Vila Pagã possui uma área comum de 90.000 m² (9 hectares), 
constituindo uma das maiores comunidades neopagãs – em território – do mundo, contando 
com um número de 8 membros autodeclarados neopagãos piagas e alguns simpatizantes, que, 
por sua vez, ―[...] pretendem resgatar o culto piaga, no qual consiste em uma espiritualidade 
que atenda às necessidades culturais, religiosas e sociais dos que corajosamente seguem nessa 
jornada em busca de reavivar o culto dos antigos deuses‖.
19
 Desse modo, a pretensa releitura 
de tradições, através de saberes populares, literários e até científicos se fez com o intuito de 
―resgatar‖ uma suposta herança ancestral sem tornarem-se adeptos de uma espiritualidade tida 
como ultrapassada e obsoleta para as necessidades do homem atual. 
Embora o grupo tenha esta pretensão de resgate sobre o culto Piaga, entendemos que 
releituras de conhecimentos, práticas e saberes feitas pelos neopagãos são formas de inventar 
tradições a partir de aspectos históricos, da cultura popular
20
 e literários que fazem, somente, 
referência a supostos cultos ancestrais, e não uma forma de resgatá-los. Ainda no bojo das 
releituras, cabe ressaltar que os folhetos, mídias digitais, e os manuais de instrução de Rafael 
Nolêto tornam-se uma expressão da cultura religiosa do grupo em questão, no qual este é 
responsável pela produção de textos que informam sobre a narrativa desta pretensa religião 
ancestral e de um espaço (Vila Pagã) fundamental ao Piaganismo. 
Em linhas gerais, é importante discutir a respeito da historicidade do neopaganismo no 
Piauí e os seus desdobramentos com a criação e fundamentação da vertente religiosa Piaga e a 
construção da Vila Pagã, a fim de abordar sobre como ocorreu a sua formação, bem como 
buscando compreender quais são as práticas religiosas estabelecidas e como elas constituem 
um espaço religioso específico, em relação as religiosidades predominantes. Desse modo, 
partimos das reflexões sobre ―a questão do historiador‖, promovidas por Antoine Prost 
 
19
 NOLÊTO, Rafael. Caminhos Piagas: magia e ancestralidade do nordeste brasileiro. São Paulo: Clube dos 
Autores, p. 20, 2015. 
20
 Tomamos este conceito segundo a perspectiva de Ginzburg. Ver: GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: 
o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela Inquisição. São Paulo: Cia. das Letras, 2006. 
21 
 
(2008), o qual afirma que é possível fazer história sobre tudo, pois é pela questão que se 
constrói o objeto histórico.
21
 
Acredito que este estudo contribui para futuros pesquisadores, pois aborda as relações 
temáticas entre história, espaço e religião, com o intuito de desenvolver uma pesquisa relativa 
à categoria de estudos sobre esoterismo na academia,
22
 sobretudo por discutir a respeito das 
influências do neopaganismo no estado do Piauí. Além da relevância científica, estes temas, 
acima de tudo, são práticas sociais. O homem sempre produziu histórias e espaços, mesmo 
que não conhecessem formalmente uma ideia sistematizada acerca destes. Por outro lado, a 
religião sempre foi parte integrante da vida do homem, seja pela necessidade de entender ou 
questionar a vida. 
Em diversos países do Ocidente, a partir da segunda metade do século XX, ocorreram 
grandes mudanças culturais e comportamentais que partiram de grupos minoritários, pelas 
quais suas ações foram entendidas enquanto um movimento, este que foi denominado de 
―Contracultura‖. Partindo da premissa de questionar os valores e ordens tradicionais, 
sobretudo no início da década de 1960, mobilizações com essa finalidade passaram a divulgar 
ideais libertários, tomada de consciência e transformação da conduta de jovens, que, quase de 
imediato, resultaram na expansão do debate sobre vários aspectos da vida (economia, 
sexualidade e religiosidade).
23
 
Antes da emergência contracultural, em meados da década de 1950, o contexto 
institucional permitiu o desenvolvimento de estudos universitários que subverteram e 
impulsionariam os debates sobre religião, que antes eram concentrados em institutos 
teológicos de tradição cristã. Dessa forma, entende-se que as instituições religiosas 
tradicionais já não conseguiam responder ou satisfazer alguns grupos e sujeitos, em relação a 
questões trazidas pelos dilemas que estavam surgindo naquele momento. À vista disso, as 
religiões tradicionais começaram a perder um pouco de sua influência social, na medida em 
que houveram a ascensão de novas espiritualidades,
24
 quer dizer, a busca por novos modos de 
 
21
 PROST, Antoine. As questões do historiador. In: Doze Lições sobre a História. São Paulo: Autêntica, 2008, 
p. 75. 
22
 SILVA, Ana Rosa Cloclet da. CAMPOS, Marcelo Leandro de. O Esoterismo na Academia: uma análise do 
percurso histórico e historiográfico.Paralellus, Recife, v. 6, n. 13, p. 361-376, jul./dez. 2015. 
23
 A respeito da discussão, conferir o artigo de: SILVA, Eliane Moura da. Religião, Diversidade e Valores 
Culturais: conceitos teóricos e a educação para a Cidadania. Rever, Revista de Estudos da Religião Nº 2 / 2004 / 
pp. 1-14 ISSN 1677-1222. Disponível em: <https://www.pucsp.br/rever/rv2_2004/p_silva.pdf>. Acessado em: 
20 de agosto de 2019. 
24
 A exemplo: as religiosidades orientais, a Wicca e Hare Krishna. A respeito do tema, ler o artigo: 
GUERRIERO, Silas. Caminhos e descaminhos da contracultura no Brasil: o caso do Movimento Hare 
Krishna. Revista Nures no 12. Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica – SP. 
https://www.pucsp.br/rever/rv2_2004/p_silva.pdf
22 
 
se relacionar com o espiritual, partindo do ensejo contemporâneo de se contrapor às 
religiosidades majoritárias da sociedade. 
Essa coisa nova parece ser a busca por respostas espirituais aos dilemas dos homens 
e mulheres contemporâneos. Essa busca, associada a um desencanto com as 
religiões tradicionais, tem levado uma parcela considerável de pessoas a procurarem, 
não apenas no neopaganismo como também nas diferentes doutrinas orientais e no 
movimento da Nova Era, uma outra experiência religiosa. Sob esse aspecto, o 
crescimento destas formas de expressão religiosa pode ser interpretado como uma 
espécie de ―sinalizador‖, expressão de uma tentativa social mais ampla de 
contrabalançar as tendências majoritárias da nossa sociedade consumista e hiper-
tecnológica, enfatizando valores como os vínculos comunitários, as relações 
interpessoais e a integração com a natureza.
25
 
Nessa perspectiva, suponho que a sociedade atual, da rápida inovação tecnológica e do 
consumismo intenso, produz relações cada vez mais distantes do ser humano com a natureza. 
É nesse aspecto que os debates que envolvem o neopaganismo enquanto um sistema religioso 
de cunho marcadamente alternativo frente às religiões predominantes no Ocidente, buscam 
estabelecer um discurso sobre conexão do homem com o meio ambiente, ou seja, outra 
maneira de encontrar respostas para dilemas espirituais presentes na atualidade. No entanto, 
compreende-se que a criação de diversas vertentes religiosas politeístas que vem ocorrendo, 
principalmente, desde a segunda metade do século XX, decorre também pelo fato da chamada 
desinstitucionalização do sagrado, que foi possibilitado pelo processo de secularização que o 
Ocidente vivencia desde o movimento iluminista, a partir do qual se continua experimentando 
esse ―encantamento no âmbito individual‖,
26
 ocorrendo também coletivamente. Desse modo, 
a secularização possibilitou o questionamento e a oposição a valores religiosos 
institucionalizados pelas igrejas cristãs desde o iluminismo até os dias atuais.
27
 
A religião não é mais prerrogativa exclusiva das Igrejas. Decorrência do exílio do 
Sagrado é a privatização da religião. A secularização possibilitou o avanço do 
pluralismo e do trânsito religioso, uma vez que, não havendo mais amarras das 
instituições religiosas, o indivíduo pode manipular os bens simbólicos construindo 
seus arranjos religiosos sem medo de quebrar o eixo central onde está apoiado. Por 
isso, o que vemos hoje, não é uma profunda secularização na sociedade, mas uma 
permanência do encantamento no âmbito individual.
28
 
O pluralismo religioso não foi somente expandido para os indivíduos considerados 
cristãos, mas também para outras manifestações religiosas. Nesse sentido, o neopaganismo, 
enquanto sistema religioso que ganhou força com o movimento da contracultura foi 
 
Disponível em: <https://www.pucsp.br/revistanures/Revista12/nures12_silas.pdf>. Acessado em: 20 de agosto 
de 2019. 
25
 OLIVEIRA, Rosalira. Ouvindo uma Terra que fala: o renascimento do Paganismo e a Ecologia. São Paulo: 
Revista Nures, 2009, p. 02. 
26
 Expressão utilizada por Rubem Alves para definir o que poderíamos entender como um contínuo processo de 
secularização. 
27
 Lembrando que o processo de secularização do Cristianismo é a referência para se perceber a decorrência 
desses movimentos no recorte aqui analisado: a nível de Ocidente. 
28
 ALVES. Rubem, O que é religião? 7. Ed. São Paulo: Loyola, 2006, p. 66. 
https://www.pucsp.br/revistanures/Revista12/nures12_silas.pdf
23 
 
desencadeado, sobremaneira, por questões referentes ao processo de secularização combinado 
com a crise de paradigmas tradicionais, isto é, ―[...] as poderosas ideologias, que tinham sido 
uma característica central da vida na maioria dos países ocidentais desde o final do século 
XIX estavam, já nos finais da década de 1950, começando a parecer opressivas e 
redundantes‖.
29
 Os impactos na economia e sociedade ocidental, nesse período, propiciaram a 
valorização do individualismo e das coletividades minoritárias em detrimento das 
coletividades majoritárias, fato este que, contemporaneamente, ainda gera críticas a respeito 
das novas expressões religiosas. 
Muitas vezes as pessoas me perguntam se ‗isso‘ que eu estou pesquisando é uma 
religião, se é ritualizada ou é apenas uma brincadeira de adolescente que gosta de se 
vestir de preto. Acredito que perguntas como essa se devem a um certo 
desconhecimento sobre as formas de ritos e rituais presentes nas sociedades 
contemporâneas.
30
 
O desconhecimento, aqui, pode ser entendido a partir da contemporaneidade, que por 
sua vez traz novas e diferentes formas de lidar com os dilemas individuais e coletivos e, neste 
caso, com as manifestações religiosas neopagãs. De acordo com Martine Segalen (2002),
31
 a 
ritualidade está a priori associada ao religioso por meio do sagrado. A partir disso e da 
afirmação de que as sociedades vivem sob o signo da racionalidade e da técnica, a autora 
indaga se há espaço para o ritual dentro da atualidade, considerando que ―[...] uma das 
principais características do rito é a sua plasticidade, a sua capacidade de ser polissêmico, de 
acomodar-se à mudança social‖.
32
 Desta maneira, aspectos relacionados à religião e à 
espiritualidade, como os ritos e a sua relação com a natureza, têm impacto nas práticas e 
mudanças sociais, tanto no âmbito individual, como do coletivo, e, nesse seguimento, a 
religião se torna espaço de conflitos que determinam e constroem discursos. 
Como as opiniões religiosas não tem incidência unicamente sobre a busca de sentido 
para a existência, mas a têm igualmente sobre os comportamentos, ordenando toda a 
vida do homem crente, inclusive suas práticas sociais, as religiões também são 
lugares relevantes dos conflitos sociais. Assim sendo, o campo religioso é 
simultaneamente lugar, produto e fator ativo daqueles conflitos, e parece-me, pois, 
legítimo considerar a História religiosa como uma disciplina especifica, afirmada a 
sua legitimidade, há, não obstante, a necessidade de aclarar seu objeto.
33
 
 
29
 FILHO, Celso Luiz Terzetti. A deusa não conhece fronteiras e fala todas as línguas: um estudo sobre a 
religião Wicca nos estados unidos e no brasil. Tese de Doutorado, Pontifica Universidade de São Paulo – PUC. 
São Paulo, 2016, p. 62. 
30
 SOARES, Danieli Siqueira. Rituais contemporâneos e o neopaganismo brasileiro: o caso da Wicca, 2007, 
p. 51. 
31
 SEGALEN, Martine. Ritos e rituais contemporâneos. Rio de Janeiro: Editora FGV. 2002. 
32
 Idem, p. 15. 
33
 GOMES, Francisco José Silva. História e Religião: A Religião como objeto da História. Rio de Janeiro. 
FAPERJ: Mauad, 2002, p. 17. 
24 
 
Situado nessa discussão, o Paganismo Piaga emergiu de uma série de estudos e práticas 
realizadas por um grupo de jovens em Teresina, por meio dos quais estes constituíram um 
seleto número depraticantes do neopaganismo no Piauí, tendo suas práticas registradas em 
meios de comunicação desde o início de 2007 – folhetins do ―Jornal O Bruxo‖. Fundado pelo 
jornalista e adepto do movimento neopagão piauiense, Rafael Nolêto, o jornal constava de 
registros dos encontros dos jovens pagãos piauienses, sendo estes momentos destinados às 
práticas religiosas baseadas, sobretudo, em ritos provenientes de correntes da Europa, tendo, 
como maior destaque, a prática da Wicca em Teresina. Contudo, ao longo dos anos, Rafael 
Nolêto e outros adeptos do neopaganismo começaram a idealizar uma nova vertente religiosa 
que acreditavam ser influenciada por tradições estrangeiras e pelo que consideravam ser o 
folclore
34
 local. 
Por volta do ano de 2011, foram realizados estudos e reuniões para levantamento de 
produções bibliográficas e literárias que pudessem ―revelar‖ possíveis caminhos de práticas e 
cultos ancestrais, que, por sua vez, fossem necessários para sistematizarem determinada 
crença, isto é, partindo da necessidade de reinventar antigos cultos. Assim como a Wicca 
objetiva reconstituir os cultos antigos pré-cristãos, o Paganismo Piaga também buscou fincar 
sua crença na ideia de ancestralidade piauiense, considerando a influência de supostos 
costumes e saberes antigos. 
Os adeptos da vertente religiosa Piaga, apesar de construírem uma maneira de 
expressão religiosa no Piauí inserida na contemporaneidade, levantaram estudos 
arqueológicos e bibliográficos que, segundo estes, fundamentaram o Paganismo Piaga como 
uma manifestação religiosa ressignificada de supostos povos ancestrais que viviam na região 
do referido estado. 
Entre 2011 e 2012, a partir de reflexões pessoais sobre crenças e práticas minhas e 
de outros neopagãos de Teresina, vivenciamos juntos um processo de busca por uma 
identidade enquanto grupo. Antes disso, cada um tinha sua prática isolada e não 
tínhamos uma ―existência enquanto comunidade‖, justamente pela falta de uma 
identidade, de um eixo através do qual pudéssemos ser reconhecidos. Paralelamente 
com a idealização da Vila Pagã, com o propósito de fortalecer vínculos e 
identidades, começaram a surgir questionamentos e reflexões que desencadearam na 
 
34
 Quando citamos a expressão ―folclore‖ e seus derivados neste trabalho, estamos apontando o discurso de 
adeptos, de modo geral, do neopaganismo ao se referirem a práticas e saberes que, ambos pressupõe, serem 
muito antigos e assim, sobrevivendo no imaginário popular ao serem repassados por gerações através da 
oralidade e do ritual, podem ter seu conhecimento rememorado ou mesmo recuperado. Todavia, como se trata de 
uma perspectiva cara ao historiador, entendemos que o conceito ―folclore‖, como fonte de pesquisa, rompe com 
a ideia de que seja um conjunto de práticas culturais estáticas e imutáveis, como se pudessem ser dissociadas de 
transformações e tensões sociais. Desta maneira, a noção de folclore comumente difundida é a versão 
romanceada do que se caracterizaria enquanto traços da ―cultura popular‖, um conceito teórico-metodológico em 
constante discussão entre as ciências humanas e sociais aplicadas, que nos direciona a criticar a memória e as 
narrativas populares e sua tentativa de estabelecerem certa noção de antiguidade fincada à tradição, mas que, 
como qualquer outra prática cultural, não permanece imune às mudanças sócio-históricas. 
25 
 
formação do Círculo Piaga, grupo de estudos e práticas do que considerávamos ser 
nossa ―herança pagã ancestral‖.
35
 
O Paganismo Piaga, segundo seus membros, se constitui a partir de um resgate de 
práticas religiosas de antigos povos xamânicos que praticavam o culto solar nas terras onde 
hoje é o estado do Piauí. Nesse sentido, pretendo identificar os aspectos sociais e históricos 
que permitem a formulação desse discurso, bem como fomentaram a construção do espaço da 
Vila Pagã, que se constituiu enquanto um lócus para o Piaganismo, pois, como aponta Rafael 
Nolêto, ―[...] o diferencial da Vila Pagã no Piauí é que a gente não importa só tradições 
estrangeiras, mas também resgata as tradições da terra‖.
36
 
Como ponto de partida nesta pesquisa, utilizaremos a abordagem teórica de Reinhart 
Koselleck (2006), quando este escreve sobre as mudanças semânticas dos conceitos e as 
transformações que ocorrem na linguagem atualizada, ao considerar que os ―[...] 
acontecimentos históricos não são possíveis sem atos de linguagem, e as experiências que 
adquirimos a partir deles não podem ser transmitidas sem uma linguagem‖.
37
 Nesse sentido, 
as contribuições do autor permitirá a realização de uma breve abordagem historiográfica 
acerca do advento da produção do conceito de neopaganismo e entendendo-o enquanto 
categoria histórica na definição de determinados sujeitos e práticas sociais em um período 
específico, assim como também a discutir a respeito da polissemia do conceito, destacando 
suas temporalidades e as relações dos neopagãos com algumas espacialidades ao longo dos 
séculos XIX e XX. 
Outros conceitos importantes para este trabalho são o de ciberespaço e cibercultura. 
Segundo Margaret Wertheim (2001), ―[...] a nova fronteira espacial não é o hiperespaço, mas 
o ciberespaço‖,
38
 isto é, de maneira especialmente proeminente, o ciberespaço surgiu como 
um novo lugar para o convívio social, que possui salas de conversa, grupos de discussão, 
fóruns online, entre outros. Em relação a cibercultura, Pierre Lévy (1999) pontua que ―[...] ela 
expressa o surgimento de um novo universal, diferente das formas culturais que vieram antes 
dele, no sentido de que ele se constrói sobre a indeterminação de um sentido global 
qualquer‖.
39
 Nesse sentido, no bojo dessas discussões, pretendo discorrer, especificamente, 
 
35
 NOLÊTO, Rafael. Entrevista concedida a Antônio Emanuel Batista de Sousa. Piauí, 27 de outubro de 
2020. 
36
 PASSOS, Ceres. Piauí sedia 1º vila pagã da América Latina. O DIA, Teresina, 27 de janeiro de 2014. 
37
 4 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos; tradução do 
original alemão Wilma Patrícia Maas, Carlos Almeida Pereira; revisão da tradução César Benjamin. Rio de 
Janeiro, RJ: Contraponto: Ed. PUC-Rio, 2006, p. 267. 
38
 WERTHEIM, Margaret. Uma história do espaço: de Dante à internet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001, p. 
162. 
39
 LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999, p. 15. 
26 
 
sobre as experiências e sociabilidades dos neopagãos teresinenses, tanto as que ocorreram 
presencialmente quanto as que foram forjadas por meio dos ciberespaços. 
No que diz respeito aos anseios dos neopagãos teresinenses em ―resgatar‖ uma suposta 
religião antiga, busco compreender, a partir do conceito de tradições inventadas, cunhado 
pelos historiadores Eric Hobsbawm e Terence Ranger (1997), como estes sujeitos 
fundamentaram e sistematizaram a vertente religiosa politeísta denominada de Paganismo 
Piaga. Nesse sentido, os autores problematizam o que se caracteriza uma tradição enquanto 
genuína e uma tradição enquanto inventada, mostrando que as tradições genuínas são as ―[...] 
que surgiram e que se tornam difíceis de localizar num período limitado de tempo – às vezes 
coisa de poucos anos apenas – e se estabeleceram com enorme rapidez‖
40
 ou seja, não existe a 
possibilidade de definir as origens históricas dessa tradição. Em outras palavras, entende-se 
aqui que o Paganismo Piaga é uma tradição inventada e caracterizada como um conjunto de 
regras, que se estabelecem por meio da repetição, podendo essas regras serem de natureza 
ritual ou simbólica, conseguindo situar a ideia de uma continuidade em relação ao passado. 
Todas essas discussões acerca da vertente religiosa Piaga partem, sobremaneira, do 
princípio da Vila Pagã ter sido construída enquanto um espaçosagrado. A respeito disso, o 
autor Mircea Eliade (1992) nos ajuda a entender como o espaço para o homem religioso 
apresenta rupturas e quebras, que não é um espaço homogêneo e que existem espaços 
sagrados e não-sagrados. No caso da vila, ela se estabelece enquanto um espaço sagrado 
criado, sendo este mágico e energético, pois protege quem está dentro de energias externas, 
tornando-o um lugar de proteção, e que fica inserido entre o mundo terreno e o mundo 
espiritual/mágico, tendo em vista a sua relação com a natureza. Além disso, Mircea Eliade 
contribui para uma análise a respeito do período das festividades religiosas, pois os Piagas 
acreditam que as suas festividades fazem parte da repetição de um evento sagrado, que tem 
sua origem nos primórdios de um passado mítico. 
As principais fontes utilizadas nesta pesquisa fazem parte ou do acervo próprio de 
Rafael Nolêto, como as edições do ―Jornal O Bruxo‖, ou de blogs digitais disponíveis na 
internet, a exemplo do podcast ―Rádio Grito de Bruxa‖ e a ―TV Mística‖, que também eram 
administrados por Rafael. Nesse sentido, assim como Fábio Almeida (2011), acredito que 
para os historiadores que buscam compreender o presente, não se pode ―[...] negligenciar as 
fontes digitais, pois isso significaria fechar os olhos para todo um novo conjunto de práticas, 
 
40
 HOBSBAWN, Eric e RANGER, Terence. A Invenção das Tradições. – Tradução de Celina Cavalcante – Rio 
de Janeiro: Paz e Terra, 1997, p. 09. 
27 
 
atitudes, modos de pensamento e de valores contemporâneos‖.
41
 Com isso, ao longo da 
pesquisa, as fontes digitais que selecionamos são diretamente ligadas ao Rafael Nolêto por 
indicar importantes caminhos para se entender as especificidades das experiências neopagãos 
no Piauí. Estes documentos digitais, documento este ―[...]de conteúdo tão variável quanto os 
registros da atividade humana possam permitir – codificado em sistema de dígitos binários, 
implicando na necessidade de uma máquina para intermediar o acesso às informações. Tal 
máquina é, na maioria das vezes, um computador
42
‖, serão contextualizados em seu tempo e 
espaço, mas também articuladas com outras fontes que já são tradicionalmente aceitas pela 
disciplina histórica, a exemplo de imagens e entrevistas orais que foram concedidas por 
Rafael Nolêto, entre os anos de 2016 e 2021, e de Hérica Regina em 2020. 
Nesse seguimento, é preciso mencionar que a grande maioria do acervo documental 
utilizado na construção desta pesquisa foram produzidas ou salvaguardas por Rafael Nolêto. 
Não somente como um importante nome do neopaganismo piauiense, Rafael formou-se em 
jornalismo pela Universidade Estadual do Piauí em 2011 e em relações públicas em 2014, 
pela mesma instituição. À vista disso, consideramos que esse aspecto foi crucial para que o 
movimento pagão no Piauí diretamente ligado a Nolêto tomasse maior visibilidade, 
principalmente através de mídias digitais, a exemplo da criação de importantes sites para, 
estudos, contato e divulgação de eventos relacionados a encontros entre adeptos do 
neopaganismo no Piauí que ocorreram justamente nos anos em que o mesmo cursava sua 
graduação em jornalismo. Isto posto, as 55 edições do Jornal o Bruxo, que tiveram formato 
impresso apenas nas duas primeiras edições e logo passou a ser publicado em forma de blog 
até o ano de 2012, disponibilizadas a mim, por Rafael, exemplificam tanto os domínios de 
técnicas de alguém familiarizado com o oficio do jornalismo, principalmente em uma época 
em que a internet não tinha seu uso massificado entre a população brasileira, como também a 
tentativa do próprio de manter arquivado uma memória de si e dos encontros pagãos em 
Teresina, uma tentativa de manter possibilidades de produção de trabalhos científicos acerca 
de experiências neopagãs no Piauí, muito apoiada e incentivada pelo mesmo. 
Além das fontes mencionadas, as obras: ―Caminhos Piagas: magia e ancestralidade do 
nordeste brasileiro (2015)‖; ―A magia das Palmeiras: divindades da Mata de Cocais (2018)‖; e 
―Deuses, encantados, espíritos e outros seres lendários do Piauí (2019)‖; escritas por Rafael 
Nolêto são utilizadas com o intuito de compreender melhor acerca dos conhecimentos e 
 
41
 ALMEIDA. Fábio Chang de. O historiador e as fontes digitais: uma visão acerca da internet como fonte 
primária para pesquisas históricas. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG-História da UFRGS, v.3, n. 8, 
p. 9 -30, jan./jun. 2011, p. 12. 
42
 Idem. p. 17. 
28 
 
saberes dos ―novos piagas‖ e de como sistematizam a própria crença, o que me permite 
realizar uma abordagem a respeito de quais são as influências e os princípios que constituem o 
Piaganismo. 
Considerando todas as informações anteriores, no primeiro capítulo intitulado de ―‗A 
busca de raízes no passado‘: historicidades e espacialidades do neopaganismo‖, apresento 
uma narrativa sobre o conceito de neopaganismo, discutindo as suas bases de formação na 
Europa, nos Estados Unidos e no Brasil, isto é, busco realizar uma breve abordagem 
historiográfica sobre a formação deste enquanto categoria histórica, assim como também 
discutir a respeito da polissemia do conceito, destacando suas temporalidades e as relações 
dos neopagãos com algumas espacialidades ao longo dos séculos XIX e XX. 
Na esteira dessa discussão, pretende-se discorrer, no segundo capítulo, intitulado de 
―‗Em pleno século XXI, no auge da civilização tecnológica, a magia continua em alta‘: 
experiências neopagãs no Piauí‖, especificamente sobre as experiências e sociabilidades dos 
neopagãos teresinenses, tanto as que ocorreram presencialmente quanto as que foram forjadas 
por meio dos ciberespaços. A finalidade é evidenciar que, em um primeiro momento, a 
internet foi uma importante ferramenta não só para conhecer ou difundir o neopaganismo, 
mas também para possibilitar a construção de uma cibercultura neopagã que os conectava 
frequentemente, seja entre os sujeitos do próprio grupo ou com outros neopagãos nos EUA e 
na Europa. 
Já nos encaminhamentos finais desta dissertação, no terceiro capítulo, intitulado de 
―‗Entusiastas do movimento de resgate‘: fundamentos do Paganismo Piaga e a construção da 
Vila Pagã‖ pretende-se compreender, a partir dos anseios dos neopagãos teresinenses, como 
estes sujeitos fundamentaram e sistematizaram a vertente religiosa politeísta denominada de 
―Paganismo Piaga‖ e como, por conseguinte, construíram e instituíram a Vila Pagã como um 
espaço sagrado. 
Ressalta-se, ainda, que foi preciso estender o recorte temporal por mais 1 ano, a 
princípio pensando entre os anos de 2007 e 2020, intervalo este em que havia sido produzidas 
a maioria das fontes analisadas na pesquisa, porém devido aos diversos contratempos surgidos 
com a pandemia global do Novo Coronavírus decretada pela OMS em março de 2020, 
originaram-se dificuldades de ir à campo como sugerida pelo orientador. Neste sentido, como 
o espaço físico da Vila Pagã se encontrou fechado a visitações neste período e com festivais 
religiosos restritos a seus membros, não foi possível a concretização de uma experiência 
empírica de imersão do pesquisador naquele ambiente sociorreligioso na qual pudesse 
contribuir de forma não somente objetiva acerca do detalhamento das características 
29 
 
peculiares da Vila Pagã e dos adeptos do Círculo Piaga através do olhar do próprio 
pesquisador como também nas impressões sensíveis que transcendem quaisquer limites 
impostos pelo método científico. Contudo, ainda no ano seguinte, foi solicitado novas 
imagens e entrevistas, mediantes questionários por email ao líder do círculo Piaga e outra 
adepta, a fim de sanar algumas lacunas ainda abertas na pesquisa, por isso a necessidade de 
estender mais 1 ano este recorte temporal, justificada pela situação extraordinária que omundo viveu neste período. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
30 
 
CAPÍTULO I 
 
 
 
 
 
“A BUSCA DE RAÍZES NO PASSADO”:
43
 HISTORICIDADES E 
ESPACIALIDADES DO NEOPAGANISMO 
 
 
 
 
 
Os homens se parecem mais com sua época do 
que com seus pais. 
Proverbio Árabe
44
 
 
43
 Expressão utilizada pelo historiador Janluis Duarte ao problematizar os discursos envolvendo as origens do 
neopaganismo. Consultar: DUARTE, Janluis. Os bruxos do século XX: Neopaganismo e invenção de tradições 
na Inglaterra do pós-Guerra. Dissertação de mestrado- Brasília: Universidade de Brasília, 2008, p. 16-17. 
 
31 
 
O fazer historiográfico, isto é, a construção de uma narrativa acerca do homem e de 
suas relações sociais e culturais, a partir dos indícios históricos de determinados períodos, 
sempre se apresenta ao historiador como uma prática desafiadora, sobretudo quando o 
objetivo é abordar a respeito de um tema multidisciplinar – a exemplo de uma religiosidade, 
seus adeptos e suas produções culturais e materiais –, que é discutido, inclusive, por outras 
áreas de pesquisas integradas às bases de estudos consolidados e que possuem os seus 
próprios modos de fazer,
45
 ou seja, com metodologias e objetos de estudos diferenciados em 
relação aos que são utilizados nas pesquisas da área de História. 
Embora o ofício do historiador seja laborioso, acredito que analisar e discutir temas 
como o neopaganismo, a partir dos métodos e técnicas da historiografia, seja importante para 
pensarmos como as práticas das religiosidades, dos movimentos sociais ou as relações tecidas 
por homens e mulheres no cotidiano são mais ―parecidas com sua época do que com seus 
pais‖, pois, de acordo com Marc Bloch (2002), o ―[...] passado não é objeto de estudo da 
ciência‖ – lê-se ―ciência‖ como um termo equivalente à História –, mas, a História é a ―[...] 
ciência dos homens, ou melhor, dos homens no tempo‖.
46
 
Ao partirmos da epígrafe introdutória e das breves considerações de Marc Bloch 
(2002) acerca do ofício do historiador, podemos compreender que estudar, pesquisar e 
escrever a respeito de uma vertente religiosa, dos seus adeptos e de suas práticas à luz da 
História, nos desafia a ir além das percepções subjetivas ou coletivas dos indivíduos 
estudados, o que nos instiga a situar os sujeitos e as suas práticas em suas devidas 
temporalidades e espacialidades, para não ocorrer o risco de reforçar, por exemplo, a ideia de 
que seja possível resgatar alguma prática religiosa ou de que alguns sujeitos estão para além 
de seu tempo. 
Aparentemente, à primeira vista, pode ser que a associação do título com o subtítulo 
deste capítulo cause algum tipo de estranhamento ao leitor, pois, ―buscar raízes no passado‖,
47
 
nos remete à ideia de recuperar algo do outrora, que, por sua vez, revela uma contradição do 
termo neopaganismo, isto é, de que modo um ―novo paganismo‖ poderia ter como princípios 
 
44
 BLOCH, Marc L. Benjamin, Apologia da história, ou, O ofício de historiador. — Rio de Janeiro: Jorge 
Zahar Ed., 2001, p. 51. 
45
 A exemplo do campo acadêmico multidisciplinar ―Pagan Studies‖, que é dedicado ao estudo do paganismo 
contemporâneo. Os estudos pagãos abrangem uma variedade de diferentes abordagens acadêmicas para estudar 
tais religiões, sobretudo com base na sociologia, antropologia, arqueologia, folclore e teologia. 
46
 BLOCH, Marc L. Benjamin, Apologia da história, ou, O ofício de historiador. — Rio de Janeiro: Jorge 
Zahar Ed., 2001, p. 51. 
47
 Expressão utilizada pelo historiador Janluis Duarte ao problematizar os discursos envolvendo as origens do 
neopaganismo. Consultar: DUARTE, Janluis. Os bruxos do século XX: Neopaganismo e invenção de tradições 
na Inglaterra do pós-Guerra. Dissertação de mestrado- Brasília: Universidade de Brasília, 2008, p. 16-17. 
 
https://en.wikipedia.org/wiki/Modern_Paganism
https://en.wikipedia.org/wiki/Modern_Paganism
https://en.wikipedia.org/wiki/Sociology
https://en.wikipedia.org/wiki/Anthropology
https://en.wikipedia.org/wiki/Archaeology
https://en.wikipedia.org/wiki/Theology
32 
 
constituintes elementos significativos e iguais a de um passado europeu pagão pré-cristão? A 
meu ver, termos como recuperar, readquirir e resgatar, quando se trata do passado, só 
possuem utilidades, para os historiadores, a nível de análises e problematizações, pois como 
alguma cultura, religiosidade ou formas de cultos antigos poderiam ressurgir de forma intacta 
na contemporaneidade? 
É justamente a partir dessas questões que, a seguir, abordarei brevemente acerca das 
historicidades e espacialidades do neopaganismo – lê-se no plural por estar analisando um 
conceito polissêmico.
48
 Antes disso, ressalta-se também que as discussões por vir não 
possuem a pretensão de abranger todas as questões relativas ao culto à natureza nas religiões 
neopagãs, em suas diferentes temporalidades, mas, tão somente, de expor, em concepções 
gerais, acerca de como o conceito de neopaganismo se relacionou com pautas religiosas e 
sociais importantes, sobretudo a partir da segunda metade do século XX. 
1.1 Neopaganismo: uma breve abordagem sobre a polissemia do termo 
A partir das reflexões anteriores, alguns questionamentos voltados para esta pesquisa 
foram surgindo: O que é o neopaganismo? Um movimento político? Uma organização 
estritamente religiosa? Em que momento começou a ser sistematizado? Nesse sentido, para 
responder estas questões, devemos direcionar nosso olhar crítico aos anos que antecederam a 
década de 1960, período em que houve as primeiras tentativas de definição e sistematização 
do conceito de neopaganismo, que foram relacionadas a um passado europeu pagão pré-
cristão. Da mesma forma, também daremos atenção aos anos e décadas seguintes a 1960, 
período importante para compreendermos os novos sentidos que foram constituindo a ideia de 
neopaganismo na contemporaneidade. 
Antes de adentrar ao assunto, ressalta-se que, mesmo nos dias atuais, o termo ainda é 
bastante genérico ao caracterizar ou definir as diferentes vertentes religiosas alternativas, 
esotéricas e ocultistas, que foram fundadas entre a segunda metade do século XIX e ao longo 
do século XX. As fundamentações filosóficas e políticas das diversas vertentes neopagãs se 
diferenciam, embora ambas possuam fatores motivadores comuns. 
À vista disto, é necessário analisar o conceito sob dois períodos históricos distintos: 
um que diz respeito às bases históricas de sua formação, ligadas aos movimentos românticos 
nacionalistas do século XIX; e outro, quando o termo ganha um corpo conceitual mais 
definido e que foi caracterizado não somente como um sistema religioso que abarca diferentes 
 
48
 KOSELLECK, R. Futuro Passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: 
Contraponto (PUC-Rio), 2006. 
33 
 
crenças, mas como um movimento político de afirmação identitária ligado ao paradigma da 
contracultura, que explodiu no ocidente durante a segunda metade do século XX, e às 
doutrinas filosóficas que inauguraram o movimento New Age.
49
 
De acordo o historiador Janluis Duarte (2013), ―[...] esse grupo heterogêneo de 
movimentos religiosos possui, no entanto, um processo de formação comum: determinadas 
mudanças identitárias ocorridas entre a elite cultural da Europa Ocidental no decorrer do 
século XIX, que levaram à contestação dos valores vigentes, diante de um mundo em rápida 
transformação‖.
50
 Ou seja, nesse período, a Europa ainda vivenciava um contexto de 
consolidação de Estados Nacionais, com a unificação e expansão territorial e, portanto, a 
necessidade de validaçãode nação em seus mitos de origem em uma sociedade em rápida 
transformação. 
Tendo isso em vista, considero não ser descabido classificar o neopaganismo 
original como um movimento, antes de tudo, literário. Ele surgiu da pena de 
escritores que, movidos por ideais nacionalistas ou contestatórios, buscaram 
valorizar o folclore e os costumes de sua terra natal, ou ainda de uma antiguidade 
clássica profundamente romantizada.
51
 
Isto posto, é possível afirmar que as produções literárias românticas do século XIX, e 
seu contexto de produção, influenciaram determinados grupos de intelectuais a buscarem 
identificar, nos costumes e no que compreendiam enquanto folclore, certas raízes 
consideradas pagãs, como uma espécie de marcadores de identidade, para grupos dominados 
por outros povos no processo de unificação territorial, bem como para definir as origens 
míticas de sua nação, ou mesmo por reação à chamada alienação cultural desencadeada pela 
Revolução Industrial. Como aponta Néia (2017) ―[...] o gosto pelo exótico e o apego ao 
passado fortaleceram-se no Romantismo e estiveram no cerne dos primeiros movimentos 
protonacionalistas, fundamentais para os estudos posteriores a respeito do folclore‖ 
52
, isto é, 
a própria tentativa de definição do que poderia ser considerado como conhecimento e prática 
folclórica passa a caminhar concomitante a esse contexto de afirmação identitária por parte de 
intelectuais românticos. 
Embora o amadorismo ainda prevalecesse em muitos dos folcloristas pioneiros, aos 
poucos foi delimitada uma definição para o folclore, não mais circunscrito 
unicamente a artefatos materiais, mas também preocupado com o registro de práticas 
 
49
 CAROZZI, Maria Julia. Nova Era: a autonomia como religião. In: CAROZZI, Maria Julia. (org.). A Nova Era 
no Mercosul. Petrópolis: Editora Vozes, 1999, p. 149-190. 
50
 DUARTE, Janluis. Reinventando tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. 
2013. 231 f., il. Tese (Doutorado em História) — Universidade de Brasília, Brasília, 2013, p. 12. 
51
 Idem. 
52
 NÉIA, V. H. S. O folclore e a escrita da História: a cultura popular como fonte. Resgate: Revista 
Interdisciplinar de Cultura, Campinas, SP, v. 25, n. 1, p. 203–226, 2017. DOI: 10.20396/resgate.v25i1.8648158. 
Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/resgate/article/view/8648158. Acesso em: 4 fev. 
2022. 
34 
 
entendidas como tradicionais, coletivas e simbólicas. Esse âmbito incluiu os 
costumes, as crenças, as superstições, os aspectos linguísticos, as cerimônias, as 
narrativas e canções populares e diversos outros elementos daquilo que passou a ser 
associado à ideia de Volks (povo). Para além das questões literárias, históricas e 
estéticas, esse movimento também foi motivado por concepções políticas, muitas 
vezes em contraposição a hegemonias estrangeiras, como ocorreu na Alemanha e na 
Finlândia, por exemplo. [...] Assim, a visão cristalizada do folclore, tanto como área 
de pesquisa quanto como conjunto de práticas, aproximava-se das tentativas de 
construção de nacionalidades coesas e homogêneas, pouco afeitas à contestação. Ao 
longo da segunda metade dos Oitocentos, inicialmente na Europa, a busca pelas 
raízes nacionais e por vestígios da cultura popular aproximou-se do cientificismo 
positivista, reivindicando os métodos incipientes das Ciências Sociais.
53
 
Paralelo a esta definição de folclore, é importante observar, também, que houve a 
associação da noção de neopaganismo como religiosidade da natureza, seguindo uma 
tendência literária da época, ou seja, o Romantismo do século XIX, visto que, após o 
expressivo desenvolvimento do racionalismo, do ceticismo e do cientificismo que ocorreu a 
partir do Iluminismo no final do século XVIII, a crença na bruxaria foi retomada como uma 
alternativa para sanar a busca pelo retorno das emoções e preocupações humanas, do 
sentimento religioso e da magia. Logo, a compreensão do que caracterizaria um 
neopaganismo esteve relacionada ao movimento romancista do século XIX, que preconizava, 
inclusive, o entendimento de que o homem é parte importante da natureza. À vista disso, todo 
esse contexto de definição de concepções de folclore e neopaganismo vão ser preponderantes 
para o desencadear de debates envolvendo importantes intelectuais na Europa neste momento, 
e que vão contribuir de forma definitiva para, mais adiante, consolidar a noção de 
neopaganismo enquanto um sistema religioso. 
Na análise da obra The triumph of the Moon, do historiador britânico Ronald Hutton – 
especialista em estudos que envolvem neopaganismo e magia –, Janluis Duarte (2013) aponta 
que o termo ―neopagão‖ só começou a aparecer propriamente de fato no final do século XIX, 
em críticas às obras de intelectuais românticos ingleses, dentre os quais se destacam W. B. 
Yeats e Maud Gonne, acusados de defenderem abertamente a criação de uma religião celta 
reconstrucionista, abrangendo lendas galesas e magia. Porém, ―[...] o termo popularizou-se 
apenas a partir de 1967, com os artigos do psicólogo Timothy Zell – mais conhecido como 
Oberon Zell Ravenheart – criador da Church of All Worlds e editor da revista Green Egg, 
dedicada ao assunto, numa tentativa de nomear o movimento que ele mesmo ajudava a 
formar‖.
54
 
 
53
 NÉIA, V. H. S. O folclore e a escrita da História: a cultura popular como fonte. Resgate: Revista 
Interdisciplinar de Cultura, Campinas, SP, v. 25, n. 1, p. 203–226, 2017, p. 204-205. 
54
 DUARTE, Janluis. Reinventando tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. 
2013. p. 13. 
35 
 
A partir de 1967, o termo ―neopagão‖ esteve tanto relacionado ao conjunto 
diversificado de crenças provenientes do movimento literário romântico do século XIX – que 
incentivava a valorização da cultura popular local, mesmo que de maneira romantizada –, 
assim como do paradigma contracultural de meados da década de 1960. Destaca-se ainda que 
as concepções acerca do neopaganismo no Romantismo ainda não eram imbuídas de 
significações políticas, pois ―[...] o Romantismo possuía ideias menos políticas e mais 
metafísicas, com base no entendimento de que o homem é parte importante da entidade 
natureza e da energia orgânica‖.
55
 Em contrapartida, como veremos ao longo deste capítulo, 
após a década de 1960, alguns dos grupos já considerados neopagãos passaram a se associar a 
movimentos políticos, que foram incorporados à ideia de neopaganismo, isto é, conferindo 
mais significados e definições ao termo. 
Ressalta-se ainda que, durante o século XIX, a ideia do que viria a ser compreendido 
como neopaganismo passou pela influência de tradições herméticas durante o processo de 
sistematização das diferentes vertentes religiosas que o abrange, sendo este também um fato 
importante ao longo do século XX. 
Paralelamente à literatura, ou agindo de forma coerente com aquilo que escreviam os 
poetas, é preciso ressaltar que vários desses fizeram parte de outra importante 
influência para a formação do neopaganismo como forma religiosa: as diversas 
sociedades herméticas, especialmente as de cunho ocultista, que se multiplicaram na 
Europa da segunda metade do século XIX.
56
 
 As sociedades secretas foram preponderantes para a criação de diferentes vertentes 
religiosas que viriam a definir e compor o neopaganismo enquanto categoria, embora 
genérica, que abrangesse um conjunto de crenças de caráter religioso. Foi possível constatar 
esse aspecto devido ao fato de que diversas sociedades secretas surgiram nesse período, como 
a maçonaria, que não só defendiam serem continuadoras de tradições muito antigas, tendo sua 
origem indefinida ao pertencer a um tempo mítico e imemorial e, portanto, capazes de serem 
transmissoras de saberes secretos desse período, mas tambémpor suas reuniões serem de 
cunho marcadamente cerimonial, aceitando seus membros somente por rituais de iniciação. 
Surgiu na França a O.T.O – Ordo Templi Orientis – da qual participa um dos mais 
conhecidos ocultistas, Alphonse Constant ou Eliphas Lévi. Após sua morte, em 
1875, o marquês Stanislau de Guainta proclama-se seu sucessor e reconstrói, em 
1888, o Supremo Conselho da Ordem Cabalística da Rosa-Cruz. Em 1875, é 
fundada pela controversa personagem de Helena Petrovna Hahn – ou Mme. 
Blavatsky – a Sociedade Teosófica, construída sob a alegação de que as "verdades 
interiores" estão presentes em todas as religiões, mas foram deturpadas por "homens 
 
55
 SANTOS, Maria Clara Dunck. A contracultura do segundo pós-guerra: um estudo comparativo entre a 
poesia marginal de Jack Kerouac e Nicolas Behr. Dissertação de Mestrado - Universidade de Brasília. Programa 
de Pós-Graduação em Literatura, 2012, p. 43. 
56
 DUARTE, Janluis. Reinventando tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. 
2013, p. 14. 
36 
 
imperfeitos" que tentaram traduzir o conhecimento divino. Seus ensinamentos 
remetem diretamente ao posterior surgimento da New-Age, ao afirmar que os 
conhecimentos esotéricos são consistentes com as recentes descobertas da ciência.
57
 
A estrutura religiosa dessas sociedades secretas foi importante para que diferentes 
doutrinas, mais adiante, surgissem com base nelas, principalmente por dois motivos: (1) 
afirmavam ser percussores de tradições antigas pré-cristãs; e (2) possuíam ritos de iniciação 
definidos. As doutrinas posteriores, influenciadas por essas sociedades ocultistas, assumiram 
esses padrões. Diante disso, no cerne dessas sociedades secretas emergiu um personagem que 
veio influenciar a noção de neopaganismo no século XX, como um sistema de crenças 
definido com características comuns, o controverso e polêmico Aleister Crowley. 
Aleister Crowley, ou Edward Alexander Crowley, surgiu como uma figura de 
notoriedade em relação ao hermetismo e/ou ocultismo, a princípio, na Ordem Hermética da 
Aurora Dourada (Golden Dawne).
58
 Após problemas com o criador da ordem da qual 
participava, em 1905, Crowley criou uma nova ordem, a Astrum Argentum,
59
 que se estendeu 
pela Europa e pelos Estados Unidos durante a primeira metade do século XX. Expulso da 
Inglaterra em 1920, por conta de problemas com as autoridades da Sicília, em 1924, devido à 
fama de seus rituais orgiásticos, Crowley se tornou uma figura bastante polêmica na época. 
No entanto, depois de um pouco mais de duas décadas, ―[...] morreu na miséria, mas deixou 
uma vasta legião de seguidores de suas doutrinas heterodoxas, profundamente anticristãs e 
que misturavam elementos de diversas tradições religiosas antigas com os devaneios de seu 
autor‖.
60
 
Todavia, mesmo com a importante contribuição do contexto romântico para a busca de 
origens míticas de determinados grupos da Europa do século XIX, sem falar nas influências 
das tradições herméticas ocultistas surgidas paralelamente às tensões culturais e sociais, ainda 
herdadas da Formação dos Estados Nacionais europeus, e também da Revolução Industrial 
para estabelecer o neopaganismo como religião, é só a partir do surgimento de importantes 
 
57
 DUARTE, Janluis. Reinventando tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. 
2013. p. 16. 
58
 A Ordem Hermética da Aurora Dourada, conhecida também como Ordem Hermética do Áureo Alvorecer, foi 
uma sociedade secreta que surgiu na Inglaterra em 1888, a qual reunia várias vertentes do esoterismo, e cujas 
ramificações encontram-se ativas até os dias de hoje. De acordo com Karina Bezerra (2019), a Aurora Dourada 
foi ―[...] o ápice da glória do renascer ocultista do século XIX, que sintetizou um vasto corpo de material 
desconexo e disperso em um todo coerente, prático e eficiente, coisa que não pode ser dita de qualquer outra 
ordem ocultista de que tenhamos conhecimento naquele tempo ou a partir de então‖. Ver em: BEZERRA, Karina 
Oliveira. Paganismo contemporâneo no Brasil: a magia da realidade, 2019, p. 50. 
59
 Astrum Argentum é uma ordem ocultista fundada por Aleister Crowley e George Cecil Jones em 1907, 
dedicada à evolução espiritual através da "lei de Thelema", herdeira direta da estrutura da famosa ordem Golden 
Dawn, operante entre os séculos XIX e XX. 
60
 MIZANZUK, Ivan Alexander. “Faze o que tu queres”: as noções de ética e moral nos escritos de Aleister 
Crowley em sua thelema sob a luz da sociologia sensível de Michel Maffesoli. (Mestrado em Ciências da 
Religião), São Paulo, 2010, p. 38. 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sociedade_secreta
https://pt.wikipedia.org/wiki/Inglaterra
https://pt.wikipedia.org/wiki/Esoterismo
https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_XIX
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ocultismo
https://pt.wikipedia.org/wiki/Aleister_Crowley
https://pt.wikipedia.org/wiki/George_Cecil_Jones
https://pt.wikipedia.org/wiki/1907
https://pt.wikipedia.org/wiki/Thelema
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_Herm%C3%A9tica_da_Aurora_Dourada
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_Herm%C3%A9tica_da_Aurora_Dourada
37 
 
trabalhos antropológicos e folcloristas que houve uma definitiva ligação ―[...] entre as ideias 
neopagãs e a efetiva fundação de religiões neopagãs‖.
61
 
Em concepções gerais, os trabalhos antropológicos e folcloristas defendiam que as 
antigas marcas culturais, ou mesmo tradições religiosas, teriam sobrevivido na obscuridade e 
resistido ao longo dos séculos na Europa mesmo com a dominação Cristã. Entre os trabalhos 
mais importantes, podemos destacar os livros: ―Aradia, o evangelho das bruxas‖, de Charles 
Leland;
62
 ―Ramo Dourado‖, de Sir James G. Frazer;
63
 e ―O culto das bruxas na Europa 
Ocidental‖, de Margaret Murray.
64
 Para entendermos a relevante contribuição de ―Aradia, o 
evangelho das bruxas‖, é preciso direcionar um pouco de nosso olhar para a vida de seu autor. 
Charles Leland, norte-americano que viveu boa parte de sua vida na Europa, além de 
jornalista, foi um folclorista que, desde sua época de estudante, demonstrou grande interesse 
pelo ocultismo e neoplatonismo, tendo sido também defensor de posicionamentos políticos 
considerados radicais. 
Do interesse de Charles Leland pelo ocultismo e cultura popular, combinados com seu 
ativismo político, nasceu uma das obras mais importantes para o surgimento do 
neopaganismo como religião: ―Aradia, o evangelho das bruxas‖, publicada originalmente em 
1899. Na obra, nos é apresentado um conjunto de textos presumidamente sagrados das 
stregha (bruxas, curandeiras) italianas, combinados com comentários de sua própria autoria. 
Esses textos narram como Diana, considerada a deusa-mãe, provém ao mundo sua filha 
Aradia, para que se torne a primeira das bruxas e desta forma instruir suas aprendizes. 
Tal visão da bruxaria como uma força de resistência política não era nova. Já estava 
presente na obra clássica A Feiticeira de Jules Michelet, de quem, aliás, Leland era 
leitor ávido. O que havia de novidade na obra de Leland era a sua alegação de ter 
encontrado uma sobrevivência deste ―culto da bruxaria‖ entre as stregha, culto este 
que teria sido grandemente perseguido pela Igreja Católica, mas sobrevivido em 
segredo no seio das famílias praticantes, através da tradição oral.
65
 
Mesmo com seu livro repleto de comentários de sua autoria, no que diz respeito a 
transcrição de textos considerados sagrados, como sortilégios e encantamentos, seu trabalho 
recorre, pela primeira vez, a uma ideia de um culto antigo pré-cristão que ainda permanecia 
vivo, no qual, por sua vez, as bruxas seriam as sacerdotisas, descrevendo-as em seus ritos e 
 
61
 DUARTE, Janluis. Reinventando tradições: representações e identidades da bruxaria

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