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Carboidratos e correlações clínicas Luciana Pereira Rangel CCS, Bloco A, subsolo, sala 24 lprangel@pharma.ufrj.br Funções: - fonte energética - polímeros insolúveis - elementos estruturais e protetores. - lubrificantes de junções esqueléticas. - participam do reconhecimento e adesão entre células. - polímeros covalentemente ligados a proteínas ou lipídios agem como sinalizadores. Os glicídeos na alimentação são importantes fontes de energia. O amido encontrado em alimentos derivados de vegetais, como as massas, é constituído de moléculas de glicose ligadas. Estas cadeias são degradadas a moléculas individuais de glicose para a utilização eventual na geração de ATP e de blocos contrutores para outras moléculas. Carboidratos Digestão e absorção de carboidratos • principais carboidratos da alimentação são amido, sacarose e lactose • α-amilase salivar (ptialina): digestão do amido inicia-se na mastigação • α-amilase pancreática: hidrólise de amido e glicogênio no duodeno, produzindo maltose e dextrinas. • os enterócitos do intestino delgado produzem quatro enzimas (lactase, sacarase, maltase e alfa-dextrinase), que são capazes de clivar os dissacarídeos nos seus monossacarídeos constituintes: lactose: galactose + glicose sacarose: frutose + glicose maltose: glicose (2) dextrina: glicose (n) Vias no metabolismo da Glicose Glicólise Gliconeogênese Glicogenólise Glicogeniogênese metabolismo da molécula de glicose a piruvato ou lactato para produção de energia Formação de glicose-6-fosfato de fontes não- glicídicas Quebra do glicogênio em glicose para a produção de energia Conversão de glicose a glicogênio para armazenamento Após a digestão e absorção, as hexoses produzidas por este processo são direcionadas para diferentes processos: Regulação da Glicemia Concentração de glicose no sangue do indivíduo Jejum 70 a 99 mg/dL de sangue Inanição Gliconeogênese do fígado fornece a glicose necessária para manter o nível de glicemia Alimentado Primeira hora após uma refeição 120 a 140 mg/dL de sangue Mecanismos de regulação da glicemia Rápido retorno da concentração de glicose aos níveis de controle (dentro de duas horas após a última absorção de carboidratos) • Em condições naturais, a glicemia é mantida em valores normais por alguns mecanismos regulatórios. Logo, após uma refeição há: - Liberação de insulina - captação de glicose por tecidos - energia - 70% da glicose vai para o fígado – oxidação ou produção de glicogênio – combustível rápido - Excesso - ácidos graxos – VLDL – tecido adiposo Mecanismos de Regulação da Glicemia • Fígado - Importante sistema de regulação da glicemia Insulina e Glucagon Importantes sistemas de controle por feedback - manter a concentração de glicose normal no sangue Insulina: • Produzida pelas células beta das ilhotas de Langherans • Ilhotas compreendem de 1 a 2% da massa celular do pâncreas • hormônio fundamental, que coordena a utilização de combustíveis pelos tecidos • Efeitos metabólicos anabólicos: síntese de glicogênio, triacilgliceróis e proteínas • Efeito sobre o metabolismo da glicose: - Fígado: inibe a gliconeogênese e glicogenólise -Fígado e músculo: aumenta a glicogeniogênese Músculo e tecido adiposo: insulina aumenta o número de transportadores de glicose na membrana celular e a captação de glicose Glucagon • Produzido pelas células alfa das ilhotas de Langherans; • Age nas mesmas células que a insulina; • Mobiliza as reservas energéticas para a manutenção da glicemia entre as refeições; • No fígado: estimula a glicogenólise; • No tecido adiposo: estimula a lipólise, liberando ácidos graxos; • Estimula a gliconeogênese e a cetogênese; • Liga-se a um receptor específico de membrana. Aumento da glicose no sangue Diminuição da glicose no sangue Diabetes Mellitus • Comprometimento do metabolismo dos carboidratos, lipídeos e proteínas Diabetes melitus tipo 1 Falta de secreção de insulina Diabetes melitus tipo 2 Resistência à insulina Alteração do metabolismo de todos os principais alimentos Deficiência no metabolismo da glicose Captação de glicose ineficiente pela maioria das células Menor utilização de glicose pelas células Aumento da utilização de gorduras e proteínas Resistência à insulina Ausência de insulina Diabetes INTERNATIONAL DIABETES FEDERATION| VOLUME 181, 109133, NOVEMBER 01, 2021 Diabetes Mellitus Tipo 1 • 10% a 20% dos diabéticos • Diabetes juvenil - indivíduos com menos de 20 anos de idade Deficiência absoluta de insulina Relativa liberação excessiva de glucagon Lesão das células beta pancreáticas Infecções virais ou doenças auto-imunes Tendência hereditária à degeneração • Detectada quando já houve 80% a 90% das células beta destruídas Sintomas abruptos: • Hiperglicemia • Utilização aumentada de gorduras para a obtenção de energia • Depleção das proteínas do organismo • Cetoacidose Diabetes Mellitus Tipo 1 Hiperglicemia Utilização periférica de glicose diminuída Glicosúria (excreção de glicose em excesso na urina) Desidratação Diurese osmótica Poliúria (produção excessiva de urina) Polidipsia (sede excessiva) Dano tecidual Glicação de proteínas Gliconeogênese Cetoacidose Aumento da lipólise para produzir energia (através da oxidação de ácidos graxos) Cetogênese acelerada (síntese hepática de corpos cetônicos) Desidratação Hálito cetônico (eliminação de corpos cetônicos no ar expirado) Acidose grave Cetonúria (excreção de corpos cetônicos na urina) + Morte Perda de peso, fadiga e fraqueza Polifagia (fome intensa) Depleção de proteínas do organismo Incapacidade de utilizar glicose como fonte de energia Maior utilização e armazenamento diminuído de proteínas Morte • Os marcadores conhecidos de autoimunidade são: anticorpo anti-ilhota (islet cell antibody, ICA), autoanticorpo anti-insulina (insulin autoantibody, IAA) anticorpo antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD65) anticorpo antitirosina-fosfatase IA-2 e IA-2B anticorpo antitransportador de zinco (Znt8) • Geralmente, autoanticorpos precedem a hiperglicemia por meses a anos, durante um estágio pré-diabético. • Quanto maior o número de autoanticorpos presentes e mais elevados seus títulos, maior a chance de o indivíduo desenvolver a doença. Autoanticorpos encontrados na DM1 Diabetes Mellitus Tipo 2 • 80% a 90% dos diabéticos • Diabetes de início adulto – ocorre depois dos 40 anos de idade ou em grupos étnicos • Desenvolve-se de modo gradual, sem sintomas óbvios Redução da sensibilidade dos tecidos- alvo aos efeitos metabólicos da insulina Resistência à insulina Fatores genéticos Secundária à obesidade Cetoacidose não é muito frequente, mas pode ocorrer em casos de estresse ou infecções Diabetes Mellitus Tipo 2 Secundária à obesidade Menor número de receptores de insulina nos tecidos Anormalidades das vias de sinalização Resistência à insulina Diminuição da utilização e armazenamento de carboidratos Hiperglicemia Aumento da concentração plasmática de insulina Diabetes Tipo 2 Células beta funcionais Secreção de insulina Regulação normal da glicose X Resistência tecidual a insulina Pré-Diabetes/ Categorias de Risco Aumentado para Diabetes o Intolerância a glicose o Resistência a insulina – hiperinsulinemia • Riscos mais altos de desenvolver diabetes e doença cardiovascular • Sem sintomas • Redução dos riscos – perda de 7% do peso corporal – ~ 58% • Controle da dieta – dieta saudável • Exercícios físicos moderados – 150 min/ semana Complicações Crônicas Resultam de um estado hiperglicêmico crônico ese caracterizam por alterações vasculares e neuropáticas Alterações vasculares: - Macroangiopatia diabética - Microangiopatia diabética Glicação não-enzimática, irreversível, das proteínas ↓ Formação dos produtos finais de glicação avançada (AGEs – advanced glycation end products) Ativadores de fatores pro-inflamatórios DECODE: risco de morte cardiovascular eleva-se com aumento da glicemia de jejum e pós-sobrecarga Testes para o diagnóstico e acompanhamento do diabetes: GLICEMIA DE JEJUM • jejum calórico de 8 h - ingestão de água é permitida • Glicemia plasmática (mg/dL) - Normal: até 99mg/dL - Pré-diabetes: 100 a 125mg/dL - Diabetes: 126mg/dL e acima. *Deve ser confirmado com novo teste em outro dia. Dosagem da Glicemia • soro ou plasma - sangue total - 10 a 15 % mais baixa • coleta - punção venosa - tubo com fluoreto e EDTA sem fluoreto - centrifugar logo após a punção *eritrócitos consomem glicose fluoreto inibe glicólise e conserva amostra por mais tempo Metodologia Laboratorial Metodologia Laboratorial TESTE ORAL DE TOLERÂNCIA À GLICOSE (TOTG) • Teste diagnóstico para diabetes; • Medidas seriadas de glicose nos tempos 0, 30, 60, 90, 120 min após ingestão de 75 g glicose anidra em 300 ml de água; • Teste realizado pela manhã, jejum de 8 h; • Valor máximo da glicemia capilar para realização do teste: até 180 mg/dl. TESTE ORAL DE TOLERÂNCIA À GLICOSE (TOTG) Cuidados antes do teste: • Ingestão de pelo menos 150 g de carboidratos, nos 3 dias anteriores; hábitos alimentares normais • Atividades físicas normais; • Durante o teste, não fumar e permanecer em repouso; • Não usar medicação que interfira no metabolismo dos carboidratos. TESTE ORAL DE TOLERÂNCIA À GLICOSE (TOTG) Indicações: • Diagnóstico DM Gestacional; • Diagnóstico tolerância à glicose diminuída; • Avaliação de pacientes com nefropatia, neuropatia, ou retinopatia não explicada e com glicemia em jejum abaixo de 126 mg/dl. Teste oral de tolerância à glicose: G lic em ia ( m g /d L) Diabetes Normal Horas 200 - 180 - 160 - 140 - 120 - 100 - 80 - 0 1 2 3 4 5 HEMOGLOBINA GLICADA • A glicose penetra livremente no eritrócito e reage com a hemoglobina. Quanto maior for a taxa de glicemia, maior a fração de hemoglobina glicada; • Indica o controle metabólico nos 120 dias precedentes ao teste, correspondendo ao tempo médio de vida dos eritrócitos; • Não é indicado para pacientes com diversas condições hematológicas, como algumas hemoglobinopatias, pois há redução na meia-vida das hemácias e do tempo de exposição da hemoglobina às variações da glicose. HbA1c: Glicose ligada ao resíduo valina na cadeia beta da hemoglobina - Ligação estável e irreversível Dosagem da Hemoglobina Glicada • Sangue deve ser coletado em tubo com EDTA • Não é necessário jejum • Métodos: - HPLC: Cromatografia de troca iônica, cromatografia de afinidade utilizando derivados do ácido borônico; - Imunoensaio turbidimétrico. • medida da glicemia em jejum é insuficiente para acompanhamento do controle glicêmico do paciente com DM * medida pontual, referente ao momento da coleta de sangue Glicemia Média Estimada (GME) OUTROS MÉTODOS PARA AVALIAÇÃO DA GLICEMIA Albumina Glicada Cetoamina formada a partir da oxidação não enzimática da albumina pela glicose. Meia-vida ~ 15 dias – controle da glicemia de curto prazo Resultados podem ser afetados por idade, estado nutricional, albuminúria, cirrose, disfunção da tireóide, tabagismo. Frutosamina Medida da glicação da fração total de proteínas plasmáticas, cuja maior representante é a albumina (~90%). Refere-se a um período de 10-14 dias anteriores ao exame. Pode ser utilizada em casos de doenças que levam a redução da meia-vida das hemácias. É alterada em casos de alterações no turnover de proteínas, altas de bilirrubina, ácido úrico e ureia. 1,5-Anidroglucitol • 1,5-Anidroglucitol (1,5-AG) é outro marcador de glicemia, um poliol plasmático de ocorrência natural na dieta que é mantido constante durante a normoglicemia mediante filtração e reabsorção renal. • Análogo da glicose não metabolizável encontrado no plasma após ingestão. • Caracteriza-se pela excreção urinária, filtração através dos glomérulos, taxa de 5 a 10 g/L e reabsorção tubular muito alta (> 99%), que é inibida pela glicose durante períodos de hiperglicemia. • Praticamente todo o 1,5-AG filtrado pelo rim é reabsorvido em condições normais. Contudo, quando as concentrações glicêmicas ultrapassam o limiar renal, ocorre diminuição da concentração plasmática de 1,5-AG devido à inibição competitiva com a glicose pela reabsorção tubular proximal. DM1: necessidade de diferenciar da DM2 (Peptídeo C, dosagem de autoanticorpos) DM2: doença evolui para redução na produção de insulina Peptídeo C: Produzido na clivagem da pró-insulina Serve como marcador da produção de insulina, mesmo na ausência dela (que pode ser destruída pelos anticorpos) É secretada em concentrações equimolares à da insulina Proporção de 5:1 em relação à insulina em jejum Precisa ser considerado o jejum: se não há secreção de insulina, não há peptídeo C Pró-insulina Critérios a serem seguidos para o diagnóstico de DM Após o diagnóstico do diabetes, seu tratamento deverá seguir metas. São elas: Diabetes Gestacional • Afeta ~18% das mulheres grávidas • Mães não-diabéticas desenvolvem resistência à insulina durante gravidez – hormônio lactogênio placentário • Valores de insulina até 3x mais altos • Riscos menores para o bebê do que com mães diabéticas • Surgimento por volta dos 6 meses de gravidez • Insulina materna não atravessa placenta - Glicose atravessa placenta • Produção aumentada de insulina pelo feto • Ganho de peso excessivo do feto – pode atrapalhar no parto • Risco de hipoglicemia no neonato Diabetes Gestacional •Diagnóstico: - Glicemia de jejum: entre 92 e 126 mg/dL já no 1º trimestre (com repetição) - TOTG entre a 24ª e a 28ª semanas Métodos de Diagnóstico da DM (Geral) Glicose em jejum acima de 125 mg/dL Hemoglobina Glicada TOTG Métodos de Controle do Paciente Diabético Automonitoração da glicemia capilar – controle da alimentação e dosagem de insulina Hemoglobina glicada Frutosamina *Glicose em jejum* Outros Dosagem de insulina – resistência a insulina? Peptídeo C – produção de insulina? Microalbuminúria – lesão renal Dosagem de corpos cetônicos (cetonemia e cetonúria) Glicosúria a partir de 160-180 mg/dL de glicose no sangue Glicemia de Jejum TOTG Caso clínico: menina de 13 anos de idade desmaia no pátio da escola. A mãe relata que a menina vem perdendo peso e tem ido diversas vezes ao banheiro à noite. O médico percebe que seu hálito está cetônico. Ela apresenta também respiração acelerada e pressão baixa. Nos exames bioquímicos, são detectadas as seguintes alterações: glicose 500 mg/dL, positivo para corpos cetônicos. Na urina, foi detectada glicose, mas não foi detectada microalbuminúria. Baseado nesses achados, a paciente pode ser diagnosticada como diabética? Quais outros exames seriam recomendados para conclusão do diagnóstico e quais não seriam? Caso clínico: paciente de 52 anos, portador de beta-talassemia. Acima do peso, com glicemia em jejum de 166 mg/dL e teste de glicemia pós-prandial de 330 mg/dL após 2h. Inicia tratamento com hipoglicemiante oral. A glicemia de jejum, após 1 mês de tratamento, tem valor de 140 mg/dL e a hemoglobina glicada apresenta valor de 5,3%. Estes valores são coerentes? O que você sugeriria para o acompanhamento deste paciente?
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