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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Pré-Natal na atenção primária DIAGNÓSTICO DA GESTAÇÃO O diagnóstico clínico normalmente se configura pela principal queixa ou suspeita: atraso menstrual, associado a fadiga, mastalgia, náuseas ou vômitos matinais e aumento da frequência urinária (polaciúria). De forma didática o diagnóstico clínico pode ser dividido em sinais de presunção, probabilidade e certeza. • Sinais de presunção: manifestações sistêmicas (náuseas, vômitos, polaciúria, sonolência, alterações do apetite, sinal de Halban lanungem e linha nigra) e sinais mamários (hipersensibilidade, aumento do volume, sinal de Hunter – hiperpigmentação da aréola; presença de tubérculos de Montgomery, rede venosa de Haller e saída de colostro). • Sinais de probabilidade (sinais do trato genital): atraso menstrual maior que 14 dias; aumento do volume uterino; amolecimento do colo uterino; alteração do muco cervical; sinal de Piskacek (formato assimétrico do útero), sinal de Hegar (amolecimento do istmo); sinal de Nobile-Budin (ocupação de fórnices laterais; sinal de Kluge (arroxeamento da vagina); sinal de Osiander (pulsação das artérias vaginais no fórnice lateral). • Sinais de certeza: sinal de Puzus (rechaço fetal sentido ao empurrar o útero pelo fórnice anterior), palpação e percepção de movimento fetais; ausculta de batimento cardíacos fetais. O diagnóstico laboratorial segue a dosagem do beta-hCG quando o atraso é menor que 14 dias podendo ser por teste de farmácia, quantitativo e qualitativo. O diagnóstico por imagem deve ser visualizado tais estruturas: CÁLCULO DA IDADE GESTACIONAL A idade da gestação corresponde ao tempo transcorrido entre o primeiro dia da última menstruação e a data atual. IG: dias da DUM até hoje/ 7 DATA PROVÁVEL DO PARTO Em relação a data da DUM: Idealmente, deveria ser realizado a consulta pré- concepcional, pois a partir dela, poderíamos ter informações a respeito de doenças previas passiveis de tratamento, minimizando os riscos gestacionais; Recomenda-se que sejam realizadas NO MÍNIMO 6 CONSULTAS de pré-natal ao longo da gestação: • Uma consulta no primeiro trimestre • Duas consultas no segundo trimestre • Três consultas no terceiro trimestre da gestação O MS recomenda que essas consultas sejam realizadas de acordo com o seguinte cronograma; • Até 28ª semana – mensalmente; • Da 28ª até a 36ª semana – quinzenalmente; • Da 36ª até a 41ª semana – semanalmente O termino do pré-natal só ocorre com o nascimento, visto que essas últimas semanas da gestação são as de maior probabilidade de intercorrências. ANAMNESE A gestante deve ser questionada sobre seu estado atual, antecedentes pessoais e familiares, sua história fisiológica e seus hábitos sociais. É importante que se questione a respeito do desejo da gravidez, se a gestação foi ou não planejada, se existem ou existiram doenças ginecológicas, nutricionais, clínicas, obstétricas, genéticas e hereditárias. Procedimentos realizados em gestações anteriores também 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 devem ser relatados (amniocentese, cordocentese, biopsia de vilo corial e dosagem de alfafetoproteina). A terminologia GESTA, refere-se ao número de gestações que a paciente apresentou, não importando a duração de cada uma dela, ou o número de fetos. Assim, temos nuligesta (nunca concebeu), primigesta (uma gravidez), multigesta (duas ou mais gravidezes). O sufixo PARA refere-se ao número de gestações em que houve viabilidade fetal, excluindo-se, portanto, os abortos. É importante informar para aquelas pacientes com menos de 16 anos ou mais de 35 anos sobre os riscos de disfunções gestacionais, como a maior incidência de hiperêmese nas mais jovens, aneuploidia nas mais idosas e de abortamento e doença hipertensiva especifica da gravidez em ambas as faixas etárias. Outras informações incluem o número de gestações e seus desfechos, como partos e abortos anteriores, assim como via de parto, puerpérios, intercorrências gestacionais e procedimentos invasivos durante as gestações anteriores. USO DE MEDICAÇÕES NA GESTAÇÃO EXAME FÍSICO Inicialmente, deve-se pesar e medir a paciente para realizar o IMC. Em relação ao exame das mamas, podemos observar a presença dos sinais de presunção da gravidez, como hipertrofia das glândulas de Montgomery e a morfologia do complexo aréolo- mamilar, visando a amamentação. A palpação abdominal é recomendada a partir do 2º trimestre através das manobras de Leopold: 1. Tempo (SITUAÇÃO): o examinador fica de frente para a paciente e com as duas mãos delimita o fundo do útero, observando qual polo fetal que ocupa. Situação fetal: relação do maior eixo do feto em relação ao eixo maior da mãe. Ex: Longitudinal, transverso ou Oblíquo. 2. Tempo (POSIÇÃO): palpa-se os lados do útero, procurando determinar a posição fetal, ou seja, onde está o dorso. Conhecer a posição fetal ajuda na procura do foco máximo de ausculta dos batimentos. Posição fetal: para que lado está o dorso do feto. Ex: direita ou esquerda. 3. Tempo (APRESENTAÇÃO): palpa a região da pelve com o polegar e o indicador para verificar a apresentação na bacia e confirmar o diagnóstico de apresentação verificado na primeira manobra. Apresentação fetal: primeira parte que aparece no parto vaginal. Ex: Cefálica, Pélvica ou Córmica. 4. Tempo (ALTURA DA INSINUAÇÃO): com o examinador de costas para a paciente, coloca-se as mãos sobre as fossas ilíacas, caminhando-se em direção ao hipogastro. Com a ponta dos dedos, procura-se penetrar na pelve e averiguar o grau de insinuação. ALTURA UTERINA O tamanho do útero pode nos fornecer informações a respeito da idade gestacional aproximada. No início da gestação o útero é ainda um órgão intrapélvico. Para a medida, utiliza-se uma fita métrica fixando o marco zero na borda superior da sínfise púbica, estendendo-se ao longo do maior eixo uterino e com a mão esquerda delimita-se o fundo. A técnica deve ser feita com a bexiga vazia, pois diferenças de até 3cm podem ser encontradas. 10-12 semanas: o útero começa a ser palpado acima da sínfise púbica; 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 16 semanas: encontra-se a meio caminho entre a sínfise púbica e a cicatriz umbilical; 20 semanas: no nível da cicatriz umbilical. A partir de 20 semanas até 32 semanas, a medida da altura do fundo uterino se correlaciona diretamente com a idade gestacional BATIMENTOS FETAIS As bulhas cardíacas fetais são audíveis a partir de 10-12 semanas com o sonardoppler e a partir de 20 semanas com o estetoscópio de Pinard. FC feto: 120-160bpm Foco de ausculta: procurar o dorso do feto; mede a distância do polo cefálico para o dorso; na metade desse ponto é o melhor foco de ausculta. EXAME GINECOLÓGICO Devem ser realizados o toque vaginal e o exame especular, seguido da coleta do material vaginal e cervical (sem a coleta endocervical) e cultura (material do colo do útero) com o objetivo de identificar infecções gonocócicas ou por clamídia naquelas mulheres consideradas de risco (adolescentes, solteiras, múltiplos parceiros, história prévia de DST, HIV positivo). O toque deve ser repetido perto do parto para avaliar clinicamente a bacia, a insinuação da apresentação fetal e as características do colo uterino. EXAMES COMPLEMENTARES Os exames solicitados rotineiramente para as gestantes são: HEMOGRAMA: Sendo um exame na primeira consulta e outro no 3º trimestre. TIPAGEM SANGUÍNEA E FATOR RH. COOMBS INDIRETO, REPETIDO COM 28, 32, 36 E 40 SEMANAS SE A PACIENTE FOR RH NEGATIVO. GLICEMIA DE JEJUM: Sendo um exame na 1ª consulta e outro no 3º trimestre. O rastreamento do Diabetes Gestacional começa com a glicemiade jejum para todas as pacientes, independentemente de fatores de risco, na primeira consulta. A paciente que apresenta glicemia de jejum na primeira consulta ≥ 92mg/dl, mas < 126 mg/dl, já possui o diagnóstico de DG, sem precisar do TOTG; As pacientes que não tiveram diagnóstico de diabetes no começo da gravidez devem realizar o TOTG 75 g entre 24 e 28 semanas, cujos valores para diagnóstico de DG são glicemia de jejum ≥ 92 mg/dl, 1 hora ≥ 180 mg/dl e 2 horas ≥ 153 mg/dl. Qualquer valor alterado confirma o diagnóstico. URINOCULTURA E URINA TIPO I, AMBOS NA 1ª CONSULTA E REPETIDOS NO 3º TRIMESTRE. A bacteriúria assintomática é definida pela contagem de pelo menos 105 em pacientes assintomáticas. Esta deve ser tratada com (Nitrofurantoína 100mg 6/6h por 10 dias ou Amoxicilina 500mg 8/8h por 7-10 dias) devido ao risco de abortamento, parto prematuro e baixo peso. TESTE RÁPIDO DIAGNÓSTICO ANTI-HIV NA PRIMEIRA CONSULTA E OUTRO NO 3º TRIMESTRE. SOROLOGIA PARA TOXOPLASMOSE IGM E IGG, REPETIDO A CADA 2-3 MESES CASO A PACIENTE SEJA SUSCETÍVEL. Anticorpos IgG surgem em cerca de 2 semanas após a infecção, pode declinar nos 2 anos seguintes ou permanecer por toda a vida. Anticorpos IgM surgem na primeira semana de infecção e declinam em alguns meses, mas podem persistir por anos. Dessa forma, a presença de IgM sugere, mas não confirma uma infecção aguda. - IgG e IgM negativos: PACIENTE SUSCETÍVEL: deve-se realizar a sorologia a cada 2-3 meses e no momento do parto; 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 - IgG positivo e IgM negativo: PACIENTE IMUNE/INFECÇÃO CRÔNICA: infecção passada e não há risco de reativação. - IgM positivo e IgG negativo: INFECÇÃO AGUDA OU FALSO-POSITIVO: pode ser uma infecção recente ou um falso-positivo. Para definir podemos solicitar a pesquisa de IgA que se positiva, confirma a infecção aguda. Porem na pratica é um serviço pouco disponível, desse modo, considera-se iniciar o tratamento específico: espiramicina 1g (3.000.000UI) de 8/8h VO e repetir sorologia em 3 semanas. - IgM e IgG positivos: INFECÇÃO AGUDA OU CRÔNICA: para diferenciar deve-se realizar o teste de avidez do IgG que mostra a força de ligação antígeno-anticorpo, pois a medida que a resposta imunológica for amadurecendo, os anticorpos IgG apresentam avidez maior. O diagnóstico de baixa avidez (< 30%) sugere uma infecção aguda (com menos de quatro meses), enquanto uma alta avidez (> 60%) é sugestiva de infecção antiga. Em pacientes com mais de 16 semanas com sorologia positiva para IgM e IgG, o teste de avidez do IgG não garantirá que a infecção ocorreu antes da gestação, justificando o tratamento nesta situação. TESTE RÁPIDO DE TRIAGEM PARA SÍFILIS E/OU VDRL/RPR NA PRIMEIRA CONSULTA E VDRL NO 3º TRIMESTRE. SOROLOGIA PARA HEPATITE B (HBSAG), SENDO UM EXAME NA PRIMEIRA CONSULTA E OUTRO NO 3º TRIMESTRE. Pacientes não vacinadas deverão ser imunizadas; Obs: caso a gestante seja hipertensa ou desconfie de HAS, a dosagem de creatinina sérica deve ser solicitada, pois este dado pode sugerir lesão em órgão alvo. Obs: O rastreio de infecção por rubéola e citomegalovírus não é recomendado de rotina pelo MS, uma vez que não há tratamento disponível para prevenção da transmissão vertical. Sua realização deve-se limitar a casos suspeitos em pacientes imunossuprimidas. ULTRASSONOGRAFIA Dessa maneira, o exame de ultrassom pode ser recomendado como rotina nos locais onde ele esteja disponível e possa ser realizado no início da gestação. A sua não realização não constitui omissão, nem diminui a qualidade do pré- natal; Deve ser realizado uma USG transvaginal após confirmação laboratorial da gestação para determinação da idade gestacional e definição do local de implantação ovular (o saco gestacional pode ser visualizado a partir de 2-5 semanas). A USG do 1º trimestre (11-14 semanas) tem como objetivo calcular a idade gestacional através da medida do comprimento cabeça- nadega e diâmetro do saco gestacional; rastrear alterações cromossômicas através da translucencia nucal e atestar a vitalidade fetal através dos batimentos cardíacos. A 2ª morfológica (entre 18 e 24 semanas) pretende estudar a morfologia dos órgãos fetais e identificar possíveis malformações. A idade gestacional nessa fase é obtida pelo comprimento do fêmur e do diâmetro biparietal fetal. 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Obs: Caso não seja possível realizar USG de todos os trimestres, deve-se optar por pelo menos um exame com cerca de 18 a 22 semanas. RASTREIO E PROFILAXIA PARA INFECÇÕES POR STREPTOCOCCUS DO GRUPO B Devido à gravidade e prevalência da infecção neonatal por estreptococo do grupo B (GBS) vem sendo recomendado a profilaxia antibiótica intraparto para todas as gestantes com fatores de risco (trabalho de parto com <37 semanas; temperatura intraparto >38ºC ou aminorrexe há mais de 18h) ou aquelas com cultura positiva. Recomenda-se que gestantes com 36-37 semanas sejam rastreadas por swab vaginal. E aquelas colonizadas devem receber ATB (Penicilina G) durante o trabalho de parto ou no momento da aminorrexe; Por outro lado, o MS não recomenda o rastreamento e nem o uso de antibióticos durante o parto para pacientes com fatores de risco. VACINAÇÃO Vacinas compostas de partículas ou vírus inativados podem ser dadas com segurança, enquanto vírus atenuados não devem ser administrados (sarampo, caxumba, rubéola). SUPLEMENTAÇÃO FERRO A suplementação de ferro deve-se iniciar após a confirmação da gravidez até 3 meses após o parto. 40mg de ferro elementar (Sulfato Ferroso). Apesar de normalmente ser o medicamento de escolha, o sulfato ferroso possui como limitantes as intercorrências gastrointestinais (vômitos, diarreia, constipação intestinal, fezes escuras e cólicas). ÁCIDO FÓLICO Durante a gravidez ocorre uma queda dos níveis de ácido fólico, porem raramente uma anemia megaloblástica. Mesmo assim, a reposição desta vitamina é recomendada, pois sua deficiência pode estar associada a defeitos no tubo neural, como espinha bífida, encefalocele e anencefalia. Na população geral, a reposição de 0,4mg/dia três meses antes da concepção é indicada. Enquanto que nos grupos de alto risco, como usuários de anticonvulsivantes a dosagem é de 5mg por dia 3 meses antes da gestação e mantendo até 12 semanas. Obs: não há evidencias capazes de recomendar a suplementação rotineira de vitamina D ou C na gestação. Obs: a vitamina A quando utilizada em altas doses (>10000UI/DIA) é teratogênica e sua suplementação não deve ser rotineira.
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